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resenha filme os mizeraveis

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1 
 
 
 
RESENHA DO FILME “OS MISERÁVEIS” 
 
Gabriela Galdino da Costa
*
 
 
1 REFERÊNCIA DA OBRA EM ANÁLISE 
 
OS MISERÁVEIS. Roteiro de Victor Hugo adaptado por Rafael Yglesias, direção de Bille 
August, produção de James Gorman e Sarah Radclyff. EUA: 1998. 1 DVD (131 min); Filme-
vídeo; NTSC, son., color., Legendado. Port. 
 
 
2 APRESENTAÇÃO DO AUTOR 
 
Nascido em 1802, o francês Victor-Marie Hugo foi um ativo defensor dos direitos 
humanos na França. Sua infância passou-se em meio a importantes eventos históricos, entre 
eles, a ascensão do império napoleônico, de maneira que a divergência das forças políticas 
que lutavam pela supremacia francesa era refletida na oposição de ideais políticos e religiosos 
de sua própria família. O pai, oficial de posição respeitada no exército de Napoleão, mostrava-
se ferrenho defensor do imperador, por outro lado, a mãe era uma católica radical, defensora 
da Casa Real, e acredita-se que tenha sido amante de um general executado por tramar contra 
Napoleão. 
Enquanto Victor Hugo era ainda criança, os pais separaram-se temporariamente, 
ficando sua educação e formação sob responsabilidade da mãe. Como resultado, as primeiras 
obras do autor emitem uma devoção ao rei e à fé. Somente após os eventos que culminaram 
na Revolução de 1848, ele passou a questionar sua educação católica e monarquista, 
dedicando-se a exaltar o republicanismo e o livre pensamento. 
Na década de 30, Victor Hugo começou um romance acerca da miséria e 
desigualdade social da França, mas a obra só foi publicada em 1862. Inicialmente, a editora 
belga Lacroix and Verboeckhoven publicou apenas a primeira parte da novela, intitulada 
“Fantine” – lançada simultaneamente em Leipzig, Bruxelas, Milão, Roterdã, Varsóvia, Rio de 
 
*
 Graduanda em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. gabggcosta@gmail.com 
mailto:gabggcosta@gmail.com
 
2 
 
Janeiro e Paris. Os estoques esgotaram-se em poucos dias, só em Paris 7 mil exemplares 
foram vendidos em 24 horas. Empática às massas, “Os Miseráveis” segue até hoje sendo a 
obra mais popular de Victor Hugo, recebendo adaptações no cinema, televisão, teatro e em 
musicais. 
Diante disso, em 1998, Rafael Yglesias adaptou o livro para o cinema, seu roteiro 
somado à direção acadêmica do dinamarquês Bille August enfatizou núcleos e teses para os 
quais os escritos originais de Victor Hugo atribuíram igual importância. 
 
 
3 PESPECTIVA TEÓRICA DA OBRA 
 
No final do século XVIII a França iniciou um processo de transformação que 
modelou as estruturas das modernas sociedades mundiais. A revolução Francesa e as de 1830 
e 1848, em Paris, apresentaram novas ideologias que se expandiram por diversas 
nacionalidades e contribuíram para que estas conquistassem suas independências e 
derrubassem regimes políticos já desgastados, substituindo-os por outros mais justos, voltados 
para a liberdade de suas populações. 
Nesse sentido, até hoje os, assim reconhecidos, heróis nacionais – tais quais Carlos 
Magno, Luis XIV, Napoleão, por exemplo – permeiam o imaginário das nações. Os poetas e 
romancistas que retrataram essa época são igualmente lembrados mundialmente – é o caso de 
Chateaubriand e Victor Hugo. 
Contudo, apesar dos momentos de glória, a sociedade francesa enfrentou diversas 
dificuldades econômicas e calamidades ao longo de sua trajetória histórica. No final do século 
XIX, a instabilidade política, unida à “má industrialização”, disseminou o sofrimento da 
população, provocado pela fome, miséria, alto índice de criminalidade, desemprego, 
prostituição, crise econômica e social. Devido a isso, eclodiram diversas revoltas civis, que 
mobilizavam uma grande quantidade de pessoas, independente de classe social. 
Sendo assim, “Os Miseráveis” aborda criticamente o sofrimento de boa parte da 
população francesa, ao longo do século XIX, exibindo a miséria e os antagonismos políticos 
do período. Insere o sofrimento e os preconceitos, pelos quais passavam os que eram 
excluídos socialmente, em um contexto de revoluções civis que repercutiam em todos os 
aspectos da sociedade. Segundo Robb, a obra pode ser descrita como “(...) um drama social e 
 
3 
 
histórico do século XIX, um enorme espelho que refletia a raça humana, capturada num 
determinado dia de sua enorme existência.” (2000, p. 362). 
 
 
4 BREVE SÍNTESE DA OBRA 
 
Segundo a versão de 1998 – a sexta editada para o cinema – que, em geral, mostra-se 
fiel à obra de Victor Hugo, ao cumprir 19 anos de trabalhos forçados nas galés por ter furtado 
comida, Jean Valjean (Liam Neeson) sai da prisão levando consigo um novo documento de 
identificação. Este carregava, na cor e na mensagem escrita, a notável intenção de mostrar 
para a sociedade que ali havia um homem temível. Em busca de abrigo e comida, o 
protagonista é ajudado por um bispo que lhe dá alimento e o recebe em sua própria residência. 
Contudo, externando rancor e ódio da lei, da sociedade, do sistema e, por 
conseguinte, da humanidade, Valjean leva a prataria da casa e agride seu protetor. Capturado 
pela polícia, alega ter sido presenteado pelo bispo, que, inesperadamente, confirma a falsa 
história. A benfeitoria do clérigo é vista como uma nova oportunidade para o galé, que volta a 
crer na bondade humana e promete “tornar-se um novo homem”. 
Anos depois, sob nova identidade, torna-se dono de uma fábrica de tecidos e prefeito, 
assim, sua vida segue pacata, até que o inspetor Javert (Geoffrey Rush) – antigo guarda da 
prisão, seguidor obsessivo e inflexível da lei – suspeita que o prefeito seja, na verdade, um ex-
prisioneiro. Surge, então, a personagem Fantine (Uma Thurman), uma das empregadas da 
fábrica de Valjean, que, após perder o emprego e tendo que manter uma filha, cuidada à 
distância por terceiros, passa a se prostituir e acaba sendo presa. Valendo-se da lei que lhe 
garante autoridade, Jean a liberta e a acolhe em sua casa. 
Adiante, a fim de livrar um acusado que seria preso em seu lugar, Jean Valjean, 
sente-se obrigado a revelar sua identidade, feito isso, Javert passa a persegui-lo 
incansavelmente. Nesse meio tempo, Fantine morre, e sua filha, Cosette (Claire Danes), é 
resgatada e cuidada por Valjean, que foge e esconde-se de seu algoz durante anos. 
Ao longo da obra, Valjean tem mais de uma oportunidade de matar o inspetor e não o 
faz, por fim, o próprio Javert comete suicídio, tomado por uma confusão mental, visto que, 
embora acreditasse intimamente que o ex-prisioneiro merecesse a liberdade, sentia-se na 
obrigação de cumprir a lei a qualquer custo. 
 
 
4 
 
 
5 PRINCIPAIS TESES DESENVOLVIDAS NA OBRA E REFLEXÕES CRÍTICAS 
 
As primeiras representações do filme “Os Miseráveis” remetem ao cinema mudo, em 
1897, posteriormente, novas adaptações foram feitas, levando a obra a mais de 42 países. A 
versão mais recente é de origem britânica, foi lançada em 2012, a fim de comemorar os 25 
anos do musical “Les Misérables”. Como visto, o enredo relata a história de Jean Valjean, 
abordando questões sociais, morais, sentimentais e jurídicas. 
Acerca dos personagens do filme, entende-se que os protagonistas enquadram-se 
todos como vítimas, daí o título autoexplicativo da obra, que apresenta várias faces da miséria 
humana, seja a miséria propriamente dita, referente à pobreza (miséria material), seja a 
miséria de valores sociais e de humanidade (miséria espiritual). Valjean, Fantine e Cosette 
surgem como vítimas de uma sociedade atroz, da desigualdade e do sistema opressor. Já o 
policial Javert, sob a égide inexorável de seus princípios, figura como vítima da limitação a 
ideais que o prendem ao cumprimento da lei, ainda que esta se mostre contrária ao seu senso 
de justiça – justamente por isso, sufocado pelas consequências emocionais de seus atos, 
comete suicídio. 
A história do filme possui aspectos atemporais,despertando questões a respeito do 
sistema penal aplicado, hoje, no Brasil, por exemplo. Na época em que se passa a obra, o réu 
não era sujeito, mas objeto da ação, tanto que o prisioneiro recebia um número de 
identificação para substituir o seu nome. O objetivo era anular a identidade do homem, 
enquanto cumpria pena, e sua dignidade, quando voltava a ser “livre”. 
Além do mais, não havia preocupação, nem por parte do sistema prisional, nem por 
interesse público, em reinserir o preso na sociedade. Pelo contrário: ao sair da prisão, adquiria 
um documento informando que se tratava de um homem perigoso, logo, dificilmente 
conseguiria emprego e se conseguisse, receberia menos do que os demais, por ser um ex-
condenado. Deixar a prisão significava receber “libertação”, mas não a restituição da 
“liberdade”, visto que se continuava prisioneiro da mácula da condenação. 
No filme, nota-se ainda que o protagonista desenvolve, durante o tempo em que ficou 
preso, uma personalidade agressiva, fundamentada no rancor, no ódio à lei e à sociedade e na 
descrença em existência de bondade humana. Dessa forma, após 19 anos de prisão, o 
inofensivo jovem, preso por furtar pães, tornara-se, de fato, um homem temível. 
 
5 
 
Sabe-se que na França do século XIX, quando se passa o filme, o Direito vigente 
exigia o cumprimento da lei a qualquer custo – caráter evidenciado pelas atitudes do 
personagem Javert. O sistema pregava a perseguição dos miseráveis por pequenos crimes, 
infrações que a sociedade não via como leves e que, portanto, justificavam penas rigorosas. 
Mecanismos de balanceamento de direitos não existiam, por isso, a gritante 
desproporcionalidade entre o delito cometido e a pena aplicada. Princípios atuais da 
insignificância, da proporcionalidade e da responsabilidade social eram constantemente 
violados. 
Ademais, a brutalidade da pena que buscava destruir o homem, se não fisicamente, 
psicologicamente, ou socialmente, atingia o que hoje temos por “Princípio da Dignidade da 
Pessoa Humana”. Como visto, Jean Valjean, ao sair da prisão, além de sofrer com a miséria 
material, viu-se impotente e inflexível diante de sua desgraça, condenado a uma pena perpetua 
e cruel – o julgamento alheio. 
Embora o Direito Penal tenha sofrido grandes modificações, desde a época em que se 
passa o enredo do filme até a atualidade, o princípio da insignificância, por exemplo, ainda 
encontra oposição daqueles que acreditam ser este um estimulo ao descumprimento das leis. 
Consequentemente, por vezes, o desprezo a esse princípio fere o binômio liberdade-dignidade 
humana. 
No Brasil, a pena deve ser aplicada levando-se em consideração os princípios de 
proporcionalidade, racionalidade e intervenção mínima, de modo que “a criminalização de 
uma conduta só se legitima se constituir meio necessário para a proteção de determinado bem 
jurídico” (BITENCOURT, 1997, p.45), tendo por “bem jurídico”, “bens ou valores mais 
consistentes da convivência humana em condições de dignidade, que merecem a máxima 
proteção jurídica, cuja outorga é reservada às prescrições do Direito Penal” (NAVARRETE, 
1981, apud PRADO, 1996, p.36). 
Contudo, na prática, o sistema de julgar, condenar e penalizar vem se mostrando 
falho. A ideia é obter na pena um caráter ressocializador, mas na maior parte dos casos, o 
indivíduo até aprende as regras e leis, chegando inclusive a decorar os dispositivos, mas não 
assimila que ao cometer um crime, não está somente descumprindo uma norma, mas fazendo 
um mal a alguém. Logo, ao invés de assegurar que o apenado compreenda a importância de 
ser honesto e agir corretamente, por meio da percepção do malefício causado por seus atos, a 
mão punitiva do Estado vem simplesmente eliminando do convívio social o que não é 
 
6 
 
legalmente e moralmente aceito. Para tanto, Antonio García-Pablos de Molina manifesta-se, 
afirmando que: 
 
A pena não ressocializa, mas estigmatiza, não limpa, mas macula, como tantas vezes 
se tem lembrado aos expiacionistas: que é mais difícil ressocializar a uma pessoa 
que sofreu uma pena do que outra que não teve essa amarga experiência; que a 
sociedade não pergunta por que uma pessoa esteve em um estabelecimento 
penitenciário, mas tão-somente se lá esteve ou não. (MOLINA, 1988, apud, 
BITENCOURT, 2000, p. 5) 
 
Diante disso, análogo ao que ocorre com Valjean, o corpo social da atualidade, em 
sua maioria, também demonstra rejeição àqueles que já cumpriram penas. Sendo assim, 
muitas vezes, desprovidos de qualificação e privados de oportunidades, os ex-condenados 
voltam a cometer crimes. Em “Os Miseráveis”, a boa ação do bispo provoca em Jean um 
processo de “reumanização”, deixando clara a ideia de que o homem pode mostrar-se bom e 
virtuoso, quando a sociedade deixa de lhe vedar oportunidades. 
Nesse aspecto, é pertinente lembrar a Escola Penal de Nova Defesa Social – o estudo 
da evolução dos ideais, baseado no Iluminismo de Beccaria, busca explicar e fundamentar as 
tendências atuais da “política criminal alternativa”. Em suma, o objetivo é passar da pena 
estritamente punitiva à ressocialização, no sentido de humanizar o Direito Penal. 
Também numa visão humanizada do Direito, cabe citar Beccaria em “Dos delitos e 
das penas” (BECCARIA, 1983), quando o autor sugere o que no futuro viria a ser o princípio 
da insignificância: "a exata medida dos crimes é o prejuízo causado à sociedade". Nesse 
contexto, a aplicação sistemática do princípio da insignificância é útil até para suavizar o 
pensamento do senso comum, que não é de todo errado, de que o sistema judiciário só 
funciona com os crimes de baixa relevância e seus autores miseráveis. 
Analisando outro importante aspecto, a obediência cega à norma e a necessidade 
absoluta de cumprir a lei – evidenciada no filme pela figura de Javert – põe em conflito o 
caráter normativo e o axiológico. A visão estritamente positiva do personagem o lançou em 
um dilema que findou causando sua morte: cumprir o dever normativo, nem sempre é o 
correto, visto que o que é “legal” pode não ser “justo”. Assim como Javert, muitos juristas 
contemporâneos desconsideram a impossibilidade de a lei abranger todos os casos. No auge 
de sua confusão de ideais, percebendo que o “irracional” seria justamente seguir o “racional” 
– quando entregar Valjean seria ingratidão e deixá-lo livre, uma desonra ao seu dever de 
policial – o inspetor Javert vê na morte a única solução para um conflito que segue debatido 
até hoje. Frente a essa reflexão, o professor Benedito Cerezzo Pereira Filho defende 
brilhantemente e de forma objetiva: 
 
7 
 
 
Desde a antiguidade é inquirido sobre o que seria melhor: leis justas aplicadas por 
homens injustos ou, leis ainda que injustas, aplicadas por homens justos. 
Evidentemente, o ideal é ter leis justas e homens justos. Porém, na impossibilidade, 
o bom senso e a coerência levam a optar por homens justos, capaz de lapidarem a lei 
injusta. (1999, p.179). 
 
Mais do que isso, a semelhança entre a obra e a realidade, sobretudo, brasileira 
desperta questionamentos acerca de “qual o perfil da sociedade excluída na França do século 
XIX?” e “quem é preso no Brasil atual?”. O primeiro remete à profunda análise social de 
Victor Hugo, remonta o resultado do êxodo rural em direção aos aglomerados urbanos, que 
engrossou a massa de assalariados submetidos a extensas jornadas de trabalho e baixas 
remunerações, disseminando a miséria. Apesar disso, havia também nobres, burgueses, 
camponeses – a sociedade pós-Revolução apresentava-se em classes bem definidas, nas quais 
cada um encaixava-se de acordo com sua posição econômica. 
Dessa forma, delitos como o de Jean Valjean, roubo e furto de comida, eram comuns 
à época e punidos severamente. Tão deprimente quanto recorrer a atos ilícitos para sobreviver, 
o caráter miserável da mulher francesa – sem trabalho, vendo a pobreza e a fome recair sobre 
suas famílias,aguentando diariamente injurias e ofensas em troca de subsistência – 
materializava-se na figura da prostituta, exemplificada na obra pela personagem Fantine. 
Assim sendo, a segregação fez com que se apoiasse o desejo de “limpeza social”, realizando-
se o máximo de esforços para retirar do convívio popular aqueles que não se encaixavam nos 
padrões desejados pela classe dominante. 
Diante do exposto, as condições sociais presentes no filme assemelham-se muito às 
encontradas, hoje, no Brasil. De fato, eram outros tempos, mas o desequilíbrio ainda segue o 
mesmo. Retornando à questão sobre “quem são os presos brasileiros?”, notavelmente, os 
presídios nacionais são lotados, em sua maioria, por jovens negros, pobres e 
semialfabetizados – muitos dos quais são mantidos presos por meses, e até anos, devido a 
crimes pouco ofensivos, alguns, inclusive, por furto famélico, à semelhança do caso de 
Valjean. A lógica é a mesma da França de XIX: esconder o lado mais desprezível e egoísta da 
sociedade, por meio da exclusão irresponsável de seus mais famigerados “miseráveis”. 
Reunindo os principais aspectos destacados no filme, em uma perfeita interpretação 
da obra, Hauteville House comenta na abertura da versão original do livro, em 1862, tendo 
sua percepção reeditada até hoje, em algumas das versões mais atualizadas: 
 
 
8 
 
Enquanto, por efeito de leis e costumes, houver proscrição social, forçando a 
existências em plena civilização, de verdadeiros infernos, e desvirtuando, por 
humana fatalidade, um destino por natureza divino; enquanto três problemas do 
século – a degradação do homem pelo proletariado, a prostituição da mulher pela 
fome, e atrofia da criança pela ignorância – não forem resolvidos; enquanto houver 
lugares onde seja possível a asfixia social, em outras palavras, e de um ponto 
de vista mais amplo ainda, enquanto sobre a terra houver ignorância e miséria, livros 
como estes não serão em vão. (HAUTEVILLE HOUSE in HUGO, Victor. Os 
Miseráveis. São Paulo: Cosac & Naif, 2002.) 
 
 
6 REFERÊNCIAS 
 
BECCARIA, Cesare Bonesana. Dos delitos e das penas. São Paulo: Hemus, 1983. 
 
BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de Direito Penal – Parte Geral. 4 ed. São Paulo: 
Revista dos Tribunais, 1997. 
 
BITENCOURT, Cezar Roberto. Novas penas alternativas: análise político-criminal das 
alterações da Lei n. 9.714/98. 2 ed. São paulo: Saraiva, 2000. 
 
HUGO, Victor. Os Miseráveis. São Paulo: Cosac & Naif, 2002. 
 
PEREIRA FILHO, Benedito Cerezzo. Pressupostos teóricos para a efetividade material da 
tutela executiva (dissertação). Curitiba: UFPR, 1999. 
 
PRADO, Luiz Regis. Bem jurídico-penal e Constituição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 
1996. 
 
ROBB, Graham. Victor Hugo, uma biografia. São Paulo: Record, 2000.

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