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E-book 1 CASO GRATUITO - versao final (2) (1)

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O MÉTODO DE TREINAMENTO 
O curso completo SENTENÇA PENAL APROVADA está estruturado em 4 módulos. Os 2 primeiros 
são teóricos e os outros 2 são práticos. Nesse material gratuito você terá acesso a um caso prático que 
foi utilizado no ano de 2023 para treinamento dos alunos da comunidade. 
O Módulo 4 do curso oferece treinamento prático completo da tomada de decisão. São 
apresentados casos simulados semanalmente, desafiando os alunos a buscarem a solução. Na semana 
seguinte, são feitas aulas de resolução ao vivo, ocasião em que o professor e os alunos interagem para 
analisar o caso, sendo permitidos “recursos” contra o espelho proposto. 
Os casos são desenvolvidos a partir da criatividade do professor ou inspirados em situações e 
sentenças reais. Mas sempre levando em conta as necessidades pedagógicas de ensino. Para que haja 
aprendizado de verdade, o método de treinamento desenvolvido no curso leva em consideração a 
necessidade de respeito aos níveis de conhecimento. São propostos sempre 3 casos mais simples para 1 
caso complexo. Na linguagem do curso: 3 Casos Gatinho e 1 Caso Leão por grupo temático. 
Aqui, você terá acesso gratuito a um Caso Gatinho, com enunciado, resolução feita pelo 
professor e uma sentença modelo, selecionada a partir das sentenças enviadas pelos alunos da 
comunidade para correção individualizada pelo professor. 
A proposta de resolução do caso não se limita a apenas direcionar os tópicos (estilo espelho de 
correção), mas aproveita o ensejo para trazer conteúdo doutrinário e jurisprudencial de muita utilidade 
para aquisição ou consolidação do conhecimento em penal e processo penal, além de técnicas de 
tomada de decisão e fundamentação. Quanto mais se treina mais se aprende e se lembra! 
Os temas abordados fazem parte de um planejamento anual organizado pelo professor desde 
janeiro de 2023, buscando abranger os principais crimes que são cobrados em provas de concursos 
públicos do país. Além disso, são sempre organizados os assuntos para que haja temáticas atuais e 
importantes, seja da legislação nova, da doutrina ou da jurisprudência atualizada. Veja os temas: 
Volumes Grupo de 
casos 
Eixo temático abordado nos casos 
Volume 01 
1 ao 4 Crimes contra o patrimônio I (furto e roubo) 
5 ao 8 Crimes de drogas e armas 
Volume 02 
9 ao 12 Crimes contra a Administração Pública 
13 ao 16 Crimes contra a dignidade sexual em geral 
Volume 03 
17 ao 20 Crimes contra a pessoa e violência doméstica 
21 ao 24 Crimes tributários, financeiros e de lavagem de dinheiro 
Volume 04 
25 ao 28 Crimes contra o patrimônio II (estelionato, receptação, apropriação, dano...) 
29 ao 32 Crimes de falsidades e outros contra a fé pública 
Volume 05 
33 ao 36 Outros crimes de leis especiais (racismo, ambientais, consumidor, ECA, trânsito...) 
37 ao 40 Revisão geral, correlacionando os crimes estudados no curso 
 
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CASO GATINHO 
1. O Ministério Público do Estado moveu ação penal contra DEMÉTRIO, imputando-lhe o 
crime do art. 215-A do Código Penal, narrando os seguintes fatos: 
a. Restou apurado que no dia 10/03/2021, na Estação Metroviária da Gradion, o 
denunciado praticou ato libidinoso com a vítima REGILAINE com o objetivo de satisfazer a sua 
própria lascívia, sem a anuência dela. 
b. Em sua oitiva prestada em sede policial, a vítima esclareceu que ela e o 
denunciado eventualmente utilizavam o mesmo meio de transporte, nos mesmos horários, 
para ir ao trabalho. Em determinadas ocasiões em que o vagão do metrô ficava muito lotado 
e a vítima precisava viajar em pé, por vezes ela notava que ele propositalmente se dirigia para 
mais próximo dela, mas preferia não dar atenção ao fato por ser casada e não ter interesse 
em relacionamentos extraconjugais. Nunca deu confiança ao denunciado, segundo disse. Mas 
eventualmente ele tentava puxar assuntos, perguntando sobre o clima, o horário ou mesmo 
sobre informações a respeito das estações próximas em que o metrô pararia. 
c. Ocorre que na semana que antecedeu os fatos narrados na denúncia, segundo 
a vítima, o denunciado se aproximou dela pelas costas e, aproveitando-se do pouco espaço 
deixado no vagão por conta do excesso de pessoas, encostou o corpo dele no dela. Disse que 
achou aquilo muito estranho e tentou desvencilhar, tentando acreditar que poderia ter sido 
apenas uma coincidência e esquecer do ocorrido. 
d. Mas na semana seguinte, no dia dos fatos ora denunciados, a cena repetiu-se 
e dessa vez a vítima disse ter ouvido do denunciado as seguintes palavras em tom de sussurro: 
“como você é gostosa”. E na sequência sentiu que ele encostou o corpo dele no dela e sentiu 
a mão dele em suas coxas, tentando aproximar mais o corpo dela. Nessa ocasião que notou 
que ele estava com seu órgão sexual para fora, encostando nas nádegas dela. 
e. De imediato a vítima passou a gritar e pedir ajuda, ocasião em que o 
denunciado saiu rapidamente pela porta lateral do vagão. Mas a vítima correu atrás dele 
gritando ainda mais para que ajudassem a “pegar o tarado”. Nisso, as pessoas que estavam 
no vagão pararam o denunciado e começaram a agredi-lo, momento em que os seguranças 
da empresa que administra a via férrea intercederam e acalmaram os ânimos. 
f. Os envolvidos foram levados à delegacia e prestaram seus depoimentos, sendo 
o da vítima no sentido como apontado acima. O denunciado disse apenas que não entendeu 
porque passou a ser agredido pelas pessoas no local, dado que estava indo embora 
normalmente para o seu trabalho, como faz todas as manhãs. Não foram ouvidas 
testemunhas no dia dos fatos. 
g. Foi aberto inquérito, ocasião em que foram colhidos os seguintes elementos de 
informação: imagens das câmeras de segurança do local, mostrando a vítima correndo atrás 
do denunciado, bem como dos populares o agredindo até a chegada dos seguranças; 
comprovante de que o acusado trabalhava próximo à estação Torquato, mas que naquele dia 
dos fatos desceu duas estações antes, Mairinque; bem como a oitiva do segurança que 
apartou a confusão, o qual disse que se recordava dos fatos e lembra que a senhora 
REGILAINE estava desesperada e gritava muito, principalmente dizendo que tinha um 
estuprador no metrô. 
 
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2. A denúncia foi recebida no dia 12/12/2021. O acusado apresentou defesa e o processo 
apenas prosseguiu com a realização de audiência. 
3. Em juízo, foi ouvido o segurança da estação, que confirmou as informações prestadas 
no dia em que ouvido perante a autoridade policial. Foram exibidas a ele as imagens do dia dos fatos 
e ele explicou a dinâmica dos acontecimentos, esclarecendo em quais momentos houve os gritos e o 
desespero das pessoas que estavam no local. Disse que nunca tinha visto a vítima ou o acusado antes 
e nunca mais os viu, até o dia daquela audiência. 
4. Não foram arroladas outras testemunhas pela acusação, que informou não ter 
identificado qualquer dos populares que estava naquele local. 
5. A vítima foi ouvida e também confirmou o que havia dito perante o delegado. 
Confirmou que a pessoa que estava na sala de audiências era mesmo o homem que ela correu atrás 
naquele dia, o que fez por conta da atitude desavergonhada dele. Segundo apontou, ele usava 
máscara apenas enquanto estava dentro do vagão, sendo que a retirou logo que saiu e teve início a 
confusão, sendo esse o motivo pelo qual tinha certeza de que se tratava da mesma pessoa. Disse que 
não o conhece de nome e nem sabe qualquer informação sobre a vida dele. Mas que o via às vezes 
quando coincidia de pegarem o mesmo vagão, porque acreditava que tinham horário de trabalho 
parecido. Ela informou que havia avisado ao marido dela que desconfiava que tinha um homem a 
seguindo no trem. Que fazia um tempo que estava preocupada com ele e o comportamento para 
cima dela. Mas que o marido teriadito que isso era coisa da cabeça dela e que deixasse o assunto 
para lá para não arrumar confusão à toa. Disse que estava tentando seguir o conselho do marido, 
mas que cada vez mais o homem se aproximava dela e estava ficando cada vez mais difícil não 
desconfiar das intenções dele, principalmente porque vivia perguntando coisas que ele obviamente 
sabia e ela percebia que era só para puxar assunto. Explicou que não conseguiu se conter no dia em 
que olhou para trás e notou que ele estava com a calça entreaberta e com uma parte do membro 
para fora. Achou isso muito absurdo e por ser uma mulher casada e séria acabou “explodindo de 
raiva”. Disse que depois do ocorrido ficou bem abalada, teve receio de perder o marido e acabou 
caindo em depressão profunda, o que motivou o seu pedido de demissão no emprego. Está 
desempregada até o momento, ainda se tratando da doença e tomando remédios para dormir. 
6. Em seu interrogatório, DEMÉTRIO negou veementemente os fatos, dizendo que 
naquela manhã estava normalmente se dirigindo ao trabalho quando foi abordado aos socos e 
pontapés por pessoas na estação de metrô. Achou que era algum tipo de assalto ou arrastão, até que 
chegou a senhora que estava ali na sala de audiência gritando com ele e o difamando perante todos. 
Agradeceu a Deus por ter escapado com vida, porque se o segurança não intercedesse ele não 
conseguiria se defender dos ataques dos populares. Disse que é trabalhador, honesto, pai de família 
com duas crianças para cuidar, casado e não faz a menor ideia do motivo pelo qual a vítima teria 
apontado ele como autor dos atos que ela narrou ter ocorrido. Disse que nunca foi preso ou 
processado anteriormente. Trabalha como técnico em informática e naquele dia desceu um pouco 
mais longe de seu trabalho porque iria passar na agência bancária antes, seguindo à pé para o seu 
trabalho depois. 
7. Encerrada a instrução, nada foi requerido na fase do art. 402 do CPP. 
8. As partes apresentaram alegações finais orais, ocasião em que o MP reiterou o pedido 
de condenação por entender que foram colacionadas provas suficientes para tanto, solicitando a 
incidência da agravante prevista na alínea “j” do inciso II do art. 61 do CP, porque o crime ocorreu 
 
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durante o estado de calamidade pública da Pandemia da Covid-19. Requereu a valoração negativa 
da culpabilidade do réu, porque a conduta dele revelou grande vilania e audácia, demonstrando 
desrespeito pelo gênero feminino. Por sua vez, a defesa sustentou a ausência de qualquer elemento 
probatório concreto que demonstrasse que de fato ocorreram os fatos narrados pela vítima, sendo 
que nenhuma das testemunhas ouvidas mencionou a respeito da suposta aproximação de corpos e 
exposição de órgão sexual. Requereu que, quando muito, fosse imputado ao réu o crime do art. 147-
A do CP, o qual exige a representação da vítima, não apresentada no prazo decadencial. 
9. Os autos vieram conclusos em maio de 2023. 
Considerando o enunciado como o relatório, prolate a sentença. 
Sugestão de resposta em até 180 linhas manuscritas (6 páginas de 30 linhas). 
 
 
 
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PROPOSTA DE RESOLUÇÃO SUGERIDA NO CURSO 
ITEM 1: Questões pendentes e preliminares processuais 
Não foram arguidas e não havia o que se analisar de ofício. 
ITEM 2: Prejudiciais de mérito 
Poderia ser analisado previamente ao mérito o argumento a respeito da tese pela 
desclassificação da conduta para o crime de perseguição, porque, se acolhida a referida versão, o 
caso se encerraria pela necessidade de declaração desde já da decadência do direito da vítima 
formular a sua representação penal (§3º do art. 147-A do CP), dado que o prazo para representar é 
de 6 meses (art. 103 do CP) e a vítima teve conhecimento do ocorrido e de sua autoria no dia dos 
fatos, que se deram em 03/2021 e a sentença está sendo prolatada em 05/2023. 
Faz muito sentido abordar isso antes da apreciação do mérito, porque o reconhecimento da 
extinção da punibilidade pela prescrição ou decadência significam que não é necessário e nem útil 
ao processo percorrer todo o seu caminho de análise meritória para fins de apuração da culpa 
(culpado ou inocente) e, na sequência, admitir não ser possível o decreto condenatório mesmo se a 
conclusão for de que o acusado cometeu um fato típico, ilícito e culpável. 
Mas sempre que se fala em análise prévia ao mérito, significa dizer que não se pode levar em 
consideração elementos concretos (fatos e provas), os quais vão ser reconhecidos como existentes 
ou não por ocasião da investigação do próprio mérito, especialmente na materialidade e autoria. A 
técnica que pode ser utilizada é a análise em abstrato. Buscar concluir se os fatos apontados como 
conduta na denúncia se amoldam melhor no tipo penal imputado naquela peça (art. 215-A do CP) 
ou se no tipo levantado como tese de defesa (art. 147-A do CP). 
Por isso mesmo nem sempre é vantajoso deslocar para a fase prévia ao mérito essa análise, 
porque a investigação das provas produzidas pode levar a uma conclusão concreta diversa daquela 
que é apontada na análise abstrata. Por isso, seria perfeitamente possível deixar para analisar a 
questão posta pela defesa no próprio mérito. Em todo caso, é aconselhável sempre fazer pelo menos 
menção a isso antes de inaugurar a análise meritória: 
A tese levantada pela defesa a respeito da necessidade de alteração da imputação para o art. 
147-A do CP será analisada por ocasião do mérito, embora o seu acolhimento pressuponha a extinção 
da punibilidade pela decadência do direito de representação da vítima. A conclusão a respeito do tipo 
penal mais adequado ao caso torna-se mais conveniente com a análise dos fatos concretos, provas e 
alegações das partes, o que pressupõe a necessidade de se avançar ao mérito da sentença. 
ITEM 3: Materialidade e autoria 
Casos cujos enunciados não parecem apresentar grandes dificuldades podem ser traiçoeiros 
em termos de maior necessidade de fundamentação. Não é porque a prova não está cobrando 
muitas teses, muitas preliminares e muita dificuldade para adequação típica e cálculo da dosimetria 
que a prova pode ser considerada fácil. É necessário recordar-se da competição que existe nas provas 
 
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de concurso público. Essa prova será mais fácil para todos, em termos de complexidade de análise 
jurídica. Então, nesses casos o diferencial é sua capacidade argumentativa e de imersão no caso. 
Mostrar como já é capaz de tomar decisões fundamentadas e com muito sentido lógico-jurídico. 
O caso trouxe grande abertura para discussões da modernidade na aplicação do direito penal 
e seus reflexos sociais. A provocação do enunciado é no sentido de haver duas versões contraditórias 
e o contexto da sociedade sempre reforçar a versão do homem em detrimento daquilo que a mulher 
fala. Poderia tranquilamente se falar em violência de gênero até mesmo na reprodução dos meios 
investigativos, tanto é que a vítima foi tratada como agressora desde o início. Isso dá abertura para 
a argumentação sobre vários tópicos importantes que são diretamente relacionados ao assunto, 
como a falta de políticas públicas para proteção da mulher e reconhecimento de suas necessidades 
em termos de dupla jornada, sobretudo diante de meios de transporte público lotados. Não estivesse 
o vagão tão lotado; tivesse ele sistema de câmeras; houvesse maior fiscalização... tudo isso 
contribuiria para não se necessitar exigir da vítima a apresentação de todas as provas daquilo que 
ela relata. 
Assim como praticamente todos os outros crimes de violação da dignidade sexual, o cerne da 
questão meritória do caso é a admissão probatória da materialidade dos elementos do tipo e da 
autoria com base em provas que poderiam ser consideradas extremamente frágeis em outros 
contextos de análises. A jurisprudência do STJ vem reconhecendo amplamente a necessidade deflexibilização desse tipo de análise no âmbito de incidência dessa criminalidade, o que vem sendo 
observado como algo que tende a ser acompanhado pelos Tribunais de Justiça do país. Veremos 
mais disso ao final da análise do presente item. Primeiro é preciso entender o que há de 
materialidade e autoria para investigar no caso. 
A materialidade no presente caso não poderia exigir um exame pericial demonstrando que 
houve toque do corpo de DEMÉTRIO no corpo de REGILAINE, até mesmo porque não se poderia 
considerar como um crime que deixa vestígios, ao menos na hipótese lançada no enunciado. Houve 
um caso emblemático, que ensejou a criação do referido tipo penal, em que o agente ejaculou sobre 
a vítima. Situação dessas permitiria e até mesmo exigiria a prova técnica. Mas no presente caso não 
é apenas a falta de uma prova técnica que dificulta a análise da existência do fato. Não há prova 
documental (o vídeo mencionado somente tem imagens da saída do vagão) e nem testemunhal (as 
pessoas que estavam no vagão não relataram ter visto o contato acintoso e lascivo de DEMÉTRIO). 
O que há de prova, verdadeiramente, é o depoimento da vítima. 
Do mesmo modo, seria necessário analisar também a questão da autoria com mais capricho 
na sentença. O réu não nega que o fato possa ter ocorrido. Ele não nega propriamente a 
materialidade, deixando a entender que se ocorreu algo dentro do vagão ele de nada sabia, tanto 
que somente notou ter algo estranho naquela manhã quando os presentes no local o abordaram 
violentamente, ao que imaginou tratar-se de algum tipo de delito patrimonial. 
E aí está a técnica argumentativa que auxilia muito a fundamentação desse tipo de tomada 
de decisão. Será preciso promover o confronto entre as versões, de modo a se obter um juízo de 
convencimento a respeito de qual pode ser a mais fidedigna para a representação do caso. O juiz 
não estava lá presente e não tem como saber ao certo o que se passou. O máximo que se pode 
 
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conseguir é essa representação do que ocorreu, para fins de convencimento. A estrutura 
argumentativa que normalmente se usa é a seguinte: 
- O QUE DIZ A DEFESA: menção às versões dadas pelo réu em seus depoimentos ou peças de 
defesa, bem como eventualmente por suas testemunhas. Possível transcrever pequenos trechos ou 
apenas reescrever com suas próprias palavras (recomendado), o que caracteriza o discurso indireto; 
- SE HÁ LÓGICA NA VERSÃO: dizer se a versão dada pela defesa faz mais ou menos sentido do 
que a dada pela vítima. Normalmente, para a condenação, se usa a técnica de dizer alguns chavões 
que podem facilitar: que a versão ficou isolada; restou sem amparo nas outras provas; não fazem 
sentido diante do acervo probatório colacionado; não possuem coerência com os demais atos do 
processo e por aí vai; 
- O QUE DIZ A ACUSAÇÃO/VÍTIMA: mencionar a versão dada pela vítima e eventuais 
testemunhas da acusação, igualmente podendo transcrever, mas sendo melhor adotar o discurso 
indireto; 
- CONCLUSÃO DO RACIOCÍNIO: para concluir é preciso apontar diretamente quais os pontos 
que a versão da acusação faz mais sentido do que a defesa. Em casos de delitos contra a dignidade 
sexual, em que a palavra da vítima vai ter um peso importante na consideração da tomada de 
decisão, é importante analisar sobretudo a coerência dela e, também, alguma possibilidade de ser 
apenas uma forma de perseguição da vítima contra o suposto agressor. Justamente por isso é 
sempre relevante buscar na argumentação da sentença levantar informações a respeito da ausência 
no caso de qualquer elemento que pudesse ser caracterizado como inimizade da vítima em relação 
ao agressor. Em outras palavras, poderia a defesa do réu trazer testemunha apontando que a vítima 
e ele tinham casos anteriores de trocas de agressões mútuas, o que talvez pudesse indicar uma falsa 
acusação dela apenas para prejudicá-lo. Mas isso é ônus probatório da defesa, o que merece 
consideração apenas argumentativa no texto da sentença. 
Veja a técnica de análise sendo colocada em prática, em uma sugestão simples: 
No presente caso, tem-se que a versão prestada pelo réu se mostrou no mínimo cínica e 
isolada dos demais elementos, diante de tudo o que se colheu de depoimentos e provas. Diz o acusado 
que somente tomou conhecimento de que havia alguma situação anormal naquela manhã quando 
foi abruptamente abordado pelos presentes, momento em que foi agredido fisicamente sem entender 
o porquê. Diz também que estava indo ao trabalho como fazia todas as manhãs e apenas saltou duas 
estações antes do normal porque pretendia passar em uma agência bancária e que caminharia até 
seu trabalho na sequência. Ao que se verifica de sua tese de defesa, o acusado não conhecia a vítima 
e tudo parece ter ocorrido tranquilamente e dentro da normalidade naquela manhã. 
Mas essa versão em nada se sustenta diante das demais provas colhidas no processo, não 
merecendo qualquer credibilidade. 
Desde sua oitiva em sede policial, no calor dos fatos, a vítima apontou que sentiu o acusado 
aproveitando-se da lotação no vagão para importuná-la sexualmente, inclusive colocando o seu 
órgão genital em contato com o corpo dela, sem a autorização da vítima. Isso teria ocasionado muita 
irritação por parte dela, que não mais conseguiu se conter, como vinha tentando fazer, e tornou 
pública a situação, aos gritos contra o agressor. A versão dada pelo acusado, de que saiu calmamente 
 
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do vagão para ir ao banco, não se sustenta diante da oitiva do segurança do metrô, que apontou nas 
imagens de segurança da estação o momento em que houve a parada e saída do vagão, confirmando 
que o clima era de confusão generalizada por conta do desespero da vítima. Além disso, também não 
tem coerência a versão dada pela defesa de que não conhecia a vítima, porque ele e ela tinham 
contatos eventuais por utilizarem o mesmo meio de transporte, não sendo totalmente desconhecidos 
como fez parecer a defesa. 
Assim, embora o acusado tenha tentado demonstrar que não possuía razões para ter 
cometido as ações apontadas pela vítima, porque casado e trabalhador honesto, o fato é que não foi 
capaz de produzir qualquer prova ou trazer elemento concreto que pudesse descredibilizar a versão 
dada pela acusação. Anota-se que não foi apresentada qualquer razão que pudesse justificar eventual 
perseguição da vítima contra o acusado, no sentido de se usar a máquina judiciária para prejudicá-
lo. Caberia à defesa a produção de prova nesse sentido, o que não foi feito no presente caso, tanto 
que a versão da defesa é no sentido de que sequer se conheciam. Não haveria qualquer sentido intuir 
que a vítima estivesse aleatoriamente querendo a punição do acusado, colocando sua própria saúde 
em risco e causando todo o pânico narrado no dia dos fatos sem qualquer razão que não o 
inconformismo pela violação de sua dignidade sexual e desprezo ao gênero feminino. 
Como se vê, em casos como o presente seria imprescindível o aprofundamento na questão 
do maior peso de análise que deve ser dado à palavra da vítima, não bastando dizer que há 
precedentes do STJ nesse sentido. É preciso sempre lembrar da equação no sentido de que casos 
com menos complexidade meritória exigem maior aprofundamento de fundamentação. Então, é 
necessário que a sentença aborde não apenas que existem os precedentes, mas diga em que pilares 
estão estruturados. Ou seja, porque foram assim construídos e em que medida se aplicam ao 
presente caso. É preciso uma análise séria e apurada para fins de garantia de uma pontuação máxima 
nesse tipo de avaliação. 
De fato, há inúmeras decisões do STJ consolidando que a palavra da vítima precisa ser vista 
com mais atenção, inclusive constando esse posicionamento no caderno de Jurisprudência em Teses 
da Corte: 
2) Em delitos sexuais, comumente praticados às ocultas, a palavra da vítima possui especial 
relevância, desde queesteja em consonância com as demais provas acostadas aos autos. (STJ, 
JURISPRUDÊNCIA EM TESES, EDIÇÃO 151, CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL) 
O que fundamenta esse posicionamento é a constatação prática de uma verdadeira prova 
diabólica contra as vítimas de abuso sexual, na medida em que a acusação raramente é capaz de 
reunir provas contundentes, no sentido do processo penal comum, da materialidade e autoria das 
violações contra a dignidade das vítimas. Como provar aquilo que ocorreu dentro de uma casa e 
apenas a vítima e o agressor presenciaram? Difícil provar materialmente tanto que o ato ocorreu 
(materialidade do abuso) quanto que o autor foi mesmo aquele apontado pela vítima. Os 
precedentes do STJ costumam abordar estupros reiterados que ocorrem no ambiente familiar, mas 
que não podem ser mais materializados pericialmente por conta da passagem dos anos, mas 
também abrangem outros delitos sexuais em que não há possibilidade de colheita de prova pericial 
e somente a vítima poderia apontar quem foi o agressor e como se deu o fato. 
 
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Em termos de provas de concursos públicos, é possível apontar a prova de sentença penal 
aplicada no 189º Concurso do TJSP, em 2022, na qual o enunciado tinha apenas uma lauda e 
aparentava ser de simples resolução. No entanto, a carga valorativa exigida na análise do mérito das 
imputações era muito maior que a normal, sendo que o espelho de correção expressamente exigiu 
a abordagem da questão da importância da palavra da vítima e o confronto dela com a versão da 
defesa e possível ou não perseguição aleatória contra o réu: 
Afastadas as teses preliminares, tem-se que a materialidade, autoria e dolo de todos os crimes 
ao réu imputados foram devidamente comprovados ao longo da instrução processual, não tendo a d. 
defesa demonstrado minimamente que as ofendidas, que prestaram seus depoimentos de forma 
firme e coesa sempre que ouvidas, o que ocorreu em ambiente seguro e adequado na forma da lei, 
confirmando integralmente os fatos narrados na denúncia, tivessem quaisquer motivos para 
prejudicar o réu, tio de quase todas, farta assim a prova oral à certeza de sua responsabilidade, 
destacando-se que, em crimes cometidos na clandestinidade, como os aqui tratados, a fala da vítima 
recebe especial valor. 
ITEM 4: Enquadramento criminal, teses de defesa e emendatio libelli 
Sempre que se fala em enquadramento criminal é imprescindível pensar na análise técnica 
dos elementos do tipo, os quais foram reconhecidos como existentes e provados na análise prévia 
do mérito. Aqui, o tipo objetivo é a conduta de praticar um ato libidinoso (que pressupõe uma dose 
de análise normativa, para definir o que é libidinoso) e sem a anuência da vítima; o tipo subjetivo é 
a consciência e vontade de fazer isso (dolo), acrescida do especial fim de agir de satisfazer a sua 
própria lascívia ou a de terceiro (o chamado dolo específico). 
A imputação penal promovida na denúncia está adequada aos fatos narrados e provados no 
caso, não sendo o caso de recapitulação para o tipo do art. 147-A do CP, como pleiteado pela defesa. 
Primeiro, porque o ato foi praticado em 10/03/2021 e a Lei 14.132 somente incluiu o tipo penal de 
perseguição no dia 31/03/2021, de modo que haveria problemas em relação ao direito intertemporal 
no caso. Além disso, não há incidência típica na conduta prevista no tipo invocado pela defesa. 
Apenas para compreender, vejamos as possibilidades: 
• Importunação sexual 
 Art. 215-A. Praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de 
satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro: 
• Perseguição 
 Art. 147-A. Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a 
integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, 
invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade. 
É possível perceber que há um núcleo comum entre os dois tipos em análise, consistente na 
perturbação da vítima. Isso está expresso na conduta típica do art. 147-A (perturbando sua esfera 
de liberdade ou privacidade) e implícito no crime de importunação sexual. 
 
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Trata-se, portanto, de um caso de conflito aparente de normas, porque há a possível 
incidência de mais de um crime para a mesma situação. A solução desse conflito se dá pela lógica do 
princípio da especialidade ou também o da absorção, porque um dos crimes é mais genérico do que 
o outro e também porque um dos crimes acabou sendo o meio para se atingir o fim que se buscava, 
que era a consumação do outro. Isso é, o crime de importunação sexual possui elementos 
especializantes que não são necessários para a tipificação da perseguição (nessa modalidade aqui 
analisada) e a perseguição acabou sendo apenas uma forma de se buscar a satisfação da lascívia do 
infrator. 
O caso posto no enunciado bem ilustra isso. A conduta do acusado até poderia caracterizar a 
perseguição, no caso em que ele apenas estivesse incomodando a vítima por várias vezes na estação 
ou vagão do metrô com a intenção de constrangê-la de algum modo. Isso foi por ele feito, conforme 
relatado por ela, ao apontar que havia semanas que o acusado ficava a procurando para falar de 
assuntos óbvios e a abordava acintosamente. Mas, a partir do momento em que essa perseguição é 
vista como um meio para atingir o fim de satisfação da lascívia, tem-se que eventual crime de 
perseguição que possa ter sido cometido pelo acusado vai estar totalmente absorvido pelo crime de 
importunação sexual, que era o seu verdadeiro fim com o comportamento anterior. 
Não seria necessário fundamentar a respeito, mas apenas a título de conhecimento, é 
interessante observar que faltam elementos para se pensar no crime de estupro (art. 213 do CP), 
principalmente porque não houve violência ou grave ameaça na conduta do réu e nem conjunção 
carnal ou ato libidinoso. A elementar violência/grave ameaça é afastada pelo fato de que a vítima 
sequer tinha percebido que o réu estava contra ela praticando a conduta. E o ato praticado por ele 
não chega a caracterizar ato libidinoso, porque apenas teria encostado o seu órgão sexual na vítima 
por cima de suas vestes. Está mais para a satisfação da própria lascívia, embora em alguns casos 
possa realmente chegar ao ponto de ser visto como uma violação apta a entender-se como o tipo 
objetivo do ato libidinoso. 
Por fim, e apenas para reflexão, é importante ressaltar que o crime do art. 215-A foi incluído 
no Código Penal em 2018 depois de um caso ocorrido no metrô de São Paulo, em que um homem 
ejaculou em uma mulher que estava no mesmo vagão que ele. Foi preso em flagrante e na sequência 
liberado, porque não se poderia tipificar o crime de estupro pela falta das elementares acima 
descritas. Na época, a única possibilidade jurídica era a tipificação na contravenção penal de 
importunação ofensiva ao pudor (art. 61 da LCP), a qual foi revogada pela lei que criou o crime de 
importunação sexual. 
É preciso se atentar às questões intertemporais. Portanto, para atos cometidos até Lei 
13.718/2018, aplica-se o art. 61 da CP, mesmo revogado, porque é mais benéfico ao réu. A aplicação 
de lei revogada se dá pelo princípio da continuidade normativo típica. Não houve revogação da 
incriminação, mas sim mero deslocamento do suporte normativo. 
ITEM 5: Fundamentação de agravantes/atenuantes ou majorantes/minorantes 
Não há causas de diminuição de pena. Não se aplicam ao caso as causas de aumento de pena 
previstas no inciso IV do art. 234-A do CP (gravidez, transmissão de doença, vítima idosa ou 
deficiente). 
 
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Era preciso fundamentar a incidência ou não da agravante do estado de calamidade, alegada 
pelo MP em seus memoriais. Sobre o tema, a jurisprudência do STJ se inclinou no sentido de que é 
necessária a demonstração do nexo de causalidade entre a condutaincriminada e o favorecimento 
que o estado de calamidade trouxe para o caso: 
5) A incidência da circunstância agravante da calamidade pública, prevista no art. 61, II, j, do 
Código Penal, exige demonstração concreta de que o agente se valeu do contexto da pandemia da 
covid-19 para a prática do crime. (STJ, JURISPRUDÊNCIA EM TESES, EDIÇÃO 180, ORIENTAÇÕES 
JURISPRUDENCIAIS SOBRE A COVID-19 III) 
Assim, como no presente caso não foi apontado em que medida o réu se valeu do ambiente 
de pandemia para praticar o delito, a agravante deveria ser afastada. Seria possível esse tipo de 
agravamento no caso de o infrator se valer de uma paciente em tratamento para praticar contra ela 
a conduta descrita no art. 215-A do CP (o que poderia ser feito por um médico ou enfermeiro, por 
exemplo). 
Não se aplica ao caso a agravante prevista no art. 61, II, alínea “f”, que se refere ao crime 
cometido com violência contra a mulher. A vítima no caso é mulher e o crime foi cometido por razões 
do gênero feminino, como reconhecido no mérito. Mas faltou o preenchimento da parte final do 
texto da lei na agravante, que diz que precisa ser “na forma da lei específica”. Essa agravante foi 
incluída pela Lei Maria da Penha e a lei específica é justamente ela, que busca maior proteção para 
as mulheres que sofrem algum tipo de violência no âmbito doméstico e familiar, o que não ocorreu 
no presente caso, dado que acusado e vítima não possuem esse vínculo de contato. Além disso, seria 
discutível se houve violência contra ela, no sentido próprio da palavra. 
ITEM 6: Fundamentação de concurso de crimes 
Trata-se de crime único porque a conduta do art. 215-A do CP foi praticada apenas uma vez, 
conforme as provas dos autos. Embora se pudesse pensar em uma continuidade entre os atos 
anteriores, é preciso se atentar que não houve denúncia neste sentido porque não foram 
apresentadas provas contundentes de que os atos anteriores pudessem caracterizar o presente 
crime e houve reconhecimento de absorção de possível crime de perseguição (art. 147-A) praticado 
anteriormente com as outras condutas. 
ITEM 7: Dispositivo 
Acolhimento integral do pedido. 
ITEM 8: Dosimetria 1 – cálculo da pena 
 O MP pediu nos memoriais a valoração negativa da culpabilidade, por questões 
relativas à violência de gênero contra a mulher. A questão é por demais interessante e merecia 
aprofundamento com suporte teórico na evolução do direito penal com perspectiva de gênero. O 
Brasil é signatário da CEDAW (Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação da 
mulher), adotada pela ONU em 1979 e incorporada em nosso ordenamento em 1994 sem reservas. 
Referida convenção traz a definição de discriminação contra a mulher: 
 
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Artigo 1º Para os fins da presente Convenção, a expressão “discriminação contra a mulher” 
significará toda a distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por objeto ou 
resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher, independentemente 
de seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e liberdades 
fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo. 
A partir desse suporte normativo e de outras importantes discussões de gênero que vêm 
sendo cada vez mais colocadas na agenda jurídica de todas as esferas de proteção de direitos 
humanos, inclusive o direito penal, tem-se construído um conjunto de novas regras protetivas 
específicas do gênero feminino. Exemplos disso é a Lei Maria da Penha e a criação do Feminicídio. 
A partir desse contexto geral, seria plenamente possível abordar com mais profundidade a 
conduta praticada pelo réu no caso concreto posto no enunciado, chegando-se à conclusão de que 
ele praticou o seu ato desprezando a mulher enquanto ser humano capaz de dotar-se da própria 
dignidade e escolha de seus interesses sexuais. Isso é, houve um completo desmerecimento pelo 
gênero feminino, colocado na conduta dele como mero objeto de obtenção do próprio prazer (tanto 
é que proferiu palavras de baixo calão como se fossem para agradar a vítima, supostamente a 
elogiando). 
Tudo isso poderia ser ponderado para a exasperação da culpabilidade. Mas seria 
imprescindível uma abordagem aprofundada e bem fundamentada na situação concreta, não 
bastando a mera alegação de que agiu contra uma mulher. No geral, esse tipo de conduta é 
realmente contra mulheres, bastando olhar como anda o noticiário a respeito. 
Outra circunstância que poderia ser negativa é a das consequências do crime, dado que foi 
mencionado que a vítima ficou profundamente abalada, entrou em estado depressivo, tem 
dificuldades para dormir e até hoje não conseguiu retornar ao trabalho. Tudo isso demonstra que a 
situação não foi uma simples passagem corriqueira em sua vida, mas sim um trauma que ainda não 
foi superado mesmo dois anos após o dia dos fatos. Usando fundamentação concreta neste sentido, 
não seria inviável a exasperação por conta desse fator, desde que apontado em que medida o abalo 
na vítima supera o que já é esperado e inerente ao tipo de crime que contra ela foi cometido. A título 
exemplificativo, o STJ tem considerado que: 
10) No estupro de vulnerável, o trauma psicológico que justifica a valoração negativa das 
consequências do crime (art. 59 do CP) é aquele cuja intensidade for superior à inerente ao tipo penal. 
(STJ, JURISPRUDÊNCIA EM TESES, EDIÇÃO 152, CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL II) 
Claro que poderia ser levado em conta que o caso não falou da existência de um laudo pericial 
apontando essa conclusão, o que pode deixar a margem de dúvida sobre a possibilidade ou não de 
se promover a valoração negativa. Em casos como os tais, é recomendável apoiar-se na 
fundamentação concreta (como no exemplo acima) e admitir que os fatos dados no enunciado estão 
provados, sendo exigido do seu avaliador apenas o exame das consequências jurídicas deles. Mas, 
caso o espelho aponte o contrário do que foi fundamentado na sua prova, aos recursos! Isso é algo 
que pode ser trabalhado em ambos os sentidos. 
Por fim, é sempre importante levar em conta que o comportamento da vítima nos crimes 
sexuais não poderá ser usado para favorecer o réu, devendo-se tomar muito cuidado com menções 
 
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a respeito das vestes da mulher ou de seu suposto comportamento convidativo. No caso, não houve 
qualquer referência neste sentido, o que facilita não incorrer no equívoco aqui mencionado. 
O crime em questão possui intervalo de pena de 1 a 5 anos e, considerando principalmente 
a questão concreta a respeito do abalo na vítima, seria proporcional a fixação de pena-base no 
patamar de 2 anos ou até um pouco mais, o que já seria a pena definitiva, porque não há 
circunstâncias de segunda ou terceira fases no caso. 
Não h á previsão de pena de multa. Não se pode afirmar que um espelho espere ou não que 
o candidato mencione esse fato na sentença, mas na dúvida é sempre pertinente acrescentar. O que 
não se pode fazer é condenar por multa onde a lei não prevê multa. Muito cuidado. 
ITEM 9: Dosimetria 2 – demais questões da individualização da pena 
Estão presentes os requisitos para a fixação do regime aberto. Não precisa falar em detração, 
porque não houve prisão processual e porque foi fixado o regime mais favorável. 
Porém, não seria recomendável a substituição da pena por duas restritivas de direitos. 
Embora não tenha havido violência ou grave ameaça, é de se observar que há 3 requisitos para a 
substituição no art. 44 do CP: 
I – pena até 4 anos sem violência/grave ameaça 
II – réu não reincidente em crime doloso 
III - art. 59 do CP (quase todo) indicarem que a substituição seja suficiente 
O réu preenche os dois primeiros requisitos. Mas com a sugestão de valoração negativa da 
culpabilidade no contexto de violência de gênero reconhecido na fundamentação, não fariasentido 
permitir a substituição afirmando que essa medida é socialmente suficiente. Interessante observar 
que a valoração negativa das consequências não afeta essa análise, porque não é uma vertente 
levada em conta no inciso III do art. 44 do CP. 
Deveria ser deferido ao condenado o direito de recorrer em liberdade (art. 387, §1º do CPP), 
porque já está solto e dado o regime inicial e a substituição, além de não ter havido pedido para 
prisão preventiva. 
ITEM 10: Efeitos da sentença, disposições finais e gerais e parte autenticativa 
Deve ser determinada a expedição de comunicação à vítima sobre a prolação da sentença 
(art. 201, §2º do CPP). 
Não há menção a pedido de reparação mínima. Deve a sentença apenas certificar o seu efeito 
de tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime (art. 91 do CP), mas sem fixação 
do valor mínimo da reparação por ausência de contraditório a tal respeito. 
Não há outros efeitos penais que se pudesse reputar importantes no caso. 
RESTITITUIÇÃO DE BENS: não houve menção a bens apreendidos, o que dispensa a 
manifestação a respeito. 
 
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Recomenda-se memorizar a parte que sempre se repete ao final da sentença, como 
intimação dos órgãos eleitorais, de identificação, estabelecimento de custas, determinação de guia 
provisória (se prisão antes do trânsito em julgado), guia definitiva após trânsito em julgado etc. 
Na parte autenticativa, colocar o “Publique-se. Registre-se. Intime-se. Cumpra-se” sem 
abreviaturas, caso não fique claro se tratar de processo eletrônico. Cuidado para não se identificar. 
Caso não haja instruções específicas, recomenda-se usar termos genéricos como: 
“Local. Data. 
Juiz Substituto”. 
SENTENÇA MODELO 
Sentença de exemplo, que não significa total acerto ou correção da técnica e escrita 
“[...] 
É o relatório. Decido. 
Inexistem preliminares e questões processuais pendentes. 
Presentes as condições da ação e os pressupostos processuais, passo ao exame do mérito. 
A materialidade do crime está comprovada pela firme declaração da vítima, bem como pelas 
imagens do metrô – que dão conta da confusão provocada após o cometimento do ato ilícito - e pelas 
declarações da testemunha ouvida em juízo (segurança da estação). 
A autoria delitiva também está comprovada pelo depoimento da vítima, pois as suas 
declarações são firmes e coerentes, tendo sido contundente em apontar o réu como o autor do fato, 
inclusive tendo procedido ao seu reconhecimento em juízo, por ocasião da audiência de instrução. As 
gravações do local do fato também comprovam a perseguição do réu pelos demais passageiros após 
a consumação da prática delitiva. O depoimento do segurança da estação também evidencia a 
autoria do réu, pois inquirido sobre os fatos explicou a dinâmica dos acontecimentos, tal como 
narrado na inicial, esclarecendo, ainda, pontos relativos à filmagem do local do delito. 
O depoimento do réu é dissociado das provas constantes dos autos. 
Assentadas a materialidade e a autoria, passa-se ao juízo de tipicidade, isto é, a subsunção 
dos fatos à norma. 
Convém destacar que não pairam dúvidas quanto aos fatos: o réu, no dia 10.03.2021, praticou 
ato libidinoso com a vítima REGILANE, com o objetivo de satisfazer a sua própria lascívia, sem a 
anuência daquela, pois aproveitou-se do fato de o vagão do metrô estar cheio, para aproximar-se da 
vítima e sussurrar-lhe palavras ao ouvido, mais precisamente a frase “como você é gostosa”, ao 
tempo em que esfregou a sua genitália – que estava para fora de sua vestimenta – nas nádegas da 
vítima. 
 
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Outrossim, o fato de o réu ter descido em duas estações anteriores ao seu trabalho denota a 
sua tentativa de escapar de eventual flagrante, pois evidente a sua intenção de fugir da vítima, que 
gritava pedindo ajuda aos demais passageiros para que ele fosse pego. 
Dessa forma, restando comprovado que o réu praticou contra a vítima – e sem o seu 
consentimento -, atos libidinosos para satisfazer a sua lascívia, impõe-se a subsunção dos fatos à 
norma típica prevista no art. 215-A do CP. 
A alegação da defesa, no sentido de inexistir qualquer elemento concreto acerca dos fatos não 
deve ser acolhida. É que em se tratando de crimes sexuais, prevalece na jurisprudência do STJ que a 
palavra da vítima tem especial relevância. Isso porque tais crimes são geralmente praticados às 
escondidas, de forma a dificultar sejam presenciados por testemunhas. 
Conforme mencionado acima, a vítima foi contundente em suas declarações, que são 
coerentes com os demais elementos de provas constantes dos autos. 
Não se há falar em desclassificação para o crime tipificado no art. 147-A do CP, uma vez que 
as condutas praticadas pelo réu não se subsumem ao tipo previsto na referida norma. Outrossim, 
resta evidente que a prática da conduta delitiva foi voltada para a finalidade de satisfazer a própria 
lascívia. 
O acusado era, na data do fato, imputável. O fato é típico, antijurídico e culpável. As provas 
dos autos são suficientes para sustentar o edito condenatório, razão pela qual a condenação do réu 
pelo crime previsto no art. 215-A é medida que se impõe. 
Inexistem circunstâncias atenuantes. Afasto a incidência da agravante do art. 61, II, j, do CP 
por entender que o réu não se aproveitou do contexto da pandemia para o cometimento da prática 
delituosa. 
Inexistem causas de aumento e de diminuição. 
DISPOSITIVO 
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal para condenar o réu 
DEMÉTRIO pela prática do crime previsto no art. 215-A do Código Penal. 
Passo à dosimetria da pena (CF, art. 5º, XLVI e art. 68 do CP) 
Quanto às circunstâncias judiciais (CP, art. 59) – denoto que a culpabilidade (reprovação da 
conduta) não deve ser valorada negativamente, pois normal à espécie. O dolo de satisfazer a lascívia 
já é abrangido pelo tipo penal. Valorar negativamente a conduta, tomando em consideração o 
desrespeito ao gênero feminino, configura bis in idem. O réu é primário e não ostenta maus 
antecedentes. Inexistem elementos para a valoração da conduta social (comportamento em 
sociedade) e de sua personalidade (modo de ser). Os motivos do crime são desconhecidos. As 
circunstâncias são comuns aos delitos da espécie. As consequências do crime (repercussão do fato) 
são graves, considerando que influíram negativamente na vida e na saúde mental da vítima, que foi 
diagnosticada com depressão, toma remédios pra dormir e pediu demissão do emprego. O 
comportamento da vítima em nada colaborou para a prática delitiva. 
Forte em tais circunstâncias, fixo a pena-base em 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão. 
 
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Inexistem atenuantes e agravantes, razão pela qual não há alteração na pena intermediária. 
Inexistem causas de aumento e de diminuição 
Fixo a pena definitiva em 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão. 
Deixo de proceder à detração, pois o réu esteve solto durante a instrução. 
Fixo o regime inicial aberto para o início do cumprimento da pena (CP, art. 33, §2º, c). 
Deixo de substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direito por reputar que a 
prática delitiva violou a saúde mental da vítima. 
Suspendo a execução da pena, pelo período de 4 anos (CP, art. 77), período durante o qual o 
condenado ficará sujeito à observação e ao cumprimento das seguintes condições (CP, art. 78): 
a) No primeiro ano da suspensão, limitação de fim de semana, na forma do art. 48 do CP 
b) No tempo restante: comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para 
justificar as suas atividades (CP, art. 78, §2º, c) 
Deixo de fixar indenização mínima à, porquanto inexistente pedido nesse sentido (CP, art. 387, 
IV). 
Concedo ao réu o direito de apelar em liberdade. 
Condeno o réu ao pagamento das custas (CPP, art. 804). 
Comunique-se à vítima. 
Após o trânsito em julgado: 
Oficie-seao TRE, para fins do art. 15, III, da CP e art. 71 do Código Eleitoral 
Expeça-se guia de execução penal, a fim de que a Vara de Execução Penal fiscalize as condições 
impostas nesta decisão. 
Arquivem-se os autos, com as baixas e anotações necessárias. 
P. R. I. 
Juiz de Direito Substituto” 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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18 
 
https://www.youtube.com/watch?v=ZAHKK8OGz8o
 
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19 
 
https://thalesleao.com.br/setenciando-como-juiz/

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