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Literatura_Brasileira_IV_Impressos-30

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mão na minha. Encostava e ficava fazendo parte melhor da
minha pele, no profundo, desse a minhas carnes alguma coisa.
Era uma mão branca, com os dedos dela delicados. – "Você
também é animoso..." – me disse. Amanheci minha aurora. Mas
a vergonha que eu sentia agora era de outra qualidade. Arre vai,
o canoeiro cantou, feio, moda de copla que gente barranqueira
usa: "... Meu Rio de São Francisco, nessa maior turvação: vim te dar
um gole d'água, mas pedir tua benção..." Aí, o desejado, arribamos
na outra beira, a de lá.
Ao ver, o menino mandou encostar; só descemos. – "Você
não arreda daqui, fica tomando conta!" – ele falou para o
canoeiro, que seguiu de cumprir aquela autoridade, desde que
amarrou a corrente num pau-pombo. Aonde o menino queria
ir? Sofismei, mas fui andando, fomos, na vargem, no meioavermelhado
do capim-pubo. Sentamos, por fim, num lugar
mais salientado, com pedras, rodeado por áspero bamburral.
Sendo de permanecer assim, sem prazo, isto é, o quase calados,
somente. Sempre os mosquitinhos era que arreliavam, o vulgar.
– "Amigo, quer de comer? Está com fome?" – ele me
perguntou. E me deu a rapadura e o queijo. Ele mesmo, só
tocou em miga. Estava pitando. Acabou de pitar, apanhava talos
de capim-capivara, e mastigava; tinha gosto de milho-verde, é
dele que a capivara come. Assim quando me veio vontade de
urinar, e eu disse, ele determinou: – "Há-te, vai ali atrás, longe
de mim, isso faz..." Mais não conversasse; e eu reparei, me
acanhava, comparando como eram pobres as minhas roupas,
junto das dele.
Antojo, então, por detrás de nós, sem avisos, apareceu a
cara de um homem! As duas mãos dele afastavam os ramos do
mato, me deu um susto somente. Por certo algum trilho passava
perto por ali, o homem escutara nossa conversa. À fé, era um
rapaz, mulato, regular uns dezoito ou vinte anos; mas altado,
forte, com as feições muito brutas. Debochado, ele disse isto: –
"Vocês dois, uê, hem?! Que é que estão fazendo?..." Aduzido
fungou, e, mão no fechado da outra, bateu um figurado
indecente. Olhei para o menino. Esse não semelhava ter tomado
nenhum espanto, surdo sentado ficou, social com seu prático
sorriso. – "Hem, hem? E eu? Também quero!" – o
mulato veio insistindo. E, por aí, eu consegui falar alto, contestando,
que não estávamos fazendo sujice nenhuma, estávamos
era espreitando as distâncias do rio e o parado das coisas. Mas, o
que eu menos esperava, ouvi a bonita voz do menino dizer: –
"Você, meu nego? Está certo, chega aqui..." A fala, o jeito dele,
imitavam de mulher. Então, era aquilo? E o mulato, satisfeito,
caminhou para se sentar juntinho dele.
Ah, tem lances, esses – se riscam tão depressa, olhar da
gente não acompanha. Urutu dá e já deu o bote? Só foi assim.
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