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PRÁTICA PENAL OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM > Identificar o momento processual e os prazos para resposta à acusação. > Apontar os argumentos que podem fazer parte da resposta do acusado. > Explicar as hipóteses legais de julgamento antecipado e absolvição sumária. Introdução A resposta à acusação está prevista nos arts. 396 e 396-A do Código de Processo Penal (BRASIL, 2017) e pode ser traduzida como a primeira oportunidade que o acusado tem de, de forma formal e escrita, apresentar todos os elementos ne- cessários à sua defesa. Após o recebimento da denúncia, o juiz, não absolvendo o réu sumariamente, deverá citá-lo para que apresente, no prazo de dez dias, a sua resposta. Na resposta à acusação, o acusado poderá arguir preliminares, oferecendo documentos e justificações, especificando as provas pretendidas, arrolando testemunhas qualificadas e, quando julgar conveniente, requerendo a intimação das testemunhas. Com as alterações legislativas decorrentes do advento da Lei n° 11.719, de 20 de junho de 2008 (BRASIL, 2008), o art. 396 do Código de Processo Penal sofreu modificações, passando a permitir, de forma expressa, nos procedimentos ordinário e sumário, a resposta à acusação por parte da defesa do réu. Além de permitir a defesa inicial do denunciado, a nova redação legislativa inovou o ordenamento jurídico pátrio, permitindo a absolvição sumária do acusado nos casos em que estiver presente excludente da ilicitude ou da culpabilidade, nas hipóteses em que o fato não constitui crime ou, ainda, quando extinta a punibilidade do agente. Isso permite o julgamento antecipado do caso penal por meio da absolvição sumária Resposta à acusação Karoline Freire do agente, que pode ser realizada antes da citação do réu ou por meio de pedido proposto na resposta à acusação. Neste capítulo, você vai conferir o momento processual e os prazos para resposta à acusação. Além disso, vai verificar alguns dos argumentos que podem fazer parte da resposta do acusado. Por fim, você vai conferir as hipóteses legais de julgamento antecipado e absolvição sumária do acusado. Momento processual e prazos para resposta à acusação Nos termos do art. 394 do Código de Processo Penal (BRASIL, 2017), a partir da redação da Lei nº 11.719, de 20 de junho de 2008 (BRASIL, 2008), o procedi- mento penal pode ser comum ou especial. No procedimento comum, os ritos se classificam em: ordinário, sumário e sumaríssimo; a este último, estão reservadas as infrações de menor potencial ofensivo a partir do regimento da Lei nº 9.099, de 1995 (PACELLI, 2019). Para compreender o momento de proposição da resposta à acusação de forma clara, faz-se necessário conhecer os diferentes ritos do processo penal. Nesse sentido, entre as mais salutares alterações introduzidas nos ritos ordinário e sumário, destacam-se a inserção do interrogatório como meio de defesa ao final da instrução e a apresentação de resposta escrita da defesa no prazo de dez dias após a citação do acusado (PACELLI, 2019). No que diz respeito ao Tribunal do Júri, rito especial do processo penal, houve disposição, expressa por meio do art. 394, §3º, do Código de Processo Penal (CPP), em relação à especialidade do tratamento procedimental, que deve observar as disposições relativas aos arts. 406 a 497 do CPP (BRASIL, 2008). O art. 394, §4º, do CPP indica que os procedimentos nos arts. 395, 396 e 397 serão aplicados a todos os processos de primeira instância, com ressalva, ainda que sem a expressa referência na legislação, aos ritos nos Juizados e no Tribunal do Júri, que têm regramentos próprios. Nesse sentido, o art. 394, §4º, do CPP diz o seguinte: “[...] as disposições dos arts. 395 a 398 deste Código aplicam-se a todos os procedimentos penais de primeiro grau, ainda que não regulados neste Código” (BRASIL, 2008, p. 5). Logo, o que esse dispositivo legal exige é que todo procedimento passe a contemplar a resposta escrita, trazida no art. 396 do CPP (PACELLI, 2019). De acordo com Pacelli (2019, p. 705): Na realidade, o anteprojeto originário previa referida resposta antes do recebimen- to da denúncia, daí justificar-se a norma que remete a todos os procedimentos, comuns ou especiais (ressalvado o sumaríssimo e o do júri, com regras próprias). Resposta à acusação 2 Não há incompatibilidade, na medida em que se sabe que os procedimentos não se encerram naquela fase. É dizer, oferecida a resposta escrita, cada procedimento especial seguirá as suas regras. A Lei nº 11.719, de 20 de junho de 2008, inovou no sentido de que passou a: (a) possibilitar a rejeição imediata da denúncia ou queixa, por inépcia ou ausência de pressupostos processuais ou, ainda, por condições da ação, incluindo-se, aqui, a justa causa, conforme o art. 395 do CPP; (b) indicar o recebimento da denúncia ou queixa e citação do réu para apresentação de defesa escrita, denominada resposta à acusação, no prazo de dez dias, conforme expressa a disposição do art. 396 do CPP; e (c) possibilitar a absolvição sumária do acusado, fundada em atipicidade manifesta, excludente da ilicitude e/ou da culpabilidade e extinção da punibilidade, regra do art. 397 do CPP (PACELLI, 2019). O legislador, na redação do art. 396 do CPP, indicou a apresentação de resposta à acusação, de maneira expressa, para os ritos ordinário e sumário (BRASIL, 2008). O rito ordinário ocorrerá nos casos em que a sanção máxima cominada para o objeto crime for igual ou superior a quatro anos de pena privativa da liberdade. Já o rito sumário ocorrerá quando o objeto crime tiver sanção máxima cominada inferior a quatro anos. Pode-se afirmar que, por regra do processo penal, salvo disposição contrária no Código de Processo Penal ou por meio de legislação especial, será adotado o procedimento comum nos demais processos, conforme o disposto no art. 394, §2º, do CPP (BRASIL, 2008). Então, o procedimento ordinário ocorre da seguinte forma: oferecida a denúncia ou queixa, o magistrado poderá rejeitá-la, por meio de liminar, quando for manifestamente inepta, faltar pressuposto processual ou con- dição para o exercício da ação penal e nas hipóteses de ausência de justa causa para o exercício da ação penal (PACELLI, 2019). Caso não o faça, após a denúncia ou queixa, e recebida a denúncia pelo juiz, o réu é citado para apresentar resposta à acusação, por escrito, no prazo de dez dias, de acordo com a regra estabelecida no art. 396 do CPP (BRASIL, 2008). Assim, completa- -se a formação regular do processo, com o objetivo de que o acusado possa exercer o contraditório (RANGEL, 2014). A resposta à acusação inovou o ordenamento jurídico processual penal, uma vez que passou a possibilitar que o réu, logo após a citação, demonstre, com documentos e justificações, o desacerto da acusação, da mesma forma que possibilita a especificação das provas que a defesa pretende utilizar na instrução e o arrolamento de testemunhas (RANGEL, 2014). Resposta à acusação 3 Conforme regra expressa no art. 396 do CPP, para resposta à acusação, adota-se o prazo de dez dias. Contudo, a legislação processual penal trouxe algumas disposições em relação à matéria. Na hipótese de a resposta à acu- sação não ser oferecida dentro do prazo estipulado pela Lei ou de o acusado citado não constituir defensor, o juiz nomeará um defensor para oferecer a resposta à acusação. Conforme Tourinho Filho (2011, p. 248): A resposta do réu é obrigatória. Ela é mais que a contestação cível. Estando em jogo o direito de liberdade, exige a lei que o réu “conteste” a peça acusatória, pois, em face dos argumentos invocados, o Juiz pode proceder a um julgamento antecipado, absolvendo-o sumariamente. Mesmo que o réu não o faça, o Juiz nomear-lhe-á defensor para tal fim. O §2º do art. 396-A defende, ainda, que o prazo de dez dias é reservado para os casos em que a citação ocorrer pessoalmente; ou seja, é inaplicável para casos de citação realizada via edital ou por hora certa. Dessa forma, apenas quandoo réu for citado pessoalmente e não apresentar resposta à acusação é que o juiz poderá proceder com a nomeação de um defensor para realizar a defesa técnica e dar andamento ao processo. Caso contrário, haverá a aplicação do art. 366 do CPP, que suspende o processo e a prescrição até que o réu seja encontrado e citado (LOPES JUNIOR, 2014). O parágrafo único do art. 396 do CPP indica que, nos casos em que a citação se der por edital, o prazo para a defesa começará a fluir a partir do comparecimento pessoal do acusado ou do defensor constituído (BRASIL, 2008). Logo, uma vez citado o réu via edital, o processo deverá ser suspenso, assim como o curso do prazo prescricional, nos termos do art. 366 do CPP. Portanto, quando não apresentada defesa, o juiz deverá aplicar o art. 366 do CPP. Se, a partir deste instante, o acusado nomear defensor, será dado andamento ao processo, com a reabertura do prazo para apresentação de resposta à acusação pela defesa (PACELLI, 2019). O réu não é mais citado para comparecer em juízo, como ocorria antes do advento da Lei nº 11.719, de 20 de junho de 2008, mas sim para apresentar resposta escrita, seja pessoalmente ou por edital, ao ato citatório (PACELLI, 2019). Além do rito ordinário, o legislador requer a apresentação da resposta à acusação, conforme redação do art. 396 do CPP, para aplicação no rito sumário (BRASIL, 2008). O rito sumário é aplicado aos crimes cuja pena — privativa Resposta à acusação 4 de liberdade — máxima cominada seja inferior a quatro anos, de acordo com o que dispõe o art. 394, §1º, II, do CPP, e completa o procedimento comum, com ressalva à competência dos Juizados Especiais, para os quais o rito é o sumaríssimo, regra do art. 394, §1º, III, do CPP (BRASIL, 2008). No que tange à resposta à acusação, a configuração do rito sumário vale- -se da aplicação das regras dos arts. 395 a 397 do CPP, por força do que está posto no art. 394, §4º, do CPP, ou seja: (a) hipóteses de rejeição da denúncia, conforme o art. 395; (b) recebimento da denúncia ou queixa e citação do acusado para apresentação de resposta à acusação de forma escrita, no prazo de dez dias, regra de idêntica aplicação ao rito ordinário, conforme o estabelecido no art. 396 do CPP; (c) e hipóteses de absolvição sumária, segundo o que impõe o art. 397 do CPP (PACELLI, 2019). Com ressalvas às disposições que diferenciam os ritos ordinário e sumário, as quais não abrangem a matéria da resposta à acusação, aplica-se a regra do art. 394, §5º, do CPP, que indica que se aplicam subsidiariamente ao rito sumário as disposições do procedimento ordinário. Dessa forma, o momento da apresentação e o prazo da resposta à acusação são os mesmos aplicados ao rito ordinário no rito sumário (BRASIL, 2008). Momento do recebimento da resposta à acusação: dicotomia entre a interpretação dos arts. 396 e 399 do Código de Processo Penal Diante da redação da Lei nº 11.719, de 20 de junho de 2008, pode surgir uma dúvida vinculada com o momento em que o juiz recebe a denúncia ou queixa, uma vez que o art. 396 afirma que o juiz, não rejeitando liminarmente a acu- sação, receberá a denúncia e ordenará a citação do acusado com o objetivo de que este responda à acusação. A questão é que o art. 399 menciona, no- vamente, o ato de receber a denúncia ou queixa, o que pode gerar a dúvida: quando ocorre o recebimento da denúncia ou queixa? (LOPES JUNIOR, 2014). A “mesóclise da discórdia”, fazendo menção à expressão “recebê-la-á”, presente no art. 396, não constava no Projeto de Lei nº 4.207, de 2001, que desenhava uma fase intermediária, de modo que a admissão da acusação somente ocorreria após o oferecimento da defesa. Era um “[...] prévio juízo de admissibilidade da acusação, para dar fim aos recebimentos automáticos de denúncias infundadas, inserindo um mínimo de contraditório nesse importante momento procedimental” (LOPES JUNIOR, 2014, p. 954). No entanto, foi inserida a mesóclise “recebê-la-á” no texto do art. 396 do CPP, o que gerou uma dicotomia de interpretação em conjunto com o art. 399 Resposta à acusação 5 do CPP. Com isso, o recebimento da denúncia é imediato e ocorre segundo o art. 396. Esse é o marco interruptivo da prescrição e demarca o início do processo, que se torna completo com a válida citação do réu, de acordo com o art. 363 do CPP. Portanto, o réu é citado nesse momento para apresentar resposta à acusação e, em momento futuro, intimado para audiência de instrução (LOPES JUNIOR, 2014). Quanto ao art. 399, ele nada mais faz do que remeter ao recebimento an- terior, sendo a expressão “recebida” desnecessária. Todavia, uma vez estando posta no texto processual penal, essa expressão deve ser interpretada como uma remissão ao recebimento já realizado, conforme o art. 396 do CPP, e não como uma nova decisão (LOPES JUNIOR, 2014). Argumentos que podem fazer parte da resposta do acusado Conforme já mencionado, a resposta à acusação deve ser feita no prazo de dez dias, sendo o momento que a defesa tem de requerer toda diligência que entenda importante para o acusado. Na resposta, o acusado poderá arguir preliminares, oferecer documentos e justificações, especificar provas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, de acordo com o disposto no art. 396-A do CPP (BRASIL, 2008). Se não for apresentada resposta à acusação, o magistrado ordenará a nomeação de um defensor para o acusado. Portanto, percebe-se que não se trata de um elemento facultativo no curso do processo penal. Nesse momento, alguns ônus temporais são impostos à defesa, sob pena de preclusão. É o que ocorre em algumas matérias, como, por exemplo, exceção de incompetência relativa — a de natureza absoluta pode ser arguida a qualquer tempo —, e com a prova testemunhal. O denunciado na resposta à acusação deve apresentar o rol de testemunhas e fazer o requerimento de prova pericial (PACELLI, 2019). A prova documental, de modo genérico, pode ser produzida a qualquer momento, de acordo com o que dispõe o art. 231 do CPP (BRASIL, 2017). Na resposta à acusação, que deve ser apresentada por escrito, algumas questões são salutares: a fixação de prazo para oferecimento do rol de testemunhas e o requerimento de prova pericial para o réu, além da apresentação das exceções, contempladas nos arts. 95 a 111 do CPP (PACELLI, 2019). No art. 396-A, §1º, do CPP, está expresso que a exceção será processada em apartado e será regida por meio do disposto nos arts. 95 a 112 do CPP (BRASIL, 2008). Nesse sentido: Resposta à acusação 6 Na verdade, quase todas as exceções poderão ser conhecidas pelo juiz depois da fase de resposta escrita, ainda quando não alegadas pela defesa. De fato, a coisa julgada e a litispendência (art. 95, III e V, CPP), por exemplo, podem perturbar a atuação jurisdicional, cumprindo ao juiz, que delas tenha conhecimento, esclarecer a eventual incidência. A ilegitimidade de parte, evidentemente, não preclui, podendo ser reconhecida a qualquer tempo! Se a ação era privativa do Ministério Público, ruirá eventual condenação passada em julgado se promovida a ação pelo quere- lante. Apenas a incompetência relativa preclui para a defesa (PACELLI, 2019, p. 711). As exceções trazidas por Eugênio Pacelli (2019) tratam de questões re- lativamente prejudiciais para o exame do mérito. Elas são denominadas prejudiciais não por serem as prejudiciais trazidas no art. 90 e nos artigos seguintes do CPP, mas sim no sentido de solucionarem, quando apreciadas, toda a matéria da ação penal. A apresentação da resposta à acusação dá início ao processo em con- traditório, com abertura para ampla defesa do acusado. Dessa maneira, questões não apreciadas pelo juiz, em razão do recebimento da denúncia, podem ou devem, desde essa primeira peça de defesa, ser utilizadas como argumentos que fazem parte da resposta do acusado; é o caso das questões trazidas no art. 397 do CPP. Logo, devido à obrigatoriedade da apreciação das teses elencadasnessa oportunidade defensiva, há jurisprudência do STJ em relação à matéria (BRASIL, 2015). No que diz respeito à apresentação do rol de testemunhas, quando do rito ordinário, a defesa poderá arrolar até oito testemunhas. No sumário, esse número é de cinco testemunhas. No Tribunal do Júri, pode haver oito testemunhas na primeira fase e cinco testemunhas em plenário (RANGEL, 2014). Nos termos do art. 401, §1º, do CPP, não se incluem no rol de testemunhas pessoas que não prestam compromissos, nos termos do art. 208, do CPP, ou as que nada souberem em relação aos fatos, disposição do art. 209, §2º, do CPP, além das denominadas testemunhas referidas, aquelas mencionadas por outras testemunhas durante a audiência (PACELLI, 2019). Inúmeras são as preliminares que podem ser arguidas pela defesa em fase de resposta à acusação, dependendo da linha de defesa. Uma parte da doutrina defende que o mérito não deve ser questionado na primeira peça de defesa, indicando que esse documento deve ser conciso e com argumentos fortes que levem à prévia resolução do processo penal com a absolvição sumária ou, então, que busque indicativos razoáveis para melhor posição do acusado no enfrentamento do processo penal. Nesse sentido, na resposta à acusação, a defesa deve requerer toda e qualquer diligência que entenda necessária. Quando o crime deixar vestígios, por exemplo, o laudo de exame do corpo de delito é necessário e fundamental, Resposta à acusação 7 conforme disposto nos arts. 158 e 160, combinados com o art. 594, III, ‘b’, do CPP, até pelo fato de que essa é uma condição de procedibilidade. Sem que seja realizado esse exame, o magistrado não pode receber a peça acusatória (TOURINHO FILHO, 2011). Nos casos em que exista alguma excludente de ilicitude ou de culpa- bilidade, a defesa deverá fazer a explicitação da questão com clareza. Por exemplo, demonstrar que o fato narrado não constitui crime, como o caso do cheque pré-datado. Nos casos de lesão corporal grave com alegação de que a vítima ficou impossibilitada de realizar suas atividades laborais por mais de 30 dias, deve-se apresentar prova, com testemunhas, de que 20 dias após o fato a vítima retornou para o trabalho. Nesses casos, a resposta à acusação pode levar a um julgamento antecipado, agilizando o processo penal, uma vez que permite que o juiz proceda com a absolvição sumária do denunciado (TOURINHO FILHO, 2011). Outra questão importante a ser aduzida na resposta à acusação diz respeito à análise dos elementos probatórios nos autos do inquérito policial. Nos casos em que o réu tenha agido em legítima defesa e isso estiver presente no depoimento, a defesa deve fazer a menção, objetivando confrontar a questão, ainda em sede, de resposta à acusação (TOURINHO FILHO, 2011). Confira outro exemplo: Sendo [...] o crime cometido por um e, por equívoco, a acusação se faz contra outro, nesse caso deve a defesa requerer a nulidade do processo, em face da ilegitimidade ad causum passiva; se já extinta a punibilidade, a resposta deve mencioná-la, pois, reconhecendo-a, o Juiz pode proferir absolvição sumária, nos termos do artigo 397, IV, do CPP. Assim, na “resposta”, deve a Defesa esmiuçar a prova do inquérito, analisá-la, confrontar depoimentos, juntar outras provas, de molde a convencer o magistrado do acerto da sua tese (TOURINHO FILHO, 2011, p. 251). As manobras para trazer argumentos que podem fazer parte da resposta à acusação pelo acusado podem ser contra ação ou contra processo. Se a defesa optar pela linha de um mecanismo contra ação, há uma subdivisão da doutrina em direta e indireta. Diz-se direta quando o réu se “[...] opõe à pretensão deduzida, negando o fato, negando a autoria ou, então, invocando um álibi de molde a tornar impossível o acolhimento da pretensão deduzida. Diz-se indireta quando o réu, sem negar o fato e a autoria, evoca [...] circunstância que neutralize a pretensão” (TOURINHO FILHO, 2011, p. 251), arguindo a extinção da punibilidade ou a isenção de pena ou de exclusão do crime, por exemplo. Em contrapartida, a defesa também pode optar por utilizar argumentos que são contra o processo. Dessa forma, o réu alega uma causa de nulidade Resposta à acusação 8 e, sobretudo, uma circunstância trazida no art. 95 do CPP, como, por exemplo, suspeição, incompetência do juízo, litispendência, coisa julgada ou ilegitimi- dade de parte ad causum ou ad processum. Por vezes, a nulidade absoluta pode ser reconhecida como matéria verdadeiramente essencial, atuando como pressuposto processual de validade. A argumentação dessas questões na resposta à acusação é absolutamente importante, uma vez que, nesses casos, a denúncia sequer poderia ter sido recebida (TOURINHO FILHO, 2011). Nos casos de incompetência ratione loci, se a defesa tiver interesse em arguir a incompetência do juízo, deve realizá-lo na resposta à acusação, con- forme a disposição do art. 108 do CPP, sob pena de preclusão. Não obstante a manifestação em contrário do Supremo Tribunal Federal, em decisão não unânime (RHC, 52:256), o entendimento genérico é o de que a competência pelo lugar da infração é relativa, e não absoluta. Nesse sentido, por se tratar de incompetência relativa, deve ser argumentada na resposta à acusação, sob pena de preclusão por prerrogatio fori (TOURINHO FILHO, 2011). Se houver incompetência absoluta, como, por exemplo, quando a Justiça Comum Estadual está julgando causa da alçada da Justiça Comum Federal, a nulidade pode ser arguida a qualquer tempo ou em qualquer instância, ainda que depois do trânsito em julgado da decisão. Todavia, se houver incompetência relativa, como, por exemplo, quando o delito é consumado no município X e o processo é instaurado no município Z, se não for arguida na resposta à acusação, o réu fica eximido de seu direito de o realizar em outro momento do processo penal. Contudo, nada impede que o juiz, a qualquer tempo, possa fazer esse reconhecimento de incompetência, conforme o disposto no art. 109 do CPP (TOURINHO FILHO, 2011). Na resposta à acusação, também devem ser apresentados os apontamentos que levam à rejeição da denúncia, constantes no art. 395 do CPP, os quais dizem respeito a denúncia manifestamente inepta, ausência de pressuposto processual ou condição para exercício da ação penal e, por fim, falta de justa causa para o exercício da ação penal (BRASIL, 2008). Além disso, a nulidade da citação é preliminar à resposta à acusação, conforme as regras dispostas entre os arts. 351 e 369 do CPP, de modo que devem ser observados os requisitos do mandado de citação constantes nos incisos do art. 352, assim como a regra de citação pessoal na hipótese de réu preso, conforme a disposição do art. 360 do CPP (BRASIL, 2008). As nulidades do art. 564 do CPP também são argumentos importantes a serem questionados na resposta à acusação no momento processual abor- dado. Portanto, a defesa do acusado deverá levar em consideração o que diz o artigo citado: Resposta à acusação 9 Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos: I - por incompetência, suspeição ou suborno do juiz; II - por ilegitimidade de parte; III - por falta das fórmulas ou dos termos seguintes: a) a denúncia ou a queixa e a representação e, nos processos de contravenções penais, a portaria ou o auto de prisão em flagrante; b) o exame do corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvado o disposto no Art. 167; c) a nomeação de defensor ao réu presente, que o não tiver, ou ao ausente, e de curador ao menor de 21 anos; [...] e) a citação do réu para ver-se processar, o seu interrogatório, quando presente, e os prazos concedidos à acusação e à defesa; [...] IV - por omissão de formalidade que constitua elemento essencial do ato (BRASIL, 2017, p. 134). Assim, argumentos vinculados com a rejeição da denúncia, base legal do art. 395 do CPP, desclassificação do delito para um menos gravoso, anulação de atos processuais ou descontinuação do crime são tesesimportantes para serem arguidas nas preliminares na resposta à acusação. Além disso, o legislador possibilitou que, em sede de resposta do réu, a defesa argua alguma exceção — as exceções estão dispostas entre os arts. 95 e 111 do CPP —, podendo fazer isso dentro do prazo da resposta ou em outra oportunidade, salvo em se tratando de incompetência relativa. É importante destacar que as exceções devem ser arguidas em apartado, em petição avulsa, conforme os arts. 111 e 396-A, §1º, do CPP (BRASIL, 2008). Um exemplo desse caso ocorre quando a defesa pretende que o réu seja submetido a exame de insanidade, previsto no art. 149 do CPP; para esse caso, a defesa deverá realizar o pedido em petição avulsa e, se possível, oferecendo de pronto os quesitos (TOURINHO FILHO, 2011). Aplicabilidade da absolvição sumária pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) Por meio da análise dos julgados do Superior Tribunal de Justiça, pode-se observar como a Corte Superior aplica o instituto da absolvição sumária. Veja: PENAL E PROCESSUAL PENAL. QUEIXA-CRIME. IMPUTAÇÃO DE DIFAMAÇÃO E INJÚRIA MAJORADAS. CONEXÃO COM A APN 969-DF. RESPOSTA. PRELIMINAR DE CONEXÃO COM OUTROS PROCEDIMENTOS INVESTIGATIVOS. REJEIÇÃO. PRELIMINAR DE ILEGI- TIMIDADE ATIVA. ACOLHIMENTO PARCIAL. MÉRITO. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA EM RAZÃO DA ATIPICIDADE DA CONDUTA. 1. Inexistindo qualquer liame entre os fatos tratados na presente ação penal e aqueles investigados nos procedimentos instaurados contra o Governador do Resposta à acusação 10 Estado do Amazonas (Inq. nº 1306, Inq. nº 1391 e Cautelar Inominada Criminal nº 30), não há que se falar na figura da conexão. 2. No que tange às supostas expressões difamatórias irrogadas à Companhia de Gás do Estado do Amazonas (CIGÁS), caberia à pessoa jurídica, e não ao quere- lante, figurar no polo ativo da relação jurídico-processual. Acolhimento parcial da preliminar de ilegitimidade ativa. 3. Expressões utilizadas de caráter genérico, sem se referir objetivamente a nenhum fato concreto, tornam impossível a adequação típica dos delitos de difamação e injúria majoradas. Atipicidade das condutas com consequente absolvição sumária (BRASIL, 2021, p. 1). RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ROUBO MAJORADO. CORRUPÇÃO DE MENORES. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. NULIDADE. DECISÃO QUE APRECIA A RES- POSTA À ACUSAÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. ANÁLISE LIMITADA ÀS HIPÓTESES DE ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. NECESSIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. RECURSO IMPROVIDO. 1. O trancamento da ação penal somente é possível, na via estreita do habeas corpus, em caráter excepcional, quando se comprovar, de plano, a inépcia da denúncia, a atipicidade da conduta, a incidência de causa de extinção da punibilidade ou a ausência de indícios de autoria ou de prova da materialidade do delito. 2. O magistrado, ao examinar a resposta à acusação, está limitado à constatação da presença das hipóteses de absolvição sumária, não podendo ampliar dema- siadamente o espectro de análise, sob pena de invadir a seara relativa ao próprio mérito da demanda, que depende de prévia instrução processual para que o julgador possa formar seu convencimento. 3. A tese de insuficiência de indícios aptos a autorizar o prosseguimento da ação penal não pode ser analisada pela via mandamental, pois depende de amplo exame do conjunto probatório, providência incompatível com os estreitos limites cognitivos do habeas corpus, cujo escopo se restringe à apreciação de elementos pré-constituídos, não sendo esta a via processual adequada para decisões que dependam de dilação probatória. 4. Recurso ordinário improvido (BRASIL, 2020, p. 1). Hipóteses legais de julgamento antecipado e absolvição sumária Na reforma do Código de Processo Penal de 2008, a partir da Lei nº 11.719, o legislador deu nova redação para o art. 397, trazendo aos procedimentos de competência originária dos tribunais, conforme prevê o art. 394, §4º, do CPP, a possibilidade de julgamento antecipado do caso penal (RANGEL, 2014). Depois de apresentada a resposta à acusação, o juiz pode absolver su- mariamente o acusado, colocando fim ao processo quando existir manifesta causa de exclusão da ilicitude ou culpabilidade — exceto nos casos de inim- putabilidade, quando o fato narrado não constituir crime (atipicidade da conduta) ou nas hipóteses em que estiver extinta a punibilidade do agente, como, por exemplo, nos casos de prescrição, decadência ou outra causa Resposta à acusação 11 prevista no art. 107 do Código Penal ou em Lei especial. O art. 397 do CPP determina o seguinte: Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: I - a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; II - a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade; III - que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou IV - extinta a punibilidade do agente. (BRASIL, 2008, p. 7). Os quatro incisos desse artigo apenas reproduzem duas condições da ação: prática de fato aparentemente criminoso e culpabilidade concreta. Os incisos I e II do art. 397 do CPP são desdobramentos da condição prevista no inciso III do mesmo artigo. Já o inciso IV é a denominada “[...] condição da culpabilidade concreta, prevista no artigo 43, II, do CPP. São questões intimamente vinculadas ao mérito, ao elemento objetivo da pretensão acusatória, e dizem respeito a interesse da defesa, que, como regra, acabam sendo alegados depois, na resposta preliminar do artigo 396-A” (LOPES JUNIOR, 2014, p. 957). Embora a regra geral aponte que a absolvição sumária ocorre após a apresentação da resposta à acusação, nada impede que o juiz faça a inversão da cronologia legal e, desde o recebimento da denúncia, absolva o acusado sumariamente, com fundamento em algumas das hipóteses do art. 397 do CPP. Exigir citação posterior e apresentação da resposta escrita, impondo esforços de variadas ordens por parte do denunciado (p. ex., despesas com advogado), não consagrará o contraditório e a ampla defesa. Claramente, tais princípios são irrenunciáveis. Para isso, basta que, existindo recurso da acusação contra a absolvição sumária, notifique-se o réu para se opor à impugnação. Segundo a Súmula 707 do Supremo Tribunal Federal, “[...] constitui nulidade a falta de intimação do denunciado para oferecer contrarrazões ao recurso interposto da rejeição da denúncia, não a suprindo a nomeação do defensor dativo” (BRASIL, 2003, documento on-line). Desse modo, à absolvição sumária sem citação do acusado, basta conferir igual tratamento dispensado à decisão de rejeição da denúncia (PACELLI, 2019). Se o pedido de absolvição sumária requerido na resposta à acusação for negado, cabe à defesa impetrar habeas corpus, com a finalidade de obter o trancamento do processo penal nos casos em que a prova da tese defensiva for pré-constituída (LOPES JUNIOR, 2014). Se, após a resposta à acusação, o juiz se convencer de que inexiste justa causa para a propositura da ação Resposta à acusação 12 penal, não estando essa hipótese elencada no art. 397 do CPP, como se deve proceder? Lopes Junior (2014, p. 957) responde essa questão da seguinte forma: Pensamos que o juiz poderá desconstruir o ato de recebimento, anulando-o, para a seguir proferir uma decisão de rejeição liminar. Isso porque não existe preclusão pre iudicato, ou seja, nada impede que o juiz desconstitua seu ato e a seguir pra- tique aquele juridicamente mais adequado. E mais: nada impede que o juiz, após a resposta escrita, se convença da ausência de alguma das condições da ação e rejeite a denúncia anteriormente recebida. Pela ausência da preclusão para o juiz, poderá ele, perfeitamente, realizar um novo juízo de preliberação à luz dos novos elementos trazidos, evitando assim um processo natimorto, sem suporte probatório e jurídico suficiente. Nesse sentido, destaca-sea jurisprudência do Tribunal Regional Federal, 1ª Região, que, em julgamento, indicou que a Lei nº 11.719/08 inovou o processo penal ao introduzir a possibilidade da absolvição sumária do acusado. Dessa forma, “[...] tornou-se perfeitamente factível que o juiz reveja a decisão pela qual recebeu a denúncia, para rejeitá-la em seguida, quando sua convicção é modificada por algum elemento trazido pela defesa em resposta escrita” (BRASIL, 2011, documento on-line). É importante destacar que a decisão pela absolvição sumária do réu gera coisa julgada material. Assim, conforme a redação do art. 397 do CPP, as hipóteses ali dispostas estão vinculadas ao mérito, ao elemento objetivo da pretensão acusatória, e dizem respeito aos interesses da defesa, que, em geral, acabam sendo demonstrados depois, na resposta preliminar do art. 396-A (LOPES JUNIOR, 2014). Raramente o magistrado tem elementos suficientes para analisar a exis- tência de uma causa de exclusão da ilicitude ou da culpabilidade, ainda que manifesta, quando do oferecimento da denúncia. Em geral, após a apresen- tação da resposta à acusação, novos elementos são trazidos para o feito, abrindo novas possibilidades de apreciação para o juiz fazer nova ponderação em relação à antecipação do julgamento do caso penal, com a absolvição sumária do acusado (LOPES JUNIOR, 2014). A partir disso, pode-se analisar os incisos do art. 397 do CPP. O primeiro deles indica que o juiz deverá absolver sumariamente o acusando quando verificar a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato (BRASIL, 2008). Dessa disposição, inicialmente, vale ressaltar a compreensão do que é ilicitude. Para Rogério Greco (2007, p. 313), ilicitude é “[...] a relação de antagonismo, de contrariedade entre a conduta do agente e o ordenamento jurídico”. Ou seja, para que a ilicitude seja concreta, faz-se necessário que o agente contrarie uma norma, uma vez que, se essa premissa não estiver Resposta à acusação 13 presente, a sua conduta, ainda que antissocial, não poderá ser considerada ilícita, de modo que não estaria em desacordo com o ordenamento jurídico- -penal (GRECO, 2007). Um policial, utilizando sua arma oficial, dá voz de prisão em flagrante mediante uma pessoa que está praticando crime de roubo. O me- liante, também armado, investe contra a vida do policial, efetuando disparos de arma de fogo. O policial, abrigado atrás de uma parede, efetua um único disparo, atingindo a região torácica do meliante, que vem a falecer, mas não sem antes ser socorrido pelo policial, que, imediatamente, providencia socorro. Nesse caso, ainda que a conduta praticada pelo policial seja típica, ou seja, “matar alguém”, ele agiu em legítima defesa, uma causa que exclui a ilicitude do fato. Para esse caso, não se fala em estrito cumprimento do dever legal, uma vez que não há, no ordenamento jurídico pátrio, o de matar outrem, salvo nos exatos e excepcionados limites do art. 5º, XLVII, ‘a’, combinado com o art. 84, XIX, ambos da Constituição Federal de 1988 (RANGEL, 2014). As causas de exclusão da ilicitude que podem ser utilizadas pelo juiz em sua decisão de absolvição sumária estão previstas na parte geral do Código Penal, em seu art. 23, e no art. 146, §3º, do mesmo documento (RANGEL, 2014). Nesse sentido, são excludentes da ilicitude: as causas que advêm de situação de necessidade, como no caso da legítima defesa e do estado de necessidade; as causas relativas à atuação do direito, a exemplo do exercício regular do direito e do estrito cumprimento do dever legal; e, por fim, as hipóteses que ocorrem a partir de situações de ausência de interesse, como no caso de consentimento do ofendido (GRECO, 2007). Assim, quando o juiz verificar a manifesta presença de uma causa excludente da ilicitude, ele deve absolver o acusado, antecipando o julgamento do caso penal (RANGEL, 2014). A segunda hipótese de absolvição sumária trazida pelo legislador no art. 397 do CPP diz respeito à existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo nos casos de inimputabilidade (BRASIL, 2008). De acordo com Greco (2007, p. 381): Culpabilidade é o juízo de reprovação pessoal que se realiza sobre a conduta típica e ilícita praticada pelo agente. [Assim], culpabilidade é a reprovabilidade da configuração da vontade. Toda culpabilidade é culpabilidade de vontade. So- mente aquilo a respeito do qual o homem pede algo voluntariamente lhe pode ser reprovado como culpabilidade. Desse modo, a culpabilidade está vinculada à reprovabilidade do injusto penal ao autor. Ou seja, a reprovabilidade está relacionada com o injusto Resposta à acusação 14 penal praticado pelo autor do delito, o que ocorre exatamente pelo que se motivou na norma, sendo exigível, diante das condições em que agiu, que nela se motivasse (RANGEL, 2014). Algumas das causas de exclusão da culpabilidade são: (a) coação irresis- tível e obediência hierárquica, dispostas no art. 22 do Código Penal (a coação mencionada nesse artigo é a de natureza moral, e não física, pois a coação física afasta a própria conduta do agente por ausência de dolo ou culpa) (GRECO, 2007); (b) aborto, quando a gravidez é proveniente de estupro, regra do art. 128, II, do CPP. Para esta última causa, não é razoável a manutenção da gestação resultante de violência sexual, razão pela qual, quando opta pelo aborto, ainda que a conduta seja típica e ilícita, o acusado deixa de ser culpável, ou seja, a inexigibilidade da conduta diversa exclui a culpabilidade (RANGEL, 2014). O juiz poderá proceder com a resolução antecipada do caso penal com a absolvição sumária com base em uma causa supralegal de exclusão da culpabilidade. Em outras palavras, aquelas causas que, “[...] embora não estejam previstas expressamente em algum texto legal, são aplicadas em virtude dos princípios informadores do ordenamento jurídico” (GRECO, 2007, p. 421). É importante destacar a parte final do inciso II do art. 397 do CPP, que indica “salvo inimputabilidade”. Essa questão legislativa está baseada no fato de que, se a inimputabilidade estiver presente, deve-se aplicar a medida de segurança, motivo pelo qual o processo penal deve seguir seu curso normalmente (RANGEL, 2014). A terceira hipótese trazida pelo legislador para a absolvição sumária pelo juiz consta no inciso III do art. 397 do CPP, que aponta para hipóte- ses em que o fato narrado não constitui crime (BRASIL, 2008). Trata-se de impossibilidade jurídica do pedido, o que requer a normativa legal que deixe evidente que o fato é uma conduta típica, ilícita e culpável e, portanto, configura crime. O inciso III do art. 397, além de ser aplicado aos fatos que não constituem crime, pode, segundo Paulo Rangel (2014, p. 545), ser aplicado à absolvição nos casos de valor insignificante do bem jurídico por exclusão da tipicidade, uma vez que o Direito Penal “[...] só deve ir até aonde esteja estritamente necessário à proteção só bem jurídico. Logo, há que se fazer uma análise da tipicidade penal (que integra a estrutura do crime)”. A doutrina subdivide a tipicidade em formal e material. A doutrina formal está vinculada à adequação do comportamento do agente ao modelo abstrato (tipo) previsto na Lei penal (RANGEL, 2014). Rogério Greco (2007, p. 65) explica a tipicidade material, também denominada conglobante, da seguinte forma: Resposta à acusação 15 Para que se possa concluir pela tipicidade conglobante, é preciso verificar dois aspectos fundamentais: a) se a conduta do agente é antinormativa; b) se o fato é materialmente típico. O estudo do princípio da insignificância reside nessa segunda vertente de tipicidade conglobante, ou seja, na chamada tipicidade material [...]. A tipicidade penal seria resultante, portanto, da conjugação da tipicidade formal com a tipicidade conglobante [...]. Se não há tipicidade material, não há fato típico; e, como consequência lógica, se não há fato típico, não haverá crime. Nos casosem que o fato narrado não constitui crime, o Parquet não deveria oferecer a denúncia, mas, se o fizer, o juiz deve absolver sumariamente o acu- sado. Se o juiz não o fizer e citar o réu, a defesa deve requisitar a absolvição sumária na resposta à acusação. Por fim, a última hipótese, que consta no art. 397 do CPP, está na redação do inciso IV, que indica o elemento que leva à absolvição sumário do acusado quando está extinta a punibilidade do agente (BRASIL, 2008). Em virtude de a punibilidade estar vinculada à realização de conduta típica, ilícita e culpável praticada pelo agente, trata-se da possibilidade que se abre ao Estado de utilizar a sanctio juris ao sujeito infrator da norma. Entretanto, após a prática da conduta, algumas situações podem impossibilitar a sanção penal ou sua execução por parte do Estado. Por esse ângulo, o que “[...] extingue é o direito de punir do Estado, não a ação penal” (BITTENCOURT, 2006, p. 863). Com base no Código Penal, nos arts. 107, 125, §5º, 129, §8º, 180, §3º, 181, entre tantos outros artigos da mesma normativa legal ou de outras legislações especiais, quando tais situações estiverem presentes, o juiz declara extinta a punibilidade e absolve o réu, antecipando a resolução do caso penal (RANGEL, 2014). É importante ressaltar que, à absolvição sumária declarada pelo juiz, cabe recurso de apelação, previsto no art. 593, I, do CPP. Entretanto, a decisão que absolve sumariamente por estar extinta a punibilidade é impugnável por meio do recurso em sentido estrito, conforme o art. 581, VIII, do CPP (LOPES JUNIOR, 2014). O inciso IV do art. 397 do CPP causa discórdia entre a doutrina. Para uma parcela da doutrina, a extinção da punibilidade, que tinha natu- reza jurídica de sentença meramente declaratória antes da nova redação do art. 397 do CPP, passa a ter mérito absolutório (RANGEL, 2014). Entretanto, para outra parcela de doutrinadores, a sentença que reconhece a extinção da punibilidade é uma decisão declaratória, e não uma sentença definitiva e absolutória, não tendo condão para alterar a natureza jurídica do ato (LOPES JUNIOR, 2014). Resposta à acusação 16 Exemplo de estrutura-base de uma petição: resposta à acusação EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE (NOME DA CIDADE) – (UF) AUTOS nº (XXX) (DADOS/QUALIFICAÇÃO), portador da Carteira de Identidade/RG de nº 0000- 000 inscrito no CPF/MF de nº 000.000.000-00, residente na (ENDEREÇO), por seu advogado devidamente constituído pelo instrumento de mandato anexo, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, apresentar sua RESPOSTA À ACUSAÇÃO com fulcro no art. 396 e no art. 396-A do Código de Processo Penal, pelos motivos que passa a expor: I – DOS FATOS: (NOME DO ACUSADO) foi denunciado pela suposta prática dos delitos de estelionato — art. 171 do Código Penal — em concurso material e falsificação de documento particular — art. 298 do Código Penal. Segundo consta na denúncia, o paciente teria falsificado documentos de (NOME DA VÍTIMA X) e, fazendo uso de tal documentação, transferido para sua conta no Banco (XXX) a quantia de R$ (XXX), que seriam provenientes da conta de (NOME DA VÍTIMA Y). O denunciado exerceu o direito de permanecer em silêncio em seu depoi- mento prestado durante o inquérito policial. Na mesma fase, o delegado que presidia o inquérito expediu ofício — cópia anexa — ao Banco (XXX) para que este enviasse extrato detalhado das contas das vítimas. O ofício, que, como se pode observar, não foi expedido por autoridade judicial, foi cumprido pelo Banco (XXX), que enviou a documentação requerida pelo delegado, subsidiando, assim, o oferecimento da denúncia. Apesar de se pautar exclusivamente nas alegações de (NOME DA VÍTIMA X) e na documentação fornecida pelo Banco, a denúncia foi recebida na data de (XX/XX/XXXX), e o réu foi citado para oferecer resposta à acusação. O réu — jogador de futebol profissional — estava, à época dos fatos pelos quais é acusado, em excursão com seu clube pela África do Sul, tendo deixado o Brasil na data de (XX/XX/XXXX), retornando apenas em (XX/XX/XXXX) — conforme a cópia de passagens aéreas anexas e a produção cinematográfica realizada com a finalidade de divulgação de suas redes sociais para clubes estrangeiros. Resposta à acusação 17 II – DO DIREITO: a) DA ILICITUDE DA PROVA BASILAR DA DENÚNCIA A Constituição de 1988, em seu art. 5°, inciso X, protege a intimidade e a vida privada do cidadão nos seguintes termos: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. No mesmo artigo, no inciso XII, a Carta Magna prevê a inviolabilidade do sigilo de dados, ainda protegendo a intimidade e a vida privada da pessoa, que somente poderá sofrer exceções em hipóteses excepcionais, ou seja, “[...] por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”. Portanto, observa-se que a denúncia se baseou em prova obtida por meio ilícito, uma vez que o delegado não é autoridade judicial e não pode, por óbvio, determinar a quebra de sigilo bancário de qualquer cidadão. O art. 157 do Código de Processo Penal aponta que a provas ilícitas “são inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo [...], assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais”. Em sua denúncia, o Ministério Público utilizou uma prova que não respeitou o devido processo legal para ser produzida, motivo pelo qual deve ser de- sentranhada do processo. Uma vez desentranhada do processo a referida prova, a denúncia estará esvaziada de materialidade e de indícios suficientes de autoria, já que ape- nas o relato da suposta vítima sustenta a peça acusatória, que, por sua vez carece de justa causa. A respeito da justa causa, o Código de Processo Penal, em seu art. 395, inciso III, versa que “a denúncia ou queixa será rejeitada quando: faltar justa causa para o exercício da ação penal”, não restando, assim, motivo para aceitação da denúncia. b) DA IMPOSSIBILIDADE DE AUTORIA: Como o réu estava em outro país à época do crime a ele indevidamente atribuído, seria impossível que ele utilizasse documentos falsos para fazer a transferência alegada, uma vez que não há Agência do Banco (XXX) naquele Resposta à acusação 18 país, o que reforça a tese da inexistência de quaisquer indícios de autoria em desfavor de (NOME DO ACUSADO), que deve ter sua denúncia rejeitada, nos termos do art. 395, inciso III, do Código de Processo Penal. Se ainda assim a denúncia for recebida, o réu deve ser absolvido pelo fato acima alegado, conforme versa o inciso IV do art. 386 do Código de Processo Penal: “O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: estar provado que o réu não concorreu para a infração penal”. III – DO PEDIDO Diante do exposto, o peticionário requer que: — a prova seja desentranhada do processo, conforme o art. 157 do Código de Processo Penal; — o recebimento da Denúncia seja reconsiderado, para rejeitar liminarmente a inicial, com base no inciso III do art. 395 do Código de Processo Penal; — o réu seja absolvido no caso do recebimento da denúncia, haja vista a impossibilidade de ter praticado o crime por estar ausente do Brasil à época dos fatos a ele atribuídos, conforme documentação anexa, na forma no inciso IV do art. 386 do Código de Processo Penal; — o MM. Juiz requisite a lista de hóspedes na data de (XX/XX/XXXX) a (XX/XX/ XXXX) do Hotel (XXX), localizado na Cidade do Cabo (África do Sul); — o MM. Juiz requisite a lista de passageiros dos voos nº (XXX) e (XXX); — haja a oitiva das testemunhas a seguir, sob pena das cominações legais. Rol de testemunhas: (NOME DA TESTEMUNHA) – qualificado à fl. X (NOME DA TESTEMUNHA) – qualificado à fl. X (NOME DA TESTEMUNHA) – qualificado à fl. X Nesses termos, Pede e espera deferimento.(CIDADE), (DATA). ADVOGADO OAB/(UF) nº (XXX). Fonte: Penal... ([2019], documento on-line). Resposta à acusação 19 Referências BITTENCOURT, C. R. Tratado de direito penal: parte geral. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. BRASIL. Código de processo penal. Brasília, DF: Senado Federal, 2017. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/529749/codigo_de_processo_ penal_1ed.pdf. Acesso em: 2 jul. 2021. BRASIL. Lei n. 11.719, de 20 de junho de 2008. 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Relator: Ministro Reynaldo Soares da Fonseca. Pesquisa de Ju- risprudência, Acórdãos, 14 dez. 2020. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/ GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202002211816&dt_publicacao=14/12/2020. Acesso em: 3 jul. 2021. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso de Habeas Corpus - RHC 44.229 / MG - Minas Gerais. Relator para o acórdão: Ministro Djaci Falcão. Revista Trimestral de Jurisprudência, v. 52, p. 256-262, abr. 1970. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula 707, de 24 de setembro de 2003. Brasília, DF: STF, 2003. Disponível em: https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/seq- -sumula707/false. Acesso em: 3 jul. 2021. BRASIL. Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Recurso em Sentido Estrito - RES 200838000151631 / MG - Minas Gerais. Relator: Desembargador Tourinho Neto. Pesquisa de Jurisprudência, Acórdãos, 15 fev. 2011. Disponível em: https://arquivo. trf1.jus.br/PesquisaMenuArquivo.asp?p1=200838000151631&pA=200838000151631 &pN=148956620084013800. 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Resposta à acusação 21