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18/03/2021 TOXICOLOGIA ANALÍTICA: DA TRIAGEM À CONFIRMAÇÃO PARTE 01 De acordo com os objetivos de (1) prevenir, (2) diagnosticar e (3) tratar as intoxicações, a toxicologia se divide em três áreas: • experimental, • analítica e • clínica. A toxicologia analítica se insere no diagnóstico e no prognóstico da intoxicação e se dedica ao estudo de métodos precisos e de exatidão adequada na pesquisa de toxicantes ou de parâmetros bioquímicos relacionados à intoxicação ou às ocorrências de interesse toxicológico. 1 2 18/03/2021 O diagnóstico pode ter a finalidade: • de determinar o agente envolvido, para nortear um tratamento (análise de urgência); • de auxiliar em processos judiciários (análise forense); • de acompanhar farmacoterapias; • de avaliar a exposição a drogas de abuso no ambiente de trabalho ou no monitoramento da abstinência; • de avaliar a exposição às substâncias químicas em ambiente laboral (monitoramento ambiental e biológico); • de avaliar a contaminação ambiental (monitoramento ambiental voltada às análises de poluentes); • ou de avaliar a contaminação de alimentos. • A finalidade do diagnóstico indicará o analito a ser pesquisado – que pode ser o próprio toxicante, seu metabólito ou um parâmetro bioquímico relacionado à toxicodinâmica do agente –, assim como irá indicar a matriz de análise adequada, tais como: amostra biológica, material de apreensão (drogas de abuso), alimentos, amostra de solo, água etc. 3 4 18/03/2021 • Somente após a definição dos parâmetros balizadores: � (1) finalidade, �(2) toxicante e �(3) matriz –, �a metodologia ou o método será selecionado. • A metodologia se refere a um conjunto de métodos que, por sua vez, é composto por conjunto de técnicas ou procedimentos. Enquanto algumas finalidades requerem a aplicação de um método, outras requerem o emprego de metodologia; neste caso, a metodologia será composta de, pelo menos, um método presuntivo ou de triagem e um método confirmatório. • Este é o caso, por exemplo, das análises toxicológicas forenses, que devem atender ao princípio fundamental da presunção da inocência ou in dubio pro reo, o qual define que a dúvida deve recair como um benefício ao réu. Neste caso, é adotada a marcha analítica que ofereça resultados irrefutáveis; caso contrário, fere-se o ordenamento jurídico e o laudo gerado perde a validade probatória. • Nas situações em que não há elementos que indiquem o provável toxicante, faz-se necessária a análise toxicológica sistemática (ATS), que é a busca químico-analítica de substâncias desconhecidas em matrizes biológicas, envolvendo etapas de preparação da amostra para extração de grupos de substâncias, segundo suas propriedades físico-químicas predominantes, seguida de aplicação de técnicas cromatográficas direcionadas a grupos de substâncias. (LINDEN; MOREAU, 2016)(LINDEN; ANTUNES, 2018) 5 6 18/03/2021 • A finalidade sempre definirá o(s) método(s). • Testes rápidos, por exemplo, são essenciais nas análises de urgência nas quais o resultado analítico irá complementar dados clínicos observados, por exemplo, a identificação rápida de salicitatos por colorimetria pode indicar a causa de uma acidose metabólica, quando se suspeita de intoxicação por aspirina; • por outro lado, o controle terapêutico de digoxina irá requerer método de alta sensibilidade, devido à estreita janela terapêutica. • Seja qual for a finalidade, a toxicologia analítica se ocupa da identificação e/ou da quantificação de substâncias e da interpretação dos resultados. • Para tanto, etapas de preparação de amostra, de métodos de triagem, de testes confirmatórios e de validação dos métodos analíticos devem ser planejadas. 1 Preparação de amostras • A preparação da amostra visa à retirada de interferentes e, em alguns casos, busca concentrar os analitos em solvente apropriado ao método selecionado, permitindo sua identificação e quantificação. 7 8 18/03/2021 • Drogas ilícitas, bebidas e demais alimentos, medicamentos, solo e matrizes biológicas são frequentemente empregadas nas análises toxicológicas. • A seleção deve levar em consideração a distribuição dos toxicantes e as inferências almejadas na interpretação do resultado. • Por exemplo: • no monitoramento terapêutico, plasma e soro devem ser as matrizes de escolha, pela possibilidade de correlação entre a concentração do fármaco na matriz e o efeito (concentração no sítio de ação). A interpretação pode ficar comprometida, neste exemplo, se for selecionada a urina, devido às variáveis patológicas ou de metabolismo. • (SANTOS; LANCHOTE; GIRAUD, 2014) • Em se tratando de matrizes biológicas, o sangue representa o primeiro compartimento de distribuição para a maioria dos fármacos, tendo alto valor interpretativo em indivíduos vivos. • A urina representa a matriz de eliminação, sendo esperadas maiores concentrações em relação ao sangue, especialmente dos metabólitos; por outro lado, o valor interpretativo é limitado por variáveis associadas à cinética de eliminação e aos fatores patológicos, como alterações na função renal e hepática. 9 10 18/03/2021 • As matrizes biológicas adotadas em análises toxicológicas são fluidos, tais como sangue, plasma, soro, urina e saliva. • Cabelo, pelo e unhas são matrizes alternativas, indicadas para avaliação do uso crônico de algumas substâncias. • Em casos postmortem, podem ainda ser coletados humor vítreo, bile, tecidos encefálico, pulmonar, hepático e renal. (CARVALHO et al., 2014) • Fatores relacionados à coleta e ao armazenamento da matriz, tais como local, horário, recipiente de armazenamento, adição ou não de aditivos como inibidores enzimáticos e quelantes devem ser planejados de acordo com toxicante a ser pesquisado, de modo a garantir correta interpretação e confiabilidade do resultado. 11 12 18/03/2021 • A técnica de extração será selecionada em função das propriedades físico- químicas dos analitos; • Por exemplo, a separação em compostos orgânicos (hidrossolúveis, lipossolúveis, ácidos, alcalinos ou neutros), inorgânicos, voláteis e não voláteis representa uma classificação útil. • Material de apreensão, como drogas de abuso (anfetaminas, opioides, cocaína etc.), e medicamentos podem requerer apenas liberação do(s) analito(s) da matriz, por técnica de diluição em solvente, homogeneização e centrifugação, enquanto matrizes complexas, como solo e alimentos, e matrizes biológicas requerem, em geral, técnicas mais elaboradas de extração. • Em alguns casos, é necessário adotar, previamente à extração, a liberação do analito ou a retirada de interferentes, por exemplo, a análise de sangue total requer a precipitação de proteínas com solventes (acetonitrila, metanol etc.) ou sais (sulfato de zinco) seguida de centrifugação. • Analitos eliminados na forma conjugada com ácido glicurônico ou sulfato requerem a hidrólise química ou enzimática, a fim de deixá-los livres para serem extraídos. (CARVALHO et al., 2013) (MOREAU, 2014)(QUEIROZ; BERGAMASCHI; QUEIROZ, 2016) 13 14 18/03/2021 • Quando são esperadas baixas concentrações dos analitos, a técnica de extração deve conter a etapa de concentração. • As técnicas mais comumente utilizadas na extração e/ou na pré- concentração dos compostos são: � extração líquido-líquido (LLE), �extração em fase sólida (SPE), �microextração em fase sólida (SPME) e, �no caso de compostos voláteis, extração por headspace. • Analitos presentes em algumas amostras sólidas, tais como vegetal (maconha, haxixe, folhas de coca), solo e óleos, podem ser extraídos diretamente com solventes, desde que os compostos de interesse sejam miscíveis e ocorra separação de fases. • O rendimento da extração pode ser melhorado se forem utilizadas menores quantidades de solvente extrator de forma seriada, ou seja, é mais eficiente extrair várias vezes determinado volume de amostra, com menores quantidades de solvente orgânico, do que uma única vez,com grande quantidade de solvente. 15 16 18/03/2021 1.1 Extração líquido-líquido (ELL) • A ELL se fundamenta na afinidade dos analitos entre duas fases imiscíveis, aquosa (polar) e orgânica (apolar) sendo esta a fase extratora. • Os analitos presentes na matriz aquosa irão migrar para a fase extratora, atingindo um equilíbrio de distribuição entre as duas fases imiscíveis. • O objetivo é forçar a migração dos analitos para a fase extratora que, sendo apolar e volátil, poderá ser evaporada promovendo sua concentração. • Quanto mais apolar (lipossolúvel) for o analito, maior a afinidade pela fase orgânica extratora. • As variáveis para otimização na ELL são tipo de solvente extrator, pH da fase aquosa, proporção das fases aquosa e orgânica, tempo de agitação e repouso. (QUEIROZ; BERGAMASCHI; QUEIROZ, 2016). 1.1 Extração líquido-líquido (ELL) • A eficiência da extração depende da afinidade do analito investigado pelo solvente de extração, da razão das fases e do número de extrações. • O processo envolve a adição do solvente extrator seguida de agitação mecânica para promover o máximo de contato entre as fases orgânica e aquosa. • Posteriormente, a mistura é submetida à centrifugação para otimizar a separação entre as fases e então a fase de interesse é recolhida para análise. 17 18 18/03/2021 1.1 Extração líquido-líquido (ELL) • Atualmente, métodos mais eficientes na extração e concentração dos analitos estão disponíveis. • Contudo, devido à sua rapidez, simplicidade e grande número de solventes extratores existente, a LLE ainda é amplamente aplicada em análises toxicológicas. • Um dos principais problemas associados a esta técnica analítica é a geração de resíduos de solventes, muitas vezes mais tóxicos do que o próprio analito de interesse, e que pode afetar tanto o analista pela exposição durante o processo, como o meio ambiente pela dificuldade no descarte do mesmo 1.1 Extração líquido-líquido (ELL) • A fase aquosa é representada pela matriz (urina, sangue, humor vítreo e tecidos homogeneizados em soluções aquosas), que pode ser diluída em solução tampão ou ter ajustado o pH e misturada com clorofórmio, acetato de etila, n-hexano, éter de petróleo, diclorometano ou outros solventes apolares representando a fase orgânica. • O rendimento da ELL será melhorado pela adição de sais higroscópicos que aumentem a força iônica e a polaridade da fase aquosa, tais como cloreto de sódio ou sulfato de sódio anidro. A adição do sal higroscópico irá diminuir as camadas de solvatação, ou seja, irá atrair as moléculas de água que circundam as moléculas de analito, favorecendo sua migração para o solvente apolar – este efeito é chamado salting out. (QUEIROZ; BERGAMASCHI; QUEIROZ, 2016) 19 20 18/03/2021 21 22 18/03/2021 1.2 Extração por headspace • A técnica headspace, empregada na extração de compostos voláteis, está baseada na separação pelo ponto de ebulição do analito – que deverá ser inferior ao da água. • A matriz é inserida em um recipiente de vidro, de modo que se tenha um espaço vazio entre a amostra e a tampa do recipiente. • Após lacrar o recipiente, a amostra é aquecida pelo tempo necessário para que se alcance um equilíbrio dinâmico entre as moléculas em estado de vapor e presentes na amostra. • O vapor contido no espaço “vazio” é coletado com o auxílio de uma seringa e injetado no equipamento de cromatografia gasosa (GC). (QUEIROZ; COLLINS; JARDIM, 2001)(OLIVEIRA, 2016) 1.2 Extração por headspace • Essa técnica é a mais empregada nos métodos de quantificação de etanol em sangue (alcoolemia) com finalidade forense e em análises de urgências toxicológicas, mas também pode ser empregada na identificação de tolueno, n- hexano, metanol e outros compostos voláteis em matrizes não biológicas e biológicas. • O headspace também pode ser aplicado de forma combinada com a microextração em fase sólida, na qual se insere uma fibra no espaço vazio, para que os compostos voláteis adsorvam no material da fibra, o qual posteriormente será exposto no injetor do GC (figura 1). (QUEIROZ; COLLINS; JARDIM, 2001), (MIHRETU et al., 2020), (CORRÊA, 2016) 23 24 18/03/2021 • Processo de extração e pré- concentração dos analitos pela técnica de micro extração em fase sólida (SPME): • a) headspace e • b) direta 25 26 18/03/2021 1.3 Microextração em fase sólida 1.3 Microextração em fase sólida • A microextração em fase sólida foi desenvolvida em 1990 por Arthur e Pawliszyn e consiste em uma técnica utilizada principalmente para a extração de compostos orgânicos voláteis e semi-voláteis em amostras aquosas empregando uma seringa modificada contendo micro tubo de aço inoxidável com uma agulha interna. • O micro tubo possui cerca de 1 cm de fibra de sílica fundida revestida com um polímero orgânico. • O método consiste na captura dos analitos em uma fibra capilar de sílica fundida quimicamente modificada, recoberta com uma película de material apropriado, com posterior análise direta por técnicas cromatográficas de alta eficiência tais como cromatografia em fase gasosa e cromatografia em fase líquida. 27 28 18/03/2021 1.3 Microextração em fase sólida • No mercado, há vários tipos de fibra, a ser selecionada de acordo com a polaridade do(s) analito(s); • a mais comumente empregada na análise de compostos apolares é a fibra recoberta do polímero polidimetilsiloxano, do inglês polydimethylsiloxane (PDMS), na espessura de 100μm. • Porém, há fibras recobertas com poliacrilato (compostos polares, principalmente fenóis), divinilbenzenopolidimetilsiloxano (compostos polares, principalmente aminas), polidimetilsiloxanocarboxen (analitos de baixo peso molecular), carbowax-divinilbenzeno (analitos polares, principalmente álcoois) e divinilbenzeno-carboxen-polidimetilsiloxano (analitos polares e apolares) (BORDIN et al., 2015) 1.3 Microextração em fase sólida • O procedimento de extração empregando a SPME pode ser realizado de duas maneiras. • A primeira consiste na imersão direta da fibra na amostra mantendo-a sob agitação durante a extração do analito. • E a segunda é através da utilização da técnica de headspace, na qual a amostra é aquecida e os componentes voláteis são adsorvidos na fibra. • É essencial que as condições para extração em fibra de SPME sejam otimizadas tais como pH, concentração de sal (para efeito de salting-out), o volume da amostra, tempo e velocidade de agitação da amostra, temperatura e tempo de extração. 29 30 18/03/2021 1.3 Microextração em fase sólida • Após o processo de extração, os analitos concentrados na fibra são dessorvidos termicamente através da introdução da fibra no injetor aquecido de um cromatógrafo em fase gasosa. • A dessorção também pode ser realizada por cromatografia em fase líquida, utilizando o próprio solvente da fase móvel. • As principais vantagens da técnica são alta sensibilidade, seletividade e precisão, possibilidade de automação e eliminação do uso de solventes. • As desvantagens são os elevados custos associados à técnica, fragilidade da fibra e elevado tempo de extração. 1.4 Extração em fase sólida 31 32 18/03/2021 1.4 Extração em fase sólida • A extração em fase sólida (SolidPhaseExtaction-SPE) é baseada no princípio de separação à base de afinidade como cromatografia em fase líquida, consistindo na separação líquido-sólido. • Nas etapas dessa técnica incluem-se retenção e eluição de analitos do fluido biológico, remoção de interferentes e concentração da amostra. 33 34 18/03/2021 1.4 Extração em fase sólida • Devido à variação de propriedades físico-químicas de analitos de interesse estes formatos tradicionais não são sempre adequados e a disponibilidade de diferentes fases estacionárias e diferentes abordagens são necessárias. • Nesta técnica, os analitos contidos numa matriz aquosa são extraídos, juntamente com os compostos interferentes, após passarem por um cartucho contendo um sólido sorvente.• Um solvente orgânico seletivo é geralmente utilizado para remover os interferentes e então, outro solvente é usado para retirar os analitos de interesse da fase. 1.4 Extração em fase sólida • Os mecanismos de retenção são idênticos àqueles envolvidos em cromatografia líquida em coluna. • Um cartucho típico é formado por um tubo de polipropileno contendo cerca de 50 a 500 mg de adsorvente, com 40-60 μm de tamanho de partícula, fixado no tubo através de dois filtros. • Em geral, o procedimento de extração é dividido em cinco etapas: • ativação do adsorvente, para deixar os sítios ativos disponíveis; • condicionamento do adsorvente com solvente adequado, para ajustar as forças do solvente de eluição com o solvente da amostra; • introdução da amostra, quando ocorre a retenção do analito e, eventualmente, de alguns interferentes; • limpeza da coluna, para retirar os interferentes menos retidos que o analito; • e, por fim, a eluição e a recuperação do analito (QUEIROZ; COLLINS; JARDIM, 2001)(CHEN et al., 2008). 35 36 18/03/2021 1.4 Extração em fase sólida • Estão disponíveis comercialmente vários adsorventes, dentre eles carvão ativado, alumina, sílica gel, silicato de magnésio (Florisil), fase quimicamente ligada e polímeros. • Tradicionalmente a SPE está disponível nos modos de fase normal, de fase reversa e de troca iônica; no entanto, um dos formatos mais utilizados é o de fase reversa. • Os grupos mais frequentemente empregados como adsorventes à base de sílica quimicamente ligada podem ser divididos em: • fase reversa (quando o adsorvente é menos polar do que o solvente de eluição), • fase normal (quando o solvente é menos polar do que o adsorvente) • e troca iônica. (QUEIROZ; COLLINS; JARDIM, 2001) 1.4 Extração em fase sólida • A SPE convencional oferece várias vantagens destacando-se o consumo de menores volumes de solventes em relação à LLE, o menor tempo de operação da técnica, a alta recuperação dos analitos e a possibilidade de automação. 37 38 18/03/2021 39 40 18/03/2021 41 42