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Noções sobre cultura A palavra cultura é usada em diversos contextos, como “tal pessoa tem muita cultura”, ou seja, uma pessoa com cultura erudita; “o agricultor intro- duziu novas técnicas na cultura da soja”, em referência ao cultivo agrícola; “o biólogo desenvolveu uma cultura de células em seu laboratório”, no sentido de um agrupamento de células. Esses significados podem ser encontrados em uma rápida consulta a um dicionário. No entanto, para as Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, a palavra cultu- ra é utilizada para se referir ao conjunto de características específicas de di- ferentes grupos sociais, sendo um critério para distinguir um grupo de outro. De modo geral, cultura refere-se aos modos de ser e de viver de um grupo que são transmitidos de uma geração para outra. O conjunto de característi- cas que compõem a cultura de um povo envolve os costumes, as normas e as crenças que caracterizam as condutas individuais, assim como as produ- ções artísticas e materiais, destinadas a manter a sobrevivência desse gru- po e a transmitir suas características para as gerações futuras. Além desses fatores, os conhecimentos e as práticas de um grupo em determinado terri- tório, ao longo da história, caracterizam a cultura desse grupo. Considerando a diversidade dos grupos humanos, alguns estudiosos da Antropologia e da Arqueologia caracterizam a cultura de acordo com a manifes- tação de determinados comportamentos, oriundos de tradições caracterizadas por saberes e práticas específicas. Com base nessa abordagem, o arqueólogo australiano Gordon Childe (1892-1957), em seu livro A evolução cultural do ho- mem (publicado originalmente em 1936), destaca as grandes transformações culturais ocorridas em diversos agrupamentos humanos. As principais delas foram o surgimento do sedentarismo apoiado na agricultura e domesticação de animais na Revolução Neolítica (de 10000 a.C. a 8000 a.C.), o surgimento das cidades na Revolução Urbana (a partir de cerca de 4000 a.C.) e as transfor- mações produtivas e sociais da Revolução Industrial (a partir do século XVIII). De acordo com Childe, essas mudanças inauguraram práticas sociais e econômicas que contribuíram para o desenvolvimento das técnicas e da tec- nologia e para o crescimento populacional da espécie humana. Esses fatores foram fundamentais para que os seres humanos mudassem as formas de manter sua sobrevivência. Nesse sentido, foram alteradas tanto as formas de trabalho quanto as formas de organização das sociedades, assim como as normas e as crenças que orientavam o comportamento dos indivíduos. Essas mudanças, ao longo do tempo, também têm o potencial de influenciar e modificar a cultura de diferentes povos. Gordon Childe utilizou marcos históricos que alteraram a forma como os se- res humanos lidavam com seus meios de sobrevivência, ou seja, como os grupos sociais lidavam com as produções materiais necessárias para o dia a dia, como a construção de moradias, o cultivo de alimentos, as relações comerciais e os recur- sos tecnológicos disponíveis nesses períodos. Trata-se de uma análise fundamen- tada nas transformações materiais pelas quais os seres humanos passaram. Antropologia: ciência que estuda a humanidade de maneira abrangente, desde os aspectos físicos (ou biológicos) até os aspectos culturais, que incluem crenças, costumes, rituais, linguagem, relações de parentesco, etc. Arqueologia: ciência que estuda os costumes e as culturas dos povos antigos por meio de fósseis, artefatos e outros materiais restantes desses povos. CHILDE, Gordon. A evolução cultural do homem. Rio de Janeiro: Guanabara, 1981. NÃO ESCREVA NO LIVRO 35 V1_CIE_HUM_Claudio_g21Sa_Cap1_016a043.indd 35V1_CIE_HUM_Claudio_g21Sa_Cap1_016a043.indd 35 9/14/20 6:10 PM9/14/20 6:10 PM De forma complementar, alguns antropólogos, como o estadunidense Clifford Geertz (1926-2006), compreendem a cultura como um conjunto de comportamentos que orientam a conduta humana, como planos, regras, instruções. Segundo Geertz, a distinção entre os grupos humanos ocorre tanto pelas práticas sociais que adotam como pelos aspectos simbólicos que guiam as condutas individuais. Cada povo tem um conjunto de elementos simbólicos que, combinados à forma de organização social e produção material, orientam a vida em sociedade. Nesse sentido, todo indivíduo teria uma vida pautada pela combinação das vontades particulares e das práticas simbólicas da cultura da sociedade em que vive. Por exemplo, uma criança nascida em Moscou (Rússia) e criada por uma família de Recife (Pernambuco) poderia crescer alheia à cultu- ra russa tanto quanto uma criança pernambucana, já que ela cresceria imersa na cultura brasileira – o contrário também poderia ocorrer. Esse aspecto mos- tra o poder que a cultura tem sobre a vida individual. Caverna das Mãos, em Santa Cruz, Argentina. Essa pintura rupestre foi criada por diferentes grupos humanos nos primeiros tempos da ocupação da América do Sul, entre 13 000 e 9 500 anos atrás. Fotografia de 2017. GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. São Paulo: LTC, 1981. Ia k o v F il im o n o v /S h u tt e rs to c k 36 V1_CIE_HUM_Claudio_g21Sa_Cap1_016a043.indd 36V1_CIE_HUM_Claudio_g21Sa_Cap1_016a043.indd 36 9/14/20 6:10 PM9/14/20 6:10 PM