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Crimes contra a Administração da Justiça | Introdução www.cenes.com.br | 1 DISCIPLINA CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA CONTEÚDO Art. 340 ao 342 do Código Penal Crimes contra a Administração da Justiça | Introdução www.cenes.com.br | 2 A Faculdade Focus se responsabiliza pelos vícios do produto no que concerne à sua edição (apresentação a fim de possibilitar ao consumidor bem manuseá-lo e lê-lo). A instituição, nem os autores, assumem qualquer responsabilidade por eventuais danos ou perdas a pessoa ou bens, decorrentes do uso da presente obra. É proibida a reprodução total ou parcial de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico ou mecânico, inclusive através de processos xerográficos, fotocópia e gravação, sem permissão por escrito do autor e do editor. 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Portanto, nesta disciplina compreenderemos alguns crimes contra a Administração da Justiça. Os crimes contra a administração da justiça iniciam-se no art. 338 do Código Penal e vão até o art. 359 do mesmo, portanto iremos analisar um por um. Neste material abordaremos o art. 340, 341 e 342, os quais trazem os crimes como: comunicação falsa de crime ou contravenção penal; autoacusação falsa; e falso testemunho ou falsa perícia. 2 Crimes Contra a administração da Justiça - Art. 340 ao 342 2.1 Comunicação falsa de crime ou contravenção penal O capítulo III do título dos crimes contra a administração da justiça traz o crime de comunicação falsa de crime ou contravenção penal, o qual possui a finalidade de proteger a administração pública da justiça no sentido de evitar que as autoridades apurem delitos que não aconteceram de fato, fazendo com que crimes reais deixem de ser apurados de forma como deveria, portanto o sujeito ativo desse crime causa um atraso na máquina do judiciário com algo desnecessário. Façamos então a leitura do art. 340 do CP, para depois analisarmos melhor seus elementos: “Provocar a ação de autoridade, comunicando-lhe a ocorrência de crime ou de contravenção que sabe não se ter verificado. Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.” Figura 1- Comunicação falsa de contravenção Fonte: Núcleo Editorial Faculdade Focus Crimes contra a Administração da Justiça | Crimes Contra a administração da Justiça - Art. 340 ao 342 www.cenes.com.br | 5 Gonçalves (2021) traz sobre a objetividade jurídica do art. 340 e cita que a administração da justiça, buscando evitar que as autoridades percam tempo apurando infrações falsamente comunicadas, estabeleceu o art. 340, tipificando como crime a comunicação falsa ou contravenção. 2.1.1 Elementos do tipo Quando o legislador menciona a palavra “provocar”, lembre-se do sentido de dar causa, induzir a autoridade a realizar um ato ou investigação. Este tipo penal poderá ser cometido por qualquer pessoa (sujeito ativo), ou seja, é um crime comum. Nesse sentido temos o posicionamento de Capez (2020): Consubstancia-se no verbo promover, isto é, dar causa a ação da autoridade pública (delegado de polícia, juiz, promotor de justiça, bem como todas as autoridades administrativas que tenham atribuição legal para iniciar investigações). Na hipótese, o agente comunica à autoridade a prática de crime ou contravenção penal que não se verificou. Ao contrário do que ocorre no crime de denunciação caluniosa, não há no delito em estudo a imputação a uma pessoa determinada da prática de crime. Se assim suceder, estará caracterizado o crime de denunciação caluniosa. Contudo, nada impede que se impute a pessoa fictícia ou imaginária a realização de um crime O sujeito passivo é a administração da justiça, o Estado, o crime é de conduta livre pode ser cometido por qualquer meio executivo, comunicação por escrito, oral, anônimo ou não, trata-se também de um crime de menor potencial ofensivo, ou seja, cabe suspensão condicional do processo e transação penal, sendo de competência do juizado especial criminal. Capez (2020), complementa que o sujeito ativo deve ter completa certeza de que a comunicação de crime é falsa, segue exemplificação do autor: O agente deve ter certeza de que o fato comunicado realmente não ocorreu ou é absolutamente diverso do ocorrido. A dúvida afasta o crime. Cite-se o seguinte exemplo: um indivíduo perde sua carteira ou documentos de identidade e, na dúvida sobre se foi furtado ou não, acaba por fazer um boletim de ocorrência na Delegacia de Polícia. Nessa hipótese, não haverá a configuração do crime em tela. O crime disposto no art. ocorre frequentemente em trotes realizados a polícia militar, Crimes contra a Administração da Justiça | Crimes Contra a administração da Justiça - Art. 340 ao 342 www.cenes.com.br | 6 por exemplo, onde é comunicado um crime em determinado local, fazendo com que a viatura sedesloque até a área. O tipo subjetivo é o dolo, sendo caracterizado pela vontade de provocar a ação da autoridade, comunicando-lhe a ocorrência de crime ou de contravenção que sabe não se ter verificado. Complementando sobre o tipo subjetivo o autor Nucci (2019), expõe: É o dolo, apenas na modalidade direta, pois o agente precisa saber não se ter verificado a infração penal. Além disso, pensávamos demandar o elemento subjetivo específico, consistente na vontade de fazer a autoridade atuar sem causa. Não é real. Os motivos do agente são variáveis e múltiplos, não se relacionando com a administração da justiça. Não se pune a forma culposa. A consumação ocorre com a provocação da autoridade, requer o resultado, sendo assim crime material, pois exige o resultado naturalístico. A respeito da tentativa, será cabível e Salim e Azevedo (2020, p. 358) compreendem que “Não é cabível a retratação como forma de extinção da punibilidade como ocorre no crime de falso testemunho”. Nucci (2020) traz uma particularidade, onde o agente comunica infração penal que sabe não se ter verificado, mas a autoridade policial encontra subsídios concretos de cometimento de outro crime, neste caso será indevido punir o agente, já que o mesmo só ganhou com a comunicação efetuada. Concluindo nosso tópico de crime de comunicação falsa, vamos a leitura de uma jurisprudência selecionada pelo autor Nucci (2019), onde logo em seguida deixa um comentário didático: A denunciação caluniosa pode ser confundida com a comunicação falsa de crime ou contravenção penal, mas de maneira oposta a denunciação caluniosa, o crime disposto no art. 340 do CP não traz acusação contra pessoa alguma. Já o art. 339 sim, se atente a isto! Crimes contra a Administração da Justiça | Crimes Contra a administração da Justiça - Art. 340 ao 342 www.cenes.com.br | 7 JURISPRUDÊNCIA INTERESSE OBSCURO TJSC: “Pedido de condenação pela prática do delito de comunicação falsa de crime (art. 340 do CP). Réu que, após praticar o crime de estupro de vulnerável, abandonou a motocicleta de sua propriedade próximo à cena do crime e empreendeu fuga. Réu que, logo após a prática do crime sexual, acionou a polícia por meio de ligação telefônica (COPOM – 190), noticiando o suposto furto da motocicleta, por meio de boletim de ocorrência. Crime de furto que nunca existiu. Dolo evidenciado. Condenação que se impõe. (...) Réu fez a comunicação falsa de crime à Delegacia de Polícia para tentar impedir a identificação da autoria do crime sexual e confundir a polícia. Possibilidade” (2014.077265-4/Ituporanga, 2.ª C. Crim., rel. Volnei Celso Tomazini, 19.05.2015, v.u.). Comentário do autor: o dolo é genérico, nesse caso, pois as metas procuradas pelos agentes são diversificadas. Nesse sentido, o objetivo era impedir a identificação de autoria de crime sexual, confundindo a polícia. Logo, a meta não era ferir a administração da justiça. 2.2 Autoacusação falsa O capítulo III do título dos crimes contra a administração da justiça também cita o crime de autoacusação falsa, onde a objetividade jurídica recai sobre a Administração Da Justiça, pois é prejudicada com acusações falsas, ainda que contra si próprio, podendo isso resultar na condenação de um inocente enquanto o verdadeiro culpado estará impune. Disposto no art. 341 cita que “Acusar-se, perante a autoridade, de crime inexistente ou praticado por outrem, Pena - detenção, de três meses a dois anos, ou multa”. Figura 2- Autoacusação falsa Fonte: Núcleo Editorial Focus Neste tipo penal diferentemente do disposto no art. 339, o indivíduo não realiza falsa Crimes contra a Administração da Justiça | Crimes Contra a administração da Justiça - Art. 340 ao 342 www.cenes.com.br | 8 acusação contra outrem, mas sim acusa a si de cometer determinado crime, isso ocorre muitas vezes entre familiares, em busca de proteger o sujeito que realmente cometeu tal ato . Capez, 18ª ed. 2020, exemplifica bem a ação nuclear do delito em tela: Consubstancia-se no verbo acusar-se, isto é, atribuir ou imputar a si mesmo, perante a autoridade, a prática de crime inexistente ou praticado por outrem. Exige o tipo penal que a autoacusação seja feita perante a autoridade pública (delegado de polícia, juiz, promotor de justiça, autoridade administrativa); contudo, conforme a doutrina de Noronha, não é necessário que o autoacusado esteja frente a frente com a autoridade, pois se admite a forma escrita, mas é necessário que seja feita a ela. A autoacusação falsa geralmente é realizada pelo acusado, oralmente, em interrogatório policial ou judicial. Se realizada perante particular ou funcionário que não seja autoridade, o crime não se perfará. Note que, mesmo que a pessoa esteja ferindo somente a própria honra, a autoacusação falsa prejudica também o processo da justiça, pois esta investigará o crime contra alguém inocente, deixando de punir o verdadeiro culpado. Gonçalves (2021) cita que a autoacusação poderá se dar por qualquer meio, mas não é exigido, todavia, que o agente tenha espontaneamente procurado a autoridade para se autoacusar. Portanto, se alguém é ouvido como testemunha ou suspeito em um inquérito policial e assume a autoria do crime que não fez, responderá pelo delito do art. 341. Contudo, se o sujeito confessa a prática do delito que não cometeu devido a tortura policial ou coação irresistível por parte do verdadeiro autor da infração, o crime disposto no art. não existirá. O tipo penal exige que ocorra a autoacusação perante autoridade, podendo ser polícia militar, delegado de polícia, promotor de justiça, juiz de direito etc. O dispositivo menciona que deve ser feito perante, mas isso não significa que o denunciante deva estar pessoalmente na presença da autoridade, já que a autoacusação poderá ser realizada de forma escrita, basta o fato chegar ao conhecimento de uma autoridade. A conduta de autoacusação perante terceiros ou funcionários públicos que não sejam autoridades é penalmente atípica. A não ser que o agente o faça visando utilizar-se Crimes contra a Administração da Justiça | Crimes Contra a administração da Justiça - Art. 340 ao 342 www.cenes.com.br | 9 dessa pessoa para que comunique as autoridades. Observe que os motivos que levaram o cometimento do crime, não possuem relevância e aquele que assume integralmente a responsabilidade de fato a qual concorreu como participe ou coator não cometerá este crime, pois embora minta não é um fato praticado por outrem. Na mesma linha, o indivíduo que imputa a si próprio um crime e acusa outra pessoa juntamente pela prática de delito que não existe ou que tenha sido praticado por outra pessoa, comete o crime de autoacusação falsa e de denunciação caluniosa em concurso formal heterogêneo, art. 70 do CP. 2.2.1 Elementos do tipo O delito previsto no art. 341 do CP, possui o dolo como tipo subjetivo, sendo caracterizado pela vontade de se autoacusar perante a autoridade. Trata-se de um crime comum, o sujeito ativo poderá ser qualquer pessoa e o sujeito passivo é o Estado. Direito do réu de mentir: Não devemos confundir o direito da ampla defesa com a permissão para se autoacusar, pois mesmo que o réu tenha direito de mentir em sua defesa, não lhe é permitido o direito de autoacusação, uma vez que também é um princípio constitucional evitar erros no judiciário. Nesse sentindo temos posicionamento de Nucci, 3 º ed, 2019: Embora, no exercício do seu direito de defesa, que é constitucionalmente assegurado – ampla defesa – e não deve ser limitado por qualquer norma ordinária, tenha o acusado o direito de mentir, negando a existência do crime, sua autoria, imputando-a a outra pessoa, invocando uma excludente qualquer, enfim, narrando inverdades, não lhe é conferido pelo ordenamento jurídico o direito de se autoacusarfalsamente. Crimes contra a Administração da Justiça | Crimes Contra a administração da Justiça - Art. 340 ao 342 www.cenes.com.br | 10 A consumação do crime ocorre quando o fato chega a conhecimento da autoridade, ainda que essa não tome qualquer atitude, sendo, portanto, um crime formal. A respeito da tentativa, em regra não é admissível, pois trata-se de fato unissubsistente, salvo, quando o fato for praticado por carta e tenha sido extraviada, por exemplo, impedindo de concluir o seu objetivo (modalidade plurissubsistente). Figura 3- Diferenciando a modalidade plurissubsistente da unissubsistente. Fonte: Núcleo Editorial Focus A ação penal é pública incondicionada, é uma infração de menor potencial ofensivo, cabendo suspensão condicional do processo e transação penal. 2.3 Falso testemunho ou falsa perícia O capítulo III do título dos crimes contra a administração da justiça também prevê o crime de falso testemunho ou falsa perícia, que visa a proteção da Administração da Justiça, dando ênfase no interesse da apuração da verdade, em processos judiciais, administrativos, inquéritos policiais, em juízo ou arbitrais, desta forma prezando pela aplicação efetiva do direito. O Código Penal em seu art. 342 cita que “Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral, poderá sofrer com pena de reclusão, de 2 a 4 anos, e multa”. Crimes contra a Administração da Justiça | Crimes Contra a administração da Justiça - Art. 340 ao 342 www.cenes.com.br | 11 Atente-se, pois, a vítima não é considerada testemunha, Távora e Alencar (2017) conceituam a testemunha como: [...] pessoa desinteressada que declara em juízo o que sabe sobre os fatos, em face das percepções colhidas sensorialmente. Ganham relevo a visão e a audição, porém, nada impede que a testemunha amealhe suas impressões através do tato e do olfato. Quanto à natureza jurídica, é mais um meio de prova, que conta com a colaboração daqueles que, escolhidos pelo destino, acabam tendo conhecimento do acontecimento delitivo” (TÁVORA, ALENCAR, 2017, p.715). Em outras palavras, a testemunha em si é meio de prova (natureza jurídica), é uma pessoa desinteressada. Contudo, diferentemente do réu, a testemunha possui a obrigação de dizer a verdade, ela não pode se calar ou omitir. Segundo Gonçalves (2021), antes de ocorrer a oitiva de uma testemunha, em regra deverá fazer “sob palavra de honra” a promessa de dizer a verdade, este compromisso está previsto no art. 203 do Código de Processo Penal. O falso testemunho, portanto, pode ser cometido mediante uma afirmação falsa, negando-se a verdade ou calando-se a respeito dessa. É um tipo misto alternativo, assim, mesmo que o sujeito cometa todas as condutas em um mesmo depoimento, responderá por um único crime. Nucci, 3ª ed. 2019, exemplifica de forma clara as condutas previstas no tipo penal: As condutas possíveis são as seguintes: fazer afirmação falsa (mentir ou narrar fato não correspondente à verdade); negar a verdade (não reconhecer a existência de algo verdadeiro ou recusar-se a admitir a realidade); calar a verdade (silenciar ou não contar a realidade dos fatos). É o mesmo que reticência.33 A diferença fundamental entre negar a verdade e calar a verdade é que a primeira conduta leva a pessoa a contrariar a verdade, embora sem fazer afirmação (ex.: indagado pelo juiz se presenciou o acidente, como outras testemunhas afirmaram ter ocorrido, o sujeito nega), enquanto a segunda conduta faz com que a pessoa se recuse a responder (ex.: o magistrado faz perguntas à testemunha, que fica em silêncio ou fala que não responderá). Note que o que caracteriza o crime não é a realidade dos fatos e o contraste com a verdade, mas sim, o que foi dito no depoimento e o que realmente era do conhecimento da testemunha. Nesse sentido Nucci (2019) traz dois posicionamentos sobre a natureza da falsidade, sendo: Crimes contra a Administração da Justiça | Crimes Contra a administração da Justiça - Art. 340 ao 342 www.cenes.com.br | 12 • falso é o que, objetivamente, não corresponde à realidade; e • falso é o que, subjetivamente, não corresponde à realidade, isto é, aquilo que não guarda sintonia com o que o agente efetivamente compreendeu. A segunda posição parece-nos melhor. Afinal, a verdade para o sujeito que presta um depoimento ou elabora um parecer, é a representação ideológica que se desenha na mente, portanto, ainda que algo seja “verdade” absoluta para um, pode ser, uma falsidade (NUCCI, 2019). Exemplificando: podemos entender que mesmo que o sujeito ativo desse crime saiba por terceiros do fato pelo qual está sendo interrogado e alegue nunca ter ouvido nada sobre tal fato, comete o crime de falso testemunho, pois alegou nunca ter ouvido nada quando na verdade ouviu. É evidente que a pessoa que praticar o falso testemunho por meio de coação, não comete o crime previsto no art. 342 do CP, porém, a pessoa que a coagiu, responderá pelo crime do art. 344 do CP. Também é isenta do crime a pessoa que pratica o falso testemunho por medo de represálias, ainda que não tenha sido alvo de ameaças, porém, o medo deve ser fundado em algo sério. Exemplificando: A testemunha que mentiu alegando não conhecer um homicida em um crime que presenciou, pois sabe que o sujeito é famoso por matar as testemunhas de seus crimes, ou o presidiário que não delata seus parceiros por receio da “lei do silêncio” existente dentro dos estabelecimentos penitenciários. O Código Penal adota a teoria subjetiva da verdade, que se considera a verdade do ponto de vista da testemunha, levando-se em consideração o que ela ouviu, viu ou soube, e o que ela relatou. A testemunha não precisa ter presenciado o crime, ou saber quem é o criminoso, mas sim relatar a verdade sobre tudo que sabe do fato em si. Crimes contra a Administração da Justiça | Crimes Contra a administração da Justiça - Art. 340 ao 342 www.cenes.com.br | 13 Na modalidade de falsa perícia o crime pode ser cometido por profissionais como perito, intérprete, tradutor ou contador, que defraudarem seu dever legal, de maneira dolosa, falseando a verdade no exercício de sua profissão, que possa vir a prejudicar processo judicial, inquérito policial, processo administrativo etc. O § 1º do art. 342 do CP, traz a forma majorada, citando que “As penas aumentam-se de um sexto a um terço, se o crime é praticado mediante suborno ou se cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal, ou em processo civil em que for parte entidade da administração pública direta ou indireta”. Já o § 2º traz a extinção da punibilidade, dispõe que “O fato deixa de ser punível se, antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito, o agente se retrata ou declara a verdade”. Figura 4- Falso testemunho ou falsa perícia. Fonte: Núcleo Editorial Focus 2.3.1 Elementos do tipo O bem jurídico tutelado nesse crime é a proteção da Administração Pública em sentido amplo. O crime de falso testemunho ou falsa perícia dispõe o sujeito ativo específico, sendo um crime de mão própria, pois exige a atuação pessoal do agente expressamente indicado no tipo. As pessoas que podem cometer esse crime são: testemunha; perito; contador; tradutor ou intérprete. Os citados, são necessários para trazer informações sobre o crime e com essas informações o embasamento será feito na sentença condenatória. Crimes contra a Administração da Justiça | Crimes Contra a administração da Justiça - Art. 340 ao 342 www.cenes.com.br | 14 O sujeito passivo desse crime notoriamente é o Estado a quem incumbe conhecer do fato verdadeiro e encaminhar o procedimento, e de forma secundária a pessoa interessadano processo por exemplo, a parte prejudicada. A respeito do concurso de pessoas, se trata de um crime que não admite concurso de pessoas, uma vez que é de mão própria, mesmo que as testemunhas tenham combinado entre si de praticarem o falso testemunho, cada um responderá de forma autônoma pelo crime. Entretanto, o Superior tribunal de Justiça traz o HC 30858 onde compreende que “apesar de o crime de falso testemunho ser de mão própria, poderá ocorrer a participação do advogado no seu cometimento” (6ª T., HC 30858, j. 12/06/2006). O tipo subjetivo é o dolo, podendo ser praticado com dolo eventual ou dolo direto, será caracterizado pela vontade de realizar afirmação falsa, negar ou calar a verdade, o agente deve ter ciência de que está praticando uma falsidade. A consumação ocorrerá no momento da afirmação falsa, aperfeiçoando-se quando é encerrado o depoimento. No que se refere a tentativa, será cabível na modalidade plurissubsistente, como por exemplo: testemunho prestado por escrito ou falsa perícia. Contudo, a tentativa não é aceita pacificamente na doutrina. A ação penal é pública incondicionada e a forma majorada do crime está disposta no §1º, Azevedo e Salim (2020) expõem as três causas de aumento de pena, note: • Se é praticado mediante suborno; • Se é cometido com a finalidade de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal; e • Se é cometido em processo civil em que for parte entidade da administração pública direta ou indireta. A retratação está prevista no § 2º Azevedo e Salim (2020, p. 368) conceituam a retratação e preveem que: “[...] retratar-se significa desdizer-se, ou seja, retirar aquilo que foi dito. Trata-se de causa de extinção da punibilidade, prevista no art. 107, VI, do CP”. É admitida a retratação, caso o agente a faça informando que mentiu durante seu depoimento, antes que a sentença tenha sido proferida. Crimes contra a Administração da Justiça | Considerações Finais www.cenes.com.br | 15 Para finalizar o tópico, vamos a leitura da jurisprudência selecionada pelo autor Nucci, em sua obra Curso de Direito Penal, para complementar seu estudo e compreensão do tema, vejamos: JURISPRUDÊNCIA CONTRADIÇÃO INGÊNUA TJMG: “A mera divergência ou contradição entre os resultados alcançados entre os laudos periciais não configura, por si só, o tipo penal disposto no art. 342 do CP , já que, em se tratando de matéria técnica tão controversa, é perfeitamente possível que ocorra percepções distintas dos dados da realidade” (Ap. Crim. 1.0518.10.019676-6/001/MG, 6.ª C. Crim., rel. Jaubert Carneiro Jaques, 14.07.2015). Comentário do autor: a testemunha tem a possibilidade de, apesar de falar a verdade, cair em contradição ou apresentar alguns dados incongruentes. Não se trata de uma máquina, mas de um ser humano. Por isso, há lembranças complexas dos fatos, quanto mais distantes, mais complicadas. Isso não significa mentira. 3 Considerações Finais O Código Penal aborda diversos crimes que atentam contra a administração da justiça e impedir que estas atividades ocorram é essencial. Nesta Unidade observamos os artigos 340, 341 e 342, onde compreendemos a comunicação falsa de crime/contravenção penal, a autoacusação falsa e o falso testemunho/falsa perícia. Na comunicação falsa de crime o indivíduo causa atraso na máquina do judiciário, comunicando crime para que as autoridades apurem delitos que não ocorreram de fato. Já na autoacusação falsa, o indivíduo não realiza falsa acusação contra outrem, mas sim acusa a si de cometer determinado crime ! Por fim, o falso testemunho é um crime que consiste nas condutas de mentir perante juízo. 4 Referências Bibliográficas AZEVEDO, M. A. de; SALIM, A. Direito penal: parte especial - dos crimes contra a incolumidade pública aos crimes contra a administração pública. 8 ed. Salvador: JusPodivm, 2020. Crimes contra a Administração da Justiça | Referências Bibliográficas www.cenes.com.br | 16 CAPEZ, F. Curso de direito penal - parte especial (arts. 213 a 359-H). 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2020. NUCCI, G. de S., Curso de direito parte especial: arts. 213 a 361 do código penal / Guilherme de Souza Nucci. – 3. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2019. GONÇALVES, V. E. R. Direito penal: parte especial / Victor Eduardo Rios Gonçalves. / coord. Pedro Lenza. – 11. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2021. (Coleção Esquematizado®) TÁVORA, N. ALENCAR, R. R. Curso de direito processual penal/ Nestor Távora, Rosmar Rodrigues Alencar - 12. ed. rev. e atu <~L- Salvador: Ed. JusPodivm. 2017. Crimes contra a Administração da Justiça | Referências Bibliográficas www.cenes.com.br | 17 Sumário 1 Introdução 2 Crimes Contra a administração da Justiça - Art. 340 ao 342 2.1 Comunicação falsa de crime ou contravenção penal 2.1.1 Elementos do tipo 2.2 Autoacusação falsa 2.2.1 Elementos do tipo 2.3 Falso testemunho ou falsa perícia 2.3.1 Elementos do tipo 3 Considerações Finais 4 Referências Bibliográficas