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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Registro: 2022.0000837562 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1000334-77.2022.8.26.0444, da Comarca de Pilar do Sul, em que é apelante/apelado MUNICÍPIO DE PILAR DO SUL, são apelados/apelantes MANACÁ ADMINISTRADORA DE BENS LTDA (E OUTROS(AS)) e MARISA DE BARROS SAAD. ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 15ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: DERAM PROVIMENTO AO RECURSO DO MUNICÍPIO E DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DAS IMPETRANTES. V.U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Desembargadores SILVA RUSSO (Presidente) E ERBETTA FILHO. São Paulo, 13 de outubro de 2022. EURÍPEDES FAIM Relator(a) Assinatura Eletrônica PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1000334-77.2022.8.26.0444 -Voto nº 23123 2 VOTO Nº.: 23123 APELAÇÃO Nº.: 1000334-77.2022.8.26.0444 COMARCA DE PILAR DO SUL APELANTE/APELADO: MUNICÍPIO DE PILAR DO SUL APELADAS/APELANTES: MANACÁ ADMINISTRADORA DE BENS LTDA. E MARISA DE BARROS SAAD JUIZ DE 1º GRAU: MATHEUS OLIVEIRA NERY BORGES EMENTA TRIBUTÁRIO APELAÇÃO MANDADO DE SEGURANÇA ITBI MUNICÍPIO DE PILAR DO SUL Sentença que indeferiu a inicial, ante a ausência de ato coator. Recursos interpostos por ambas as partes. MANDADO DE SEGURANÇA A teor do artigo 1º da Lei Federal nº 12.016/2009, o mandado de segurança visa proteger direito líquido e certo do impetrante Para que o direito seja considerado líquido e certo, é preciso que, no momento da impetração, (1) venha expresso em norma legal; (2) traga em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante, (3) tenha sua existência induvidosa; (4) tenha a sua extensão delimitada; (5) não dependa seu exercício de situações e fatos ainda indeterminados; e (6) os fatos em que se fundar estejam de pronto provados de forma incontestável, certa, no processo Impetração que, ademais, só é cabível contra atos que possuam conteúdo decisório - Doutrina - O mandado de segurança constitui via estreita Cognição limitada ao ato coator indicado na petição inicial Direito líquido e certo alegado que deve guardar relação direita com esse ato Pedido que deve estar adstrito à análise do ato coator Precedente do C. Superior Tribunal de Justiça. No caso dos autos, em se tratando de mandado de segurança preventivo, o justo receio na prática do ato administrativo tem aptidão para representar ameaça ao direito líquido e certo das impetrantes, o que autoriza a utilização da via mandamental Justo receio na exigência de recolhimento do ITBI sobre a integralização de imóveis que restou caracterizado pelas práticas reiteradas das autoridades tributárias nesse sentido, bem como pela controvérsia quanto à matéria discutida Ademais, restou evidenciada a resistência do Município ao pleito das impetrantes em suas contrarrazões Afastado o indeferimento da inicial. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA INOCORRÊNCIA Questão que não demanda dilação probatória. RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 796.376/SC Tema 796 Tese de Repercussão Geral que apenas diz respeito ao entendimento de que a imunidade prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição da República não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social a ser integralizado Embora PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1000334-77.2022.8.26.0444 -Voto nº 23123 3 tenha sido mencionado no julgado ser incondicionada a imunidade do ITBI em relação à integralização de imóvel ao capital social, tal questão não está contida na matéria afeta à repercussão geral Trata-se de fundamentação obter dicta, que não possui efeito vinculante Precedente desta C. Câmara. No caso dos autos, as impetrantes pleiteiam a aplicação de entendimento mencionado no julgamento do Recurso Extraordinário nº 796.376/SC, para que seja concedida de forma incondicionada a imunidade em relação ao ITBI incidente sobre integralização de imóveis ao seu capital social Contudo, ausente o efeito vinculante, não se justifica a observância a tal entendimento em detrimento da jurisprudência consolidada por esta C. Câmara. INTEGRALIZAÇÃO DE IMÓVEIS AO CAPITAL SOCIAL - IMUNIDADE NOS TERMOS DO ARTIGO 156, §2º, I DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. Pretensão de reconhecimento da imunidade do ITBI de sociedade recém-constituída Aplicabilidade do art. 37, §2º, do Código Tributário Nacional Incidência do tributo sujeita a condição temporal Precedentes desta C. Câmara Possibilidade de lançamento complementar ao fim do período de três anos da aquisição dos imóveis Necessidade, contudo, de comprovação contábil da preponderância da atividade imobiliária. No caso dos autos, o contrato social da empresa, com a descrição dos imóveis a serem adquiridos para a integralização de capital, foi registrado em 17/06/2021 no 6º Oficial de Registro Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de São Paulo, que é a data inicial do prazo trienal a ser observado antes do lançamento do ITBI Inexigibilidade do tributo reconhecida Precedentes desse E. Tribunal de Justiça. Sentença reformada Recurso do Município desprovido Recurso das impetrantes parcialmente provido. Trata-se de recursos de apelação interpostos pelas partes contra a respeitável sentença de fls. 80/81, cujo relatório se adota e que indeferiu a inicial no mandado de segurança preventivo impetrado por MANACÁ ADMINISTRADORA DE BENS LTDA. E MARISA DE BARROS SAAD contra a iminência de ato a ser praticado pelo SECRETÁRIO DE FINANÇAS, PLANEJAMENTO E PATRIMÔNIO DO MUNICÍPIO DE PILAR DO SUL, nos termos do artigo 485, inciso I, do Código de Processo Civil somado ao artigo 10 da Lei Federal nº 12.016/2009, ante a ausência de ato coator, uma vez que não restou demonstrada negativa da autoridade coatora em reconhecer a imunidade do ITBI incidente sobre a integralização de imóveis ao capital social da empresa impetrante. Nas razões de apelação (fls. 91/101), o Município alega que o mandado de segurança pressupõe sempre um direito líquido e certo, de forma que compete ao impetrante PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1000334-77.2022.8.26.0444 -Voto nº 23123 4 pré-constituir a prova desde logo, no momento da impetração, inviabilizando dilação probatória. Sustenta ser caso de denegação da ordem e não de extinção sem julgamento de mérito, tendo em vista a ausência de comprovação do direito líquido e certo das impetrantes. Requer a reforma da r. sentença, a fim de que seja denegada a ordem no mandado de segurança. Em suas razões de apelação (fls. 108/124), as impetrantes alegam que o presente mandado de segurança possui caráter eminentemente preventivo, de modo que prescinde de comprovação de realização do ato coator. Sustentam que os cartórios se negaram a registrar a transferência dos imóveis sem o recolhimento do ITBI, em razão de orientação da Municipalidade. Aduzem que o artigo 92, inciso II, do Código Tributário Municipal, estabeleceu como responsável pelo pagamento do imposto os tabeliães, escrivães e demais serventuários do cartório que formalizarem transferências de imóveis sem o competente recolhimento do ITBI. Afirmam que restou demonstrado o justo receio das apelantes em serem compelidas pelo Município a recolher o ITBI na integralização de imóveis ao capital social da empresa ora impetrante. Argumentam que não seria possível impor às impetrantes o ônus de produzir prova do não registro da transferência dos imóveis, sob pena de imposição da produção de prova negativa. Defendem que as impetrantes fazem jus ao reconhecimento da imunidade do ITBI incidente sobre a integralização de imóvel ao capital social, à luz do artigo 156, § 2º, inciso I, da Constituição da República. Narram que, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 796.376/SC,Tema 796 da Repercussão Geral, o C. Supremo Tribunal Federal entendeu ser incondicionada a imunidade sobre a incorporação de bens imóveis ao patrimônio da pessoa jurídica em realização de capital, de modo que a sua concessão independe da atividade preponderante desempenhada. Subsidiariamente, pugnam pelo reconhecimento da ausência de lapso temporal apto a avaliar a preponderância da atividade desempenhada pela empresa ora impetrante, conforme previsto no artigo 37, § 2º, do Código Tributário Nacional. Requerem a reforma da r. sentença, a fim de que seja concedida a ordem no mandado de segurança para que seja determinado o registro da transferência dos imóveis sem a exigência do ITBI, ante a inexigibilidade do imposto. Vieram as contrarrazões das impetrantes (fls. 131/141) e as contrarrazões do Município (fls. 150/161). Este é o relatório. Passa-se a analisar o recurso. DO MANDADO DE SEGURANÇA. O mandado de segurança está previsto no artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição da República: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1000334-77.2022.8.26.0444 -Voto nº 23123 5 Público; (grifo nosso) No mesmo sentido dispõe a Lei Federal nº 12.016/2009: Art. 1º Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça. (grifo nosso) Hely Lopes Meirelles dá o seguinte conceito de direito líquido e certo: “o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante; se sua existência for duvidosa; se a sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios jurídicos. Quando a lei alude a direito líquido e certo, está exigindo que esse direito se apresente com todos os requisitos para o seu reconhecimento e exercício no momento da impetração”. (Mandado de Segurança: ação popular, ação civil pública, mandado de injunção, habeas data. 13a edição. São Paulo: RT, 1989, p. 14) (grifo nosso) Já Celso Agrícola Barbi ensina: “o conceito de direito líquido e certo é tipicamente processual, pois atende ao modo de ser de um direito subjetivo no processo: a circunstância de um determinado direito subjetivo realmente existir não lhe dá a caracterização de liquidez e certeza; esta só lhe é atribuída se os fatos em que se fundar puderem ser provados de forma incontestável, certa, no processo.” (Do Mandado de Segurança. 3ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 1976, p. 85) (grifo nosso) Resumindo, para que um direito seja considerado líquido e certo é necessário o seguinte no momento da impetração: Vir expresso em norma legal; Trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante; Ter sua existência induvidosa; Ter a sua extensão delimitada; Não depender seu exercício de situações e fatos ainda indeterminados; e Os fatos em que se fundar estiverem de pronto provados de forma incontestável, certa, no processo. Ademais, para a impetração do mandado de segurança é necessário que a violação ou ameaça a direito líquido e certo decorra de ato ilegal ou abusivo praticado por autoridade PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1000334-77.2022.8.26.0444 -Voto nº 23123 6 pública. A doutrina esclarece o conceito de ato de autoridade, passível de ser impugnado por mandado de segurança: “Ato de autoridade é toda manifestação ou omissão do Poder Público ou de seus delegados, no desempenho de suas funções ou a pretexto de exercê-las. Por autoridade entende-se a pessoa física investida de poder de decisão dentro da esfera de competência que lhe é atribuída pela norma legal. Deve-se distinguir autoridade pública do simples agente público. Aquela detém, na ordem hierárquica, poder de decisão e é competente para praticar atos administrativos decisórios, os quais, se ilegais ou abusivos, são suscetíveis de impugnação por mandado de segurança [...]. Atos de autoridade, portanto, são os que trazem em si uma decisão [...].” (MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de Segurança. 29ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 33) (grifo nosso) Portanto, vê-se que a impetração somente é cabível contra atos que possuam conteúdo decisório. Considerando que o mandado de segurança é via estreita e que a cognição está limitada ao ato coator indicado na petição inicial, o direito líquido e certo alegado deve guardar relação direita com esse ato, e o pedido formulado deve estar adstrito à análise do ato coator. Nesse sentido, precedente da Corte Especial do C. Superior Tribunal de Justiça: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO MANDADO DE SEGURANÇA. REPASSE DE VERBAS PÚBLICAS. PEDIDO DE NÃO INCLUSÃO NA BASE DE CÁLCULO DO FPM DA MULTA PREVISTA NO ART. 8o. DA LEI 13.254/2016. A PARTE IMPETRANTE NÃO INDICA E COMPROVA DE MODO PRECISO O ATO COATOR EM PRINCÍPIO QUE PODERIA SER ATRIBUÍDO AO IMPETRADO. NÃO CABE MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA LEI EM TESE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 266 DO STF. INDEFERIMENTO DA INICIAL E EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. AGRAVO INTERNO DO PARTICULAR A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O Mandado de Segurança é um remédio constitucional, de natureza mandamental, rito sumário e especial, que visa a resguardar direito líquido e certo. Por possuir via estreita de processamento, exige a narrativa precisa dos fatos, com a indicação exata do ato coator e a comprovação do direito que se reputa líquido, certo e violado. [...] 3. Agravo Interno no Mandado de Segurança do Particular a que se nega provimento. (STJ, AgInt no MS 24.213/DF, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 07/04/2020, DJe 23/04/2020) (grifo nosso) O caso dos autos. No caso dos autos, em se tratando de mandado de segurança preventivo, o justo receio na prática do ato administrativo tem aptidão para representar ameaça ao direito líquido e certo das impetrantes, o que autoriza a utilização da via mandamental. Nesse sentido, precedente do C. Superior Tribunal de Justiça: PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1000334-77.2022.8.26.0444 -Voto nº 23123 7 TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. PEDIDOS ADMINISTRATIVOS DE RESSARCIMENTO DE CRÉDITOS DECORRENTES DA NÃO CUMULATIVIDADE DE PIS E COFINS. AUSÊNCIA DE DECISÃO ADMINISTRATIVA, NO PRAZO LEGAL. ART. 460, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC/73. SENTENÇA CONDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. HIPÓTESE EM QUE O JUÍZO SINGULAR APENAS DETERMINOU À AUTORIDADE COATORA QUE, EM SENDO RECONHECIDO O DIREITO AO RESSARCIMENTO, NA VIA ADMINISTRATIVA, PROCEDA AO PAGAMENTO DO VALOR COM CORREÇÃO MONETÁRIA. ART. 1º DA LEI 12.016/2009. SUPOSTA INEXISTÊNCIA DE ATO COATOR. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. CABIMENTO. MULTA. ART. 538, PARÁGRAFO ÚNICO, CPC/73. SÚMULA 98/STJ. AFASTAMENTO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. [...] V. Ao contrário do que entendeu o Tribunal aquo, no que tange ao pedido de incidência de correção monetária, o Mandado de Segurança assume caráter preventivo, sendo razoável o fundado receio da prática do ato administrativo, na medida em que a resistência da Administração tributária, sobre a matéria, na data da propositura da ação - 17/03/2011 -, era notória e gerava intenso debate nos tribunais. A rigor, considerado o pedido do contribuinte de incidência da correção monetária a partir de cada período de apuração, é razoável supor que ainda haverá resistência da Administração, haja vista o entendimento consolidado pelo STJ no aludido Tema 1.003, que é mais favorável à Fazenda Nacional. VI. Nos termos da Súmula 98/STJ, "embargos de declaração manifestados com notório propósito de prequestionamento não tem caráter protelatório". Assim, a simples oposição dos Embargos de Declaração pela parte recorrente, por si só, não justifica a imposição da multa prevista no art. 538, parágrafo único, do CPC/73, motivo pelo qual o Recurso Especial merece ser também provido, no ponto. VII. Recurso Especial conhecido e provido, para reformar o acórdão recorrido, no capítulo em que anulou a sentença, por reputá-la condicional, determinando o retorno dos autos à origem, para prosseguimento do julgamento da Apelação da Fazenda Nacional e da Remessa Necessária, e para afastar a multa do art. 538, parágrafo único, do CPC/73. (STJ, Segunda Turma, REsp. nº 1.515.418/SP, rel. Ministra Assusete Magalhães, j. 4/5/2021, DJe de 19/5/2021, V. U.) (grifo nosso) No mesmo sentido, precedentes deste E. Tribunal de Justiça: REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. ICMS. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA PARA FRENTE. OPERAÇÃO REALIZADA COM BASE DE CÁLCULO MENOR DO QUE A PRESUMIDA. LIMITAÇÃO TEMPORAL DA PORTARIA CAT Nº 14/2018. IMPOSSIBILIDADE. Preliminar. Não é possível acolher a alegação de falta de interesse de agir porque o singelo receio de indeferimento do pleito repetitório já enseja a eleição da ação mandamental como via judicial. Segurança preventiva que dispensa a definição de ato coator. Mérito. Revendedora de veículos. Pretensão da impetrante de restituir os valores adimplidos a maior, tendo em vista que a operação mercantil se realizou por valor inferior àquele presumido. Concessão da segurança. Inconformismo. Cabimento parcial. O art. 150, §7º, da CF garante o direito à restituição do imposto recolhido a maior, em caso de substituição tributária, quando o fato gerador não se realize ou o seja a menor, tal como reconhecido pelo STF, em sede de repercussão geral, no PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1000334-77.2022.8.26.0444 -Voto nº 23123 8 julgamento do RE nº 593.854-MG (Tema 201). Hipótese já prevista no art. 66-B, II, da Lei Estadual nº 6.374/89, reconhecidamente constitucional pelo STF na ADI nº 2.777/SP. Contribuinte que faz jus à restituição do imposto, porém deverá fazê-lo sob as regras impostas pelo Fisco Estadual, por Diplomas Normativos plenamente vigentes, decotando-se apenas a limitação temporal imposta pela Portaria CAT nº 14/18, remanescendo, no mais, as demais regras e disciplinas para o ressarcimento do imposto retido, inclusive a Portaria CAT 42/2018. Precedentes. Restituição acrescida apenas de correção monetária, sendo indevidos os juros, porque não caracterizada a mora estatal. Sentença de concessão da segurança reformada apenas para excluir os juros de mora incidentes sobre os valores a serem ressarcidos. Recursos parcialmente providos. (TJSP, 13ª Câmara de Direito Público, Apelação / Remessa Necessária nº 1002547-65.2022.8.26.0053, rel. Djalma Lofrano Filho, j. 28/07/2022, V. U.) (grifo nosso) Mandado de Segurança. ITBI. Integralização de capital. De início, não prospera a preliminar de inexistência de ato coator, na medida em que a hipótese dos autos tratou-se de mandado de segurança preventivo. Outrossim, não há falar-se em inadequação da via eleita ou ausência de direito líquido e certo, pois o presente instrumento foi corretamente instruído com provas suficientes do fato constitutivo do direito alegado. No mérito, de acordo com o art. 156, § 2º, II da CF, não incide ITBI sobre transmissão de bens e direitos em integralização de capital. A situação concreta dos autos atrai a incidência da referida norma. No mais, o Município não provou que a atividade preponderante da impetrante era a compra e venda de bens imóveis ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil, de modo que deve ser mantida a ordem concedida preventivamente à impetrante a fim de resguardá-la de eventual cobrança de ITBI na hipótese. Nega-se provimento ao recurso, mantendo-se a sentença reexaminada. (TJ/SP, 18ª Câmara de Direito Público, Apelação / Remessa Necessária nº 1019279- 92.2020.8.26.0053, rel. Beatriz Braga, j. 24/11/2020, V. U.) (grifo nosso) No presente caso, o justo receio na exigência de recolhimento do ITBI sobre a integralização de imóveis restou caracterizado pelas práticas reiteradas das autoridades tributárias nesse sentido, bem como pela controvérsia quanto à matéria discutida. Ademais, restou evidenciada a resistência do Município ao pleito das impetrantes em suas contrarrazões (fls. 150/161), uma vez que a Municipalidade pugna pela denegação da ordem tanto em relação ao reconhecimento da imunidade prevista no artigo 156, § 2º, inciso I, da Constituição da República, quanto no tocante à ausência de lapso temporal apto a avaliar a preponderância da atividade desempenhada pela empresa ora impetrante. Em consonância com tal entendimento, precedente do C. Superior Tribunal de Justiça: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. ISS SOBRE ATIVIDADES EXERCIDAS POR AGÊNCIA DE NOTÍCIAS. ACÓRDÃO EMBARGADO FIRMADO COM BASE EM PREMISSA FÁTICA EQUIVOCADA. ACOLHIMENTO PARA AFASTAR O ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ. CABIMENTO DO WRIT OF MANDAMUS NA MODALIDADE PREVENTIVA DIANTE DA EXISTÊNCIA DE LANÇAMENTOS PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1000334-77.2022.8.26.0444 -Voto nº 23123 9 FISCAIS REGULARMENTE INSCRITOS NA DÍVIDA ATIVA MUNICIPAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DA CONTRIBUINTE ACOLHIDOS, COM EFEITOS INFRINGENTES, A FIM DE PROVER O RECURSO ESPECIAL, PARA, RECONHECENDO O CABIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO, DETERMINAR O RETORNO DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE ORIGEM PARA APRECIAÇÃO DAS QUESTÕES REMANESCENTES. [...]5. A Lei 12.106/2009 não deixa dúvidas de que o Mandado de Segurança é instrumento destinado a proteger direito líquido e certo sempre que houver a prática de ato lesivo ou abuso de poder pela autoridade pública, estando consolidado o entendimento, tanto na doutrina como na jurisprudência, de que a via mandamental pode ser utilizada preventivamente, a fim de prevenir ou evitar lesão ou dano diante de ameaça concreta ou justo receio em desfavor do impetrante. 6. Na esfera tributária, esta Corte Superior prestigia o entendimento de que é cabível a utilização do Mandado de Segurança, ainda que sob enfoque preventivo, a fim de inibir que a autoridade coatora venha a fazer lançamento fiscal, tendo em vista o comportamento que pretende adotar frente à norma tributária capaz de produzir efeitos concretos na esfera patrimonial do Contribuinte. Precedentes: AgInt no REsp. 1.270.600/RS, Rel. Min. OG FERNANDES, DJe 13.6.2018; AgRg no AREsp. 543.226/PE, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, DJe 10.12.2015; AgRg no Ag 1.302.289/RJ, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe 8.11.2010;REsp. 860.538/RS, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe 16.10.2008. 7. No caso dos autos, o writ se justifica na medida em que a Contribuinte objetiva evitar que atos abusivos de cobrança venham a ocorrer, haja vista que já foi autuada reiteradamente pelo não recolhimento do tributo específico contra que se insurge, tanto que, em suas informações, a autoridade coatora defende a possibilidade de incidênciado ISS sobre as atividades de produção de material de cunho jornalístico (informações, notícias e fotos) para comercialização com empresa de jornais e revistas, além de discorrer sobre a impossibilidade de se discutir a exigência tributária em Mandado de Segurança, quando os lançamentos fiscais já foram regularmente inscritos na Dívida Ativa Municipal e geraram Certidões de Dívida Ativa, que gozam de presunção de liquidez e certeza, cabendo ao impetrante se defender por meio de Embargos à Execução. 8. Logo, a ameaça de autuação do Fisco Municipal não está apenas no plano da presunção, visto que a autoridade coatora defendeu em suas informações a legitimidade da exigência tributária. Tal circunstância é suficiente a demonstrar que a fiscalização certamente autuará a impetrante se ausente o recolhimento do ISS, além de impor penalidades pela inadimplência, até porque o lançamento tributário é atividade administrativa vinculada e obrigatória, a teor do disposto no art. 142 do CTN. 9. Destarte, considerando a exigência pelo Município de São Paulo do ISS sobre as atividades de transmissão e cessão de matérias informativas, noticiosas e reportagens jornalísticas, revela-se adequado à satisfação da pretensão formulada o remédio constitucional eleito na modalidade preventiva, pois comprovado o justo receio de vir a sofrer violação a direito por ato coator iminente. 10. Embargos de Declaração da Contribuinte acolhidos, com efeitos infringentes, a fim de afastar o óbice da Súmula 7/STJ, para dar provimento ao Recurso Especial, reconhecendo cabível o Mandado de Segurança preventivo e determinando o retorno dos autos ao TJSP, para prosseguir no julgamento das questões remanescentes. (STJ, Primeira Turma, EDcl no AgInt no AREsp nº 1.169.402/SP, rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. 24/9/2019, DJe de 3/10/2019, V. U.) (grifo nosso) PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1000334-77.2022.8.26.0444 -Voto nº 23123 10 Assim, deve ser afastado o indeferimento da inicial, uma vez que se trata de mandado de segurança preventivo, de maneira que não se exige o prévio requerimento administrativo, pois a sua impetração tem por pretensão resguardar os direitos das impetrantes contra violações. Com isso, a r. sentença deve ser reformada. DA INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. A alegação de inadequação da via eleita deve ser afastada, pois no presente mandado de segurança pretende-se o reconhecimento da inexigibilidade do ITBI como condição para o registro no Cartório Imobiliário da transferência dos imóveis integralizados ao capital social da empresa impetrante, não havendo, para tanto, necessidade de dilação probatória. Com isso, passa-se à análise do mérito. DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 796.376/SC. No presente caso, as impetrantes pleiteiam a aplicação de entendimento mencionado no julgamento do Recurso Extraordinário nº 796.376/SC, para que seja concedida de forma incondicionada a imunidade em relação ao ITBI incidente sobre integralização de imóveis ao seu capital social. Ocorre que, ao julgar o RE nº 796.376/SC, o Plenário do C. Supremo Tribunal Federal firmou como tese de Repercussão Geral (Tema 796) apenas o entendimento de que a imunidade em relação ao ITBI, prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição da República, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social a ser integralizado: EMENTA. CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE TRANSMISSÃO DE BENS IMÓVEIS - ITBI. IMUNIDADE PREVISTA NO ART. 156, § 2º, I DA CONSTITUIÇÃO. APLICABILIDADE ATÉ O LIMITE DO CAPITAL SOCIAL A SER INTEGRALIZADO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO IMPROVIDO. 1. A Constituição de 1988 imunizou a integralização do capital por meio de bens imóveis, não incidindo o ITBI sobre o valor do bem dado em pagamento do capital subscrito pelo sócio ou acionista da pessoa jurídica (art. 156, § 2º,). 2. A norma não imuniza qualquer incorporação de bens ou direitos ao patrimônio da pessoa jurídica, mas exclusivamente o pagamento, em bens ou direitos, que o sócio faz para integralização do capital social subscrito. Portanto, sobre a diferença do valor dos bens imóveis que superar o capital subscrito a ser integralizado, incidirá a tributação pelo ITBI. 3. Recurso Extraordinário a que se nega provimento. Tema 796, fixada a seguinte tese de repercussão geral: “A imunidade em relação ao ITBI, prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição Federal, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social a ser integralizado". (STF, Tribunal Pleno, RE 796376, Rel. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão: Alexandre De Moraes, j. 05/08/2020, Repercussão Geral) (grifo nosso) De fato, no corpo do acórdão restou consignado que o artigo 156, § 2º, inciso I, da Constituição da República estabelece duas hipóteses de imunidade do ITBI, uma incondicionada, quando se tratar de transmissão de bens ou direitos incorporados ao PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1000334-77.2022.8.26.0444 -Voto nº 23123 11 patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, e outra condicionada à comprovação da não preponderância no desempenho de atividade imobiliária, em se tratando da transmissão de bens ou direitos decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica: É dizer, a incorporação de bens ao patrimônio da pessoa jurídica em realização de capital, que está na primeira parte do inciso I do § 2º, do art. 156 da CF/88, não se confunde com as figuras jurídicas societárias da incorporação, fusão, cisão e extinção de pessoas jurídicas referidas na segunda parte do referido inciso I. [...] Em outras palavras, a segunda oração contida no inciso I - “ nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil” - revela uma imunidade condicionada à não exploração, pela adquirente, de forma preponderante, da atividade de compra e venda de imóveis, de locação de imóveis ou de arrendamento mercantil. Isso fica muito claro quando se observa que a expressão “nesses casos” não alcança o “outro caso” referido na primeira oração do inciso I, do § 2º, do art. 156 da CF. [...] Ou seja, a exceção prevista na parte final do inciso I, do § 2º, do art. 156 da CF/88 nada tem a ver com a imunidade referida na primeira parte desse inciso. Contudo, na sistemática dos precedentes, o efeito vinculante recai apenas sobre o núcleo da questão apreciada, não sendo possível se atribuir vinculação à chamada fundamentação obter dicta, que consiste em argumentos jurídicos ou considerações prescindíveis para o julgamento. Nesse sentido, doutrina Daniel Amorim Assumpção Neves: Conforme ensina a melhor doutrina, a ratio decidendi (chamada de holding no direito americano) é o núcleo do precedente, seus fundamentos determinantes, sendo exatamente o que vincula. Distingue- se da fundamentação obter dicta, que são prescindíveis ao resultado do julgamento, ou seja, fundamentos que, mesmo se fossem em sentido invertido, não alterariam o resultado do julgamento. São argumentos jurídicos ou considerações feitas apenas de passagem, de forma paralela e prescindível para o julgamento, como ocorre com manifestações alheias ao objeto do julgamento, apenas hipoteticamente consideradas. Justamente por não serem essenciais ao resultado do precedente os fundamentos obter dicta não vinculam. (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil Volume único. Salvador, Ed. JusPodvm, 12ª edição, 2019) (grifo nosso) No caso do RE nº 796.376/SC, portanto, o núcleo do precedente está consubstanciado no que foi fixado como Tese de Repercussão Geral, ou seja, quanto à inaplicabilidade da imunidade do ITBI em relação ao valor dos bens que exceder o limitedo PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1000334-77.2022.8.26.0444 -Voto nº 23123 12 capital social a ser integralizado. Desse modo, o entendimento acerca da imunidade ser incondicionada é questão que não está contida na matéria afeta à repercussão geral, configurando fundamentação obter dicta, que não possui eficácia vinculante. Consoante tal entendimento, precedente desta C. Câmara: Agravo de instrumento contra decisão que negou pedido liminar de suspensão de exigibilidade de ITBI - Tributação de operação de integralização de capital social Não incidência prevista no art. 156 da CF que não é incondicionada, devendo ser analisada a atividade econômica preponderante da pessoa jurídica tributada - Inexistência de tese vinculante no sentido de que qualquer operação de integralização seria isenta de ITBI Caso concreto em que o contribuinte omitiu-se em responder a fiscalização do Fisco - Presunção de legitimidade da tributação que, diante da omissão, considerou que o contribuinte não fazia jus à isenção - Existência de elementos mínimos a corroborar a probabilidade de atividade imobiliária preponderante e legitimidade da cobrança de ITBI - Questões contábeis que dependem de perícia técnica, de modo que o contribuinte não demonstrou, de modo inequívoco, que não é responsável pelo tributo Falta de probabilidade do direito que impede a suspensão liminar da cobrança do ITBI - Demonstração, apenas, de cobrança de juros moratórios anteriores a ocorrência do fato gerador Impossibilidade de tributação antes do registro imobiliário da operação Agravo parcialmente provido apenas para suspender a cobrança de juros e multa moratória constantes no auto de infração, mantida a cobrança do valor principal do ITBI (TJ/SP, AI nº 2031375-19.2022.8.26.0000, Rel. Tania Mara Ahualli, 15ª Câmara de Direito Público, j. 23/06/2022, V. U.) (grifo nosso) Do corpo do acórdão se extrai: “Não há efeito vinculante na fundamentação expendida pelo E. Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 796.376/SC, sede em que fixado o Tema nº 796 de Repercussão Geral. Isso porque, a menção de que o artigo 156, § 2º, I da Constituição Federal estabeleceria duas hipóteses de imunidade do ITBI, uma incondicionada (para os casos de mera integralização de quotas sociais através de bem imóvel), e outra condicionada (para as hipóteses de cisão, fusão, incorporação e extinção de pessoa jurídica, desde que sua atividade preponderante não recaísse sobre compra e venda dos bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil), se consubstanciou em mera questão obter dicta (argumento de passagem, em nada relacionado ao objeto da causa)”. (corpo do acórdão, grifo nosso) Com isso, ausente o efeito vinculante, não se justifica a observância a tal entendimento em detrimento da jurisprudência consolidada por esta C. Câmara. DA INTEGRALIZAÇÃO DE IMÓVEIS AO CAPITAL SOCIAL. A questão do recurso versa sobre a imunidade do ITBI nos casos de integralização de imóveis ao capital social de pessoa jurídica, prevista no art. 156, § 2º, inciso I da Constituição da República: PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1000334-77.2022.8.26.0444 -Voto nº 23123 13 Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: [...] § 2º O imposto previsto no inciso II: I - não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil; [...] (grifo nosso) O artigo 37 do Código Tributário Nacional define o conceito de “atividade preponderante”: Art. 37. O disposto no artigo anterior não se aplica quando a pessoa jurídica adquirente tenha como atividade preponderante a venda ou locação de propriedade imobiliária ou a cessão de direitos relativos à sua aquisição. § 1º Considera-se caracterizada a atividade preponderante referida neste artigo quando mais de 50% (cinqüenta por cento) da receita operacional da pessoa jurídica adquirente, nos 2 (dois) anos anteriores e nos 2 (dois) anos subseqüentes à aquisição, decorrer de transações mencionadas neste artigo. § 2º Se a pessoa jurídica adquirente iniciar suas atividades após a aquisição, ou menos de 2 (dois) anos antes dela, apurar-se-á a preponderância referida no parágrafo anterior levando em conta os 3 (três) primeiros anos seguintes à data da aquisição. § 3º Verificada a preponderância referida neste artigo, tornar-se-á devido o imposto, nos termos da lei vigente à data da aquisição, sobre o valor do bem ou direito nessa data. (grifo nosso). O conceito de “atividade preponderante”, assim, envolve necessária aferição dos rendimentos da empresa, não cabendo ao município presumir sua existência com base unicamente no objeto social. O supracitado artigo 37, § 2º do Código Tributário Nacional impõe um prazo de três anos para a apuração da atividade preponderante caso a pessoa jurídica inicie suas atividades em menos de dois anos da aquisição do imóvel, como no presente caso. O contrato social da empresa, com a descrição dos imóveis a serem integralizados ao seu capital, foi registrado em 17/06/2021 no 6º Oficial de Registro Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de São Paulo (fls. 27/67), que é a data inicial do prazo trienal a ser observado antes do lançamento do ITBI. Em precedente semelhante, esta C. 15ª Câmara de Direito Público também considerou imperativa a observância do prazo trienal: MANDADO DE SEGURANÇA - ITBI - Transmissão do imóvel para a integralização de capital social da empresa - Pretendido reconhecimento da imunidade tributária - Inteligência do art. 156, § 2º, II da CF - Indeferimento fundado na prejudicialidade do pedido, pois a sociedade PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1000334-77.2022.8.26.0444 -Voto nº 23123 14 incorporada pela impetrante foi constituída há menos de dois anos da integralização do imóvel em relação ao qual se discute a incidência do ITBI, a impossibilitar o exame da atividade preponderante, para fins de reconhecimento da imunidade - Incidência do ITBI condicionada a verificação da atividade preponderante da empresa, levando-se em consideração os três primeiros anos seguintes à data da aquisição, somente após o que tornar-se-á devido o imposto - Inteligência do art. 37 §§ 2º e 3º do Código Tributário Nacional - Violação de direito líquido e certo configurada - Sentença que denegou a ordem reformada em parte, com ressalva a possibilidade de eventual lançamento complementar do ITBI depois de respeitado o prazo de três anos da data de aquisição, em regular e novo procedimento administrativo - Recurso provido, com observação. (TJ/SP, Apelação nº 9062599-12.2006.8.26.0000, 15ª Câmara de Direito Público, Rel. Rezende Silveira, j. 31/10/2013, V. U.) No corpo do acórdão: Como o lançamento complementar do ITBI se deu antes desse prazo de três anos, era caso de se reconhecer violado o direito líquido e certo quanto a não incidência, ainda que condicional no tempo, do ITBI e somente para esses fins é que se deve conceder a segurança. Fica ressalvado que se em novo procedimento administrativo a Fazenda Pública vier a constatar a preponderância da atividade, aí sim, o lançamento poderá ser realizado. Pelo exposto, meu voto dá provimento ao recurso, para conceder a segurança, com observação, garantindo a não incidência do ITBI à impetrante até que se cumpra o prazo de três anos da data da aquisição do imóvel, nos termos do disposto no art. 37, § 2º do Código Tributário Nacional, ressalvado o direito da Fazenda de verificar posteriormente a eventual preponderância da atividade. (corpo do acórdão, grifo nosso)No mesmo sentido, ainda: Apelação nº 1004636-38.2014.8.26.0604, 15ª Câmara de Direito Público, Rel. Raul de Felice, j. 26/02/2015, V. U.; Apelação nº 0003591-30.2011.8.26.0116, 14ª Câmara de Direito Público, Rel. João Alberto Pezarini, j. 09/04/2015, V. U. Assim, não há que se falar na incidência do ITBI nos primeiros três anos da data de aquisição do imóvel. Contudo, transcorrido o prazo trienal, a municipalidade poderá, eventualmente, realizar o lançamento do imposto sobre a mesma aquisição, valendo-se do disposto no art. 37, §3º, do CTN, desde que comprove que a atividade preponderante da empresa é a venda, locação e arrendamento mercantil de imóveis. A mesma conclusão é a de Aliomar Baleeiro: Se o início das atividades da firma adquirente data de menos de dois anos, ela gozará do benefício fiscal, sujeita, porém, a perdê-lo e ser compelida ao pagamento do imposto, caso nos três anos posteriores à aquisição se verifique a preponderância dos negócios imobiliários. A exoneração do tributo é condicional durante o triênio seguinte, convalidando-se, definitivamente, depois dele. O imposto fica diferido até que se complete o termo. Resolve-se se não houver a preponderância de negócios imobiliários. O Fisco adotou a técnica da “condição” do Direito PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1000334-77.2022.8.26.0444 -Voto nº 23123 15 Civil. (BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro, 12ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 370) (grifo nosso) Com isso, deve ser concedida a ordem no presente mandado de segurança. Por derradeiro, considera-se questionada toda matéria infraconstitucional e constitucional, observando-se jurisprudência consagrada, inclusive no Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que para fins de interposição de recursos extremos às cortes superiores é desnecessária a citação numérica dos dispositivos legais, bastando que a questão posta tenha sido decidida. Bem por essa razão eventuais embargos declaratórios não se prestariam à eventual supressão de falta de referência a dispositivos de lei (STJ, EDcl no RMS 18.205/SP, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJ 08/05/2006). Ante o exposto, meu voto propõe que se NEGUE PROVIMENTO ao recurso do Município e que se CONCEDA PARCIAL PROVIMENTO ao recurso das impetrantes. EURÍPEDES FAIM RELATOR 2022-10-13T12:01:08-0300 Not specified