Logo Passei Direto
Buscar
Material
páginas com resultados encontrados.
páginas com resultados encontrados.
left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

Prévia do material em texto

FILOSOFIA 
POLÍTICA 
PROFESSOR
Esp. Silvanir Aldá 
ACESSE AQUI 
O SEU LIVRO 
NA VERSÃO 
DIGITAL!
https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/2681
EXPEDIENTE
C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. 
Núcleo de Educação a Distância. ALDÁ, Silvanir.
Filosofia Política. 
Silvanir Aldá.
Maringá - PR.: UniCesumar, 2020. Reimpresso em 2023. 
216 p.
“Graduação - EaD”. 
1. Filosofia 2. Política 3. Sociedade. EaD. I. Título. 
FICHA CATALOGRÁFICA
NEAD - Núcleo de Educação a Distância
Av. Guedner, 1610, Bloco 4Jd. Aclimação - Cep 87050-900 | Maringá - Paraná
www.unicesumar.edu.br | 0800 600 6360 
Coordenador(a) de Conteúdo 
Roney de Carvalho Luiz
Projeto Gráfico e Capa
Arthur Cantareli, Jhonny Coelho
e Thayla Guimarães
Editoração
Matheus Silva de Souza
Design Educacional
Amanda Peçanha dos Santos
Jociane Karise Benedett
Revisão Textual
Ana Carolina Ribeiro
Ilustração
André Azevedo
Fotos
Shutterstock
CDD - 22 ed. 101 
CIP - NBR 12899 - AACR/2
ISBN 978-65-5615-078-9
Impresso por: 
Bibliotecário: João Vivaldo de Souza CRB- 9-1679
Reitor Wilson de Matos Silva Vice-Reitor Wilson de Matos Silva Filho Pró-Reitor de Administração Wilson de 
Matos Silva Filho Pró-Reitor Executivo de EAD William Victor Kendrick de Matos Silva Pró-Reitor de Ensino de 
EAD Janes Fidélis Tomelin Presidente da Mantenedora Cláudio Ferdinandi
DIREÇÃO UNICESUMAR
NEAD - NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
Diretoria Executiva Chrystiano Mincoff, James Prestes, Tiago Stachon Diretoria de Design Educacional 
Débora Leite Diretoria de Graduação e Pós-graduação Kátia Coelho Diretoria de Permanência Leonardo 
Spaine Head de Curadoria e Inovação Tania Cristiane Yoshie Fukushima Gerência de Processos Acadêmicos 
Taessa Penha Shiraishi Vieira Gerência de Curadoria Carolina Abdalla Normann de Freitas Gerência de Contra-
tos e Operações Jislaine Cristina da Silva Gerência de Produção de Conteúdo Diogo Ribeiro Garcia Gerência de 
Projetos Especiais Daniel Fuverki Hey Supervisora de Projetos Especiais Yasminn Talyta Tavares Zagonel
BOAS-VINDAS
Neste mundo globalizado e dinâmico, nós tra-
balhamos com princípios éticos e profissiona-
lismo, não somente para oferecer educação de 
qualidade, como, acima de tudo, gerar a con-
versão integral das pessoas ao conhecimento. 
Baseamo-nos em 4 pilares: intelectual, profis-
sional, emocional e espiritual.
Assim, iniciamos a Unicesumar em 1990, com 
dois cursos de graduação e 180 alunos. Hoje, 
temos mais de 100 mil estudantes espalhados 
em todo o Brasil, nos quatro campi presenciais 
(Maringá, Londrina, Curitiba e Ponta Grossa) e 
em mais de 500 polos de educação a distância 
espalhados por todos os estados do Brasil e, 
também, no exterior, com dezenas de cursos 
de graduação e pós-graduação. Por ano, pro-
duzimos e revisamos 500 livros e distribuímos 
mais de 500 mil exemplares. Somos reconhe-
cidos pelo MEC como uma instituição de exce-
lência, com IGC 4 por sete anos consecutivos 
e estamos entre os 10 maiores grupos educa-
cionais do Brasil.
A rapidez do mundo moderno exige dos edu-
cadores soluções inteligentes para as neces-
sidades de todos. Para continuar relevante, a 
instituição de educação precisa ter, pelo menos, 
três virtudes: inovação, coragem e compromis-
so com a qualidade. Por isso, desenvolvemos, 
para os cursos de Engenharia, metodologias ati-
vas, as quais visam reunir o melhor do ensino 
presencial e a distância.
Reitor 
Wilson de Matos Silva
Tudo isso para honrarmos a nossa mis-
são, que é promover a educação de qua-
lidade nas diferentes áreas do conheci-
mento, formando profissionais cidadãos 
que contribuam para o desenvolvimento 
de uma sociedade justa e solidária.
P R O F I S S I O N A LT R A J E T Ó R I A
Esp. Silvanir Aldá
Mestrando em Filosofia pela Universidade Estadual de Maringá. Especialista em 
Psicopedagogia pela SOCIESC (2012). Graduado em Filosofia (2006) e História pela 
Universidade Estadual de Maringá (2013). Publicou os seguintes livros: Oratória – O 
Poder de se Comunicar (2018); As Provas da Existência de Deus Segundo os Filósofos 
(2018); Sócrates em: “Só sei que nada sei” (2019).
http://lattes.cnpq.br/2053925565369644
A P R E S E N TA Ç Ã O D A D I S C I P L I N A
FILOSOFIA POLÍTICA
Caro(a) aluno(a), seja bem-vindo(a) ao nosso curso de Filosofia Política! Pretendemos dis-
correr sobre os mais importantes filósofos políticos, desde a antiguidade até a contem-
poraneidade, abrangendo um roll de conceitos, tanto significativos quanto necessários à 
boa compreensão desta ciência, a qual trata do cuidado dos cidadãos e da preservação 
do espaço, local onde ele se expressa e articula o que é mais relevante, desde a vida na 
pólis até a sua dinâmica em sociedades, ditas mais complexas. 
Veremos, na antiguidade, uma política extremamente ligada à ética, em que as ações de 
cada cidadão era de extrema relevância. Não bastava ao grego da antiguidade clássica 
saber o que é o bem, o objetivo era colocá-lo em prática. Vislumbraremos, desde os 
projetos considerados mais difíceis de se implementar, como a calípolis de Platão, até 
algo mais elementar para nós hoje, como a análise da liberdade, com Zizek.
Com Aristóteles, há uma busca pelos direitos mínimos que deveriam ser garantidos 
aos cidadãos, para que pudessem evitar os trabalhos manuais e, assim, voltar-se à 
contemplação. O estagirita falará de um tipo de governo específico para cada tipo de 
povo. Depois, com Cícero, teremos o resgate do amor pátrio, em que o homem tem de 
se esforçar para fundar o Estado. 
Avançamos até Maquiavel, neste momento, abordaremos o verdadeiro objetivo de sua 
obra, livrando o filósofo de interpretações derivadas de leituras apressadas de sua teoria. 
O filósofo florentino objetivava responder à instabilidade política, na qual se encontrava 
a Itália, onde viveu, ensinando, ainda, como um príncipe deveria agir para se manter no 
poder. Sua obra traz outro objetivo nobre: alertar a população de sua época sobre os 
exageros que podem ser cometidos por um príncipe.
Com as teorias dos filósofos contratualistas, perceberemos certos níveis de instabili-
dade no estado de natureza, mais hostil na visão de Hobbes, e com um agravante, o 
medo do sujeito, em um lugar onde “o homem pode ser o lobo do homem”. De forma 
mais abrangente, na teoria de Locke e o liberalismo, o estado de natureza chega, com 
Rousseau, a ser um estado ideal para se educar a criança e o jovem (ao menos até os 
25 anos de idade).
D A D I S C I P L I N AA P R E S E N TA Ç Ã O
Arendt, posteriormente, mostrará uma política voltada para crítica aos elementos dos 
regimes totalitários e ao Nazista. Já Bobbio trará à tona a preocupação com a questão 
democrática, deixando mais clara a diferença entre a democracia direta e a democracia 
representativa. Inclusive afirmará que a pior democracia conseguirá ser melhor do que 
qualquer regime totalitário. E Rawls ressignificará o liberalismo, trabalhando a noção 
de justiça com equidade.
Encerraremos nossas discussões, na quinta unidade, com o polêmico Karl Marx, desta-
cando as questões envolvidas em seu conceito de trabalho alienado e de ideologia co-
munista, que, por sua vez, assusta tantas pessoas. Um filósofo de marca maior, como foi 
Karl Marx, não poderia deixar de ter uma legião de seguidores. Não daria para nomear e 
explanar a teoria de todos os seguidores de Marx, aqui, de forma que expusemos alguns 
dos mais relevantes: Antonio Gramsci e a questão do Estado Capitalista; Georg Lukács 
e o conceito de politicidade e a dignidade do ser social; Louis Althusser e os Aparelhos 
Ideológicos do Estado e, por fim, a questão da liberdade em Slavoj Zizek.
ÍCONES
Sabe aquela palavra ou aquele termo que você não conhece? Este ele-
mento ajudará você a conceituá-la(o) melhor da maneira mais simples.
conceituando
No fim da unidade, o tema em estudo aparecerá de forma resumida 
para ajudar você a fixar e a memorizar melhor os conceitos aprendidos. 
quadro-resumo
Neste elemento, você fará uma pausa para conhecer umpouco 
mais sobre o assunto em estudo e aprenderá novos conceitos. 
explorando ideias
Ao longo do livro, você será convidado(a) a refletir, questionar e 
transformar. Aproveite este momento! 
pensando juntos
Enquanto estuda, você encontrará conteúdos relevantes 
online e aprenderá de maneira interativa usando a tecno-
logia a seu favor. 
conecte-se
Quando identificar o ícone de QR-CODE, utilize o aplicativo Unicesumar 
Experience para ter acesso aos conteúdos online. O download do aplicativo 
está disponível nas plataformas: Google Play App Store
CONTEÚDO
PROGRAMÁTICO
UNIDADE 01 UNIDADE 02
UNIDADE 03
UNIDADE 05
UNIDADE 04
FECHAMENTO
A POLÍTICA NA 
ANTIGUIDADE
10
FILOSOFIA POLÍTICA 
MODERNA
56
92
OS FILÓSOFOS 
CONTRATUALISTAS
132
A FILOSOFIA POLÍTICA 
CONTEMPORÂNEA
166
MARX E AS 
INFLUÊNCIAS DE SUA 
TEORIA POLÍTICA
206
CONCLUSÃO GERAL
1
A POLÍTICA NA
ANTIGUIDADE
PLANO DE ESTUDO 
A seguir, apresentam-se as aulas que você estudará nesta unidade: • Construção do Ideal Político em 
Platão • A Política como Busca da Felicidade (eudaimonia) em Aristóteles • Ação Política em Cícero.
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM 
Entender a construção da cidade ideal em Platão e qual o melhor modelo político a ser implantado • 
Compreender, em Aristóteles, qual é o modo de vida que proporciona ao cidadão a boa vida e pode 
ser traduzida como felicidade • Verificar na política de Cícero quais os modos de agir que, de fato, 
contribuirão para a construção da república.
PROFESSOR 
Esp. Silvanir Aldá
INTRODUÇÃO
A organização política na antiguidade surge da tentativa e da experiência do 
homem em definir uma melhor forma de convivência entre os cidadãos com-
ponentes de uma polis, palavra que deu origem ao vocábulo cidade. Os cuidados 
com a cidade e com o cidadão sempre entram nessa pauta, por isso, aprenderemos 
mais a respeito desses assuntos, nas teorias de alguns dos mais relevantes filósofos, 
as quais a humanidade teve a oportunidade de acessar, por meio de seus escritos.
Nesta unidade, veremos, mais propriamente, os pensamentos de Platão, no 
que se refere à construção do ideal político; também comtemplaremos, em Aris-
tóteles, a busca do bem mais precioso do homem, que é a felicidade e o pensa-
mento; e, em Cícero, conheceremos a ação política.
Platão parte do fator de que o homem tem necessidade de se unir a outros 
para garantir sua preservação. A construção da cidade perfeita para ele, a calípolis 
(cidade bela), passa, primeiro, pela construção de um político que seja filósofo. E 
o que isso quer dizer? Platão aponta a necessidade de uma pessoa preparada no 
poder. O governante deve vir da classe dos guardiões e não possuir interesses 
financeiro, familiar e particular. É alguém que estará a serviço do povo, de modo 
a não se corromper. A monarquia seria a forma de governo ideal.
O bem comum, para Aristóteles, será o bem do próprio indivíduo, o cidadão 
ter condições de ter bens e investir para ter uma vida digna na polis. Não é que 
se tenha perdido a visão de conjunto. Veremos que quem não vive, em comuni-
dade, não se encaixa no que seria considerado o bem comum e, portanto, estaria 
distante do ideal de felicidade. Cada povo deveria ter um governo que lhe fosse 
mais apropriado. Por exemplo, um povo voltado ao comando político, deveria ser 
regido pela monarquia; um povo que se sujeita, mesmo sendo livre, estaria mais 
voltado à aristocracia. Nesse sentido, a democracia seria a pior forma de governo.
Por último, veremos, na política de Cícero, que o amor pátrio deve ser 
ressaltado, e, para tanto, o homem deve se empenhar na fundação e na con-
servação do estado. A justiça será tema de destaque, pois é por meio dela 
que se torna possível o governo da república. Apesar da influência que teve 
dos gregos, Cícero tentará promover a dissolução dos costumes gregos e ro-
manos. A família terá ressaltada sua importância e a felicidade se baseará na 
verdadeira constituição política. A ideia é termos uma república sábia e bem 
organizada. O coroamento de sua teoria apontará para o fato de que o bom 
político, o qual ajuda a construir a república, de modo honroso e justo, terá 
um lugar de recompensa após a morte.
U
N
ID
A
D
E 
1
12
1 
CONSTRUÇÃO DO 
IDEAL POLÍTICO 
EM PLATÃO
Antes de entrarmos, mais propriamente, no ideal político de Platão, vemos que 
o conceito de ideia, palavra que vem do grego idein, significa ver e está ligado à 
questão da forma. Em Platão, tal conceito se refere à realidade supra-sensível, ao 
modelo, ao paradigma inteligível e, por fim, ao ser puro.
A Aspiração Política de Platão
Em sua mocidade, Platão (c. 428-347 a. C.) aspirava ao mesmo que qualquer ou-
tro cidadão grego: tornar-se independente, ingressar na política. Tanto mais para 
Platão, do que para qualquer outro, as coisas corriam nesse sentido, uma vez que 
ele descendia de família nobre. Do lado paterno, tinha como parente o Rei Codro 
e, do lado materno, descendia de Solão, além de contar com alguns tios influentes, 
no governo da cidade. Depois que o partido aristocrático subiu ao poder, trabalhar 
para o bem público, isto é, para a cidade, seria um caminho natural a percorrer.
Encerrado o governo dos Trinta tiranos (hoje chamamos de ditadores), a 
oligarquia (de Oligoi, melhores e arqué, princípio, ou seja, é o que chamamos de 
governo dos melhores), toma lugar a democracia (demo, povo e kratos, gover-
no, isto é, o governo do povo). Houve, ainda, na cidade de Dião, pessoas mortas 
por praticarem, depois da “abolição da tirania”, os ideais poéticos de Platão. Este 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
13
filósofo almejava a política, como forma de contribuir com o bom andamento 
da cidade, mas devido às mancumunações dos políticos poderosos, seu amigo 
Sócrates acaba sendo acusado injustamente, condenado e morto, o que faz com 
que ele não queira mais entrar na política. Tal morte teria mesmo influenciado a 
obra de Platão, deixando marcas visíveis de amadurecimento (PLATÃO, 1970).
E quer governem a favor ou contra a vontade do povo; quer se inspirem ou não em leis 
escritas, quer sejam ricos ou pobres, é necessário considerá-los chefes, de acordo com o 
nosso atual ponto de vista, desde que governem competentemente por qualquer forma 
de autoridade que seja.
(Platão)
pensando juntos
A Política
As obras de Platão que tratam da política são, mais especificamente, a República, 
o Político e as Leis. Podemos notar que a República contrapõe-se ao estado ideal, 
o qual é o estado do espírito, ao estado da política deste mundo. Para Platão, 
a democracia era um regime ruim, porque seria inviável todos mandando ao 
mesmo tempo. Analisando a arte política e o conceito de Estado, estes tratam da 
velha política e do velho Estado, no que concerne à retórica, que era, com certeza, 
seu instrumento mais poderoso. Já, a nova e verdadeira política e o novo Estado 
pautavam-se pela filosofia, uma vez que esse é o único caminho seguro de acesso 
aos valores de justiça e bem, fundamento de toda política ideal.
Se nos perguntarmos sobre o porquê da formação do Estado, veremos, em 
Platão, que esse é fruto da necessidade. O homem não se basta em si mesmo, 
precisa, por sua vez, suprir-se de tudo o quanto seja essencial à sua sobrevivência, 
tanto material quanto moral. Na conformação do Estado, começam a surgir as 
mais variadas profissões. Cada homem nasce com uma determinada aptidão, o 
que lhe permite realizar trabalhos diferentes uns dos outros. Os trabalhos essen-
ciais para a manutenção da vida na polis (cidade Estado grega) estavam voltados 
à agricultura, ao artesanato e ao comércio. Quanto à segurança da cidade, havia a 
classe dos guardiões e dos guerreiros que, além desta função, poderiam avançar 
U
N
ID
A
D
E 
1
14
na conquista de outros territórios, ao visar a expansão do domínio político-geo-
gráfico. As primeiras profissões, aqui citadas, não necessitavam de uma educação 
especial, enquanto que o guerreiro, além da ginástica para o corpo, praticava a 
poesia e a música, como objetivo de fortalecer a alma. Dentre os guerreiros, há, 
também, outra distinção: de onde irá sair aqueles que irão obedecer e se colocar a 
serviço dos que irão mandar? Os que serão detentores do mando da cidade serão 
os governantes dessa. Das classes que indicamos, à primeira, a qual envolve os 
agricultores, comerciantes e artesãos, não é concedido bens, nem exageradamente 
nem de modo escasso. Já, os defensores do Estado participam de uma mesa co-
mum, sem a concessão de bens e/ou riquezas. Ainda, em Padovani e Castagnola, 
podemos ver isto posto da seguinte forma:
 “ Segundo Platão, o estado ideal deveria ser dividido em classe so-
ciais. Três são, pois, estas classes: a dos filósofos, a dos guerreiros, a 
dos produtores, as quais, no organismo do estado, corresponderiam 
respectivamente às almas racional, irascível e concupiscível no orga-
nismo humano. À classe dos filósofos cabe dirigir a república. Com 
efeito, contemplam eles o mundo das ideias, conhecem a realidade 
das coisas, a ordem ideal do mundo e, por conseguinte, a ordem da 
sociedade humana, e estão, portanto, à altura de orientar racional-
mente o homem e a sociedade para o fim verdadeiro. Tal atividade 
política constitui um dever para o filósofo, não, porém, o fim supre-
mo, pois este fim supremo é unicamente a contemplação das ideias.
À classe dos guerreiros cabe a defesa interna e externa do estado, de 
conformidade com a ordem estabelecida pelos filósofos, dos quais 
e juntamente com os quais, os guerreiros receberam a educação. Os 
guerreiros representam a força a serviço do direito, representado 
pelos filósofos.
À classe dos produtores, enfim, - agricultores e artesãos - submetida 
às duas precedentes, cabe a conservação econômica do estado, e, 
consequentemente, também das outras duas classes, inteiramente 
entregues à conservação moral e física do estado. Na hierarquia das 
classes, a dos trabalhadores ocupa o ínfimo lugar, pelo desprezo com 
que era considerado por Platão - e pelos gregos em geral - o trabalho 
material (PADOVANI; CASTAGNOLA, 1984, p. 120-121).
U
N
IC
ES
U
M
A
R
15
Em uma primeira instância, aquele que deve ser escolhido pelo legislador, 
segue uma sucessão hereditária, mas em alguns casos, pode ser escolhida 
uma criança de uma classe inferior, a qual tenha excepcionais habilidades. 
Aliás, um filho de um guardião que fosse considerado insatisfatório poderia 
ser degradado (RUSSELL, 1969).
Para firmar as qualidades de cada classe social, Platão recorre ao mito 
fenício das raças, o qual tomou emprestado de Hesíodo. Apesar de todos os 
homens serem originariamente iguais e irmãos, pois todos são filhos da terra, 
os deuses dotaram suas almas de composições diferentes. Na alma dos guar-
diães perfeitos, colocaram ouro; na alma dos guardiães auxiliares, colocaram 
prata e, na dos trabalhadores e artesãos, colocaram bronze e ferro. Dessa for-
ma, cada cidadão deveria seguir a orientação de sua alma, ou seja, realizar, da 
melhor forma possível, as atribuições que lhes foram dadas (FRAILE, 1971).
O fim, no sentido de finalidade, o objetivo da política é o bem do homem 
e, uma vez que o sentido de homem, para Platão, está mais fundado na questão 
da alma, e o corpo é só o recipiente que aprisiona sua alma, o bem do homem 
maior é o cuidado com sua alma. A verdadeira política é esta, a qual visa cui-
dar da alma. Já, o cuidado apenas com o corpo seria a falsa política. Porém é 
necessário ter atenção, aqui, pelo fato de que Platão não apregoa o menosprezo 
do corpo, muito pelo contrário, em sua escola, a Academia, além dos estudos, 
isto é, dos exercícios intelectuais, havia também, muitos exercícios físicos 
(ginástica). A ideia era que, com o cuidado do corpo, seriam amenizadas as 
possíveis dores e os sofrimentos que o corpo pudesse exercer sobre a alma.
Ao adentrar um pouco mais na ideia de bem, entendemos que esta seria 
o centro da “religião” platônica. Platão rechaça o antropomorfismo, que seria 
a atribuição de forma humana aos deuses bem como de qualidades morais. 
Se, por um lado, ele tenta eliminar os deuses da mitologia popular grega e da 
poética, por outro acaba aceitando o politeísmo.
 “ É um politeísmo estranho, cujas divindades são os astros e o 
cosmos, animados e racionais, os assim chamados deuses visíveis, 
subordinados ao Demiurgo, bem como à ideia do Bem e às outras 
ideias. Platão pode, pois, conservar - reformada e purificada - a 
religião helênica, como religião do seu estado ideal (PADOVANI; 
CASTAGNOLA, 1984, p. 122).
U
N
ID
A
D
E 
1
16
Temos, aqui, uma ideia de religião que foge ao tradicional, mas que é, também, 
uma busca pela verdade. Da mesma forma que seu mestre Sócrates, Platão 
não tem o intuito de negar os deuses da cidade, uma vez que eles não repre-
sentam um empecilho para a construção da cidade ideal. O Estado e a lei 
sempre constituíram o modelo e apontamento de modo de vida do cidadão. 
Enquanto indivíduo, o homem tinha de se mostrar virtuoso, isso significava 
adotar a virtude do cidadão. A realização de uma vida justa e digna passava 
pelo fato de servir ao Estado, da melhor forma possível.
A República
A República de Platão é constituída de três partes: A primeira parte, que vai 
até quase o final do Livro V, trata da constituição de uma comunidade ideal, 
nesse trecho está inclusa a questão das utopias. Na segunda parte, livros VI e 
VII, o filósofo trata da definição do “filósofo”. E, a terceira parte, livros VIII a 
X, consiste em uma discussão sobre quais seriam as espécies de constituições 
reais, quais os seus méritos e defeitos.
Dentro do Estado, as leis são iguais para as classes, note-se aqui que não dis-
semos para todas as classes, mas para cada classe, de forma separada. A República 
é iniciada a partir de uma questão que nos arremete à vida após a morte (ancião 
falando da proximidade da morte e o quanto foi bom se livrar dos desejos car-
nais), quanto termina com o mito do “juízo final”, o mito de Er. A República traz 
um assunto que vai além do plano físico. Toda essa preparação para governar 
acaba sendo, também, uma preparação para atingir um lugar melhor após a 
morte e, assim, acessar toda forma de conhecimento.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
17
O que foi exposto, anteriormente, aponta para o fato de que atingir o bem, 
aqui na terra, e o esforço para ser filósofo seriam o passo necessário para 
atingir um bem maior na vida, depois da vida terrena. A ideia do governante 
ideal é o Rei filósofo e esse não pode atingir o próprio bem, se não conseguir 
levar a sociedade a agir bem. A calípolis (de cali, belo e polis, cidade) não é 
somente a construção de uma cidade (casas, ruas, praças... belos), mas sim 
e, primordialmente, a construção do homem de bem. Não basta saber o que 
é o bem, este deve ser posto em prática. Na República, o homem só pode se 
explicar moralmente, se explicar-se politicamente (REALE, 1994).
As interpretações da República são as mais variadas possíveis. Há, por exem-
plo, quem a tenha comparado com um comunismo ou, até mesmo, com o so-
cialismo, no que diz respeito à proposta de colocar todos os bens em comum e a 
educação dos filhos a partir dos 7 anos. Entretanto somente algumas passagens 
lembram o comunismo, não sendo o caso uma postura tão “radical”. Para uma 
determinada classe, no que se refere aos guardiões e aos soldados, quanto à eco-
nomia, Platão propõe sim um completo comunismo, apesar de nem sempre se 
mostrar de uma forma muito clara. 
 “ Os guardiões terão pequenas casas e farão uso de alimentos simples; 
viverão como num acampamento, comendo juntos em grupos; não 
devem ter propriedade privada, além do absolutamente necessário. 
O ouro e a prata são proibidos. Embora não sejam ricos, não há 
razão para que não se sintam felizes: todavia, o objeto da cidade é 
o bem de todos, conjuntamente, e não a felicidade de uma única 
classe. Tanto a riqueza como a pobreza são prejudiciais e, na cidade 
de Platão, não existirá nem uma coisa, nem outra. Há um argumento 
curioso com relaçãoà guerra: o de que será fácil comprar aliados, já 
que nossa cidade não deseja participar de modo algum dos despojos 
da vitória (RUSSELL, 1969, p. 129).
Russell (1969), incisivamente, afirma, ainda, que o fato de dizer que o Só-
crates platônico aplicava o comunismo à família seria fingimento da parte 
deste, no sentido de que pareceria realmente algo exagerado pôr algumas 
coisas em comum, como a esposa e os filhos. Mas ganha destaque afirma-
ções de que, por exemplo, as meninas deviam ter o mesmo tipo de educação 
que os meninos e junto deles, de modo que, também aprendessem música, 
ginástica e a arte da guerra.
U
N
ID
A
D
E 
1
18
A Justiça
A questão da justiça, no livro IV da República, está 
estreitamente ligada ao fato de que todos na cidade 
devem realizar o seu trabalho, sem se intrometerem 
em coisas que não lhes diz respeito. A cidade atinge 
o ponto ideal quando todos fazem exatamente o que 
lhes compete.
A justiça é o ideal a ser perseguido pelo 
governante do Estado perfeito. Qual seria a 
natureza e o valor da justiça? Ao tratar da 
justiça, temos que trazer à discussão outras 
três virtudes, as quais seriam as virtudes da 
sapiência, a da fortaleza e a da temperança. 
Elas compõem o que chamamos de vir-
tudes cardeais, assim o Estado que visa 
atingir a perfeição deve, pois, atingir as 
quatro. A sapiência (sophia) está fun-
dada no bom conselho, o que difere 
das ciências técnicas particulares e ajuda 
no entendimento de como melhor se relacionar consigo mesmo, 
com a sua cidade e com as cidades circunvizinhas ou de outro 
país. A Fortaleza, ou a coragem (andreia), é o pensar e decidir 
sobre as coisas perigosas ou não. A ponderação ou a temperança 
(sophrosyne) é uma ordem, domínio ou disciplina dos prazeres 
e dos desejos. E, por último, a justiça (dikaiosyne) está ligada ao 
fato de que, para o bem do Estado e da sua construção, cada um 
deve fazer o que lhe é próprio por natureza, isto quer dizer, por lei, 
aquilo para o que fora chamado a fazer. Para obtermos um 
Estado justo, cada cidadão deve ser justo (PLATÃO, 2000).
A palavra “justiça”, como é, ainda, usada no direito, assemelha-se mais ao conceito de 
Platão do que ao sentido em que é empregada na especulação política. 
(Bertrand Russell)
pensando juntos
U
N
IC
ES
U
M
A
R
19
Apesar de Platão não ter sistematizado outras virtudes em suas obras, muitas 
outras virtudes aparecem em suas obras, como:
Virtudes intelectuais: prudência, conhecimento, conhecimento intelectual, 
ciência, sabedoria, compreensão e bom conselho.
Virtudes morais: justiça, moderação, fortaleza, domínio de si mesmo, piedade 
(justiça para com os deuses), alegria, bom humor, magnificência, arte e habilidade 
industriosa.
Verificamos que o filósofo não trabalha somente com as virtudes, mas cita tam-
bém quais os vícios passíveis de serem assumidos pelos homens não comprome-
tidos com a causa da República, a saber:
Vícios: estupidez, ignorância, intemperança, injustiça, prejuízo ou dano, covar-
dia, moleza, arrogância, insolência, mau humor, baixeza, maldade, adulação, inveja 
e descontentamento.
A República é o grande projeto político de Platão. Esse projeto conta com a 
educação como pilar para a construção da cidade ideal. Sócrates é o personagem 
principal deste diálogo. Ao ser convidado para ir à casa de Céfalo, onde este diz estar 
muito bem, porque em sua idade (velhice) ele tem agora mais tempo de se dedicar 
ao filosofar. Uma vez tendo dinheiro, ele pode reparar as injustiças que cometeu 
durante a vida. A justiça é o assunto que está entremeado durante toda a República. 
O que, realmente, é a vida feliz? Ter muito dinheiro ou viver a virtude da justiça?
Em outra passagem, Céfalo, no início da República, diz a Sócrates: “A jus-
tiça é dar a cada um o que lhe pertence! ” . Ao passo que Sócrates lhe rebate, 
contando sobre uma determinada situação em que, por exemplo: um amigo que 
não está gozando de suas faculdades mentais lhe pede que guarde sua arma. 
Mais tarde este amigo volta e diz que quer a arma de volta. O que é mais correto: 
seguir a máxima – “A justiça é dar a cada um o que lhe pertence!” – e devolver 
a arma, ou você se esquiva de devolvê-la, porque, afinal, este pode fazer algum 
a si mesmo ou, ainda, ferir outros? Dito isto, Céfalo concorda com Sócrates e o 
deixa conversando com seu futuro herdeiro, seu filho Polemarco. Este, por sua 
vez, dá a seguinte definição de justiça: “Devemos fazer bem aos amigos e mal 
aos inimigos!”. Sócrates, imediatamente, opõe-se a essa ideia, dizendo que fazer 
o mal seria incompatível com a ideia de justiça, porque prejudicar alguém nunca 
seria o melhor caminho. 
Em seguida, entra em cena o sofista Trasímaco que, de imediato, irrita-se com 
Sócrates, dizendo ser este, na verdade, quem estaria se utilizando de sofismas. 
Trasímaco dá a seguinte definição: “A justiça é a conveniência do mais forte!”. 
U
N
ID
A
D
E 
1
20
Dessa forma, a justiça seria uma produção, conforme a conveniência do mais 
forte. Por ser mais forte uma determinada pessoa, faria valer sua vontade a seu 
mero prazer. Sócrates dá o exemplo de um homem forte, lutador de pancrácio 
(uma luta onde valia tudo). Como a lenda diz que tal lutador devorava um boi 
por dia. Então o que seria correto? Se “A justiça é a conveniência do mais forte!”, 
tanto mais justo seríamos se devorássemos um boi por dia. Nisso, Trasímaco se 
irrita e coloca uma segunda definição: “Ser injusto, mas parecer justo!”. Ele diz 
isso, porque a vida do injusto parece valer mais à pena, uma vez que ele só se dá 
bem. Para Trasímaco em todas as artes é assim, por exemplo, o médico cuidaria 
do paciente para ganhar dinheiro, não porque estaria preocupado com a saúde. O 
pastor cuidaria da ovelha para tosquiá-la. Mas, para Sócrates, cada arte tem uma 
finalidade própria. A medicina visa à saúde e o pastoreio visa o bem das ovelhas. 
De modo que o bem da arte da medicina ou da arte do pastoreio está, exatamente, 
em algo que já está inscrito em cada uma destas artes.
No segundo livro da República, entrando Sócrates em conversa com Glauco, 
temos a seguinte fala deste: “dizem que cometer uma injustiça é por natureza 
um bem, e sofrê-la, um mal, mas que ser vítima de injustiça é um mal maior 
do que o bem que há em cometê- la” (PLATÃO, 2000, p. 358). Por meio desta 
concepção é que as leis foram estabelecidas, visando que as pessoas não sejam 
vítimas de injustiça e não possam cometê-las. 
A vida em sociedade traria essa segurança. Essa seria a gênese e a essência da 
justiça. O que se quer, aqui, é que não se pague a pena de ser injustiçado e, por 
outro lado, que não seja o cidadão impedido de vingar uma injustiça. Glauco 
argumenta de modo sofístico no trato do conceito de justiça. Como comenta 
Belini (2009): “Ela (a justiça) é apenas um pacto entre os homens por natureza 
destinados a receberem injustiças sem poder cometê-las” (BELINI, 2009, p. 57). 
Uma vez que as leis estejam postas, é justo quem lhes obedece e injusto quem 
deixa de fazê-lo. Aquele que é incapaz de cometer uma injustiça é justo, mas 
aquele que pratica a justiça, a pratica, exatamente, por ser incapaz de fazê-la. Se 
a justiça não for estimada por si mesma e for praticada pelos incapazes, pode-se 
dizer que o é pelos fracos. 
No diálogo, Críton ou Do Dever, de Platão, Críton conversa com Sócrates 
sobre o que é e o que não é o justo. Trazemos, aqui, uma passagem de profunda 
relevância, que além de tratar da justiça, também é o momento exato em que 
Sócrates defende que entregar sua vida seria o mais justo, isto é, mostra também 
sua disposição para cumprir aquilo que ele considerava ser seu dever:
U
N
IC
ES
U
M
A
R
21
 “ SÓCRATES - Portanto, nunca se deve cometer injustiça, nem pa-
gar o mal com o mal, seja lá o que for que nos tiverem feito, portan-
to cuidado, Críton, e que ao aceder-me nisto não te voltes contra 
tua opinião, porque há poucos que concordem quanto a isso. 
[...].
SÓCRATES - Prossigo, ou melhor, te pergunto: o homem que pro-meteu uma coisa justa, deve cumpri-la ou faltar a ela?
CRÍTON - Deve cumpri-la.
SÓCRATES - Segundo o que dissemos, se ao sair daqui sem o 
consentimento da cidade, fazemos ou não fazemos o mal preci-
samente aos que não o merecem. Cumpriremos o que convencio-
namos ser justo ou não?
CRÍTON - Não posso responder ao que me perguntas porque, na 
verdade, ó Sócrates, não o entendo.
SÓCRATES - Vejamos se assim o entendes melhor. Se chegado o 
momento de nossa fuga, ou como o queres chamar, nossa saída, as 
leis da República, apresentando-se a nós, nos dissessem: “Sócrates, 
o que vais fazer? Levar teu projeto a cabo não implica destruir-nos 
completamente, uma vez que de ti dependem, para nós, as leis 
da República e a todo o Estado? Acreditas que um Estado pode 
subsistir quando as sentenças legais nele não tem força e, o que é 
mais grave, quando os indivíduos as desprezam e destroem? ” Que 
responderíamos, Críton, a estas e a outras acusações parecidas? 
Quantas coisas não poderiam ser ditas, mesmo por um retórico 
acerca da destruição desta lei que exige o comprimento das sen-
tenças ditadas? Diremos por acaso que a República foi injusta e 
nos julgou mal? É isso que responderemos?
CRÍTON - Sim, Sócrates, é o que lhes diremos.
SÓCRATES - E a isso responderão as leis: “Não convencionamos, 
ó Sócrates, que te submeterias ao juízo da República? ” E tal lin-
guagem nos surpreendesse, talvez então nos dissessem: “Não te 
surpreendas, Sócrates, mas responde-nos, uma vez que estás ha-
bituado a discutir por perguntas e respostas. Diga-nos as queixas 
que tens contra a República e contra nós, para que ajas de molde 
a tudo fazer para nos destruir. Em primeiro lugar, deve-nos a vida, 
uma vez que por nós casou-te teu pai com aquela que te deu à luz 
(PLATÃO, 1996, p. 108-110).
U
N
ID
A
D
E 
1
22
O que pudemos ver aqui é que o Estado é maior que o indivíduo. Se, num mo-
mento, o Estado tudo deu (segurança e bens) à sua família (pais de Sócrates) e, por 
consequência, a ele, este mesmo pode requerer tudo de volta a qualquer instante 
e da “melhor forma” que o desejar.
Para Platão, a justiça no indivíduo e a justiça na cidade consistem essencialmente 
no mesmo (FRAILE, 1971). O governo é visto por Platão como se fosse um grande 
organismo. O grande todo, que é a cidade, é integrado por indivíduos, famílias, clas-
ses sociais, sendo que seus interesses nem sempre convergem para o mesmo objetivo. 
Como poderia ser possível uma sociedade com tantos interesses diferentes. Há que 
ter entre suas diversas partes uma ordem que promova unidade, assegurando que 
cada parte realize a função que lhe é correspondente dentro de uma totalidade.
Leis
Enquanto na República empunha-se a bandeira da educação e da justiça, como fun-
damento do Estado, na obra Leis o que será preponderante é a organização da so-
ciedade através das leis. Há que se encontrar, na lei, um fundamento sólido, estável e 
universal, que seja, ainda, independente dos costumes e pluralidade de cada cidadão. 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
23
Inclusive, os sofistas contribuíram para dar relevo a ampliação da lei, ressaltando a 
pluralidade, o relativismo e a diversidade de leis civis locais. Tudo isso contrapõe-se 
às leis naturais, como a estabilidade, a firmeza e a universalidade.
Segundo Fraile (1971), o antigo conceito de lei estava relacionado com o ser e 
a ordem cósmica. Se, em Homero e Hesíodo, a justiça era o fundamento e ordem 
do cosmos, em Platão há o retorno a este conceito, parte por conservar a noção 
genética da lei, que procedia dos costumes. A função da lei era guiar e corroborar 
os costumes, e a dos legisladores era, com suas leis, recorrer, por escrito, e aprovar 
seus costumes. Já de outro lado, parte da lei está baseada na razão (logos), o qual 
consiste em sua essência. E de onde vêm esse logos? Dos deuses, que são, nesse caso, 
a medida de todas as coisas (FRAILE, 1971). O expresso acima se mostrava como 
um pensamento razoável, proveniente da razão verdadeira e reta (logos aletés), que 
era escrito e sancionado pelo legislador, aceito pelo povo e, assim, convertia-se em 
norma comum da cidade (dogma póleos).
Qual seria pois, o objeto da lei? O bem comum da cidade, que estava acima dos 
interesses particulares dos indivíduos. Não se tratava aqui de uma regra rígida e 
inflexível, mas sim racional e que poderia ser ajustada, dependendo das circuns-
tâncias. O legislador deveria ater-se ao que se passava no geral, não apenas aos 
acontecimentos dos casos particulares. O legislador estava, de certa forma, acima 
das leis, podendo ajustá-las ou modificá-las, conforme cada ocasião, mas sempre 
de acordo com a prudência. Por fim, para que os cidadãos respeitassem as leis, o 
legislador deveria ater-se mais às razões que fundamentavam tais leis, do que nas 
possíveis penas que seriam aplicadas aos transgressores.
As Formas de Governo
A constituição da cidade se parece com a correspondente às almas distintas do 
homem. Na República, são postas as formas de governo que veremos a seguir. A 
sociedade está dividida em classes, e os regimes políticos se degeneram, partindo 
do que Platão considera o mais perfeito, que seria a aristocracia, passando pela ti-
mocracia, oligarquia e democracia, chegando à tirania, o qual seria o pior de todos, 
por não apresentar nada de bom. 
U
N
ID
A
D
E 
1
24
Em sua obra Político, Platão trata das formas de governo de modo mais re-
sumido, assim, temos três formas fundamentais: a monarquia, a aristocracia 
e a democracia.
 “ A monarquia, unida a boas regras escritas a que chamamos leis, 
é a melhor das seis constituições, ao passo que, sem leis, é a que 
torna a vida mais penosa e insuportável. [...]. Quanto ao gover-
no do pequeno número, sendo o de “poucos”, ele se situa entre 
a unidade e o grande número e é necessário considerá-lo in-
termediário entre os dois outros. Finalmente o da multidão é 
fraco em comparação com os demais e incapaz de um grande 
bem ou de um grande mal, pois nele os poderes são distribuídos 
entre muitas pessoas. Do mesmo modo, está é a pior forma de 
constituição quando submetida à lei e a melhor quando estas são 
violadas (PLATÃO, 1979, p. 251).
 Caberia ao homem imitar a ordem do universo em suas constituições e em 
suas leis. Uma vez, diante da inevitável e progressiva degeneração, propõe 
como remédio a substituição do poder pessoal do monarca pelo poder da lei. 
Estas seriam as 
formas puras, ideais 
e perfeitas (trata-se 
do governo dos 
melhores), na qual 
governaria o homem 
distinto ou por 
poucos homens 
eminentes, que 
regeriam a cidade de 
modo prudente.
Nessa forma de 
governo, haveria uma 
mistura de raças: a de 
ouro, a de prata e a de 
bronze e ferro, em que 
surge muita 
desarmonia e discórdia 
interior. A terra que 
antes era comum, 
divide-se. A ambição 
pelas vitórias e pela 
honra se sobrepõe ao 
pensar e querer 
racional. Por �m, para 
piorar, a classe militar 
se apossa das riquezas 
e oprime as classes 
inferiores, compostas 
pelos lavradores e 
artesãos.
É caracterizada pela 
ambição crescente 
pela riqueza, 
concentrando essa 
nas mãos de uma 
minoria. Neste 
contexto, a cidade
é dividida em duas 
classes antagônicas: 
de um lado, os 
magnatas ricos 
(oligarcas) que detém 
o monopólio do 
dinheiro e posses,
e, do outro lado,
as pessoas 
empobrecidas, que 
carecem, até mesmo, 
dos meios mais 
elementares de 
subsistência.
Se derrotados os 
oligarcas, o povo chega 
ao poder. Há liberdade, 
porém, consiste em uma 
verdadeira anarquia em 
que, pelo fato de todos 
fazerem o que bem 
entendem, acabam por 
se deixarem levar por 
desejos desenfreados.
DEMOCRACIA TIMOCRACIA
OU TIMARQUIA
MONARQUIA
OU ARISTOCRACIA
OLIGARQUIA
O excesso de liberdade 
produz desordem e, 
nesse caso, prevalecem 
os mais ousados e 
violentos.
A preferência do povo 
por um demagogo faz 
com que esse se 
apodere do mando e se 
coloque como tirano, 
suprimindo 
completamente a 
liberdade. 
Estabelece-se dessa 
forma, o reino dainjustiça, imperando a 
desordem, porque se 
rompe a harmonia 
entre as diversas partes 
integrantes do Estado. 
Para Platão, a alma do 
tirano está dominada 
pelos desejos inferiores. 
Mesmo que não 
aparente, sua vida é a 
mais infeliz de todas. 
TIRANIA
U
N
IC
ES
U
M
A
R
25
O que Aristóteles faz não é nos dar uma definição do que é a felicidade, mas sim 
apontar por quais caminhos alcançá-la. Esses caminhos seriam dois: a vida políti-
ca e a moral, a qual se amplia sob o controle da reta razão; e, a vida contemplativa, 
que traz à tona a parte mais divina, a natureza humana, que é a capacidade natural 
de obter a verdade última. 
Política como coisa para o indivíduo
Aristóteles (384 – 322 a. C.) direcionará sua filosofia política para um rumo 
diferente da filosofia política de Platão. Enquanto este último tentou voltar 
todos os indivíduos para a construção e bem da Calipolis, isto é, o que era 
público teria prioridade sobre o que fosse privado, Aristóteles prioriza o in-
divíduo, desconfiando de que não daria certo priorizar o bem público. Ainda, 
outros motivos apontam a crítica de Aristóteles a Platão, como a questão da 
excessiva unidade do Estado, e que ele o converteria depois num indivíduo, 
além da questão da abolição da família. “O comunismo de Platão aborrece 
Aristóteles. Conduziria, diz ele, à irritação contra os indivíduos preguiçosos e 
a toda a sorte de disputas comuns entre companheiros de viagem (RUSSELL, 
1969, p. 219). Ele parece ter se preocupado mais em compreender a realidade 
2 
A POLÍTICA COMO BUSCA DA
 FELICIDADE 
(EUDAIMONIA)
em Aristóteles
U
N
ID
A
D
E 
1
26
política de sua época e, para realizar tal intento, estudou as leis de diferentes 
cidades e quais as formas de governo que existiria em sua época. A Politia, 
que é uma mistura de democracia de aristocracia, seria, segundo ele, a melhor 
forma de organização política. O homem é um zoon politikon, um animal 
político. Faz parte de sua natureza se organizar politicamente. No início de 
Política, Aristóteles diz o seguinte: 
 “ Vemos que toda cidade é uma espécie de comunidade, e toda 
comunidade se forma com vistas a algum bem, pois todas as 
ações de todos os homens são praticadas com vistas ao que lhes 
parece um bem; se todas as comunidades visam a algum bem, é 
evidente que a mais importante de todas elas e que inclui todas as 
outras tem mais que todas este objetivo e visa ao mais importante 
de todos os bens; ela se chama cidade e é a comunidade política 
(ARISTÓTELES, 1997, p. 13).
A teoria presente em Política tem vistas ao bem. É, exatamente, no subsistir 
e colocar o bem em prática, que se pode alcançar o bem comum. A história 
atribui a Aristóteles a frase: “Uma andorinha só não faz verão! ”. Seria exata-
mente essa ideia, a síntese de seu pensamento, onde cada um faz um pouco, 
e faz não o que deseja simplesmente, mas a partir de si e de sua estrutura de 
subsistência, faz aquilo que deve ser feito. 
Aristóteles fala que o homem comum deve ter posses, uma estrutura fi-
nanceira mínima para que possa se preparar e poder participar da vida polí-
tica. É, na polis, que o homem pode desenvolver seu potencial. O bem comum 
da polis é o bem comum do próprio indivíduo, por isso, veremos que apesar 
deste foco no indivíduo, não quer dizer que ele tenha perdido a visão de con-
junto. Alguém que não vivesse a coletividade, sabendo, inclusive, o que era o 
bem comum, seria um deus ou uma fera. Ao colocar o indivíduo à frente da 
discussão, o modelo de comunidade, na qual todos contribuem para o bem 
comum é apresentado. Em sua época, além das pólis, existiam, também, ci-
dades, entretanto era só na polis que teríamos o modelo pelo qual se poderia 
alcançar a vida ideal de bem comum a todos os cidadãos.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
27
A política trata do bem comum e do bom governo da cidade. Já, o objetivo maior, 
possível de ser atingido pelo indivíduo, seria conquistado por meio da ética, que 
está subordinada à política. Pela ética é que se tem a orientação da conduta, daí 
se chega à perfeição e, consequentemente, à felicidade.
Para os gregos, não se podia entender o homem em estado de isolamento. 
Ele é um ser social, componente de uma família e de uma sociedade civil. Fora 
desse esquema não poderia atingir sua perfeição individual. O bem individual é 
subordinado ao bem comum.
A aplicação da ciência política, como pressuposto para se atingir a felicidade, 
está presente em uma obra de Aristóteles, que é a Ética a Nicômaco. A ciência 
da felicidade humana começaria, dessa forma, na ética, e sua última parte estaria 
na obra Política. 
 “ A felicidade humana consistiria em uma certa maneira de viver, e a 
vida de um homem é o resultado do meio em que ele existe, das leis, 
dos costumes e das instituições adotadas pela comunidade à qual ele 
pertence. Na zoologia de Aristóteles o homem é classificado como 
um “animal social por natureza” (Política, 1253a, parágrafo 9), que 
desenvolve suas potencialidades na vida em sociedade, organizada 
adequadamente para seu bem-estar. A meta da “política” é descobrir 
primeiro a maneira de viver que leva à felicidade humana, e depois a 
forma de governo e as instituições sociais capazes de assegurar aquela 
maneira de viver. A primeira tarefa leva ao estudo do caráter (ethos), 
objeto da Ética a Nicômaco; a última conduz ao estudo da constitui-
ção da cidade-estado, objeto da Política (ARISTÓTELES, 1997, p. 7).
A política é uma tensão entre dois pólos: a violência possível e a livre coexistência. Contra 
a força, faz-se necessária a resistência pela força, a menos que se esteja disposto a admitir 
a própria escravização ou a própria destruição. A livre coexistência cria uma comunidade, 
por meio de instituições e de leis. A política da força e a política da parlamentação opõe-se 
por natureza: a combinação de uma e outra tem constituído a prática política até os dias 
de hoje, e, talvez, por tempo indeterminado.
Fonte: Jaspers (2010, p. 66).
explorando Ideias
U
N
ID
A
D
E 
1
28
Para Aristóteles, a política compõe o grupo das ciências práticas, isso quer dizer, 
mais exatamente, que as ciências práticas buscam conhecimento como um meio 
para a ação, justamente o contrário do que é feito pelas ciências teóricas, como 
a metafísica e a teologia, as quais reconhecem que conhecimento é um fim em 
si mesmo. Já, as ciências práticas se dividem em: Ciências poiéticas, as quais são 
as produtivas, que ensinam a fazer alguma coisa, e a outra é a ciência no sentido 
mais específico, a qual trata do modo como devemos agir.
Passando a tratar, mais especificamente, da obra Política, podemos observar que 
os assuntos nela reunidos nem sempre estão muito conectados. Alguns assuntos 
entram repetidos, sem um aviso prévio e a obra referida também carece de um final 
mais “conclusivo”, se assim podemos nos expressar. Na obra Política, encontramos 
três grupos de assuntos ou lições: os primeiros, livros I, II e III são introdutórios, 
abordam a teoria do Estado, em geral, e a classificação das várias espécies de cons-
tituições; os segundos livros IV, V e VI, tratam da política, da natureza das consti-
tuições existentes e dos princípios para seu bom funcionamento; os terceiros livros 
VII e VIII examinam a política ideal, a estrutura da melhor cidade. É, também, 
perceptível que este objetivo ficou inacabado (ARISTÓTELES, 1997, p. 8). 
 “ [...] é evidente em toda a Política o tom de aula, ou exposição de pro-
fessor a alunos, como se se tratasse de apostilas talvez organizadas 
por discípulos com base nas lições do mestre, para sua preservação 
e utilização futura. Daí a forma de certo modo confusa em que a 
obra chegou até nossos dias, levando muitos estudiosos a propor 
uma nova sequência dos livros, por considerarem a disposição tra-
dicional dos mesmos completamente ilógica. Alguns editores mo-
dernos da Política sugeriram que os livros VII e VIII da sequência 
tradicional fossem postos no lugar dos livros IV e V, e os livros IV, 
V e VI fossempostos no lugar dos livros VI, VII e VIII, ou ainda no 
lugar dos livros VI, VIII e VII (ARISTÓTELES, 1997, p. 8).
A ideia, por meio das alterações, seria respeitar a ordem lógica dos conteúdos. A 
obra Política é um dos maiores clássicos da política, mantendo, por isso mesmo, a 
atualidade dos temas, nessa, abordados. De forma que sobressaem, ao longo do seu 
tempo de vida, alguns temas peculiares que merecem destaque. Um deles é a defesa 
da escravidão, que o filósofo explica como uma necessidade, uma vez que não se 
tinha máquinas para fazer o trabalho: “[...] se, então, as lançadeiras tecessem e as 
palhetas tocassem cítaras por si mesmas, os construtores não teriam necessidade de 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
29
auxiliar e os senhores não necessitariam de escravos” (ARISTÓTELES, 1997, p. 18). 
Os escravos eram, de fato, os meios de produção da época, isto quer dizer 
que “equivaleriam” às nossas atuais máquinas. Para quem acaba por construir 
um preconceito sobre o filósofo, vale ressaltar que não foi ele que implantou a 
escravidão em sua época, não se trata, dessa forma, de algum tipo de satisfação 
com a situação.
A construção do Estado
Na construção do Estado, fica 
claro que a mais alta espécie de 
comunidade e a que tem o objeti-
vo mais elevado, que é o bem, é a 
família, ou seja, a primeira comu-
nidade. A construção da família, 
entendia-se, calcada em duas rela-
ções, uma entre o homem e a mu-
lher, outra entre amo e escrevo. A 
estas relações Aristóteles chamava 
de naturais. 
Quanto às famílias, várias delas reunidas formam uma aldeia; as aldeias, por 
sua vez, reunidas darão origem a um Estado. A ideia que verificamos estar pre-
sente aqui é mais exatamente a de organismo, e isso se dá, por exemplo, com uma 
mão, quando há a destruição do corpo não é mais uma mão. Se o propósito da 
mão é o de segurar as coisas, como poderá fazê-lo se desmembrada do corpo e 
este não tiver mais vida? Assim, também acontece com o indivíduo. Esse jamais 
poderá alcançar seus objetivos se não pertencer a um estado.
Para Aristóteles, aquele que fundou o Estado foi o maior dos benfeitores, uma 
vez que, sem as leis, o homem seria o pior dos animais. A lei depende do Estado 
para sua existência. O Estado não teria outro fim senão o de tornar a vida boa. “E 
o Estado é a união de famílias e aldeia numa vida perfeita e autossuficiente, com 
o que queremos dizer uma vida feliz e honrada” (ARISTÓTELES, 1997, 1281b). 
E ainda: “Uma sociedade política existe para a causa de ações nobres, e não de 
mero companheirismo” (ARISTÓTELES, 1997, 1281a). A vida do indivíduo é de 
extrema relevância, mas, na verdade, tudo concorre para o bem do Estado. 
U
N
ID
A
D
E 
1
30
Em torno da discussão sobre a casa (oikos), entra a discussão da escravidão 
novamente, uma vez que o escravo era reconhecido como parte da família. A 
escravidão era considerada conveniente. Afinal, qual outra solução poderia 
ser adotada em seu lugar para aquela época? O escravo deve ser inferior ao 
amo sempre. O cumprimento de seu destino estava na obediência. Enquanto 
alguns indivíduos são destinados à sujeição, outros são destinados a mandar. A 
princípio, os escravos não deveriam ser gregos, mas de uma raça inferior (en-
tretanto, isso não acontecia ao pé da letra), assim, os escravos seriam dotados 
de uma alma inferior. Todos os seres inferiores requerem que alguém superior 
lhe guie. Seria, pois, justo tomar como prisioneiros escravos de guerra? Muitos 
homens, mesmo tendo uma natureza passível de serem escravos, não querem 
se submeter às ordens de outrem. Para Aristóteles, esse seria um caso em que 
haveria licitude em fazê-los escravos.
Quanto ao comércio, existe o uso apropriado e o uso inapropriado das coisas. 
Acerca da aquisição de dinheiro, o modo natural de enriquecer se dá por meio da 
direção da casa e da terra. Há um limite quanto aos ganhos da casa, mas o mesmo 
não se dá com o comércio. A usura é reprovada, porque tira proveito do próprio 
dinheiro e não do objeto natural dele. 
A divisão da sociedade em credores e devedores, não é de agora, desde os gregos 
até hoje, sempre existiu. Quase que na totalidade do tempo, os proprietários de terras 
foram devedores, ao passo que os comerciantes foram credores. Mais à frente, os 
filósofos gregos pertenciam ou eram empregados pela classe proprietária de terras.
Uma cidade é uma multidão de pessoas suficientemente numerosa, e é isso que 
assegura uma vida independente dentro da mesma. A cidade é um todo, e como 
tudo que forma um todo é composto de partes, a cidade assim também o é. Nessa 
perspectiva, quanto ao cidadão, vemos que esse não é nominado cidadão, apenas, 
por ter domicílio em certo lugar, porque se assim fosse, o estrangeiro e os escravos 
residentes também o seriam. Os estrangeiros são obrigados a apresentar um cida-
dão responsável por eles. O cidadão integral é definido pelo fato de ter direito de 
administrar justiça e exercer funções públicas.
Na prática, a cidadania é limitada ao filho pelo lado do pai e pelo lado da mãe, 
e não por um só lado. Como teriam os antepassados se tornado cidadãos? Os go-
vernantes assim o fizeram há várias gerações anteriores (ARISTÓTELES, 1997).
Clístenes, após a expulsão dos tiranos, arrolou nas tribos atenienses muitos 
estrangeiros residentes, tanto imigrantes quanto escravos. Daí surgiu a seguinte 
dúvida: os investidos nelas a receberam legítima ou ilegitimamente. O que 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
31
ocorre numa cidade é de sua responsabilidade, mesmo que o governo mude, 
por exemplo, de oligarquia ou tirania em democracia? Não, um novo governo 
não deve honrar os compromissos e/ou obrigações contraídas pelo governo 
anterior, porque tais compromissos não foram assumidos pela cidade, mas por 
um tirano e, ainda, porque alguns governos têm seus fundamentos na força e 
não no bem comum.
Dever-se-á dizer que uma cidade na qual a população vive no mesmo lugar 
é a mesma cidade, enquanto a população for da mesma raça, apesar de sempre 
haver alguém morrendo e alguém nascendo. Aristóteles questiona se as qua-
lidades de um homem bom são as mesmas de um bom cidadão. Primeiro, ele 
define o cidadão bom como aquele cuja bondade relaciona-se com a constitui-
ção à qual ele pertence e, que por haver várias formas de constituição, não pode 
haver uma só excelência que seja a bondade perfeita de um bom cidadão. Um 
homem bom é aquele que possui uma bondade única, a bondade perfeita, mas 
é possível ser um bom cidadão, sem possuir a bondade característica de um 
homem bom. Como a cidade é constituída por pessoas dissimilares é melhor 
que seja constituída por bons cidadãos. “[...] a excelência do cidadão consiste 
em ser capaz de mandar e obedecer igualmente bem” (ARISTÓTELES, 1997, 
p. 84). Ainda, fica posto que a qualidade específica de um governante deve ser 
o discernimento. 
Só os cidadãos legítimos devem participar do poder ou os artífices tam-
bém devem ser considerados cidadãos para este fim? Aristóteles responde 
que seria complicado o artífice assumir tal posição de governante, por serem 
derivados de estrangeiros ou escravos. Mas a questão se resolve mesmo pelo 
fato de terem, na época, numerosas formas de constituições e, consequente-
mente, diversas espécies de cidadãos em posição submissa para os quais, no 
entanto, estendia-se a cidadania. Em sentido absoluto, o cidadão pode, ainda, 
ser definido como o homem que partilha os privilégios da cidade.
A Constituição
No capítulo IV, do livro III, da Política, Aristóteles faz a análise sobre devermos 
considerar só a existência de uma forma de constituição ou se há várias. Por 
exemplo, nas sociedades democráticas, o povo é soberano, e nas oligarquias uns 
poucos o são, já que elas têm uma constituição diferente.
U
N
ID
A
D
E 
1
32
A autoridade do senhor sobre o escravo, embora na verdade os interesses do 
senhor e do escravo sejam comuns, ambos são adequados pela natureza às suas 
respectivas posições, as quais são exercidas, principalmente, com vistasao inte-
resse do senhor, mas acidentalmente é exercida com vistas ao interesse do escravo, 
pois se o escravo perecer, a autoridade do senhor não sobreviverá.
A constituição significa o mesmo que governo, e o governo é o poder supremo 
em uma cidade. Aristóteles começa a definir algumas formas de governo. Um 
reino é chamado monarquia no governo de mais de uma pessoa. Aristocracia é 
o governo de poucos com vistas ao que é melhor para a cidade e seus habitantes. 
O governo da maioria é o governo constitucional.
Governo Bom Desvio do Governo
Monarquia Tirania
Aristocracia Oligarquia
Gov. Constitucional Democracia
Efetivamente, todos os homens se apegam a justiça, mas só avançam até um certo 
ponto e não dizem qual é o princípio de justiça absoluta em seu todo. Esses ho-
mens parecem se enganar, pensando que a justiça é a mesma coisa que a igualdade 
para todos os homens. A justiça vem a ser igualdade dos iguais entre si, mesmo 
a desigualdade tem a possibilidade de ser justa, desde que não se atribua isso a 
todos, mas a quem é desigual entre si. Não revelar a qualificação das pessoas as 
quais se aplicam tais suposições acaba sendo realizar um mal julgamento. A causa 
disto é que eles julgam, tomando a si mesmos como exemplo e, quase sempre, se 
é um mau juiz em causa própria.
 “ “Todos aqueles que têm interesse num bom governo dão a devida 
consideração à virtude e ao vício em suas cidades.” Qualquer cidade 
digna de assim ser chamada e que “não seja cidade apenas no nome, 
deve estar atenta às qualidades de seus cidadãos, pois de outra ma-
neira a comunidade se torna uma simples aliança, diferindo apenas 
na localização se comparadas com as alianças propriamente ditas 
pois nestas as cidades participantes são separadas umas das outras” 
(ARISTÓTELES, 1997, p. 93-94).
U
N
IC
ES
U
M
A
R
33
A comunidade política deve existir para a prática de ações nobilitantes, não so-
mente para a convivência. 
 “ Em todas as ciências e artes o fim é um bem, e o maior dos bens e 
bem no mais algo grau se acha principalmente na ciência todo-po-
derosa; esta ciência é a política, e o bem em política é a justiça, ou 
seja, o interesse comum (ARISTÓTELES, 1997, p.101). 
Não é possível conceber o cidadão sem que esse participe da política. Além do 
que, seria no mínimo estranho, o indivíduo não se preocupar nem mesmo com 
o seu bem próprio. Quanto à distribuição do poder político e as mais variadas 
pretensões das classes que compõem a cidade e em relação ao poder político, 
vemos que, nas cidades onde o regime democrático fora adotado, instituíram o 
ostracismo. Para tais cidades, a igualdade vinha acima de tudo, de modo que os 
homens considerados excessivamente poderosos passaram a ser condenados 
ao exílio, fosse por sua riqueza, popularidade, ou alguma outra forma de força 
política. Esse banimento da cidade era por tempo determinado.
Formas de Governo
Há várias espécies de governo monárquicos e o modo de governar não é o mes-
mo em todas. A constituição lacedemônia era tida como representativa, e o rei, 
nessa constituição regida pela 
lei, não tinha soberania sobre 
todos os assuntos concernentes 
à guerra e à religião, os quais lhe 
estavam jurisdicionados. Tal go-
verno monárquico é uma espécie 
de comando militar autocrático 
e vitalício. Os governos monár-
quicos de natureza tirânica são 
estáveis, exatamente pelo fato 
de serem hereditários e o poder 
exercido com base na lei.
U
N
ID
A
D
E 
1
34
Na monarquia que existiu entre os antigos helenos, os governantes eram 
chamados aisimnetas. Era uma tirania eletiva, esta diferia dos bárbaros por 
não ser hereditária. Notou-se que, alguns detentores deste tipo de monarquia 
a exerciam vitaliciamente, enquanto outros, por períodos predeterminados, 
ou ainda, até cumprirem certas missões específicas.
Além disso, há, também, a monarquia hereditária, a qual nos remete aos 
tempos heroicos, exercida com o consentimento dos súditos. As espécies de 
governo monárquico são quatro, a primeira:
 “ Existia nos tempos heróicos e era exercida com o consentimento 
dos súditos, mas em esferas bem definidas, pois os reis eram co-
mandantes militares, juízes e dirigentes das cerimônias religiosas.
Governo monárquico entre os povos bárbaros (um despotismo 
hereditário exercido de acordo com a lei).
Governo dos chamados aisimnetas (trata-se de uma tirania ele-
tiva); Vitalício ou por períodos predeterminados.
A quarta, finalmente, é o governo monárquico dos lacedemônios (ela 
pode ser definida simplesmente como um comando militar heredi-
tário vitalício).
Há ainda uma quinta espécie de governo monárquico, quando 
um governante único exerce o poder soberano em todas as ta-
refas, da mesma forma que cada povo e cidade é soberano sobre 
seus próprios assuntos (ARISTÓTELES, 1997, p.111).
A citação talvez explique porque tenham sido os governos monárquicos exis-
tentes nas épocas mais remotas, pois era raro encontrar homens de mérito 
superior, principalmente, porque naquele tempo, as cidades eram pequenas.
Para Aristóteles, o rei pode agir segundo sua própria vontade, em todos os 
assuntos. A monarquia constitucional, por exemplo, não corresponde a um 
tipo especial de constituição. Dentro deste esquema, um comando militar 
vitalício pode existir sob todas as constituições. Exemplo disso, ainda, podem 
ser constituições sob o “comando” da democracia e da aristocracia. Muitos dão 
a um homem o poder soberano para administrar uma cidade.
Na monarquia absoluta, o que temos? Nesse caso, vemos o rei governar todos 
os homens, de acordo com sua própria vontade. Dessa forma, numa cidade, onde 
todos os cidadãos são iguais, todos devem governar e ser governados alternada-
U
N
IC
ES
U
M
A
R
35
mente. “Isto é uma lei, pois um princípio ordenador é uma lei” (ARISTÓTELES, 
1997, p. 115). Para o filósofo, a lei deve, primeiro, educar os magistrados, para que 
estes estejam capacitados a apreciar e decidir sobre os casos pertinentes, tratem 
eles de omissões ou, ainda, outros tipos. 
 “ Quem recomenda o império da lei parece recomendar o império ex-
clusivo da divindade e da razão, mas quem prefere que um homem 
governe, de certo modo também quer pôr uma fera no governo, pois 
as paixões são como feras e transtornam os governantes, mesmo 
quando eles são os melhores homens. Portanto a lei é inteligência 
sem paixões (ARISTÓTELES, 1997, p.116).
Qual seria, então, a natureza do governo monárquico, a do aristocrático, a do 
constitucional? Se um povo for capaz de produzir, por sua própria natureza, uma 
estirpe de qualidades excelentes, e essas se voltarem para o que seja necessário ao 
comando político, esse é um povo feito para a monarquia, isto é, um povo que se 
sujeita, mesmo sendo livre, a serem governados por homens cujas qualidades o 
credenciam para o comando político e feito para a aristocracia. Já a democracia, 
diferente do que pensamos na atualidade, seria o pior dos governos.
A busca da felicidade
O livro VII, cap. I da Política, é focado, mais incisivamente, no que é necessário 
para se atingir a felicidade. Para chegar à melhor forma de governo, tem-se que 
decidir, em um primeiro momento, quais seriam os princípios que nortearão o 
modo de vida mais desejável para os habitantes da cidade. Aristóteles começa 
com a análise dos bens e os classifica em: bens exteriores, bens do corpo e bens da 
alma. Alguém poderia pôr em dúvida que os homens devem tê-los todos? Parece 
que não. Como poderia ser feliz, por exemplo, um homem carecente de “uma 
partícula de coragem”, ou moderação, ou sentimento de justiça, ou se contivesse, 
diante das possibilidades de excessoou, ainda, frente à questão da inteligência, 
assemelhasse, em erros, a uma criancinha ou a um louco. Apesar de querer, em 
qualquer quantidade, as virtudes morais, estas, de modo comedido, Aristóteles 
destaca, que muitos estão preocupados em buscar em excesso a riqueza, os bens 
materiais, o poder e a glória.
U
N
ID
A
D
E 
1
36
Podemos ver que, em outras obras, Aristótelesmostra sua preocupação quanto 
à felicidade. Vejamos o que ele pensa por meio desse excerto da Ética a Nicômaco:
 “ O homem feliz, portanto, deverá possuir o atributo em questão [ele 
se refere aqui à excelência] e será feliz por toda a sua vida, pois ele 
estará sempre, ou pelo menos frequentemente, engajado na prática ou 
na contemplação do que é conforme à excelência. Da mesma forma 
ele suportará as vicissitudes com maior galhardia e dignidade, sendo 
como é, “verdadeiramente bom e irrepreensivelmente tetragonal (re-
ferência a Simônides feita por Platão no Protágoras, 339 B, tetragonal 
significa o que é “quatro vezes reto”, tomando aqui o sentido daquilo 
que seria “quatro vezes perfeito”) (ARISTÓTELES, 1996, p. 132).
E, ainda, na Retórica:
 “ Admitamos que a felicidade é um êxito combinado com a virtu-
de, ou uma existência suprida de recursos suficientes, ou ainda 
uma vida repleta de prazeres acompanhada de segurança, ou ain-
da uma abundância de bens aliada a um bom estado do corpo, 
juntamente com a capacidade de conservá-los e deles fazer uso. 
Quase todos concordam ser a felicidade uma ou mais de uma 
dessas coisas (ARISTÓTELES, 2013, p. 60). 
Tomando as assertivas das três obras , anteriormente, referidas, Política, Ética 
a Nicômaco e Retórica, a qual consenso chegou o filósofo? Para ele “é fácil”, 
deve-se chegar realmente a um consenso. Os homens adquirem e preservam 
qualidades morais graças aos bens exteriores, mas para que se possa preservar 
esses bens, deve-se contar com as qualidades morais.
No livro VII, cap. II e III da Política, chegamos ao ápice da questão política, 
desse querer saber em que consiste a felicidade. Seria a mesma coisa a felicidade 
de cada indivíduo e a felicidade da cidade? Sim. Inclusive, ter riqueza e condições 
para levar a “boa vida” é algo preconizado por Aristóteles.
Podemos perceber, ainda, que Aristóteles não somente fala qual seria a 
melhor forma de governo: “Evidentemente a melhor forma de governo é aque-
la em que qualquer pessoa, seja ela quem for, pode agir melhor e viver feliz” 
(ARISTÓTELES, 1997, p. 223). O filósofo cita, ainda, que algumas pessoas 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
37
acreditam que uma vida, segundo as qualidades morais, é a mais desejável 
e, ainda assim, levanta uma dúvida: é mais desejável uma vida politicamente 
ativa e prática, ou uma vida contemplativa. 
Mesmo aqueles que dizem ser a vida, conforme as virtudes morais, a mais 
desejável, divergem sobre a maneira de segui-la. Aristóteles ressalta que alguns 
desaprovam o exercício das funções de governo, por pensarem que a vida do 
homem livre é melhor que a do estadista. Outros, ainda, pensam que a vida do 
estadista é a melhor, porque “é impossível a um homem que nada faz ser bem-
-sucedido, e o sucesso e a felicidade são a mesma coisa” (ARISTÓTELES, 1997, 
p. 223). Entretanto, o filósofo afirma que há casos em que podemos ver aqueles 
que pensam nas duas formas como corretas.
 “ A ambos os lados devemos dizer que elas estão parcialmente certas 
e parcialmente erradas. Os primeiros estão certos quando dizem que 
a vida do homem livre é melhor que a do déspota, pois é verdade 
que nada há de excepcionalmente meritório em usar um escravo 
enquanto escravo, já que dar ordens acerca de deveres triviais nada 
tem de nobilitante; pensar, porém que todo governo consiste em 
exercer a autoridade de um senhor não é correto, pois a diferença 
entre governar homens livres e governar escravos não é menos que 
a diferença existente entre os próprios homens livres por natureza e 
os escravos por natureza (já mostramos suficientemente esta dife-
rença no princípio desta exposição). Mas elogiar a inação mais que 
a ação não é certo, pois felicidade é ação, e além disto as ações dos 
homens justos e moderados trazem com elas a realização de muitas 
coisas nobilitantes (ARISTÓTELES, 1997, p. 228).
Não é que o supremo bem consiste em ser senhor do mundo, pois isso acarretaria 
em fazer de tudo para se sobrepor ao outro, por exemplo, ao invés de fazer qual-
quer concessão a meu vizinho, eu deveria despoja-lo. Podemos perceber, quanto 
à violação da lei que, um homem que viola a lei não pode praticar algo que seja 
suficientemente para reabilitá-lo de sua transgressão à moralidade.
Uma cidade poderia ser próspera, apesar de ser pequena? Aristóteles não 
diz que uma cidade pequena não possa ser próspera, mas que toda cidade deve 
visar ser eficiente. Dessa forma, a cidade mais qualificada para atingir a pros-
peridade é a maior, assim como poderíamos dizer que Hipócrates, enquanto 
médico, é maior que outro homem.
U
N
ID
A
D
E 
1
38
Enfim, com a teoria política de Aristóteles, podemos perceber que algumas 
ideias, que se mostraram enraizadas na sociedade antiga, não se sustentamem 
nossos dias. Como aponta Ames (2012, p. 28), pode ser exemplo disso: o fato de 
achar que um governo é justo, somente pelo fato de que a maioria toma as deci-
sões, ou a ideia de que política é algo para os especialistas, por ser algo complexo. 
Devido a estes fatores que todos devem, na atualidade, opinar sobre política, 
quanto ao que presta ou não presta à sua justeza ou conveniência. 
3 
AÇÃO POLÍTICA
EM CÍCERO
Natural de Arpino, Marco Túlio Cícero (106-43 a. C.) obteve uma esmera 
educação, chegando a frequentar, após os estudos de eloquência com Filão, a 
casa do senador Múcio Cévola, com o qual adquiriu profundo conhecimento 
das leis. Teria, também, aprendido com sábios gregos de sua época, aumen-
tando, exponencialmente, seu conhecimento (CÍCERO, 2008,, p. 9). Segundo 
Fraile, Cícero leu Platão, Aristóteles, Crantor, Panécio, Clitómaco, Decearco, 
entre outros. Teria, em Atenas, assistido às lições dos epicureus Fedro e Zenão 
e, em Rodes, às de Posidônio. Sua vida política teria compreendido o espaço 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
39
entre os anos 81 e o ano 49 a. C., em que chegou a ocupar os mais altos cargos. 
Partidário que era de Pompeo, quando da derrota desse, foi perdoado por 
César. Nesse espaço de tempo, do ano em que teria se afastado da política 
até a sua morte, foi o momento em que compôs a maior parte de suas obras 
filosóficas (FRAILE, 1971).
Atividade Política
A obra Da República parece ter sido, além da obra de maior repercussão, também 
a que ele mais teria gostado. É um livro relativamente curto, que está dividido 
em seis partes. E quais são os assuntos que figuram na obra? No primeiro livro, 
Cícero faz uma defesa ao amor pátrioe destaca o fato da função e conservação dos 
Estados aproximarem os homens da divindade; no segundo, ele revisa, por meio 
de Cipião, toda a história de Roma, definindo, ainda, o tipo do verdadeiro homem 
político; no terceiro, continuando o mesmo tema, chega à conclusão de que só a 
justiça torna possível o governo da República; no quarto, trata da dissolução dos 
costumes gregos e romanos; no quinto, elogia a família e aponta para o fato de 
que a verdadeira felicidade só poderá ser dada por uma verdadeira constituição 
política, partindo de uma República que seja sábia e bem organizada; e, no sexto 
livro, termina por afirmar a existência de Deus e diz acreditar na imortalidade 
da alma (CÍCERO, 2008). 
É verdade que muito antes do surgimento da política, em ambos os sentidos, os homens 
já viviam em sociedade. Contudo não “faziam política”. Por quê? Porque não pensavam 
sobre esse modo de existir coletivo como algo que dependia deles. Submetiam-se ao po-
der dos chefes como a um destino contra o qual nada pode ser feito. Os gregos são os 
inventores da política, porque a compreenderam como aquilo que depende dos homens. 
Para esta cultura, a maneira como o poder se organiza resulta da vontade dos homens. 
Por isso, a política sempre pode ser diferente e melhor! A política, para os gregos, abar-
ca todas as atividades práticas relativas a um mundo comum. Mesmo aquelas que hoje 
colocamos na esfera “privada”, como a moral, a religião e a educação dos filhos, para os 
gregos são do domínio “público”, isto é, político.
Fonte: Ames(2012, p. 19).
explorando Ideias
U
N
ID
A
D
E 
1
40
O conceito de res publica, para a teoria de Cícero, tem uma certa flexibi-
lidade e traz à tona alguns significados. Pode-se dizer que é a atividade pú-
blica, em relação aos assuntos voltados para a vida pública, como os negócios 
públicos, o interesse público ou seu maior beneficiário, ou pode ser, ainda, a 
comunidade de cidadãos (civitas) ou o povo (populus). Em um sentido mais 
extenso, referindo-se ao patriotismo, podemos dizer que é a nação.
O diálogo Sobre a República trata da política, mas o uso dessa palavra não 
retrata exatamente o que o pensamento romano ou o pensamento de Cíce-
ro queriam dizer. Enquanto a política é um termo grego derivado de polis, 
aqui, devemos falar em civitas, algo distinto e até contrário, uma vez que a 
civitas romana não é, primeiramente, de onde se deduz a condição dos que 
a ela pertencem; ao invés disso, é secundária, por ser o conjunto das pessoas 
(cives) que compõem o povo (populus). O que Cícero faz é tratar dessa base 
humana pessoal, o povo, de modo mais concreto da gestão do que afeta esse 
conjunto humano: a res publica, não diretamente da civitas.
De Re Publica, que é o título desse diálogo, frequentemente, acabou sendo 
traduzido por O Estado ou Sobre o Estado, ao que preferiu-se manter um 
tema mais próximo do original de “república”. Cícero não trata exclusivamente 
de uma forma de governo, mas de todas as formas políticas em geral. Para 
Álvaro D’Ors, falarmos de “Estado” em Cícero seria cair em anacronismo, 
ou seja, situar a discussão em outra época, outro tempo cronológico. Ape-
sar de ser necessário algum tipo de organização em toda convivência social, 
isso não pressupõe necessariamente que seja em forma de Estado. O estado, 
propriamente dito, é algo que existe somente a partir do século XVI, o qual 
apresenta uma teoria e uma realidade prática e concreta muito diferenciadas 
(CICERÓN, 2002).
Cícero destacava a superioridade da atividade política sobre a questão 
teorética. Ao relatar isso a seu irmão Quinto, recordava como, estando os dois 
em Esmirna, Públio Rutílio Rufo lhes contava sobre um diálogo em que ele 
mesmo (Rutílio), assistiu, há alguns anos à exposição de Numantino sobre 
qual seria a melhor forma de república (CICERÓN, 2002).
U
N
IC
ES
U
M
A
R
41
Vejamos como Cícero lida com o termo república:
 “ O que devemos entender primariamente por res publica nos disse 
Cícero, pela boca de Cipião: “a res publicas é a res que pertence ao 
populus”. A dificuldade pode estar em entender o que se quis dizer 
com res, “coisa”: “a coisa que pertence ao povo”. Parece evidente que 
não se trata das coisas patrimoniais de uso público, que os juristas 
geralmente chamam de “coisa pública” (res publicae), ou melhor, 
em nossa opinião, a “gestão pública”, porque a palavra “coisa”, em 
seu amplo campo semântico, compreende também esse sentido de 
atuação ou gestão: “a coisa ou negócio de que se trata” (res de qua 
agitur). Assim, pode, a “república” se referir ao governo público, e o 
que vem a dizer Cícero, ainda que pareça tautológico, é que a repú-
blica consiste no governo que afeta o povo (CICERÓN, 2002, p. 20).
Não é que Cícero pensasse em um governo democrático, isto é, um “governo 
do povo”. O povo não era somente um simples agregado humano, mas uma 
sociedade que deve se servir de um direito comum. Cícero parece concordar 
com a ideia aristotélica de que os homens se agrupam por seu instinto natural, 
e não como alguns filósofos tentam colocar, que o fazem pela necessidade. 
Para alguns, tais necessidades fariam com que o homem realizasse pactos de 
sujeição recíproca e também se ajudassem. 
Formas de Governo
Salústio investe contra a aristocracia 
romana em sua obra De Bello Jugurti-
no, na qual descreve a conspiração de 
Catilina, o que evidencia uma maneira 
eficaz sobre o grau de corrupção a que 
havia chegado a vida política de Roma, 
nos últimos tempos da República. 
Trouxemos, aqui, por meio de Salústio, 
de modo breve, o panorama da políti-
ca em Roma, para que continuemos, 
agora, com a política em Cícero. 
U
N
ID
A
D
E 
1
42
A sua política é desenvolvida nas obras De Republica, De Legibus e De Of-
ficiis, nas quais ele examinou as três formas tradicionais de governo e afirmou 
que a melhor seria um governo misto, isto é, a combinação das três. Nesse caso, 
Cícero teria sofrido a influência de Políbio. Já, acerca da escravatura, Cícero 
não concorda com a visão de Aristóteles, quanto à desigualdade dos homens. 
Não que ele não justifique que deva haver escravatura, mas diz ser essa uma 
consequência do direito internacional, devido ao fato de que, na guerra, os 
vencidos, aos quais se poupa a vida, devem ser feitos escravos. De acordo com 
a história, Cícero tratava seus escravos de uma forma muito humanizada, 
ainda mais os que fossem cultos, vindos do Oriente. 
O direito comum a serviço de todos, era apregoado por Cícero. As cidades 
seriam grupos unidos pelos direitos. Mais tarde, surge a ideia de que a comu-
nidade do direito é o que constitui uma cidade.
Pode-se dizer que o governo do povo não é, sempre, igual e não deve 
afirmar que existe uma verdadeira república quando o governo é perfeito. O 
fato de permitir variadas formas de governofundamenta-se em que nenhuma 
delas tem sua perfeição de modo absoluto, mas somente a cada momento his-
tórico. Os tipos de república, em suas formas puras: monarquia, aristocracia 
e democracia tem, em contrapartida, seus contrários, ou melhor, suas formas 
degeneradas: tirania, oligarquia e anarquia.
Das formas de governo, a monarquia parece ser a mais perfeita, uma 
vez que o bom rei é tido como um pai que ama seu povo. Entretanto essa 
forma de governo tem uma propensão a se tornar uma tirania, o que a tor-
na suspeita. A anarquia é, das formas degeneradas, a pior, porque deriva da 
democracia, o que atestaria também que, tampouco, a democracia seria se-
gura. A aristocracia se mostra como transitória entre a monarquia (pura ou 
degenerada) e a democracia.
Como nenhuma das formas chamadas puras podem atingir uma forma 
de governo perfeita, Cícero tenta se firmar na teoria que mais se aproxima 
do ideal. A forma mista e harmônica é a que teria um governo forte, como 
se dá na monarquia, mas que se preserve a liberdade dos melhores (que é o 
que se dá na aristocracia), atendendo, ainda, aos interesses do povo, tal qual 
ocorre na democracia. Entretanto a constituição mista, proposta por Cícero, 
termina por frustrar-se. O que se constituía em um monarquismo, puramente 
teórico, acaba por figurar como possível solução para salvar a república, por 
meio de um forte poder pessoal capaz de defendê-la. Poderíamos dizer que 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
43
surge, aqui, uma teoria do principado, que teria se realizado com Augusto. 
Conforme a troca de políticos no poder e suas características, as coisas po-
dem sair mais ou menos do jeito que se gostaria. Ajustes são necessários para 
que se tenha soluções adequadas, não cabendo falar de responsabilidades, 
quanto à aplicação de uma mesma forma de governo por pessoas, possivel-
mente, tão diferentes.
A ideia de Cícero, seria, falando de um modo mais direto, partir de um 
simples ajuntamento de pessoas, ou se preferirmos, de um agregado humano. 
Não necessitando de um pacto ou contrato, mas realizado de modo espon-
tâneo. Não é que as coisas seriam totalmente soltas, sem regras. Esse agru-
pamento constitui apenas um povo de fato, quando dispõe de uma ordem 
comum, que pode julgar com consenso, de modo que se possa dizer que há 
um governo comum, uma res pública, que seria algo próprio do populus. 
O interesse público é constituído por aqueles que estão vinculados por 
um acordo que diz respeito à justiça e que constitui um aglomerado, o qual 
visa ao bem comum, por isso, a sociedade deve destinar-se aos benefícios 
que as ligações sociais, trazidas pelas relações de confiança, podem trazer. 
Junta-se a isso, ainda, a união e a vida em pé de igualdade,sob uma lei insti-
tuída e sob um governo. A “ideologia” de Cícero traz à tona a sanção de um 
pacto: essa organização deve contar com a boa-fé dos indivíduos, já que a 
falta dela propicia o sabotamento do espírito social o qual, naturalmente, 
fora implantado no homem.
O governo misto, que citamos anteriormente, pode compreender tanto a 
participação do homem comum quanto a do homem da elite, bastando, para 
isso, que estejam ligados por um pacto e por uma promessa. Dessa forma, os 
governos mistos seriam mais equilibrados e estabilizados. Cícero se mostrou 
imparcial quanto à lei. Não haveria como o estado ser justo, se não fosse impar-
cial. A partir dessa formação de república, podemos dizer que Cícero faz questão 
de que a democracia esteja presente na forma de governo. Seus estudos sobre 
as melhores formas de governo tinham o objetivo de ressaltar o bem comum.
O governo que não assegura a comunidade de direito, como nas formas 
degeneradas, faz com que desapareça também a república. Entretanto um 
mínimo de comunidade jurídica já impediria a queda da república. Mesmo 
não havendo uma perfeita harmonia, a república se mantém, por isso, tal 
harmonia dos distintos elementos constituem o povo, os chamados melhores, 
que governam os bens comuns dos cidadãos. 
U
N
ID
A
D
E 
1
44
Qualquer uma das três melhores formas de governo que Cícero cita: a mo-
narquia, a aristocracia e a democracia podem ser, validamente, construtoras de 
uma república. Poderia acontecer a degeneração de cada uma, em despotismo, no 
caso das duas primeiras e da anarquia, para a última. Assim, os estudos de Cícero 
traduzem que a forma mais desejável de governo, apesar da instabilidade, deve ser 
a mista: há que se ter um equilíbrio entre as três formas, para que seja evitada a 
irrupção de uma das formas degeneradas.
Não é uma novidade a discussão sobre as formas de governo, visto o que ex-
pusemos até mesmo em Platão e Aristóteles. Todavia, em Cícero, a novidade está 
no fato de que a especulação teórica combina com uma consideração histórica da 
experiência política romana. 
Cícero consegue inserir uma reflexão pragmática, a qual é fundada, inclusive, 
na experiência do próprio povo. Trata-se de uma alta visão da vida política como 
parte do cosmos. 
 “ Digo, pois, somente, assim o penso e afirmo, que, de todas as repúblicas, 
não há nenhuma que, por sua constituição, por sua estrutura ou por 
seu regime, seja comparável com aquela que nossos pais receberam dos 
antepassados e nos transmitiram a nós. Se os parece, posto que haveis 
querido escutar de mim o que já vós também sabias, mostrarei, não 
só como é nossa república, mas também como é a melhor república, e 
uma vez exposta como exemplo, me acomodarei a ela, se puder fazê-lo, 
todo o discurso que hemos de fazer sobre a melhor forma de cidade; e 
se conseguisse fazê-lo, faria cumpri-lo suficientemente, segundo minha 
opinião (CICERÓN, 2002, p. 84). 
Cícero, no intento de construir a melhor república, ressalta que os antepassados con-
tribuíram, de modo imprescindível para que se constituísse a melhor cidade possível.
A Construção do Homem e do 
Político na República de Cícero
Falar da virtude é nos arremetermos à herança grega. Cícero não faz diferente, aliás, 
tudo isso é resultado da forte influência grega em sua formação. Assim, nada mais 
pertinente do que ter à frente do governo da república um homem virtuoso. Ser vir-
tuoso é, também, para Cícero, sinônimo de ser sábio, indivíduo que priorizaria o bem 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
45
comum. A república deve estar sempre em primeiro lugar. Assim, os homens devem ter 
em mente que o seu dever é atender, primeiro, aos interesses da república e, se o dever 
mais emergente é, dessa forma, especificado, isso se refere aos cuidados com seus con-
cidadãos. Vejamos, no livro segundo Da República, como a corrupção de um homem 
pode minar a moralidade de quem está no governo e da própria forma de governo.
 “ Basta o crime de um só homem para converter uma boa forma de go-
verno na pior de todas as que se possam imaginar? É a esse déspota do 
povo que os gregos chamam tirano; porque querem dar o nome de rei 
somente àquele que vela pelo povo como um pai e que conserva os que 
governam na condição e estado mais venturosos da vida. Considero, 
como já disse, boa essa forma de constituição política, mas também 
próxima do estado mais pernicioso. No mesmo momento em que um 
rei se deixa dominar pela injustiça, converte-se em tirano, e nada é mais 
horrível e repulsivo aos deuses e aos homens do que esse animal funesto 
que, embora com forma humana sobrepuja, em ferocidade e cruelda-
de, as mais desapiedadas feras. Quem dará o título de homem a um 
monstro que não reconhece comunidade de direitos para com os outros 
homens, em laços que o unam à humanidade? (CÍCERO, 2008, p. 55)
Anterior a Cícero, Aristóteles já havia alertado que o homem que não vive em 
coletividade, ou é um deus, ou é uma fera. Para Cícero o homem que se corrom-
pe, portanto, não pensa na humanidade e pode ser comparado a uma fera, a um 
monstro. Estes não atentam para dois conceitos fundamentais para a formação e a 
manutenção da sociedade: a justiça e a comunidade de direitos.
O que se dá na construção do diálogo Da República é o embate realizado por 
ilustríssimos e sapientíssimos varões, deixando claro que os homens devem praticar 
as artes que sejam mais úteis à civitas, porque a virtude e a sabedoria são as mais 
belas coisas que se pode praticar para o bem do estado. Desse modo, percebemos 
que a relação entre a sabedoria e a política não é mera coincidência, mas uma ne-
cessidade na qual se assentará o estado.
U
N
ID
A
D
E 
1
46
 “ Cícero, no exórdio do De Re Publica, I 81, constrói a figura do ho-
mem sábio por meio de dois argumentos centrais: o amor pátrio e o 
combate aos que julgam que a sabedoria é incompatível com a vida 
pública. Os varões que lutaram pela salvação da pátria são dignos de 
admiração, pois colocaram os interesses públicos em primeiro lugar; 
são os que antepõem o amor à pátria ao seu. O amor à pátria é um 
sentimento de reconhecimento, na medida em que tudo o que temos 
devemos a ela; ele deve ser incondicional. Cícero faz objeções àqueles 
que se opõem à atividade política e mostra a necessidade de os bons 
concidadãos protegerem os outros concidadãos. Eles precisam estar 
preparados a qualquer momento quando a república necessitar. Desse 
modo, o que carregamos na memória é o nome dos homens públicos. 
O concidadão virtuoso deve dedicar-se ativamente à política, deve ter 
qualidades morais que o habilitem à ação política. Um político-sábio 
é aquele que é educado nas artes liberais e nos costumes romanos, 
como o exemplo de Catão em De Re Publica, I, 1, que possui “ação 
e virtude”. Nosso autor escreve contra os epicuristas – chamados de 
“opositores” ou “vulgo” –, e, para sustentar sua argumentação, empre-
ga a doutrina estoica e os exemplos de homens que agem segundo 
preceitos estoicos e que lutaram pela pátria. Ao mesmo tempo em 
que combate os epicuristas, elabora a figura do sábio baseando-se na 
virtude, como aquela que foi dada aos homens pela natureza para a 
utilidade comum, pública (BERNARDO, 2018, p. 37).
A virtude posta em prática é o concurso natural da vida do homem. Suas virtudes 
devem ser postas a serviço do povo. As leis das civitas devem seguir os preceitos 
encontrados na retidão e na honestidade das teorias dos filósofos. Por outro lado, 
para Cícero, pessoas como Catilina, deveriam ser punidas com a morte, por não 
concorrerem para o bem da república. Na Oração I de M. T. Cícero Contra Ca-
tilina, podemos perceber todo o ardor com que ele discursa:
 “ Até quando, Catilina, abusarás da nossa paciência? Quanto zombará 
de nós ainda esse teu atrevimento? [...]. Muito tempo há, Catilina, que 
tu devias ser morto por ordem do cônsul, e cair sobre ti a ruína que há 
tanto maquinas contra todos nós. Porventura o insigne P. Cipião, Pon-
tífice Máximo, não matou a Tibério Graco,por deteriorar um pouco o 
estado da República? E nós havemos sofrer a Catilina, que com mortes 
e incêndios quer assolar o mundo? (CÍCERO, 1960, p. 215-216). 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
47
Vemos como é de causar indignação, al-
guém agir contra o povo e contra a repúbli-
ca. Isso seria algo inadmissível, assim como 
Tibério teve paga o que lhe fora justo, com 
a morte pelas mãos de Cipião, também 
devem ser extirpados todos aqueles que 
atacarem a república de alguma forma.
A honra, a confiança, a equidade, o 
pudor e os conceitos de justiça, como a 
confiança, a continência, a fortitude, a re-
ligião e o direito são as coisas que, segundo 
Cícero, o sábio deve ensinar, por meio das 
disciplinas. Como seria então organizadas 
tais virtudes e implementadas tais leis? As 
virtudes seriam confirmadas pelos costu-
mes, e as leis sancionadas pelo governo.
Cada cidadão, imbuído de sabedoria, 
deveria defender os interesses públicos. O 
político deve ser um homem sábio. Ao ci-
dadão, cabe ainda, entre outras coisas, dar 
a devida importância às obras criadas pelo 
gênero humano, tendo, sempre, o discerni-
mento do que é melhor ao trabalho. Essas 
coisas devem ocorrer de modo natural. 
Ao cuidar da pátria, hoje, e dar refúgio aos 
seus concidadãos, essa poderá lhe propor-
cionar refúgio no futuro. Disso, podemos 
perceber que, não é certo buscar “colher” 
algo, sem antes semear.
É importante, para Cícero, que a re-
pública seja composta por homens for-
tes, bons e animados, para agir, segundo 
a causa da comunidade. O próprio Cí-
cero se considerava um sábio-político, 
uma vez que ocupou um cargo público 
quando, ainda, a república estava em 
U
N
ID
A
D
E 
1
48
crise. No livro quinto Da República, há uma passagem expressiva quanto à im-
portância do conhecimento:
 “ Cipião - Será possível que te admires de que um agricultor conheça 
as raízes e as sementes? Manílio - Não, por certo, se a obra se realiza. 
Cipião - Julgas, pois, que é próprio do agricultor esse estudo? Manílio - 
Sim, se cuida do cultivo dos campos. Cipião - Pois bem: assim como o 
agricultor conhece a natureza do terreno e assim como o escritor sabe 
escrever, procurando ambos, na sua ciência, antes a utilidade do que 
o deleite, assim também o homem de Estado pode estudar o direito, 
conhecer as leis, beber nas suas próprias fontes, sob a condição de que 
as suas respostas, escritos e leituras o ajudem a administrar retamente 
a República. Certamente, deve conhecer o direito civil e natural, sem 
cujo conhecimento não pode ser justo (CÍCERO, 2008, p. 80).
Observamos que o conceito de justiça, sempre, permeaia a discussão. É justo pois, 
que se faça o que for correto para o bem da república. Na passagem acima, ficou 
muito claro que o governante deve ser alguém preparado, preocupação que vimos, 
também, no começo desta unidade, em Platão. Inclusive, está reservado um prêmio 
após a vida terrena, para aqueles que agem de um modo justo. Na obra Sonho de 
Cipião, de Cícero, podemos ver o seguinte: “Para que te inspire maior deleite, ó Afri-
cano, na defesa da República, receba o seguinte: “a todos que preservam, auxiliando e 
promovendo a pátria, está reservada, no céu, um lugar onde se desfruta de beatitude 
infinda”. Nesse momento da obra, Cícero se refere ao relacionamento de Cipião com 
estadistas que não faltaram com seu dever, por isso, quem adentra o céu, o faz por 
merecimento (ALDÁ, 2018, p. 48).
Na obra Da República, observa-se, ainda, que todos os interlocutores têm um 
cargo público. O exercício público é o resultado do modo como fora moldado o su-
jeito desde a infância, contando muito a experiência doméstica, ainda que o ensino 
das letras resguarde o seu valor.
Unindo a teoria e a prática, o pensar e o fazer, podemos perceber que a filosofia 
ganha espaço: o filósofo não é necessariamente o sábio, mas o sábio deve possuir uma 
formação filosófica. Há que se buscar um equilíbrio entre a sua formação e as ativi-
dades por ele exercidas. Essa união entre a teoria e a ação é a união entre o negócio 
(nec otium) e o ócio (ótium, tempo livre).
Bem, é claro que a fundamentação da engenhosidade do sujeito contribui para 
algo que é ainda maior. Partindo da experiência, recolhe-se ao longo do tempo uma 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
49
bagagem que coloca a república romana num lugar de destaque, quando a compara-
mos com as demais. Mais do que dar uma república pronta, Cícero traz a valorização 
da construção da cidade. Ao longo do tempo, o homem amadurece e coleta feitos 
virtuosos, o que solidifica os bons princípios. Assim, ocorre que o governo misto, 
pautado na sua melhor forma, é o que leva Roma ao seu apogeu. 
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Vimos, nesta primeira unidade, a forma como se desenvolveram algumas das 
mais relevantes construções de teorias políticas da antiguidade, do ideal político 
de Platão, passando pela busca da felicidade em Aristóleles, até chegarmos no 
reto modo de agir, para a construção da república, em Cícero.
Percebemos que as questões pessoais não devem excluir o trato da política, 
como aconteceu com Platão que, ao ver seu mestre, Sócrates, ser preso e conde-
nado a tirar a própria vida, uma vez que um grego não podia matar outro grego, 
continua a se interessar pelo bem da polis. Não ingressando na política, como 
era o objetivo da juventude, mas pensando em um modelo de cidade, a calípolis, 
cidade bela que, para ser de fato bela, dependia do cidadão conhecer as virtudes 
e colocá-las em prática. Cada um cumprindo seu papel, de acordo com o que sua 
alma requer. Essa construção visa chegar a sua melhor forma de vida, suprindo 
as necessidades, ao ser guiada pelo governo do rei filósofo.
Aristóteles mostrou sua preocupação em compreender a realidade política 
da época em que viveu, ao afirmar que o homem é um animal político. Colocou-
-se a estudar as diferentes leis das diferentes cidades, bem como as diferentes for-
mas de governo (a história registra cerca de 160). A melhor forma de organização 
política seria a politia, a qual é uma mistura da democracia com a aristocracia. É 
parte integrante da natureza do homem se organizar politicamente.
Com Cícero, vimos que o imperativo é trabalhar e zelar pelo bem da repú-
blica. Àqueles que, por ventura, agissem contra o bem da cidade, deveriam ser 
imputado um castigo exemplar, chegando, até mesmo, a ser morto o ofensor 
da república, como no caso em que referimos o Pontífice Máximo, Cipião, ao 
matar Tibério Graco. Por meio de um pacto é que se construiria o governo 
misto, capaz de levar ao equilíbrio da sociedade. A justiça era um fator pre-
dominante, a qual só poderia ser implantada à república justa, se respeitada a 
imparcialidade nas decisões.
50
na prática
1. Partindo do texto referente à construção da cidade ideal em Platão, temos: “A 
calípolis (de cali, belo e polis, cidade) não é somente a construção de uma cidade 
(casas, ruas, praças... belos), mas sim e primordialmente a construção do homem 
de bem. Não basta saber o que é o bem, este deve ser posto em prática”. Escolha 
as alternativas corretas.
a) O bem é estar junto à família em qualquer ocasião.
b) Quem concorria à política tinha imunidade. 
c) Para a construção da calípolis, não basta apenas saber o que é o bem, mas é 
necessário fazer o que a virtude e a honra pedem.
d) Platão quer demonstrar que na República todos os cidadãos integrantes de 
uma cidade podem opinar.
2. Acerca das teorias de Aristóteles, no que se refere às formas de governo:
( ) A melhor forma de governo seria a politia.
( ) A família não é a primeira comunidade.
( ) Alguém que não vivesse em coletividade, sabendo inclusive o que era o bem 
comum seria um deus ou uma fera. 
Assinale a alternativa correta:
a) V, V, F.
b) F, F, V.
c) V, F, V.
d) F, F, F.
e) V, V, V.
51
na prática
3. Referente à teoria de Cícero. O fato de permitir variadas formas de governo, está 
fundada em que nenhuma delas tem sua perfeição de modo absoluto, mas so-
mente a cada momento histórico. Os tipos de república,em suas formas puras: 
monarquia, aristocracia e democracia, têm em contrapartida seus contrários, ou 
melhor, suas formas degeneradas: tirania, oligarquia e anarquia. Aqui, seria correto 
afirmar que:
( ) Das formas de governo, a monarquia parece ser a mais perfeita, uma vez que 
o bom rei é tido como um pai que ama seu povo. Entretanto essa forma de 
governo tem uma propensão a se tornar uma tirania, o que a torna suspeita. 
( ) A anarquia não é, das formas degeneradas, a pior, porque deriva da democra-
cia, o que atestaria também que, tampouco, a democracia seria segura.
( ) A aristocracia não se mostra como transitória entre a monarquia e a democra-
cia, pelo fato de que o povo mandando, todos ao mesmo tempo, daria certo.
4. Para Platão, a sociedade seria como um corpo, em que cada parte precisaria da 
outra para sua melhor evolução e andamento. Por isso, a divisão de tarefas, apesar 
de não ser sempre igualitária, faz-se necessária. Dito isso, qual o motivo que levou 
Platão a querer a formação do Estado?
5. Um cidadão não pode carecer de bens, sem os quais seria impraticável investir e 
colher frutos para que se possa manter uma vida contemplativa. Nesse sentido, 
quais seriam, para Aristóteles, os três tipos principais de bens necessários ao ci-
dadão, para que alcance a felicidade?
52
aprimore-se
Quando da instituição da política, começa-se a falar em convenções e acordos dos 
quais brotam as normas. É, a partir do momento em que cada indivíduo toma 
consciência de seu papel em sociedade e começa a interiorizar a norma, que as 
coisas passam a caminhar melhor. Vejamos, nesse sentido, um excerto da obra de 
Petrucciani, Modelos de filosofia política:
“Se assumimos como fio condutor a tripartição enunciada por Bobbio, obser-
vamos, antes de tudo, que as duas primeiras questões salientadas (a melhor cons-
tituição política e o fundamento da obrigação política) constituem duas proble-
máticas profundamente interligadas, das quais se ocupa aquela que definimos a 
abordagem normativa da filosofia política. Com efeito, no interior de um horizonte 
normativo, entra tanto a questão de qual seja a melhor constituição política, quan-
to a relativa ao fundamento da obrigação política: na perspectiva dessa pergunta 
indaga-se, de fato, quais características a ordem política deve ter para merecer a 
obediência da parte daqueles que a ela estão submetidos, ou seja, para ser consi-
derada uma ordem política legítima. 
O que caracteriza uma filosofia política normativamente orientada é o fato de 
que nela o tema da política é focalizado fundamentalmente na perspectiva de o 
dever ser; o objetivo primário não é o de indagar os fatos políticos tais como são, 
na sua natureza ou na sua estrutura (embora isto constitua sempre uma passagem 
essencial na pesquisa), mas o de chegar a delinear a ordem política como deveria 
ser, para poder ser reconhecida como boa, justa, legítima. Da República de pla-
tão à Teoria da justiça de Rawls, a tradição filosófico-política ocidental não cessou 
em elaborar grandes paradigmas normativos para responder à pergunta sobre o 
modo como deve ser estruturada uma boa ordem política. A tradição normativa é, 
pois, a nosso ver, a que melhor caracteriza a abordagem dos pensadores ociden-
tais às questões da política.
53
aprimore-se
O fato de a pergunta sobre a boa ordem política se repropor como uma das 
grandes questões sempre vivas da tradição filosófica ocidental não quer dizer, 
naturalmente, que essa tradição não seja marcada por profundíssimas censuras. 
Assim como mudam os horizontes filosóficos, muda, nas diversas perspectivas, 
o modo de entender a relação entre realidade e norma, ou realidade e valor. No 
horizonte aristotélico, por exemplo, a norma não é entendida como algo separado 
da realidade, mas ao contrário, como o que corresponde à sua mais verdadeira 
natureza humana e ao seu fim intrínseco”.
Fonte: adaptado de Petrucciani (2014, p. 19).
54
eu recomendo!
Ética e Política: da Antiguidade Clássica à Contemporaneidade
Autor: Fernando Quintana
Editora: Atlas
Sinopse: essa obra visa a esclarecer a relação entre ética e polí-
tica em diferentes momentos históricos. Quintana destaca como 
a sociedade está ou deveria ser ordenada, seu modo de vida e 
como alcançar uma vida feliz. Para que esses objetivos sejam al-
cançados, percorre-se, ainda, os seguintes tipos de ética: consequencialista, hedo-
nista, pragmática, deliberativa, entre outras. 
livro
Curso de Filosofia Política: do Nascimento da Filosofia a Kant
Autor: Ronaldo Porto Macedo Jr.
Editora: Atlas
Sinopse: aqui, vemos a exposição da construção da filosofia po-
lítica de grandes pensadores como Platão, Aristóteles, Hobbes, 
Locke, entre outros. O que se pretende, nessa obra, é evidenciar 
o compromisso existente entre a construção de categorias pró-
prias da Filosofia Política. 
livro
Matrix
Ano: 1999
Sinopse: um programador de computador tem pesadelos nos 
quais ele estaria conectado por cabos a computadores do futuro. 
Qual a realidade concreta? Há fortes dúvidas quanto ao que fazer 
para encontrar tal resposta. Esse impasse quanto ao que seria o 
mundo real e o mundo virtual nos arremete à alegoria da caver-
na de Platão, na qual os prisioneiros acorrentados conhecem um 
outro tipo de realidade, abordando a preocupação política que um dos prisionei-
ros têm de retornar à caverna para ajudar os demais (a “comunidade”). 
filme
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
anotações
2
FILOSOFIA POLÍTICA
MODERNA
PROFESSOR 
Esp. Silvanir Aldá
PLANO DE ESTUDO 
A seguir, apresentam-se as aulas que você estudará nesta unidade: • Origem do Pensamento Político 
Moderno em Maquiavel • Os Principados: Como Ser um Príncipe • A Atualidade e a Autonomia da 
Política.
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM 
Compreender o contexto no qual viveu Maquiavel e a importância da formação das milícias • Entender 
algumas ideias iniciais que ajudam o príncipe (governante) a se manter no poder, principalmente os 
conceitos de virtù e de fortuna • Perceber como é a autonomia do príncipe (governante) em seu agir, 
e como as teorias de Maquiavel têm potencial para influenciar a política atual.
INTRODUÇÃO
A filosofia moderna teve como grande marco as teorias de Maquiavel. 
Saímos das teorias que visavam a construção de uma sociedade ideal, 
para a construção de uma política realista. Maquiavel não aborda em sua 
obra uma questão de abstração filosófica, especulativa ou mesmo utópi-
ca. A construção de seu pensamento partirá de suas constatações sobre 
o modo de agir de governantes de outros países e de sua atuação, como 
secretário do Ofício dos Dez da Liberdade e da Paz, por seu país, a Itália.
A partir da análise dos principados e de como ser um príncipe, po-
demos dizer que Maquiavel inovará os estudos da área, a originalidade 
de seu pensamento está exatamente em oferecer uma resposta à ins-
tabilidade política que marcava a Itália de sua época. Em sua obra O 
Príncipe, perceberemos sua intenção de ensinar a conquistar Estados 
e a melhor forma de mantê-los, visando a sua estabilidade. Ele fala da 
realidade política, ao mostrar o que pode ser mais eficiente nas ações 
humanas e dos governantes. Tais ações não precisam ser norteadas pela 
moral e pela ética cristã, porque o objetivo maior é manter o principado. 
Assim, decorre que o correto é tudo o que leva à sua boa conservação e 
manutenção, não importando qualquer outro critério de justiça.
Além d’O Príncipe, outras obras do filósofo, como os Discursos So-
bre a Primeira Década de Tito Lívio e, até mesmo, A Mandrágora (apesar 
desta não tratar exatamente sobre política), confirma que a natureza 
humana deve inclinar-se para sua própria conservação, ao tomar ati-
tudes que poderiam ser vistas como imorais, a partir do ponto de vista 
ético-cristão, o qual não vem ao caso, neste debate. A ação do príncipe 
pode se dar de duas formas: pela lei ou pela força, sendo necessário usá-
-lasconforme a necessidade e em justa medida. Em sua teoria, o filósofo 
leva em consideração a divisão de desejos, os quais existem, no homem, 
e que o guiarão na constituição das sociedades políticas. 
U
N
ID
A
D
E 
2
58
1 
ORIGEM DO 
PENSAMENTO 
POLÍTICO MODERNO 
em Maquiavel
Um filósofo que mexe com a imaginação das pessoas até hoje, Maquiavel 
desperta a curiosidade de muitos, no que se refere aos recursos do poder, 
que podem, no tempo certo, serem utilizados, a partir de conselhos pontuais 
e assertivos, por exemplo: engana-se quem acredita que um aliado seja seu 
amigo. Este filósofo revolucionou a política, desde o momento da elaboração 
de sua teoria, até hoje.
Quem foi Maquiavel
Nicolau Maquiavel nasceu em Florença, no ano de 1469. Apesar de descender 
de uma família antiga, ele tinha economias consideradas modestas. Formou-
-se em humanidades, instrução obrigatória para os jovens de sua época, com a 
mesma condição financeira. Dizem que conhecia bem o latim e, relativamente 
bem, o grego. Não se tem muita notícia sobre seus primeiros anos de vida. 
Devido a vida de parcos recursos, fez concurso, em 1498, para secretário da 
segunda chancelaria do Domínio Senhorial. Uma vez aprovado, foi nomeado 
secretário do Ofício dos Dez da Liberdade e da Paz, permanecendo no cargo 
até o ano de 1512.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
59
Maquiavel ocupou o cargo de secretário do Conselho dos Dez em um 
período complicado da história da Itália: o país passava por invasões dos 
franceses, dos espanhóis, dos suíços e dos alemães. A situação era complicada 
pelo fato de que a Itália não tinha força para fazer frente a esses invasores, de 
modo efetivo. Impressiona, os historiadores, a clarividência que tinha Maquia-
vel do que se passava em seu país. Um fator preponderante para que a Itália se 
enfraquecesse foi a sua divisão em pequenos estados e a falta de organização 
militar. Empreender uma organização para formar um grande Estado era 
bem complicado, pelo fato de que nenhum pequeno estado queria abrir mão 
de suas particularidades e, consequentemente, subordinar-se a outro estado. 
Além d’O Príncipe (1513), que se tornou sua obra mais conhecida, na 
qual Maquiavel expõe todo o realismo que viveu e que viu, durante sua atua-
ção em cargos políticos, temos de dar destaque, ainda, aos Discursos Sobre a 
Primeira Década de Tito Lívio de 1517, o qual traz a mais alta expressão do 
Maquiavel republicano. Temos, ainda, o poema O Asno, o conto O Demônio 
que se Casou, a comédia teatral A Mandrágora de 1503, na qual ele fala de 
uma conquista amorosa e das tramas da conquista, além do pretexto que pos-
sibilitaria o desenvolvimento da estratégia política, o qual envolvia as artes, 
como a da manipulação e a do convencimento. A Arte da Guerra, outra obra 
do autor, foi escrita entre 1519 e 1520, época em que a Itália carecia de um 
forte líder militar e político que conseguisse criar um Estado unificado mais 
ao norte do país, cuja intenção era eliminar as forças estrangeiras que estavam 
no território italiano. Escreveu, também, a Vida de Castruccio Castracani 
(quase uma biografia romanceada do condottiere Lucano); Discurso, que foi 
endereçado ao papa Leão X; em seu cargo de historiador oficial, escreveu 
Histórias Florentinas e, por fim, escreveu a comédia, Clizia.
A formação da Milícia Nacional
Montar uma milícia nacional sólida, no sentido de colocar o país em ordem, 
com um número suficiente de pessoas, levaria alguns anos, mas Maquiavel 
estava firme nessa ideia de incentivar a formação das milícias. Sabemos que ele 
teria constituído um número de nove, das quais se tornou chanceler. No ano 
de 1506, por ocasião disso, ele escreve uma obra intitulada: Discurso Sobre a 
Preparação Militar Florentina, na qual apregoou que os Estados e os gover-
U
N
ID
A
D
E 
2
60
nantes precisavam de duas coisas, que lhes eram essenciais: justiça e armas. E 
o que Maquiavel entendia por justiça? Para ele, a justiça seria um conjunto de 
boas instituições, mantenedoras da ordem e da estabilidade sociais, as quais 
seriam a base necessária, onde se construiria as virtudes cívicas. O fato de que 
nessa época a cidade de Florença não possuía nem armas e nem justiça, seria 
resolvido com a criação das Milícias Nacionais, e dessas milícias se originaria 
a transformação moral dos florentinos. Esse Discurso abordava também o 
tema da religião como ideologia. Os soldados deveriam ter uma preparação 
religiosa, a qual seria algo que os tornaria mais obedientes.
Mesmo com a criação das milícias e a dedicação que Maquiavel lhe pres-
tou, sua carreira política sofreu um grande abalo. Nesse momento, Florença 
se aliou aos franceses e o papado se inclinou para o lado da Espanha. Para 
o filósofo, a oposição de interesses causou a derrocada dos governantes da 
cidade. Com Florença cercada, surgiu um levante interno, o qual permitiu o 
retorno dos Médice. Entretanto, em 1527, o saque ocorrido em Roma, pelo 
imperador Carlos V (1500-1558), do Sacro Império Germânico, libertou Flo-
rença do poder dos Médice (MAQUIAVEL, 1999).
A partir de uma breve exposição sobre o humanismo e a Itália contemporânea de 
Maquiavel, tem-se a possibilidade de analisar alguns elementos que foram objeto 
de estudo da política maquiaveliana. A Itália contemporânea de Maquiavel (1469-
1527) é palco de muitas disputas políticas. Cidades contra cidades, Estados ponti-
fícios e, principalmente, os interesses particulares tanto da Igreja quanto dos go-
vernos seculares eram mecanismos que reforçavam, ainda mais, as desordens e a 
instabilidade política na Itália.
Fonte: adaptado de Engelmann (2005, p. 52)
explorando Ideias
Conceber a possibilidade da milícia nacional, significava a possibilidade de 
confiar armas aos cidadãos. Nesse cenário, onde o estado seria defendido por 
quem o integrasse, Maquiavel parecia exceder a história de seu tempo. Essa 
revolução militar devia corresponder a uma renovação sócio-política. Essa 
milícia dos cidadãos não poderia existir, a não ser onde o estado vive, dia a 
dia, na consciência íntima do povo.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
61
 “ Em 1512, o Cardeal Giovanni de Médicis, que alguns meses mais 
tarde devia tornar-se o Papa Leão X, obteve da Espanha forte con-
tingente de soldados espanhóis destinados a permitir aos Médicis 
reconquistarem o Domínio Senhorial de Florença. A milícia flo-
rentina reunida às pressas, mas privada de bons oficiais e pouco 
treinada, não pôde sustentar em Prato o choque da velha infantaria 
espanhola. O Governo de Soderini caiu e os Médicis retomaram o 
poder (MOSCA; BOUTHOUL, 1980, p. 110).
Maquiavel manteve sua fidelidade a Soderini e à República, perdeu seu cargo e 
ficou preso por alguns meses, por terem suspeitado que ele tivesse conspirado 
contra os Médices. Dessa situação, decorreu seu exílio para Rocca San Cassia-
no, lugar onde tinha uma porção de terra e uma casa. Nesse local, levou uma 
vida tranquila, podendo, inclusive, dedicar-se mais firmemente à leitura dos 
clássicos e à escrita. Mesmo estando afastado de suas funções, acreditava que a 
Itália poderia ser liberta das invasões bárbaras, se investissem na constituição 
de um Estado poderoso e em um exército nacional bem preparado.
Na procura de quem poderia levar seu projeto à execução, escreveu O 
Príncipe. Para Maquiavel, essa pessoa haveria de ser Juliano de Médice, que 
era o irmão mais novo do Papa Leão X. Ele parecia ser a pessoa ideal para tal 
intento, mas Juliano logo morreu, de modo que Maquiavel volta seus olhares 
a Lourenço de Médice, que era sobrinho do Papa Leão X.
O Príncipe , desse modo, constituiu-se em um manual para governantes, 
com o intuito de ensinar ao príncipe como conquistar Estados e conservá-
-los. Maquiavel dedicou a obra ao duque de Urbino, Lourenço II, que não 
deu muita importância, no momento, e não teve oportunidade de fazê-lo, 
posteriormente. Entretanto o monarca inglês, Henrique VIII (1491-1519), 
bem diferente disso, aproveitou tais conselhos muito bem. Tanto que forjou 
a anulaçãode seu casamento com Catarina de Aragão (1485-1536), para se-
parar a Igreja britânica da Santa Sé; fazer espólio dos mosteiros e consolidar 
seu poder.
Havia muita confusão na política da Itália, na época do Renascimento. 
Muitos tiranos exerciam seu poder de modo arbitrário. Alguns governantes 
agiam de modo ilegítimo; outros, ainda, utilizavam-se da astúcia, tentando 
mobilizar rapidamente seus inimigos. Ações como neutralizar os opositores e 
atemorizar os súditos, visando coibir subversões e fazer alianças com outros 
principados, constituem o eixo da administração. 
U
N
ID
A
D
E 
2
62
Observemos que a Itália, na época de Maquiavel, encontrava-se muito frágil 
politicamente, mas muito bem economicamente. Vejamos os relatos em seus 
Escritos Políticos:
 “ A coroa e os reis de França são atualmente mais ricos e mais 
poderosos do que nunca, pelos motivos abaixo citados; e antes:
A coroa, transmitida por sucessão de sangue, veio a se tornar rica; 
isso porque às vezes, não tendo filhos os reis, nem sucessores na 
própria herança, foram para a coroa suas posses e seus Estados. 
E, como tal sucedeu a muitos monarcas, a coroa acabou sendo 
muito enriquecida pelos numerosos Estados que lhe couberam; 
como ocorreu com o ducado de Anjou, e no presente, como su-
cederá ao rei atual, o qual, não tendo filhos varões, deixará para 
a coroa o ducado de Orléans e o Estado de Milão; de sorte que, 
atualmente, todas as boas terras de França são da coroa, não dos 
seus barões, em particular.
Há outro motivo, muitíssimo forte, da força daquele rei: acontece 
que, no passado, a França não se encontrava unida mercê dos 
potentes barões, que tudo ousavam e lhes era suficiente o desejo 
para se entregar a qualquer empresa contra os reis, como era o 
caso dum duque de Guiena e de Bourbon, os quais, hoje, são to-
dos muito benevolentes. Tornou-se, dessa maneira, o mais forte.
Outro motivo: a qualquer outro príncipe vizinho bastava ter von-
tade de assaltar o reino de França, uma vez que sempre havia um 
duque da Bretanha, ou de Guiena, de Borgonha, ou de Flandres, 
que o apoiava, concedia-lhe o passo e o tornava amigo, como 
sucedia quando os ingleses se encontravam em guerra com a 
França [...].
Eis outro motivo: atualmente, os mais ricos e poderosos barões 
de França tem sangue real e da linha hereditária, de sorte que, na 
falta de algum superior e ascendente, a coroa pode lhe ser outor-
gada. E assim cada um se conserva unido à coroa, aguardando 
que ou ele mesmo ou um de seus filhos consigam alcançar aquele 
grau. Rebelar-se ou vir a ser inimigo poderia ser mais danoso do 
que bom (MAQUIAVEL, 1999, p. 215-216).
U
N
IC
ES
U
M
A
R
63
O uso da força era uma demonstração de poder nessa época, uma vez que 
faltava uma organização imposta por um Estado central, e a multipolarização 
do poder criava um vazio, sobressaltando a capacidade dos mais fortes. Um 
exemplo disso foram os condottieri, dominantes da arte militar, que vendiam 
serviços de segurança e conquista aos príncipes que estivessem dispostos a 
remunerar melhor. A consequência disso foi a conquista de principados, o es-
tabelecimento de alianças com reis, cardeais e papas.
O fato dos principados italianos recorrerem às monarquias absolutas eu-
ropeias, na tentativa de solucionar a crise instaurada pelas disputas internas, 
torna-os uma vítima ainda mais impotente, de forma que os impérios Germâ-
nico, da França e da Espanha disputaram para ver quem seria a detentora da 
posse de muitos desses territórios.
Causa um certo estranhamento o fato de que a Itália se encontre nessa 
situação, uma vez que o capitalismo comercial tinha quase dois séculos de 
existência no país, quando comparado aos demais. O que aconteceu, porém, 
foi o crescimento econômico do capital mercantil, de modo geral.
A OBRA O PRÍNCIPE
Sem dúvidas, O Príncipe é 
a obra mais famosa de Ma-
quiavel. Ela contém uma 
divisão de vinte e seis capí-
tulos, trazendo os preceitos 
necessários à constituição, 
conservação e expansão 
dos Estados. A princípio, o 
filósofo florentino queria 
ser reconduzido à política. 
Se, no entanto, a obra não serviu de passaporte de retorno à coisa que ele mais 
gostava, que era a política, ao menos foi digna de inscrever seu nome na lista 
dos mais renomados pensadores políticos de todos os tempos. Ao final da obra, 
contudo, há o elogio daqueles que põem em prática seus preceitos, aconselhando 
que se crie um exército poderoso, com a finalidade de libertar a Itália do domínio 
estrangeiro ao qual estava submetida.
U
N
ID
A
D
E 
2
64
Sua obra despertou os mais variados sentimentos, havendo quem chegasse 
a depreciar seu trabalho, e até quem o houvesse elogiado. Tal foi o caso de 
Napoleão Bonaparte que, em seus comentários sobre O Príncipe, demonstra-
ra admiração por tal engenho. Seu grande inimigo, na realidade, era a Igreja 
Católica, a qual considerava esta obra como uma leitura proibida e pecami-
nosas. Verdadeiramente “coisa do demônio”. Na modernidade, Jean-Jacques 
Rousseau posicionou-se em sua defesa, dizendo que era uma obra valorosa 
para a filosofia política, no senti-
do de que enganou a muitos que 
pensaram que ele estava ensinan-
do política aos fortes, enquanto 
mostrava seu verdadeiro funcio-
namento ao povo.
A obra citada poderia ser di-
vidida em duas partes: a primei-
ra apresenta exemplos de vários 
homens e como estes subiram ao 
poder em várias circunstâncias, 
tendo sucesso sua subida e con-
seguindo se conservar. Na segun-
da parte, focando as característi-
cas da natureza humana, o autor 
enuncia conceitos, ou melhor, 
preceitos e conselhos sobre a arte 
de governar, ilustrando essa parte 
com outros exemplos mais. 
Quando, no século XX, dedicado às guerras gigantes, o mundo liberal se vê assaltado, 
de todos os lados, pela maré autoritária, em breve totalitária, o idealismo político perde 
terreno diante dos “realismos”, que se valem, mais ou menos abertamente, de Maquia-
vel e de O Príncipe. Benito Mussolini, em um Prelúdio a Maquiavel, escrito em 1924 
para louvar o florentino, louvando-se a si mesmo, prende o fascismo ao maquiavelismo 
(“Afirmo que a doutrina de Maquiavel está hoje mais viva do que há quatro séculos... “). 
Fonte: Chevallier (1999, p. 48).
explorando Ideias
U
N
IC
ES
U
M
A
R
65
A princípio, todos os governos que exercem suas autoridades sobre os homens 
podem ser divididos em repúblicas e em principados. Quais seriam esses tipos de 
principados? Seriam os principados hereditários, mistos e novos. Os hereditários 
são mais fáceis de conservar, uma vez que seus súditos têm o costume de obe-
decer. Nos governos mistos, é mais difícil encontrar uma estabilidade de poder, 
sobretudo se a parte nova do estado não pertencer à mesma nação que a antiga. 
Para que sejam superadas as dificuldades referentes à parte nova do estado, uma 
vez que seja ela de nação estrangeira, Maquiavel sugere quatro medidas:
 “ Primeira, que o príncipe habite nesta parte; segunda, que ele estabe-
leça aí suas colônias; terceira, que impeça ele que na mesma região 
se estabeleça outro domínio ou influência estrangeira; quarto, que 
enfraqueça os Estados mais poderosos e sustente os mais fracos 
(MOSCA; BOUTHOUL, 1980, p. 113).
Maquiavel destaca, ainda, que o rei Luis XII da França, por não colocar em prática 
esses preceitos, acaba perdendo a Lombardia. O Príncipe foca mais a atenção 
nos principados novos, que foram fundados ou pelas armas ou pela habilidade 
política, ou ainda, atos que se aproximam do banditismo. César Bórgia seria o 
grande exemplo de príncipe que se vale das armas e da habilidade política. Já, 
outros príncipes, chegaram ao poder por outros meios. Alguns deles seriam, por 
exemplo, Oliverotto da Fermo e Agátocles.
2 
OS PRINCIPADOS: 
COMO SER 
UM PRÍNCIPE
U
N
ID
A
D
E 
2
66
 “ Oliverotto da Fermo foi certamente um bandido infame; havia 
chegado ao poder assassinando por traição seu tio e os principais 
cidadãos de Fermo. Agátocles, homem pouco escrupuloso, chegou 
(ele,filho de um oleiro e que foi soldado afortunado) a conservar o 
poder durante longos anos, malgrado o poderio de seus inimigos 
interiores e exteriores, dando provas de qualidades políticas muito 
altas e de virtudes militares pouco comuns. Quanto a César Bórgia, 
filho de um papa e não menos destituído de escrúpulos, apode-
rou-se da Romanha, aproveitando-se da fraqueza dos senhores que 
tinham em suas mãos as cidades, e graças à ajuda que o Papa lhe 
conseguira do rei de França. Mas logo depois da morte de seu pai 
perdeu ele todos os Estados (MOSCA; BOUTHOUL, 1980, p. 113).
Essas exposições vão de encontro com os ensinamentos de Maquiavel, quanto a 
fazer o que for necessário para se manter no poder, governando bem um povo. 
Virtù e Fortuna
Maquiavel apresenta alguns preceitos, dos quais deve ser dotado todo e qualquer 
homem que liderar o Estado. Trata-se da virtù e da fortuna, que, se bem execu-
tados, poderiam ter ajudado a Itália a conseguir a unidade e força política que o 
filósofo tanto almejava. A virtù se refere às qualidades desejáveis ao homem de Es-
tado, são as qualidades que todo homem que quiser conquistar e manter o Estado 
deve ter. A virtù trata da sagacidade, da inteligência, isto é, saber quando manter 
a palavra e quando é necessário quebrá-la. “O carisma da virtù é próprio daquele 
que se conforma à natureza de seu tempo, aprende-lhe o sentido e se capacita a 
realizar praticamente a necessidade latente nas circunstâncias” (MARTINS, 1996, 
p. 209). Quem melhor se adaptar terá, consequentemente, o melhor resultado. 
Nessa busca de definir quais são as qualidades que realmente importam para a 
arte política, percebemos que Maquiavel “dialoga” com a Antiguidade, entretanto 
parece ser esse o ponto de ruptura com o pensamento de seu tempo.
Em um contexto de invenções, como a imprensa, tornou-se possível que as 
ideias e teorias fossem propagadas de um modo mais rápido e amplo. Foi por 
causa da invenção da imprensa, inclusive, que surgiu os manuais que “ensinavam” 
a bem governar, materiais esses que aconselhavam os governantes sobre o que 
seria melhor fazerem para obter bons resultados.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
67
A influência de filósofos da antiguidade, como Cícero, faz-se bem visível. 
Do conceito de virtus deixado por Cícero, saem as seguintes diferentes qua-
lidades: primeiro, seria necessário que o príncipe tivesse as quatro virtudes 
cardeais: sabedoria, justiça, coragem e temperança (ver explicação mais deta-
lhada dessas na Unidade 1, “Ação Política em Cícero”). Sendo necessário juntar 
posteriormente a essas virtudes, mais quatro atributos: honradez, magnani-
midade, liberdade e moralidade, de modo a reforçar a ideia de que a melhor 
política é a da “moralidade”. Tudo deve concorrer para que a conveniência não 
conflite com a retidão. No início do capítulo XV d’O Príncipe, nosso filósofo 
alerta para o perigo de se pensar uma república ou principado de modo a 
empunhar a bandeira da ‘bondade natural’. 
 “ E muitos imaginaram repúblicas e principados nunca vistos ou 
reconhecidos como reais. Tamanha diferença se encontra entre o 
modo como se vive e o modo como deveria ser feito, em vez do 
que na realidade se faz, aprendem antes a própria derrota do que 
sua preservação; e, quando um homem deseja professar a bondade, 
natural é que vá à ruína, entre tantos maus. Assim, é preciso que, 
para se conservar, um príncipe aprenda a ser mau, e que sirva ou 
não disso de acordo com a necessidade (MAQUIAVEL, 1999, p. 99). 
O que resolve os problemas de fato, é agir do modo que for necessário, visando 
se conservar. Maquiavel não está discutindo aqui se o homem é bom ou mau 
por natureza. A questão está em atender às próprias necessidades. A análise das 
coisas de um modo realista parece retomar lugar aqui. O fato de contrapor-se 
ao pensamento cristão à grande parte dos pensadores antigos, faz com que Ma-
quiavel tenha uma dura tarefa, mas é exatamente isso que constitui o marco de 
seu trabalho, um pensamento que, de forma original, coloca-se contra a cultura 
dominante de sua época. O príncipe que quisesse fracassar, precisaria tão somente 
praticar os princípios da moral cristã. Princípios, esses, que visariam o bem em 
geral, enquanto que o governante precisaria priorizar o bem de seu povo. 
O conceito de virtù aparece mais claramente no decorrer das lições que 
podemos apreender em sua obra. Maquiavel vai contra o pensamento polí-
tico dominante de sua época. A virtù tem relação com a capacidade de agir 
de acordo com a necessidade do estado, sem se ater quanto a praticar uma 
boa ou má ação. Costumamos dizer na atualidade que há exceções nas ques-
U
N
ID
A
D
E 
2
68
tões morais, estando a vida acima de 
qualquer lei, por ser essa (a vida) um 
bem maior. Mas, aqui, o ‘bem maior’ 
é uma preservação do estado para 
seu fortalecimento. Trata-se de uma 
flexibilidade moral, da qual o prín-
cipe não poderá abrir mão. Partindo 
da discussão anterior, podemos pôr 
em cheque a moral do próprio Ma-
quiavel? O termo maquiavélico tem 
origem de seu nome, isso é inegável. 
Nome que descreve tudo o quanto há 
de mais sórdido, ao menos na inter-
pretação “popular” equivocada.
Bem, não é necessariamente atribuível a ele a posição de uma pessoa má, 
se bem que a Igreja o perseguiu na segunda metade do século XVI, colocando 
as suas obras no Index, lista dos livros proibidos. Mas sua condenação chegou 
a ser feita por pessoas que conheciam sua obra de segunda mão, o que as levou 
a fazerem uma leitura “maquiavélica”. Esses fatos fizeram com que, até hoje, seja 
alimentada uma opinião equivocada sobre sua pessoa e suas atitudes, associan-
do-o, ainda, hoje, a tudo o que é imoral (PANCERA, 2009).
Figura 1 - Instrumentos de Tortura
O Index Librorum Prohibitorum ou “Index Expurgatorius” foi uma lista de publicações 
proibidas pela Santa Sé (ou sede), por serem consideradas heréticas e de várias linhas de 
pensamentos divergentes, desde o início do cristianismo. 
Fonte: Silvestre ([2019], on-line)1.
conceituando
Também expressivo é o conceito de fortuna. Podemos perceber que a fortuna se 
refere a estar preparado, porque se não estiver, quando a oportunidade passar 
você pode perdê-la. É saber enfrentar as adversidades. A fortuna poderia pegar 
o sujeito desprevenido, daí a importância de estar sempre alerta. Esse fenômeno 
poderia tanto trazer a glória, sem o emprego de qualquer esforço, quanto levar 
um governante desavisado à ruína.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
69
Como ressaltamos, a força da fortuna dirigi-se tanto a um sentido ruim quanto 
a um sentido bom. A “deusa da fortuna” tem seus caprichos, como no esquema de 
antropomorfização dos deuses da antiguidade, podendo conceder benesses ou cas-
tigos. Poderíamos perguntar, então: como se poderia chamar a atenção da fortuna 
para que ela venha a escolher o governante? A fortuna seria mesmo uma mulher? 
Pensavam os moralistas que, se ela fosse mulher, poderia preferir as qualidades de 
um homem viril e corajoso. Esses atributos, vamos lembrar, já afirmava Cícero, 
poderiam ser encontrados apenas no homem que possui virtù.
Em sua obra O Príncipe, Maquiavel, no capítulo XXV, diz serem os homens 
governados pelos desígnios da fortuna e também por Deus. A prudência dos ho-
mens também é insuficiente para corrigir ou evitar algo. Há, ainda, a preocupação 
de Maquiavel com o livre arbítrio. Se a fortuna, como determinada oportunidade 
que é, nos aparecer e não estivermos preparados, realmente seria uma situação 
complicada. O livre-arbítrio proposto pelo filósofo parece ser parcial. Como pode-
mos observar na citação seguinte a fortuna interferiria em metade de nossas ações.
 “ Entretanto, para que nosso livre-arbítrio não se anule, penso que se 
pode afirmar que a fortuna decide sobre metade de nossas ações, mas 
deixa a nosso governo a outra metade, ou quase. Comparo-a a um 
desses rios devastadores que, quando se enfurecem, alagam as pla-
nícies, derrubam árvores e construções, arrastam grandes torrões de 
terra deum lado para outro: todos fogem diante dele, todos cedem a 
seu ímpeto sem poder contê-lo minimamente. E, como eles são feitos 
assim, só resta aos homens providenciar barreiras e diques em tem-
pos de calmaria, de modo que, quando vierem as cheias, eles escoem 
por um canal ou provoquem menos estragos e destruições com seu 
ímpeto. Algo semelhante ocorre com a fortuna, que demonstra toda 
sua potência ali onde a virtude não lhe pôs anteparos; e para aí ela 
volta seus ímpetos, onde sabe que não se construíram barreiras nem 
diques para detê-la. E, se considerarem a Itália, que é a sede dessas 
variações e quem lhes deu movimento, verão que ela é um campo sem 
barreiras e sem nenhum anteparo; porém, se estivesse protegida por 
adequadas virtudes, como estão a Alemanha, a Espanha e a França, ou 
esta cheia não teria feito as grandes mudanças que fez, ou ela não teria 
nem mesmo ocorrido. E creio que, de modo geral, isto baste quanto a 
fazer frente à fortuna (MAQUIAVEL, 2008, p. 98).
U
N
ID
A
D
E 
2
70
O texto é esclarecedor acerca de que, há coisas que não podemos impedir, 
como o turbilhão de água que corre rio abaixo, devido a uma chuvarada, e coisas 
que podemos e devemos fazer, de modo a precavermo-nos de tais intempéries. 
É exatamente o que ocorre no caso da fortuna. Se o sujeito não for dotado de 
suficiente virtude, terá ao menos que se precaver, de modo que a fortuna será a 
clareza e motivação, independentemente de querer ou não. Teria, pois, o governo 
da Itália que se precaver das intempéries da desunião e partir para o fortalecimen-
to político. Formar as Milícias Nacionais seria o modo como poderiam montar 
os “diques” para tal reestruturação.
O Príncipe e os Discursos Sobre a 
Primeira Década de Tito Lívio
Talvez, pela sua relevância e fama, O Príncipe venha a obscurecer a importância 
dos Discursos Sobre a Primeira Década de Tito Lívio, o que, por sua vez, pare-
ce “ocultar” aspectos republicanos de sua obra, contidos nessa última. Já outras 
interpretações, que destacam aspectos mais republicanos, tendem a valorizar os 
Discursos. Como ressalta Pancera (2009, p. 420), muitos foram os que desquali-
ficaram O Príncipe, como se fosse uma obra de ocasião, escrita num momento 
em que parecia ser possível o estabelecimento de um principado na Itália, ou 
pelo fato da obra ter sido dedicada ao senhor de Florença, para que Maquiavel 
voltasse a participar dos serviços públicos. Do que foi exposto anteriormente, o 
que podemos verificar? Tratariam O Príncipe e os Discursos de temas tão dife-
rentes e, mesmo, contraditórios? Ou será que mesmo diferentes, as obras atuam 
de um modo complementar? 
Há, para maquiavel, em todo tipo de sociedade política, uma estrutura de re-
lação de domínio. De um lado estão os que desejam governar e, do outro, aqueles 
que desejam não ser oprimidos. Tais desejos ambíguos, constituem a sociedade 
política, que apontam para o que formaria a unidade da obra maquiaveliana. As 
mais variadas coisas que se dão, a partir de tais junções e problemas, é que faz 
surgir a república, um principado, ou ainda, o que o filósofo chamava de licença, 
que significa a ausência de qualquer tipo de ordem. N’O Príncipe não é tratado, 
apenas, da república e dos principados. O modo de se referir aos principados, 
ajuda a entender e, talvez, desfazer as rígidas fronteiras que pareciam separar os 
objetos de ambas as obras, o que facilita a passagem de uma obra a outra.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
71
Não teriam, dessa forma, O Príncipe e os Discursos as suas particularidades? 
É claro que teriam. Maquiavel pensa O Príncipe, partindo da consideração da 
divisão de desejos que constituíram as sociedades políticas. Regime esse que se 
instaura pelas relações de servidão, em que as leis são diferentes do que ocorre 
nas repúblicas. Na república, a lei é a mediadora das relações. Essas leis devem 
ser derivadas da participação dos cidadãos. Já nos Discursos Sobre a Primeira 
Década de Tito Lívio, o filósofo trata da república, de um governo livre. Ele fala 
de uma liberdade que coloca os cidadãos em pé de igualdade perante as leis. Os 
cidadãos podem participar na determinação dos rumos do estado. No capítulo II 
dos Discursos, Maquiavel fala sobre como foram feitas as leis em alguns Estados:
 “ Umas, desde o momento do seu nascimento, ou logo depois, rece-
beram as leis das mãos de um só homem, como as deu Licurgo a 
Esparta. As outras as receberam várias vezes e segundo os eventos: 
foi o que se deu em Roma. Pode-se chamar feliz a república à qual o 
destino concede um homem tão prudente, que as leis que ele lhe dá 
são combinadas de maneira a poder assegurar a tranquilidade de cada 
um, sem que seja necessário reformá-las. É assim que se vê Esparta 
observar as suas, durante mais de oito séculos, sem alteração e sem 
desordens perigosas. Pelo contrário, pode-se considerar infeliz a cida-
de que, não tendo caído nas mãos de um sábio legislador, é obrigada a 
restabelecer, por si própria, a ordem no seu seio. Entre as cidades desse 
gênero, a mais infeliz é aquela que se encontra mais afastada da ordem; 
e a mais afastada da ordem é aquela cujas instituições se acham todas 
desviadas do caminho reto, que a pode conduzir a seu algo perfei-
to e verdadeiro, pois é quase impossível que ela ache nessa posição 
qualquer evento feliz que restabeleça a ordem no seu seio. Aquelas, 
pelo contrário, cuja constituição é imperfeita, mas cujos princípios são 
bons e suscetíveis de aperfeiçoamento, podem, segundo o curso dos 
acontecimentos, alçar-se até a perfeição. Deve-se estar persuadido de 
que as reformas nunca se farão sem perigos pois a maior parte dos 
homens não se curva voluntariamente a uma lei nova quando essa 
lei estabelece na cidade uma nova ordem de coisas à qual eles não 
vêem a necessidade de se submeter. (MAQUIAVEL, 2008, p. 80-81).
Há uma dificuldade na correção do rumo, com a implantação de outras leis para que 
a república possa atingir a perfeição, e essa reside nos homens não acatarem com 
facilidade uma lei nova. 
U
N
ID
A
D
E 
2
72
A cidade de Florença, como complementa Maquiavel, é prova dessa di-
ficuldade que estamos trazendo à tona aqui. Ela foi reorganizada depois da 
revolta de Arezzo em 1502, mas tornou a ser desorganizada.
O acaso e o imponderável podem se dar no que compete à fortuna. Ela, ao 
mesmo tempo que pode trazer a glória, pode também trazer a ruína. A vida e 
a conjuntura política são essencialmente mutáveis. Há que ficar, o homem, de 
olho em tudo, estando atento a qualquer mudança. O homem que observa es-
sas coisas seria o homem de virtù. É aquele homem que, como dissemos, pode 
construir um dique, levantar barreiras capazes de controlar os transtornos 
e as intempéries da vida. As coisas mudam de tempos em tempos, devendo, 
então, o governante preparar-se para o que for necessário para se precaver. 
Tudo isso envolve, ainda, a astúcia Política.
O filósofo apregoa que o governante tenha a qualidade da audácia, co-
ragem e virilidade, de modo a poder atrair e enfrentar a fortuna, ou melhor, 
dominá-la. Com certeza, a estabilida-
de política estará sempre ao alcance 
do príncipe corajoso e impetuoso. 
Este receberá prêmios pela escolha 
da fortuna e sua sabedoria, evitando 
todo possível desastre. Seria besteira 
governar sem os instrumentos da virtù 
e da fortuna, elas cruzarão o caminho 
uma da outra.
Maquiavel em sua teoria do gover-
no faz uma péssima imagem do ho-
mem. Ao ser estudadas as relações de 
virtudes tradicionais, transmitidas pe-
los moralistas romanos e comparadas 
com a virtù maquiaveliana, é possível 
vermos de modo mais claro, a razão de 
recusa que o filósofo fez da vontade ou 
da generosidade como vetor das ações 
adotadas pelos governantes.
Há uma grande distância entre a 
visão utópica de como se deveria viver 
para como se vive.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
73
 “ Porque há tamanha distância entre como se vive e como se 
deveria viver, que aquele que trocar o que se faz por aquilo que 
se deveria fazer aprendeantes a arruinar-se que a preservar-se; 
pois um homem que queira fazer em todas as coisas profissão 
de bondade deve arruinar-se entre tantos que não são bons. 
Daí ser necessário a um príncipe, se quiser manter-se, aprender 
a poder não ser bom e a valer-se disso segundo a necessidade 
(MAQUIAVEL, 2007, p. 73).
Em nome da manutenção de si, um homem não deve se fiar em ajudar a to-
dos quantos puder, mas garantir a si mesmo e, se estiver no governo, garantir 
o bem do estado. Para Maquiavel, os homens não são bons. A bondade na 
condução do estado não tem vez. Os homens, como diz Skinner, são ingratos, 
mentirosos, embusteiros, fogem do perigo e são ávidos de vantagem (SKIN-
NER, 2003).
Nos Discursos sobre a Primeira Década de Tito Lívio, o pessimismo quan-
to ao homem continua a aflorar. Entretanto, não seria necessário recorrer ao 
uso da força para conduzir o povo. E também, não é apregoado pelo filósofo 
que o povo deva temer os soberanos o tempo todo. Referente a essa questão 
de conduzir o governo e o povo com habilidade, podemos recorrer ao início 
do capítulo XXVII dos Discursos.
 “ Os homens muito raramente sabem ser inteiramente bons ou 
inteiramente maus. O Papa Júlio II, indo a Bolonha em 1505, para 
de lá escorraçar a família dos Bentivogli, que havia possuído o 
poderio dessa cidade durante largos anos, queria também afastar 
de Perúgia João Paulo Baglioni, que era o tirano dessa cidade, 
pretendendo agir como se tivesse resolvido dar cabo de todos os 
tiranos que ocupavam as possessões da Igreja. Chegado perto de 
Perúgia, transbordante desse espírito audacioso e decidido que 
todos nele reconheciam, não quis esperar, para entrar na cidade, 
o exército que o poderia apoiar. Penetrou nela sozinho e desar-
mado, apesar de saber que João Paulo aí se achava com grande 
número de tropas, reunidas para defendê-lo. Arrebatado pela 
impetuosidade que dirigia todas as suas ações, confiou-se com 
sua simples guarda, nas mãos do inimigo, que conseguiu trazer 
consigo, deixando na cidade um governador para administrá-la 
em nome da Igreja (MAQUIAVEL, 2008, p. 134). 
U
N
ID
A
D
E 
2
74
Essa ação do Papa Júlio II colocou em destaque sua coragem e ressaltou a atitude 
covarde de Baglioni, que não reagiu. Nem sempre se revestir de autoridade deu 
certo na história, mas, nesse caso, acabou bem. A ideia que Maquiavel passa na 
citação é que ninguém é ou precisa ser mau o tempo todo, pois não é isso neces-
sariamente que leva ao êxito. Mesmo porque um povo não suportaria viver sob 
o domínio de um governante que fosse mau a todo momento.
A Mandrágora
Mesmo em obras que não tratam diretamente sobre política, por exemplo, na co-
média A Mandrágora, podemos perceber o ardil de um dos personagens principais, 
que vai de consonância com uma moral do interesse. Na peça, Callimaco por estar 
apaixonado por Lucrezia, esposa de Messer Nicia, um advogado já idoso, procura 
enganar esse último para conquistar sua amada. Diante da infertilidade de Messer, 
callimaco diz haver uma planta que poderia resolver seu problema: a mandrágora. 
Essa planta deveria ser dada a Lucrezia antes dela ter relação com outro homem, o 
qual morreria, depois disso, o perigo passaria e tudo estaria bem, podendo enfim ter 
um filho. Mas tudo não passava de uma trama para que Messer consentisse de outro 
homem (no caso Callimaco) pudesse ficar com ela e tentar conquistá-la.
Essa peça é mais um exemplo de como a virtude cristã não entra no esquema 
de sua teoria. É uma busca pelo ganhar a todo custo. O cinismo não tem prece-
dentes, de forma que os homens são vistos como invejosos, ingratos, dissimu-
lados, maldosos, ambiciososetc., tudo concorre para que Maquiavel pense ser 
melhor que o príncipe seja alguém odiado do que amado. Como o mundo pode se 
apresentar hostil a qualquer tempo, o príncipe deve estar com sua espada pronta 
para reagir a qualquer conflito da forma mais vantajosa possível. 
Como ser um Príncipe
O embate entre amor versus temor aparece tanto em O Príncipe quanto nos Dis-
cursos. O filósofo cita os casos de Cipião e de Aníbal. Olhando o governo de Cipião, 
percebe-se que ele foi bom e liberal e, além disso, conquistou o amor de seu povo, 
porém teve seus soldados se rebelando contra ele. O acontecido se deu na Espanha, 
onde preponderou o fato de terem pouco a devotar a seu líder. Os homens em sua 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
75
inquietude, mesmo tendo quem 
lhes oportunize uma coisa, por 
melhor que seja, logo esque-
cem do amor que nutriam pelo 
príncipe. E qual foi a forma, de 
contornar tal ocorrido, adotada 
por Cipião? Ele se viu obrigado 
a se utilizar, em parte, da mes-
ma crueldade a qual fugira an-
tes. Para Maquiavel, Cipião te-
ria pago pela sua imprudência. 
Aníbal, por sua vez, foi temido 
pela sua crueldade. E não parece haver, na história, algum exemplo particular que 
mostre que sua crueldade e deslealdade tenham lhe causado prejuízo.
Qual é, então, a mensagem que Maquiavel quer nos transmitir sobre o prínci-
pe? É a de que o príncipe ser bom ou mau não é uma questão de escolha, necessa-
riamente. Vê-se que a bondade, a clemência e a justiça nem sempre são passíveis 
de serem implantadas. Por mais beleza que haja nesses adjetivos citados, não é 
assim que a sociedade funciona. Não é uma defesa dos defeitos e vícios humanos, 
é a realidade como ela se apresenta. A história tem uma “tendência a se repetir”, 
daí que se faz importante analisar bem os fatos, na intenção de que o presente e 
o futuro não se mostrem traiçoeiros. O que o filósofo, aqui em pauta, procurou 
fazer, não ignorando seu objetivo de voltar à cena política, foi mostrar de modo 
insistente a forma como os fatos têm dado prova de que não compensa agir sem 
mão firme. Qual seria, então, uma das mais importantes funções do príncipe de 
virtù? Esse deve estudar a história, para que saiba qual o melhor curso que deve 
tomar as suas ações políticas.
Chabod afirma que Maquiavel, nos Discursos, fala da religião e insiste em sublinhar sua im-
portância (“E assim como a observância do culto divino é causa da grandeza das repúblicas, 
assim o desprezo do mesmo é causa da ruína dela ”). Continuando, nos próprios Discursos, 
Maquiavel afirma: “Onde não existe o temor de Deus é preciso que o império sucumba ou 
que seja sustentado pelo temor de um príncipe capaz de substituir a religião ”.
Fontes: Chabod (1984, p. 257); Maquiavel (2008, p. 108-109).
explorando Ideias
U
N
ID
A
D
E 
2
76
Como acentua Isaiah Berlin, o fato de Maquiavel sustentar que o ser humano 
é ruim e deve estar preparado para fazer as mais diversas crueldades, não 
deve se confundir com a personalidade do próprio filósofo, tornando-o um 
“sádico”, ou coisa do gênero. Em resumo, ele quer dizer que não se deve traçar 
o perfil de Maquiavel, partindo de seus escritos políticos (BERLIN apud FER-
REIRA, 2009). Outro fator que confirma um perfil diferente, em Maquiavel, 
é o fato dele não se agradar dos líderes que abusam da crueldade, sem que 
haja necessidade. 
No capítulo XV d’O Príncipe, Maquiavel, mais uma vez, tateando pelo seu 
realismo, fala do comportamento dos príncipes, pelo fato de estarem em um 
alto cargo referente ao governo, no que concerne a seu comportamento. Fala 
também das qualidades que lhes dão valor ou reprovação. Alguns seriam tidos 
como liberais, outros considerados miseráveis, que vem do termo toscano 
misero, porque avaro, que está associado àquele que deseja possuir as coisas 
por meio de rapinagem, e a palavra miseri denota os que se abstêm muito 
de usar aquilo que possuem. No geral, os príncipes são tidos como pródigos, 
outros como rapaces, alguns seriam cruéis, outros ainda piedosos; “perjuros 
ou leais; efeminados e covardes ou truculentos e corajosos; humanitários ou 
arrogantes; lascivos ou castos; estúpidos ou astutos; enérgicos ou fracos; sérios 
ou levianos; religiosos ou incrédulos, e assim por diante” (MAQUIAVEL, 1999, 
p. 100). O filósofo diz ainda que não haveria quem discordasse ser louvável 
um príncipepossuir das qualidades mencionadas, as consideradas boas. En-
tretanto a natureza humana impediria a posse total de todas elas. E é mesmo 
difícil que tudo isso se dê na prática.
O príncipe deve sempre evitar os defeitos que possam lhe tirar o governo, 
e pôr em prática todas as qualidades possíveis de auxiliar para que ele garanta 
a posse desse. Tudo, é claro, dentro do possível. E uma vez que não possa, deve 
deixar as coisas seguirem seu curso natural. Que ele ignore a má fama de ter 
tantos defeitos, sujeitando-se a isso se preciso for. A observância de todas a 
virtudes, no entanto, poderá levá-lo à ruína, e outras podem se assemelhar 
a vícios, mas que, se observadas, podem levar à estabilidade e segurança do 
principado e do governante.
A história fornece os exemplos acerca do governo do príncipe, da guerra e de 
tantas outras coisas, e Maquival valorizava isso. As observações fornecem dados 
capazes de orientar e aconselhar os políticos. Ao tratar da guerra ele também dá 
destaque à história. No entanto o que seria, exatamente, tal arte:
U
N
IC
ES
U
M
A
R
77
 “ Arte da Guerra é um tratado de estratégia militar, desdobrado de 
maneira sistemática e com minúcia obsessiva, a despeito de que 
formalmente se apresente como um diálogo, como uma conversa-
ção aprazível entre homens experientes e cultivados, desfrutando 
a sombra e as comodidades do jardim da casa de um dos persona-
gens: o palácio Rucellai em Florença. Os personagens, curiosamente, 
Maquiavel os forma e nomina como contemporâneos seus, nota-
damente o comandante Fabrizio Collona, em cujas falas coloca seu 
pensamento, e que é secundado na tertúlia por outras pessoas tam-
bém muito reais, como são Cosimo Rucellai – o anfitrião – e Bat-
tista della Palla, Zanobi Buondelmonte e Luigi Alemanni – jovens 
amigos de Rucellai, que, diz Maquiavel, eram homens de qualidade 
e amantes dos estudos (TORRES apud MAQUIAVEL, 2008, p. 11).
Entretanto as últimas páginas d’O Príncipe discutem o fato da Arte da Guerra 
não ser mera complementaridade do estudo, visando, apenas, a uma satisfação 
à necessidade teóricae ao complemento da estratégia militar. A Arte da Guerra 
pode ser vista como uma obra engajada, que objetiva incentivar o povo italiano 
a se preparar e se desenvolver e, ao mesmo tempo, mostrar-lhe suas fraquezas, 
pois, assim, ele poderá achar o caminho necessário para se livrar dos problemas.
Em que medida devemos nos perguntar se a arte da guerra é importante para 
o príncipe? Maquiavel aconselha os principados a terem sempre um exército 
bem treinado. Disso, depende a defesa do principado e a sua própria. O capítulo 
XIV d’O Príncipe é bem claro acerca dos deveres do Príncipe com suas milícias.
 “ Um príncipe não deve ter outro objetivo ou pensamento, ou manter 
qualquer outra coisa como prática, a não ser a guerra, seu regulamento 
e sua disciplina, pois essa é a única arte que se espera de quem coman-
da. É ela de tal poder que não apenas conserva príncipes aqueles que 
assim nasceram como muitas vezes permite que cidadãos de situação 
particular elevem-se àquela condição. Constata-se a perda dos Estados 
aos príncipes que se ocuparam mais com os luxos da vida do que com 
as armas. A casa que te levará a perder o domínio, em primeiro, é des-
cuidar dessa arte, e só o poderás conquistá-lo ao professá-la. Francesco 
Sforza, de simples particular, tornou-se duque de Milão, e isso porque 
se armou; já seus filhos, fugidos aos deveres das armas, de duques pas-
saram a simples cidadãos (MAQUIAVEL, 1999, p. 95).
U
N
ID
A
D
E 
2
78
Claramente, um príncipe deve deixar de lado sua particularidade. O exemplo 
dos Sforza é claro: age-se preventivamente ou se entrega a uma condição me-
nor de vida. O desarmamento para Maquiavel leva, rapidamente, à submissão, 
o que caracteriza uma desonra e essa é uma condição que deve ser evitada 
pelo príncipe. Chega a ser incomparável a situação de um príncipe armado 
em relação a um desarmado. O príncipe que estiver armado não obedecerá 
de bom grado o que está desarmado.
Na concepção republicana de Maquiavel, foram os conflitos que geraram tamanha desor-
dem e fizeram com que a Florença perdesse de vista o ideário de governo republicano, 
que, na visão do nosso autor, seria a melhor maneira de governar uma cidade, por ser um 
modelo mais razoável, visando geralmente os interesses mútuos de seus cidadãos.
(A. Borges Neto)1).
pensando juntos
MILÃO
Ducado de Milão
Atualmente sob
controle francês
FLORENÇAFLORENÇA
República de Florença
Ameaçada pelo
expansionismo
dos Bórgia
Reino de Nápoles
Recém-invadido e dividido
entre a França e os espanhóis
de Aragão
REINO DE 
NÁPOLES
Roma
ESTADOSESTADOS
PONTIFÍCIOSPONTIFÍCIOS
República de Veneza
A potência comercial do
Mar Adriático enfrenta
cerco turco
VENEZA
Estados Pontifícios
Alexandre VI agita os
territórios da Igreja
A ITÁLIA NO TEMPO DE MAQUIAVELA ITÁLIA NO TEMPO DE MAQUIAVEL
(1469-1527)(1469-1527)
A PENÍNSULA DIVIDIDAA PENÍNSULA DIVIDIDA
Figura 2 - Península da Itália no Tempo de Maquiavel (1469-1527)
Fonte: adaptada de Medeiros (2014, on-line)2. 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
79
O príncipe deve se preocupar a todo momento com a arte da guerra, pra-
ticando exercícios que possibilitem atingir os seguintes objetivos: treinar o 
pensamento e exercitar o corpo nos mais variados terrenos. “Quanto à ação, 
além de conservar os soldados sob disciplina e sob exercício constante, deve 
sempre fazer grandes caçadas, nas quais além de acostumar o corpo aos des-
confortos naturais da vida em campanha ainda aprenderá a natureza dos 
locais[...]” (MAQUIAVEL, 1999, p. 96). Essa experiência possibilitará que o 
príncipe conheça melhor o seu próprio país; observe sua defesa; reconheça 
lugares novos, sabendo de imediato o que é preciso especular, uma vez que os 
montes, vales, planícies, pântanos e rios da Toscana são semelhantes aos de 
outras cidades. Essa preparação para a guerra está vinculada, como já aler-
tara insistentemente Maquiavel, à defesa dos principados e, principalmente, à 
tentativa de unificação da Itália. Por meio de alguns mapas de sua época, em 
um comparativo com as fases da unificação de seu país, percebemos, vendo 
o mapa da Itália atual, as mudanças ocorridas.
Na figura 3, a seguir, 
podemos ver o processo 
de unificação. Muito além 
da época em que Maquia-
vel viveu. Observe que o 
mapa apresenta modifi-
cações que vão desde o 
ano 1859 até o ano 1920. 
Reparemos que, acima do 
mapa em listras verme-
lhas, aparecem territórios 
cedidos à França. Desde o 
tempo de Maquiavel, a Itá-
lia era constituída por um 
aglomerado de pequenos 
reinos ou repúblicas isola-
das. Ela caminha rumo a se 
tornar um estado moder-
no, conseguindo se unifi-
car em fins do século XIX.
IMPÉRIO
AUSTROHÚNGARO
SAVOIA
MAR TIRRENO
MAR ADRIÁTICO
MAR JÔNICO
MAR MEDITERRÂNEO
ESTADOS
PONTIFÍCIOS
ESTADOS
PONTIFÍCIOS
SEGREGADOS
PARMA
MODENA
TOSCANA
Reino de Piemonte - Sardenha em 1859
Aquisição em 1859
Aquisição em 1860
Territórios cedidos à França em 1860
SICÍLIA
REINO
DAS DUAS 
SICÍLIAS
PIEMONTE
TIROL
NICE
SARDENHA
VENEZA
ÍSTRIALOMBARDIA
FASES DA UNIFICAÇÃO
Aquisições em 1866
Anexos em 1870
Ampliações em 1920
Figura 3 - Itália - Fases Da Unificação (1859- 1920)
Fonte: adaptada de Espinoza (2010, on-line)3.
U
N
ID
A
D
E 
2
80
Na figura 4, a seguir, 
podemos perceber a nova, 
ou se preferirmos, a atual 
divisão político-geográfica 
da Itália. Os estados con-
servam hoje um tamanho 
mais proporcional em re-
lação às divisões da época 
de Maquiavel. 
A medida do agir do Príncipe
Novamente, recorrendo ao seu realismo político, Maquiavel se firma na posi-
ção de elogiar o príncipe capaz de manter a palavra dada. Não teria problema 
um príncipe voltar atrás na palavra dada. Mas por qual razão poderia o prín-
cipe tomar tal atitude? Trata-se do que o filósofo chama de atitude prudente, 
uma vez que guardar a palavra seria prejudicial. Também pode ser que tenha 
sido extinguida a razão pela qual se iria agir, não necessitandomais, para o 
bem do principado, que se mantenha o acordo. “Um príncipe prudente não 
pode nem deve manter a palavra dada quando isso lhe é nocivo e quando 
aquilo que a determinou não mais exista. Fossem os homens todos bons, 
esse preceito seria mau” (MAQUIAVEL, 1999, p. 110). Vemos, aqui, que não 
se trata de uma opção de Maquiavel o agir de uma forma que pareça má. É a 
natureza humana, por não ser necessariamente só boa que obriga o homem 
a agir de modo preventivo. As outras pessoas também não manterão suas 
palavras, o que faz com que não seja o agir, segundo seus interesses, uma 
atitude arbitrária. 
Figura 4 - Atual divisão político-geográfica da Itália
U
N
IC
ES
U
M
A
R
81
Ao falar da autonomia da política, temos que pensar na autonomia do indivíduo. 
Falamos, até aqui, da necessidade que Maquiavel via na ação do homem, visando 
o seu próprio bem. O combate às coisas pode se dar de dois modos: pela lei ou 
pela força. A primeira forma de combate, pela lei, corresponde à natureza do 
homem. A segunda é própria dos animais. Pelo fato de que só a primeira não se 
faz suficiente em todos os casos, há que se apelar, em muitos casos, complemen-
tarmente, à segunda. E, nessa metáfora, temos o seguinte: 
 “ [...]uma vez que um príncipe se vê obrigado a bem valer-se da nature-
za da besta, deve tirar dela as qualidades da raposa e do leão, porque 
este não tem defesa nenhuma contra as armadilhas, e a raposa, contra 
os lobos. Precisa, portanto, ser raposa para conhecer as armadilhas, e 
leão para atemorizar os lobos. Os que servirem exclusivamente dos 
leões não serão bem-sucedidos (MAQUIAVEL, 1999, p. 109-110).
O príncipe deve impor o medo pela força, como o leão, e ser astuto como a raposa. 
Um representante não deve se mostrar fraco por causa do empenho da palavra. 
Com o passar do tempo, a humanidade ganha novos conhecimentos. Certamen-
te, hoje em dia, devido ao sistema de comunicação do qual gozamos, podemos 
enxergar “mais longe” do que podia fazê-lo Maquiavel. 
3 
A ATUALIDADE E A 
AUTONOMIA 
DA POLÍTICA 
U
N
ID
A
D
E 
2
82
Vamos aos aspectos que transparecem maior autonomia em sua obra. O que 
pretendeu Maquiavel em sua teoria? Teria sido satírico ou realista? Vemos que ele 
põe à mostra tudo quanto foi iniquidade dos príncipes. É isso mesmo o que ocor-
reu? Assim, aferem Mosca e Bouthoul:
 “ Como se sabe, esta tese foi colocada pela primeira vez por Alberico 
Gentile, aceita por Rousseau e repetida em seguida por Alfieri e por 
Fóscolo. Mas esta hipótese parece que deve ser afastada porquanto, 
contrariamente ao que foi afirmado por Rousseau, não se encontra 
qualquer contradição entre o pensamento de Maquiavel, tal como o 
expõe no Príncipe, e o que exprime nas suas outras obras. Além disto, 
quando Maquiavel sugere uma ação imoral, muito frequentemente 
ele se escusa, alegando a necessidade de agir com malignidade, dado 
que os homens são maus. Subentende-se que se os homens fossem 
bons ele aconselharia que se seguissem outros métodos (MOSCA; 
BOUTHOUL, 1980, p. 115).
O príncipe tem autoridade para agir de modo autônomo, mas o reflexo de sua 
ação não visará e nem expressará a justiça. Lida-se com a realidade da melhor 
forma possível, tentando representar o principado, mesmo que a face mais torpe 
do príncipe precise aparecer.
Poderíamos dizer que a política pode ser realizada, mantendo-se longe dos 
princípios morais? O príncipe deve se conformar à sua realidade. Não se apregoa, 
no entanto, na obra de Maquiavel que se deva ficar de modo sistemático fora da 
moral. Caso contrário, o político seria abominado pelos seus governados, e com 
razão, uma vez que isso foi exatamente o que ocorreu com César Bórgia a ponto de 
causar sua queda. Quem não se propõe a agir de um modo misto, deve ser questio-
nado quanto à sua aptidão para se tornar um homem de Estado. 
Teria Maquiavel fundado uma ciência política de fato? Parece que vai de en-
contro com suas aptidões, tal proposição. Ele fez uma grande análise das socieda-
des humanas, identificando tendências políticas marcantes e com características 
típicas. Para ele, bastava que se estudasse a história dos mais diferentes povos. Ele 
se esforçou por fundamentar a ciência política, mas o que ocorreu é que, em sua 
época, a crítica histórica não havia nascido ainda. E qual a consequência disso? Sem 
dados mais precisos ficava difícil tratar do assunto de modo mais assertivo. O que 
Maquiavel tinha disponível em sua época era a história dos gregos e dos romanos.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
83
Maquiavel elaborou um manual de política, passível de ser utilizado, com algu-
mas atualizações, é claro, por governantes de todos os tempos. Há quem diga que ele 
criou uma arte política. Apregoando que devemos nos fiar na história, Maquiavel 
recomenda que o governante se baseie nela. Ele próprio, como dissemos, parece ter 
se inspirado demasiadamente nos feitos dos antigos gregos e romanos. Por outro 
lado, ele se equivocou ao pensar que seria suficiente, para ter bom êxito, imitar esses 
povos. Mosca e Bouthoul (1980) afirmam que Maquiavel comete várias vezes tais 
equívocos n’O Príncipe e, ainda, nos Discursos. Nessa última obra, isso aparece de 
um modo mais acentuado, numa constante contraposição entre a Roma Antiga e 
Florença, com maior destaque a superioridade da primeira em relação à segunda. 
O que ele não levava em conta era a grande diferença de meio e circulação em que 
cada uma das cidades se encontrava.
Para Maquiavel, portanto,seria necessário e útil que o governante pudesse fa-
vorecer os homens que eles não podem destruir. No entanto Mosca e Bouthoul 
contrapõem tal ideia com a seguinte análise acerca desse assunto: 
 “ [...]é impossível favorecer a uns sem lesar a outros: é o que acontece 
toda vez que se deve dispor de um cargo disputado por várias pessoas 
interessadas. Como é impossível, muitas vezes, reduzir à impotência 
aqueles que necessariamente tivermos descontentado, é preciso pos-
suir juízo rápido e seguro com o fim de discernir aquele que, entre 
os eventuais descontentes, devemos mais temer (MOSCA; BOU-
THOUL, 1980, p. 118).
Podemos perceber que realmente não é de simples aplicação tudo o que o filóso-
fo florentino apregoa, sendo passível, ainda, depararmo-nos com contradições. A 
obra de Maquiavel invita o governante a adular, fazer parceria, desprezar e quebrar 
acordos, conforme lhe parecer melhor para sua atuação política. O próprio filósofo 
parece não ter agido de modo imoral. Falam inclusive de ser um homem de fácil 
trato, além de não ter angariado mesmo uma grande fortuna, mas ter levado uma 
vida modesta. 
U
N
ID
A
D
E 
2
84
Originalidade do Pensamento Político de Maquiavel
Teria o pensamento político de Maquiavel trazido algo de original, ou seria so-
mente uma continuidade? Bem se sabe que ele é um marco na filosofia política, 
e isso tem obviamente determinadas razões. Uma primeira seria a preocupação 
de dar uma resposta à instabilidade política que marcava a Itália de sua época. 
É exatamente, por isso, que O Príncipe tinha, além do intento de ensinar a 
conquista dos Estados, ensinar como mantê-los e torná-los estáveis. A segunda 
é uma diferença no que se refere às obras políticas tradicionais. Maquiavel não 
coloca, na obra referida, todaa questão de abstração filosófica, especulativa ou 
mesmo utópica. Ele fala da realidade política, visando mostrar o que pode ser 
mais eficiente nas ações humanas. Essas ações não precisam ser norteadas pela 
moral e pela ética cristã, ou ainda qualquer outro critério de justiça.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
85
Para buscar a estabilidade, a política das ações morais não pode vigorar. O que 
importa de fato, é construir um estado forte. Esse modelo de pensamento inaugu-
rado por Maquiavel, traz à tona, como alertamos anteriormente, a era do realis-
mo político. Para ele, o cerceamento da Igreja e sua imposição por meio de seus 
mandamentos eram coisas que poderiam atravancar o ideal de um estado livre e 
forte. Seu liberalismo vem, inclusive,a quebrar a ideia de que ele era absolutista.
 “ A ideia que se tem de Maquiavel é a de que ele foi o grande defen-
sor do absolutismo, - e se há alguma coisa contra a qual o liberalis-
mo é radical, esta é sabidamente o absolutismo, quer dizer, o poder 
concentrado e ilimitado nas mãos de um só indivíduo, o monarca. 
Contudo, quando era inconcebível pensar fora dos padrões autori-
zados pela ética e pela teologia dogmáticas, Maquiavel rompe com 
tudo isso, promovendo a descoberta da liberdade do pensamento e 
inaugurando a modernidade. E não foi apenas essa liberdade que 
ele promoveu, diga-se de passagem. Com seu Príncipe absoluta-
mente inescrupuloso, Maquiavel estabelece, na prática, embora 
não tenha sido essa sua intenção, o império da esperteza e da força, 
ou da possibilidade do êxito do mais forte e astucioso, no jogo do 
poder, da competição e da concorrência (ULHÔA, 1999, p. 13).
Temos que tomar cuidado para que, uma interpretação errada da teoria de 
Maquiavel, principalmente impulsionada pelo fato de acharem que o filósofo 
ensina os príncipes a serem maus, venha a corroborar a ideia de que um regime 
absolutista seja mais adequado.
A aplicação de suas teorias, em sua época, poderia ter ajudado a unificar a Itália 
dividida, mas sua obra começa a circular, principalmente, depois de sua morte. Hoje, 
ainda, encontramos um mar de gente que frequenta seu pensamento. Alguns movi-
dos pela interpretação preconceituosa do que seria uma ação maquiavélica, outros 
ainda podem estar incitados pela sede de aprender a conquistar o poder e querer 
fazê-lo a todo custo, bem como mantê-lo. Mas o que se sobressalta, de fato, na teoria 
de Maquiavel é a forma realista de mostrar a natureza humana.
U
N
ID
A
D
E 
2
86
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em relação ao que estudamos das teorias de Maquiavel, pudemos inferir que 
sua originalidade, quanto ao estilo realista de escrever, torna sua filosofia um 
marco no advento da modernidade. Ele dá uma resposta ao problema da 
instabilidade, pela qual passava a Itália de sua época, cuja dificuldade de uni-
ficação era o grande problema da política vigente. Sua obra mais famosa, O 
Príncipe, além de ter sido dedicada a Lourenço de Médice, vem a ser também 
um manual com lições curtas acerca de como os governantes, no caso dele, 
o príncipe, podem agir, tanto para conquistar os Estados como para man-
tê-los. A obra de Maquiavel foge, portanto, às questões de abstração filosófica, 
especulativa ou mesmo utópica, inaugurando, como já assinalamos, uma teoria 
política realista, de modo que visa mostrar o que pode ser mais eficiente nas 
ações humanas. 
Dois conceitos básicos foram fundamentais para alimentar a convicção do 
filósofo da certeza do êxito da implantação de sua teoria: a virtù e a fortuna. A 
primeira trata das qualidades que todo governante deve , isto é, a sagacidade 
e a inteligência para discernir quando é melhor manter e quando é melhor 
retirar a palavra. Já a fortuna é estar preparado. Todo aquele que não estiver 
preparado pode perder a oportunidade que se lhe apresenta. O cotidiano 
apresenta várias adversidades, de forma que quem for pego desprevenido 
pode sucumbir às forças inimigas.
Enfim, a melhor forma de governo seria uma república ou principado. Os 
principados podem ser divididos em hereditários, esta é a forma mais fácil 
de conservar, porque os súditos já estão aptos a obedecer; mistos, onde não 
há uma estabilidade de poder; e novos, por incluir uma nação estrangeira 
em uma que já estava estabelecida. Se por um lado, nem todas as teorias de 
Maquiavel foram postas em prática, para o bem de todos; por outro lado, até 
hoje, algumas dessas teorias têm inspirado muitos homens, na tentativa de 
conquistar o poder e se impor por ele.
87
na prática
1. A obra O Príncipe constituiu-se um manual para governantes, com o intuito de en-
sinar o príncipe como conquistar Estados e conservá-los. Assim sendo, de acordo 
com as teorias contidas nas obras de Maquiavel, como o príncipe poderia agir para 
assegurar tais coisas?
2. Maquiavel, apresenta alguns preceitos, dos quais deve ser dotado todo e qualquer 
homem que liderar o Estado. Trata-se da virtù e da fortuna, que, se bem executadas, 
poderiam ter ajudado a Itália a conseguir a unidade e força política que o filósofo 
tanto almejava. Leia as questões a seguir que confirmam o que sejam a virtù 
e a fortuna:
I - A virtù não trata da sagacidade e nem da inteligência. Ela não representa o fato 
de saber quando manter a palavra e quando é necessário quebrá-la. 
II - A força da fortuna pode se referir a um sentido ruim ou asentido bom. A “deusa 
da fortuna” tem seus caprichos, como no esquema de antropomorfização dos 
deuses da antiguidade, podendo conceder benesses ou castigos.
III - Uma das qualidades desejáveis ao homem de Estado deve ser a virù.
IV - Em sua obra O Príncipe, Maquiavel, no capítulo XXV, diz serem os homens go-
vernados pelos desígnios da fortuna e, também, por Deus.
Assinale a alternativa correta:
( ) Apenas, I e II estão corretas.
( ) Apenas, II e III estão corretas.
( ) Apenas, I está correta.
( ) Apenas, II, III e IV estão corretas.
( ) Nenhuma das alternativas está correta.
88
na prática
3. No tocante à autonomia da política, temos que pensar também no que seria a 
autonomia do indivíduo. Falamos da necessidade que Maquiavel via na ação do 
homem, visando o seu próprio bem. Nesse sentido, combate no campo das coisas 
políticas pode se dar de dois modos: pela lei ou pela força. 
Leia as alternativas a seguir, depois, assinale Verdadeiro (V) ou Falso (F):
( ) A primeira forma de combate, pela lei, corresponde à natureza do homem. 
( ) A segunda não é própria dos animais. 
( ) Pelo fato de que só a primeira não se faz suficiente em todos os casos, há que 
se apelar, em muitos casos, complementarmente, à segunda. 
4. Considere o texto: “para buscar a estabilidade, a política das ações morais não 
pode vigorar. O que importa de fato é construir um estado forte. Esse modelo de 
pensamento, inaugurado por Maquiavel, traz à tona, a era do realismo político. Para 
ele o cerceamento da Igreja e sua imposição por meio de seus mandamentos eram 
coisas que poderiam atravancar o ideal de um estado livre e forte. Seu liberalismo 
vem, inclusive, a quebrar a ideia de que ele era absolutista”. Agora, responda: quais 
são as contribuições originais que o pensamento de Maquiavel nos traz?
5. “Um príncipe prudente não pode nem deve manter a palavra dada quando isso lhe 
é nocivo e quando aquilo que a determinou não mais exista. Fossem os homens 
todos bons, este preceito seria mau” (MAQUIAVEL, 1999, p. 110). 
A partir dessa assertiva, o que o príncipe deve fazer para que possa evitar que lhe 
tirem o poder?
89
aprimore-se
Por ocasião da busca de Maquiavel por uma teoria realista, no intento de formar um 
governo republicano, lançamos, aqui, luz à teoria democrática por um viés realista. 
O objetivo é apurar a possibilidade do realismo, como base, fomentar diferentes 
formas de governo.
“A visão partilhada por muitos daqueles realistas que se dedicaram ao estudo da 
Democracia no século XX levou a conclusões diversas (por vezes pessimistas) sobre 
a plausibilidade de se encontrar efetivados os clássicos ideais democráticos. Max 
Weber e Joseph Schumpeter, dois dos autores mais representativos dessa corrente, 
ofereceram análises das Democracias contemporâneas em que a participação de-
mocrática e o ideal da soberania popular deram lugar aos mecanismos institucionais 
formais e a processos de concorrência pelo poder. A perspectiva do realismo político 
está ancorada no diagnóstico mais amplo de uma modernidade política caracteri-
zada pela existência de sociedades altamente complexas e pluralistas. Sociedades 
complexas (compostas por um Estado burocratizado, por uma economia de merca-
do desenvolvida e por uma sociedade civil fragmentada em grupos de interesse) 
possuem um alto grau de diferenciação funcional que acompanhaa racionalização 
do direito, a concentração das empresas e a extensão da intervenção estatal sobre 
os mais diversos âmbitos da atividade humana. Sociedades plurais, que não contam 
mais com uma eticidade tradicional e comum, são regidas por uma multiplicidade 
de valores e de interesses que na maior parte das vezes são irreconciliáveis entre si 
e ensejam uma individuação cada vez mais radical de formas de vida: cada indivíduo 
assume radicalmente a responsabilidade de avaliar os valores que orientarão suas 
decisões (WEBER, 2008). 
90
aprimore-se
É importante notar que, embora Weber e Schumpeter tenham adotado o rea-
lismo político como pressuposto metodológico de suas análises, seria um erro afir-
mar que eles se limitaram a uma descrição normativamente neutra do funciona-
mento do sistema político. Cada um dos autores nos oferece ferramentas teóricas 
com as quais podemos distinguir regimes autoritários e antidemocráticos daque-
les legítimos e democráticos. Curiosamente, o realismo político sempre preten-
deu ser mais coerente do que as concepções normativas na sua preocupação em 
apresentar justificações racionais plausíveis para uma defesa da Democracia. Se a 
racionalização do Estado moderno, como veremos, impõe limites aos ideais iguali-
tários da liberdade política – ideais considerados vagos, segundo o vocabulário rea-
lista –, aspectos institucionais das Democracias existentes ainda assim possibilitam 
uma justificação do governo democrático segundo definições mínimas, tais como 
a manutenção de eleições periódicas, o princípio da maioria e procedimentos de 
tomadas de decisão razoavelmente consensuais. Para tais autores, o núcleo liberal 
instaurado nos mecanismos de funcionamento do sistema político é passível de 
justificação porque promoveria procedimentalmente a pluralização dos valores e 
a organização democrática da concorrência entre os grupos de interesse, fomen-
tando, assim, o princípio da liberdade de escolha sob as condições de um mundo 
racionalizado”.
Fonte: Ramos, Melo e Frateschi (2018).
91
eu recomendo!
Compreender Maquiavel
Autor: Denis Collin
Editora: Vozes
Sinopse: Maquiavel tem uma teoria política intrigante. Essa obra 
vai mostrá-lo como defensor do povo. Ele admite a implantação 
de uma certa ditadura, não hesitando em procurar um príncipe 
capaz de implantar seus conselhos para que a Itália fosse liberta. 
O príncipe teria de ser um ‘homem providencial’. Não é o caso de que ele tivesse 
proposto uma teoria política, como fizeram os utopistas, mas definiu uma política 
para tempos de crise.
livro
Poder & Manipulação: Como entender o mundo em vinte 
lições extraídas de “O Príncipe”, de Maquiavel
Autor: Jacob Petry
Editora: Faro Editorial
Sinopse: você verá, nessa obra, um trabalho de análise dos en-
sinamentos de Maquiavel, de uma forma mais comentada, rela-
cionados ao que ocorre no mundo atual. São vinte estratégias 
relevantes sobre o clássico: O Príncipe. Aqui, ficarão mais claras as formas como 
algumas pessoas podem tentar lhe manipular, e o que você deve fazer para que 
possa se sobressair na vida e na carreira. 
livro
Documentário O Príncipe (Nicolau Maquiavel)
Sinopse: esse documentário sobre O Príncipe trata de forma me-
tafórica da virtù e da fortuna. Explica como deve ser jogado o jogo 
do poder. Trata do que realmente acontece no governo de um 
príncipe, não se orientando pelo que deveria ser feito num plano 
ideal. O vídeo está permeado por indicativos de que os líderes 
dos Estados Unidos da América teriam agido conforme os precei-
tos do príncipe de Maquiavel.
filme
3
OS FILÓSOFOS
CONTRATUALISTAS
PROFESSOR 
Esp. Silvanir Aldá
PLANO DE ESTUDO 
A seguir, apresentam-se as aulas que você estudará nesta unidade: • Hobbes: o Estado é Sinônimo de 
Segurança • John Locke:Estado e Propriedade • A vontade geral em Jean-Jacques Rousseau.
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM 
Compreender o porquê de Hobbes pensar ser o estado de natureza um estado de guerra de todos 
contra todos, e os motivos que justificam a formação do Estado • Verificar, nas teorias de John Locke, 
o que justifica a instituição da propriedade e como se dá sua legitimação pelo estado • Distinguir em 
Jean-Jacques Rousseau a vontade geral da vontade de todos e porque o estado de natureza não se 
sustenta, apesar de ser o estado ideal para o filósofo.
INTRODUÇÃO
O Contratualismo se refere à questão de justificar o porquê do surgi-
mento do Estado. Primeiramente, os filósofos contratualistas, Hobbes, 
Locke e Rousseau, partem de uma análise de como nos apresentava o 
estado de natureza para, depois, partir para um pacto, ou contrato. Antes 
de viver em sociedade, o homem vivia em estado de natureza.
Para Hobbes, os homens, em estado de natureza, viviam em “estado 
de guerra”. “O homem era o lobo do homem ”, dessa forma, os conflitos 
eram permanentes e os homens estavam se matando. Era necessário, 
então, que se instituísse o Estado.
Locke não via o estado de natureza com tanto rigor, como o fez 
Hobbes, porque, para ele, existia até uma relativa paz. O que faltava era 
a segurança jurídica, dado que não se tinha um juiz imparcial. Mas o 
gozo de direitos naturais, como a vida, a liberdade, a propriedade e a 
felicidade já se davam. Dessa forma, o que vimos é que faltava um ajuste, 
e este era a proteção da sociedade civil a cargo do Estado. 
Rousseau falará que o homem, no estado de natureza, é o bom sel-
vagem, mas com o surgimento da sociedade, o homem é corrompido 
e passa a viver oprimido. Assim, o Estado é fundado para que possa 
regular as relações e direcionar as coisas. 
Cada filósofo vai dizer que o homem vive de um jeito, de modo que, 
partindo de um estado hipotético, lançarão as “regras” de convivência 
nesse Estado ideal. Para Hobbes, o Estado terá poder absoluto, de modo 
que, mesmo se incorrer em abuso, o soberano não será punido devido 
a ter sido feito o contrato e os poderes lhe terem sido atribuídos. Locke 
proporá um Estado de intervenção mínima, e Rousseau, com o corpo 
político, trará à tona a possibilidade de liberdade e igualdade amparadas 
na vontade geral.
U
N
ID
A
D
E 
3
94
1 HOBBES:
o Estado é sinônimo 
de segurança
Thomas Hobbes, filósofo inglês, nasceu na aldeia de Westport, adjacente a Mal-
mesbury, no Wiltshire, no dia 5 de abril de 1588. De família de parcos recursos, 
era filho de um clérigo semiletrado. Logo, deixou de contar com a ajuda do pai, 
tendo seus estudos custeados por um tio, Francis Hobbes, luveiro de Malmesbury, 
que tinha uma prosperidade relativa. 
Foi pupilo de Robert Latimer, o qual 
o versou em latim e em grego. Isso 
lhe oportunizou frequentar os clássi-
cos literários. Em 1603, ingressou no 
Magdalen Hall, em Oxford, tendo nes-
sa época 14 anos. Hobbes começa sua 
incursão filosófica a partir do contato 
com Francis Bacon (1561-1626), do 
qual foi secretário, entre 1621 e 1626. 
Ele chegou a traduzir algumas obras 
de Bacon para o latim.
 Hobbes não ficou somente no 
empirismo baconiano. Ele entra em 
contato com padre Mersene, corres-
pondente e amigo de Descartes. Teve, 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
95
ainda, contato com Galileu. No retorno das viagens ao continente, retorna à 
Inglaterra, colocando-se como defensor do Rei Carlos I (1600-1649), que era 
ameaçado por uma revolução liberal. Em apoio ao soberano, compôs seu pri-
meiro tratado: Elementos de Lei Natural e Política, obra que fundamenta a 
ciência política e a justiça. O trabalho foi disseminado em cópias manuscritas, 
vindo a ser publicado, apenas, em 1650, na forma de dois tratados separados: 
Natureza Humana e Sobre o Corpo Político. Refugiou-se em Paris, onde es-
creveu em defesa do poder real Sobre o Cidadão, em 1642, no mesmo ano em 
que se desencadeou a Guerra Civil na Inglaterra. Hobbes morreu em Hardwick, 
em 1679 (HOBBES, 1999a).
Embora deduza sua ciência política de conceitos e definições, Hobbes aponta o 
fato de que tais conceitos seriam relativos aos fatos da natureza humana. Tal como 
podemos verificarnos capítulos I a XI do Leviatã, contém um considerável número 
de fatos acerca da experiência. Há um destaque especial, aqui, para a doutrina do 
homem (que é o que constitui o fundamento da política), onde o filósofo admite 
apenas uma espécie de demonstração, essa é uma demonstração não dedutiva que 
consiste em que cada sujeito encontre em si mesmo sua natureza, a natureza huma-
na. A resposta para tais questões, o filósofo diz ter encontrado ‘lendo-se a si mesmo’.
O Estado moderno estava fundado sobre o monopólio do uso da força física. 
No Estado, podia-se exercer os direitos de proibir, matar, encarcerar e multar, isso 
compõe uma visão individualista, que diferia do modo de pensar dos antigos. 
Para Hobbes, o ponto de partida para a ação humana e, em consequência, da ação 
moral e política seria o conato, que é o esforço ou empenho.
O Jusnaturalismo em Hobbes
Podemos considerar, como uma das mais expressivas interpretações do jus-
naturalismo de Hobbes, a obra de G. B. Macpherson: The Political Theory of 
Possessive Individualism (A Teoria Política do Individualismo Possessivo), em 
que Macpherson (2005) vê no estado de natureza de Hobbes, algo diferente 
do que a maioria percebeu. O estado de natureza representaria não a guerra 
civil, mas a sociedade de mercado “possessiva”, em que o termo ‘possessiva’ é 
empregado para distingui-la do mercado simples. Posteriormente, veremos 
que John Locke avançará nesse sentido da sociedade natural e do Estado como 
associação de proprietários. 
U
N
ID
A
D
E 
3
96
No intento de fazer uma teoria política rigorosa, Hobbes tenta atingir vários 
alvos. As teorias de Aristóteles são, entretanto, as mais visadas. Para Aristóteles, a 
ética e a política não eram conhecimentos certos, mas sim prováveis. Isso quer dizer 
que não há uma lógica aí, mas é uma questão de retórica (BOBBIO, 1991). 
Entre o Hobbes jusnaturalista ou positivista jurídico, Norberto Bobbio (1985) 
prefere classificá-lo na segunda posição. Mesmo que haja quem tente enquadrar 
a teoria de Hobbes em um totalitarismo ou como antecipador do estado liberal, 
Bobbio destaca que o tema central do pensamento dele é a unidade do Estado, não 
é a liberdade, nem do cidadão nem do Estado. Assim, nas teorias de Hobbes:
 “ O único caminho que tem o homem para sair da anarquia natural, 
que depende de sua natureza, e para estabelecer a paz, prescrita pela 
primeira lei natural, é a instituição artificial de um poder comum, 
ou seja, do Estado (BOBBIO, 1991).
A instituição desse Estado seria o Leviatã, referência a um lendário monstro marinho, 
que representa para Hobbes a figura artificial do Estado. Esse vem a substituir o estado 
de natureza, que, devido a toda insegurança que proporcionava, deveria ter encerrada 
sua existência, sendo instituído um modelo mais seguro, que assegurasse a paz. 
Contrato e formação do Estado
Se nos questionarmos acerca de Hobbes ter trazido alguma novidade no campo po-
lítico, veremos que sim. É o fato de que seu pensamento diferencia Estado e Governo. 
Uma separação que não apareceu, por exemplo, na teoria de Maquiavel. Para Hobbes, 
o Estado e o governo são coisas distintas. O Estado seria independente das formas 
de governo. Ele se define pela sobera-
nia e por seu poder, que são fundados 
em um contrato e legitimado juridica-
mente. Mas a soberania desse Estado 
é exercida, não mais baseada no con-
trato, ela se dá de acordo com as cir-
cunstâncias que podem vir a impedir 
ou contribuir para sua manutenção 
(LIMONGI, 2002).
U
N
IC
ES
U
M
A
R
97
Para Hobbes, o fim último do homem é sua conservação e uma vida satisfeita. O 
que ele quer é se livrar da mísera condição de guerra, a “guerra de todos contra todos”, 
apesar desse ser consequência natural das paixões dos homens, quando da ausência 
de um poder capaz de manter o respeito, forçando-os, por medo do castigo, a cum-
prirem seus pactos e respeitarem as leis de natureza (que são a justiça, a equidade, a 
modéstia, a piedade, enfim, fazer aos outros o que queremos que nos façam). “Seria 
um mal menor suportar uma lei injusta que permitir a cada um decidir da justiça 
das leis” (FERREIRA FILHO, 2002, p. 41). No De Corpore Politico, vemos, ainda: 
“Em todo Estado onde os homens em particular são privados dos seus direitos de se 
protegerem, lá reside um soberano absoluto, como eu já mostrei” (HOBBES, 1999c. 
p. 117). Agir, individualmente, não levará à defesa e proteção de ninguém, é preciso 
agir em conjunto e sob o comando de um. E ainda sobre o estado de guerra vemos:
 “ A situação de guerra é uma situação de miséria e incerteza. O pro-
duto de nosso trabalho pode nos ser retirado a qualquer instante 
por um poder maior que o nosso. Nossa vida está constantemente 
ameaçada, pois nada nos garante, a não ser nosso próprio e ínfimo 
poder, contra o poder dos outros, o que não é insensato supor que 
será usado contra nós. É portanto razoável que queiramos sair dessa 
situação, garantindo as condições da paz. Esse desejo de paz, que se 
supõe ser o desejo de todos os homens que tenham refletido sobre 
as causas e os efeitos da guerra, está na base de um suposto contrato 
ao qual Hobbes pretende fazer remontar o fundamento jurídico do 
Estado, pensado ele mesmo como um ente jurídico e, nesse sentido, 
não natural. Por meio desse contrato, segundo o modelo de Hobbes, 
os homens se comprometem reciprocamente a submeter suas von-
tades à vontade de um homem ou assembleia de homens, que passa 
a ter poder para decidir acerca de todos os assuntos concernentes à 
paz. Institui-se desse modo o Estado (LIMONGI, 2002, p. 28).
No Estado de Natureza, os indivíduos vivem isolados e em luta permanente en-
tre si. É exatamente, aqui, que reina o medo e, principalmente, medo de morte 
violenta. Querendo então se proteger uns dos outros, os homens inventaram 
as armas e cercaram as terras que ocupavam. Essas atitudes foram, no entanto, 
inúteis, dado que sempre haverá alguém mais forte que derrotará o mais fraco e 
ficará com as terras outrora cercadas. Não há garantias na vida, onde quem faz a 
lei é o mais forte, que pode tudo quanto tenha força para conquistar e conservar. 
U
N
ID
A
D
E 
3
98
No Tratado sobre el Ciudadano (Tratado sobre o Cidadão), Hobbes nos mostra, 
o porquê de tantos problemas no estado de natureza.
 “ No estado de natureza, todos são acometidos por uma vontade 
agressiva, mas que não se dá pela mesma causa, nem é igualmente 
condenável. Já que alguns, segundo a igualdade natural, permitem 
aos demais o mesmo que se permitem a eles (o que é próprio aos ho-
mens modestos e que valoram retamente suas forças). Outros, por 
sua vez, acreditando-se superiores aos demais, se permitem tudo, 
somente para si mesmos, e se atribuem honra diante dos demais (o 
que é próprio de uma condição feroz). Para estes, a vontade agres-
siva nasce de uma glória vã e de uma falsa estima de suas forças; 
para aqueles, da necessidade de defender suas coisas e sua liberdade 
contra estes últimos (HOBBES, 1999b, p. 17).
A busca de uma glória vã, isto é, que não tem sentido, ou a vontade agressiva, é o 
que transforma o estado de natureza em um estado de guerra de todos contra todos. 
Aliás, “a questão é, tão-somente a seguinte: o que pode motivar alguém no estado 
de natureza a ser a primeira pessoa a cumprir sua palavra?” (TUCK, 2001, p. 89). 
Hobbes diz não haver motivo algum, racional, que obrigue alguém a cumprir sua 
palavra, posteriormente, a outra pessoa. Instaurada a insegurança, vê-se a necessi-
dade de instituir o Estado Civil. O filósofo viu a necessidade de um pacto, em que 
o poder se concentrava nas mãos de um só (não tendo esse nenhum dever para 
com os súditos). Fala-se que um Estado foi instituído, a partir do momento em que 
uma multidão de homens concordam e pactuam entre si, sendo que daí a maioria 
atribui o direito de ser representada por um homem ou assembleia de homens. 
 “ Esta submissão das vontades de todos à vontade de um só homem ou 
de uma assembleia se dá quando cadaum se obriga mediante um pacto 
diante dos demais a não resistir à vontade daquele homem ou assem-
bleia a que se submete. [...]. A união assim conseguida se chama Estado 
ou sociedade civil, e também pessoa civil. Porque ao ser una a vontade 
de todos, há que considerar-se como uma pessoa e há de ser distinguida 
e reconhecida com um único nome por todos os particulares, e deve ter 
seus direitos e suas propriedades; desta forma, nem um cidadão nem 
o conjunto deles tem de se considerar como se fosse do Estado (com 
exceção daqueles cuja vontade está no lugar das vontades dos demais). 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
99
Por tanto, o ESTADO (para defini-lo já), é uma só pessoa cuja vontade, 
como consequência dos acordos de muitos homens, deve ser tomado 
no lugar de todos, para que possa ter a força e as faculdades de cada um 
para a paz e a defesa comum (HOBBES, 1999b, p. 53).
Ninguém pode desistir do acordo, nem tentar tirar a soberania a quem foi confe-
rida, pois se assim agir estará tirando o que é seu, o que constitui injustiça. Todos 
formam com o Estado uma só pessoa. Analisando os estatutos da lei em sua obra: 
Diálogo entre un Filósofo y un Jurista (Diálogo entre um Filósofo e um Jurista), 
Hobbes afirma a importância da questão da obediência. “Pois a lei da razão or-
dena que todos observem a lei a qual prestaram seu assentimento, e obedeçam 
a pessoa a qual prometeram obediência e fidelidade” (HOBBES, 1992, p. 136).
Partindo da argumentação 
sobre o estado de natureza e dos 
problemas aí encontrados, como 
a igualdade de fato, em que os 
homens podem causar males uns 
aos outros, vê-se que os homens 
podem chegar até mesmo à morte. 
E, ainda, a escassez dos bens, da 
qual pode ocorrer que mais de um 
homem queira possuir a mesma 
coisa. Nasce, desta forma, um es-
tado de permanente desconfiança 
recíproca, que leva cada um a se 
preparar mais para a guerra e a 
ignorar a busca da paz.
Ao tratar da parte orgânica, constituinte do poder soberano, aparece a figura do 
ministro público, que é o homem encarregado pelo soberano (seja ele um monar-
ca ou uma assembleia) de qualquer missão, representando a pessoa do Estado. Há 
ministros públicos encarregados da administração geral, seja de todo o domínio, 
seja de uma parte dele. Eles têm, ainda, autoridade para ensinar ou permitir que seja 
ensinado ao povo seu dever para com o soberano, instruindo-o no conhecimento 
do que é justo e injusto, a fim de que o povo seja capaz de viver em paz e harmonia 
e resistir ao inimigo comum. Entre outras atribuições ainda, aos ministros públicos 
também são concedidos os poderes judiciais.
U
N
ID
A
D
E 
3
100
Sobre o Soberano
O soberano deve ser juiz em relação às opiniões e doutrinas contrárias ou a 
favor à paz. Ele deve instituir as leis civis, que são as regras pelas quais o homem 
pode saber quais os bens de que pode gozar, as ações que pode praticar, sem 
ser molestado por seus concidadãos. Ele deve julgar as controvérsias referen-
tes às leis, evitando que se volte ao estado de guerra, pois a dissipação desse 
foi o objetivo proposto, ao se instituir o Estado. O soberano tem direito ainda 
de fazer a guerra e a paz com outras nações e Estados. Ele deve escolher seus 
conselheiros, ministros, funcionários e magistrados e pode, ainda, punir com 
castigos corporais ou pecuniários como também, recompensar com honras e 
riquezas. Como destaca Bobbio, o raciocínio de Hobbes acerca da soberania é 
realmente algo simples: “se o poder soberano está efetivamente dividido, não é 
mais soberano; se continua a ser de fato soberano, não está dividido - a divisão 
é só aparente” (BOBBIO, 1985, p. 112). 
“Um reino dividido em si mesmo não pode manter-se” (HOBBES, 1999a 
s.p.). Aqui, Hobbes faz menção a que o soberano deve concentrar todos os 
poderes em sua mão, se não o fizer poderá ser prejudicado. O filósofo apre-
senta as espécies de governo: 
 ■ Monarquia: governo de um só.
 ■ Democracia: assembleia de todos os que se uniram.
 ■ Aristocracia: assembleia de apenas uma parte.
Hobbes parece mostrar, aqui, a divisão dos governos já proposta por Aristó-
teles, porém diz ser desnecessário falar de suas formas degenerativas: tirania, 
oligarquia e anarquia, pois não se trata de novas formas de governo. “A diferença 
entre essas três espécies de governo não reside numa diferença de poder, mas 
numa diferença de conveniência, isto é, de capacidade para garantir a paz e a 
segurança do povo, fim para o qual foram instruídos” (HOBBES, 1999a, p. 154).
Na monarquia, o interesse pessoal é o mesmo que o interesse público. Pri-
meiro que “nenhum rei pode ser rico ou glorioso, ou pode ter segurança, se aca-
so seus súditos forem pobres, desprezíveis, ou demasiado fracos, por carência 
ou dissensão, para manter uma guerra contra seus inimigos” (HOBBES, 1999a, 
p. 155). Já, a democracia e a aristocracia contribuem menos para a riqueza e 
fortuna pessoal a prosperidade do povo.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
101
Pode-se, ainda, na visão de Hobbes, pensar formas de governo derivadas das três 
apresentadas, como em primeiro a monarquia eletiva, em que o soberano governará 
até o fim de sua vida, porém não indicará um novo monarca, esse outro será eleito. 
Assim, o absolutismo não deriva de um direito divino, mas sim do pacto, e a existência do 
Direito – leis civis – vincula-se à existência do Estado. Embora manifeste sua preferência 
por um rei absoluto, Hobbes reconhece a legitimidade de outros tipos “puros” de governo 
– estão reunidos numa mesma pessoa o Legislativo, o Executivo e o Judiciário – porque os 
vários poderes que cabem ao soberano são tão estreitamente ligados um ao outro, tão 
interdependentes, que não podem deixar de pertencer a uma só pessoa. A justificativa 
para a preferência do governo monárquico está na antropologia humana: todo homem 
e, por conseguinte, todo governante, pensa no seu interesse pessoal. Portanto, interesse 
público só é possível na monarquia.
Fonte: Chevallier (1973, p. 73 apud SOUZA; OLIVEIRA, 2009, p. 9).
explorando Ideias
No capítulo XX do Leviatã, é apresentado a diferença entre: Estado por aquisição 
– o poder soberano foi adquirido pela força, ou seja, o soberano foi eleito pelo 
medo que os homens tinham dele (de serem mortos ou postos em cativeiro– e 
Estado por instituição, em que os homens elegem um soberano por medo uns 
dos outros. Vemos que, dessa forma, os dois tipos de soberanias são instituídos 
por medo. E o domínio pode se dar dos seguintes modos: por geração – de pai 
para filho (tendo que contar com o consentimento do filho) –, ou por conquista 
– domínio conquistado ou vitória militar (despótico), de modo que o dominado 
se torna seu servo.
Liberdade
Para Hobbes, não é a vitória que confere o direito de domínio sobre o vencido, mas 
o pacto celebrado por esse. O filósofo dá uma ampla definição de liberdade, que não 
se restringe somente à liberdade humana, mas vai além, pois implica a noção de 
movimento: Liberdade significa a ausência de oposição (ou seja, de impedimentos ex-
ternos do movimento). Essa liberdade é aplicada igualmente às criaturas inanimadas, 
irracionais e racionais. Há pelo menos dois tipos de impedimentos dos movimentos, 
U
N
ID
A
D
E 
3
102
um é a oposição oferecida por algum corpo externo, e o segundo é constituinte da 
própria coisa, daí não poder dizer que ela não tem liberdade, mas que lhe falta o po-
der de se mover. Exemplos da primeira podem ser paredes ou cadeias, e da segunda, 
uma pedra quando está parada, ou um doente que se encontra preso à cama pela 
sua enfermidade.
Pode-se, ainda, verificar um reforço desse argumento no seu: Tratado sobre el 
Ciudadano (Tratado sobre o Cidadão, Parte II, p. 85). Em síntese, parece que o es-
forço, uma vez que implique movimento, estará, para Hobbes, subordinado, ainda, 
à liberdade desse movimento, que é, em termos gerais, a liberdade do súdito, dos 
objetos inanimados.
A definição de homem livre que o filósofo nos fornece, em consequência do 
que foi expresso, é a seguinte:“[...]um homem livre é aquele que, naquelas coisas que 
graças a sua força e engenho é capaz de fazer, não é impedido de fazer o que tem 
vontade de fazer”. Quanto à expressão livre-arbítrio, não há aqui como inferir uma 
liberdade da vontade, desejo ou inclinação, mas tão somente a liberdade do homem, 
que consiste, nele, não deparar com entraves ao fazer o que tem vontade. Podemos 
nos perguntar, qual a participação de Deus nisso tudo? Ao que o autor responde: 
“Portanto Deus, que vê e dispõe todas as coisas, vê também que a liberdade que o 
homem tem de fazer o que quer é acompanhada pela necessidade de fazer aquilo 
que Deus quer, e nem menos que isso” (HOBBES, 1999a, p. 172).
A Propriedade e as Leis
Em Hobbes, o Estado se nutre via abundância e distribuição dos materiais neces-
sários à vida, em seu acondicionamento e preparação, e uma vez acondicionados, a 
sua entrega para o uso público se dá por meio de canais adequados. A distribuição 
dessa nutrição é o que o nosso filósofo chama de constituição da propriedade. Se um 
monarca soberano, ou a maioria de uma assembleia soberana, pudesse dar ordens, 
segundo suas paixões e contrariamente a sua consciência, isso seria uma quebra da 
confiança e das leis da natureza.
Hobbes fala do conselho, distinguindo-o da ordem, pois o primeiro deduz suas 
razões do benefício que tal acarreta para aquele a quem o diz. Já do segundo, o que se 
espera não é nada mais que a vontade de quem a diz. “Há portanto entre um conselho 
e uma ordem uma diferença: a ordem é dirigida para benefício de quem a dá, e o 
conselho para benefício de outrem” (HOBBES, 1999a, p. 201-202).
U
N
IC
ES
U
M
A
R
103
No Leviatã, a preocupação do autor, ao abordar as leis, não é falar de uma ou 
outra, ou seja, das leis particulares, mas o importante para ele é ressaltar o seu caráter 
geral. A Lei Civil é, então, definida:
 “ A lei civil é, para todo súdito, constituída por aquelas regras que o Estado 
lhe impõe, oralmente ou por escrito, ou por outro sinal suficiente de sua 
vontade, para usar como critério de distinção entre o bem e o mal; isto é, 
do que é contrário ou não é contrário à regra (HOBBES, 1999a, p. 207).
Ele expõe, ainda, que os Estados cristãos castigavam a quem se rebelasse contra a reli-
gião cristã; e quanto ao direito no estado de natureza, e depois como a lei já instituída: 
 “ A natureza deu a cada homem o direito de se proteger com sua pró-
pria força, e ao de invadir um vizinho suspeito a título preventivo, 
e a lei civil tira essa liberdade, em todos os casos em que a proteção 
da lei pode ser imposta de modo seguro (HOBBES, 1999a, p. 221).
Fica mais claro, aqui, que um pecado não é apenas uma transgressão da lei mas 
é também o ato de manifestar desprezo pelo legislador (soberano). Dessa forma, 
esse desprezo é a violação de todas as leis, ao mesmo tempo, que pode se dar pela 
prática de um ato, pela pronúncia de palavras proibidas pela lei, da omissão do 
que a lei ordena ou, ainda, no próprio propósito de transgredir. Hobbes diferencia 
crime e pecado da seguinte maneira:
 “ Um crime é um pecado que consiste em cometer (por feito ou pa-
lavra) um ato que a lei proíbe, ou em omitir um ato que ele ordena. 
Assim, todo crime é um pecado, mas nem todo pecado é um crime. 
[...]. Todo homem chegado ao uso da razão sabe que não deve fazer 
aos outros o que jamais faria a si mesmo (HOBBES, 1999a, p. 223).
Sobre os Contratos
Das paixões que o homem pode sofrer, a que mais o impede de violar as leis é o 
medo. Porém mesmo o medo pode, em muitos, casos levar a cometer um crime. No 
estado de natureza: “O homem é o lobo do homem”. Essa proposição que aparece, 
U
N
ID
A
D
E 
3
104
na obra Sobre o Cidadão, levanta a questão de que o homem, em um estado sem 
regulamentações, viveria de um modo perigoso, propenso ao ataque uns dos outros. 
Aqui, o homem está vivendo um momento anterior ao estado social. No estado de 
natureza, o que importa é mais o útil do que, propriamente, outros valores. 
 “ Apesar de defensor do despotismo político e adversário da democracia 
política, Hobbes afirma que “todos os homens são naturalmente iguais”. 
Essa igualdade baseia-se no desejo universal de autopreservação, isto 
é, da procura do que é necessário e cômodo à vida. Com isso, fica esta-
belecido um direito fundamental de autoconservação. Como todos os 
homens seriam dotados de força igual (pois o fisicamente mais fraco 
pode matar o fisicamente mais forte, lançando mão deste ou daquele 
recurso), e como as aptidões intelectuais também se igualam, o recurso 
à violência generaliza-se e complica-se, cada qual elaborando novos 
meios de destruição do próximo, com o que a vida se torna “solitária, 
pobre, sórdida, embrutecida e curta”, na qual cada um é lobo para o ou-
tro, em guerra de todos contra todos. Assim, o estado natural exige uma 
saída com base no próprio instinto de conservação da vida. Deixado 
a si, o instinto de conservação é abertura para a violência que o reitera 
e, ao mesmo tempo, para a paz tática que prometa conservação. É esse 
o campo da lei natural. A concepção que Hobbes tem do estado de 
natureza distancia-o da maior parte dos filósofos políticos, que acredi-
tam haver no homem uma disposição natural para viver em sociedade 
(MONTEIRO apud HOBBES, 1999a, p. 13-14). 
Quando na condição natural, o homem se vê frente aos desafios das intempéries da 
natureza, que traz consigo a privação do alimento e do gozo, muitas vezes, das coisas 
mínimas necessárias à sobrevivência, o lado animal, do lobo que quer se preservar, 
vem à tona. Em um estado de “iguais”, a pobreza, a solidão e outros privativos ressal-
tam o embrutecimento do homem.
Nesse contexto, temos que ressaltar ainda, a relevância da pena, que é o dano 
que a autoridade pública inflige a quem fez ou omitiu o que pela mesma autoridade 
é considerado transgressão da lei, a fim de que, assim, a vontade dos homens fique 
mais disposta à obediência. Já a recompensa pode ser de duas formas: por dádiva, 
que é um benefício proveniente da graça de quem o confere, com intuito de capacitar 
alguém para lhe prestar serviço; ou por contrato, aqui se diz contrato por salário ou 
ordenado, que é o benefício devido por serviços prestados ou prometidos.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
105
Assim sendo, para que o homem possa gozar de relativa paz, faz-se necessário um 
contrato, que garanta uma vida mais longa, protegido da violência que poderia ser 
instaurada no estado de natureza. Uma vez que aconteça a dissolução do Estado, não 
por violência externa, mas por desordem indistinta, a causa não reside nos homens 
enquanto matéria, mas enquanto seus obreiros ou organizadores. 
2 JOHN LOCKE:
Estado e propriedade
John Locke nasceu em 1632, em Wrington (Somerset, perto de Bristol), Ingla-
terra, vindo a falecer no ano de 1704 em Otes (na região de Essex). A época 
em que Locke viveu era de uma política conturbada na inglaterra. Aos 10 anos 
de idade, vê iniciar-se a guerra civil, na qual seu pai, que também se chamava 
John Locke, atuou como capitão de cavalaria no exército do rei Carlos I. Aos 
28 anos, já cansado da guerra, o filósofo Locke fica feliz com o retorno, naquele 
tempo, de Carlos II, momento esse em que se dá a Restauração. Seus textos, 
da época de 1660 e 1664, mostram o seu anseio pelo fim das hostilidades e o 
desejo de paz e segurança. Tais preocupações mostraram uma aproximação 
entre as teorias de Hobbes e as suas. 
U
N
ID
A
D
E 
3
106
Locke é considerado o pai do liberalismo polí-
tico. Ele era contra o absolutismo monárquico, 
mas defende que haja uma intervenção mínima 
do Estado na sociedade. Em sua obra Dois Tra-
tados sobre o Governo, ele justifica a Revolução 
Gloriosa, em que o Rei perde muito dos seus 
poderes, sendo assim, quem passa a governar 
de fato é o parlamento. Essa sua obra foi, ainda, 
o mais completo tratado sobre o Estado liberal, 
do qual se tem notícia até hoje.
Qual é o fundamento da arte de governar? 
O que dá legitimidade para que o Estado gover-ne e quais seriam os limites até onde ele poderia 
ir? Em Hobbes, vimos que o Estado intervém 
em tudo, mas com Locke isso não acontece, de modo que o indivíduo pode viver à 
vontade. O homem teve um estágio pré-sociedade e esse era um estado de relativa 
paz. Aqui, podemos destacar que, pelo fato do homem ser racional teria direitos 
naturais: vida, liberdade, propriedade e felicidade. O Estado liberal seria um Estado 
regulador de algumas situações.
O trabalho “impresso” na terra daria ao homem o direito à propriedade da 
terra. O x da questão da propriedade em Locke é que o adquirir terras, por meio 
do trabalho, é apenas uma das formas de poder consegui-la. Outra forma seria 
pelo dinheiro que as pessoas poderiam ganhar a partir da venda de produto 
excedente. Por exemplo, se ao plantar, a colheita for abundante, o homem pode 
vender esse excedente, angariar dinheiro e comprar mais terras. Percebemos que 
esses direitos são, ainda, anteriores à formação da sociedade civil.
Carlos II de Inglaterra, Monarca britânico (1630-1685), rei da Grã-Bretanha e da Irlanda, 
nascido em Londres. Reinou entre 1660 e 1685. Casou com D. Catarina de Bragança, filha 
de D. João IV e de D. Luísa de Gusmão, em 1661. Das negociações para o esse casamento 
resultou o tratado anglo-luso do mesmo ano, nos termos do qual Portugal entregou a 
Carlos II a cidade e a fortaleza de Tânger e o domínio do porto e ilha de Bombaim. O rei-
nado de Carlos II representou a pacificação do país e a restauração da monarquia, após 
as guerras civis entre católicos e protestantes e o regime republicano de Oliver Cromwell. 
Fonte: Porto Editora ([2019], on-line)4. 
conceituando
U
N
IC
ES
U
M
A
R
107
O estado de natureza
Os direitos naturais, ou direitos dos homens, são as coisas inerentes a esses, 
como suas liberdades individuais e civis, governo representativo mínimo e 
constitucional, separação de poderes, o executivo e sua subordinação ao le-
gislativo, defesa da propriedade privada, laicismo e tolerância religiosa. 
Para John Locke, alguém poderia se opor de alguma forma à defesa dos 
direitos naturais? Não, uma vez que agindo assim atentaria contra a vida de 
outro homem. Implementação do Estado não quer dizer a subjugação dos 
homens por meio da escravidão. O jusnaturalismo é parte da resposta e da 
proposta do filósofo, para a questão de se partir do modelo de vida do estado 
de natureza, em que os indivíduos constituem uma associação que independe 
de sua vontade. Se por um lado, essa passagem do estado de natureza para o 
estado civil não advém de uma evolução natural, como apregoava Aristóteles, 
por outro lado, era uma manifestação por meio de um contrato, por essa razão 
que o jusnaturalismo moderno é conhecido também como contratualista.
Como já assinalamos, o homem continua com alguns direitos trazidos do 
estado de natureza. Sua liberdade se mantém, isto é, pode continuar a dispor 
de seus bens da forma que lhe aprouver. O que tem de fazer é observar os limi-
tes colocados pela lei natural. A igualdade trata da condição na qual o poder 
e a jurisdição são recíprocos, havendo, dessa forma, um equilíbrio entre as 
possessões. Mesmo no tempo de Locke, a liberdade na condição natural não 
significava fazer o que cada um bem entendesse, já nesse estado havia uma 
lei natural que governa e obriga a todos.
A quem caberia, então, executar a lei natural, para que essa tivesse seu 
efeito? Pelo fato de todos serem iguais, qualquer pessoa poderia castigar o 
culpado, colocando em prática a lei natural. Um dos maiores problemas em 
julgar (inclusive em causa própria) é que se pode cair num julgamento parcial, 
Para Locke, o dinheiro é uma mercadoria e é importante na medida em que tem valor de 
troca com outras mercadorias. Mas sua função não é apenas facilitar as trocas das coisas 
produzidas para o consumo. O objetivo característico do dinheiro é servir como capital. 
Mesmo a terra, Locke a vê simplesmente como uma forma de capital.
Fonte: Macpherson (2005, p. 204).
explorando Ideias
U
N
ID
A
D
E 
3
108
excedendo no castigo. Corre-se, assim, o risco dos homens empreenderem 
vingança uns contra os outros. No estado de natureza, falta um juiz imparcial 
que dê auxílio à resolução das contendas. Há, inclusive, a possibilidade de se 
chegar em um estado de guerra, o qual é difícil reconduzir à paz. Vemos que, 
quem viola as leis de natureza ameaçando a vida de outro ou a propriedade 
de outro, põe-se em estado de guerra com esse. No início do capítulo III do 
segundo livro de sua obra Dois Tratados sobre o Governo, Locke diz o seguinte: 
 “ O estado de guerra é um estado de inimizade e destruição; por-
tanto, aquele que declara, por palavra ou ação, um desígnio firme 
e sereno, e não apaixonado ou intempestivo, contra a vida de 
outrem, coloca-se em estado de guerra com aquele contra quem 
declarou tal intenção e, assim, expõe sua própria vida ao poder 
dos outros e para ser tirada por aquele ou por qualquer um que 
a ele se junte em sua defesa ou adira a seu embate. Pois é razoável 
e justo que eu tenha o direito de destruir aquilo que me ameaça 
de destruição, já que, pela lei fundamental da natureza, como 
o homem deve ser preservado tanto quanto possível, quando 
nem todos podem ser preservados, a segurança do inocente deve 
ter precedência. E pode-se destruir um homem que promove a 
guerra contra nós (LOCKE, 2005, p. 396).
Das condições, aqui, apresentadas do estado de natureza, o que precisa ficar 
claro é que a condição do homem melhora e,partindo da garantia de seguran-
ça, ele passou também a esperar outros direitos naturais, como a liberdade, a 
propriedade, a vida. E que, mesmo com a necessidade da implantação da so-
ciedade civil, o Estado apenas auxiliará o que já caminhava relativamente bem.
E é justamente no estado de natureza que se compreende existir a perfeita liberdade e 
igualdade entre os homens, pois, todos têm o domínio sobre si mesmo e as leis da natu-
reza que, cabem a todos de forma indiscriminada e sem restrições, não existindo subor-
dinação nem sujeição de um em relação a outro. 
(Stenio da Paixão Ribeiro)
pensando juntos
U
N
IC
ES
U
M
A
R
109
Criação do Estado
O Estado será um juiz imparcial para resolver os conflitos do estado de nature-
za. Fazendo isso, o Estado está exercendo asua função de preservar os direitos 
naturais. Isso seria, na visão de Locke, o Estado mínimo. O Estado tem ainda 
que oferecer proteção interna e externamente. Enquanto para Hobbes, o pacto 
pressupõe submissão; para Locke, pelo pacto, as coisas podem melhorar um pou-
co mais, uma vez que o estado de natureza não é ruim, as pessoas já têm alguns 
benefícios, mas é possível melhorar.
Na contraposição entre sociedade civil e Estado, podemos questionar: o Esta-
do precisa existir? Sim, entretanto deve ser de uma intervenção menor possível, 
para que não suprima o liberalismo.
Quanto ao sistema de governo, Locke resgata as formas de governo que Aris-
tóteles já falava na antiguidade e pensa que a melhor forma seria colocar todos 
em funcionamento ao mesmo tempo. A Monarquia, com o rei; a Aristocracia, 
com a câmara dos lordes, e a democracia, com a câmara dos comuns. O Estado 
deve garantir as liberdades de pensamento, expressão e de culto.
O Estado como garantia da Propriedade
John Locke também trata da questão da vida no estado de natureza e de sua re-
levância para a filosofia política. Ele não enxerga, nesse estado, necessariamente, 
uma guerra incessante. A liberdade não era causadora de um estado sem lei, 
porque ainda ali os homens seriam governados pela lei natural da razão. A pre-
servação da vida ocorria, não havendo agressões nem mortes no intuito de se 
U
N
ID
A
D
E 
3
110
apossar do que era do outro. Mesmo no estado de natureza os homens podem 
possuir bens, inclusive a primeira propriedade que ele possui é seu próprio corpo 
e, ao crescer, sua capacidade de trabalho. Ao transformar a natureza e produzir 
coisas, esse seu trabalho será de sua propriedade. Assim sendo,o que ele vende 
não é a si mesmo, mas sua força de trabalho.
Na segunda parte dos Dois Tratados sobre o Governo, no capítulo V, Da 
Propriedade, podemos ver que:
 “ Quer consideremos a razão natural - que nos diz que os homens, 
uma vez nascidos, têm direito à sua preservação e, portanto, à comida, 
bebida e a tudo quanto a natureza lhes fornece para sua subsistência - 
ou a revelação - que nos relata as concessões que Deus fez do mundo 
para Adão, Noé e seus filhos -, é perfeitamente claro que Deus, como 
diz O rei Davi (sl 115, 61), deu a terra aos filhos dos homens, deu-a 
para a humanidade em comum. Supondo-se isso, porém, parece ser 
da maior dificuldade, para alguns, entender como pode alguém che-
gar a ter a propriedade de alguma coisa (LOCKE, 2005, p. 405-406). 
Todos, só pelo fato de terem 
nascido, já têm direito à pre-
servação, isto é, ao mínimo ne-
cessário para sua subsistência. 
Locke ressalta que o próprio 
Deus concede as benesses a 
todos, sendo, pois, importante 
entender como alguém pode 
ser proprietário de alguma 
coisa em detrimento de outros 
não terem nada.
Os homens são donos de todo trabalho que realizam com suas próprias mãos. 
Ao anexar o trabalho às coisas que a natureza fornece, ficam os homens como que 
misturados ao próprio trabalho, daí poder tomar tais coisas como fruto de seu tra-
balho. Ao trabalhar com uma determinada coisa, que antes era de pertencimento 
comum, também de outros homens, tal coisa fica pertencente somente a ele, porque 
foi ele quem a transformou. Entretanto, esse pertencimento das coisas aos homens 
que as trabalhou fica condicionado ao fato de que: não falte aos outros. 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
111
Uma vez que todos fossem colocados em pé de igualdade, quem seria o 
verdadeiro proprietário das coisas? E se ainda todos forem iguais, quem vai 
julgar as questões em geral e mesmo essa primeira? Essa reunião dos homens 
objetiva que haja uma fruição do direito de propriedade que, apesar de ser 
possível no estado natural, não traz uma certeza e uma segurança. A ideia de 
unir os homens em uma comunidade seria fazer com que a propriedade fosse 
preservada.
Da mesma forma que se dá em Hobbes, na teoria de Locke, é o pacto que 
instituirá a sociedade civil, capaz de julgar em defesa do direito de propriedade 
para todos. Para Locke, o contrato se apresenta pelo fato dos homens terem 
dado seu consentimento, não para se submeterem a algum poder comum, mas 
para que concordem em se preservar, garantindo tudo o que desfrutaram no 
estado de natureza, e esse era o objetivo principal para Locke, e depois poder 
assegurar outras coisas mais possíveis com a formação da sociedade civil.
O casamento seria o grande reforçador das características do contrato que 
institui a sociedade política, porque nele os indivíduos envolvidos, o homem 
e a mulher, podem ver partindo deles a decisão de se unirem, e isso é o que 
possibilita a instauração da sociedade.
Pelo fato de serem homens livres por natureza, isso os faz iguais e inde-
pendentes. Isso faz com que não possam ser expulsos de suas propriedades 
e submetidos ao poder político de outros sem que consintam disso poder 
acontecer. A renúncia à liberdade natural está ancorada no fato do sujeito ver 
vantagens nos laços que se cria com a sociedade, pelo gozo da paz, pela garantia 
da propriedade, e poderem desfrutar de alguma proteção. Daí ser constituído 
uma comunidade ou governo, um corpo político no qual a maioria tem direito 
de agir e resolver por todos os demais.
O que John Locke quer fazer, não é implementar a renúncia da liberdade, 
mas promover uma nova forma de liberdade, que conte com o apoio da so-
ciedade civil. Há, ainda, aqui, a preservação daquela liberdade do estado de 
natureza, mas com sua ampliação. Se os direitos naturais forem preservados, 
isso fará com que o Estado não seja visto como um mal necessário, mas pela 
realização dos direitos humanos, que preservam a propriedade e garante que 
se possa acessar a felicidade.
U
N
ID
A
D
E 
3
112
Contrato e Sociedade Política ou Civil
A lei natural era o que nor-
teava a vida no estado de 
natureza. Como já assina-
lamos, a inexistência de um 
juiz imparcial, para regular 
as situações, era um fator 
complicante. Assim sendo, 
vai-se de um estado pacífico 
para as situações conturba-
das, em um piscar de olhos, 
o que acarreta a instauração 
do estado de guerra. Uma vez que muitos sucumbem aos conflitos, vê-se a necessi-
dade de instituir a sociedade civil, de modo que o governo poderá atuar como juiz, 
podendo resolver os conflitos aí existentes. Quando de sua entrada no estado civil, 
os homens ainda, conservam todos os seus direitos, exceto um, o de fazer justiça 
por si mesmo. Temos, aqui, a grande representação do estado liberal. Deve ocorrer 
que o poder político deve ser limitado, já o poder econômico deve ter estímulo.
Uma vez que todos os homens são livres, iguais e independentes por natureza, 
não se deve retirar o indivíduo de tal condição e sujeitá-lo ao poder político, sem 
que ele consinta. Tal consentimento deve ser manifesto por meio do contrato social. 
E é esse contrato que representa a passagem do estado de natureza para a sociedade 
civil. Nos Dois Tratados sobre o Governo, livro II, capítulo VII, diz Locke:
 “ Portanto, sempre que qualquer número de homens estiver unido 
numa sociedade de modo que cada um renuncie ao poder executivo 
da lei da natureza e o coloque nas mãos do público, então, haverá uma 
sociedade política ou civil. E tal ocorre sempre que qualquer número 
de homens no estado de natureza entra em sociedade para formar 
um povo, um corpo político sob um único governo, ou então quando 
qualquer um se junta e se incorpora a qualquer governo já formado. 
Pois com isso, essa pessoa autoriza a sociedade ou, o que vem a ser o 
mesmo, o legislativo desta a elaborar leis em seu nome segundo o exija 
o bem público, cuja execução sua própria assistência (como se fossem 
decretos de sua própria pessoa) é devida (LOCKE, 2005, p. 460).
U
N
IC
ES
U
M
A
R
113
Uma vez que o corpo político tenha sido constituído, esse era regido pela 
maioria. De modo que cada indivíduo se reconhecesse como parte inte-
grante de uma totalidade. Essa era, para John Locke, a forma dos homens 
não precisarem regressar ao estado de natureza. Entra-se, aqui, no esquema 
jusnaturalista, em que a resposta para as coisas é baseada no princípio da 
maioria. Não é o consenso da maioria que dita as regras, mas corresponde à 
natureza das coisas.
No tocante, ainda, à questão contratualista, é importante destacarmos a co-
locação de Ames (2012) sobre a forma tradicional e o modo como Locke agiu:
 “ Na doutrina contratualista tradicional o pacto de associação con-
verte uma multidão num povo, enquanto que o pacto de sujeição 
forma o governo. Estes dois pactos representam dois momentos 
da formação do corpo político: o primeiro cria o corpo social, 
o segundo produz o governo. Ao longo da obra de Locke não 
se encontra qualquer referência explícita ao segundo pacto. O 
silêncio sobre o segundo contrato não significa, porém, que Loc-
ke não reconhecesse a distinção dos dois momentos. Quando a 
sociedade se dissolve devido a uma guerra civil, por exemplo, 
extingue-se também o governo, mas este pode desaparecer sem 
acarretar a dissolução da sociedade. Isto significa que a constitui-
ção da sociedade e a constituição do governo são coisas distintas, 
representando dois momentos diferentes da formação do Estado 
(AMES, 2012, p. 120-121).
Cada um foi constituído para um fim: o povo na sociedade visava manter os 
direitos bons que tinham outrora, e o governo tinha a função mais específica 
de proteger as pessoas no Estado. Houve até mesmo críticas das ideias de Loc-
ke que diziam não ser possível realizar contratos, uma vez que, na história, não 
havia exemplos de grupos de homens independentes e iguais que tivessem se 
reunido para estabelecer um governo por contrato. Locke refuta tal argumen-
to, dando o exemplo da formaçãode Roma e Veneza. O mesmo ocorreria em 
alguns estados, onde o vínculo com este não se transmitia ao filho. E o filho 
poderia escolher entre a cidadania do pai ou uma outra cidadania. Uma vez 
que aceitasse tomar posse dos bens de herança que os pais deixaram, teria de 
aceitar pertencer ao país onde se localizava tais bens.
U
N
ID
A
D
E 
3
114
Jean-Jacques Rousseau nasceu em Genebra, na Suíça (1712-1778). Teve ao longo de 
sua vida várias profissões: aprendiz de escriturário, secretário, educador, funcionário 
do registro público de imóveis, copista de partitura, maestro, compositor de ópera 
e dramaturgo. Nesse tempo, passou, além de sua cidade em Genebra, na Suíça pelos 
seguintes países: Itália e França. O filósofo não era um exemplo moral, admitindo em 
sua obra Confissões ter cometido roubos, 
mentiras, entregue-se à preguiça, difa-
mação de moças inocentes, além é claro 
do chocante episódio para um educador, 
em que, por não saber o que fazer com 
os filhos, manda-os para um orfanato. 
Entretanto o nosso objeto de estudo aqui 
é mais propriamente a política. O filóso-
fo genebrino escreveu durante o que foi 
chamado de Século das Luzes, período 
em que ocorreram mudanças decisivas de 
mentalidade e de comportamento. Mu-
danças essas que teriam começado com 
o Renascimento do século XV.
Para Rousseau, Hobbes se equivoca 
3 
A VONTADE GERAL EM 
 JEAN-JACQUES 
ROUSSEAU 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
115
ao pensar e concluir que o homem natural é mau, por não ter nenhuma ideia de 
bondade, ou mesmo que ele seja corrupto por não conhecer a virtude. Para o filósofo 
de Genebra, Hobbes teria visto muito bem o defeito de todas as definições modernas 
de direito natural, mas as consequências que tira de sua formulação sobre a mesma 
questão apresentaria os mesmos problemas, isto é, também seria falsa.
Liberdade 
O ponto central do Contrato Social de Rousseau, é justamente seu início: “O 
homem nasce livre, e por toda parte encontra-se a ferros” (ROUSSEAU, 1997a, 
p. 53). Essa assertiva não tem sentido, aqui, para ele de irrestrição, mas sim de 
passagem da liberdade natural para a liberdade convencional. Pode-se perceber, 
ao ler a teoria de Rousseau, que o problema que ele põe em destaque, aqui, é de 
que forma a natureza original do homem pode se conciliar com a existência em 
sociedade? Essa nova ordem social que está para ser constituída, não vem a se 
fundar na natureza fundamental do homem, em seu substrato físico e mental, 
mas sim em suas convenções. Mesmo a família se mantém por convenção, se 
fugir a isso age voluntariamente. O homem tem como sua primeira lei sua 
própria conservação, e só aliena sua liberdade em proveito próprio. O Estado 
moderno visa sua própria conservação. A sociedade age de modo a impedir 
o homem de ser bom, porque está fundada somente no amor próprio, o que 
impede os homens de serem felizes.
Para que o mais forte seja sempre senhor, teria que transformar sua força 
em direito e a obediência em dever. O problema dessa atitude é o que o próprio 
filósofo assinala:
 “ [...] desde que a força faz o direito, o efeito toma lugar da causa. 
Uma vez que não há homem que tenha autoridade natural sobre 
seus semelhantes e que a força não produz nenhum direito, fica es-
tabelecido como base de toda a autoridade legítima existente entre 
os homens, as convenções. Renunciar à liberdade é o mesmo que 
renunciar à qualidade de homens, aos direitos da humanidade, e 
inclusive aos próprios deveres. [...] nulo é o direito de escravidão não 
só por ser ilegítimo, mas por ser absurdo e nada significar (ROU-
SSEAU, 1997a, s.p.). 
U
N
ID
A
D
E 
3
116
Antes de qualquer atitude a ser tomada, tem-se que remontar a uma conven-
ção anterior, em que uns mandam e outros obedecem. Como exemplifica e quer 
Grotius, que povo pode dar-se a um rei, deve-se examinar e conhecer, segundo 
Rousseau, antes o ato pelo qual um povo é povo. 
Uma vez que os homens se defrontam com a impossibilidade e subsistem por 
seus próprios meios no estado de natureza, ou seja, como simples indivíduos, fazem 
um contrato que rege daqui para adiante seu modo de vida. Há, aqui, uma “forma de 
associação que defenda e proteja as pessoas e os bens de cada associado com toda a 
força comum, e pela qual cada um, unindo-se a todos, só obedece contudo a si mes-
mo, permanecendo assim tão livre quanto antes” (ROUSSEAU, 1997a ,s.p.). Nasce 
aqui, então, um corpo moral e coletivo, chamado ainda de corpo político.
Vontade geral
Rousseau expõe que, entre o corpo político ativo e seus componentes, surge uma 
questão ímpar do contrato social, essa é a vontade geral, que, por sua vez, é sempre 
certa e que, não podendo errar, jamais agirá contra a liberdade de qualquer membro 
que seja do corpo social. Dentro do Estado civil, o que o homem ganha e o que 
ele perde, por participar deste contrato, fica claro uma vez que distingamos entre a 
liberdade natural e um direito ilimitado a tudo quanto, porventura, poder alcançar, 
e ganha a liberdade civil e a propriedade de tudo que possui. O próprio Rousseau, 
no Contrato Social, Livro Segundo, Capítulo III, é claro na diferenciação do que 
seja realmente a vontade geral e como essa difere da vontade de todos.
 “ Há comumente muita diferença entre a vontade de todos e a vonta-
de geral. Esta se prende somente ao interesse comum; a outra, ao in-
teresse privado, e não passa de uma soma das vontades particulares. 
Quando se retiram, porém, dessas mesmas vontades, os a-mais e os 
a-menos que nela se destroem mutuamente, resta, como soma das 
diferenças, a vontade geral. [...]. E, finalmente, quando uma dessas 
associações for tão grande que se sobreponha a todas as outras, não 
se terá mais como resultado uma soma das pequenas diferenças, 
mas uma diferença única - então, não há mais vontade geral, e a 
opinião que dela se assenhoreia não passa de uma opinião particu-
lar. Importa, pois, para alcançar o verdadeiro enunciado da vontade 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
117
geral, que não haja no Estado sociedade parcial e que cada cidadão 
só opine de acordo consigo mesmo (ROUSSEAU, 1997a, p. 91-92). 
Como bem assinala Ames (2012), anteriormente à filosofia de Rousseau, na 
Filosofia Política, tínhamos a definição de dois sujeitos fundamentais, que eram, 
de um lado, o príncipe (detentor do mando), e o povo (aqueles que obedeciam). 
O filósofo de Genebra, porém, vem a redefinir de modo radical essa visão. Ago-
ra, o corpo político é constituído por cidadãos livres e iguais, o que impossibilita 
que se continue qualquer forma de submissão pessoal. Não tem mais o pacto 
de submissão, o que se firma nesse momento é um pacto de associação. O que 
ocorre é que, pela renúncia plena dos direitos e poderes naturais em favor da co-
letividade, há a formação do corpo político, em que a vontade é a vontade geral. 
Propriedade 
A fundação da sociedade civil está estreitamente conjugada com a questão 
da propriedade. No início da segunda parte do Discurso sobre a Origem e os 
Fundamentos da Desigualdade entre os Homens, Rousseau coloca que: “O 
verdadeiro fundador da sociedade civil foi o primeiro que, tendo cercado um 
terreno, lembrou-se de dizer, isto é, meu e encontrou pessoas suficientemente 
simples para acreditá-lo” (ROUSSEAU, 1997b, p. 87). Muitos coisas ruins teriam 
deixado de acontecer se alguém tivesse se colocado contra tudo isso, desde o 
início. Essa crítica, no entanto, traz o reconhecimento do fato de que: além 
das coisas não poderem permanecer da forma como estavam, era essa passa-
gem para a sociedade civil fruto de muitas ideias que vinham amadurecendo 
de longa data, desde outrora. O estabelecimento da propriedade trouxe uma 
transformação verdadeira. Com o cultivo da terra, deu-se origem à propriedade, 
e com ela veio a desigualdade. E da desigualdade é que se criou a ambição, o 
desânimo dos pobres, o estado de guerra, a escravidão (SÉE, 1982).
O domínio real (e o autor entende real como: “das coisas”, ou “sobre as 
coisas”) deve obedecer a certas condições.Dado que, no Estado civil, o pri-
meiro ocupante tem direito, mesmo sobre o mais forte, à posse da terra, deve 
ainda respeitar que: primeiro, o terreno não seja ainda habitado por outrem; 
segundo, que ocupe só a porção necessária à sua subsistência, e, terceiro, que 
a posse não seja uma cerimônia vã, mas pelo trabalho e pela cultura. “Esses 
U
N
ID
A
D
E 
3
118
são os únicos sinais que devem ser respeitados pelos outros na ausência de 
títulos jurídicos” (ROUSSEAU, 1997a, s. p.). 
Em seu Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade en-
tre os Homens (1997), ao tratar da questão do trabalho, o filósofo genebrino 
expõe a seguinte suposição quando a uma possível condição ao homem: a de 
que a população, uma vez que venha a aumentar, de modo que as produções 
da natureza não sejam suficientes para alimentar a todos. Apesar da vantagem 
de ter a condição de ser humano, suponha-se, ainda, que os instrumentos 
de trabalho lhes tenham caído do céu em suas mãos, e esse tenha, ainda, 
vencido o ódio mortal que todos têm pelo trabalho contínuo. E continua 
dizendo desses homens terem, agora, aprendido a prever suas necessidades, 
adivinhado como se cultiva a terra e a fazer as demais atividades. Dito isso, ele 
faz a seguinte colocação: “qual seria depois disso, o homem suficientemente 
insensato para atormentar-se com a cultura de um campo de que o despo-
jaria o primeiro a chegar, fosse indiferentemente homem ou besta, e a quem 
conviesse essa colheita?” (ROUSSEAU, 1997b, p. 68).
No momento em que não estivesse a propriedade ainda instituída, o que 
poderia fazer com que alguém, no seu sensato juízo, propusesse-se a plantar 
e cuidar de uma cultura que, mais que provável, certamente, outro colheria e 
daria cabo? Rousseau indaga, dessa forma, como podem os homens continuar 
a cultivar a terra, sem que essa seja dividida entre eles? Sem a instituição da 
propriedade que garante a possibilidade de divisão das terras, realmente seria 
algo complicado convencer alguns a realizar esforços em vão. Daí a necessi-
dade de firmar um pacto entre os homens.
 “ [...]o pacto fundamental, em lugar de destruir a igualdade natural, 
pelo contrário substitui por uma igualdade moral e legítima aquilo 
que a natureza poderia trazer de desigualdade física entre os ho-
mens, que podendo ser desiguais na força ou no gênio, todos se 
tornam iguais por convenção e direito (ROUSSEAU, 1997a, p. 81).
A partir do segundo livro do Contrato Social, é apresentado um estudo mais por-
menorizado da estrutura e comportamento da soberania, com o que se prepara 
a definição da lei, para depois formulá-la.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
119
Soberano
Para Rousseau, a soberania é indivisível pela mesma razão que é inalienável, uma 
vez que a vontade é geral (que visa o bem comum) ou não é, é a vontade do corpo 
do povo ou somente de uma parte. É possível que o poder seja sempre certo e tenda 
sempre à utilidade pública, mas isso não significa que as deliberações do povo apre-
sentem sempre a mesma exatidão. “Salvo em caso de deperecimento e perversão, a 
vontade geral nunca erra” (ROUSSEAU, 1997a). O que o pacto social faz é estabe-
lecer uma determinada igualdade entre os cidadãos, em que eles se comprometem 
todos nas mesmas condições e devem todos gozar dos mesmos direitos.
O Estado, caso esteja em estado de guerra, uma vez que precise das vidas de 
seus súditos, pode delas fazer uso.
 “ Ora, o cidadão não é mais juiz do perigo do qual a lei quer que se 
exponha e quando o príncipe lhe diz: É útil ao Estado que morras, 
deve morrer, pois foi exatamente por essa condição que até então 
viveu em segurança e que sua vida não é mais mera dádiva da na-
tureza, porém um Dom condicional do Estado. Só se tem o direito 
de matar mesmo para exemplo, aquele que não se pode conservar 
sem perigo (ROUSSEAU, 1997a, p. 101).
Se pelo pacto social foram dadas 
existência e vida ao corpo políti-
co, uma vez que o ato primitivo 
pelo qual o corpo se forma e se 
une não determina aquilo que 
ele deve fazer para se conservar, 
é pela legislação que lhe será 
dado movimento e vontade, “[...] 
a matéria sobre a qual se estatui 
é geral como a vontade que a es-
tatui. A esse ato dou o nome de 
lei” (ROUSSEAU, 1997a, p. 106-
107). Quando Rousseau diz que os objetos das leis são sempre gerais, é porque a 
lei considera os súditos como corpo e as ações como abstratas, jamais como um 
indivíduo ou uma ação particular.
U
N
ID
A
D
E 
3
120
A tarefa do legislador é mais difícil que a do próprio soberano que, tão so-
mente, precisa segui-la. Há ainda legisladores que recorrem a Deus (deuses) para 
persuadir aqueles que a razão humana não persuade. O bom legislador avalia 
quais tipos de leis são mais convenientes a cada povo, pois não adianta dar leis 
que um povo não consiga cumprir (ROUSSEAU, 1997a). Os sistemas de legis-
lação devem visar precisamente, como sua finalidade primordial, dois objetos: 
à liberdade e a igualdade. A primeira porque qualquer dependência particular 
corresponde a outro tanto de força tomada ao corpo do Estado, e a igualdade 
porque a liberdade não subsiste sem ela (ROUSSEAU, 1997a).
No livro III do Contrato Social, Rousseau se dedica, de modo mais compene-
trado, ao estudo do governo. A princípio, ele parece realizar a questão de forma 
geral, visando estabelecer um critério para avaliar as várias formas de organiza-
ções governamentais. Seria o governo, segundo sua visão, um corpo intermédio 
entre o soberano e os súditos, servindo assim de mediador e equilíbrio dessa 
relação. Ao firmar distinção entre o poder executivo e a realidade estatal, já se 
detectava grandes abusos políticos, ficando difícil dizer qual seria a melhor forma 
de governo, se a monarquia, aristocracia ou a democracia. Segundo Rousseau: 
 “ [...]nos vários Estados, o número de magistrados superiores deve 
estar em razão inversa à do número de cidadão, conclui-se daí 
que em geral o Governo democrático convém aos Estados pe-
quenos, o aristocrático aos médios e o monárquico aos grandes 
(ROUSSEAU, 1997a, p. 148).
Há momentos em que são ressaltados os pontos negativos e positivos de se viver 
numa democracia, tais como: ser contra a ordem natural governar a maioria e ser 
a menoria governada; cita um pensador virtuoso da Polônia que dizia: “Prefiro a 
liberdade perigosa à tranquila servidão”. A igualdade não poderia subsistir por 
muito tempo no direito e na autoridade etc. A aristocracia era a forma de governo 
das primeiras sociedades. Essa forma de governo teve um bom andamento, até 
que a desigualdade da instituição prevaleceu sobre a desigualdade natural, sendo 
daí que a riqueza ou o poder foram preferidos à idade, daí a aristocracia ter se 
tornado eletiva (os bens agora eram junto ao poder transmitidos dos pais aos 
filhos). A aristocracia se divide em três: a natural, que só convém a povos simples; 
a hereditária, que é a pior, e a eletiva, que é o melhor governo, pois é a aristocracia 
propriamente dita, estabelecida por eleição (ROUSSEAU, 1997a).
U
N
IC
ES
U
M
A
R
121
O príncipe é visto como uma pessoa moral e coletiva unida pela força das leis e de-
positária, no Estado, do poder executivo. Mas Rousseau falará agora da monarquia, 
em que o poder reunido nas mãos de uma pessoa natural, de um homem real, está 
enfim nas mãos daquele único que tem o direito de dispor dele, segundo as leis. A 
esse se chama monarca, ou rei. Mesmo adverso a esse regime, o filósofo aceita, ao 
menos teoricamente, como uma das formas possíveis de governo legítimo.
O corpo político, cedo ou tarde, terá sua morte, ele já traz em si, desde o seu 
nascimento, as causas de sua morte. Porém, é mais vigoroso o corpo político que 
tem clareza, e o princípio da vida política reside na autoridade soberana. “Onde 
o poder legislativo é o coração do Estado, o poder executivo, o cérebro, que dá 
movimento a todas as partes. O cérebro pode paralisar-se e o indivíduo continuar 
a viver”, mas não se o coração parar (ROUSSEAU, 1997a, p. 178).
Uma vezque os homens reunidos em um único corpo formam o estado, 
esse é fruto de sua busca de conservação e bem-estar geral, em que todos de-
vem se guiar pelas soluções mais simples, vinda de homens simples. As divisões 
em facções só vêm a enfraquecer o Estado. É o fim da vontade geral? Não, esta 
sempre será constante, inalterável e pura. No livro IV, cap. I do Contrato Social, 
vê-se que quanto mais unanimidade, mais dominante será a vontade geral. Já as 
dissenções e os túmultos causam o declínio do Estado. Quanto ao pacto social, 
esse é a única lei que exige consentimento unânime. O consentimento unânime, 
em outro caso (que não seja o pacto), leva à servidão, pois afeta a liberdade e a 
vontade. A vontade da maioria é igual a vontade geral. A respeito das eleições, 
temos as que se dão pela sorte, em que Rousseau discorda com Montesquieu, 
que diz ser a melhor, pois pertence a natureza da democracia; e a que se dá pela 
escolha, em que, na aristocracia, o príncipe escolhe o príncipe, pois o governo se 
conserva por si mesmo. E, nela, cabem melhor os sufrágios. Onde os costumes, 
talentos e fortunas fossem iguais, a escolha pela sorte não teria problemas. Onde 
O fato básico da política não é o governo. O governo, para Rousseau, é um mal necessário, 
porque os homens necessitam direção no exercício da liberdade. Quanto menos governo 
houver, tanto melhor. Existe uma grande preocupação em limitar a esfera do governo e 
em impedir que contradiga a vontade geral. Por causa da tendência de controlar a vonta-
de geral, o governo é visto sempre com desconfiança.
Fonte: Ames (2012, p. 140).
explorando Ideias
U
N
ID
A
D
E 
3
122
há escolha e sorte juntas, há cargos que necessitam de talentos especiais, tal como 
os cargos militares. O monarca é o único que escolherá seus auxiliares diretos 
(ROUSSEAU, 1997a).
É atribuído ao tribunato conservar as leis e o poder legislativo, outras vezes 
pode proteger o soberano contra o governo. Pelo fato de tribunato não ser parte 
constitutiva da polis, não deve, portanto, ter porção alguma do poder executivo 
nem do legislativo, porém é aqui que reside sua força, seu poder, pois uma vez 
que nada pode fazer, tudo pode impedir. Semelhante ao governo, o tribunato 
enfraquece uma vez que seja multiplicado seus membros.
Rousseau pensava que o estado ideal para que o homem vivesse seria o pró-
prio estado de natureza. Como podemos verificar, por exemplo, nessa passagem 
de sua obra Emílio ou da Educação:
 “ [...]quanto mais o homem permanece perto de sua condição natural, 
mais a diferença de suas faculdades com seus desejos se faz pequena 
e menos, por conseguinte, ele se acha longe de ser feliz. Ele não é 
nunca menos miserável do que quando parece desprovido de tudo; 
pois a miséria não consiste na privação das coisas e sim na necessi-
dade que delas se faz sentir (ROUSSEAU, 1968, p. 63).
Os homens eram sadios, bons e felizes enquanto cuidavam de sua sobrevivência, 
porém uma vez reconhecendo que seria impossível continuar assim, no estado 
de natureza, chega o momento em que é criada a propriedade, e uns passam a 
trabalhar para os outros, fato que gera escravidão e miséria. Tem-se que passar 
também para a vida em sociedade. Mas não no regime monárquico, mas numa 
democracia, e esse regime é preferível, mesmo que se pense estar mais seguro em 
outra forma de governo, por exemplo, o monárquico ou aristocrático. Como ele 
citou no Contrato Social, e que já referimos, anteriormente, ele explana o que dis-
se o palatino: “prefiro a liberdade perigosa, à tranquilidade servidão”. Em Hobbes, 
uma vez que o soberano erre, não pode ser punido, porque é ele mesmo quem 
atribui as penas, e fazendo isso não irá consequentemente punir a si próprio; 
nem mesmo o povo pode lhe punir, pois uma vez que o instituíram soberano, ou 
mesmo que esse o seja por força, ele representa o corpo todo de cidadãos, assim, 
querendo o penalizar, estariam penalizando a si mesmos. Já para Rousseau, o 
que impera é a vontade geral, que é fruto do contrato social e sempre certa, e não 
podendo, jamais agirá contra a liberdade de qualquer membro do corpo social.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
123
Por falar em liberdade, esse conceito tem importância fundamental para os fi-
lósofos. Para o filósofo francês, o contrato realizado pelos homens, ao formar a 
sociedade civil, “desloca-os” da liberdade natural, em que não precisava prestar 
satisfação de seus atos, para a liberdade convencional. Por convenção, os homens 
passam a ter, por exemplo, que respeitar as leis; conquistar terras não mais pela 
força, mas pelo trabalho, de modo a justificar seu uso: “O homem nasce livre, e 
por toda parte encontra-se a ferros”, vem lhe propor que obedeça às convenções. 
De outro lado, Hobbes vê a liberdade do homem naquilo que, graças a sua força, e 
engenho é capaz de fazer, não sendo impedido de tal ação que, porventura, tenha 
vontade de fazer. Vemos, aqui, que diferente do sentido empregado por Rousseau 
ao termo, ele incute a questão do impedimento ou não do movimento.
Para Rousseau, o Estado de Natureza, é o estado de felicidade original, em que 
desconhecem as lutas e se comunicam pelos gestos, gritos e cantos. Esse seria um 
modo selvagem e inocente, mas que tem seu fim quando alguém diz: “Isso é meu”. 
Ocorre a divisão entre o meu e o teu, isto é, a propriedade privada é estabelecida, 
originando-se, assim, o Estado de Sociedade. 
U
N
ID
A
D
E 
3
124
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pudemos entender que para Hobbes, Locke e Rousseau, o contrato teve papel 
importante para uma melhor organização da humanidade. Em Hobbes, o 
Estado vem substituir o estado de natureza, fazendo com que a insegurança 
seja dissipada, propiciando a paz necessária à vida e ao desenvolvimento. A 
primeira ideia, então, é a conservação de si próprio, esquivando-se da violên-
cia, e para que não se caia numa anarquia, o Estado deve ser instituído.
A teoria política de John Locke, de viés liberal, já enxergava no estado 
de natureza um bom desenvolvimento ‘social’ e uma certa paz. Entretanto o 
filósofo queria a implantação do estado, para que houvesse a possibilidade 
de se julgar e resolver os conflitos, firmando assim a preservação dos direitos 
naturais. Da primeira propriedade do homem, que era seu próprio corpo e 
depois seu trabalho, passa-se pela questão de sua preservação, podendo contar 
com um mínimo necessário à sua subsistência. Tudo isso acarretará, como 
assinalamos a pouco, em um liberalismo de propriedade e conservação dessa 
e de si mesmo.
Com Jean-Jacques Rousseau vimos que o estado de natureza era bom. Mas 
o fato de um homem não ter direito natural sobre seu semelhante pressiona 
para que seja adotada uma nova ordem social, por meio das convenções. 
A forma como Rousseau propõe uma forma de associação visa defender as 
pessoas e os bens de cada associado, fazendo com que a vontade geral, que 
é a expressão do interesse comum, possa ser exercida. No sistema político, 
o filósofo diz que: onde o poder legislativo é o coração do Estado, o poder 
executivo é o cérebro que dá movimento a todas as partes.
Enfim, o contratualismo acabou por compreender os fundamentos que le-
varam a uma avaliação do modo de vida no estado de natureza, e a importân-
cia de se fazer um pacto social que contou com o acordo expresso da maioria 
dos indivíduos para a formação do Estado e as garantias por ele oferecidas.
125
na prática
1. Para Hobbes, o fim último do homem é sua conservação e uma vida satisfeita. O 
que ele quer é se livrar da mísera condição de guerra, a “guerra de todos contra 
todos”, apesar dessa ser consequência natural das paixões dos homens, quando 
da ausência de um poder capaz de manter o respeito, forçando-os por medo do 
castigo a cumprirem seus pactos e respeitarem as leis de natureza (que são a justiça, 
a equidade, a modéstia, a piedade, enfim, fazer aos outros o que queremos que 
nos façam). “Seria um mal menor suportar uma lei injusta que permitir a cada um 
decidir da justiça das leis” (FERREIRAFILHO, 2002, p. 41). Tomando como base o 
que foi dito acima, quais as opções corretas?
( ) Para Hobbes, o medo impulsiona a formação do Estado.
( ) Segundo Rousseau, o “estado de guerra” deve ser implantado para que poste-
riormente se obtenha melhores resultados.
( ) Sempre houve, como apregoou Hobbes, e sempre haverá miséria, independen-
te de como o governante realiza sua administração.
( ) Mesmo havendo alguma lei injusta, para Locke, compensa aderir à formação do 
Estado, uma vez que esse pode “garantir” a proteção dos indivíduos e o estado 
de natureza apresenta o risco da guerra de todos contra todos.
( ) É melhor, para Rousseau, condicionar-se a um estado que lhe ofereça alguma 
garantia, do que permanecer no estado de natureza, no qual, apesar de ter 
maior liberdade, corre-se mais riscos.
2. Os homens são donos de todo trabalho que realizam com suas próprias mãos. Ao 
anexar o trabalho às coisas que a natureza fornece, ficam os homens como que 
misturados ao próprio trabalho, daí poder tomar tais coisas como fruto de seu tra-
balho. Como podemos analisar essa passagem frente à teoria de John Locke?
126
na prática
3. Rousseau, no Contrato Social, Livro Segundo, Capítulo III, sobre a vontade geral: 
Há comumente muita diferença entre a vontade de todos e a vonta-
de geral. Esta se prende somente ao interesse comum; a outra, ao 
interesse privado, e não passa de uma soma das vontades particula-
res. Quando se retiram, porém, dessas mesmas vontades, os a-mais 
e os a-menos que nela se destroem mutuamente, resta, como soma 
das diferenças, a vontade geral. (...) E, finalmente, quando uma des-
sas associações for tão grande que se sobreponha a todas as outras, 
não se terá mais como resultado uma soma das pequenas diferen-
ças, mas uma diferença única - então, não há mais vontade geral, e a 
opinião que dela se assenhoreia não passa de uma opinião particu-
lar. Importa, pois, para alcançar o verdadeiro enunciado da vontade 
geral, que não haja no Estado sociedade parcial e que cada cidadão 
só opine de acordo consigo mesmo (ROUSSEAU, 1997a, p. 91-92).
Assinale Verdadeiro (V) ou Falso (F):
( ) A vontade geral é melhor para os homens do que a vontade de todos, uma vez 
que essa primeira pensa o bem da sociedade como um todo.
( ) Uma associação muito grande prejudica o resultado da soma de pequenas 
diferenças, em quenão se pode mais falar, nesse caso, de vontade geral.
( ) Rousseau quer instaurar um novo liberalismo, em que, com a formação do 
Estado, os homens poderão continuar a fazer tudo o que faziam antes.
4. A definição de Locke sobre o estado de natureza é a seguinte: “homens vivem 
juntos segundo a razão e sem um superior comum sobre a Terra, com autorida-
de para julgar entre eles” (II, 19). O estado de natureza está regulado pela razão 
(diferentemente de Hobbes) e é possível que o homem viva em sociedade, mas 
se carecem desse “poder decisivo de apelo, tais homens se encontrarão ainda no 
estado de natureza” (II, 89). Em outras palavras, “a ausência de um juiz comum 
dotado de autoridade coloca todos os homens em um estado de natureza” (II, 
19)(VÁRNAGY, 2006, p. 59). A partir desse texto responda o que motiva, para 
Locke, a formação do Estado”?
127
na prática
5. O fim último, causa final e desígnio dos homens (que amam naturalmente a liber-
dade e o domínio sobre os outros), ao introduzir aquela restrição sobre si mesmos 
sob a qual os vemos viver nos Estados, é o cuidado com sua própria conservação e 
com uma vida mais satisfeita. Quer dizer, o desejo de sair daquela mísera condição 
de guerra que é a consequência necessária (conforme se mostrou) das paixões 
naturais dos homens, quando não há um poder visível capaz de os manter em 
respeito, forçando-os, por medo do castigo, ao cumprimento de seus pactos e ao 
respeito àquelas leis de natureza[...]” (HOBBES, 1999a, 141). Referente ao texto, 
aqui, citado de Hobbes, assinale as alternativas corretas, colocando (V) 
para Verdadeiro e (F) para Falso.
( ) O homem quer sair do estado de natureza para alcançar um liberalismo se-
melhante ao proposto por Rousseau.
( ) Viver sob o Estado é se impor restrições, mas é, ao mesmo tempo, assegurar 
a própria preservação.
( ) A formação do Estado não exclui necessariamente o medo. Do medo das incer-
tezas, passa-se ao medo do soberano. Entretanto, para Hobbes, essa condição 
é melhor, uma vez que traz mais segurança.
( ) O desrespeito é uma coisa natural, portanto, deve-se viver do jeito que der.
( ) As paixões naturais dos homens geravam desentendimentos, e isso era com-
parável para Hobbes ao estado de guerra de todos contra todos.
128
aprimore-se
O CONTRATUALISMO NA IDADE MODERNA DOS SÉCULOS XV A XVIII: 
UMA TEORIA POLÍTICO-FILOSÓFICA DE VIÉS ILUMINISTA 
Após a invenção da imprensa, por Johannes Gensfleisch Zur Laden Zum Gutem-
berg (1395-1468), no século XV, na Alemanha, há o advento do Iluminismo (tam-
bém denominado Idade da Ilustração, Século das Luzes ou Época do Esclarecimen-
to), o qual, de acordo com Santos (2016), consistia em um movimento filosófico 
e artístico-literário que se estendera de 1680 a 1780 (século XVIII) e analisava a 
sociedade a partir de uma perspectiva racional, sendo assim originário da teoria 
mecanicista do cientista inglês Isaac Newton (1642-1727), pela qual os fenômenos 
se explicam por conjuntos de causas mecânicas, ou seja, de forças e movimentos. 
Grosso modo, pode-se dizer que o Iluminismo foi um amplo movimento reacioná-
rio contra o Antigo Regime (o Absolutismo), que obtivera grande repercussão prin-
cipalmente na França e na Inglaterra (VAZ, 2007), sendo considerado o apogeu da 
centralização monárquica na Europa durante a Idade Moderna, nos séculos XV-X-
VIII. Diante disso, as transformações ocorridas nesses períodos históricos levaram 
os pensadores de tais épocas a buscar explicações sobre os homens e a vida social 
em sentido amplo, desencadeando o surgimento de diferentes teorias que fossem 
capazes de solucionar, ao menos em parte, os conflitos e as guerras sociais exis-
tentes. Outra questão latente que ocupou bastante os filósofos da Idade Moderna 
(séculos XV a XVIII) foi a justificação racional para a existência das sociedades hu-
manas e a criação do Estado. Conforme apontado por Cotrim (2006, p.276), essa 
questão apresentou-se, de modo geral, nos seguintes moldes: Qual é a natureza 
do ser humano? Qual é o seu “estado natural”? – em suas diversas conjecturas 
chegaram, em geral, à conclusão básica de que os homens são, por natureza, li-
vres e iguais. Como explicar, então, a existência do Estado e como legitimar seu 
poder? – Com base na tese de que todos são naturalmente livres e iguais, deduzi-
ram que, em dado momento, por um conjunto de circunstâncias e necessidades, 
129
aprimore-se
os homens se viram obrigados a abandonar essa liberdade e estabelecer entre si 
um acordo, uma aliança, um pacto social ou um contrato social, o qual teria dado, 
por consequência, origem ao Estado (ou à sociedade civil) por excelência. A res-
posta para estas indagações conduziu, portanto, os filósofos iluministas da Idade 
Moderna, no século XVIII, às concepções de “estado de natureza” (“estado natu-
ral” ou “estado de natureza original”) e Estado Civil (ou Estado Moderno). Dentre 
as principais contribuições do Iluminismo, pode-se citar uma das mais influentes 
correntes de pensadores iluministas no contexto da Teoria Política: os contratua-
listas; dando destaque especial às denominadas teorias contratualistas (ou teorias 
políticas contratualistas) elaboradas cada qual de forma diferenciada, segundo 
critério cronológico específico, por Thomas Hobbes (1588-1679), John Locke (1632-
1704) e Jean Jacques Rousseau (1712-1778). Nesse contexto, cabe-nos então per-
guntar: o que significa contratualismo? Em sentido muito amplo, o contratualismo 
compreende todas aquelas teorias políticas que veem a origem da sociedade e o 
fundamento do poder político (chamado,quando em quando, potestas, imperium, 
Governo, soberania, Estado) num contrato, isto é, num pacto social, num acordo 
tácito ou expresso entre a maioria dos indivíduos; acordo esse que assinalaria o 
fim do “estado natural” e o início do Estado Social e Político. Com efeito, num sen-
tido mais restrito, por tal termo se entende uma escola (filosófica) que floresceu 
na Europa entre os começos do século XVII e os fins do XVIII, aproximadamente, e 
teve seus máximos expoentes em J. Althusius (1557- 1638), T. Hobbes (1588-1679), 
B. Spinoza (1632-1677), S. Pufendorf (1632- 1694), J. Locke (1632-1704), J. J. Rous-
seau (1712-1778), I. Kant (1724- 1804), dentre outros renomados teóricos. Vale sa-
lientar que por escola (filosófica) concebe-se não uma comum orientação política, 
mas o comum uso de uma mesma sintaxe ou de uma mesma estrutura conceitual 
para racionalizar a força e alicerçar o poder no consenso. 
Fonte: Bobbio (1998, p.272) e Santos e Henich (2018, p. 38).
130
eu recomendo!
A Teoria Contratualista do Estado: Convergências e Diver-
gências em T. Hobbes, J. Rousseau e J. Locke
Autor: Gustavo Granado 
Editora: Gramma
Sinopse: o modo como Granado trata do contratualismo expõe 
convergências e divergências entre Thomas Hobbes, Jean-Jac-
ques Rousseau e John Locke. A obra oportuniza o conhecimento 
de um mesmo problema, mas sob diferentes perspectivas. Cada uma das teorias 
será analisada separadamente, tentando estabelecer entre alas um certo diálogo, 
o que ressalta alguns aspectos da política.
livro
Ética, direito e política: a paz em Hobbes, Locke, Rousseau e 
Kant 
Autor: Paulo César Nodari
Editora: Paulus
Sinopse: nesta segunda indicação, propomos uma leitura em que 
as vidas dos homens desembocam na paz, por meio da segurança 
que é transmitida com a formação do Estado, perpassando ques-
tões de ética, direito e política e suas implicações. Além de tratar das épocas de 
Hobbes, Locke, Rousseau e Kant, a obra também traz uma análise sobre o momen-
to atual, no que compete à globalização, tecnociência e os mais variados tipos de 
violência.
livro
Os Três Mosqueteiros
Ano: 2011
Sinopse: esse filme é uma adaptação de uma das obras de Alexan-
dre Dumas, contendo muita ação e aventura. Mas para além das 
aventuras, o filme mostra as artimanhas e as disputas pelo poder 
que mobilizavam os povo inglês e o povo francês no século XVII.
filme
https://www.amazon.com.br/s/ref=dp_byline_sr_book_1?ie=UTF8&field-author=Gustavo+Granado&search-alias=books
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
anotações
4
A FILOSOFIA POLÍTICA
CONTEMPORÂNEA
PROFESSOR 
Esp. Silvanir Aldá
PLANO DE ESTUDO 
A seguir, apresentam-se as aulas que você estudará nesta unidade: • O Pensamento Político de Han-
nah Arendt: crítica ao Totalitarismo • Norberto Bobbio: o Futuro da Democracia • A Sociedade Justa 
em John Rawls.
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM 
Entender o que é a política em Hannah Arendt e como se dá a banalidade do mal dentro do contexto 
do totalitarismo • Verificar a possibilidade de implantação dos mais variados tipos de democracia em 
diferentes sociedades • Compreender a noção de sociedade justiça e os problemas internos à justiça, 
como o caso da equidade.
INTRODUÇÃO
Na filosofia contemporânea, trataremos das teorias de três filósofos de 
peso: Hannah Arendt, Norberto Bobbio e John Bordley Rawls. Uma 
conversa que parte de um dos, senão o mais horrendo evento da his-
tória mundial, que foi o nazismo, a anulação do ser humano no campo 
de concentração, em nome de um ideal genético e perfeito de homem. 
Percorreremos, depois, na contramão do nazismo, a discussão sobre a 
democracia, não só da questão desta ser representada pelo povo, como 
do fato dela emanar do povo. Teríamos encontrado uma forma de go-
verno melhor que a democracia? Até onde poderemos chegar com ela? 
Qual é o seu limite? Essas e outras respostas estão ligadas, ainda, aos 
limites do próprio homem. Com John Rawls veremos a necessidade 
das instituições levantarem a ‘bandeira’ da justiça. Como organizar a 
sociedade sem que essa esteja fundamentada na justiça? Deve haver um 
constante repensar, para que toda vez que se identifique teorias injustas 
possa haver as correções necessárias ao bom crescimento social.
Arendt pensou os elementos opressores presentes, em um dos que 
foram conhecidos como mais cruéis regimes totalitários, o Nazismo. 
Nesse, o isolamento aparecerá como fator preponderante e pré-requisito 
da tirania, de modo avassalador.
Com Bobbio, verificaremos que, na democracia, o poder emanará 
do povo, ela vem desse lugar comum. A democracia é composta tanto 
da democracia representativa quanto na democracia direta. Na antigui-
dade, o envolvimento e o comprometimento com as coisas públicas fora 
algo muito apreciado. A democracia é um dos temas de maior destaque 
na teoria política desse autor, sendo, para ele, um regime democrático 
ruim melhor que qualquer regime totalitário.
Em Rawls, veremos que seu liberalismo político reage ao debate 
dos liberais. O que ele fará é tentar trabalhar uma concepção de justiça 
como equidade. Sua visão contratualista trata da distribuição de bens 
sociais, a qual apresentará o critério de justiça.
U
N
ID
A
D
E 
4
134
1 
O PENSAMENTO POLÍTICO DE 
HANNAH ARENDT:
crítica ao Totalitarismo
Pouco ou quase nunca ouvimos falar de filósofas, mesmo na Modernidade. Se por um 
lado, poucas foram as filósofas; por outro, suas teorias deixaram marcas profundas, 
principalmente no campo da política. Trataremos, aqui, especificamente, de Hannah 
Arendt (1906-1975), filósofa alemã, de origem judaica, com expressão notável, prin-
cipalmente na filosofia política do século XX. Sua obra trata dos seguintes assuntos: 
política e autoridade, suas reflexões têm, inclusive, um caráter pedagógico, acrescenta-
-se à lista, ainda, as questões sobre o totalitarismo, o trabalho, a violência, pluralismo, 
liberdade, igualdade no âmbito político e a condição da mulher na sociedade. 
A Condição Humana
A obra de Hannah Arendt, Origens do Totalitarismo, foi publicada em 1951. E 
a A Condição Humana publicada em 1958. Nessa última, ela faz mais do que 
dar uma resposta à questão da possibilidade do totalitarismo. Sua obra torna-se 
uma fenomenologia das atividades humanas fundamentais, no campo do que 
ela chamava de vida ativa. 
A vida ativa compreendia, para a filósofa, três tipos de atividades do homem: 
o trabalho (manutenção da vida), a obra (produção de algo novo) e ação (vida pú-
blica, política). Essa distinção feita entre obra e trabalho tem um caráter inovador. 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
135
 “ Ao defender esta distinção, ela argumenta que todas as línguas euro-
peias possuem duas palavras de etimologia diferente para designar o 
que hoje para nós é uma mesma atividade, e curiosamente elas con-
servam as duas palavras mesmo elas sendo usadas como sinônimas. 
Neste sentido, a palavra trabalho nunca designa o produto final; já 
a palavra correspondente a obra, ao contrário, deriva do nome do 
próprio produto. No mundo ocidental o desprezo pelo trabalho, que 
resulta da luta do homem contra a necessidade e todo o seu esforço 
que não deixa qualquer vestígio ou obra que seja digna de ser lembra-
da pode ser o motivo, segundo a autora, pelo qual esta distinção per-
maneça durante bastante tempo ignorada (CAMARGO, 2013, p. 191).
Para Arendt o fato, por exemplo, de que, na Grécia antiga, valorizava-se tanto 
o trabalho quanto a obra, fundava-se na necessidade de se ter escravose, es-
pecialmente, por se considerar a natureza servil das ocupações pertinentes 
à manutenção da vida. A liberdade do cidadão grego estava fundada no fato 
dele subjugar os outros homens pelo viés da necessidade. Trabalho e obra não 
eram considerados, na antiguidade clássica, coisas distintas. Os dois eram per-
tencentes à casa privada (oikos), assinalando necessidades a serem supridas, 
ao contrário do que se dava na esfera pública. 
O homem é um animal social ou político.O que regula as atividades dos 
homens é o fato de viverem juntos. Realizar um trabalho não requer neces-
sariamente a presença de outros, mas ao trabalhar na mais completa solidão 
não o tornaria exatamente ‘humano’, mas um animal laborans. Ao fabricar ou 
construir algo, o homem seria um fabricador, mas não um homo faber, Arendt 
questiona se seria ele um demiurgo divino, como dizia Platão (ARENDT, 2010, 
p. 26). O agir e o estar juntos poderiam, ainda, arremeter ao zoon politikon de 
Aristóteles, ao animal socialis de Sêneca ou o homem por natureza política e 
social de Tomás de Aquino.
Quando se faz a substituição social pela significação política, fica claro o 
quanto se tinha perdido a originalidade da compreensão grega da política. “Para 
tanto, é significativo, mas não decisivo, que a palavra ‘social’ seja de origem romana 
e não tenha equivalente na língua ou no pensamento gregos” (ARENDT, 2010, 
p. 27). A condição do homem no domínio público ocorreu a partir do domínio 
privado da família e do lar. Nesse sentido, o que fez a polis deixar de violar a vida 
privada de seus cidadãos e, como sagrados, os limites que cercavam cada pro-
priedade não foi o respeito à propriedade privada, mas o fato de possuírem casa.
U
N
ID
A
D
E 
4
136
O que é Política?
Autora de uma obra com esse 
mesmo título, O que e po-
lítica?, em meados de 1950, 
aborda a temática da plu-
ralidade dos homens.O ho-
mem é uma criação de Deus 
e esse produto de suas mãos 
tem uma natureza humana. 
Para Arendt, tanto a filosofia 
quanto a teologia sempre se 
ocuparam do homem e isso 
se estenderia, ou melhor, con-
tinuaria a acontecer mesmo que houvesse apenas um homem, ou dois, ou mesmo 
que esses fossem idênticos uns aos outros. Seria devido a isso que não encontra-
ram, ainda, uma resposta válida para a questão: “o que é política?”, do ponto de 
vista filosófico. Para as várias áreas das ciências, existe, meramente, o homem. Na 
filosofia, na biologia, na teologia, na psicologia. Da mesma forma que acontece 
em outras áreas, como na zoologia, em que existe apenas o leão.
Voltemos mais diretamente para o campo da política. Hannah Arendt critica 
as obras da filosofia política em relação às outras obras dos grandes pensadores, 
inclusive Platão. A falta de profundidade de pensamento na política seria fruto 
da própria falta de profundidade da política. Além do que:
Na segunda parte da obra, Origens do totalitarismo: antissemitismo, imperialismo, tota-
litarismo, a autora aborda o Imperialismo e expõe a crise dos direitos humanos. Neste 
ítem, Arendt disserta sobre a insuficiência dos direitos humanos, pois a vida, defendida 
na declaração dos direitos humanos, conjugada com a idéia de nação, é abstrata, natural, 
biológica. A defesa abstrata da vida foi incapaz de barrar o mal radical, a descartabilidade 
dos homens como seres capazes de pensar e agir. Esse processo inicia-se com a desna-
cionalização, gera um contingente enorme de refugiados e se transforma no leitmotiv do 
domínio total e do extermínio.
Fonte: adaptado de Aguiar (2008, p. 76-77).
explorando Ideias
U
N
IC
ES
U
M
A
R
137
 “ A política trata da convivência entre diferentes. Os homens se orga-
nizam politicamente para certas coisas em comum, essenciais num 
caos absoluto, ou a partir do caos absoluto das diferenças. Enquanto 
os homens organizam corpos políticos sobre a família, em cujo qua-
dro familiar se entendem, o parentesco significa, em diversos graus, 
por um lado aquilo que pode ligar os mais diferentes e por outro 
aquilo pelo qual formas individuais semelhantes podem separar-se 
de novo umas das outras e umas contra as outras. Nessa forma de or-
ganização, a diversidade original tanto é extinta de maneira efetiva 
como também destruída a igualdade essencial de todos os homens. 
A ruína da política em ambos os lados surge do desenvolvimento 
de corpos políticos a partir da família. Aqui já está indicado o que 
se torna simbólico na imagem da Sagrada Família: Deus não criou 
tanto o homem como o fez com a família (ARENDT, 2006, p. 2).
Podemos ver que para a filósofa, as famílias são fundadas como abrigos e, ainda, 
como castelos sólidos em um mundo inóspito e estranho. A filosofia não se limita 
a meramente encontrar o lugar onde a política surge. Em um primeiro momento, 
podemos falar na questão do homem ser um Zoon Politikon, que fala da questão de 
que, no homem poderia haver algo que fizesse com que a política pertencente à sua 
essência. Entretanto, para Arendt, isso não procede. Onde então surgiria a política? 
Essa surgiria entre os homens. Não haveria nenhuma substância política original, 
uma vez que essa surgiria no intra-espaço, estabelecendo-se como relação, e para 
Hannah Arendt, o filósofo Thomas Hobbes teria compreendido bem essa questão. 
A filósofa assinala que se tornaria difícil compreender que devemos ser livres 
de fato num campo, isto é, onde não seríamos movidos nem por nós mesmos, in-
dependentemente do material dado. A tarefa da política é construir um mundo tão 
transparente para a verdade como parece ter sido transparente a criação de Deus.
Arendt assinala que, ao se tentar falar sobre política em sua época, deve-se avaliar 
os preconceitos que todos temos contra a política, e isso pode se dar pelo fato de não 
sermos políticos profissionais. Esses preconceitos seriam comuns, representando 
inclusive algo de político no sentido mais amplo da palavra: “não brotam da soberba 
das pessoas cultas e não são culpados do cinismo delas, que viveram demais e com-
preenderam de menos” (ARENDT, 2006, p. 25). Ela analisa que haveria o risco de a 
política desaparecer do mundo. Os preconceitos se antecipam e é nesse momento 
que se corre o risco de se ‘jogar a criança fora com a água do banho’. Parece haver 
uma confusão acerca daquilo que seria o fim da política com a política em si mesma.
U
N
ID
A
D
E 
4
138
Apesar do preconceito contra a política, os medos quanto à invenção da bom-
ba atômica eliminar a vida na face da terra, incluindo a questão de outros tipos de 
violência, deve haver a esperança de que a humanidade tenha juízo, não chegando 
a tal ponto de extinguir a si mesma. O que deveria ser eliminado parece ser tais 
tipos de política.
Precisaríamos da ação de um governo mundial, quanto à questão colocada 
acima. A máquina administrativa deve ser capaz de por fim a esses conflitos. Os 
exércitos deveriam ser substituídos por tropas policiais. Todavia seria ‘utopia’ 
pensar dessa forma, uma vez que a política expõe em geral uma relação que se 
dá entre dominadores e dominados.
O Totalitarismo
Arendt se interessou por elemen-
tos totalitários do marxismo. Em 
sua obra, As Origens do Totalita-
rismo, ela vem a traçar um perfil 
abrangente dos elementos crista-
lizados no totalitarismo nazista. 
Houve, na época, quem a criticou 
por não dar um tratamento igual à 
questão do bolchevismo.
O isolamento tem a ver com o 
modelo totalitário. O isolamento, para Arendt, é um pré-requisito da tirania e essa 
destruição causa mais destruição ou torna capaz de agir, o que termina por destruir 
a esfera comum. Depois que Hanna Arendt escreveu: “Ideologia e terror: uma nova 
forma de governo”, a filósofa investigou quais seriam os elementos totalitários do 
marxismo. Em outra obra sua, vemos ainda:
 “ A versão definitiva de A Condição Humana, mais que uma resposta 
à pergunta sobre como e porque foi possível o totalitarismo e mais 
que um exame da relação entre totalitarismo e tradição, conver-
teu-se em fenomenologia das atividades humanas fundamentais 
no âmbito da vida ativa - o trabalho, a obra ou fabricação e a ação 
(CORREIA apud ARENDT, 2010, p. 23).
U
N
IC
ES
U
M
A
R
139
Os elementos últimos dessa citação, já nos referimos no início desse trabalho 
sobre Arendt. Posterior às experiências nazista e stalinista, para a filósofa, te-
mos que nos questionar qual seria o significado da política, uma vez que, para 
Arendt, a política preserva o sentido de liberdade, coisa da qual careceram 
detantas pessoas subjugadas por regimes totalitários. Não pode entrar nessa 
definição de política programas que promoveram a desumanização, a eugenia, 
transformando o ser humano num objeto para pesquisa, ou mesmo para des-
cartar por não se enquadrar no estereótipo dito “ideal”.
Seria a política, que fora exercida de modo totalitário, responsável pela trans-
formação da natureza humana, elevando o mal a seu nível mais radical, absoluto 
e imperdoável? Haveria, ainda, a ocultação das ações não políticas, ou mesmo 
antipolíticas? O próprio termo, política totalitária já é por si mesmo contraditório. 
Os regimes totalitários vem, ao longo do tempo, fazendo sua “catequização” 
ou, expressando num termo melhor, sua “politização”, termo que deprecia 
muito o sentido original da boa política. O modo como agem leva as pes-
soas a aprovar as razões liberais? Liberdade e política seriam, de fato, coisas 
incompatíveis? Só haveria política sob os ditames do Estado. Mas Hannah 
Arendt traz esse questionamento. Seria a liberdade uma coisa a-política, ou 
seria, uma liberdade política?
A política teria algum sentido e, mesmo, o que de fato ocorre na política? O 
que acontece é que a perplexidade diante das catástrofes do século XX, conjuga-
da à destruição total, pode possibilitar que a humanidade e toda vida orgânica 
possa ser eliminada. Não se tratava somente de uma decisão poĺitica em uma 
guerra de extermínio, mas acabou mostrando uma certa aversão pela política. 
Parece ter havido uma ilusória extinção da mesma. 
Para Arendt, a “política” levou à desumanização dos indivíduos no campo de 
concentração. O que resultou na extinção do fenômeno humano está incrustado 
nos preconceitos contra, inclusive, as sociedades atuais. Uma vez que a política 
se identifica com a violência, isso faz emergir no seio da sociedade a violência de 
modo desenfreado. Os interesses pessoais, e porque não dizer egoístas e mesqui-
nhos, corrompem e quanto maior o poder dirigido por esses interesses escusos, 
o poder absoluto tem o poder de corromper mais ainda. Se os indivíduos se 
comportam de modo apático e passivo, renunciando à própria cidadania, essa 
condenação do poder seria correspondente a um ‘desejo inarticulado das mas-
sas’, o que tem gerado uma fuga à impotência (TORRES, 2007, p. 236).
U
N
ID
A
D
E 
4
140
O julgamento de Eichmann em Jerusalém 
e a banalidade do mal
Para Hannah Arendt, o tota-
litarismo é a miséria da po-
lítica. Ao tratar da questão 
de Eichmann, ela se espanta 
ao vê-lo se apresentar como 
um tipo assustadoramente 
comum e normal, um zeloso 
cumpridor de ordens, mas que 
tem dificuldade de julgar so-
bre o bem e o mau uma vez 
que julgar o bem e o mau é, 
realmente, necessário.
Eichmann pode ser con-
siderado o maior carrasco 
nazista. As autoridades o en-
contraram e capturaram no 
subúrbio de Buenos Aires 
em 1960, na Argentina, onde 
estava morando, foragido há 
anos. Entretanto seu julga-
mento em Jerusalém, uma cidade judia, foi um marco para a justiça contra 
o que fora feito aos judeus durante o nazismo. Hannah Arendt pediu para 
acompanhar o julgamento, representando a Revista The New Yorker, após, 
relatou os fatos sob uma perspectiva política e filosófica.
Com uma reflexão até hoje atual, Arendt traz à tona o que seria a figura de 
um funcionário mediano, metido com as burocracias e que não tinha capacida-
de de refletir sobre seus próprios atos. E isso poderia representar uma ameaça à 
democracia. Aquele sujeito, atrás da cabine blindada, sempre, representou o papel 
de um funcionário honesto e obediente, sempre pronto a cumprir as metas e a lei. 
Seguindo-se todos os trâmites da lei, Eichmann é processado, defendido e 
julgado, mas algo que intriga fortemente a todos é o fato de que se questiona 
se teriam os judeus, por meio de seus líderes, colaborado com sua própria 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
141
destruição. Quanto a Eichmann, ele não tinha problemas de consciência, obe-
decendo de forma incondicional ao seu líder, Hitler. Era um gigantesco traba-
lho organizacional, onde esse funcionário teria de ‘resolver a questão judaica’. 
 “ Eichmann, quando é ouvido no banco dos réus, tem presente de 
forma muito tranquila em seu discurso que apenas “transportava 
os judeus”, não se sentindo em momento algum o responsável 
pela morte deles. A mediocridade de Eichmann espanta, afinal, 
era incapaz de pensar, de transcender o que representavam seus 
atos e atitudes. Tinha para si apenas o cumprimento de uma ta-
refa, enaltecendo que a sua maior honra era sua lealdade. Nesse 
sentido, encontra-se a banalidade do mal, a que inviabiliza a ca-
pacidade para juízos morais. Trata-se de apenas um burocrata 
zeloso, seguidor de regulamentos, orgulhoso de quando completa 
suas tarefas com êxito, mesmo que essas tarefas sejam encami-
nhar judeus para câmaras de gás, valas de morte ou, ainda, cam-
pos de concentração (KONRAD, 2014, p. 53-54).
Aqui, parece se destacar o sentimento de impunidade que a “guerra” imputa às 
pessoas, que tendo o aval do estado para matar ou ajudar a matar, o fazem sem se 
envolverem com o fato em si. Não há uma preocupação em pensar para distin-
guir o que seja o bem e o mal, o bom e o ruim, acompanhando o julgamento de 
Eichmann e a descrição de seu trabalho de Chefe da Seção de Assuntos Judaicos, 
Arendt constata a alienação moral que se deu por parte dos oficiais nazistas. 
Nem em seu próprio julgamento, muitos anos depois das atrocidades nazistas, 
Eichmann não teria se dado conta das crueldades que cometeu.
Um dos artifícios dos quais se muniam alguns nazistas seria, por exemplo, 
o uso de argumentos, como que eufemismos. Em vez de dizer ‘Que coisas 
horríveis eu fiz com as pessoas’, os assassinos poderiam dizer “Que coisas 
horríveis eu tive de ver na execução dos meus deveres, como essa tarefa pesa 
sobre os meus ombros! ” (ARENDT, 1999, p. 122).
O que Arendt tentou fazer, quanto ao julgamento de Eichmann, não foi 
concordar com o que ele fez, como alguns tentaram acusá-la, mas sim tentar 
entender seu pensamento. Tentar conciliar a mediocridade desse homem com 
seus atos abomináveis. Do que resulta que, ao se esquivar de pensar no que 
fazia, deixava também de elaborar juízos morais. 
U
N
ID
A
D
E 
4
142
Norberto Bobbio nasceu em Turim, na Itália, no dia 18 de outubro de 1909. Filho 
de um renomado médico-cirurgião, teve a oportunidade de frequentar as me-
lhores escolas. Com formação em Direito, especializou-se em Filosofia. Chegou a 
participar de um grupo de oposição ao regime fascista, foi preso em 1935. Bobbio 
participou do Partido de Ação, considerado um grupo de radicais de esquerda. 
Como assinalamos, era contrário ao 
fascismo e, quanto ao comunismo, até 
aceitava dialogar referente aos temas da li-
berdade, justiça social e democracia. Sendo 
inclusive esse último tema o viés pelo qual 
enveredaremos aqui nossa discussão. Bob-
bio teve ainda oportunidade de visitar a 
China de Mao Tsé Tung, decepcionando-se 
quanto ao ‘modelo’ de comunismo viven-
ciado por essa, uma vez que tinha pouco 
a ver com as ideias de Marx e Hegel. Sen-
do assim, não acreditava em um modelo 
de socialismo que não fosse voltado para a 
questão da liberdade. O filósofo faleceu em 
Turim, Itália, no dia 9 de janeiro de 2004.
2 NORBERTO BOBBIO: 
o futuro da Democracia
U
N
IC
ES
U
M
A
R
143
Tendo escrito vários livros ao longo da carreira, destacamos aqui as se-
guintes obras: “Teoria da Ciência Jurídica” (1950), “Política e Cultura” (1955), 
“Teoria das Formas de Governo” (1976), “Qual Socialismo?” (1976), “As Ideo-
logias e o Poder em Crise” (1981), “Estado, Governo e Sociedade - Para uma 
teoria geral da política” (1985), “O Futuro da Democracia” (1986) e as obras-
-primas da literatura moral e autobiográfica: “Tempo de Memória” (1996) e 
“Elogio da Serenidade” (1997). 
A Dicotomia: Público/Privado
Na história social do ocidente pode se falar da divisão entre o que é público e o que 
é privado. Ao longo do tempo, não só as disciplinas jurídicasorganizaram e deli-
mitaram seu campo de investigação dessa forma. Bobbio dá nesse caso, o exemplo 
do campo das ciências sociais, onde tem-se: paz/guerra, democracia/autocracia, 
sociedade/comunidade, estado de natureza/estado civil (BOBBIO, 1997, p. 13).
Outra dicotomia que vem a somar à questão acima é a da sociedade de 
iguais e sociedade de desiguais. Uma vez que o direito é um ordenamento de 
relações sociais: entre iguais e entre desiguais. Qualquer sociedade organiza-
da, e mesmo o Estado, tem em sua esfera pública, seja total ou parcialmente, 
características de subordinação entre governantes e governados, isto é, entre 
quem detém o poder de comandar e aqueles que se destinam a obedecer, 
chegando-se, assim, a uma relação de desiguais. 
Bobbio assinala que em seu tempo, na linguagem política, a expressão ‘so-
ciedade civil’ era empregada geralmente como um dos termos que representa a 
grande dicotomia sociedade civil/Estado. Vejamos a passagem que ‘ilustra’ isso:
 “ Na linguagem política de hoje, a expressão “sociedade civil” é geral-
mente empregada como um dos termos da grande dicotomia socie-
dade civil/Estado. O que quer dizer que não se pode determinar seu 
significado e delimitar sua extensão senão redefinindo simultanea-
mente o termo “Estado” e delimitando a sua extensão. Negativamente, 
por “sociedade civil” entende-se a esfera das relações sociais não re-
guladas pelo Estado, entendido restritivamente e quase sempre tam-
bém polemicamente como o conjunto dos aparatos que num sistema 
social organizado exercem o poder coativo (BOBBIO, 1997, p. 33).
U
N
ID
A
D
E 
4
144
O Estado, apesar de exercer um poder coativo, acaba sendo necessária sua im-
plantação. Na citação anterior, extraída da obra: Estado, Governo, Sociedade - 
Para uma Teoria Geral da Política, Bobbio ressalta que a sociedade civil não 
é a condição ideal, por trazer junto a si os aparatos coativos, integrantes de um 
sistema de controle distante da efetividade ‘positiva’ que o Estado pode fornecer.
 “ Remonta a August Ludwig von Schlozer (1974) - tendo sido conti-
nuamente retomada pela literatura alemã dedicada ao assunto - a 
distinção entre societas civilis sine imperio e societas civilis cum 
imperio, na qual a segunda expressão indica aquilo que na grande 
dicotomia é designado com o termo “Estado”, num contexto em que, 
como se verá depois, ainda não nasceu a contraposição entre socie-
dade e Estado e basta um único termo para designar um e outra, em-
bora com uma distinção interna em espécies. Com a noção restritiva 
do Estado como órgão do poder coativo, que permite a formação e 
assegura a persistência da grande dicotomia, concorre o conjunto 
das ideias que acompanharam o nascimento do mundo burguês: 
a afirmação de direitos naturais que pertencem ao indivíduo e aos 
grupos sociais independentemente do Estado e que como tais limi-
tam e restringem a esfera do poder político (BOBBIO, 1997, p. 33).
Fica posto que antes da formação da sociedade civil, predominava o Estado, sen-
do esse o detentor do poder coativo. Ao se falar em sociedade civil, deve-se falar 
também em Estado. Entretanto, a sociedade civil não seria totalmente regulada 
pelo Estado, uma vez que esse seria, como citamos, uma esfera do poder coativo. 
A Democracia em Norberto Bobbio
A democracia se constitui em um 
dos temas centrais na teoria política 
de Norberto Bobbio. A ideia dele era 
implementar suas ideias democráticas, 
em que ele diz que mesmo o modelo 
de regime democrático mais distante 
do ideal não seria tão ruim como os 
regimes totalitários ou autocráticos. 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
145
Nesse sentido, temos a concepção processual ou teoria das regras constituti-
vas da democracia, que, por sua vez, constituem o que seria a ‘regra do jogo’ nesse 
campo. O autor colocará em cena o debate sobre a democracia representativa e 
a democracia direta, essas formas de democracia não são alternativas ou exclu-
dentes, como poderia pensar alguém que fizesse uma análise básica das mesmas 
nos tempos atuais e, ainda, sobre a relação entre liberdade e igualdade bem como 
suas diferenças. E no texto: ‘O futuro da Democracia’, Bobbio compara os ideais 
democráticos com a situação concreta.
Para que se chegue a um acordo, ao se tratar da democracia como antônimo 
dos governos autocráticos, essa deve ser considerada portadora de um conjunto 
de regras (primárias e fundamentais), que dirão quem irá tomar as decisões co-
letivas e quais os procedimentos a serem adotados. Os grupos sociais têm que, 
obrigatoriamente, tomar decisões vinculatórias para todos os seus membros, 
tendo em vista que seja provida a própria sobrevivência interna e externamente. 
Tais atitudes constituem o que o pensamento democrático bobbiano nomeou de 
‘significado formal de democracia’, que sob a ótica do regime democrático cons-
titui, mais propriamente, um conjunto de regras de procedimento para formar as 
decisões coletivas, das quais os interessados podem participar mais amplamente.
 “ De acordo com Bobbio, é inerente a qualquer regime democrático 
a instituição de normas e leis que regulem o “jogo” das disputas po-
líticas. Com o advento do Estado moderno, passou-se a estabelecer 
previamente em constituições um conjunto de regras que tratassem 
da forma de como o poder político seria disputado e exercido em 
um dado país. Na visão do autor, a existência de tais regras caracte-
riza um regime como “democrático”, visto que num estado “autocrá-
tico” o poder nunca está em disputa, e o povo jamais é chamado para 
tomar alguma decisão. Nesta perspectiva, as “regras do jogo” valem 
como condição da democracia (PEREIRA, 2012, p. 54).
Em um regime autocrático não há necessariamente regras para o jogo, porque 
não se trata de algo justo e participativo. Bobbio reforça as diferenças existentes 
entre as formas de governo democráticas e as formas não democráticas. O regi-
me democrático trata da adoção por parte deste do referido conjunto de regras 
que regulam, de modo antecipado em Lei, quem está autorizado a decidir pelo 
coletivo e de que forma proceder. De acordo com Norberto Bobbio, há regras que 
podem constituir um instrumento diagnóstico para medir o grau da democracia 
U
N
ID
A
D
E 
4
146
dentro dos regimes políticos. Bobbio enumera seis regras que ele classifica como 
‘procedimentos universais’, isto é, normas que podem ser encontradas em qual-
quer regime ao qual se tenham dado o nome de democrático.
 “ 1. Todos os cidadãos que alcançaram a maioridade, sem distinção 
de raça, religião, condição econômica e sexo, devem desfrutar 
dos direitos políticos, ou seja, todos têm o direito de expressar 
sua própria opinião ou de escolher quem a exprima por eles; 2. 
O voto de todos os cidadãos deve ter o mesmo peso; 3. Todas as 
pessoas que desfrutam de direitos políticos devem ser livres para 
poder votar de acordo com sua própria opinião, formada com a 
maior liberdade possível por meio de uma concorrência livre en-
tre grupos políticos organizados, competindo entre si; 4. Devem 
ser livres também no sentido de ter condições de escolher entre 
soluções diferentes, ou seja, entre partidos que têm programas 
diferentes e alternativos; 5. Seja por eleições, seja por decisão 
coletiva, deve valer a regra da maioria numérica, no sentido de 
considerar o candidato eleito ou considerar válida a decisão ob-
tida pelo maior número de votos; 6. Nenhuma decisão tomada 
pela maioria deve limitar os direitos da minoria, particularmente, 
o direito de se tornar, por sua vez, maioria em igualdade de con-
dições (BOVERO, 2010, on-line)5.
São essas as regras importantes para se aplicar à vida política. Entretanto não 
existe para o filósofo aqui abordado, na história, algum regime político que tenha 
conseguido seguí-las todas na plenitude de conteúdo que elas trazem. Haveria 
apenas “graus de aproximação do modelo ideal, por isso é lícito falar de regimes 
mais ou menos democráticos” (BOBBIO, 2000, p. 367). 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
147
Os fundamentos da democraciaPara Norberto Bobbio, a democracia dos antigos e a democracia dos modernos 
tornaram-se assuntos que não podem ser desvinculados dos currículos. Trata-
-se de duas diferenças, a saber, a analítica e a axiológica.
Descritivamente, a democracia dos antigos era entendida como uma demo-
cracia direta, já os modernos como uma democracia representativa. A demo-
cracia traz à mente o dia das eleições, com suas longas filas, em que os cidadãos 
esperam para depositar seu voto na ‘urna’. O filósofo questiona se, a cada queda 
de ditadura, instala-se um regime democrático. O que ocorre é que, na demo-
cracia atual, o voto não é para decidir, mas para eleger quem decidirá.
Na formulação hoje mais corrente, o liberalismo é a doutrina do “Estado mínimo” (o mini-
mal state dos anglo-saxões). Ao contrário dos anarquistas, para quem o Estado é um mal 
absoluto e deve, pois, ser eliminado, para o liberal o Estado é sempre um mal, mas é ne-
cessário, devendo, portanto, ser conservado dentro de limites os mais restritos possíveis.
Fonte: Bobbio (2000, p. 89).
explorando Ideias
Para Bobbio, as dificuldades de se seguir as regras, aqui citadas, podem ser 
verificadas, recorrendo a investigação de um regime democrático concreto. 
Fazendo isso, pode-se verificar o desvio existente entre o que está posto no 
enunciado das regras e o modo como elas são aplicadas na realidade, de modo 
a tornar possível perceber quais são as democracias reais mais democráticas 
e as que são menos democráticas. 
U
N
ID
A
D
E 
4
148
 “ Quando descrevemos o processo de democratização ocorrido ao lon-
go do século XIX nos diferentes países que hoje chamamos de demo-
cráticos, nos referimos à ampliação progressiva, mais rápida ou mais 
lenta segundo os diferentes países, do direito de eleger os representan-
tes, ou então à extensão do processo eleitoral a partes do Estado, como 
a Câmara alta, na qual os membros eram habitualmente nomeados 
pelo soberano. Nada mais. Um dos maiores teóricos da democracia 
moderna, Hans Kelsen, considera elemento essencial da democracia 
real (não da democracia ideal, que não existe em lugar algum) o mé-
todo da seleção dos líderes, ou seja, a eleição (BOBBIO, 2000, p. 372).
Ao povo foi dado o direito de eleger um representante. Citando a afirmação de 
um juiz da Suprema Corte dos Estados Unidos, na ocasião da eleição de 1902, este 
magistrado cita a cabine eleitoral como sendo o ‘templo’ das instituições america-
nas, onde cada eleitor é um sacerdote, para o qual foi confiada a guarda de algo 
sagrado e, portanto, muito importante, como a arca da aliança. 
 “ Para os antigos a imagem da democracia era completamente di-
ferente: falando de democracia eles pensavam em uma praça ou 
então em uma assembleia na qual os cidadãos eram chamados a 
tomar eles mesmos as decisões que lhes diziam respeito. “Demo-
cracia” significava o que a palavra designa literalmente: poder do 
démos, e não como entendido genericamente como hoje, poder dos 
representantes do démos. Se depois o termo démos, entendido ge-
nericamente como a “comunidade de cidadãos”, fosse definido dos 
mais diferentes, ora como os mais, os muitos, a massa, os pobres 
em oposição aos ricos, e portanto se democracia fosse definida ora 
como poder dos mais ou dos muitos, ora como poder do povo 
ou da massa ou dos pobres, não modifica em nada o fato de que o 
poder do povo, dos mais, dos muitos, da massa, ou dos pobres, não 
era aquele de eleger quem deveria decidir por eles, mas de decidir 
eles mesmos, como escreve Moses Finley, “sobre a guerra e a paz, 
as finanças, os tratados, a legislação, as obras públicas, em suma, 
toda a gama de atividades governativas”. Na célebre oração fúnebre 
de Péricles são louvadas as pessoas que se ocupam não apenas de 
seus interesses privados, mas também dos negócios públicos, e são 
censurados como cidadãos inúteis aqueles que não se ocupam dos 
segundos (BOBBIO, 2000, p. 372). 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
149
Podemos observar que a de-
mocracia representativa e a de-
mocracia direta vem do mesmo 
lugar comum, qual seja, da ideia 
de que o poder emana do povo. 
E o envolvimento e comprome-
timento como as coisas públicas 
é ressaltado desde a antiguidade 
como uma coisa louvável. O que 
temos de diferente, nas democracias anteriormente citadas, é o fato de se diversi-
ficarem pelas modalidades e formas com que se exerce tal soberania. Por que as 
duas formas de governo existem? Elas podem coexistir, ou se excluem? Os dois 
sistemas de democracia não precisam, para Bobbio, ser colocados como alterna-
tivos, ou mesmo, excluírem-se, no sentido de que onde um estiver o outro não 
poder estar. Esses dois sistemas podem se integrar reciprocamente. A democracia 
representativa, que Bobbio chama de ‘democracia dos modernos’, está relacionada 
ao pensamento liberal. Ela apregoa a necessidade de se instaurar um ‘Estado de 
Direito’, que garanta as liberdades individuais, a igualdade jurídica frente à lei e o 
direito de participar das decisões políticas de modo democrático. Vejamos como 
o autor faz essa proposição em sua obra: O Futuro da Democracia:
 “ No entanto, mesmo para uma definição mínima de democracia, como 
é a que aceito, não bastam nem a atribuição a um elevado número de 
cidadãos do direito de participar direta ou indiretamente da tomada 
de decisões coletivas, nem a existência de regras de procedimento 
como a da maioria (ou, no limite, da unanimidade). É indispensável 
uma terceira condição: é preciso que aqueles que são chamados a 
decidir ou a eleger os que deverão decidir sejam colocados diante de 
alternativas reais e postos em condição de poder escolher entre uma 
e outra. Para que se realize esta condição é necessário que aos cha-
mados a decidir sejam garantidos os assim denominados direitos de 
liberdade, de opinião, de expressão das próprias opiniões, de reunião, 
de associação, etc. - Os direitos à base dos quais nasceu o estado liberal 
e foi construída a doutrina do estado de direito em sentido forte, isto 
é, do estado que não apenas exerce o poder sub lege, mas o exerce 
dentro de limites derivados do reconhecimento constitucional dos 
direitos “invioláveis” do indivíduo (BOBBIO, 2009, p. 19).
U
N
ID
A
D
E 
4
150
Uma questão complicada é a seguinte: como se poderia instituir um regime demo-
crático em um território tão extenso e populoso, como são os países modernos? 
Devido a isso é que surge a ideia de representação. Disso decorre que os liberais ins-
tituíram o modelo representativo de democracia, em que os representantes tomam 
decisões políticas em seu nome. Ao menos dois pontos têm de ser considerados 
quanto à representação política: os poderes do representante, que é o ‘como’ esse 
representa; e, o conteúdo da representação, que é ‘que coisa’ esse representa. 
Ter representantes de uma classe geral e representantes de uma classe específica, 
como uma classe social, profissional, religiosa etc., pode surtir alguns problemas. 
Para Bobbio, sobretudo as correntes de esquerda dizem que a democracia represen-
tativa não chega a estabelecer um vínculo real entre representantes e representados 
e, assim sendo, não representando em todas as ocasiões a vontade dos que elegeram 
esses representantes. A democracia direta não seria possível na atualidade, devido à 
extensão territorial, ao grande número de habitantes, as questões específicas de cada 
região, a complexidade e a heterogeneidade das sociedades modernas, entre outros 
motivos. Isso não quer dizer que se deva, necessariamente, para o autor, descartar 
os métodos de representação direta. O que se deveria fazer é tentar implementar 
alguns elementos da democracia direta na democracia representativa.
 Todos os cidadãos que alcançaram a maioridade, sem distinção de raça, religião, condi-
ção econômica e sexo, devem desfrutar dos direitos políticos, ou seja, todos têm o direito 
de expressar sua própria opinião ou de escolher quem a exprima por eles.
(Michelangelo Bovero)
pensando juntos
Bobbio acrescenta que, em algunspaíses, já se utilizam de mecanismos previstos 
em lei, para que o povo possa decidir algumas questões diretamente pelo poder 
do voto, sem que algum representante intervenha. Exemplos disso podem ser o 
referendum e as assembleias populares de caráter regional. Isso dito, percebe-se 
que os cidadãos não se contentam mais em participar apenas de eleições para 
escolher seus representantes, mas querem também ampliar o espaço para a to-
mada de decisões políticas que dizem respeito às suas próprias vidas. 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
151
O filósofo John Bordley Rawls nasceu em 21 de fevereiro de 1921, em Baltimore 
(Mariland) e faleceu em 24 de novembro de 2001, em Lexington (Massachusetts), 
aos 81 anos. Desenvolveu sua escrita no sentido de que se compreendesse a teoria 
jurídica contemporânea. Se até o ano de 1971 a política havia parado de estrutu-
rar teorias normativas abrangentes, que pudessem desvendar conceitos relevantes 
para a filosofia moral e do direito, aconte-
ce uma reviravolta, a partir da publicação 
de sua obra Uma Teoria da Justiça. 
Na obra citada, Rawls expõe uma 
visão contratualista da distribuição de 
bens sociais entre as pessoas, de modo 
que não fosse deixado de lado o critério 
de justiça como equidade. Além disso, o 
que poderia fazer um cientista do direi-
to, senão, no máximo, estipular sentidos 
possíveis das normas jurídicas? Do mes-
mo modo que um indivíduo, ao apreciar 
e interpretar uma obra de arte poderia 
perceber e identificar determinados 
traços, sua interpretação diferiria da de 
3 
A SOCIEDADE JUSTA EM
JOHN RAWLS
U
N
ID
A
D
E 
4
152
outra pessoa. Ainda mais, se comparado com um especialista, que com certeza 
consegue ir mais ao fundo, podendo, inclusive, opinar de um modo mais ‘legítimo’. 
Mesmo se tratando do mesmo quadro, o que ‘inibe’ de certa forma a interpretação, 
o leque de questões que poderiam ser discutidas, ainda, seria grande.
A interpretação da norma jurídica seguiria o mesmo percurso. Apesar de 
ficar posta uma ‘moldura’, como um elemento constrangedor das possibilidades 
de interpretação, o julgador pode adotar interpretações diversas, mesmo não 
sendo essas, muitas vezes, previstas pelo julgador, pela doutrina ou ainda na ju-
risprudência. Tudo isso deixaria o juiz livre para decidir da forma que lhe convier, 
pautado em suas próprias concepções de justiça.
Algumas obras de Rawls
De 1980 a 1990, Raws leciona em Harvard. Quanto às suas obras ele se pro-
põe a responder às críticas a sua obra Uma Teoria da Justiça. A partir de sua 
obra: O Liberalismo Político (1993), Rawls aborda a questão do pluralismo 
razoável, que trata da existência de várias visões de mundo diferentes, e de 
sua relação com o consenso de sobreposição, fazendo com que sejam, vez ou 
outra, antagônicas, mas que possam coexistir na sociedade e confirmar um 
determinado consenso político do que seja justiça. Sua obra O Direito dos 
Povos (1999) projeta para as relações internacionais os princípios de justiça 
que seriam escolhidos entre os povos, com referência no liberalismo político 
e no consenso de sobreposição (BRAGA apud FERREIRA; GUANABARA 
e JORGE, 2009, p. 418).
A partir dessas obras, ele combate à desigualdade social e econômica en-
tre as pessoas e entre os povos. Ele trabalha com padrões de compensação 
em nível nacional e internacional. Rawls atualiza a seguinte questão: “Como 
se justifica moralmente os termos sob os quais as pessoas livres e iguais po-
dem viver juntas numa associação política?” (RAMOS, MELO, FRATESCHI, 
2012, p. 261). Para responder a tão profundo questionamento, nosso autor 
traz consigo, resgatados, vários temas clássicos modernos, como: a institu-
cionalização dos direitos humanos, qual o sentido da democracia, as relações 
entre os indivíduos e a comunidade, a conceituação de liberdade e igualdade, 
a separação Estado-Igreja, os limites da tolerância e a relação entre Estado, 
sociedade civil e mercado.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
153
O que fica posto como centro da teoria da justiça de Rawls é, além de 
sua proposição de fundamentação e organização de uma sociedade justa 
que traga à tona a autonomia plena dos indivíduos, sua teoria da justiça se 
evidenciaria pelas mais variadas críticas que teceram outros liberais.
Não é algo tão simples encontrarmos uma base comum de justificação 
de concepção política e pública da teoria da justiça de Rawls, que possam 
preencher os critérios de aceitabilidade racional. Mesmo que se parta das 
concepções de bem, muitos cidadãos não estão de acordo em renunciar às 
concepções de vida boa que constituiu e constitui suas identidades e formas 
de vida cultural.
 “ Nessas circunstâncias, uma teoria da justiça conseguirá apresen-
tar princípios que possam ser compartilhados pelos cidadãos 
como um fundamento comum de acordo político à medida que 
conseguir alcançar um ponto de equilíbrio entre as exigências de 
universalidade - aquilo que todos estariam dispostos a aceitar 
- e as exigências particulares de cada concepção abrangente do 
bem. Essa é a ideia que está no cerne do conceito de overlapping 
consensus: um acordo razoável em torno de princípios de justiça 
e valores políticos com os quais os cidadãos podem se identificar, 
mas por razões diferentes e mantendo suas diferenças de crenças 
e estilos de vida (RAMOS; MELO; FRATESCHI, 2012, p. 281).
A sociedade justa está fundada para Rawls na distribuição de bens e direitos. 
Mas como fazer essa distribuição? Isso deve ser feito por meio de regras e 
princípios formulados. Quais regras e princípios utilizar? Para Rawls, se per-
guntarmos ao rico se o governo deve prestar auxílios como saúde, educação, 
entre outros cuidados aos pobres, esse responderá que não. Cada um que 
cuide de si e de suas coisas! Já o pobre diria que sim, que deve-se tributar 
os bens dos ricos e atender a todos. Devido a tudo isso, Rawls propõe que 
sejam feitos novos contrato social, mas não um contrato nos moldes dos 
contratualistas clássicos.
Esse novo contrato acontece, tirando o sujeito de sua posição social para a 
posição que ele chama de original. Nessa condição, onde ele estará coberto por 
um “véu de ignorância”, ele não saberá quem ele é. Todos devem ter igual liberdade. 
Devem, ainda, ter direito a voto e de participar dos cargos públicos. Todos devem 
ter, em síntese, os direitos civis e políticos, que são os direitos humanos de primeira 
U
N
ID
A
D
E 
4
154
geração. Num segundo momento, Rawls diz que: as desigualdades econômicas são 
legítimas, se: (a) respeitarmos o princípio da diferença, onde as pessoas podem ser 
ricas o quanto elas ‘quiserem’ e puderem, mas quem é pobre tem, por exemplo, di-
reito aos estudos numa boa escola. Desse modo, deve-se respeitar as desigualdades. 
O segundo ponto, (b) a igualdade de oportunidades, como o próprio exemplo ex-
presso no final da letra (a) contempla. Assim, o sujeito pode chegar onde quiser, mas 
sem esquecer que numa sociedade justa os outros devem ter oportunidades iguais. 
Apesar de ser liberal, devido a essas ideias, começaram a pensar que Rawls 
as sustentava pelo fato de ser adepto de uma ‘ética socialista’, ou um ‘comunismo 
disfarçado’.
Seriam os direitos sociais que dariam a igualdade de oportunidades e, pelas 
quais, as desigualdades econômicas seriam suprimidas. O sujeito que não conse-
guisse, nesse formato de sociedade justa, uma boa posição social, seria por culpa 
dele mesmo, pelo fato de não ter se esforçado o tanto que poderia. 
O Liberalismo Político
Podemos perceber que Rawls tem em 
seu liberalismo político uma resposta 
à crítica comunitarista. Com seu libe-
ralismo político, ele reage ao debate 
dos liberais e comunitaristas. Ele pa-
rece não ter mais uma teoria moral 
da justiça, mas sim o que ele chamara 
de concepção de justiça como equi-
dade, mesmo que essa ainda conte-
nha fundamentos morais. Dessa for-
ma, a justiça como equidade é situada 
no interior do liberalismo político. É como uma concepção pública e política da 
justiça. A escolha desses termos nãose dá de forma gratuita, mas com a intenção 
de se ‘diferenciar’ de liberalismos éticos, como os de Stuart Mill e Immanuel Kant. 
As teorias de Rawls visam, ainda, dar um melhor rumo a alguns problemas in-
ternos à justiça, como é o caso da equidade. E quanto a sustentar uma concepção 
política e pública da justiça, há que se pensar princípios que possam ser comparti-
lhados pelos cidadãos. 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
155
O filósofo acaba por introduzir determinadas modificações na forma de interpre-
tar a justiça como equidade. Mesmo que a estratégia adotada para isso mostre, aqui, 
uma forma dupla de justificação em sua obra Uma Teoria da Justiça, ele apresenta o 
artifício de representação da posição original de deliberação, revestido sob o véu da 
ignorância e o recurso ao método por ele chamado de equilíbrio reflexivo.
 “ [...] nas últimas formulações de sua teoria Rawls se inclina mais favora-
velmente para o método do equilíbrio reflexivo e a justificação pública 
(ou o uso público da razão) como instâncias privilegiadas de funda-
mentação de seus princípios de justiça. Como resultado, os princípios 
da justiça passam a ser preferencialmente justificados a partir de uma 
razão prática que reconstrói as intuições morais mais profundas e os 
ideais normativos da eticidade política presentes na cultura política pú-
blica e nas instituições das democracias constitucionais modernas, e que 
aposta na capacidade de os cidadãos encontrarem, mediante a formação 
pública do juízo, um ponto de equilíbrio entre os princípios de justiça e 
esses ideais (RAMOS; MELO; FRATESCHI, 2012, p. 281-282).
A concepção pública e política de Rawls não é metafísica, o que não a faz deixar de 
ser moral. Ela deve ser reconhecida por motivos morais e estratégicos, derivados do 
uso público da razão, como citam Ramos, Melo e Frateschi. 
O PAPEL DA JUSTIÇA
Em sua obra, Teoria da Justiça, Rawls dá o mote necessário para que possamos 
visualizar sua intenção quanto ao que é a justiça e sua abrangência.
U
N
ID
A
D
E 
4
156
 “ A justiça é a primeira virtude das instituições sociais, como a 
verdade o é dos sistemas de pensamento. Embora elegante e 
econômica, uma teoria deve ser rejeitada ou revisada se não é 
verdadeira da mesma forma leis e instituições, por mais eficientes 
e bem organizadas que sejam, devem ser reformadas ou abolidas 
se são injustas. Cada pessoa possui uma inviolabilidade fundada 
na justiça que nem mesmo o bem-estar da sociedade como um 
todo pode ignorar. Por essa razão a justiça nega que a perda da 
liberdade de alguns se justifique por um bem maior partilhado 
por outros. Não permite que os sacrifícios impostos a uns poucos 
tenham menos valor que o total maior das vantagens desfrutadas 
por muitos. Portanto numa sociedade justa as liberdades da cida-
dania igual são consideradas invioláveis; os direitos assegurados 
pela justiça não estão sujeitos à negociação política ou ao cálculo 
de interesses sociais (RAWLS, 1997, p. 3-4). 
A justiça estaria para as instituições sociais, assim como a verdade está para 
os sistemas de pensamento. O que quer dizer que a justiça se constitui em 
um pilar fundamental de toda essa questão da organização da sociedade 
como um todo. Rawls não nega o movimento que há nas teorias e que essas 
tendem e devem mudar conforme sejam ‘inconsistentes’, ou seja, injustas. 
Ao falar que cada pessoa possui uma inviolabilidade fundada na justiça que 
nem mesmo a sociedade pode ignorar, isso dá relevância para o fato de que 
a sociedade como um todo pode progredir, todavia sem ferir os direitos de 
cada indivíduo e sem deixar de dar oportunidades a todos para alcançarem 
seu desenvolvimento e demais conquistas.
A justiça com equidade não é uma doutrina religiosa, filosófica ou moral abrangente que 
se aplique a todos os temas e abarque todos os valores. Doutrinas morais abrangentes 
como, por exemplo, o utilitarismo ou o intuicionismo, possuem um tipo de moral que dita 
o que é “bom” e “mau”. Rawls pretende com a justiça como equidade falar de uma noção 
razoável de justiça, que nos permita mediar a convivência política através do contrato (fa-
zendo acordos mútuos entre as pessoas em iguais condições). Na justiça como equidade 
o conceito do certo vem antes do conceito de bom
(Leonor Gulart Soler)
pensando juntos
U
N
IC
ES
U
M
A
R
157
De nada adianta na construção da sociedade justa, que alguns tenham 
bens para partilhar abundantemente, se isso custar a perda da liberdade de 
outras pessoas, a justiça não está nisso. O esforço de todos deve ser reconheci-
do, sem que se penda para um lado somente as tarefas penosas e para o outro 
vá todas as vantagens e benefícios. Que não haja, portanto, tais diferenças, 
evitando-se a violação da igualdade das liberdades cidadãs. Para o nosso filó-
sofo, o desenvolvimento da política e mesmo os cálculos de interesses sociais, 
não devem passar por cima dos direitos assegurados pela justiça, isso seria 
inegociável.
Desse modo, a única coisa que poderia fazer para que se aceitasse uma teoria 
errônea seria o fato de não se ter uma teoria melhor. Quando então uma injustiça 
poderia ser tolerada? No caso dessa, evitar uma injustiça ainda maior. Rawls vê a 
sociedade como um empreendimento cooperativo, no qual as pessoas enxergam 
vantagens mútuas. Há conflito? Sim, há, mas também pode-se perceber uma 
identidade de interesses. Como isso se dá? É que a cooperação social dá uma 
abertura para que todos possam ter uma vida melhor do que teriam se cada 
membro dependesse apenas de seus próprios esforços.
 “ Há um conflito de interesses porque as pessoas não são indiferentes 
no que se refere ao como os benefícios maiores produzidos pela 
colaboração mútua são distribuídos, pois para perseguir seus fins 
cada um prefere uma participação maior a uma menor. Exige-se um 
conjunto de princípios para escolher entre várias formas de ordena-
ção social que determinam essa divisão de vantagens e para selar um 
acordo sobre as partes distributivas adequadas. Esses princípios são 
os princípios da justiça social: eles fornecem um modo de atribuir 
direitos e deveres nas instituições básicas da sociedade e definem 
a distribuição apropriada dos benefícios e encargos da cooperação 
social (RAWLS, 1997, p. 5).
O ser humano parece ter uma propensão natural para querer crescer e juntar para 
si os frutos dos esforços mútuos, os benefícios do que produziu, conforme estes 
surgem. A justa divisão desses produtos deve se dar por meio de um conjunto 
de ordenamentos, que vise o mais adequado ao grupo. Tais princípios são os que 
Rawls nomeia de: princípios da justiça social, que são os reguladores dos direitos, 
mas também dos deveres que compete a cada um.
U
N
ID
A
D
E 
4
158
Todo esse movimento impresso nas citações de Uma Teoria da Justiça, que 
estamos apresentando, mostra como o filósofo traz à tona o que seria uma so-
ciedade bem-ordenada. Isso não se refere, apenas, ao aspecto do planejamento 
para promover o bem de seus cidadãos como também a uma concepção pública 
de justiça. Em tal sociedade, as pessoas mostram os seguintes aspectos: “(1) 
todos aceitam e sabem que os outros aceitam os mesmos princípios de justiça, 
e (2) as instituições sociais básicas geralmente satisfazem, e geralmente se sabe 
que satisfazem, esses princípios” (RAWLS, 1997, p. 5).
Na busca de uma vida pautada na justiça como equidade, a cooperação 
social se faz elemento necessário para que se possa levar um estilo de vida 
decente. Os cidadãos não são indiferentes ao modo como os benefícios e 
encargos da cooperação serão divididos entre todos. 
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do que disse Hannah Arendt, sobre as experiências nazista e stalinista, 
temos que nos questionar qual seria o significado da política, uma vez que, 
para Arendt, a política preserva o sentido de liberdade. Liberdade essa de que 
mais carecem aspessoas subjugadas por regimes totalitários. Não pode entrar 
nessa definição de política programas que promoveram a desumanização,a 
eugenia, transformando o ser humano num objeto para pesquisa, ou mesmo 
para que o indivíduo seja descartado por não se enquadrar no estereótipo 
dito “ideal”.
Bobbio trata da democracia de forma a podermos perceber que tal tema 
nunca se exaure. Passa pelas relações de poder entre governantes e governa-
dos de modo a que se possa perceber uma inclinação para que se construa 
relações mais acertadas. Saber sobre a democracia é essencial. Isso porque o 
saber e a democracia são coisas complementares, de modo que a democracia 
pode se expressar como procedimento para formar as decisões coletivas, e os 
interessados podem participar de modo amplo.
A questão primordial a ser respondida por Rawls é: como se justifica 
moralmente os termos sob os quais as pessoas livres e iguais podem viver 
associadas? É a justiça e a equidade que permeará uma sociedade organizada, 
desenvolvendo a autonomia dos indivíduos.
159
na prática
1. De acordo com a passagem, a seguir, que estudamos em Hannah Arendt, marcar 
qual é a resposta correta: os regimes totalitários vem, ao longo do tempo, fazendo 
sua “catequização” ou, expressando num termo melhor, sua “politização”, termo 
que deprecia muito o sentido original da boa política. O modo como agem leva as 
pessoas a aprovar as razões liberais? Liberdade e política seriam, de fato, coisas 
incompatíveis? Só haveria política sob os ditames do Estado. Mas Hannah Arendt 
traz esse questionamento. Seria a liberdade uma coisa a-política, ou seria, uma 
liberdade política?
( ) Sempre houve e sempre haverá regimes totalitários, e sempre existirá miséria 
independente de como o governante faça com que a política seja gerida.
( ) Os regimes totalitários passam a imagem de que eles são indispensáveis para 
o progresso e que suas barbáries (disfarçadas de boa política) são a verdadeira 
política que deve ser implantada. 
( ) Estar livre e ser livre seriam a mesma coisa, desde que se deixe implantar o 
totalitarismo.
( ) O totalitarismo é o braço forte de todo regime republicano, o que leva conse-
quentemente à democracia.
2. Uma vez que o direito é um ordenamento de relações sociais: entre iguais e entre 
desiguais. Qualquer sociedade organizada, e mesmo o Estado, tem em sua esfera 
pública, total ou parcialmente, características de subordinação entre governantes 
e governados, isto é, entre quem detém o poder de comandar e aqueles que se 
destinam a obedecer, chegando-se, assim, a uma relação de desiguais. 
O que podemos apreender dessa passagem referente ao conteúdo que estudamos 
em Norberto Bobbio?
160
na prática
3. Nesse texto, retirado da obra de Rawls, Uma Teoria da Justiça, o filósofo trata da ques-
tão da equidade, analisando não só o que uma das partes fará, mas o compromisso 
que deve ser cumprido por todos. Vejamos o trecho que melhor expressa isso: 
Os argumentos a favor do princípio da equidade.
Enquanto há vários princípios do dever natural, todas as obrigações se originam 
do princípio da equidade. [...] Deve-se lembrar que esse princípio afirma que uma 
pessoa tem a obrigação de fazer a sua parte, especificada pelas regras de uma ins-
tituição, desde que tenha aceitado o sistema de benefícios ou se tenha beneficiado 
das oportunidades que a instituição oferece para a promoção de seus interesses, 
supondo-se que essa instituição seja justa ou equitativa, isto é, satisfaça os dois 
princípios da justiça. Como se observou anteriormente, a ideia intuitiva neste ponto é 
que, quando um número de pessoas se envolve num empreendimento cooperativo 
mutuamente vantajoso, seguindo certas regras e assim restringindo voluntariamente 
a própria liberdade, aqueles que se submeteram a essas limitações têm direito a 
uma aceitação, semelhante por parte dos que se beneficiaram com a sua submissão. 
Não devemos lucrar com os esforços cooperativos dos outros sem fazer a parte que 
nos cabe (RAWLS, 1997, p.380 ).
A partir das alternativas seguintes, assinale Verdadeiro (V) ou Falso (F):
( ) Podemos fazer o que bem entendermos para garantir nossa liberdade e isso 
pode ser percebido na teoria de John Rawls.
( ) Não é correto lucrar com os esforços cooperativos dos outros e deixar de fazer 
a parte que compete a nós.
( ) Uma vez que tenha considerado justas as instituições, a pessoa deve, desde 
que “tenha aceitado o sistema de benefícios ou se tenha beneficiado das opor-
tunidades que a instituição oferece”, seguir fazendo sua parte. Não pode ficar, 
somente, recebendo os benefícios que a sociedade lhe fornece, sem retribuir.
161
na prática
4. Ao falar (denunciar) sobre Eichmann, Hannah Arendt quer desmascarar a crueldade 
de quem participou do horror nazista, mesmo que de forma indireta. Como ela vê 
esse cidadão (Eichmann)? Com uma reflexão até hoje atual, Arendt traz à tona o que 
seria a figura de um funcionário mediano, metido com as burocracias e que não 
tinha capacidade de refletir sobre seus próprios atos. Isso poderia representar uma 
ameaça à democracia. O que mais representa a figura de Eichmann?
5. “Duas idéias básicas motivam o Direito dos Povos: [1] a de que os grandes males que 
afligem a história humana tais como guerras injustas, opressões, perseguição religio-
sa, fome, pobreza, genocídios e, dentre outros, privação de liberdade de consciência, 
são decorrentes da injustiça política; [2] que esses males só serão eliminados através 
daquilo que o autor chama de “políticas sociais justas (ou, pelo menos, decentes) e 
instituições básicas justas (ou pelo menos decentes)”. A eliminação desses grandes 
males constitui o que ele chama de “utopia realista” (LIMA, 2011, p. 2). A partir des-
se texto identifique e assinale a letra que corresponde às opções corretas.
I - Por fim, Rawls põe o Direito dos Povos como guia para a política exterior.
II - O objetivo fundamental de Rawls é levar todas as sociedades a honrar o Direito 
dos Povos e se tornarem membros plenos e de boa reputação da sociedade 
dos povos bem-ordenados.
III - Uma das qualidades desejáveis ao homem de Estado deve ser o governo para 
si mesmo.
IV - O direito dos povos passam pelas grandes guerras e essas é que impulsionam 
a sociedade.
Assinale a alternativa correta:
a) Apenas, I e II estão corretas.
b) Apenas, II e III estão corretas.
c) Apenas, I está correta.
d) Apenas, II, III e IV estão corretas.
e) Nenhuma das alternativas está correta.
162
aprimore-se
Deve-se, ainda, diferenciar a desobediência civil da desobediência criminosa. 
Para Arendt (1999, p. 69), “há um abismo de diferença entre o criminoso que 
evita os olhos do público e o contestador civil que toma a lei em suas próprias 
mãos em aberto desafio”. Assim, enquanto o transgressor comum age de modo 
furtivo, visando seu próprio benefício; o contestador civil faz questão de que sua 
ação seja notada, para que assim possa surtir efeitos e, além disso, atua pensan-
do no interesse comum do grupo com o qual se identifica. A distinção entre con-
testador civil e revolucionário (ou militante), defendida por Hannah Arendt, John 
Rawls e Norberto Bobbio, se dá conforme o meio de ação utilizado. Enquanto 
o contestador civil lança mão de manifestações não-violentas, o revolucionário 
tem na violência seu modus operandi. Assim, “enquanto a resistência, ainda que 
não necessariamente violenta, pode chegar até o uso da violência e, de qualquer 
modo, não é incompatível com o uso da violência, a violência do contestador, ao 
contrário, é sempre apenas ideológica” (BOBBIO, 1992, p. 145). Nessa perspecti-
va, John Rawls (1981) defende ainda que o militante se opõe ao sistema político 
como um todo, enquanto o desobediente, por sua vez, aceita a Constituição e o 
sistema vigente, mas se opõe a leis e/ou decisões específicas. Nesse sentido, “o 
militante crê que este sistema ou está profundamente afastado dos princípios 
que prega, ou apresenta uma concepção de justiça totalmente falsa. [...] ele não 
está em sintonia com o senso e justiça da maioria” (RAWLS, 1981, p. 275). O autor163
aprimore-se
complementa essa ideia indicando que, para o militante, a estrutura básica da 
sociedade está “de tal modo afastada dos ideais por ela própria professados, que 
se deve tentar favorecer mudanças radicais, ou mesmo revolucionárias” (RAWLS, 
1981, p. 275). À guisa de conclusão da primeira parte do trabalho, faz-se interes-
sante destacar o entendimento de Hannah Arendt (1999) quanto à importância 
da desobediência civil para as sociedades democráticas. Na visão da autora, por 
terem sido fundadas a partir da união dos indivíduos, as sociedades democrá-
ticas encontram no direito de associação um de seus princípios fundamentais. 
Logo, ao reunirem-se em grupos com identidade de interesses e lançarem mão 
de meios pacíficos a fim de obter uma mudança, seja legislativa ou política, os 
contestadores civis não fogem ao “espírito” democrático, visto que as democra-
cias surgiram desse modo, mas, do contrário, seguem uma tradição essencial-
mente democrática. Ante ao exposto, embora seja difícil a absorção da desobe-
diência civil pelo sistema jurídico, porque não se pode conceber a existência de 
uma lei que permita a violação de outra lei, isso não pode servir de obstáculo 
para que a desobediência civil seja assimilada pelo sistema político, uma vez que 
tal instituto complementa a experiência democrática, indo ao encontro dos prin-
cípios que norteiam essa forma de governo.
Fonte: Lucas, Copetti e Oliveira (2018, p. 73). 
164
eu recomendo!
É Isto um Homem?
Autor: Primo Levi
Editora: Rocco
Sinopse: essa obra traz os relatos da prisão e vivência do judeu 
italiano Primo Levi, no campo de extermínio nazista de Ausch-
witz, em 1944. O autor divide sua experiência sem, no entanto, 
recorrer à autopiedade, apontando as esperanças e/ou desespe-
ranças de cada dia ali passados. Fala ainda da constante humilhação física, como 
a fome permanente, a longa jornada de trabalho. E a tortura psicológica, como a 
incerteza de até quando viveriam e os castigos de ver tantas atrocidades.
livro
Breve História da Justiça
Autor: David Johnston
Editora: WMF Martins Fontes
Sinopse: nesta segunda indicação de obra, trazemos um texto de 
ímpar importância. Um aprofundamento na história da justiça, 
resgatando desde suas origens no direito babilônico e hebraico, 
passando pelo pensamento grego até chegar à modernidade e aos 
textos contemporâneos de Rawls. O trabalho de Johnston consegue aliar discus-
sões filosóficas cruciais a importantes questões contemporâneas sobre a justiça.
livro
Hannah Arendt
Sinopse: alemã de origem judaica, Hannah Arendt (1906 – 1975) 
foi uma filósofa-política do século XX. Ela defendia o conceito de 
pluralismo, liberdade e igualdade no âmbito político. O filme tra-
ta do julgamento de Adolf Eichmann, colaborador do nazismo na 
organização e envio de pessoas, perseguidas na época, ao campo 
de concentração. A autora acompanhou o julgamento, escreven-
do uma série de artigos sobre o caso. Nesse sentido, a filósofa 
criou o conceito de “banalidade do mal”, que gerou controvérsias, devido às inter-
pretações pessoais sobre o assunto. 
filme
https://www.amazon.com.br/s/ref=dp_byline_sr_book_1?ie=UTF8&field-author=David+Johnston&search-alias=books
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
anotações
5
MARX E AS INFLUÊNCIAS DE
SUA TEORIA 
POLÍTICA
PLANO DE ESTUDO 
A seguir, apresentam-se as aulas que você estudará nesta unidade: • Alienação e Ideologia em Karl 
Marx • Antonio Gramsci e o Estado Capitalista • Politicidade em Georg Lukács • Louis Althusser: os 
Aparelhos Ideológicos do Estado • Slavoj Zizek e a questão da liberdade.
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM 
Compreender os conceitos de ideologia e alienação na teoria de Karl Marx • Analisar a relevância da 
sociedade política e a da sociedade civil e a forma como a ideologia permeia tais conceitos • Entender 
o que é a construção ontológica do ser social • Pesquisar a questão da distinção entre o poder do Es-
tado e de seu aparelho repressivo • Perceber como se dá a liberdade de pensamento e liberdade do 
homem frente aos embates econômicos e políticos e da luta de classe.
PROFESSOR 
Esp. Silvanir Aldá
INTRODUÇÃO
Veremos que, para Karl Marx, o homem precisa satisfazer suas ne-
cessidades, indo além do básico. Produz sua subsistência e participa 
da primeira comunidade, a família, para daí avançar na formação das 
classes e produção. Para tanto, o homem tem de lidar com a ideologia 
dominante, que mascara a realidade para explorá-lo, além de sobrepor 
a essa questão o trabalho alienado.
Em seguida, passaremos a trabalhar as teorias de filósofos que foram 
influenciados por Marx. Com Gramsci, a sociedade civil deve continuar 
a se organizar no sentido de superar a hegemonia do Estado, desmisti-
ficando as ideologias, dentro de suas instituições.
Ler Lukács é revisitar a dignidade do ser social, fugindo da decadên-
cia e banalidade da vida. É um reforço à esperança, mesmo em tempos 
tão difíceis. O filósofo falará de uma alienação objetiva, instalada no ser 
social, cujo nome mais adequado a se dar a tal fato é: alienação. Esta 
alienação traduz-se como escravidão. O indivíduo alienado quererá 
apenas manter seus particularismos. Ao deixar de ser massacrado, o 
homem deixa de ser escravo e isso representa um progresso em sua vida.
Com Atlhusser, poderemos perceber que o Estado, na verdade, é 
o Estado da classe dominante. Não é uma questão dele ser público ou 
privado. Veremos, aqui, as forças agentes dentro desse Estado, que são 
os seguintes: Aparato Repressivo do Estado, que ‘trabalha de modo vio-
lento’, e o Aparelho Ideológico de Estado, que opera ‘ideologicamente’.
E, por fim, com Zizek, questionaremos a desigualdade econômica 
vigente. No contraste entre a pobreza e a riqueza extremos sob o olhar de 
quem critica tais diferenças e a questão da aceitação, ou não, da posição 
de quem faz tal crítica. Para essa última, é fato que a ética não passaria 
de um pretexto, uma espécie de maquiagem ou adereço, que poderia, de 
certa forma, dar legitimidade ao intervencionismo militar, que estaria, 
ainda, a serviço de objetivos econômico-políticos específicos. 
U
N
ID
A
D
E 
5
168
1 
ALIENAÇÃO E IDEOLOGIA EM
KARL MARX
Karl Marx nasceu no dia 5 de maio de 1818, em Trier, Renânia, província loca-
lizada ao sul da Prússia. Apesar de ser de família judaico-alemã, ele foi batizado 
na igreja protestante. Após terminado os primeiros estudos, foi para a univer-
sidade de Bonn, engajando-se na época na luta política estudantil, passando 
depois para a universidade de Berlim. Casado com Jenny von Westphalen, ti-
veram sete filhos, o que os fez viver em situação difícil, de modo que quatro 
de seus filhos não sobreviveram. Ele teve ainda um filho fora do casamento, 
com uma empregada socialista. Após a morte da esposa, ele ficara deprimido, 
chegando mesmo a contrair algumas doenças. Veio a falecer no ano de 1883, 
sendo enterrado em Londres.
Atribui-se a Karl Marx a fundação do sistema econômico socialista, tendo 
ainda orientado a criação de sindicatos, para que os proletários pudessem ter 
uma qualidade de vida melhor, ajudando, dessa forma, a eliminar a exploração 
que recaía sobre eles. 
De suas obras, a de maior destaque foi O Capital, onde o filósofo analisa a 
sociedade capitalista e socialista, a cultura, a política e a economia. Escreveu 
ainda: A Questão Judaica, Crítica ao Programa de Gotha, Guerra Civil na 
França. Em parceria com Engels tem obras como O Manifesto do Partido 
Comunista e A Ideologia Alemã.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
169
No momento em que se deu a Revolução de 1848, Marx retornou a Paris, ela-
borando em conjunto com Engels a obra citada, Manifesto do Partido Comunista, 
trouxeram à reflexão o que seriam consideradas ideias fundamentais do que passou 
a ser chamado de sistema marxista. Uma primeira ideia seria sobre as relações 
entre o capital e o trabalho. Tais relações não seriam arbitrárias, mas produtodos 
instrumentos e métodos usados pela produção. E a segunda ideia consistiria em 
sustentar que toda a estrutura social, religiosa, jurídica e política das sociedades são 
mera consequência do fator econômico, isto é, da técnica de produção.
Tempos depois, por volta de 1859, Marx começara a publicar uma obra que 
tratava do seguinte assunto: a crítica da Economia Política. Na introdução, ele re-
toma, porém de modo bem mais claro, duas ideias expostas, anteriormente, em seu 
Manifesto Comunista. Uma abordava o fato de depender da técnica da produção 
as relações entre empregados e empregadores. A outra fazia considerações a toda a 
estrutura política, jurídica e religiosa de um povo, em um momento determinado, e 
como fruto do tipo de organização econômica que este povo atingiu, nessa mesma 
época. Tal doutrina é chamada de materialismo histórico.
O Homem
O homem se diferencia dos animais. Quando fala do homem Marx diz que 
este é ativo, por satisfazer suas necessidades básicas. Ele produz seus meios de 
subsistência. O que importa, inclusive, é sua história real e não especulações 
filosóficas (metafísicas). O animal é passivo. Na relação com os outros, o homem 
forma a família, que é considerada por Marx como a primeira célula social. 
 ■ Divisão social do trabalho: nessa se dá o aparecimento tanto da distribuição 
desigual do trabalho e do produto como a aparição da propriedade privada.
 ■ Formação das classes sociais: com a formação das classes sociais surge a 
consciência de classe. A luta de classe se mostra, maioria das vezes, como a 
luta dos opressores contra os oprimidos. A sociedade capitalista tem duas 
classes definidas pela propriedade privada.
Burguesia e Proletariado
Dona da força de produção 
e do material. 
Vende sua força de trabalho 
para o burguês.
U
N
ID
A
D
E 
5
170
Em sua obra, A Questão Judaica, Marx traz à tona duas questões de extrema 
importância. Uma primeira se refere à crítica da posição baueriana e a segunda 
é sobre a não coincidência entre emancipação política e emancipação humana. 
Para Marx, o que Bauer faz é transformar as questões sociais em questões teoló-
gicas, onde se ter uma emancipação religiosa como algo prévio da emancipação 
política. Bauer não teria percebido o antagonismo que há entre a vida individual 
e coletiva, ele somente combate a expressão religiosa deste conflito.
Em segundo lugar, dá destaque à situação histórica presente: “a não coincidên-
cia entre emancipação política e emancipação humana, por que persiste ainda a 
divisão ou o hiato entre sociedade civil e Estado” (MORÃO, 1999). 
O Conceito de Ideologia
Na Ideologia Alemã, o con-
ceito de ideologia, como o 
próprio Marx e seu com-
panheiro Engels resgatam, 
remonta a Destutt de Tracy, 
em sua obra Elementos de 
Ideologia, de 1801. Para esse 
último autor, a ideologia se-
ria o estudo da origem e da 
formação das ideias.
Vejamos por exemplo a dinâmica do conceito de ideologia: a palavra “Ideologia” pode ser 
pensada etimologicamente como a ciência, ou o estudo, das ideias, e foi precisamente 
com este sentido que ela surgiu pela primeira vez quando, em 1801, logo após a Revolu-
ção Francesa, Antoine Destutt de Tracy, um iluminista liberal, escreveu um livro intitulado 
Eléments d’idéologie [Elementos de Ideologia]. Como um bom iluminista, Tracy estava 
certo de que o avanço das ciências apagaria da face da terra qualquer tipo de ignorância 
ou obscurantismo, e que a submissão de tudo ao crivo da razão consistia em uma arma 
importante para que a humanidade se livrasse das amarras da religião, da tradição e da 
rígida política que marcavam o antigo regime. 
Fonte: Pereira (2016, p. 298-299).
explorando Ideias
U
N
IC
ES
U
M
A
R
171
Para Marx a ideologia pertence ao âmbito do que ele chamou de superestrutura. 
Antes dessa, ainda, vem a estrutura. Vejamos, em que essas teorias consistem.
 ■ Estrutura - é a base material, o modo de produção, que são compostos de 
relações sociais de produção e forças produtivas.
 ■ Superestrutura - Edifício jurídico-político e Fenômenos ideológicos.
Como já assinalamos, para Marx, o homem se diferencia dos animais por esses últi-
mos terem uma postura passiva, enquanto o homem tem uma postura ativa, buscan-
do satisfazer suas necessidades por meio da produção dos meios de subsistência. A 
educação fazia parte da superestrutura de controle, usada pelas classes dominantes. A 
escola veicularia, dessa forma, ideias para a classe trabalhadora (proletários) que cria-
ria uma falsa classe burguesa. O proletariado deveria se libertar dessa visão opressora.
 “ Marx percebeu que a Revolução de 1830, ocorrida na França, havia 
destronado os grandes proprietários de terra e colocado no poder 
a burguesia industrial e os banqueiros, que se aproveitavam da si-
tuação para explorar os operários: além da negação dos direitos 
políticos, aumentavam a jornada de trabalho e diminuíam os sa-
lários. Essa situação, segundo Marx, era propícia para fecundar as 
ideias socialistas e revolucionárias. Foi além das ideias do socialismo 
utópico e demonstrou que o capitalismo deveria ser derrotado pela 
organização e ação direta da classe operária (BOGO, 2005, p. 70). 
Apesar da visão de que a mudança era uma coisa extremamente necessária, cons-
tituía-se um desafio imenso pensar uma forma de fazer as coisas acontecerem. O 
desenvolvimento d’O Manifesto do Partido Comunista ocorreu de modo a dar 
suporte para a classe proletária, em meio às revoluções burguesas, uma vez que 
não se tinha, ainda, bem claro, o que se poderia fazer. Entretanto, tal texto correra 
o mundo, disseminando ideias que elevaram o conhecimento dos revolucioná-
rios, aproximando cada vez mais os trabalhadores.
Marx e Engels organizaram o Manifesto em três partes: 
 ■ Burgueses e proletários.
 ■ Proletários e comunistas.
 ■ Literatura socialista e comunista.
O início dessa obra é deveras marcante: 
U
N
ID
A
D
E 
5
172
 “ Um espectro paira sobre a Europa - o espectro do comunismo. [...] 
Qual partido de oposição não foi acusado de comunismo por seus 
adversários no poder? Que partido de oposição, por sua vez, que não 
lançou contra seus adversários de direita ou de esquerda o epíteto 
infamante de comunista? (MARX; ENGELS, 2007, p. 47)
A princípio, a classe dominante costumava tratar com demérito a classe proletária, em 
nosso caso, hoje, a classe trabalhadora. E quanto aos partidos, Marx e Engels vão mais 
a fundo na questão, dizendo que a esquerda também imputa a marca de comunista à 
classe burguesa. Uma vez que nos perguntemos como andam os proletários em geral, 
o que podemos aferir é que: os comunistas não eram um partido particular em relação 
aos outros partidos operários. O que poderia diferenciar os comunistas dos demais 
proletários seria a questão de que, nas diversas lutas nacionais travadas por esses, o 
que se acentua são os interesses comuns, sejam quais forem suas nacionalidades.
A ideologia para Marx não é algo que seria possível de ocorrer no campo do 
proletariado. Dizer que há uma ‘ideologia proletária’ não seria correto, o povo não 
dissemina suas ideias e nem mesmo força sua implantação uma vez que a classe 
dominante cria determinadas mistificações que não bate com o real papel a ser 
assumido pelo povo, que é o de exterminar tais mistificações. 
Alienação 
Para Karl Marx, a alienação se dá quando o homem se sente alheio ao produto 
de seu trabalho. Temos três formas de alienação:
1. A alienação do trabalhador acerca dos produtos de seu trabalho, porque 
uma vez que termina de realizar o trabalho este não lhe pertence mais.
2. Ato da produção.
3. A respeito do gênero humano.
No trabalho alienado, há um processo de particularização da espécie humana. 
Para Marx, o homem, no que se refere ao conceito de alienação no capitalismo, 
seria alienado pelo fato de que o próprio fruto de seu trabalho não lhe pertence. 
O conceito de alienação em Karl Marx pode ser encontrado em sua obra Ma-
nuscritos Econômico-Filosóficos de 1844. Vejamos como CarlosE. Sell analisa 
ser a alienação para Marx:
U
N
IC
ES
U
M
A
R
173
 “ A alienação significa que a ‘exteriorização’ e objetivação dos bens so-
ciais que resultam do processo de trabalho tornaram-se autônomos e 
independentes do homem, apresentando-se como realidades ‘estranhas’ 
e opostas a ele, como um ser alheio que o domina (SELL, 2013, p. 48).
O homem se torna estranho ao trabalho, isto é, alheio a ele. É o trabalho que 
diferencia o homem do animal e, dessa forma, o homem pode adquirir cul-
tura e dominar a natureza, mas o problema é enfrentar as deformações que 
o capitalismo pode lhe impor, subjugando-o ao lhe impor as mais variadas 
ordens. O que ocorre é que perde-se o processo criativo e mesmo recreativo 
concernente ao que se produz. 
 “ [...] quanto mais a Economia Política reconhece o trabalho como o 
único princípio da riqueza, mais ela degrada e empobrece o traba-
lhador e faz do próprio trabalho uma mercadoria - e está aí tanto 
um axioma teórico necessário à sua ciência quanto uma verdade 
prática da vida social atual. Ademais de a expressão “trabalho acu-
mulado” indicar a origem do capital, significa igualmente que o tra-
balho tornou-se cada vez mais uma coisa, uma mercadoria e que 
progressivamente é concebido apenas sob o aspecto de um capital 
e que progressivamente é concebido apenas sob o aspecto de um 
capital e não como atividade humana (MARX, 2015a, p. 224). 
U
N
ID
A
D
E 
5
174
Referente aos demais homens, a alienação também tem seus efeitos. O capital 
é que regerá as relações entre eles, porque os homens vivem sob a lógica do 
capital. Seu valor será tanto maior quanto mais tiver a capacidade de aumentar 
o capital que lhe for confiado.
Se nos voltarmos para o que foi a indústria na época de Marx, sendo essa o 
setor mais produtivo em termos de capital, poderemos perceber que o capitalis-
mo desenvolveu mecanismos que dessem conta de não atribuir muito valor aos 
homens trabalhadores das fábricas. Assim sendo, o lucro aumentava, concentran-
do-se nas mãos de poucos, que nesse caso eram os burgueses.
 “ Portanto, temos agora que conceber a conexão essencial com o sis-
tema do dinheiro de toda a alienação que é a propriedade privada, a 
ganância, a separação entre trabalho, capital e propriedade da terra, 
entre troca e concorrência, entre valor e desvalorização do homem, 
entre monopólio e concorrência etc.
O trabalhador torna-se tanto mais pobre quanto mais riqueza pro-
duz, quanto mais a sua produção cresce em poder e volume. O tra-
balhador torna-se uma mercadoria tanto mais barata quanto mais 
mercadoria cria. Com a valorização do mundo das coisas, cresce 
a desvalorização do mundo dos homens em proporção direta. O 
trabalho não produz apenas mercadorias; produz-se a si próprio e o 
trabalhador como uma mercadoria, e, a saber, na mesma proporção 
em que produz mercadorias em geral. 
Esse fato exprime apenas que: o objeto que o trabalho produz, 
o seu produto, enfrenta-o como um ser alienado, como um po-
der independente do produtor. O produto do trabalho é o tra-
balho que se fixou num objeto, se coisificou, ele é a objetivação 
do trabalho. A realização do trabalho é a sua objetivação. Essa 
realização do trabalho aparece na situação nacional-econômica 
como desrealização do trabalhador, a objetivação como perda do 
objeto e servidão ao objeto, a apropriação como alienação, como 
exteriorização (MARX, 2015b, p. 303-305).
Para Marx, o capital e a propriedade privada são grandes geradores de alienação. 
Quanto mais o homem se distanciar da produção mais artesanal das coisas, mais 
distante ele ficará de se identificar como o produto. Cada vez mais o objeto ganha 
valor em detrimento do ser humano.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
175
A divisão de tarefas, além de fazer com que o trabalhador não fizesse mais o 
produto por inteiro, o deixava especializado em exercer funções de modo mais au-
tomatizado. Isso pode jogar a favor das pessoas, fisicamente mais frágeis e menos 
hábeis, mas, no geral, vinha a desvalorizar cada trabalhador em relação ao que ele 
produz. Voltar à produção manufaturada não era uma opção, pois não seria possível 
se equiparar aos preços pelos quais a produção industrializada era vendida.
 “ O que caracteriza a divisão do trabalho na fábrica é o fato de o trabalho 
perder aí todo caráter de especialidade. Mas, a partir do momento em 
que cessa todo o desenvolvimento especial, a necessidade de universali-
dade, a tendência a um desenvolvimento integral do indivíduo começa 
a se fazer sentir. A fábrica líquida as especializações e o idiotismo do 
ofício (MARX, 2009, p. 160).
Podemos ver que, para Marx, a especialização causa uma alienação do trabalhador em 
relação ao produto, evento esse que o filósofo nomeará de ‘fetichismo da mercadoria’. O 
salário, por exemplo, quando da produção das coisas em série, deixa de ser algo que se 
possa ‘negociar’, dependendo da submissão/alienação ao ganho ofertado pelo patrão.
 “ Além disso, o produto é propriedade do capitalista, não do produtor 
imediato, o trabalhador. O capitalista paga, por exemplo, o valor diário 
da força de trabalho. Sua utilização, como a de qualquer outra merca-
doria - por exemplo, a de um cavalo que alugou por um dia -, perten-
ce-lhe durante o dia. Ao comprador pertence o uso da mercadoria, e o 
possuidor da força de trabalho apenas cede realmente o valor de uso 
que vendeu, ao ceder seu trabalho. Ao penetrar o trabalhador na oficina 
do capitalista, pertence a este o valor de uso de sua força de trabalho, 
sua utilização, o trabalho. O capitalista compra a força de trabalho e 
incorpora o trabalho, fermento vivo, aos elementos mortos constituti-
vos do produto, os quais também lhe pertencem (MARX, 2014, p. 219). 
No capitalismo, o homem é alienado em seu próprio trabalho, no que concerne 
ao modo de produção, à natureza humana e à sua espécie. No capital, para Marx, 
as relações sociais ficam desajustadas, no sentido de inverter o papel do sujeito 
e do objeto. O homem é visto como objeto e o objeto ocupa o lugar do sujeito. 
Isso é a mercantilização da vida e das relações sociais, uma vez que o homem é 
tomado por completo pelo processo de produção.
U
N
ID
A
D
E 
5
176
A ideia de Marx era disseminar o conceito filosófico de alienação para além 
do campo da filosofia da religião e, para que isso fosse levado a cabo, ele partiu 
do estudo da filosofia política de Hegel. Karl Marx acaba por descobrir que os 
jovens hegelianos caem no mesmo erro que a teologia e a filosofia hegeliana da 
religião cometeram, fazendo com que fossem invertidas a essência e a aparência.
2 ANTÔNIO GRAMSCI
e o Estado Capitalista 
Fonte: Wikipédia ([2020], on-line)6.
O filósofo Antonio Gramsci nasceu em Ales, 
Sardenha, Itália (1891-1937). Foi um dos fun-
dadores do Partido Comunista Italiano em 
1921. De extrema relevância para o debate po-
lítico, Gramsci traz uma relevante contribuição 
ao pensamento acerca do Estado. Pensador de 
viés marxista, sua obra Cadernos do Cárcere 
foi objeto de grandes investigações e, mesmo, 
interpretações controversas. O contexto em que 
ele viveu teria sido marcado pela grande crise 
civilizatória do capitalismo. 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
177
O Estado seria formado por duas instâncias: a sociedade política e a sociedade 
civil. O governo era quem fazia as leis que regulavam a vida das pessoas e as ins-
tituições também contavam com um papel relevante. Para Gramsci, a sociedade 
civil deve se organizar para vencer a hegemonia do Estado no campo das ideias, 
dentro de suas instituições e não como propôs Marx, com a luta de classe.
Teoria do Estado Ampliado
Sociedade Política (Governo) Sociedade Civil (Instituições)
Aparelho repressivo do Estado
- Partidos políticos 
- Mídia 
- Religiões 
- Sindicatos 
A classe dominada, deve ter o seu próprio partido, para defender suas ideias nesse 
campo (contra a ideologia opressora). A mídia não pode ficar somente na mão dos 
dominadores, mas o povo deve ter suas mídias (jornal, rádio, cinema). Ossindi-
catos eram importantes no sentido de organizar os trabalhadores para que esses 
pudessem reivindicar suas demandas, mas eram limitados, à essa lógica da relação 
trabalhador e patrão, ao contrário das instituições que apresentamos antes. A re-
ligião dominante em sua época era a católica. Para ele as pessoas ao ir à Igreja, na 
saída debatiam sobre política. Na passagem a seguir, de seu Cadernos do Cárcere, 
podemos verificar um outro exemplo relacionado à religião:
 “ O público “crê” que o mundo exterior seja objetivamente real, mas pre-
cisamente aqui surge o problema: qual é a origem desta “crença” e que 
valor crítico tem “objetivamente”? De fato, esta crença é de origem reli-
giosa, mesmo se quem dela partilha é religiosamente indiferente. Dado 
que todas as religiões ensinaram e ensinam que o mundo, a natureza, o 
universo, foi criado por Deus antes da criação do homem e, portanto, 
que o homem já encontrou o mundo pronto e acabado, catalogado e 
definido de uma vez por todas, esta crença tornou-se um dado fér-
reo do “senso comum”, vivendo com a mesma solidez ainda quando 
o sentimento religioso está apagado e adormecido. Daí que, portanto, 
fundar-se nesta experiência do senso comum para destruir com a “co-
micidade” a concepção subjetivista é algo que tem uma significação so-
bretudo “reacionária”, de retorno implícito ao sentimento religioso; de 
fato, os escritores e os oradores católicos recorrem ao mesmo meio para 
obter o mesmo efeito de ridículo corrosivo (GRAMSCI, 1999, p. 130).
U
N
ID
A
D
E 
5
178
Para Gramsci, o ideal seria o povo explorado ter sua própria religião, libertan-
do-se de imposições de ideias que atravanquem sua conquista por meio das 
ideias. Em sua época, o modelo liberal já se encontrava saturado, de modo que 
o Estado assumiu funções determinantes na economia. Vendo a dominação da 
burguesia sobre os mais desfavorecidos, ele ajudou a fortalecer a concepção 
de um proletariado atuante, que empunhasse seus valores próprios, ajudando 
a criarem estratégias para evitar serem submissos.
 Surgiram por todas as partes os movimentos que organizaram as classes su-
balternas. Essas classes reivindicavam melhores condições de trabalho e de vida, 
o que representou uma ameaça à burguesia. Para coibir tal ameaça, o Estado vai 
muito além de uma reprimenda, executando ações políticas nesse sentido. 
Cadernos do Cárcere
Gramsci foi preso em 8 de 
novembro de 1926, aos 35 
anos de idade, pelo regi-
me fascista, que por tentar 
combater todo e qualquer 
tipo de divulgação de ideias, 
não aceitou a opção socia-
lista do filósofo que estava 
sendo expressa em uma di-
versidade de materiais. Na época, ele era secretário geral do Partido Comunista da 
Itália e deputado. Ainda desconhecido como escritor, apesar de ter escrito inúmeros 
artigos engajado na imprensa operária, além de outros materiais menores. Após ser 
preso, relata em carta de 19 de março de 1927, à sua cunhada Tatiana Schucht que 
tem um programa de trabalho intelectual a ser desenvolvido no cárcere.
Como já era de se esperar, Gramsci sofreu um grande desgaste, tanto físico 
como moral, durante o longo tempo na prisão. Seus escritos, durante o período 
em que ficou encarcerado, somavam cerca de 2.550 páginas. Infelizmente, ele só 
alcançou o reconhecimento após sua morte, sendo muito discutido no século XX. 
Uma pergunta que intrigava Gramsci, como participante do Partido Comu-
nista, era a seguinte: ‘por que perdemos?’ Sendo esse inquirimento o que o ajudou 
a traçar a linha analítica de seu pensamento. No cárcere, o filósofo era norteado 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
179
por sua mensuração do que era de fato a luta revolucionária.
 “ Para responder tal indagação, Gramsci deu-se conta de que não bastava 
a crise econômica e a organização operária para que o capitalismo fosse 
suplantado: o poder parecia não se circunscrever apenas ao campo eco-
nômico ou à “tomada do Estado”. Gramsci mergulhou em profundas re-
flexões, traçando, de forma pioneira, um “sistema conceitual completo 
para apreender de forma unitária a complexa fenomenologia do poder 
nas sociedades capitalistas contemporâneas” (ACANDA, 2010, p. 172). 
Trilhando um caminho diferente do que era comum encontrarmos em quem 
abordava as teorias de Karl Marx, Gramsci trata do Estado e da política. Tendo 
para tanto, a resistência das correntes do liberalismo e do marxismo economicis-
ta. Relativo ao primeiro, ele contrapõe uma visão classista do Estado burocrático; 
e ao segundo ponto, ele propõe o resgate da abordagem marxista dialética da 
realidade, o que abre o horizonte quanto às reflexões sobre política.
Para Antônio Gramsci, tanto a política como o Estado não podem ser pensados 
como coisas isoladas uma da outra. Apesar das ciências sociais particulares nascen-
tes adotarem essa proposta dentro do período em que ele realiza suas reflexões. De 
acordo com Coutinho, Gramsci parecia considerar que: a produção e a reprodução da 
vida material, implicando a produção e a reprodução das relações sociais globais, é o 
fator ontologicamente primário na explicação da história” (COUTINHO, 1981, p. 88).
A Ideologia
Se questionarmos sobre a 
ideologia, Antônio Gramsci, 
dirá que essa atua de um modo 
positivo, como um cimento 
da estrutura social. Isso se dá 
quando um grupo exerce li-
derança moral e intelectual, 
de modo a unificar uma va-
riedade de aliados, constituindo assim um “bloco” social de forças. Todavia se 
incorporada ao senso comum, chega-se a estabelecer um consenso. 
U
N
ID
A
D
E 
5
180
A ideologia dominante, como diz o filósofo de Ales, procura indicar de modo exato os 
meios pelos quais tais ideias do pensamento dominante se inserem em meio aos opri-
midos, controlando-os. É para isso que se deve instalar uma filosofia da práxis, que dará 
suporte à construção de uma visão crítica das coisas e mostrará uma saída da opressão.
É fato que todas as atividades que são realizadas por grupos sociais podem 
ser ditas pertencentes à ideologia. A ideologia compreende todas as atividades 
humanas, não ficando apenas no campo das ideias, mas exercidas na prática, tanto 
cotidiana quanto científica.
 “ Para Gramsci, somente as “ideologias orgânicas” deviam ser conside-
radas, ou seja, só aquelas vinculadas a uma das classes fundamentais 
da sociedade, no caso do capitalismo, a burguesia e o proletariado. Ele 
estabelece níveis dentro desse todo a que podemos chamar de ideologia 
dominante, ou seja, entre a concepção de mundo “produzida” pelos 
intelectuais orgânicos da classe dominante e as idéias, senso comum, 
das classes subalternas, informadas por aquela concepção de mundo. 
Esta diferenciação em níveis é engendrada pelas contradições objetivas 
inerentes à sociedade dividida em classes sociais antagônicas. Esta con-
tradição é a fonte das constantes fissuras; responsável, em certo sentido, 
pela falta de homogeneidade entre o discurso (sempre ideológico) de 
dominantes e dominados, apesar de esses últimos, no fundamental 
estarem presos nos laços da ideologia burguesa, que os informam 
(BUONICORE, 1991, p. 79).
Podemos perceber que, não é qualquer ideologia que requer que se dispenda esforços 
para compreendê-la. Basta que tão somente víssemos as componentes das instâncias 
mais relevantes da sociedade.
 A ideologia das camadas dirigentes da sociedade seria uma forma de pensamen-
to mais elaborado. Para Gramsci, o povo não conseguiria sair de meros e esparsos 
fragmentos de sua multifacetada cultura. Para Gramsci, a filosofia seria o atingir um 
nível superior da ideologia, com uma estrutura coesa. 
A reflexão gramsciana sobre o social e o político é, portanto, atravessada pelo princípio da 
totalidade, evidenciando que essas duas esferas não são tratadas desvinculadas do fator eco-
nômico, ou seja, da relação entre infra-estrutura e superestrutura.
(Ivete Simionatto).
pensando juntos
U
N
IC
ES
U
M
A
R
181
A função da filosofia, segundo nosso autor, para que se cumpra, necessita de 
estar ligada às classessubalternas, às massas. De modo que, se isso não se der, per-
de-se a sua capacidade de trilhar um caminho político e ideológico. Com Marx, já 
víamos que é quando está inserida na massa que a teoria adquire sua força material.
Para que as pessoas componentes da classe trabalhadora adquirissem uma 
visão que pudesse ser considerada superior, isto é, uma visão filosófica das coisas, 
seria preciso uma filosofia que tivesse a capacidade de unificar e elevar as pessoas 
por meio do que Gramsci chama de filosofia das práxis. 
3 
POLITICIDADE EM 
GEORG LUKÁCS
Georg Lukács nasceu em Budapeste, no dia 13 de abril de 1885. Filho de Adél Wer-
theimer e Jozséf Lukács. Seu pai dirigia a principal instituição bancária da Hungria. 
Desde muito jovem, o filósofo recusou o próprio mundo burguês no qual foi criado. 
Envereda pelo caminho da literatura, deixando aflorar um notável talento para a 
crítica. Tal como Karl Marx, seu grande inspirador, Lukács escreve em periódicos 
progressistas, ora como colaborador desses, ora como fundador. Em 1902, ingressa 
no curso de Jurisprudência da Universidade de Budapest e doutora-se em Leis em 
1906 e em Filosofia em 1909. Uma vez empolgado com a Revolução de Outubro e es-
U
N
ID
A
D
E 
5
182
timulado por E. Szabó, lê Karl Marx, Rosa 
Luxemburgo, Anton Pannekoek e Sorel. 
Em dezembro de 1918, ele se ingressa no 
Partido Comunista da Hungria, engajan-
do-se na política e na teoria revolucioná-
ria. Em março de 1919, foi proclamada a 
República Soviética da Hungria, sendo 
Lukács designado como vice-comissário 
do Povo para a Cultura e a Educação Po-
pular. Em agosto do mesmo ano, as tropas 
fascistas de Horthy atacam, de forma que 
o Partido Comunista é obrigado a atuar 
clandestinamente. Exilado em Viena, é 
condenado preso e condenado à morte 
por Rorthy. Ele só conseguiu escapar des-
sa condenação devido à mobilização de intelectuais alemães, como P. Ersnt, Heinrich 
e Thomas Mann. Sua obra As Teses de Blum, foram publicadas sob pseudônimo, 
numa época em que o autor viveu na clandestinidade. Ele as escreveu por ocasião do 
II Congresso do PC húngaro. Entretanto, uma vez derrotadas suas teses, Lukács se 
desliga da política partidária. Morre em 4 de julho de 1971 (PINASSI; LESSA, 2002).
Lukács foi um dos maiores, senão o maior filósofo marxista. Vivemos até 
certo ponto uma cultura da ‘barbárie’, e nesse sentido, ler esse filósofo, cujo huma-
nismo é o centro de seu pensamento, primando sempre pela defesa da dignidade 
do ser social é evitar cairmos em uma decadência e banalidade da vida. Ele nos 
ajuda a perceber que o que passamos, ainda hoje, quase cinquenta anos depois 
de sua morte, mesmo em tempos tão difíceis, deve haver esperança. Assim sendo, 
o livre desenvolvimento de cada ser humano acaba por se tornar condição para 
o desenvolvimento de todos. Mesmo sendo dono de um pensamento tão fértil, 
os desafios pelos quais o filósofo passou foram muitos.
 “ Condenado pelas ideias contidas em “Literatura e democracia” e “Por 
uma nova cultura magiar”, abre-se a “questão Lukács”, pela qual é acu-
sado interna e internacionalmente como epíteto de “reformista” e “ca-
luniador de Lenin”. Retira-se da vida pública e intensifica seus estudos 
estéticos publicando “Realistas alemães do século XIX” (1951), “Bal-
zac e o realismo francês” (1952).”Breve história da literatura alemã” 
Fonte: Wikipédia ([2020], on-line)7.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
183
e “Contribuições à história da estética, de 1953. Em 1954, publica A 
destruição da razão, obra na qual imprime a ideia de que “nenhuma 
ideologia é inocente”; o critério de sua avaliação do “caminho seguido 
pela Alemanha para chegar a Hitler, no campo da filosofia”, é a pos-
tura favorável ou não à Razão, procedimento que balizaria a crítica 
que faz do irracionalismo de Schelling, Schopenhauer, Kierkegaard, 
Nietzsche, Dilthey, Simmel, Scheller, Heidegger, Jasper, Weber, entre 
outros (PINASSI; LESSA, 2002 , s. p.).
Para Lukács, o pensamento marxiano se mostra como uma novidade que faz 
frente ao edifício teórico erigido por Karl Marx. Teria sido Marx o pensador 
que mais se ocupou da questão da ontologia do ser social.
 “ Na compreensão de Lukács o caráter ontológico do pensamento 
marxiano ficou obscurecido pela rigidez dogmática que conta-
giou quase todas as correntes do marxismo desde a morte de 
Lênin. Sob a influência em parte do stalinismo, em parte do pre-
domínio das questões gnosiológicas e até mesmo neopositivistas, 
tais correntes rechaçaram toda discussão acerca da ontologia, 
qualificando-a de ideológica, idealista ou simplesmente metafí-
sica (FORTES; VAISMAN, 2015, p. 119).
Para Lukács, essa rigidez decorre das reflexões lógico-epistemológicas passarem 
a dominar o cenário da filosofia a partir do século XVII.
Construção Ontológica do ser Social
O que é essa construção ontológica do ser social? 
Desde já, podemos ao menos dizer, para agirmos, de 
um modo mais filosófico-especulativo, o que ela não 
é. Ela não é, por exemplo, uma consequência natural 
dos interesses do autor, mas algo que nos é propos-
to para centralizar suas preocupações e a própria 
emancipação do homem. Para que isso ocorra, de-
ve-se retomar um conjunto de questões, da esfera 
prática e da esfera teórica e repensá-las a partir de 
U
N
ID
A
D
E 
5
184
uma nova perspectiva. O que nos apresentaria de novo essa análise lukacsiana 
acerca do ser social? Ela nos remeteria a problemas relevantes do pensamento 
filosófico, como a ideologia, o estranhamento e, por fim, à política. 
A ideologia para Lukács conferiria tal amplitude à sua determinação, que 
chegaria a seu ápice, ao absorver o tema politicidade para o seu interior. A po-
lítica para o filósofo húngaro se constitui numa forma específica de ideologia.
 “ Lukács se propõe a analisar e desvelar o real sentido do complexo 
na ideologia em Marx, tarefa que o coloca na posição contrária 
à vasta tradição filosófica e do próprio marxismo, quase sempre 
fundados em pressupostos gnosiológicos. O desenvolvimento do 
tema da ideologia em Lukács não está voltado para a elaboração 
de uma teoria do falso – perfil amplamente assumido nos debates 
filosóficos mais importantes acerca da questão –, pelo contrário, 
combatendo exatamente essa perspectiva de caráter gnosiológi-
co, sua análise parte da caracterização da ideologia como veículo 
de conscientização e prévia ideação da prática social dos homens 
(FORTES; VAISMAN, 2015, p. 120). 
Podemos perceber que, não é meramente um ponto de vista verdadeiro ou 
falso que constitui, de modo isolado, uma ideologia. Eles podem, até mesmo, 
tornar-se uma ideologia com o passar do tempo. Deve-se evitar o conflito 
social. Inclusive, a ideologia deve ser entendida como função social, variando 
nos tipos de formação ideal. 
Com vistas a investigar a gênese do ser social, Lukács procura analisar os vínculos e as 
distinções entre o ser meramente orgânico (animal) e o ser social (humano). Nesse caso, 
ele esclarece também que se trata da passagem de um nível de ser a outro, ou seja, de 
um salto ontológico – uma mudança qualitativa e estrutural do ser. Ao contrário da conti-
nuidade normal do desenvolvimento, o salto consiste essencialmente em uma ruptura. A 
gênese do ser social pressupõe a superação qualitativa da vida orgânica, um processo de 
extrema lentidão, mas que não deixa de ser um salto.
Fonte: Duayer; Escurra; Siqueira (2013, p. 19).
explorando Ideias
U
N
IC
ES
U
M
A
R
185
Para Lukács, pode-se entender a ideologia como função social. São ideias diver-
sificadas, que se formam a partir da organização que cada indivíduo faz de suas 
ações e reações ao mundo, visando conscientizar e considerar a forma de resolver 
os conflitos da práxis social.
Progresso e Alienação
Para Lukács, o fato do desenvolvimento social não ser teleológico é de extrema re-
levância, uma vez que se queira verificar qual a verdadeira natureza do fenômeno 
da alienação. Se pudesse haver um desenvolvimento teleológico global objetivo, 
issodescartaria a possibilidade de que existisse aí um caráter de desigualdade.
Olhando do ponto de vista do ser social, os momentos progressivos, que 
se dão necessários e objetivamente articulados entre si, vêm mostrar desi-
gualdades, não somente pela força das coisas em sua sucessão, mas também 
relativas às suas bases. O que ocorre é que este tipo de coisa se manifesta no 
que é chamado de primeira grande alienação objetiva e se encontra no ser 
social. Essa alienação é a escravidão.
A alienação deixa que os indivíduos mantenham, meramente, seus particu-
larismos. Esse seria o segundo salto ontológico do gênero humano. Ao deixar 
de ser massacrado, passam a não ser mais escravos, o que caracteriza um certo 
progresso. Já o sujeito de uma contradição, por mais bárbara que essa pareça, é, 
nesse momento, necessária e concorre inevitavelmente para o progresso que é 
possível para se desenvolver.
O Capitalismo e a Politicidade
Como se apresenta o capitalismo frente ao pensamento de Lukács e à politicida-
de? A intensidade com que aparece o capitalismo é de uma intensidade que, até, 
não fora vista. Ressalta-se, aqui, uma contraditoriedade, difícil de ser sanada. As 
influências econômicas atuam aí, de modo a transformar a sociedade de forma 
diversificada. Aqui, a alienação pode aparecer, ainda, de uma forma matizada, 
oprimindo a personalidade dos homens de todos os lados.
U
N
ID
A
D
E 
5
186
Lukács, ao redescobrir o pensamento marxiano, traz a seguinte novidade, frente 
ao amplo trabalho teórico erigido pelas postulações teóricas de Karl Marx. Pri-
meiro, afirma-se originalmente que não houve ninguém que se ocupou mais do 
que o próprio Marx da ontologia do ser social. As correntes do marxismo foram 
obscurecidas pela rigidez dogmática que a ‘contagiou’, desde a morte de Lênin.
 “ Sob a influência em parte do stalinismo, em parte do predomínio das 
questões gnosiológicas e até mesmo neopositivistas, tais correntes re-
chaçaram toda discussão acerca da ontologia, qualificando-a de ideoló-
gica, idealista ou simplesmente metafísica. Na verdade, como o próprio 
Lukács sugere, esta rigidez nada mais é do que a resultante específica 
das reflexões lógico-epistemológicas que passaram a dominar o cená-
rio da filosofia a partir do séc. XVII (FORTES; VAISMAN, 2015, p. 119).
Levando em conta que as relações sociais capitalistas são permeadas de coisas 
complexas, para que seja possível que o sujeito se auto-liberte do estado de alie-
nação, em que é pressuposto estar, esse deve mostrar uma inteligência crítica, 
mais avançada que a de épocas atrás.
Isso não quer dizer que a luta seja do interior da pessoa, de modo isolado. Não 
se trata também de um impulso libertador da individualidade das tendências que 
se mostram alienadoras da sociabilidade. Dessa forma, deve-se superar a própria 
alienação, mesmo que essa se apresente de modo autônomo e, portanto, diferente 
do que seja a luta social contra o próprio fenômeno social da alienação. Há, ainda, 
aqui, uma forte determinação histórico-social.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
187
Para Lukács o papel, a que se presta a ideologia burguesa, é exatamente o de 
não entender a contrariedade do progresso, tal como ele de fato se constitui, 
isto é, ele tem o caráter intrínseco a todo movimento que a sociedade realiza 
no sentido de seguir em frente.
 “ A relação entre a consciência de classe e a história é, por con-
seguinte, uma nos tempos pré-capitalistas e outra na época ca-
pitalista. Nos tempos pré-capitalistas, as classes não podiam ser 
destacadas da realidade histórica imediatamente dada a não ser 
por intermédio da interpretação da história elaborada pelo mate-
rialismo histórico. Enquanto hoje as classes são essa própria rea-
lidade imediata, histórica. Não é, pois, de modo algum um acaso 
- como já ressaltava Engels - que esse conhecimento só se tornou 
possível na época do capitalismo. E isso não somente em razão da 
simplicidade maior dessa estrutura em comparação com as “co-
nexões complicadas e ocultas” dos tempos passados, como pensa 
Engels, mas, antes de tudo, porque o interesse econômico de classe, 
como motor da história, só apareceu em toda a sua pureza com 
o advento do capitalismo. As verdadeiras “forças motrizes” que 
“estão por trás dos móveis dos homens que atuam na história “ ja-
mais poderiam alcançar a consciência (mesmo como consciência 
simplesmente adjudicada) nos tempos pré-capitalistas. Permane-
cem, na verdade, ocultas por trás dos móveis como forças cegas 
da evolução histórica. Os momentos ideológicos não “acobertam” 
somente os interesses econômicos, não são somente as bandeiras 
e as palavras-de-ordem de combate. São parte integrante e os pró-
prios elementos da luta real (LUKÁCS, 1960, p. 11-12). 
Com a ajuda do materialismo histórico, esse sentido sociológico é pesqui-
sado, revelando momentos de exploração contundente. E a diferença disso 
para a época capitalista, os momentos econômicos não se fazem ocultos, mas 
sim presentes na própria consciência. Enfim, a partir do desaparecimento 
da estrutura estamentária que se deu com o capitalismo, constitui-se uma 
sociedade de articulações estritamente econômicas e a consciência de classe 
alcança condições de se tornar consciente.
U
N
ID
A
D
E 
5
188
Louis Althusser nasceu em 
1918, na Birmandreis, Argélia 
(colônia francesa na época), 
vindo a falecer em 1990, em 
La Verrière, França. Comunis-
ta e filósofo francês, estudou 
na École Normale Supérieure 
em Paris. Teve influência do 
racionalismo e do estruturalis-
mo francês. Ao estudar a obra 
de Karl Marx, identificou um 
corte radical entre os escritos 
do ‘jovem Marx’ em relação ao 
‘Marx da maturidade’ e, a favor 
do último, sustentou o marxis-
mo como ciência, enfatizando seu anti-humanismo. Suas obras Pour Marx (Para 
Marx - 1965) e, com Étienne Balibar, Lire Le Capital (Ler o Capital - 1966) lhe 
renderam um público vasto, embora fosse um público frequentemente crítico.
4 LOUIS ALTHUSSER:
os aparelhos ideológicos 
do estado
https://www.google.com/search?client=ubuntu&hs=Ckf&channel=fs&sxsrf=ACYBGNQ0hUi1TOc02afF-6hHlIkg4FS1LQ:1572874516915&q=louis+althusser+&stick=H4sIAAAAAAAAAOPgE-LQz9U3yDYzM1XiArGMC9OTc5K05LOTrfQLUvMLclL1U1KTUxOLU1PiC1KLivPzrFIyU1MWsQrk5JdmFisk5pRklBYXpxYpAACOZFaQTAAAAA&sa=X&ved=2ahUKEwiFpO2W1tDlAhVlIrkGHWgjDAoQmxMoATAPegQIDRAL&biw=1920&bih=931
U
N
IC
ES
U
M
A
R
189
Aparelho Ideológico de Estado Escolar e a Ideologia 
A escola também tem seu papel político e ideológico, e também o tem a luta de 
classes, travada com maior ou menor intensidade no interior dela (da escola), 
podendo ser feitas de modo que se recupere a concepção de ideologia em geral, 
do autor e de forma a compreendê-lo no campo do AIE - Aparelho Ideológico 
de Estado escolar e da própria escola.
 “ Marx e Engels, no “Manifesto do Partido Comunista”, ao responder às 
críticas da burguesia à proposta de educação dos comunistas, apontam 
a relação da educação e da escola como instrumento de reprodução das 
relações sociais, afirmam os autores: “Mas, dizeis, suprimimos as rela-
ções mais íntimas ao substituirmos a educação doméstica pela social. E 
não está também a vossa educação determinada pela sociedade? Pelas 
relações sociais em que educais, pela intromissão mais directa ou mais 
indirecta da sociedade, por meio da escola, etc? Os comunistas não in-
ventaram a acção da sociedade sobre a educação; apenas transformam 
o seu caráter, arrancam a educação à influência da classe dominante” 
(MARX; ENGELSapud COUTINHO, 1998, p. 50-51).
Uma vez que a tese sobre a ideologia em geral se aplica de forma direta a uma 
ideologia considerada revolucionária, parece haver aí uma abertura. A concep-
ção althusseriana de ideologia em geral traz três teses. Primeira: a ideologia é uma 
representação da relação imaginária dos indivíduos com suas condições reais de 
existência. Segunda: “a ideologia tem uma existência material”. E a terceira apregoa 
que: a ideologia vem interpelar os indivíduos enquanto sujeitos, o quea leva a ser 
pensada a partir do AIE escolar e de suas instituições e da luta ideológica. E isso 
ocorre, inclusive, como uma forma de luta de classes, travada entre a ideologia 
dominante e a ideologia subordinada, que encontramos no interior do Aparelho 
Ideológico de Estado Escolar.
Althusser concebe o marxismo como uma ciência da sociedade. Sua produção concentra-
-se na tarefa de desenvolver essa ciência que, seguindo a tradição, ele denomina materia-
lismo histórico. [...] Ora, se o materialismo histórico é uma ciência da sociedade ele deve, 
como toda ciência, ser desenvolvida, submetida à prova e renovada.
(Armando Boito Júnior)
pensando juntos
U
N
ID
A
D
E 
5
190
A primeira e a segunda teses, também, possibilitam que se pense a ideologia, 
no campo escolar, como práticas sociais. Tais práticas, englobam as formações 
sociais capitalistas que representam relações de exploração, e tais relações de 
exploração pressupõem uma relação de dominação, em que segmentos domi-
nados podem tomar para si o trabalho de reverter a correlação de forças, tanto 
no interior das escolas, como do próprio AIE escolar.
Observando melhor a segunda tese, pode-se inferir que a existência de ideo-
logias subordinadas podem ser vistas no interior das escolas e também do AIE 
escolar, é a existência da participação de indivíduos em práticas tão diferentes que 
não tem a ver com as relações que são reproduzidas dessas relações de produção 
dominante, que pode contribuir na luta ideológica (que, por sua vez, é a própria 
luta de classes), que busca uma nova hegemonia, tanto no interior da escola com 
também do Estado. E a terceira tese, da ideologia, interpelar os indivíduos en-
quanto sujeitos, esse supõe haver um Sujeito que possa interpelar, e do sujeito 
interpelado e constituído, a partir do reconhecimento que se tem. 
O Estado e seus aparelhos ideológicos
Quando fala em teoria do Estado, Althusser leva em conta que não se deve fazer 
apenas uma distinção entre o poder do Estado e de seu aparelho, mas assinalar que 
há, por outro lado, o dispositivo do Estado que podemos traduzir como aparelho re-
pressivo. A tal formulação, o filósofo dará o nome de aparelho ideológico do estado. 
A ideia aqui é não confundir aparelho ideológico de estado com aparato 
estatal (repressivo):
 ■ O aparelho de Estado, que pode ser definido pela sigla (AE) se refere 
a: Governo, Administração, Exército, Polícia, Tribunais, Prisões etc., e o 
aparato estatal, que é a parte repressiva, vem a indicar que o aparelho do 
estado age com violência, ao menos no que diz respeito aos seus limites 
e, principalmente, quando a repressão toma formas não físicas.
 ■ Os Aparelhos Ideológicos do Estado se encontram espalhados por todas as 
partes da sociedade. Vejamos as instituições nas quais podemos percebê-los.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
191
• Família.
• Escola (o sistema de diferentes “Escolas”, públicas e privadas).
• Religião (o sistema das diferentes igrejas).
• O AIE legal.
• O AIE político (o sistema político, incluindo os diferentes partidos).
• O AIE sindicato.
• Cultural (Letras, Belas Artes, Esportes etc.).
• O AIE de informação (imprensa, rádio-TV etc.).
Como já frisamos anteriormente, tomemos cuidado para não confundir Apare-
lhos Ideológicos do Estado (também identificado com a sigla AIE), com o aparato 
de estado. Mas o que distingue um do outro? O aparato estatal pertence ao domí-
nio público, enquanto a maioria dos aparatos ideológicos do Estado pertencem ao 
domínio privado. E esses particulares seriam as igrejas, festas, sindicatos, famílias, 
algumas escolas, a maioria dos jornais, empresas culturais, entre outros.
 “ [...] agir por leis e decretos no Aparelho (repressivo) de Estado 
e “agir” por intermédio da ideologia dominante nos Aparelhos 
ideológicos de Estado são duas coisas diferentes. Será preciso 
entrar no pormenor desta diferença, - mas ela não poderá es-
conder a realidade de uma profunda identidade. A partir do que 
sabemos, nenhuma classe pode duravelmente deter o poder de 
Estado sem exercer simultaneamente a sua hegemonia sobre e 
nos Aparelhos Ideológicos de Estado. Dou um único exemplo 
e prova: a preocupação lancinante de Lenine de revolucionar o 
Aparelho ideológico de Estado escolar (entre outros) para permi-
tir ao proletariado soviético, que tinha tomado o poder de Esta-
do, assegurar o futuro da ditadura do proletariado e a passagem 
ao socialismo (ALTHUSSER, 1970, p. 48-49).
O filósofo Gramsci, por exemplo, já observara que a distinção entre direito públi-
co e direito privado é uma distinção que reside no interior das ideias burguesas 
e em seu modo de exercer o poder. 
U
N
ID
A
D
E 
5
192
Para Althusser, o Estado é o Estado da classe dominante, e não público ou 
privado, mas a distinção do mesmo entre o público e o privado. Enquanto o 
Aparato Repressivo do Estado ‘trabalha de modo violento’, o Aparelho Ideo-
lógico de Estado opera ‘ideologicamente’.
 “ É porque, por sua conta, o aparelho de Estado (repressivo) opera 
de maneira maciçamente preponderante na repressão, (incluindo 
física), enquanto trabalha secundariamente a ideologia. (Não há 
dispositivo puramente repressivo.) Exemplos: O Exército e a Po-
lícia também funcionam ideologicamente, tanto para garantir a 
sua própria coesão e reprodução, e pelos “valores” que oferecem 
fora (ALTHUSSER, 1970, s. p.).
A diversidade com a qual operam os AIE, tendem a prevalecer de modo ma-
ciço sobre a ideologia. A princípio podemos considerar que a classe domi-
nante é que detém o poder estatal, tendo nas mãos todo o aparato repressivo. 
Uma coisa é agirmos por leis e decretos no aparelho de Estado (repressivo) e 
outra, diferente, é ‘agir’ por intermédio da ideologia dominante nos aparatos 
ideológicos do Estado.
Dessa forma, podemos concluir que a teoria marxista clássica do estado 
pode encerrar em si e a distinguir o poder do Estado (e o que esse contém), 
por um lado, e por outro, o dispositivo estatal. Qual seria, então, a medida 
exata do papel do aparelho ideológico estatal?
 “ Os aparatos estatais funcionam tanto na repressão como na ideo-
logia, com a diferença de que o aparelho de estado (repressivo) 
opera de maneira maciça e prevalecente na repressão, enquanto 
os estados ideológicos operam de maneira maciçamente predo-
minante na ideologia (ALTHUSSER, 1970, s. p.).
Os aparatos estatais acabam considerando que o aparelho de Estado (repres-
sivo) vem a constituir um todo organizado, e que os membros desses são 
centralizados sob uma forma de comando. De modo que a política de luta 
de classe é imposta pelos representantes políticos da classe dominante que 
detêm o poder do Estado. 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
193
O filósofo Slavoj Zizek nasceu em 
Liubliana, Eslovênia em 1949. Sua for-
mação é influenciada pela escola Laca-
niana da Eslovênia. Ele é testemunha 
ativa da queda do regime socialista na 
Iugoslávia. Analisou os interesses capi-
talistas, nos mercados recém-abertos, 
bem como a onda de democratização 
capitalista que se passou nos países do 
Leste Europeu, nas décadas de 80 e 90.
Algumas obras
Na obra de Zizek, Bem-vindo ao deserto do real! O que podemos encontrar 
é uma coletânea que reúne cinco ensaios, neles o autor aborda os aconte-
cimentos de 11 de setembro, analisando suas consequências. Em Alguém 
disse totalitarismo? Cinco intervenções no (mau) uso de uma noção, Slavoj 
Zizek trata da questão do totalitarismo. Sem cair em uma exegese repetitiva, 
o filósofo analisa, inclusive, os mais candentes impasses ideológicos do pre-
5 SLAVOJ ZIZEK E A
questão da liberdade
http://brasil.elpais.com/tag/slavoj_zizek/a
U
N
ID
A
D
E 
5
194
sente. Ele não apresenta uma análise política das estruturas de exceção, o que 
envolveria a administração totalitária, mas defende que a própria noção de 
“totalitarismo”, longe de ser um conceito teórico efetivo, é essencialmente um 
tapa-buraco. Para Zizek, o totalitarismo não possibilita o pensamento, antes, 
desobriga-nos de pensar, ou o que é pior, impede-nosativamente de pensar.
Ideologia da Liberdade de 
Expressão na Democracia
Em seus questionamentos, podemos verificar, por exemplo: haveria uma ideo-
logia da liberdade de expressão na democracia, ‘na forma como ela é pensada 
no ocidente liberal’? Não é meramente uma questão de enxergar no Outro as 
coisas que não podem ser toleradas, mas de ver o que é intolerável, no Outro, 
refletir e espelhar as coisas que são intoleráveis em nós mesmos.
O filósofo questiona o porquê de continuarmos a ver tanta desigualdade 
econômica. Ainda hoje, há um contraste entre a extrema pobreza e a extrema 
riqueza. E nisso está presente um julgamento intolerante sobre aqueles que 
não toleram esta diferença: são taxados como fanáticos. Essa intolerância ‘se 
converte’ em uma noção política fundamental.
 “ Entretanto, não será a questão fundamental de Hegel e de Lacan, 
ao menos na leitura de Zizek, a de pensar este impossível? Não 
no sentido, é claro, de uma perspectiva do Saber Absoluto como 
o agente que poderia antecipar a marcha da história, mas no sen-
tido de apontar o bloqueio inerente ao presente que constitui, 
ao mesmo tempo, a condição de sua ultrapassagem (SOBRINO; 
TUBINAMBÁ, 2015, s. p.).
Poderia o discurso de Slavoj Zizek influenciar a política e a filosofia futuras? 
O que vemos em Hegel, por exemplo, é que seria impossível saltarmos sobre o 
tempo presente, uma vez que a filosofia, sempre, é produto do tempo histórico 
em que ela é realizada. 
U
N
IC
ES
U
M
A
R
195
A Ética e a Política do Real
Zizek firmou-se como um grande interlocutor nos debates acerca do destino 
do pensamento político de esquerda. Marxista assumido, ele demonstra grande 
preocupação com um proletariado que se sente desestimulado. Sua forma de 
pensar o lançou como “guia” dos cultural studies norte-americanos, apontando 
uma via de pensamento da cultura contemporânea que parece se afastar da 
doxa pós-moderna. 
O filósofo esloveno não defende o velho comunismo, sua ideia é que se em-
preenda em um novo comunitarismo globalista. E se nos perguntarmos quais 
serão os novos desafios, ele afirma que são a ecologia, a renovação do Estado do 
bem-estar e a prevenção da “guerra digital cognitiva”.
O filósofo Slavoj Zizek 
parece discutir no senti-
do de uma politização da 
ética, visando desmistifi-
car uma visão ética que 
é meramente idealista e 
até certo ponto abstrata, 
em uma tentativa de que 
o pensamento ético se 
aproxime, ou melhor, in-
vada a política. Isso acar-
retaria na transformação 
do pensamento em ação 
concreta, o que daria destaque à coerência (que parece inexistir na atualidade) 
entre discurso e ação de fato. É aí que surgiria o que podemos chamar de “ética 
do real”, em detrimento de uma ética meramente abstrata e que pareça estar 
fora do alcance do sujeito.
É importante alertarmos quanto ao risco de se cair no vazio ético, que é algo 
que marca a política e, principalmente, a geopolítica internacional. Para essa úl-
tima, é fato que a ética não passaria de um pretexto, uma espécie de maquiagem 
ou adereço, que poderia, de certa forma, dar legitimidade ao intervencionismo 
militar, que estaria ainda, a serviço de objetivos econômico-políticos específicos. 
Qual seria, então, a proposta zizekiana? A retomada do real ideia de política, de 
modo que essa realizasse sua junção com a ética.
U
N
ID
A
D
E 
5
196
Quanto ao que foi dito anteriormente, é plausível que concordemos com 
Zizek. O que é passível de se verificar nas ações políticas, seja qual tendências te-
nham (de esquerda, direita ou mais de centro), trata-se de embates ‘enlouquecidos’ 
para se conquistar e manter o poder. Muitos podem afirmar que a essência da 
Política consiste em uma visão pragmática e realista, mas isso deve ser direcio-
nado de modo a incorporar essa luta natural pelo poder, da qual se incorporaria 
a Política com os parâmetros fornecidos pela ética, sob pena de converter toda a 
atuação Política em cinismo.
Crítica à “igualdade formal” e 
ao princípio da liberdade
Zizek, mesmo não se referindo propriamente a Evgeni Pachukanis (1891 – 1937), 
apresenta uma nítida aproximação com a ideologia desse autor. Slavoj Zizek se 
volta para a questão da igualdade, legalmente e constitucionalmente, estabelecida. 
E onde isso se dá? Nos Estados Democráticos de Direito, isso seria como que uma 
equivalência da ‘forma-mercadoria’, isto é, algo possível de ser tocado no mercado, 
e que é passível de ser utilizado como parâmetro de comparação. 
 “ A igualdade nada mais seria do que uma “equivalência entre indivíduos 
livres intercambiáveis” a propiciar a negociação da força de trabalho. 
Acontece que para Zizek, tal como para Pachukanis, essa suposta igual-
dade e consequente liberdade na troca da força de trabalho pelo salário 
é apenas e tão somente aparente, refletindo, na verdade, uma forma de 
dominação de classes em que os donos do capital impõem sua vontade, 
deixando ao trabalhador um campo de liberdade muito restrito, o que 
implica em uma desigualdade de condições material, inobstante a igual-
dade formal prevista na legislação (CABETTE, 2014,on-line, p. 23)8.
U
N
IC
ES
U
M
A
R
197
O que Zizek faz aqui é o que fez o jurista soviético Evgeni Bronislávovich 
Pachukanis (1891-1937) e causou uma revolução na teoria geral do direito, 
tendo tal teoria uma forte conotação do ponto de vista das ideias marxis-
tas. Ele denuncia uma igualdade formal e legal de sujeitos que interagem no 
mercado, e essa igualdade formal seria uma camuflagem que viria a ocultar 
a real exploração desse binômio ‘capital - trabalho’. Para Zizek, o direito se 
apresentaria como uma superestrutura (referência a Marx), em que, dentre 
outras coisas, sustentaria a infraestrutura mercantil e econômica da sociedade 
capitalista.
A privação de liberdade econômica vem a implicar em caso de privação 
de liberdade social, do mesmo modo que a privação de liberdade social ou 
política acarreta a privação da liberdade econômica. Quando denuncia que 
uma liberdade formal e legal não corresponde, necessariamente, a uma li-
berdade material ou real, ele (Zizek) tem razão, e tal correspondência vem a 
implicar uma desigualdade material, o que se contrapõe à igualdade formal 
enquanto direito fundamental, que encontramos nas várias constituições de 
Estados de Direito Democráticos. 
Ainda, a esse respeito, podemos ver, por exemplo, em Bobbio que a questão 
ou problema fundamental acerca dos direitos do homem, ainda hoje, não é 
necessariamente o de justificá-los, mas de protegê-los. Isso se refere não a 
um problema filosófico, mas a um problema de ordem política. Dessa forma, 
esses problemas, como foram colocados a Zizek e também a Pachukanis, são 
de ordem marxista. De forma mais atenuada em Zizek, no que se refere ao 
questionamento sobre qual seria o modelo de garantia dessa liberdade e igual-
dade material. O modelo político e econômico, surgido da ideologia marxista, 
não assegurou a prosperidade econômica nem a liberdade política e social. 
Podemos perceber que obtém-se disso, no máximo, uma igualdade ni-
velada muito por baixo. É claro que isso não foi feito para todos, mas para 
um grande número de pessoas com uma casta governamental que detinha 
mais privilégios do que propriamente as elites capitalistas. Uma vez gerada a 
dúvida, quanto à possibilidade de ascensão de outras classes, onde essas entra-
ram numa imobilidade social, o marxismo parece ter caído numa descrença, 
quanto a sua viabilidade nos aspectos político e econômico.
U
N
ID
A
D
E 
5
198
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como pudemos ver, apesar da polêmica que se faz em torno do pensamento 
de Marx, ele tem uma preocupação com a classe menos abastada (proletários). 
Se sua (de Marx) ideologia de mudança parece, por vezes, exacerbada em sua 
“utopia”, há por outro lado a geração e contribuição de seu pensamento, com 
elementos como o conceito de alienação e de ideologia. Um fator importante 
a ser ressaltado é que a ideologia nunca vem do proletariado, mas sempre das 
classesdominantes, sendo a mesma que, além de propagar suas ideias, tenta 
implantá-las.
No seu desenvolvimento, o ser humano tem de lidar com as ordens rece-
bidas, horários a cumprir e objetivos da empresa a atingir, uma alienação que 
parece não ter fim. A rotina parece tomar conta do dia a dia do proletariado. 
Ele é controlado; não detém mais o domínio da produção; tem que obedecer 
ao capitalismo, que longe de se preocupar com o desenvolvimento do homem 
por inteiro, quer implementar a lógica da produção: venda (escoação da 
produção) e lucro.
É nessa esteira que pudemos tratar aqui de filósofos que foram, até certa 
medida, seguidores de Marx, como Gramsci e sua tentativa de superar a he-
gemonia do Estado, revendo suas ideologias. Lukács e o resgate da dignidade 
do ser social. A crítica de Althusser sobre o Estado, que não passa de um 
Estado da classe dominante. Estado esse que vem munido com seus Aparatos 
Repressivos e Ideológicos. E a questão dos contrastes econômicos, com Zizek, 
e a aceitabilidade da crítica social.
A herança que nos foi deixada por Karl Marx tem sido elemento de muitas 
reflexões, dissabores e mesmo vitórias no campo das ideias e na análise do 
real. Amado e aclamado por muitos, odiado e evitado por outros, o filósofo 
transpôs a fronteira da “comodidade” para lançar a semente da discussão sobre 
um tema de relevância inquestionável: a exploração do trabalho.
199
na prática
1. Para Marx, o capital e a propriedade privada são grandes geradores de alienação. 
Quanto mais o homem se distanciar da produção artesanal das coisas, mais dis-
tante ele ficará de se identificar como o produto. Cada vez mais o objeto ganha 
valor em detrimento do ser humano. Quais as respostas corretas, relativas à 
passagem acima?
a) Para Marx, todo homem que tem um trabalho manual está em vantagem em 
relação aos que tem somente um trabalho intelectual.
b) A propriedade privada causa a retenção de bens nas mãos de poucos, de forma 
a excluir parte da população de seus benefícios.
c) Para Marx, sempre houve e sempre haverá pobres e miséria, independente-
mente de como o governante realiza sua administração.
d) Não fazer um produto por inteiro faz com que o homem não se identifique com 
ele, e Karl Marx dá nome a isso de alienação.
e) Com os novos processos de produção, o foco na produtividade e os procedi-
mentos industrializados têm afastado, cada vez mais, o homem do produto 
que ele ajuda a fabricar.
2. Podemos perceber que não é, meramente, um ponto de vista verdadeiro ou falso 
que constitui, de modo isolado, uma ideologia. Eles podem, até mesmo, tornar 
uma ideologia com o passar do tempo. Deve-se evitar o conflito social. Inclusive, a 
ideologia deve ser entendida como função social, variando nos tipos de formação 
ideal. Como podemos interpretar essa passagem de Lukács?
3. Marxista assumido, Zizek demonstra grande preocupação com um proletariado 
que se sente desestimulado. Sua forma de pensar o lançou como “guia” dos cul-
tural studies norte-americanos, apontando uma via de pensamento da cultura 
contemporânea que parece se afastar da doxa pós-moderna. O filósofo esloveno 
não defende o velho comunismo, sua ideia é que se empreenda um novo comuni-
tarismo globalista. E se nos perguntarmos quais serão os novos desafios, ele afirma 
que são a ecologia, a renovação do Estado do bem-estar e a prevenção da “guerra 
digital cognitiva”. Dito isto e levando em conta o que estudamos da teoria de 
Zizek, assinale Verdadeiro (V) ou Falso (F):
200
na prática
( ) Um comunismo à moda da China (em sua época de alge comunista) seria a 
melhor resposta aos problemas da sociedade.
( ) Explorado como é ainda hoje, o trabalhador (proletariado) se sente desesti-
mulado diante de uma ausência de possibilidade de mudança ou de reação à 
opressão sofrida.
( ) O liberalismo atua na formação do Estado, de forma a sustentar uma mudança 
positiva em todos os lugares em que é implantado.
( ) A preocupação de Zizek com questões, como a ecologia, bem-estar, entre ou-
tros, dá-se pela forma crítica (para não dizer ruim) como a política está sendo 
conduzida, de modo a relegar ao esquecimento tais coisas relevantes.
4. Partindo do texto de Gramsci, analise as opções corretas: a classe dominada, 
deve ter o seu próprio partido, para defender suas ideias nesse campo (contra a 
ideologia opressora). A mídia não pode ficar somente na mão dos dominadores, 
mas o povo deve ter suas mídias (jornal, rádio, cinema etc.). Os sindicatos eram 
importantes no sentido de organizar os trabalhadores para que esses pudessem 
reivindicar suas demandas, mas eram limitados apenas à essa lógica da relação 
trabalhador e patrão, ao contrário das instituições que apresentamos antes. A 
religião dominante em sua época era a católica. Para ele, as pessoas ao ir à Igreja, 
na saída, debatiam sobre política.
I - Tratando da política exterior, Gramsci deseja a implantação de um modelo 
oligárquico.
II - Ter parte da mídia ajudaria a se defender da ideologia opressora.
III - Apesar das críticas que se faz aos sindicatos na atualidade, e mesmo na época 
de Gramsci, esses tinham sua validade, no sentido de ajudar os trabalhador es 
a reivindicarem suas demandas.
IV - O filósofo, aqui abordado, não ressalta na passagem citada a importância da 
religião, mas o fato das pessoas irem à igreja contribuiria para que elas deba-
tessem sobre política após prestarem culto. 
201
na prática
Assinale a alternativa correta:
a) Apenas, I e II estão corretas.
b) Apenas, II e III estão corretas.
c) Apenas, I está correta.
d) Apenas, II, III e IV estão corretas.
e) Nenhuma das alternativas está correta.
5. Texto sobre a teoria de Althusser: uma vez que a tese sobre a ideologia em geral 
se aplica de forma direta a uma ideologia considerada revolucionária, parece haver 
aí uma abertura. A concepção althusseriana de ideologia em geral traz três teses. 
Primeira: a ideologia é uma representação da relação imaginária dos indivíduos 
com suas condições reais de existência. Segunda: "a ideologia tem uma existên-
cia material". E a terceira apregoa que: a ideologia vem interpelar os indivíduos 
enquanto sujeitos, o que a leva a ser pensada a partir do AIE escolar e de suas 
instituições e da luta ideológica.
Assinale Verdadeiro (V) ou Falso (F):
( ) A ideologia de Althusser de forma geral se aplica indiretamente de uma forma 
não revolucionária.
( ) A terceira tese da ideologia interpela os indivíduos enquanto sujeitos, fato que 
pode ser pensado a partir do AIE escolar de suas instituições.
( ) Podemos verificar que a segunda tese sobre a ideologia ressalta que essa tem 
um caráter material.
( ) Na primeira tese da ideologia, o que prevalece é uma relação não imaginária 
dos indivíduos com as formas de governo.
202
aprimore-se
No exercício de entendimento sobre o funcionamento e o papel da ideologia, 
Marx e Engels defendem que não é correto partir daquilo que os homens di-
zem, pensam ou imaginam, nem mesmo daquilo que remete ao significado das 
palavras, da imaginação ou dos pensamentos para chegar até a constituição 
em carne e osso dos homens, deve-se partir dos homens, da atividade real. 
É neste sistema de vida que é possível compreender o desenvolvimento dos 
reflexos e das repercussões ideológicas presentes no processo vital (MARX & 
ENGELS, 1998). A teoria desenvolvida por estes autores influenciou o pensa-
mento político e filosófico de Antônio Gramsci. Contudo, Gramsci desenvolve 
argumentos que vão além do que foi formulado por Marx e Engels sobre a 
caracterização do conceito de ideologia. Para Gramsci, a ideologia deveria ser 
tratada mais positivamente do que negativamente. Marx e Engels localizavam 
a ideologia no nível da “supraestrutura”, e, desta forma, deveria ser analisada 
de forma crítica. Estas construções supraestruturais possuem a capacidade de 
combinar elementos de conhecimento e expressões prejudiciais à universali-
dade do conhecimento. A ideologia, no sentido emque é dado a palavra por 
Marx e Engels, passa a representar, no nível da supraestrutura, um fator de 
equívocos, ou, segundo Gramsci, um elemento de erro (KONDER, 2002). [...] 
Lukács afirma que, na maioria das vezes, e mesmo no interior de uma tradição 
intelectual que pode ser caracterizada como marxista, a ideologia está contra-
posta à ciência. Começando com algumas citações da obra A Ideologia Alemã, 
o fenômeno ideológico é comparado com uma câmara escura que possui a 
capacidade de inverter a realidade, escondendo assim as contradições sociais 
entre os homens ao mesmo tempo em que legitima as relações de exploração 
e dominação (LESSA, 1997). A ideia de que a ideologia seria responsável pela 
criação de uma penumbra no interior da qual estaria escondida a realidade das 
contradições sociais, permitindo que as classes dominantes reproduzissem a 
dominação e a exploração está implícita nas alegações de Lukács. Retornando 
a discussão sobre a distinção entre ciência e ideologia, Lukács afirma que não 
é a função social que determina o papel efetivo jogado na processualidade so-
cial, mas sim o conteúdo, que é mais ou menos verdadeiro dos conhecimentos, 
203
aprimore-se
o elemento responsável pela distinção entre ciência e ideologia. Admitindo a 
ideologia como função socialmente estabelecida, Lukács rompe com esta con-
cepção, “postula que uma conquista da ciência, que nada tenha em si de ideo-
lógica, pode, em dadas condições, se converter ou não, em seguida da mesma 
forma que uma dada ideologia” (LESSA, 1997, p.49). Diferente de Lukács, que 
afirma que a ideologia é um elemento pertinente à materialidade como tal, que 
emerge das atividades dos indivíduos, o fetichismo da mercadoria, etc., Althus-
ser argumenta que o exterior institucionalizado, que é capaz de subjugar e re-
gular a vida social dos indivíduos, através dos Aparelhos Ideológicos do Estado 
(AIEs) representa o agente superior externo que organiza a sociedade (ŽIŽEK, 
1996). Para Althusser, os AIEs indicam a existência material da ideologia através 
das práticas, dos rituais, regras e instituições ideológicas (ALTHUSSER, 1983). 
Uma teoria das ideologias, segundo o autor, estaria situada na história das for-
mações sociais, e, desta forma, naqueles modos de produção combinados nes-
tas diversas formações, repercutindo também nas lutas de classe que acabam 
se desenvolvendo nelas. Apresentando um projeto de teoria da ideologia em 
geral, nas quais outras teorias da ideologia dependem, Althusser defende que a 
ideologia não tem história (ALTHUSSER, 1983), visto que está é “eterna, onipre-
sente, sob a sua forma imutável, em toda a história, a história das formações 
sociais de classe” (ALTHUSSER, 1983, p.85).
No exercício de entendimento sobre o funcionamento e o papel da ideolo-
gia, Marx e Engels defendem que não é correto partir daquilo que os homens 
dizem, pensam ou imaginam, nem mesmo daquilo que remete ao significado 
das palavras, da imaginação ou dos pensamentos para chegar até a constitui-
ção em carne e osso dos homens, deve-se partir dos homens, da atividade real. 
É neste sistema de vida que é possível compreender o desenvolvimento dos 
reflexos e das repercussões ideológicas presentes no processo vital (MARX & 
ENGELS, 1998). A teoria desenvolvida por estes autores influenciou o pensa-
mento político e filosófico de Antônio Gramsci. Contudo, Gramsci desenvolve 
argumentos que vão além do que foi formulado por Marx e Engels sobre a 
caracterização do conceito de ideologia. Para Gramsci, a ideologia deveria ser 
204
aprimore-se
tratada mais positivamente do que negativamente. Marx e Engels localizavam 
a ideologia no nível da “supraestrutura”, e, desta forma, deveria ser analisa-
da de forma crítica. Estas construções supraestruturais possuem a capacidade 
de combinar elementos de conhecimento e expressões prejudiciais à univer-
salidade do conhecimento. A ideologia, no sentido em que é dado a palavra 
por Marx e Engels, passa a representar, no nível da supraestrutura, um fator 
de equívocos, ou, segundo Gramsci, um elemento de erro (KONDER, 2002). No 
exercício de entendimento sobre o funcionamento e o papel da ideologia, Marx 
e Engels defendem que não é correto partir daquilo que os homens dizem, 
pensam ou imaginam, nem mesmo daquilo que remete ao significado das pa-
lavras, da imaginação ou dos pensamentos para chegar até a constituição em 
carne e osso dos homens, deve-se partir dos homens, da atividade real. É neste 
sistema de vida que é possível compreender o desenvolvimento dos reflexos 
e das repercussões ideológicas presentes no processo vital (MARX & ENGELS, 
1998). A teoria desenvolvida por estes autores influenciou o pensamento polí-
tico e filosófico de Antônio Gramsci. Contudo, Gramsci desenvolve argumentos 
que vão além do que foi formulado por Marx e Engels sobre a caracterização 
do conceito de ideologia. Para Gramsci, a ideologia deveria ser tratada mais 
positivamente do que negativamente. Marx e Engels localizavam a ideologia 
no nível da “supraestrutura”, e, desta forma, deveria ser analisada de forma 
crítica. Estas construções supraestruturais possuem a capacidade de combinar 
elementos de conhecimento e expressões prejudiciais à universalidade do co-
nhecimento. A ideologia, no sentido em que é dado a palavra por Marx e Engels, 
passa a representar, no nível da supraestrutura, um fator de equívocos, ou, 
segundo Gramsci, um elemento de erro (KONDER, 2002). 
Fonte: Gonçalves (2015, p. 4-8).
205
eu recomendo!
A Ideologia Alemã
Autores: Karl Marx e Friedrich Engels
Editora: Boi Tempo
Sinopse: a ideologia alemã é a obra filosófica mais importante de 
Marx e Engels. Sendo elaborada entre os anos de 1845-1846, é 
uma exposição estruturada da concepção materialista da história 
bem como o texto principal desses autores, no que se refere à reli-
gião. Na obra, os filósofos promovem, ainda, um acerto de contas com a filosofia de 
seu tempo e com a obra de Hegel e os chamados hegelianos, entre eles Feuerbach.
livro
Marxismo e teoria da literatura
Autor: Georg Lukács
Editora: Civilização Brasileira
Sinopse: os temas abordados nesta obra são os mais variados. Esse 
livro contém um exame das ideias estéticas de Engels bem como 
uma abordagem da teoria marxiana da decadência ideológica e os 
seus reflexos na literatura. E ,para finalizar, Lukács apresenta algu-
mas das principais determinações desenvolvidas pelo realismo.
livro
 “O Jovem Marx”
Ano: 2000
Sinopse: esse filme retrata a época da juventude de Karl Marx e as 
primeiras mobilizações realizadas por ele e Friedrich Engels. Já aos 
26 anos, Marx e sua esposa são exilados. Ele irá conhecer Engels 
somente em 1844, em Paris. Esse último investigou o nascimento 
da classe trabalhadora britânica, complementando a nova visão de 
mundo de Marx, o que gerou várias obras escritas em parceria.
filme
https://www.google.com.br/search?hl=pt-BR&tbo=p&tbm=bks&q=inauthor:%22Gy%C3%B6rgy+Luk%C3%A1cs%22
206
conclusão geral
conclusão geral
206
conclusão geral
conclusão geral
Olá, querido(a) aluno(a)! Chegamos ao término do nosso estudo, mas, na verdade, 
este é só o começo. Os filósofos que conhecemos, aqui, são o ponto de partida para 
que possamos estruturar bem a sociedade em que vivemos, aperfeiçoando e imple-
mentando a forma de governo mais adequada.
Com Aristóteles, havia uma busca pelos direitos mínimos que deveríamos garantir 
aos cidadãos, para que esses pudessem evitar os trabalhos manuais e se voltar à 
contemplação. O estagirita falou de um tipo de governo específico para cada tipo de 
povo. Depois, com Cícero, tivemos o resgate do amor pátrio, no qual o homem tem 
de se esforçar para fundar o Estado. 
Avançando até Maquiavel, expusemos o verdadeiro objetivo de sua obra, livrando o 
filósofo de interpretações derivadas de leituras apressadas de sua teoria. O filósofo 
florentino objetivava, mais exatamente, responder à instabilidade políticana qual se 
encontrava a Itália em que ele viveu, ensinando, ainda, como um príncipe deve agir 
para se manter no poder. Sua obra traz um outro objetivo nobre: alertar a popula-
ção de sua época sobre os exageros que podem ser cometidos pelo príncipe.
Com as teorias dos filósofos contratualistas, pudemos perceber certos níveis de ins-
tabilidade no estado de natureza, mais hostil na visão de Hobbes, e com um agra-
vante: o medo do sujeito de habitar um lugar, onde “o homem pode ser o lobo do 
homem”. De um modo mais abrandado na teoria de Locke, com seu liberalismo, e 
chegando em Rousseau, a ser um estado ideal para se educar a criança e o jovem 
(ao menos até os 25 anos de idade).
207
conclusão geral
conclusão geral
Arendt mostrou uma política voltada para uma crítica aos elementos componentes 
dos regimes totalitários e Nazista. Já Bobbio trouxe à tona a preocupação com a 
questão democrática, deixando mais claro a diferença entre a democracia direta e 
a democracia representativa. Inclusive afirmou que a pior democracia consegue ser 
melhor do que qualquer regime totalitário. Rawls ressignificou o liberalismo, traba-
lhando a noção de justiça com equidade.
Assim, fechamos a última unidade com o polêmico Karl Marx, destacando as impli-
cações envolvidas em seu conceito de trabalho alienado e de ideologia comunista, 
que, por sua vez, “assusta” tantas pessoas. Um filósofo de marca maior, como foi 
Karl Marx, não poderia deixar de ter uma legião de seguidores. Como dissemos 
anteriormente, seria difícil nomear e explanar a teoria de todos eles numa obra que 
é, de certa forma, não muito extensa, desse modo, expusemos alguns dos mais 
relevantes: Antonio Gramsci e a questão do Estado Capitalista; Georg Lukács e o 
conceito de politicidade e a dignidade do ser social; Louis Althusser e os Aparelhos 
Ideológicos do Estado e, por fim, a questão da liberdade, em Slavoj Zizek.
referências
208
ACANDA, J. L. Gramsci. Recife, jan. 2010. [Notas de aula].
AGUIAR, O. A. A tipificação do totalitarismo segundo Hannah Arendt. Dois pontos, Curitiba; 
São Carlos, v. 5, n. 2, p.73-88, out. 2008.
ALDÁ, S. As Provas da Existência de Deus Segundo os Filósofos. Maringá: Pensador, 2018.
ALTHUSSER, L. Ideologia e Aparelhos ideológicos do Estado. Queluz de Baixo: Presença, 
1980.
AMES, J. L. Filosofia Política: Reflexões. Curitiba: Protexto, 2012.
ARENDT, H. Eichmann em Jerusalém: um relato sobre a banalidade do mal. São Paulo: Com-
panhia das Letras, 1999.
ARENDT, H. O Que é Política? Tradução de Reinaldo Guarany. 6. ed. Rio de Janeiro: Bertrand 
Brasil, 2006.
ARENDT, H. A condição Humana. Tradução de Roberto Raposo. Rio de Janeiro: Forense Uni-
versitária, 2010.
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Nova Cultural, 1996.
ARISTÓTELES. Política. Tradução de Mário da Gama Kury. Brasília: UnB, 1997.
ARISTÓTELES. Retórica. São Paulo: Edipro, 2013.
BELINI, L. A. A justiça na República de Platão. Sarandi: Humanitas Vivens, 2009.
BERNARDO, I. P. Política e História em Cícero: do Conhecimento da Natureza à Ação Política. 
2018. Tese (Doutorado em filosofia) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Uni-
versidade de São Paulo, São Paulo, 2018.
BOBBIO, N. A Teoria das Formas de Governo. Tradução de Sérgio Bath. Brasília: UnB, 1985.
BOBBIO, N. Thomas Hobbes. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 
1991.
BOBBIO, N. Estado, Governo, Sociedade: para uma Teoria Geral da Política. Tradução de 
Marco Aurélio Nogueira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.
BOBBIO, N. Liberalismo e Democracia. São Paulo: Brasiliense, 1998.
BOBBIO, N. Teoria Geral da Política: a Filosofia e as Lições dos Clássicos. Tradução de Daniela 
Beccaccia Versiani. Rio de Janeiro: Elsevier, 2000.
BOBBIO, N. O Futuro da Democracia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2009.
referências
209
BOGO, A. Teoria da Organização Política: Escritos de Engels, Marx, Lênin, Rosa, Mao. São 
Paulo: Expressão Popular, 2005.
BOITO JÚNIOR, A. Indicações para o estudo do marxismo de Althusser. In: PINHEIRO, J. (org.) 
Ler Althusser. Marília: Oficina Universitária; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2016.
BORGES NETO, A. História Política em Maquiavel: Istore Fiorentine. Seara Filosófica, Pelotas, 
n. 12, p. 1-15, 2016.
BUONICORE, A. C. Ideologia e Hegemonia na Obra de Gramsci. Revista Princípios, São Paulo, 
n. 21, edição especial, p. 79-85, maio/jul. 1991.
CAMARGO, L. P. Sobre a Condição Humana no Pensamento de Hannah Arendt e Karl Marx. 
Griot Revista de Filosofia, Amargosa, v. 8, n. 2, p. 190-200, dez. 2013.
CHABOD, F. Escritos sobre Maquiavel. Tradução para o espanhol de Rodrigo Ruza. México: 
Fundo de Cultura Económica, 1984.
CHEVALLIER, J.-J. As grandes obras políticas de Maquiavel a nossos dias. Tradução de Lydia 
Cristina. Rio de Janeiro: AGIR, 1999.
CÍCERO, M. T. Da República. Tradução de Amador Cisneiros. São Paulo: Escala, 2008.
CÍCERO, M. T. Orações. In: Oração I, contra L. Catilina. Tradução de António Joaquim. Rio de 
Janeiro: W. M. Jackson INC, 1960.
CICERÓN. Sobre la República. Tradução de Álvaro D’Ors. Madrid: Gredos, 2002.
COTRIM, G. V. Fundamentos da Filosofia: História e Grandes Temas. 16. ed. São Paulo: 
Saraiva, 2006.
COUTINHO, C. N. et al. O Manifesto Comunista: 150 anos depois. Rio de Janeiro: Contra Pon-
to; São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 1998.
DUAYER, M.; ESCURRA, M. F.; SIQUEIRA, A. V. A ontologia de Lukács e a restauração da crítica 
ontológica em Marx. Revista Katálysis, Florianópolis, v. 16, n. 1, p. 17-25, jan./jun. 2013.
ENGELMANN, A. A. Maquiavel: secularização, política e natureza humana. 2005. Dissertação 
(Mestrado em Filosofia) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2005.
FERREIRA, L. P.; GUANABARA, R.; JORGE, V. L. (org.). Curso de Ciência Política: Grandes Auto-
res do Pensamento Político Moderno e Contemporâneo. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.
FERREIRA FILHO, M. G. Do Processo Legislativo. São Paulo: Saraiva, 2002.
FORTES, R. V.; VAISMAN, E. A Politicidade no Pensamento Tardio de György Lukács. Revista de 
Estudos Políticos, [online], v. 5, n. 1, 2015.
referências
210
FRAILE, G. História de la Filosofia I: Grecia y Roma. 3. ed. Madrid: Catolica,1971.
GONÇALVES, R. B. O conceito de ideologia na tradição (pós)marxista e pós-estruturalista. 
2015. 18 f. Disponível em: https://wp.ufpel.edu.br/legadolaclau/files/2015/07/rafael-bruno.
pdf.
GRAMSCI, A. Cadernos do cárcere. v. 1. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: 
Civilização Brasileira, 1999.
HOBBES, T. Diálogo entre un Filósofo y un Jurista y Escritos Autobiográficos. Madrid: Tec-
nos, 1992.
HOBBES, T. Leviatã ou Matéria, Forma e Poder de um Estado Eclesiástico e Civil. Tradução 
de João Paulo Monteiro e Maria Beatriz Nizza da Silva. São Paulo: Nova Cultural, 1999a.
HOBBES, T. Tratado sobre el Ciudadano. Madrid: Trotta, 1999b.
HOBBES, T. Human Nature and De Corpore Politico. Oxônia: Oxford University Press,1999c.
JASPERS, K. Introdução ao pensamento filosófico. Tradução de Leonidas Hegenberg e Oc-
tanny Silveira da Mota. São Paulo: Pensamento-Cultrix, 2010.
KONRAD, L. R. Eichmann em Jerusalém e a Banalidade do Mal: percepções necessárias para a 
urgência de uma educação em direitos humanos. Caderno pedagógico, Lajeado, v. 11, n. 2, 
p. 50-72, 2014. 
LAUREANO, P. S. Uma breve introdução ao pensamento de Slavoj Zizek. Analytica, São João del 
Rei, v. 4, n. 7, jul./dez. 2015.
LIMA, F. J. G. de. A ideia de uma sociedade de povos bem-ordenados segundo John Rawls. 
In: ENCONTRO DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM HUMANIDADES, 2.; SEMANA DE HUMA-
NIDADES, HUMANIDADES: ENTRE FIXOS E FLUXOS, 8., 2011, Fortaleza. Anais […]. Fortaleza: 
Universidade Federal do Ceará, 2011. p. 1-16.
LIMONGI, M. I. Hobbes. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002.
LOCKE, J. Dois Tratados sobre o Governo. Tradução de Júlio Fisher. São Paulo: Martins Fontes, 
2005.
LUCAS, D. C.; COPETTI, A. L.; OLIVEIRA, C. D. de. O Papel da Desobediência Civil em Tempos de 
Desconfianças Democráticas: o

Mais conteúdos dessa disciplina