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Universidade de Brasília Departamento de Matemática Prof. Celius A. Magalhães Cálculo II Notas da Aula 34∗ Funções de Bessel Bessel introduziu suas funções por volta de 1824 como parte de seus estudos sobre gravitacão. Hoje, além da Astronomia, as funçõs de Bessel são importantes também no Eletromagnetismo, no Processamento de Sinais, na Termodinâmica e na Mecânica Quântica. Para a Física-Matemática, as funções de Bessel são quase tão populares quanto as funções trigonométricas. Lembrando: Corda Vibrante Como guia para o que se vai fazer adiante, vale lembrar alguns resultados da Aula 29 sobre a corda vibrante. Na- quele estudo supõe-se que a corda tem comprimento π , que está presa em suas extremidades e que oscile com pequenas amplitudes, como uma corda de violão. x π y(x,t) Neste caso, a função y(x, t), que mede a altura do ponto x no tempo t, é solução da equação da onda σ 2 ∂ 2 ∂x2 y(x, t) = ∂ 2 ∂ t2 y(x, t) (1) onde σ é a velocidade de propagação da onda. Com algumas hipóteses adicionais, e usando o honorável método de separação de variáveis, foi visto que as funções yn(x, t) = cn sen(nx)cos(σ nt) são soluções de (1) que satisfazem yn(x,0) = cn sen(nx), onde n ∈N e cn é uma constante. As figuras abaixo ilustram os gráficos de alguns dessas funções, que são os harmônicos da corda. x x x y1 y2 y3 A solução geral de (1) é uma superposição desses harmônicos yn, que oscilam com frequências ζn = nζ1, onde ζ1 = σ 2π é a frequência do harmômico fundamental y1. Como as frequências são multiplas umas das outras, as interferências entre eles são construtivas, e produzem um som rico e profundo. Membrana Vibrante As funções trigonométricas são importantes para o estudo da corda vibrante. Para o estudo da membrana vibrante o importante são as funções de Bessel, como se verá a seguir. Considere então o problema de modelar as vibrações de uma menbrana elástica na forma do disco D = {(x,y); x2 + y2 ≤ 1}. Suponha que a mem- brana esteja presa ao longo de seu bordo, como em um tambor, e despreze a resitência do ar. Neste caso, a função de três variáveis z(x,y, t), que mede a altura do ponto (x,y) no tempo t, é solução da equação de onda σ 2 [ ∂ 2 ∂x2 z(x,y, t)+ ∂ 2 ∂y2 z(x,y, t) ] = ∂ 2 ∂ t2 z(x,y, t) (2) onde σ > 0 é a velocidade de propagação da onda. Esta é a generalização natural da equação (1), e pode ser deduzida de forma análoga ao que se fez na Aula 29. A menos da constante σ , o lado esquerdo de (2) é conhecido como o operador de Laplace, o mesmo da equação do calor estudada na Aula 32. Este é um dos operadores fundamentais da Física-Matemática. ∗Texto digitado e diagramado por Henrique Reis a partir de anotações de sala de Olaia Diniz No estudo de (2) a ideia é, como antes, usar o honorável método de separação de variáveis. Mas, antes, é necessário mudar as coordendas cartesianas (x,y) para as coordenadas polares (r,θ), onde x = r cos(θ) e y = r sen(θ). O significado geométrico desta mudança está ilustrado nas figuras abaixo. x y r θ 1 1 D r θ 1 2π Das figuras é claro que o raio r varia no intervalo (0,1), e isso independentemente da variação do ângulo θ , que se dá no intervalo (0,2π). Essa é a vantagem das coordenadas polares: uma coordenada varia independentemente da outra, o que não acontece com as coordendas cartesianas do disco. Em coordenadas polares a função z(x,y, t) é dada por u(r,θ , t) = z(r cos(θ),r sen(θ), t). Usando a expressão do operador de Laplace em coordenadas polares, visto anteriormente na aula Aula 32, de (2) segue-se que u(r,θ , t) é solução da equação σ 2 [ ∂ 2 ∂ r2 u(r,θ , t)+ 1 r ∂ ∂ r u(r,θ , t)+ 1 r2 ∂ 2 ∂θ 2 u(r,θ , t) ] = ∂ 2 ∂ t2 u(r,θ , t) (3) O problema pode ser simplicadado admitindo-se que as vibrações tenham uma forma radialmente simétrica, como ilustra a figura ao lado, em que a altura u(r,θ , t) do ponto (r,θ) é a mesma para todo ângulo θ . Isso corresponde a supor que u(r,θ ,r) = u(r, t) é independente de θ . Esse é o caso de um tambor em que a percusão ocorre no centro da membrana. Com essa hipótese de simetria a equação (3) escreve-se como σ 2 [ ∂ 2 ∂ r2 u(r, t)+ 1 r ∂ ∂ r u(r, t) ] = ∂ 2 ∂ t2 u(r, t) (4) Explorando agora que as variações de r e t são independentes uma da outra, pode-se usar separação de variáveis e tentar solução de (4) na forma u(r, t) = g(r)h(t). Obtém-se então que σ 2 [ d2 dr2 g(r)h(t)+ 1 r d dr g(r)h(t) ] = g(r) d2 dt2 h(t) Dividindo essa equação pelo produto g(r)h(t) segue-se que σ 2 [ d2 dr2 g(r) 1 g(r) + 1 r d dr g(r) 1 g(r) ] = d2 dt2 h(t) 1 h(t) onde as variáveis estão separadas! Daí obtém-se que, mudando o valor de t, o lado direito não muda, pois é igual ao lado esquerdo que não depende de t. Logo, o lado direito é constante. Consequentemente, o lado esquerdo é também igual à mesma constante. Indicando por K essa constante, tem-se que σ 2 [ d2 dr2 g(r) 1 g(r) + 1 r d dr g(r) 1 g(r) ] = d2 dt2 h(t) 1 h(t) = K (5) Pode-se inferir o sinal da constante K com o seguinte argumento: do fato de que a membrana oscila sem amortecimento, segue-se que h(t) deve ser periódica; como h(t) é solução de d2 dt2 h(t)−Kh(t) = 0, deve-se ter necessáriamente que K ≤ 0, pois, do contrário, h(t) seria uma função exponencial monótona. Assim, indicando por K =−ω2, de (5) obtém-se as equações d2 dt2 h(t)+ω2h(t) = 0 (6) σ 2 [ d2 dr2 g(r) 1 g(r) + 1 r d dr g(r) 1 g(r) ] =−ω2 (7) Cálculo II Notas da Aula 34 2/6 Ótimo! Até aqui os argumentos parecem bem coerentes. Isso porque a solução geral da equação (6) é uma combinação linear das funções cos(ωt) e sen(ωt), que são periódicas de período 2π/ω . Ora! Esse é exatamente o comportamento esperado para as vibrações da membrana, e já se obtém que a constante ω determina o período das vibrações. Muito bom. Multiplicando por r2g(r) σ2 e usando a notação µ = ω σ , a equação (7) escreve-se na forma r2 d2 dr2 g(r)+ r d dr g(r)+µ2r2g(r) = 0 (8) Vale ainda simplificar (8) um pouquinho usando a mudança de variável x = µr e indicando por y(x) = g( x µ ) = g(r). Então, d dx y(x) = d dr g( x µ ) 1 µ e d2 dx2 y(x) = d2 dr2 g( x µ ) 1 µ2 , e, de (8), segue-se que 0 = r2 d2 dr2 g(r)+ r d dr g(r)+µ2r2g(r) = r2µ2 d2 dx2 y(x)+ rµ d dx y(x)+ (µr)2y(x) = x2 d2 dx2 y(x)+ x d dx y(x)+ x2y(x) (9) Pronto! Essas são as simplificações necessárias. (9) é a equação de Bessel de ordem zero, e as soluções correspondentes são as funções de Bessel de ordem zero. É claro que x = 0 é um ponto singular para a equação (9) , e as soluções y(x) podem não estar definidas nesse ponto. No entanto, em coordenadas polares, x = 0 corresponde a r = 0, que é o centro da membrana, e as soluções devem descrever como são as vibrações nesse ponto. Então, para se obter soluções que sejam fisicamente aceitaveis, deve-se procurar soluções de (9) que sejam bem comportadas em x = 0, no sentido de que exista o limite limx→0 y(x) = y0 ∈ R. Funções de Bessel de Ordem Zero O primeiro passo no estudo de (9) é notar que x = 0 é um ponto singular regular. Com efeito, como os coeficientes da equação são P(x) = x2, Q(x) = x e R(x) = x2, segue-se que p(x) = Q(x)/P(x) = 1/x e q(x) = R(x)/P(x) = 1 são tais que lim x→0 xp(x) = p0 = 1 e lim x→0 x2q(x) = q0 = 0 Isso mostra que x = 0 é um ponto singular regular. Mostra ainda que a equação indicial correspondente s(s−1)+ p0s+q0 = s2 = 0 tem raízes s0 = s1 = 0. Daqui, e do que foi visto na aula passada, segue-se que as soluções da equação (9) são combinações lineares das funções y0(x) = x0 ( 1+ ∞ ∑ n=1 anxn ) , x > 0 (10) y1(x) = y0(x) ln(x)+ x0 ( ∞ ∑ n=1 bnxn ) , x > 0 (11) A função em (10) é conhecida como a função de Bessel de primeira espécie de ordem zero. Já a função em (11), com uma normalização conveniente, é a função de Bessel de segunda espécie de ordem zero. Destas duas, apenas a de primeira espécie é bem comportada perto de x = 0, pois a de segunda espécie inclui um termo logarítmico, e portanto não existe o limx→0 y1(x). O próximo passo é simplificar a notaçãoe usar y′(x) e y′′(x) para indicar a primeira e a segunda derivadas, pois só se vai usar a variável x no restante desta seção. � Exemplo 1 Obtenha as relações de recorrência para a função y0(x) = 1+∑∞ n=1 anxn em (10). Em seguida, calcule os quatro primeiros termos não nulos desta série. � Cálculo II Notas da Aula 34 3/6 Solução. Já se tem que a0 = 1. Para os demais coeficientes, da expressão de y0(x) tem-se que y′0(x) = ∞ ∑ n=1 nanxn−1 = a1 +2a2x+3a3x2 + · · ·+nanxn−1 + · · · y′′0(x) = ∞ ∑ n=2 n(n−1)anxn−2 = 2a2 +3 ·2a3x+4 ·3a4x2 + · · ·+n(n−1)anxn−2 + · · · Para substituir essas expressões em (10), notando que xy′0(x) e x2y′′0(x) possuem as mesmas potências de x, vale primeiro somar esses dois termos e obter x2y′′0(x)+ xy′0(x) = ∞ ∑ n=2 n(n−1)anxn + ∞ ∑ n=1 anxn = a1x+ ∞ ∑ n=2 [n(n−1)+n]anxn = a1x+ ∞ ∑ n=2 n2anxn (12) Para somar o termo x2y0(x), o melhor é fazer a mudança de índice n = k−2, como a seguir: x2y0(x) = x2 ( 1+ ∞ ∑ n=1 anxn ) = x2 + ∞ ∑ n=1 anxn+2 = x2 + ∞ ∑ k=3 ak−2xk (13) Somando (12) e (13), voltando ao índice n em (13) e agrupando os temos semelhantes, obtém-se x2y′′0(x)+ xy′0(x)+ x2y0(x) = a1x+ ∞ ∑ n=2 n2anxn + x2 + ∞ ∑ n=3 an−2xn = a1x+22a2x2 + ∞ ∑ n=3 n2anxn + x2 + ∞ ∑ n=3 an−2xn = a1x+(22a2 +1)x2 + ∞ ∑ n=3 (n2an +an−2)x n Por (9), os coeficientes das potências de x acima devem ser nulos, e daí as relações de recorrência a1 = 0, a2 =− 1 4 e an =− an−2 n2 , n = 3,4,5, · · · Segue-se então que todos os coeficientes ímpares se anulam, pois eles são determinados por a1 = 0. Já os coeficentes pares são determinados por a0 = 1, e os primeiros desses coeficientes são dados por a2 =− 1 22 , a4 =− a2 42 = 1 2224 = 1 64 , a6 =− a4 62 =− 1 (3·2)226 =− 1 2304 , · · · Em geral, os coeficientes pares são dados por a2k = (−1)k (k!)222k , e a solução y0(x) em (10) é dada por y0(x) = 1+ ∞ ∑ k=1 (−1)k (k!)222k x2k = 1− 1 4x2 + 1 64x4 − 1 2304 x6 + · · · Esta é a função de Bessel de primeira espécie de ordem zero, usualmente denotada por J0(x). � A função J0(x) = y0(x) tem uma curiosa relação com as funções trigonométricas. De fato, pode-se mostrar que J0(x) ≈ √ 2 πx cos(x− π 4 ) quando x → ∞ A figura ao lado ilustra o gráfico de J0(x) em azul e o gráfico de √ 2 πx cos(x− π 4 ) em vermelho. Destes gráficos percebe-se que a aproximação já é muito boa para x ≥ 1. 1 µ1 µ2 µ3 µ4 Os gráficos ilustram também o carater ondulatório da função J0(x), que ora é positiva, ora é negativa, e com amplitude que diminui à medida que x aumenta. Em particular, assim como o cosseno, J0(x) tem uma infinidade de zeros µ1,µ2, . . . ,µn, . . . no semi- eixo positivo. Os primeiros desses números são µ1 ≈ 2,4048, µ2 ≈ 5,5201, µ3 ≈ 8,6537 e µ4 ≈ 11,7915, e é curioso notar que as diferenças µ2 − µ1 ≈ 3,1153, µ3 − µ2 ≈ 3,1336, µ4 − µ3 ≈ 3,1378 . . . tendem a se aproximar do número π , exatamente como acontece para o cosseno. As semelhanças são mesmo impressionantes! Os zeros de J0(x) vão desempenhar um papel importante logo a seguir. Cálculo II Notas da Aula 34 4/6 Volta à Membrana Vibrante Além da hipótese de simetria u(r,θ , t) = u(r, t), usada no início da seção anterior, e exatamente como na corda vibrante, a membrana será estudada com as seguintes hipóteses adicionais: x y r θ 1 1 DC u(1, t) = 0 ∀t ≥ 0 (14) ∂ ∂ t u(r,0) = 0 ∀r ∈ [0,1] (15) u(r,0) = f (r) ∀r ∈ [0,1] (16) Como no caso da corda vibrante, a interpretação física de (14) é bem simples. Significa que a membrana está presa ao longo do bordo C = {(x,y);x2 + y2 = 1}, pois nesses pontos r = 1. Assim, a altura da membrana nesses pontos deve ser zero para todo tempo t. Veja a figura. Como ∂ ∂ t u(r, t) é a velocidade de oscilação do ponto (r,θ) no tempo t, a hipótese (15) significa que todos os pontos da membrana iniciam o movimento com velociade nula. Finalmente, (16) significa que, no início, o ponto (r,θ) da membrana está a uma altura f (r), onde f (r) é uma função dada. Assim, o gráfico de u(r,0) coincide com o gráfico de f (r) no início do movimento. Bem, como u(r, t) = g(r)h(t), resta agora saber como essas hipóteses adicionais se refletem no com- portamento das função g(r) e h(t). Neste sentido, foi visto que h(t) é solução de (6), e, portanto, é uma combinação linear das funções cos(ωt) e sen(ωt). Mas, da hipótese adicional ∂ ∂ t u(r,0) = g(r)h′(0) = 0, deve-se ter que h′(0) = 0, pois, do contrário, g(r) deveria ser nula, o que não é interessante! Com essa condição, h(t) é um múltiplo de cos(ωt). Finalmente, com a notação µ = ω σ usada para se obter (11), h(t) é da forma h(t) = acos(σ µt). Já com respeito a g(r) existem duas considerações a serem feitas. A primeira é que, com a mudança de variável x = µr e a função y(x) = y(µr) = g(r), foi visto que y(x) é uma solução da equação de Bessel de ordem zero, e uma solução que deve ser bem comportada perto de x = 0. Assim, y(x) é um múltiplo y(x) = bJ0(x) da função de Bessel de primeira espécie de ordem zero. Daqui conclui-se que g(r) é da forma g(r) = y(µr) = bJ0(µr) para alguma constante b. A segunda consideração é a respeito dos possíveis valores de µ . Com efeito, da hipótese adicional u(1, t) = g(1)h(t) = 0, para se obter soluções h(t) que sejam não nulas, deve-se ter que g(1) = kJ(µ) = 0. Surpresa! Os possíveis valores de µ são os zeros µ1, µ2, µ2, . . . , µn, . . . da função J0(x). Com isso obtém- se toda uma família de soluções g(r) = gn(r) = bnJ0(µnr), com n = 1,2,3, . . . e constantes bn Usando esses valores de µ , e que h(t) é um múltiplo de cos(σ µt), obtém-se também que h(t) = hn(t) = an cos(σ µnt), em que an é constante. Esses argumentos mostram que u(r, t) = un(r, t) = gn(r)hn(t) = cnJ0(µnr)cos(σ µnt), n = 1,2,3, . . . onde cn = anbn é constante, são soluções da equação (4) que satisfazem un(r,0) = cnJ0(µnr). Elas são as soluções elementares, e podem ser comparadas com os harmônicos da corda vibrante. As figuras abaixo ilustram os gráficos de algumas funções un(r,0) = cnJ0(µnr), já em coordenadas cartesianas. u2 u3 u4 No início da aula foi visto que os harmônicos da corda oscilam com frequências que são múltiplos inteiros da frequência fundamental, e daí a qualidade acústica do som da corda. Isso já não é verdade para a membrana. Com efeito, as soluções elementares un oscilam com frequên- cias ζn = µn σ 2π que não são multiplos inteiros da frequência fundamental µ1 σ 2π , pois os zeros µn não são multiplos inteiros de µ1. Esse fato explica a diferença acústica entre o som da corda e o da membrana: na primeira, os harmônicos interagem construtivamente, enquanto que, na segunda, a interferência é destrutiva. Essa é uma bonita interpretação musical dos zeros das funções de Bessel! Voltanto à equação da onda, por superposição das soluções elementares, obtém que u(r, t) = ∞ ∑ n=1 cnJ0(µnr)cos(σ µnt) (17) Cálculo II Notas da Aula 34 5/6 é também solução da equação da onda que satisfaz as hipóteses adicionais (14) e (15). Agora, exatamente como no caso da corda vibrante, a pergunta é: dada uma função f (r), como fazer para que a hipótese adcional u(r,0) = f (r) seja satisfeita? Para isso, usando a expressão de u(r, t) acima, a ideia é escolher constantes cn de modo que u(r,0) = ∞ ∑ n=1 cnJ0(µnr) = f (r) (18) Como no caso das séries de Fourier, estudadas na Aula 29, essa ideia gera pelo menos duas perguntas interessantes. A primeira é: quais funções podem ser escritas como em (18)? É uma pergunta difícil, mas pode-se mostrar que uma grande quantidade de funções podem ser escritas nesta forma. Caso f (r) possa ser escrita como em (18), a segunda pergunta é: como calcular os coeficentes cn? Surpreendentemente, essa pergunta é mais fácil do que a primeira. Isso porque, com um produto escalar adequado, as funções J0(µnr) formam um conjunto ortogonal! Esse é o conteúdo do lema a seguir, cuja demonstração pode ser encontrada em (G. Simmons). Lema 1 Para as funções gm(r) = J0(µmr) e gn(r) = J0(µnr), com m e n em N e n 6= m, tem-se que 〈gm,gn〉= ∫ 1 0 rJ0(µm r)J(µn r)dr= 0 � Caramba! Que resultado interessante. Ele significa que, com o produto escalar introduzido no lema, (18) é a expressão de f (r) como combinação linear de funções ortogonais, e, portanto, que cnJ0(µnr) é a projeção ortogonal de f (r) sobre J0(µnr). É impressionante a semelhança com as séries de Fourier, e (18) é dita a série de Fourier-Bessel de f (r). Esses argumentos resolvem inteiramente o problema da membrana vibrante com as hipóteses adici- onais (14), (15) e (16). Com efeito, as soluções elementares un(r, t) = cnJ0(µnr)cos(σ µnt) são soluções da equação da onda que satisfazem (14) e (15). Por superposição obtém-se que a função em (17) é também solução que satisfaz as mesmas hipóteses (14) e (15). Finalmente, para (16), basta calcular os coeficiêntes cn da projeção ortogonal de f (r) sobre J0(µnr), que são dados por cn = 1 ‖gn‖2 〈 f ,gn〉= 1 ‖gn‖2 ∫ 1 0 r f (r)J0(µnr)dr onde ‖gn‖ 2 = ∫ 1 0 rJ0(µnr)2 dr é o quadrado da norma da função gn(r) = J0(µnr). Com esses coeficientes (17) é a solução procurada. Talvez, o melhor seria dizer candidato a solução, pois ainda falta estudar os problemas de convergência, e tanto para (17) como para (18). Mas essas questões de convergência escapam ao alcance do curso, e são motivos para muito tempo de estudo. O que se pretende aqui é ilustrar a importância das funções de Bessel em um contexto físico de interesse, mas simples de se entender. Foi usado a membrana vibrante como motivação, mas as funções de Bessel desempenham um papel fundamental também no Eletromagnetismo, no Processamento de Sinais, na Termodinâmica, na Mecânica Quântica, etc. Cálculo II Notas da Aula 34 6/6