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 c a p í t u l o 5
Bebês em creches
O recém-nascido para a terra e para o céu
Quando sua tenra palma pressiona
O círculo do seio
Nunca pensou “isto sou eu”.
Tennyson
o longo dos últimos 20 anos, houve um enorme aumento no número
de mulheres que trabalham em tempo integral um ano após ter dado
à luz – a porcentagem passou de 5 para 24%. Se incluirmos o traba-
lho de meio período, o número sobe para 67% (Labour Market Trends, 2002).
Em outros países, como a Suécia, cuja legislação protege os salários e os em-
pregos da força de trabalho constituída por mães, há uma tendência para a
diminuição desse percentual, com menos bebês sendo colocados em institui-
ções de cuidado (Devem e Moss, 2002; Moss, 2001), mas, no Reino Unido,
apesar de recentemente ter ocorrido uma melhora modesta no que tange à
questão de licença-maternidade e paternidade, a tendência é para o aumento
da porcentagem.
As pressões de ordem econômica e o desemprego estão fazendo com que
as mulheres com empregos congeniais fiquem cada vez mais ansiosas com
relação a largar seus empregos quando têm um bebê. Se elas o fazem, podem
encontrar grandes dificuldades mais tarde, ao procurar trabalho que seja ade-
quado às suas qualificações, terão certamente perdido sua condição de profis-
sionais mais experientes (seniority) e suas perspectivas em termos de carreira
profissional terão provavelmente diminuído (Joshi, 1987). As mães solteiras
encontram-se em uma situação mais vulnerável, pois podem esperar uma exis-
tência extremamente nebulosa e limitada, caso a sua renda dependa exclusi-
vamente do Seguro Social (Bradshaw, 2000; Land, 2002). Seja como for, pou-
cas mães deixam seus filhos sem sentir apreensão e dúvida, por mais que
A
98 Elinor Goldschmied e Sonia Jackson
queiram voltar ao trabalho, e muitas acham as primeiras semanas de separa-
ção de seus bebês extremamente dolorosas (Brannen e Moss, 1988; Moylett,
1997).
Tudo isso precisa ser levado em consideração pelas cuidadoras e pelas
mães-crecheiras, que às vezes têm uma atitude crítica em relação aos pais que
procuram as creches para cuidar de seus filhos bem pequenos (Ferri, 1992;
Moss, 1986). Uma outra questão a ser lembrada é que, embora a falta de
tempo seja sempre um problema para os pais que trabalham, é mais provável
que um bebê receba cuidado e atenção melhores de uma mãe que tem um
emprego que lhe proporcione satisfação e um salário adequado, do que de
uma mãe que tem de enfrentar todos os problemas decorrentes da pobreza.
A discussão que questiona se o cuidado em creches é prejudicial para
crianças com menos de 1 ano é altamente controversa. Belsky (2001) reali-
zou uma revisão bastante extensa de todos os fatores que cercam o que ele
chama de “as guerras no cuidado de crianças”. Em um artigo de argumentação
densa, ele conclui que o cuidado não materno precoce, extenso e contí-
nuo é associado a vínculos menos seguros e a uma incidência maior de agres-
são, não conformidade e problemas comportamentais no período da pré-esco-
la e nos primeiros anos escolares. Essa conclusão é conflitante com muitos
estudos que não demonstram que o cuidado de boa qualidade produza efeitos
adversos, embora o de má qualidade, dado por um dos pais ou por qualquer
outra pessoa, certamente seja pernicioso, especialmente para os bebês bem
pequenos. Outras pesquisas mostram que a pobreza e o background educacio-
nal dos pais são fatores mais importantes para a predição de efeitos a longo
prazo do que o emprego que a mãe tem (ou não) durante o primeiro ano do
bebê (Joshi e Verropoulou, 2000).
Curiosamente, Belsky não considera a questão da amamentação, que,
apesar da enorme quantidade de evidências que atestam seus benefícios para
o desenvolvimento cognitivo e da saúde, não é muito discutida em relação ao
cuidado de bebês em creches (Anglesen et al., 2001; Independent inquiry into
inequalities of health, 1998). Com os modernos equipamentos disponíveis para
o aleitamento hoje, não temos por que não alimentar o bebê com mamadei-
ras, com leite materno, na creche, ao mesmo tempo em que ele continua a ser
amamentado no peito da mãe, durante os períodos muito mais longos que
passa com ela em casa. As cuidadoras precisam compreender as razões de
valer muito a pena esse pequeno esforço a mais que talvez tenham de fazer.
Na prática, a decisão de voltar ou não ao trabalho, e quando, está rara-
mente nas mãos dos pais. Uma questão mais complicada é escolher entre uma
creche e uma mãe-crecheira. Fiona Fogarty e Helen Moylett, que escreveram
mais do ponto de vista de mães do que de profissionais, descrevem como
fizeram suas diferentes escolhas (Abbott e Moylett, 1997). Tipicamente, ambas
ficaram satisfeitas com os resultados, e seus bebês também pareciam conten-
Educação de 0 a 3 anos 99
tes. Pode ser que isso seja mais importante do que a forma específica de cuida-
do escolhida.
CRECHES E MÃES-CRECHEIRAS
Não obstante, garantir que as crianças pequenas recebam cuidado indi-
vidual e responsivo em uma creche envolve muitos problemas. Para começar,
esse tipo de cuidado é extremamente caro, por causa da alta proporção adul-
to-criança necessária. Uma dificuldade adicional é que as necessidades dos
bebês são imprevisíveis e flutuantes, além de ser intensas e imediatas. Podem
haver períodos em que não haverá nada para a cuidadora fazer, que se alter-
nam com momentos em que todos os bebês na sala querem atenção ao mesmo
tempo. Seus ritmos diários mudam à medida que eles crescem, de maneiras
que não se assemelham à rotina da creche.
Compreender as comunicações dos bebês depende de fatores como um
conhecimento íntimo dos seus padrões de comportamento e de observações
próximas de suas reações de um momento para o outro, muito bem-ilustrados
pela sequência de imagens contida em um livro adorável, The social baby (O
bebê social) (Murray e Andrews, 2000). Os pais desenvolvem esse conheci-
mento ao longo das primeiras semanas após o nascimento do bebê, mas as
cuidadoras não dispõem dessa oportunidade.
Na prática, a maioria das mães que procura manter seus empregos não
tem muita escolha em relação à organização do cuidado de seu filho em cre-
ches. Poucas creches privadas, mesmo quando há uma disponível na vizinhança,
oferecem cuidado para bebês bem pequenos. As avós, que costumavam ser as
cuidadoras principais quando as mães trabalhavam, estão cada vez mais relu-
tantes em relação a se comprometer com tal tipo de compromisso contínuo e
regular (Brannen et al., 2003). Assim, a menos que a família tenha condições
de custear uma babá, ela terá de usar o recurso da mãe-crecheira.
As mães-crecheiras prestam um serviço inestimável, e muitas das críticas
que elas sofreram no passado deveriam ser dirigidas ao governo ou aos con-
gressistas que falharam em oferecer reconhecimento, treinamento e apoio ade-
quados para o trabalho delas, da forma que ocorre em países como França,
Suécia e Nova Zelândia (Mooney e Statham, 2003). Na França, as creches
(crèches collectives) muitas vezes dispõem dos serviços de um grupo de cuida-
doras que trabalha em casa (crèches familiales). As cuidadoras familiares* têm
* N. de T. Neste parágrafo é explícita a variedade de termos utilizados em língua inglesa
para descrever essas atividades, ocupações e instituições. Os termos “cuidadoras familia-
res” e “crèches familiales” (em francês) podem aqui ser considerados análogos a “mães-
crecheiras” e a “creches domiciliares”.
100 Elinor Goldschmied e Sonia Jackson
sua própria coordenadora e acesso às instalações da creche. Na Suécia, muitas
vezes elas são empregadas assalariadas da prefeitura.
Neste país, algumas questões que foram desenvolvidas e que nos dão
esperanças são o crescimento das redes de creches domiciliares (Owen, 2003)
e o reconhecimento tardio de que as mães-crecheiras são, além de cuidadoras,
também educadoras. Agora elas podem receber bolsas para seus estudos na
área da educação infantil, embora somente quando cuidam de crianças de 3
ou 4anos (Jackson, 2003).
Comparando-se esses serviços, pensamos que o cuidado domiciliar é mais
bem adaptado às necessidades dos bebês, em comparação com o cuidado ofe-
recido em centros – desde que a mãe-crecheira compreenda que o seu papel
vai muito além do simples cuidado físico. Um bom cuidado oferecido por uma
pessoa é quase sempre mais amoroso e sensível do que aquele dado por várias
pessoas diferentes, por mais competentes que sejam. O sistema de educador-
-referência representa somente uma tentativa parcial de compensar essa des-
vantagem inerente ao cuidado feito em grupo.
Muitos textos na área da psicologia afirmam que os bebês de menos de 8
meses não diferenciam os adultos que os cuidam. Pelo contrário, eles podem
tolerar vários cuidadores, porém demonstram com clareza suas preferências
desde muito cedo. Somente conhecendo muito bem um bebê podemos com-
preender suas formas sutis de comunicação e interpretação de sons pré-ver-
bais (Murray e Andrews, 2000).
Não pretendemos duplicar a vasta quantidade de conselhos e informa-
ções que temos disponível nos dias de hoje sobre o cuidado e a educação de
bebês. Enfatizamos aqui vários aspectos da vida do bebê, que são de particu-
lar importância para aqueles a quem foi confiado o seu cuidado fora de sua
casa.
CHORAR: UMA LINGUAGEM DOS BEBÊS
Há uma grande variação natural no tempo que os bebês passam choran-
do, e esse tempo também varia em relação aos meses de idade do bebê. Al-
guns bebês, que raramente choravam em suas primeiras semanas de vida, de
repente passam por um período que para os seus pais parece ser de gritos
contínuos. Entretanto, em geral os bebês choram por algum motivo, o choro
continuado e persistente dos bebês em uma creche sempre indica que algo
está faltando no cuidado oferecido a eles.
Vivendo próximos a um bebê, tornamo-nos capazes de distinguir (e as-
sim interpretar) as mensagens que estão por trás dos diferentes tipos de cho-
ro. O bebê pode estar vivenciando fome, dor, desconforto físico, solidão,
estimulação em demasia, ou talvez só um sentimento geral de mal-estar. Quan-
do os gritos de um bebê persistem e ele parece incapaz de aceitar nosso con-
	Capítulo 5 | Bebês em creches

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