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12 Saiba mais em https://fridaysforfuture.org/. Acesso em: 18/10/2019. 13 FRIEDMANN, Adriana. “História do percurso da sociologia e da antropologia da infância”, Revista Veras, São Paulo, v. 1, n. 2, 2011. 14 Programa de escuta, intercâmbio de saberes, registro e difusão da cultura infantil. Disponível em: https://territoriodobrincar.com.br/o-projeto/. Acesso em: 1o/12/2019. 15 Disponível em: https://www.videocamp.com/pt/movies/miradas. Acesso em: 18/10/2019. 16 Disponível em: http://www.cindedi.com.br/. Acesso em: 18/10/2019. https://fridaysforfuture.org/ http://www.cindedi.com.br/ Como acessar paisagens, rostos, gestos do invisível? Como apreender realidades dos mundos imaginários infantis? Como apreender gestos que tanto expressam e que as palavras não podem dizer? Como ler corpos nas paisagens do mundo? E paisagens dos rostos infantis? Onde encontramos a alma das crianças? Que maneiras para falar com elas? Como traduzi-las ao mundo sobre elas? Se elas nos deixarem?! Um universo imenso a desvelar! Ética A ética, tema central que não pode ser deixado de lado quando se trata de processos de escuta e de participação, constitui o conjunto de normas construídas de forma coletiva, de respeito, humanização, fraternidade e esperança dos grupos humanos, no que se refere a direitos, obrigações, benefícios para a sociedade, equidade e determinadas virtudes; e também, no que tange à vida de crianças, suas vozes, expressões, produções e comportamentos. A ética, diferentemente da moral – a norma, a regra instituída, construção temporal –, constitui um espaço de liberdade que nos permite fazer transformações para mudar, questionar, protestar. A moral se herda, a ética se constrói! A mudança torna-se necessária quando o repertório de valores, relações e significados já não dão conta da realidade, não promovem satisfação ou visão de futuro. Historicamente, a identidade e as tradições estavam ligadas à etnia ou ao território. Hoje se perdeu, em grande parte do mundo, o respeito às diferentes identidades. Por meio da ética manifestamos o respeito pela inteligência e singularidade de cada ser humano. A ética cria significado. Os conceitos éticos básicos são a confiança, o respeito e a honestidade. Humanizamo-nos no convívio, sustentando reciprocidades. Quando tratamos da escuta e da observação de crianças, alguns questionamentos se fazem necessários: Por que escutar? Para que escutar? O que fazemos com o que escutamos? Como damos devolutivas do que escutamos? Sônia Kramer (2002), em um artigo muito pertinente, contribui com a questão da ética nas pesquisas com crianças. Ela aponta e problematiza questões que dizem respeito à autoria delas e ao direito ao anonimato, embora sejam autoras de suas vidas e produções. Kramer discute também a fotografia como metodologia de pesquisa e suas implicações, e o tema da devolutiva para as crianças, sobre o qual nos debruçaremos a seguir. Essas questões devem ser pensadas a cada processo de escuta, observação e pesquisa com crianças. Por estarmos em processo de construção de possibilidades éticas, precisamos colocar uma lente de aumento sobre esses temas. Existem padrões internacionais éticos nas pesquisas com crianças – Ethical Research Involving Children/Investigación ética con niños17 – criados pelo Unicef (2013) e outros organismos parceiros. Hoje, o debate sobre o registro de fotos, imagens e produções infantis também está em pauta. Atitudes de escuta por parte dos adultos são ainda raras, complexas e desafiadoras, já que a ideia de que eles são donos do saber e da autoridade predomina na maior parte das sociedades. Nós, adultos, temos grande dificuldade de silenciar e escutar verdadeiramente; acreditar e reconhecer que as crianças têm saberes diferentes dos nossos; e que é essencial conhecê-los, incorporá-los e adequar atividades e propostas socioeducacionais a cada grupo e contexto. O cuidado ético que devemos assumir nesses processos de dar voz e escutar crianças tem a ver com respeitar seus tempos, seus espaços, sua intimidade, suas emoções, suas escolhas; estarmos abertos para acolher suas essências, seus potenciais, aceitar suas limitações e preferências. Todas essas atitudes são fundamentais para não violentar seus mundos. É desafiador aprender a lidar com o equilíbrio entre tempos de falar, ensinar, propor, intervir e tempos de escutar, aprender, estar junto, tomar distância e observar. Negociar com elas combinados e regras. Saber colocar limites, sim. Existem diferentes formas de exercitar a ética em relação às crianças e a primeira delas é pedir licença para adentrar seus territórios, para nos aproximarmos, para nos sentarmos junto, brincarmos. Ainda, para tirar fotos, filmar ou realizar quaisquer outros tipos de registro. Ao pedir licença, estabelecemos não somente um vínculo de confiança, como também a possibilidade de diálogos, explicando, na medida da compreensão de cada idade, a razão da nossa curiosidade e vontade de conhecer seus mundos. Nossa aproximação respeitosa significa também aprender a escutar e compreender suas linguagens expressivas, assim como o que vivem, o que sentem, do que gostam, seus lugares cotidianos, seus hábitos, suas referências, seus amigos, seus afetos etc. Mas precisamos também aceitar – e respeitar – que as crianças podem nem sempre querer compartilhar seus mundos, segredos ou vivências; ou ter seus dizeres, narrativas, processos, produções ou imagens expostos ou compartilhados. Como saber? Só fazendo o exercício de nos colocarmos em seu lugar. Construindo uma cultura ética para as infâncias Neste panorama, uma das questões mais preocupantes é, justamente, o uso que tem sido feito de tudo o que vem das crianças, por parte de inúmeros atores sociais, sem levar em consideração que há uma ética, no que diz respeito ao tratamento e ações voltadas para as crianças e suas vidas. Essa é questão premente e urgente a ser refletida, cuidada, construída e posta em prática onde quer que haja crianças. Essa discussão – que tem suas bases na Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (1989), no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, 1990) e, sobretudo a partir da violação dos direitos básicos das crianças – precisa ser conhecida e debatida por toda a sociedade, como condição urgente e premissa essencial em prol do respeito primordial a toda e qualquer criança, independentemente de etnia, religião, condição física, psíquica ou social. Veicular imagens, eventos, depoimentos ou falas de crianças ou sobre elas tornou-se tão corriqueiro no cotidiano de todos os cidadãos que se perdeu o bom senso e a ética, no que se refere à privacidade e ao respeito pelas vidas infantis. As redes sociais são as que, de longe, lideram essa exposição, seguidas pela mídia, pelo mercado e pelas diversas estratégias de marketing. Até as instituições que, por excelência, têm crianças como seu público-alvo expõem imagens e falas delas em reuniões de pais, fóruns, dentre outros eventos. A partir do momento em que se começa a ter consciência da importância de escutar e de observar crianças em seus contextos e territórios cotidianos espontâneos, sem a interferência dos adultos, instaura-se o desafio de uma mudança de postura ética e metodológica: não mais partir de verdades universalmente reconhecidas pelo mundo adulto a respeito das crianças, mas considerar e aprender a escutar e a decifrar o que elas vivem, sentem e pensam, a partir de suas próprias vozes. Estou aqui defendendo respeitar os tempos das crianças, seus ritmos, suas preferências, seus medos, frustrações, escolhas. Estou falando em pedir licença a elas para adentrar seus universos: seus espaços, seus brincares, suas produções, suas emoções. Estou afirmando a necessidade de parar de avaliar, classificar, criticar ou querer modelar crianças conforme nossos padrões adultocêntricos (que variam de um contexto a outro) e começar a conhecer seus universos particulares. Estou falando de acolhê-las em suas dores, feridas, conquistas, descobertas, produções e criatividades.Estou também falando em não tomar decisões unilaterais por elas ou para elas, acreditando que não tenham a capacidade de opinar sobre Delicadezas do escutar as crianças e seus mundos: respeito, ética, presença e comunicação Ética