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<p>2019</p><p>Economia BrasilEira</p><p>contEmporânEa</p><p>Prof.a Josélia E. Teixeira</p><p>Prof.a Pollyanna Rodrigues Gondin</p><p>1a Edição</p><p>Copyright © UNIASSELVI 2019</p><p>Elaboração:</p><p>Prof.a Josélia E. Teixeira</p><p>Prof.a Pollyanna Rodrigues Gondin</p><p>Revisão, Diagramação e Produção:</p><p>Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI</p><p>Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri</p><p>UNIASSELVI – Indaial.</p><p>Impresso por:</p><p>T266e</p><p>Teixeira, Josélia Elvira</p><p>Economia brasileira contemporânea. / Josélia Elvira Teixeira; Pollyanna</p><p>Rodrigues Gondin. – Indaial: UNIASSELVI, 2019.</p><p>200 p.; il.</p><p>ISBN 978-85-515-0317-1</p><p>1. Brasil – Condições econômicas. - Brasil. I. Gondin, Pollyanna Rodrigues.</p><p>II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci.</p><p>CDD 330.981</p><p>III</p><p>aprEsEntação</p><p>É valioso para a sua formação entender o percurso ao longo da</p><p>história da Economia Brasileira. É um desafio sintetizar os principais fatos</p><p>e desdobramentos históricos e de como estes impactaram nos principais</p><p>indicadores e implicou no rumo da economia do país.</p><p>Assim, iniciaremos nosssos estudos com a Unidade 1. Esta unidade</p><p>está dividida em três tópicos, sendo que o primeiro aborda o período da</p><p>industrialização pesada, o segundo, o período marcado pelo endividamento</p><p>e o “Milagre Econômico”, iniciando com a crise política que ocorreu nos anos</p><p>de 1960. Já o terceiro tópico, abordará a crise do modelo de subsituição de</p><p>importação, a crise inflacionária da década de 1980 e o fim dos governo militares.</p><p>Nesta primeira unidade, você irá se debruçar mais afundo sobre a</p><p>evolução da economia brasileira pós Segunda Guerra Mundial. Mas, para</p><p>isto, retornaremos um pouco na história para que você perceba que a crise</p><p>que ocorreu em 1930, fez com que o modelo econômico brasileiro, baseado</p><p>na agroexportação, sofresse forte declínio, abrindo margens para o processo</p><p>de industrialização que se iniciou com a Era Vargas.</p><p>Em um segundo momento, iremos estudar o período iniciado</p><p>na década de 1960, que foi marcado por muitas mudanças na sociedade</p><p>brasileira, que passou de uma democracia a uma ditadura militar autoritária</p><p>e repressiva em 1964. Em termos econômicos, passa-se por uma grave crise</p><p>econômica nos primeiros anos da década. A partir de 1967, com a instauração</p><p>do PAEG, a economia brasileira é reestruturada por meio de uma série de</p><p>reformas, o que resulta em uma recuperação econômica iniciada no primeiro</p><p>triênio dos anos 1960 até o primeiro triênio de 1970, quando observa-se o</p><p>chamado “milagre econômico”.</p><p>Após a euforia pelas altas taxas de crescimento da economia no</p><p>período entre 1968 e 1973, o ano de 1974 iria marcar o processo de queda</p><p>do crescimento econômico brasileiro. Além disso, o período entre 1974 e</p><p>1984 marca o esgotamento do modelo de industrialização por substituição</p><p>de importações (PSI), além do final da ditatura militar e transição para a</p><p>restauração da democracia no Brasil.</p><p>Assim, a década de 80 é um caldeirão de experiências econômicas</p><p>que devem ser analisadas e compreendidas. O Brasil passou pelo movimento</p><p>das “diretas já” e começou a conduzir o país para o modelo republicano</p><p>presidencialista e que iria resultar nas primeiras eleições diretas em</p><p>1989. Entretanto, nesta década o Brasil enfrentou inflação, hiperinflação e</p><p>estagflação, para isso, a população ficou sequelada com os vários planos</p><p>econômicos criados para tentar conduzir a economia para a estabilidade, mas</p><p>sem sucesso. Veremos que a condução para as eleições diretas foi um processo</p><p>IV</p><p>político complexo que só se efetivou no final da década, e a estabilização da</p><p>economia brasileira não é um tema para amadores. Além disso, os choques</p><p>externos e os aspectos internacionais também são fatores fundamentais para</p><p>compreender os problemas da economia brasileira como a dívida externa,</p><p>os investimentos externos no país, bem como a vulnerabilidade que o país</p><p>apresentava diante das crises internacionais, especialmente dos outros países</p><p>emergentes da América Latina.</p><p>O desafio é fazê-los montar esse quebra-cabeça, com tantas peças</p><p>e observar de diferentes perspectivas. Portanto, a Unidade 2 terá como</p><p>objetivo apresentar os fatos mais relevantes para discutir sobre a economia</p><p>brasileira e como os planos econômicos desde 1986 até 2002 afetaram as</p><p>principais variáveis socioeconômicas. Entretanto, externamente se fortalecia</p><p>o fenômeno da globalização e se propagavam as ideais do neoliberalismo</p><p>econômico. Vamos ver como o Brasil, fortemente dependente dos credores</p><p>internacionais como o FMI, foi influenciado a aderir ao receituário deliberado</p><p>no Consenso de Washington e induzido a construir uma agenda a ser</p><p>cumprida independente da linha política que se estabelecesse no executivo.</p><p>Vamos continuar a desvendar a economia brasileira, já no início</p><p>do século XXI, na Unidade 3. Nesta unidade você encontrará referências</p><p>para estudo da política econômica nos dois mandatos do Presidente Lula,</p><p>da Presidente Dilma e, após o seu impeachment no segundo mandato, do</p><p>Presidente Temer. Vamos apresentar os principais indicadores e analisar</p><p>como a economia chegou “praticamente” ao pleno emprego e chegou numa</p><p>recessão econômica. Você observará que a economia depende fortemente da</p><p>política e vice-versa. O Brasil passou por uma forte crise política, além dos</p><p>escândalos de corrupção envolvendo agentes do setor público e empresários</p><p>e gestores privados vai culminar no declínio das atividades econômicas e</p><p>descrédito da capacidade do Estado da gestão de políticas públicas e de</p><p>intervenção nas atividades privadas. Este é mais um capítulo do país, e aqui</p><p>buscamos apresentar algumas peças para que você reflita e problematize</p><p>como o economista pode perceber essas peças e como interpretar para ajudar</p><p>em sua função seja na iniciativa pública ou privada.</p><p>Cabe ressaltar que os temas abordados são muito complexos, e os mais</p><p>recentes acontecimentos do século XXI ainda têm suas consequências nos dias</p><p>vindouros, portanto, as informações não são perfeitamente transparentes ou</p><p>disponíveis. Logo, nos serve alguns desses fatos mais como ilustração e de</p><p>como afetaram algumas variáveis macroeconômicas e despertar a análise de</p><p>quais seriam as políticas econômicas praticadas e quais seriam as alternativas.</p><p>Dra. Josélia E. Teixeira e Dra. Pollyanna Rodrigues Gondin</p><p>V</p><p>Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfi m, tanto para</p><p>você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há</p><p>novidades em nosso material.</p><p>Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é</p><p>o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um</p><p>formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.</p><p>O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova</p><p>diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também</p><p>contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.</p><p>Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,</p><p>apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade</p><p>de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.</p><p>Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para</p><p>apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto</p><p>em questão.</p><p>Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas</p><p>institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa</p><p>continuar seus estudos com um material de qualidade.</p><p>Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de</p><p>Desempenho de Estudantes – ENADE.</p><p>Bons estudos!</p><p>NOTA</p><p>Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos</p><p>materiais ofertados a você e dinamizar ainda mais</p><p>os seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza materiais</p><p>que possuem</p><p>em</p><p>equilíbrio, caso contrário significa que ele está devendo para outra nação ou outro Estado</p><p>deve a ele (BATISTA JR., 2002).</p><p>Existem diferentes diagnósticos para a inflação que determinam ações</p><p>variadas. O PAEG diagnosticou a inflação de modo ortodoxo, indicando que o</p><p>déficit público é a causa da inflação, ou seja, que o excesso de oferta de moeda</p><p>aquece a demanda. Isso ocorreu, segundo seus formuladores, pela expansão</p><p>do crédito às empresas e pelos aumentos salariais superiores ao aumento da</p><p>produtividade, provocando a recessão e a subida de preços. Assim, a proposta</p><p>foi a redução dos gastos públicos e a diminuição da inflação em 10%. As ações</p><p>indicadas para a mudança foram: i) controlar contas públicas, ii) adotar uma</p><p>política monetária restritiva, iii) controlar a emissão de moeda e crédito; e iv) uma</p><p>política de contenção salarial, o chamado arrocho salarial.</p><p>Importante salientar que as ações do PAEG se deram em duas frentes: i) nas</p><p>políticas conjunturais de combate à inflação; e ii) nas reformas estruturais, que</p><p>poderiam solucionar os problemas da inflação e eliminar obstáculos ao crescimento.</p><p>Dentre as medidas de combate à inflação, podem se destacar:</p><p>• A redução do déficit público, por meio do aumento das tarifas públicas e da</p><p>reforma tributária. Isso provocou uma redução do déficit público de 4,2 % em</p><p>1963 para 1,1 % em 1966.</p><p>• A restrição do crédito e o aperto monetário por meio do aumento dos juros,</p><p>com encarecimento do crédito e diminuição do consumo e investimento.</p><p>• Uma política salarial, com reajustes que reduziram o salário real.</p><p>Dentro dessa lógica surge a noção de correção monetária, ou seja,</p><p>indexação da economia, que, posteriormente, na década de 1980, representará</p><p>um grave problema para a economia brasileira. Nesse sentido, considerava-se</p><p>que a ausência da correção monetária gerava problemas. Ademais, a inflação</p><p>promoveu os seguintes desafios:</p><p>• um desestímulo à poupança para o sistema financeiro;</p><p>• a lei do inquilinato desestimulava a construção civil, pois os aluguéis não eram</p><p>corrigidos e estavam desatualizados;</p><p>• a desordem tributária promovia atraso nos pagamentos de impostos e reduzia</p><p>a arrecadação do governo.</p><p>TÓPICO 2 | REFORMAS, ENDIVIDAMENTO EXTERNO E O MILAGRE ECONÔMICO</p><p>27</p><p>IMPORTANTE</p><p>O que é a correção monetária?</p><p>Pode-se mencionar que a correção monetária se tornou um elemento que marca</p><p>a economia brasileira desde o PAEG. É uma atualização monetária, que representa a</p><p>adequação da moeda à inflação passada, dentro de um período predefinido. O objetivo</p><p>é compensar as perdas econômicas dos grupos econômicos, como os vendedores, os</p><p>trabalhadores, os donos de imóveis e os investidores do mercado financeiro, com os reajustes</p><p>dos preços na economia, dos salários, dos juros e dos aluguéis. O grande problema é que</p><p>a correção monetária na década de 1980 passou a ser feita diariamente, o que enriqueceu</p><p>os investidores do mercado financeiro com o overnight e promoveu uma hiperinflação na</p><p>economia, prejudicando consumidores e empresários.</p><p>FONTE: <https://blog.rebel.com.br/o-que-significa-correcao-monetaria-qual-a-diferenca-</p><p>com-os-juros/>. Acesso em: 27 out. 2018.</p><p>O PAEG contempla a ideia de tratamento de choque para uma ação mais</p><p>gradual e que teve bons resultados, como a queda da inflação, porém provocou</p><p>também redução do crescimento econômico no período, devido ao crédito caro e</p><p>ao consumo limitado (GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).</p><p>Em termos de reformas estruturais, o PAEG atuou em três linhas, realizando:</p><p>i) uma reforma tributária; ii) uma reforma monetária e financeira; e iii) uma reforma</p><p>da política externa. No âmbito da reforma tributária as ações adotadas foram:</p><p>• A alteração do formato do sistema tributário, com a criação de uma série de</p><p>importantes impostos de tipo valor adicionado, como o Imposto sobre Produtos</p><p>Industrializados (IPI), Impostos sobre Circulação de Mercadorias (ICM) e o</p><p>Imposto sobre Serviços (ISS).</p><p>• A redistribuição dos tributos entre as esferas do governo. Nesse sentido, a</p><p>União ou o governo Federal ficou responsável por recolher o IPI, o Imposto</p><p>de Renda (IR), os Impostos sobre comércio exterior, e o Imposto Territorial</p><p>Rural (ITR), sendo o maior concentrador de fontes de renda. Por sua vez, os</p><p>entes estatais federados ficaram a cargo de recolher o Imposto sobre Circulação</p><p>de Mercadorias (ICM). Já os municípios ficaram responsáveis pelo Imposto</p><p>Predial e Territorial Urbano (IPTU) e o Imposto sobre Serviços (ISS). Além</p><p>disso, foi criado o fundo de Participação de Estados e Municípios. Nota-se um</p><p>processo de centralização das decisões sobre tributação nas mãos da União,</p><p>com o objetivo de eliminar guerra fiscal entre os estados da Federação.</p><p>Na ótica da reforma tributária, surgem ainda os fundos parafiscais FGTS e</p><p>o PIS, que são importantes fontes de poupança compulsória para o setor público.</p><p>Passa-se a adotar a chamada “Inflação corretiva” nas empresas estatais, isto é,</p><p>a correção dos preços públicos (energia, transporte, água etc.). As principais</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>28</p><p>consequências da reforma tributária do PAEG que podemos mencionar foram</p><p>o aumento da arrecadação e a centralização da arrecadação e das decisões</p><p>na União, com subordinação dos estados ao governo central (GREMAUD;</p><p>VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).</p><p>Na ótica da Reforma Monetária-Financeira proposta pelo PAEG as</p><p>seguintes ações foram previstas:</p><p>• A instituição da correção monetária, que estimula juros reais e a criação da</p><p>Obrigação Reajustável do Tesouro Nacional (ORTN) e de outros títulos fixados</p><p>de longo prazo. Nesse sentido, é a variação da ORTN que determina o índice</p><p>de correção monetária. O mercado de títulos públicos se torna então instituído</p><p>no Brasil, com as Letras do Tesouro Nacional (LTN). Lembrando que um</p><p>Mercado de Títulos sofisticado é importante para a expansão das fontes de</p><p>financiamento do governo.</p><p>• A criação das duas principais instituições de execução da política monetária: o</p><p>Conselho Monetário Nacional (órgão normativo) e o Banco Central (Bacen, órgão</p><p>executivo). Isso promoveu uma maior independência da política monetária.</p><p>Ademais, o Banco do Brasil se tornou o agente bancário do governo. O Bacen</p><p>passou a administrar a dívida pública, ao emitir títulos do tesouro nacional e</p><p>moeda. O Bacen, que deveria ser um órgão de controle das contas públicas,</p><p>se transformou em banco de fomento da economia. Pode-se afirmar que essas</p><p>instituições e suas funções formaram um estranho arcabouço institucional que</p><p>mistura política fiscal e monetária.</p><p>• A criação do SFH (Sistema Financeiro de Habitação) e BNH (Banco Nacional de</p><p>Habitação), tendo como agentes a Caixa Econômica e as Sociedades de Crédito</p><p>Imobiliário. As fontes de recursos para o SFH são as cadernetas de poupança,</p><p>as letras imobiliárias e o FGTS.</p><p>• Foi realizada a reforma do mercado de capitais, com a aprovação da lei n. 4728,</p><p>baseada no modelo financeiro norte-americano, com uma forte segmentação do</p><p>mercado. Nesse sentido foram autorizados os seguintes agentes no Mercado:</p><p>1) Bancos comerciais, encarregados do crédito de curto prazo; 2) Financeiros,</p><p>que são agentes de crédito ao consumidor; 3) Bancos de investimento, que</p><p>concedem crédito de médio e longo prazo e 4) Bancos de desenvolvimento,</p><p>encarregados de financiar operações especiais de fomento.</p><p>O PAEG criou também a Bolsa de Valores, subordinada ao Bacen, e se</p><p>operam a compra e venda de ações de empresas com capital aberto, assim como</p><p>o Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR) (GREMAUD; VASCONCELLOS;</p><p>TONETO JÚNIOR, 2011).</p><p>A última frente de reformas foi a da Política Externa, cujo intuito era</p><p>aprimorar o comércio externo brasileiro e atrair capital estrangeiro, mediante:</p><p>TÓPICO 2 | REFORMAS, ENDIVIDAMENTO EXTERNO E O MILAGRE ECONÔMICO</p><p>29</p><p>• Estímulo e diversificação das exportações, por meio da utilização de incentivos</p><p>fiscais e modernização</p><p>de dois órgãos públicos (Cacex). Para garantir o</p><p>crescimento das exportações foram extintos os limites quantitativos para a</p><p>importação e passou a ser a política tarifária como controle e arrecadação. Foi</p><p>proposta a unificação do sistema cambial, com o fim das taxas múltiplas e o</p><p>estabelecimento do sistema de minidesvalorizações (1968) para expansão da</p><p>competitividade das exportações, mas de modo gradual.</p><p>• Atração do capital estrangeiro, com a renegociação da dívida externa e a</p><p>definição de um Acordo de Garantias para o capital estrangeiro, expandindo</p><p>a confiança internacional na economia brasileira. Foi aprovada a Lei n. 4131,</p><p>de 3 setembro de 1962, que permitia acesso direto às empresas brasileiras ao</p><p>Sistema Financeiro Internacional. Por meio da Resolução 63, foi autorizada a</p><p>captação de recursos externos pelos bancos comerciais. Esse processo permitiu</p><p>a internacionalização financeira do Brasil.</p><p>Em relação aos resultados do PAEG, pode-se afirmar que como</p><p>programa de estabilização teve um saldo positivo, pois executou transformações</p><p>institucionais necessárias. O PAEG alterou todo o quadro institucional vigente,</p><p>criando um esquema de financiamento que viabilizaria o crescimento. Ademais,</p><p>confere ao Estado maior capacidade de intervenção, dando base para a retomada</p><p>do crescimento que ocorreu nos anos do milagre econômico. Todavia, importante</p><p>afirmar que isso ocorreu com custos sociais, com uma política recessiva com</p><p>menor possibilidade de consumo e emprego.</p><p>Outro problema do PAEG foi o erro de diagnóstico da inflação, como</p><p>sendo exclusivamente de demanda, o que gerou pressões dos preços agrícolas,</p><p>devido a uma quebra de safra, mostrando que era uma inflação com componentes</p><p>de oferta. Uma crítica realizada foi o autoritarismo na implementação das</p><p>transformações institucionais (liberalismo econômico sem liberalismo político),</p><p>pois não houve envolvimento da sociedade nas decisões. Ademais, notaram-</p><p>se um fortalecimento dos oligopólios e uma desnacionalização da economia,</p><p>com expansão da nossa dependência externa e aumento da exploração da força</p><p>de trabalho, gerando mais desigualdade econômica na sociedade brasileira</p><p>(GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).</p><p>IMPORTANTE</p><p>Quais são os diferentes tipos de inflação?</p><p>A inflação é a alta geral de preços da economia. Podemos indicar que na literatura</p><p>existem três tipos diferentes de inflação: a inflação de demanda, a inflação de oferta e a</p><p>inflação inercial. A inflação de demanda é consequência do excesso de liquidez na economia,</p><p>ou seja, quando há muita moeda na economia e demanda sem uma quantidade adequada de</p><p>produtos, provocando alta de preços. A inflação de oferta ocorre quando algum componente</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>30</p><p>do lado do vendedor tem uma expansão no preço, como aconteceu durante as Crises do</p><p>Petróleo na década de 1970. A alta do preço dos combustíveis era repassada para todos os</p><p>preços da economia, gerando inflação. Já a inflação inercial é aquela que ocorre quando se</p><p>transfere a memória da inflação para os preços atuais, mediante correção monetária, o que</p><p>ocorreu diariamente no Brasil na década de 1980, ocasionando hiperinflação.</p><p>4 O MILAGRE ECONÔMICO (1968 -1973)</p><p>A partir de 1968 até 1973, a economia brasileira apresentou altas taxas</p><p>de crescimento do PIB, com a designação de “Milagre Econômico”. As taxas de</p><p>crescimento do PIB foram capitaneadas pelo crescimento do setor de bens de</p><p>consumo duráveis e menor proporção pelos bens de capital. Desde o Plano de</p><p>Metas buscava-se aumentar, além de incrementar a produção e consumo de bens</p><p>duráveis no Brasil (PIRES, 2010). Vamos analisar como o Brasil atingiu esse nível</p><p>de crescimento e identificar as principais medidas e sua influência na economia</p><p>brasileira nesse período.</p><p>Como pode-se observar na tabela a seguir, o PIB brasileiro chegou a crescer</p><p>14% em 1973. Observe também na tabela que o crescimento foi alavancado pela</p><p>indústria e pelo setor de serviços. “A taxa de investimento, que ficou estagnada em</p><p>torno de 15% do PIB no período de 1964-67, subiu para 19% em 1968 e encerrou o</p><p>período do milagre em pouco mais de 20%” (GIAMBIAGI et al., 2005, p. 82). Nota-se</p><p>que a agricultura, embora tenha um salto em 1971, devido às políticas que priorizaram</p><p>o setor, não obteve o mesmo ritmo de crescimento nos anos subsequentes.</p><p>TABELA 5 – BRASIL – TAXA DE VARIAÇÃO ANUAL DO PIB TOTAL E POR SETORES</p><p>DE ATIVIDADE ECONÔMICA (1968-1980)</p><p>Ano PIB INDÚSTRIA AGRICULTURA SERVIÇOS</p><p>1968 9,8 13,3 4,5 8,9</p><p>1969 9,5 12,1 3,8 11,6</p><p>1970 10,4 11,9 5,6 10,5</p><p>1971 11,3 11,8 10,2 11,2</p><p>1972 11,9 14,2 4,0 12,4</p><p>1973 14,0 17,0 0,1 15,6</p><p>1974 8,2 8,5 1,3 10,6</p><p>1975 5,2 6,2 3,4 11,8</p><p>1976 10,3 10,7 4,2 7,5</p><p>1977 4,9 3,9 9,6 4,1</p><p>1978 5,0 6,4 -2,7 6,2</p><p>1979 6,8 6,8 4,7 7,8</p><p>1980 9,2 9,2 9,5 9,0</p><p>FONTE: IBGE (apud PIRES, 2010, p. 197)</p><p>TÓPICO 2 | REFORMAS, ENDIVIDAMENTO EXTERNO E O MILAGRE ECONÔMICO</p><p>31</p><p>A mudança de governo, sai Castello Branco e assume o ministro do</p><p>Exército Arthur da Costa, que nomeou Antônio Delfim Netto para o Ministério</p><p>da Fazenda. Em 1967 houve flexibilização da política econômica (menos</p><p>rigidez quanto à inflação e incentivo à liberalização do crédito) e foram criados</p><p>instrumentos políticos de coerção (nova Constituição, nova lei de imprensa e</p><p>nova Lei de Segurança Nacional, todas essas medidas restringiam a liberdade</p><p>política) (SOUZA, 2008). Essa mudança de equipe também exigiu certa mudança</p><p>de direcionamento da política econômica, que passou a operar no combate à</p><p>inflação, mas com ênfase no crescimento econômico, pois o governo deposto</p><p>deixou traços na economia de estagflação (HERMANN, 2005).</p><p>As principais causas do crescimento acelerado da economia brasileira no</p><p>período de 1968 a 1973 se encontram nas medidas adotadas no período anterior,</p><p>pois a política salarial e a fiscal do PAEG permaneceram com pouquíssimas</p><p>alterações, tais como as destacadas por Souza (2008):</p><p>• Investimento público.</p><p>• O fortalecimento das empresas estatais.</p><p>• O processo de substituição de importações.</p><p>• As medidas protecionistas.</p><p>• Os mecanismos oficiais de financiamento de empresas nacionais.</p><p>• A legislação de proteção ao trabalho.</p><p>• O desenvolvimento do mercado de trabalho interno etc.</p><p>Além disso, no período, foi utilizada a capacidade produtiva ociosa,</p><p>gerada no período de 1963 a 1967 que foi de estagnação econômica, com golpes</p><p>de Estado e instabilidade política. O investimento público também é marcado</p><p>pelo fortalecimento das estatais, que é acentuado pelo aumento das taxas de</p><p>crescimento da formação bruta de capital fixo, que em 1965 crescia a 13,3% e</p><p>em 1970, passou a 2,3%, e subiu para 23,3% em 1974. Comparando com o setor</p><p>privado, que a taxa anual de crescimento da Formação Bruta de Capital Fixo era de</p><p>15,8%, percebe-se a importância das estatais na elevação das taxas de crescimento</p><p>da economia brasileira (SOUZA, 2008).</p><p>IMPORTANTE</p><p>O que é formação bruta de capital fixo?</p><p>Esse indicador de nome extenso e complicado mede o quanto as empresas</p><p>aumentaram os seus bens de capital, ou seja, aqueles bens que servem para produzir outros</p><p>bens. São basicamente máquinas, equipamentos e material de construção. Ele é importante</p><p>porque indica se a capacidade de produção do país está crescendo e se os empresários</p><p>estão confiantes no futuro.</p><p>FONTE: <http://desafios.ipea.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=2045:-</p><p>catid=28&Itemid=23>. Acesso em: 13 out. 2018.</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>32</p><p>Entretanto, Antônio Delfin Netto pretendia dar uma outra orientação</p><p>para a política econômica desse período por meio do I Plano Nacional de</p><p>Desenvolvimento Econômico (I PND). Delfin Neto parte da premissa que o país</p><p>podia crescer mesmo com uma determinada taxa de inflação. Por isso, o programa</p><p>tinha como foco estimular a demanda, incorporando alguns traços da política</p><p>anterior com a dependência</p><p>externa (SOUZA, 2008). As políticas fiscal e salarial,</p><p>do PAEG, permaneceram com essa equipe econômica. Entretanto, para evitar o</p><p>descontrole da expansão monetária e seus impactos no aumento dos índices de</p><p>inflação, criaram um sistema de controle de preços, que seria gerido pela CONEP</p><p>(Comissão Nacional de Estabilização de Preços) que depois foi trocada pela CIP</p><p>(Comissão Interministerial de Preços). Esse órgão instituiu o tabelamento de</p><p>preços públicos como tarifas, câmbio e juros de crédito público, bem como, vários</p><p>preços de ordem privada como os insumos industriais. Os juros passaram a ser</p><p>instituídos pelo BACEN (HERMANN, 2005).</p><p>Em 1968 Delfin Netto implantou o Plano Estratégico de Desenvolvimento</p><p>(PED). O plano possuía alguns objetivos primordiais a serem alcançados de</p><p>acordo com Giambiagi et al. (2005):</p><p>• Estabilizar os preços, mas sem impor metas explícitas de inflação.</p><p>• Retomada do investimento por meio do fortalecimento da iniciativa privada.</p><p>• Investimento governamental em infraestrutura.</p><p>• Aumento do mercado doméstico por meio do incentivo do consumo dos bens</p><p>de consumo duráveis.</p><p>A tabela a seguir ressalta as taxas de inflação no período de 1960 a 1979.</p><p>Pode-se observar que a inflação estava crescendo desde os governos democráticos,</p><p>mas com o golpe de 1964 houve pressão inflacionária e, a partir de 1965, os preços</p><p>começaram a cair com as medidas de controle de preços entre outras medidas</p><p>adotadas pelo PAEG. No período do “milagre” nota-se que as taxas de inflação</p><p>continuaram caindo até 1973, fim do período de elevado crescimento econômico.</p><p>TABELA 6 – TAXA DE INFLAÇÃO DO BRASIL (1960-1979)</p><p>Anos Taxa de inflação Governo</p><p>1960 30,9</p><p>1961 38,1</p><p>1962 53,2</p><p>1963 78,0</p><p>1964 87,8 Início da ditadura militar -</p><p>Governo Castello Branco (1964</p><p>- 1967)</p><p>1965 55,4</p><p>1966 38,2</p><p>1967 25,0</p><p>Governo Costa e Silva (1967 - 1969)1968 25,5</p><p>1969 20,1</p><p>TÓPICO 2 | REFORMAS, ENDIVIDAMENTO EXTERNO E O MILAGRE ECONÔMICO</p><p>33</p><p>Anos Taxa de inflação Governo</p><p>1970 19,3 Governo Medici (1969 - 1974)</p><p>1971 19,5</p><p>1972 15,7</p><p>1973 15,5</p><p>1974 34,5</p><p>Governo Geisel (1974 – 1979)</p><p>1975 29,4</p><p>1976 46,3</p><p>1977 38,8</p><p>1978 40,8</p><p>1979 77,2 Governo Figueiredo (1979 - 1985)</p><p>FONTE: Adaptado de Lopes e Rossetti (1998, p. 358)</p><p>A economia brasileira estimulada pelo PED iniciou em 1968, em um</p><p>período de crescimento com a diminuição dos índices de inflação e com o</p><p>equilíbrio do balanço de pagamentos que passou a apresentar superávits. A fase</p><p>denominada como “Milagre Econômico” pode ser atribuída a dois grupos de</p><p>fatores: primeiro, as condições econômicas e políticas propícias e, em segundo,</p><p>a capacidade governamental de aproveitar as boas condições econômicas que se</p><p>apresentaram naquele cenário (HERMANN, 2005).</p><p>A política de minidesvalorização cambial, a partir de 1968, também</p><p>evitou desequilíbrios na balança comercial e evitou a queda da atividade</p><p>econômica interna. Na seara fiscal, o governo reduziu o déficit primário por</p><p>meio do fortalecimento das estatais e maior participação em investimentos</p><p>públicos em infraestrutura. Mesmo com o afastamento do general Costa e Silva</p><p>da presidência, a política econômica foi mantida pelo novo presidente, general</p><p>Médici (1969-1973). Entretanto, o regime militar tornou-se mais acirrado a partir</p><p>de 1968 (HERMANN, 2005).</p><p>[...] no campo político, porém, o período marca uma fase de nítida</p><p>radicalização do regime autoritário. Em resposta às inúmeras</p><p>manifestações contrárias ao regime militar desde 1964, em dezembro</p><p>de 1968, o governo Costa e Silva decretou o AI-5 (Ato Institucional</p><p>nº 5), que suspendeu as garantias constitucionais, fechou o Congresso</p><p>por tempo indeterminado e cassou mandatos de políticos opositores</p><p>ao regime. Seguiu-se um longo período, conhecido como “anos de</p><p>chumbo”, marcado por prisões arbitrárias (e sem qualquer direito</p><p>de defesa por parte do acusado), torturas e deportações de cidadãos</p><p>considerados “subversivos da ordem” – leia-se, críticos ao regime</p><p>autoritário. Esse ambiente político favoreceu, indiretamente, a política</p><p>anti-inflacionária do governo, calcada no controle direto de preços e</p><p>na contenção dos salários reais (HERMANN, 2005, p. 85-86).</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>34</p><p>IMPORTANTE</p><p>FONTE: <https://www1.folha.uol.com.br/folha/treinamento/hotsites/ai5/personas/</p><p>arthurDaCostaESilva.html>. Acesso em:</p><p>Arthur da Costa e Silva</p><p>O que foi o AI-5?</p><p>O Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968, marcou o início do período</p><p>mais duro da ditadura militar (1964-1985). Editado pelo então presidente Arthur da Costa</p><p>e Silva, ele deu ao regime uma série de poderes para reprimir seus opositores: fechar o</p><p>Congresso Nacional e outros legislativos (medida regulamentada pelo Ato Complementar</p><p>nº 38), cassar mandatos eletivos, suspender por dez anos os direitos políticos de qualquer</p><p>cidadão, intervir em Estados e municípios, decretar confisco de bens por enriquecimento</p><p>ilícito e suspender o direito de habeas corpus para crimes políticos. O ministro da Justiça,</p><p>Gama e Silva, anunciou as novas medidas em pronunciamento na TV à noite.</p><p>Os primeiros efeitos do AI-5 foram percebidos naquela mesma noite. O Congresso é</p><p>fechado. O presidente Juscelino Kubitschek, ao sair do Teatro Municipal do Rio — quando foi</p><p>paraninfo de uma turma de formandos de engenharia — foi levado para um quartel em Niterói,</p><p>onde permaneceu preso em um pequeno quarto por vários dias, sem roupa para trocar e nada</p><p>para ler. O governador Carlos Lacerda foi preso no dia seguinte pela PM da Guanabara. Após</p><p>uma semana em greve de fome, conseguiu ser libertado. Para driblar a censura, o "Jornal do</p><p>Brasil" tenta dar a dimensão dos acontecimentos na sua seção de meteorologia:</p><p>Previsão do tempo:</p><p>Tempo negro.</p><p>Temperatura sufocante.</p><p>O ar está irrespirável.</p><p>O país está sendo varrido por fortes ventos.</p><p>Máx.: 38º, em Brasília. Mín. :5º, nas Laranjeiras.</p><p>(Publicado no Jornal do Brasil, no dia seguinte à decretação do AI-5).</p><p>Acessando o site disponível no endereço https://www1.folha.uol.com.br/folha/</p><p>treinamento/hotsites/ai5/index_ppal.html?var=site, você também encontrará o AI-5 em sua</p><p>íntegra, fotos dos governantes e áudios completos da leitura do Ato.</p><p>FONTE: <https://www1.folha.uol.com.br/folha/treinamento/hotsites/ai5/ai5/index.html>.</p><p>Acesso: 13 out. 2018.</p><p>FIGURA - COSTA E SILVA</p><p>TÓPICO 2 | REFORMAS, ENDIVIDAMENTO EXTERNO E O MILAGRE ECONÔMICO</p><p>35</p><p>Embora muitas medidas da política anterior continuaram, o divisor da</p><p>concepção de Delfin Netto de política de desenvolvimento se apoiava na agricultura</p><p>e nas exportações. No início dos anos 70, o economista anunciava a estratégia pautada</p><p>no modelo agrícola e exportador, que responderia pela insuficiência da demanda</p><p>do mercado interno. O Governo Médici adotou a agricultura como sua prioridade,</p><p>e assim, foram implementadas políticas públicas para aumentar a produtividade</p><p>desde redução de impostos à expansão do crédito agrícola, paralelamente há o</p><p>impulso para a indústria de tratores e máquinas agrícolas (MACARINI, 2005).</p><p>As exportações cresceram a taxas acumuladas no período de 1968-73</p><p>275%, enquanto que as importações cresceram 330%. Esse aumento expressivo das</p><p>importações também demonstra a dependência externa, especialmente em relação</p><p>a bens de capital e insumos, como o petróleo e derivados (HERMANN, 2005).</p><p>Embora as exportações de manufaturados tenham crescido a taxas acumuladas</p><p>de 639%, ainda assim, entre 1971 a 1972 a balança comercial fechou em déficit.</p><p>“Com o apoio de diversas políticas públicas — creditícias, tributárias, tarifárias</p><p>e cambial — foi possível uma diversificação maior da pauta de exportações em</p><p>direção a produtos manufaturados” (IPEA, 2010, p. 11).</p><p>A conta de serviços e rendas registrou déficits recorrentes, saltando de</p><p>US$600 milhões em 1967 para US$2,1 bilhões em 1973. Isso foi resultado das</p><p>despesas com juros e remessas de lucros enviadas ao exterior. No mesmo período,</p><p>a dívida externa aumentou de</p><p>US$3,4 bilhões para US$14,9 bilhões, entretanto o</p><p>endividamento financiou o déficit em conta corrente, possibilitando o acúmulo</p><p>de reservas internacionais pelo BACEN (HERMANN, 2005).</p><p>De acordo com Furtado (1982), o fortalecimento do mercado de bens duráveis</p><p>de consumo e a política de geração de empregos e de subsídio à exportação que</p><p>patrocinaram o crescimento da economia a partir de 1968. Entretanto, este mesmo</p><p>autor lembra que a ação governamental de geração de empregos foi favorecida</p><p>pela diminuição do salário real e do endividamento externo.</p><p>Da política anterior ainda existiam os resquícios da queda do salário</p><p>real dos trabalhadores em contraposição ao aumento da rentabilidade das</p><p>empresas. “De 1964 a 1968, a produtividade aumentou em 23%, enquanto</p><p>baixou em 28% o salário real mais frequente em São Paulo, em 25% o salário dos</p><p>metalúrgicos paulistas e em 35% o salário mínimo real” (SOUZA, 2008, p. 80).</p><p>Os dados demonstram que os salários são baixos no Brasil não apenas porque a</p><p>produtividade é baixa, mas também porque os lucros são excessivamente altos</p><p>(BRESSER PEREIRA, 1994). Isso aprofundou a desigualdade de renda entre os</p><p>mais ricos e os mais pobres do país.</p><p>Observe a tabela a seguir. Em 1960, 39,6% da riqueza concentrava-se com</p><p>10% dos mais ricos, enquanto que a concentração de riqueza foi elevando no</p><p>decorrer das décadas. Em 1970, 46,7% da riqueza concentra-se com 10% dos mais</p><p>ricos e sobe a concentração para 50,9% da renda em 1980.</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>36</p><p>TABELA 7 – DISTRIBUIÇÃO DE RENDA POR ESTRATOS DE RENDIMENTOS</p><p>NO BRASIL (1960 – 1980) EM %)</p><p>Estratos</p><p>Ano</p><p>1960 1970 1980</p><p>50% mais pobres 17,4 14,9 12,6</p><p>40% renda média 43,0 38,4 36,5</p><p>10% mais ricos 39,6 46,7 50,9</p><p>Total 100,0 100,0 100,0</p><p>5% mais ricos 28,3 34,1 37,9</p><p>1% mais rico 11,9 14,7 16,9</p><p>FONTE: IBGE (apud PIRES, 2010, p. 1975)</p><p>Quando esses dados de distribuição de renda de 1970 foram divulgados,</p><p>Antônio Delfin Neto proferiu a seguinte frase: “devemos deixar o bolo crescer</p><p>para depois repartir” (SOUZA, 2008, p. 80). O bolo cresceu (PIB), mas não foi</p><p>repartido. Como pode-se observar, os mais ricos ficaram com o bolo e a maioria</p><p>da população continuou em precárias condições socioeconômicas.</p><p>IMPORTANTE</p><p>Quando foi criado o PIS/PASEP?</p><p>“PIS significa Programa de Integração Social e do Fundo Único do Programa</p><p>de Formação do Patrimônio do Servido Público, instituído de modo independente pelo</p><p>Governo Federal em 1970 e unificado em 2 de setembro de 1975” (PIRES, 2010, p. 210).</p><p>Em 1970, são instituídos os fundos PIS/PASEP, refletindo a preocupação</p><p>oficial com a injusta distribuição de renda. As Metas e Bases para a</p><p>Ação do Governo identificariam aí um dos “grandes problemas éticos</p><p>do nosso tempo” – mas explicitamente descartavam qualquer “excesso</p><p>redistributivista que sacrifique a aceleração da taxa de crescimento</p><p>nacional (MACARINI, 2005, p. 71).</p><p>Os esforços para industrializar e diversificar a indústria brasileira</p><p>esbarravam na distribuição de renda. Se por um lado a política econômica</p><p>adotada a partir de 1968 buscava corrigir as distorções entre a inflação interna</p><p>e externa, medidas para melhorar a distribuição de renda não foram adotadas,</p><p>dessa forma, o crescimento favorecido por salários reais mais baixos desencadeou</p><p>o enfraquecimento do mercado interno.</p><p>TÓPICO 2 | REFORMAS, ENDIVIDAMENTO EXTERNO E O MILAGRE ECONÔMICO</p><p>37</p><p>De acordo com Bresser Pereira (1994), esse modelo de subdesenvolvimento</p><p>industrializado iniciou-se em 1964 e é típico do modelo de alta concentração de</p><p>renda sem que o país obtenha expressiva taxa de acumulação de capital, pois</p><p>geralmente o excedente é gasto em consumo de bens de luxo e não em poupança</p><p>e investimento produtivo:</p><p>No plano político o modelo de subdesenvolvimento industrializado</p><p>corresponde ao Estado autoritário tecnoburocrático-capitalista, que se</p><p>instala no Brasil a partir de 1964. O Estado, que substitui a aliança</p><p>populista do modelo de industrialização substitutiva de importações,</p><p>é marcado pela unidade da burguesia mercantil e industrial (que fora</p><p>quebrada no período populista) e pela aliança da burguesia com a</p><p>tecnoburocracia pública e privada, civil e militar, e com as empresas</p><p>multinacionais. Essa aliança só começará a entrar em colapso a partir</p><p>do final dos anos 70, quando a sociedade civil, em face da crise</p><p>econômica, começa a libertar-se da tutela tecnoburocrático-militar. A</p><p>própria grande burguesia, que fora grande beneficiária dessa tutela,</p><p>começa a pô-la em questão, iniciando-se o processo de abertura</p><p>política (BRESSER PEREIRA, 1994, p. 63).</p><p>Apesar do regime militar facilitar a entrada de capitais estrangeiros</p><p>no país, as corporações transnacionais não ampliaram seus investimentos e</p><p>empréstimos no Brasil até 1968. Essas empresas esperavam por consolidação</p><p>do regime político. Após 1968, viu-se a ampliação do investimento estrangeiro,</p><p>principalmente os eurodólares. Os investimentos privados cresceram a 15,8% ao</p><p>ano de 1970 a 1974 (SOUZA, 2008).</p><p>IMPORTANTE</p><p>O QUE SÃO EURODÓLARES?</p><p>“Depósito em moeda estrangeira, contabilizado por um banco sediado fora do país</p><p>onde ela é emitida; é denominado eurodólar porque os primeiros bancos que aceitaram</p><p>depósitos em dólar estavam na Europa” (CARVALHO; SILVA, 2000, p. 277).</p><p>Outra característica que marcou a economia pós 68 foi o processo de</p><p>monopolização devido à entrada de capitais estrangeiros, promovendo a</p><p>acelerada concentração do capital. Entre as 318 maiores empresas industriais</p><p>existentes em 1972, estas representavam 42% do valor da produção industrial</p><p>no Brasil. Outro aspecto importante foi o de que este processo não se deu por</p><p>meio de novas instalações e capacidade produtiva no país, e sim, pela aquisição</p><p>de empresas brasileiras pelas estrangeiras. No período de 1971 a 1973, 61% das</p><p>transnacionais americanas que se estabeleceram aqui foram através da compra de</p><p>empresas locais (SOUZA, 2008).</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>38</p><p>DICAS</p><p>Leia uma análise da política econômica brasileira que aponta algumas causas do</p><p>crescimento acelerado obtido no período de 1970 a 1973 em MACARINI, José Pedro. Uma</p><p>política econômica do governo Médici: 1970-1973. Nova Economia, Belo Horizonte, v. 15, n.</p><p>3, p. 53-92, dezembro de 2005. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_</p><p>arttext&pid=S0103-63512005000300003&lng=en&nrm=iso.</p><p>As taxas de crescimento do país começam a cair a partir de 1974, isso</p><p>em decorrência do esgotamento do modelo econômico que não se sustentava</p><p>e agravado pela crise econômica mundial, gerada pelos choques do petróleo.</p><p>A economia dependente do mercado externo reduziria suas exportações e</p><p>aumentaria seu passivo e já comprometida com as pressões externas, como</p><p>seguiremos estudando nos próximos tópicos.</p><p>39</p><p>RESUMO DO TÓPICO 2</p><p>Neste tópico, você aprendeu que:</p><p>• Os anos 60 foram considerados de crise na economia brasileira, como</p><p>consequência da política expansionista do período do Plano de Metas. Assim,</p><p>na década de 60 houve aumento da inflação, que atingiu os 90% e redução no</p><p>ritmo de crescimento do PIB. São diferentes as causas que explicam as crises,</p><p>sendo estas causas econômicas e políticas, conjunturais e estruturais.</p><p>• Os governos de Jânio Quadros e João Goulart, com adoção do Plano Trienal, não</p><p>tiveram sucesso em corrigir o problema da inflação e promover o crescimento</p><p>econômico necessário, o que contribuiu para o golpe militar de 1964.</p><p>• Uma das primeiras ações econômicas durante a ditadura militar foi a adoção</p><p>do PAEG, que buscava estabilizar a economia e promover reformas necessárias</p><p>ao futuro crescimento econômico. As medidas buscavam combater a inflação</p><p>e estabilizar a economia por meio da correção monetária. Existiram reformas</p><p>em três diferentes frentes: a reforma tributária, com a expansão dos impostos e</p><p>a centralização da tributação na União; a reforma</p><p>monetária-financeira, com a</p><p>criação do BACEN e do CMN e da bolsa de valores, entre outras medidas, que</p><p>solidificaram o sistema financeiro brasileiro; e a reforma de política externa,</p><p>com a expansão das exportações e a atração do capital estrangeiro.</p><p>• O saldo do PAEG foi positivo, pois conseguiu estabelecer as reformas</p><p>necessárias para estabilizar a economia brasileira. Contudo, permitiu a redução</p><p>dos direitos trabalhistas e acentuou a desiguldade econômica no Brasil e a</p><p>dependência externa.</p><p>• O milagre econômico brasileiro foi denominado assim pela equipe econômica</p><p>de Antônio Delfin Netto. Este período de 1968 a 1973 foi caracterizado por</p><p>forte crescimento das taxas do PIB, redução da inflação e superávit do balanço</p><p>de pagamentos. O crescimento foi sustentado fundamentalmente pela elevada</p><p>participação dos bens de consumo duráveis no PIB.</p><p>• A economia brasileira pós 68 beneficiou-se das medidas adotas no PAEG nos</p><p>anos anteriores. Além disso, o Ministro Antônio Delfin Netto focou no modelo</p><p>de desenvolvimento pautado na exportação de produtos agropecuários,</p><p>frente ao fraco desempenho do mercado interno brasileiro. O crescimento da</p><p>economia foi marcado por perda aquisitiva dos salários reais, aumento da</p><p>rentabilidade das empresas e concentração de renda.</p><p>• A dependência externa do modelo de crescimento experimentado neste</p><p>período se deu em função do incentivo da agricultura para exportação e os</p><p>empréstimos internacionais decorrentes dos petrodólares aumentaram a dívida</p><p>externa brasileira. Ainda, as empresas multinacionais passaram a aumentar as</p><p>remessas para as suas matrizes no período, contribuindo para desestabilizar a</p><p>conta corrente do Balanço de Pagamentos.</p><p>40</p><p>1 Explique o cenário da crise de 1960 e indique como o PAEG conseguiu ter</p><p>sucesso em estabilizar a economia brasileira.</p><p>2 Explique o que foi o período denominado Milagre Econômico e aponte os</p><p>principais fatores que contribuíram para a caracterização desse período.</p><p>3 Quais foram as principais causas que desencadearam o crescimento</p><p>acelerado no período de 1968-73?</p><p>4 Discorra sobre a frase: “Devemos deixar o bolo crescer para depois repartir”</p><p>(Antônio Delfim Netto). Você concorda com o ex-ministro, que é preciso elevar</p><p>as taxas de crescimento sem adotar medidas paralelas de distribuição de renda?</p><p>5 Por que o país aumenta seu endividamento externo? Podemos afirmar que</p><p>o país aumentou sua dependência externa? Justifique sua resposta.</p><p>AUTOATIVIDADE</p><p>41</p><p>TÓPICO 3</p><p>A CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO</p><p>DE IMPORTAÇÃO E A CRISE</p><p>INFLACIONÁRIA NO FINAL DOS</p><p>GOVERNOS MILITARES (1985)</p><p>UNIDADE 1</p><p>1 INTRODUÇÃO</p><p>Após a euforia pelas altas taxas de crescimento da economia no período entre</p><p>1968 e 1973, o ano de 1974 iria marcar o processo de queda do crescimento econômico</p><p>brasileiro. Neste tópico, estudaremos os principais eventos econômicos nacionais e</p><p>internacionais que sucederam nos governos militares após o milagre econômico.</p><p>A conjuntura de bonança internacional caracterizada pela disponibilidade</p><p>de eurodólares despertara cobiça por empréstimos, e aumentará o endividamento</p><p>externo de muitos países, inclusive o Brasil. A dependência externa e o precário</p><p>mercado de consumo interno, devido à grande desigualdade de renda e social,</p><p>conduzirão o país por longos anos de inflação e suscetibilidade aos acontecimentos</p><p>internacionais. Para manter o ritmo de crescimento e não deixar a economia entrar</p><p>em recessão, impactada pelo choque do petróleo e desvalorização do dólar, o</p><p>Governo Geisel adota o II PND para tentar prosseguir com a consolidação do</p><p>parque industrial brasileiro.</p><p>O final do período de 1974 a 1984 marca o esgotamento do modelo de</p><p>industrialização por substituição de importações (PSI), assim como veremos o</p><p>final da ditatura militar e transição para a restauração da democracia no Brasil.</p><p>Vamos tentar compreender essa transição econômica e os principais fatos</p><p>que antecederam esse novo momento histórico: a redemocratização brasileira.</p><p>Bons estudos!</p><p>2 A CRISE INTERNACIONAL E O II PND</p><p>A implantação do II PND, no governo Geisel, complementou o processo</p><p>de industrialização por meio de substituição de importações. Como vimos no</p><p>tópico anterior, a estrutura produtiva do milagre econômico se amparou na</p><p>produção e consumo de bens de consumo duráveis, mas isso gerou um problema:</p><p>o parque industrial brasileiro não conseguia atender à demanda por bens de</p><p>capital e petróleo. Resultado disso, as importações desses bens aumentaram e a</p><p>dependência externa também. O milagre econômico coincidiu com a expansão</p><p>42</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>da economia mundial, entretanto, os efeitos foram paradoxais, como veremos</p><p>neste tópico. Por um lado, contribuíram para o crescimento econômico brasileiro,</p><p>mas, também, a crise internacional teve efeitos na economia doméstica, que</p><p>conduziram o país a mergulhar na crise por várias décadas. Contudo, quais</p><p>seriam as consequências da dependência externa?</p><p>Com o aumento das importações de bens duráveis e petróleo, a dívida</p><p>externa aumentou, e, além disso, a economia brasileira tornou-se mais suscetível</p><p>aos movimentos financeiros da economia mundial. Dessa forma, o Brasil deveria</p><p>apresentar superávits crescentes na sua balança comercial para poder honrar</p><p>com os serviços da dívida (discutiremos mais adiante as consequências da dívida</p><p>externa para a economia brasileira), e o governo deveria controlar os déficits em</p><p>conta corrente (HERMANN, 2005).</p><p>A tabela que segue apresenta a evolução das contas do Brasil. Podemos</p><p>observar que as importações a partir de 1971 ultrapassam as exportações, isso</p><p>devido ao aumento do consumo de bens duráveis e necessidade de petróleo.</p><p>Observe que em 1973 a balança comercial se equilibra, mas nos anos seguintes</p><p>os déficits foram recorrentes até 1976, pois em 1977 o saldo da balança</p><p>comercial apresentou-se positivo, embora tenha sido muito baixo para impactar</p><p>positivamente no BP. Entretanto, a partir de 1978 as importações retomam um</p><p>ritmo mais acelerado do que as exportações e o balanço de pagamentos também</p><p>se apresentou negativo, mostrando que o Brasil estava com problemas para</p><p>efetuar seus pagamentos e honrar seus compromissos.</p><p>TABELA 8 – CONTAS EXTERNAS DO BRASIL (1967-1980, VALORES EM US$ BILHÕES)</p><p>Ano</p><p>Exportações Importações Balança Balanço de Dívida Reservas</p><p>(FOB) (FOB) Comercial Pagamentos Externa Internacionais</p><p>1967 1,7 1,4 0,2 -245 3,3 0,2</p><p>1968 1,9 1,9 0,0 76 3,8 0,3</p><p>1969 2,3 2,0 0,3 549 4,4 0,7</p><p>1970 2,7 2,5 0,2 545 5,3 1,2</p><p>1971 2,9 3,2 -0,3 529 8,3 1,7</p><p>1972 4,0 4,2 -0,2 2.439 11,5 4,2</p><p>1973 6,2 6,2 0,0 2.179 14,9 6,4</p><p>1974 8,0 12,6 -4,7 -936 20,0 5,3</p><p>1975 8,7 12,2 -3,5 -950 25,1 4,0</p><p>1976 10,1 12,4 -2,3 1.192 32,1 6,6</p><p>1977 12,1 12,0 0,1 630 38,0 7,3</p><p>1978 12,7 13,7 -1,0 4.262 52,2 11,9</p><p>1979 15,2 18,1 -2,8 -3.215 55,8 9,7</p><p>1980 20,1 23,0 -2,8 -3.472 64,2 6,9</p><p>FONTE: IPEADATA (apud PIRES, 2010, p. 200)</p><p>TÓPICO 3 | A CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>E A CRISE INFLACIONÁRIA NO FINAL DOS GOVERNOS MILITARES (1985)</p><p>43</p><p>A consequência dos desequilíbrios das contas nacionais pode ser</p><p>observada também na tabela a seguir: o crescimento da dívida externa. Além</p><p>disso, os desequilíbrios apresentados foram endossados pela crise internacional,</p><p>e assim, termina a fase do milagre econômico brasileiro, acompanhada de alta</p><p>dos índices da inflação (PIRES, 2010). Lopes e Rossetti (1998) explicam que foram</p><p>adotadas medidas para tentar diminuir o déficit das transações correntes no</p><p>balanço de pagamentos, mas outros problemas surgiram derivados dessas ações.</p><p>Simonsen (1977 apud LOPES; ROSSETTI, 1998) elenca as principais dificuldades</p><p>surgidas dessas políticas:</p><p>1- A melhor política cambial para a inflação é a pior para o balanço de</p><p>pagamentos.</p><p>2- O deslocamento da agricultura das culturas de mercado interno</p><p>para as de exportação é fator de aumento de preços.</p><p>3- A contenção da demanda de importações, via preços e impostos</p><p>indiretos,</p><p>se é benéfica para o balanço de pagamentos, agrava os</p><p>problemas da inflação.</p><p>4- O aumento das reservas cambiais, se reforça a credibilidade externa,</p><p>prejudica a contenção monetária.</p><p>Além do problema da inflação crescente, de acordo com Sena (1978), o Brasil</p><p>produzia, em 1973, apenas 23,4% do volume total que consumia. Assim, o petróleo</p><p>também se tornou um fator de vulnerabilidade externa do Brasil por sua dependência.</p><p>A tabela que segue apresenta o consumo de petróleo no Brasil desde 1967.</p><p>Observem o consumo crescente no Brasil, pois o país estava em franca expansão</p><p>da indústria e da utilização do petróleo como fonte de energia. Por outro lado,</p><p>os preços do petróleo são pressionados continuamente para cima. Outro aspecto</p><p>importante é o aumento da dependência da importação do petróleo, sendo que 1979</p><p>o Brasil chega a impor 85,7 do petróleo consumido no país. Podemos compreender</p><p>que o país se industrializou, mas, por outro lado, a dependência da importação do</p><p>petróleo era mais um ponto de vulnerabilidade brasileira aos choques externos.</p><p>TABELA 9 – CONSUMO E PREÇOS DO PETRÓLEO PARA O BRASIL – INDICADORES</p><p>SELECIONADOS (1967 -1984 – ANOS SELECIONADOS)</p><p>Ano Total mil m3 Importação (%)</p><p>Preço-Merc. Internacional</p><p>US$/barril</p><p>1967 20.688 58,9 1,80</p><p>1971 30.500 70,8 2,24</p><p>1972 34.986 75,6 2,48</p><p>1973 45.804 80,9 3,29</p><p>1974 47.333 79,8 11,58</p><p>1978 60.919 84,7 13,60</p><p>1979 67.514 85,7 30,03</p><p>1980 60.772 82,7 35,69</p><p>1981 60.370 80,6 34,28</p><p>1982 59.692 76,8 31,76</p><p>1983 61.128 76,8 28,77</p><p>1984 64.029 58,1 28,66</p><p>FONTE: IBGE (2004 apud GIAMBIAGI et al., 2005)</p><p>44</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>No tocante às importações, em 1967 aumentaram significativamente</p><p>as compras na Arábia Saudita, que passou a ocupar a posição da</p><p>Venezuela, como nosso maior fornecedor. Os três principais supridores</p><p>externos eram, na ordem, Arábia Saudita (42,8 %), Venezuela (20,7 %),</p><p>e Iraque (16,2 %). O percentual restante (20,3 %) estava dividido entre</p><p>oito países. Vale notar que dada a abundância de petróleo no mercado</p><p>mundial, permanecia a política de evitar contratos de fornecimento de</p><p>longo prazo. A receita de exportações brasileiras vinculadas às nossas</p><p>compras externas de petróleo situou-se em tomo de 35 milhões de</p><p>dólares (SENA, 1978, p. 79).</p><p>Em 1971 a crise internacional foi disparada por conta dos sucessivos</p><p>aumentos do preço do barril do petróleo. Os principais acontecimentos para a</p><p>elevação dos preços são explanados por Sena (1978).</p><p>Primeiro, o Acordo de Teerã e o decorrente aumento dos preços de</p><p>referência e dos encargos fiscais dos petróleos do Golfo Pérsico, com</p><p>previsão de aumentos escalonados até 1975. Segundo o Acordo de</p><p>Trípoli, com medidas semelhantes para os petróleos do Mediterrâneo.</p><p>Terceiro, a elevação de taxas e impostos na Venezuela, Nigéria</p><p>e Indonésia, e a gradual nacionalização da indústria petrolífera</p><p>na Argélia. Como resultado geral, novos aumentos de preços,</p><p>caracterizando o reconhecimento, por parte dos países produtores de</p><p>petróleo, de seus poderes monopólicos.</p><p>Vale observar que um dos fatores apresentados como justificativa</p><p>para a elevação de preços foi a desvalorização do dólar americano,</p><p>em agosto de 1971. Em função disso, os países produtores passaram</p><p>a querer compensação pela perda de poder aquisitivo verificado em</p><p>suas receitas provenientes do petróleo (SENA, 1978, p. 83- 84).</p><p>Em setembro de 1973 o barril do petróleo estava em US$2,18, em outubro</p><p>passou a US$5,12 e em janeiro de 1974 subiu para US$10,84 (TEIXEIRA, 2006).</p><p>O governo Geisel optou por implementar um modelo de ajuste estrutural</p><p>com o objetivo de minimizar os efeitos externos que estavam impactando</p><p>negativamente no crescimento econômico brasileiro e os efeitos da política</p><p>anterior, que também não se apresentou como autossustentável. Dessa forma,</p><p>medidas que estimulassem a substituição das importações e aumentassem</p><p>a capacidade de exportar tornaram-se alvo do ajuste estrutural proposto no II</p><p>PND, em meados de 1974.</p><p>O II PND reunia um plano de investimentos públicos e privados</p><p>direcionados para setores críticos (identificados neste período) como</p><p>infraestrutura, bens de capital, bens de produção, como capital e insumos,</p><p>energia e exportação (HERMANN, 2005). Ou seja, pretendia-se superar o</p><p>subdesenvolvimento do país. Dessa forma, o II PND tentaria adotar medidas que</p><p>tentassem “acelerar o processo de crescimento, por meio da internalização da</p><p>produção de equipamentos, de insumos industriais e energia, de forma a superar</p><p>os gargalos surgidos no período anterior” (PIRES, 2010, p. 209).</p><p>TÓPICO 3 | A CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>E A CRISE INFLACIONÁRIA NO FINAL DOS GOVERNOS MILITARES (1985)</p><p>45</p><p>No entanto, o país aumentou seu endividamento externo. Mesmo com</p><p>a crise internacional, o Governo Geisel preferiu continuar o endividamento</p><p>externo, adotar medidas de austeridade e enfrentar uma recessão econômica. O</p><p>governo utilizou o BNDE como fonte de financiamento de parte do plano, cuja</p><p>fonte desses recursos se encontrava no PIS e no PASEP, e passou a emitir títulos</p><p>públicos como a ORTN (Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional) e LTN</p><p>(Letras do Tesouro Nacional) (PIRES, 2010).</p><p>Já a partir de 1974-75, a crise internacional restringia fortemente o</p><p>crédito externo aos países subdesenvolvidos, forçando a desaceleração</p><p>da economia brasileira. A ameaça de desvalorização cambial, que</p><p>fatalmente quebraria muitas empresas no país, fez com que o Estado</p><p>assumisse grande parte do endividamento privado, em dólares, o que</p><p>ampliou o rombo nas contas públicas externas e nas finanças públicas</p><p>(CANO, 2017, p. 272).</p><p>De acordo com Pires (2010, p. 209), os principais investimentos do plano</p><p>envolviam os setores destacados no quadro a seguir:</p><p>QUADRO 2 – PRINCIPAIS INVESTIMENTOS PÚBLICOS E PRIVADOS NO II PND</p><p>Setor Medidas</p><p>Petróleo Ampliação da produção interna do petróleo.</p><p>Energia elétrica Construção de hidrelétricas como a Itaipu e a</p><p>construção das usinas nucleares (Angra).</p><p>Produção de insumos</p><p>industriais</p><p>Expansão da produção de insumos como o aço,</p><p>petroquímicos, metais não ferrosos.</p><p>Infraestrutura Expansão das ferrovias como a Ferrovia do Aço e</p><p>projetos rodoviários.</p><p>Mecânica pesada Expansão do setor de mecânica pesada para</p><p>ampliar a produção de máquinas e equipamentos.</p><p>Proálcool</p><p>Programa do governo para incentivar e modernizar</p><p>a agricultura canavieira, com o objetivo de produzir</p><p>álcool combustível para adicionar à gasolina.</p><p>FONTE: Adaptado de Pires (2010, p. 209)</p><p>Essa estratégia de tentar manter o crescimento frente a uma crise internacional</p><p>se justificava por questões políticas e, além disso, alguns dos investimentos feitos</p><p>nos períodos anteriores pelos empresários estavam em processo de maturação, dessa</p><p>forma, poderiam não só frustrar as possibilidades de rentabilidade dos empresários,</p><p>como proporcionar uma crise ainda maior, pelo receio que isso causaria no mercado.</p><p>A estratégia focada no estímulo à indústria de bens de consumo duráveis estava</p><p>consoante com os objetivos de expansão das multinacionais já instaladas no país. O</p><p>crescente aumento de IED e alianças do capital estrangeiro com os setores da classe</p><p>dominante brasileira influíram na política vigente e cercearam o desenvolvimento de</p><p>forma independente (PIRES, 2010).</p><p>46</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>Portanto, depois de 1974 o setor primário e os insumos básicos persistiram</p><p>em um ritmo de crescimento até 1977. O modelo de substituição de importações</p><p>nos ramos de insumos básicos (siderurgia, fertilizantes, metais não ferrosos,</p><p>petroquímicas como nos bens de capital) impactou na redução desses bens e</p><p>insumos com exceção do petróleo. A economia continuou crescendo, embora em</p><p>um ritmo mais lento, até 1980 (SOUZA, 2008).</p><p>Os efeitos do II PND acompanhados do prosseguimento do PSI foram</p><p>diversos de acordo com o setor. O PSI levou à redução</p><p>da participação do capital</p><p>estrangeiro nas empresas do setor I (bens de consumo não duráveis). No setor</p><p>II (de bens duráveis) predominava o capital estrangeiro e estava crescendo mais</p><p>lentamente que o setor I, que era controlado pelos empresários nacionais e pelas</p><p>estatais, entretanto, o PSI evitou a crise do setor de bens duráveis, pois impediu</p><p>que o setor tivesse perdas e entrasse em colapso.</p><p>Além disso, o aumento das exportações após 1974 também contribuiu</p><p>para evitar uma crise maior e equilibrar o balanço de pagamentos. A partir de</p><p>1976, a economia mundial apresentou retomada do crescimento e contribuiu para</p><p>o crescimento das exportações brasileiras (SOUZA, 2008).</p><p>Nos anos de recessão mundial, foi possível impedir a queda do volume</p><p>das exportações graças à intensificação das vendas para os países</p><p>socialistas e outros países do Terceiro Mundo, compensando a redução</p><p>ou estancamento das vendas para os países centrais. Tal resultado</p><p>se deveu, em grande medida, à política do governo brasileiro, que</p><p>acrescentou às exportações já existentes uma ofensiva diplomática,</p><p>adotada pelo governo Geisel, que buscou a aproximação com os países</p><p>socialistas e os regimes progressistas da África cujos países haviam</p><p>sido recém-libertados do domínio colonial português. Essa política foi</p><p>designada de pragmatismo responsável (SOUZA, 2008, p. 136).</p><p>A perda de dinamismo da economia mundial contribuiu para a</p><p>desaceleração do ritmo de crescimento da economia mundial, mas a maior</p><p>abertura da economia aumentou as importações e refletiu no aumento dos preços</p><p>internos, crescendo as taxas de inflação (PIRES, 2010). Observe o gráfico que</p><p>segue. A partir de 1974 a inflação retoma o ritmo ascendente, tendo uma queda</p><p>no ano seguinte, após a implantação das medidas do II PND, mas volta a elevar-</p><p>se em 1976. Elevada inflação e lenta desaceleração da economia vão resultar na</p><p>perda de apoio para a permanência do General Geisel na presidência.</p><p>TÓPICO 3 | A CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>E A CRISE INFLACIONÁRIA NO FINAL DOS GOVERNOS MILITARES (1985)</p><p>47</p><p>GRÁFICO 1 – TAXA DE INFLAÇÃO (1960-1979)</p><p>FONTE: Lopes e Rossetti (1998, p. 358)</p><p>A correção monetária foi criada para evitar as perdas reais por conta</p><p>da taxa de inflação. Entretanto, isso estimulava que os rentistas aplicassem seu</p><p>dinheiro a juros ou praticassem agiotagem de forma ilegal.</p><p>O papel do Estado foi muito marcante neste período, pois o sistema financeiro</p><p>mostrou-se incapaz de coletar poupanças diversas e repassá-las para a iniciativa</p><p>privada investir. Segundo Wilson Suzigan, em 1974, o Estado repassou por meio de</p><p>financiamentos 72,2% destes para investidores (BRESSER- PEREIRA, 1994).</p><p>Sair da fase do subdesenvolvimento e garantir a autonomia do país</p><p>eram desafios cujo projeto não conseguiu alcançar. Como vimos, o setor de bens</p><p>duráveis era controlado por capitais estrangeiros e o modelo de agroexportação</p><p>e o PSI tornavam o país ainda mais dependente da economia mundial. Manter o</p><p>ritmo de crescimento não foi possível após 1973, mas também o governo Geisel</p><p>não quis pagar o preço de ajustes na economia e gerar recessão. Entretanto, a</p><p>economia continuou crescendo. Mas os fatos que sucederam após 1976 vão</p><p>elucidar a crise que começa a se instaurar. Continuaremos analisando a evolução</p><p>da dívida externa e a crise no país na sequência.</p><p>3 A CRISE DA DÍVIDA EXTERNA</p><p>A entrada de capitais para investimentos no Brasil veio sobretudo da</p><p>Alemanha e Japão, na categoria de joint venture para aumentar sua competitividade</p><p>com os Estados Unidos. Os IED (Investimentos Externos Diretos) apresentaram-</p><p>se elevados e após 1976 começou a ocorrer um fluxo maior de remessas dos lucros</p><p>para o exterior. A entrada de empréstimos e financiamentos continuou crescendo</p><p>após 1944 e foi até 1977. No entanto, também os encargos da dívida retornavam</p><p>ao exterior. Após 1977, empresários e governo se endividavam para pagar parte</p><p>das dívidas anteriores, tanto que três quartos dos empréstimos e financiamentos</p><p>eram usados com essa finalidade (SOUZA, 2008).</p><p>48</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>A tabela a seguir apresenta as dívidas externas bruta e líquida e o</p><p>acúmulo de reservas internacionais. Observe que a dívida externa brasileira foi</p><p>crescendo e aumentando a dependência externa do Brasil a cada ano. Além disso,</p><p>para complicar a crise que começava a se instaurar, as reservas internacionais</p><p>começam a cair a partir de 1974 e o balanço de pagamentos apresenta déficits</p><p>recorrentes. Ainda, a inflação dá um salto em 1975, e as taxas de juros são, a cada</p><p>ano, mais elevadas, agravando a crise do setor público.</p><p>TABELA 10 – DÍVIDA EXTERNA BRASILEIRA 1970 – 1979 (US$ MILHÕES)</p><p>Período</p><p>Dívida Externa Reservas Dívida</p><p>Bruta Internacionais Externa</p><p>1970 5.295 1.187 4.108</p><p>1971 6.622 1.746 4.876</p><p>1972 9.521 4.183 5.338</p><p>1973 12.572 6.416 6.156</p><p>1974 17.166 5.269 11.897</p><p>1975 21.171 4.040 17.131</p><p>1976 25.985 6.544 19.441</p><p>1977 32.037 7.256 24.781</p><p>1978 43.511 11.895 31.616</p><p>1979 49.904 9.689 40.215</p><p>FONTE: Teixeira (2006, p. 51)</p><p>Após o período do Milagre, o governo Geisel preferiu endividar e</p><p>aumentar a participação do Estado no financiamento, por meio da utilização</p><p>de empréstimos internacionais, sendo que a “participação do setor privado</p><p>na dívida externa se reduz de 67%, no período 1972/73, para 23% no final da</p><p>década” (OMETTO; FURTUOSO; SILVA, 1995, p. 405). Além disso, o governo</p><p>aumentava seu gasto público principalmente por meio de subsídios e incentivos</p><p>fiscais à indústria e à agricultura (PIRES, 2010).</p><p>Por um lado, o choque do preço internacional do petróleo fez com que</p><p>aumentassem os gastos com a importação do produto, pressionando os custos</p><p>internos e a inflação. Por outro, a necessidade de manter o crescimento também</p><p>reforçou a tomada de empréstimos no exterior para financiar o investimento</p><p>interno. São fatores determinantes para o aumento da dívida externa brasileira.</p><p>TÓPICO 3 | A CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>E A CRISE INFLACIONÁRIA NO FINAL DOS GOVERNOS MILITARES (1985)</p><p>49</p><p>IMPORTANTE</p><p>Sobre a legislação de capitais estrangeiros no Brasil</p><p>A modificação no campo da legislação sobre capitais estrangeiros, com a criação</p><p>de novos instrumentos legais, preparou o terreno internamente para a captação de grandes</p><p>massas de recursos sob a modalidade de empréstimos em moeda, isto é, operações de</p><p>crédito sem qualquer vinculação com transações comerciais. A Lei nº. 4.131, de 3 de</p><p>setembro de 1962, alterada pela Lei nº. 4.390, de 29 de agosto de 1964, que constitui a</p><p>legislação geral sobre capitais estrangeiros, embora tratasse daquela modalidade de crédito,</p><p>e assegurasse a remessa de rendimentos, não contemplava as operações de curto prazo.</p><p>A Instrução 289 da Sumoc, de janeiro de 1965, autorizava empréstimos externos em moeda,</p><p>para capital de giro, por prazos inferiores a 360 dias; além do mais, garantia cobertura</p><p>cambial para o retorno do principal.</p><p>Estando o crédito doméstico restrito pela política econômica em vigor, este</p><p>instrumento serviu de válvula de escape para as empresas estrangeiras, que podiam assim</p><p>dispor de financiamento para suas operações correntes. O mecanismo discriminava as</p><p>empresas nacionais, já que estas não tinham acesso ao mercado financeiro internacional (por</p><p>serem desconhecidas, não terem conta bancária em estabelecimentos estrangeiros etc.). O</p><p>tratamento diferenciado só seria reparado com o advento das resoluções 63 e 64, de agosto</p><p>de 1967, através das quais os bancos comerciais, de investimento, e o BNDE foram autorizados</p><p>a captar recursos externos e a repassá-los a tomadores nacionais, para financiamento de</p><p>capital fixo ou de giro. Mais tarde, com o aumento das facilidades para a captação de recursos</p><p>de longo prazo no mercado internacional, foi extinta a Instrução 289 (pela Resolução 237, de</p><p>outubro de 1972, do Banco Central), ficando a Lei nº. 4.131 e a Resolução 63 como os dois</p><p>instrumentos básicos</p><p>de captação de empréstimos em moeda até os dias de hoje.</p><p>FONTE: FGV. Dívida externa. São Paulo: CPDOC, 2009. <http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/</p><p>dicionarios/verbete-tematico/divida-externa-2>. Acesso em: 28 out. 2018.</p><p>Em 1979, a crise mundial, novamente, se agravou com aumentos do</p><p>preço do petróleo e a crise internacional ainda permaneceria até 1982. A partir</p><p>de 1978 a taxa de juros internacionais continuou a crescer, impactando direto no</p><p>crescimento da dívida externa brasileira. Em 1979, o presidente do FED (Federal</p><p>Reserve System), Paul Volker, aumentou a taxa de juros americana e pronunciou</p><p>ao FMI que o dólar permaneceria como moeda hegemônica internacional e que</p><p>não permitiria sua desvalorização (TAVARES, 1997 apud TEIXEIRA, 2006).</p><p>Por conta dessas medidas, os países endividados, como o Brasil, aumentaram</p><p>ainda mais as suas dívidas e, por consequência, elevou-se a inflação nas economias</p><p>dependentes. Os fluxos de capitais se redirecionaram ainda mais para Estados</p><p>Unidos e países europeus (OMETTO; FURTUOSO; SILVA, 1995).</p><p>A tabela a seguir apresenta a elevação dos juros que eram cobrados para a</p><p>dívida externa brasileira. Ou seja, o montante com juros e amortizações aumentavam</p><p>a cada ano que passava, gerando aumento do déficit no Balanço de Pagamentos.</p><p>50</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>TABELA 11 – TAXA DE JUROS PAGA PELA DÍVIDA EXTERNA BRASILEIRA (%), 1978-1982</p><p>Ano Juros %</p><p>1978 10,9</p><p>1979 13,3</p><p>1980 15,5</p><p>1981 19,6</p><p>1982 19,5</p><p>FONTE: Lopes (1983 apud SOUZA, 2008, p. 146)</p><p>DICAS</p><p>OMETTO, Ana Maria H.; FURTUOSO, Maria Cristina; SILVA, Marina Vieira da.</p><p>Economia brasileira na década de oitenta e seus reflexos nas condições de vida da população.</p><p>Revista de Saúde Pública, São Paulo, n. 29, v. 5, p. 403-414, out. 1995. http://www.scielo.br/</p><p>scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-89101995000500011&lng=en&nrm=iso.</p><p>O artigo trata de analisar os indicadores sociais e os dispêndios das famílias frente à</p><p>crise econômica inflacionária que o Brasil vivia, afetando drasticamente o bem-estar das famílias.</p><p>As remessas de lucros para o exterior aumentaram a partir de 1976, “a</p><p>ponto de a relação entre o lucro legalmente enviado ao exterior e o montante do</p><p>investimento direto ter aumentado de pouco mais de 31% em 1976 para quase</p><p>46% em 1977” (SOUZA, 2008, p. 137). O agravamento da dívida externa e a</p><p>deterioração das contas nacionais geraram uma forte crise econômica no país,</p><p>além disso o regime militar começava a mostrar sinais de abertura e falta de apoio</p><p>do empresariado. A seguir, estudaremos mais sobre a transição presidencial para</p><p>o general Figueiredo e os fatos que desencadearam o fim do regime militar.</p><p>4 O GOVERNO FIGUEIREDO E A ECONOMIA BRASILEIRA</p><p>FRENTE À CRISE INFLACIONÁRIA</p><p>O Brasil, na década de setenta, atingiu um grau de diversificação da</p><p>indústria brasileira e estimulou a produção de bens duráveis. Para tanto,</p><p>era necessário manter a indústria operando em larga escala para manter sua</p><p>lucratividade. O governo poderia elaborar medidas pelo lado da demanda ou da</p><p>oferta. O modelo escolhido foi o de estimular a demanda, criando mecanismos</p><p>de salvaguarda contra as perdas da inflação e que pudessem manter o consumo</p><p>da classe média. Foi utilizada a correção monetária, protegendo a poupança da</p><p>classe média. Além disso, os bancos criaram intermediários financeiros e títulos</p><p>de alta liquidez que também transferiam recursos dos poupadores para aqueles</p><p>que precisavam realizar investimentos (FURTADO, 1982).</p><p>TÓPICO 3 | A CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>E A CRISE INFLACIONÁRIA NO FINAL DOS GOVERNOS MILITARES (1985)</p><p>51</p><p>Por outro lado, o arrocho salarial era utilizado para contenção da</p><p>inflação e manutenção dos ganhos das empresas (FURTADO, 1982). Isso gerou o</p><p>acirramento da luta sindical e campanhas de reposição salarial. Além disso, várias</p><p>manifestações de grupos de empresários já apresentavam descontentamento,</p><p>especialmente do setor de produtos básicos, que eram empresários nacionais.</p><p>Estes chegaram a apresentar um projeto político-econômico, demonstrando</p><p>claramente que iriam buscar o controle do governo. Tais desgastes, do governo</p><p>militar, impulsionaram as campanhas por reposição salarial de 1977. O movimento</p><p>sindical dos metalúrgicos do ACB Paulista, em 1978, abriu precedente para a luta</p><p>de outras categorias e demais regiões do país (SOUZA, 2008).</p><p>Em março de 1979, os metalúrgicos do ABC Paulista voltaram à cena:</p><p>entraram em greve 210 mil metalúrgicos de Santo André, São Bernardo e Diadema,</p><p>greve que durou 14 dias. A reação do governo consistiu em intervir no sindicato e</p><p>cassar os mandatos dos dirigentes sindicais. Com isso, pretendia assinalar os limites</p><p>de seu projeto de abertura política na área sindical. Mas, depois de várias negociações</p><p>e a ameaça de uma nova paralisação, o governo suspendeu as intervenções,</p><p>possibilitando o regresso dos dirigentes a seus postos (SOUZA, 2008, p. 143).</p><p>Na linha sucessória de Geisel, apoiou o general João Baptista Figueiredo,</p><p>ex-chefe do Serviço Nacional de Informações. Enquanto isso, o MDB e os</p><p>empresários também apresentaram uma candidatura alternativa para alavancar</p><p>o processo de abertura e o II PND, indicando o general nacionalista Euler Bentes.</p><p>Uma terceira via era composta pelos generais de linha dura Sylvio Frota e Hugo</p><p>Abreu, que também queriam um candidato próprio. Acabou prevalecendo a</p><p>indicação de Geisel (SOUZA, 2008).</p><p>Isso ocorreu, em grande medida, porque a correlação de forças existentes</p><p>na sociedade ainda não conseguira se expressar no “colégio eleitoral”</p><p>que escolhia o presidente, constituído pelo Congresso Nacional e</p><p>delegados escolhidos indiretamente nos Estados. O “pacote de abril”,</p><p>ao estabelecer que 1/3 dos senadores seria escolhido indiretamente,</p><p>e não pelo voto direto dos eleitores, contribuiu decisivamente para</p><p>mascarar a correlação de forças real (SOUZA, 2008, p. 144).</p><p>O governo do general Figueiredo não altera a política econômica e continua</p><p>no viés desenvolvimentista, mantendo investimentos em energia, insumos básicos</p><p>e estímulo para as atividades direcionadas para exportação, como a agricultura.</p><p>Apesar do PIB continuar apresentando crescimento, a inflação apresenta-se com</p><p>taxas crescentes e a dívida externa também (PIRES, 2010).</p><p>Com o excesso de petrodólares, os empréstimos eram contratados para as</p><p>taxas de juros flutuantes, e os financiamentos a médio e longo prazos renegociados</p><p>às taxas dos contratos. Como havia liquidez não era problemático para os países</p><p>devedores. Entretanto, após 1979, como vimos, os Estados Unidos aumentaram</p><p>sua taxa de juros, diminuindo a liquidez no mercado internacional e provando a</p><p>alta de juros no mercado internacional.</p><p>52</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>Os países devedores, do Terceiro Mundo, começaram a ter problemas</p><p>de saldar seus compromissos da dívida. O problema foi intensificado em 1982,</p><p>quando o México declarou incapacidade de pagar suas obrigações, detonando a</p><p>crise da dívida (CARVALHO; SILVA, 2000).</p><p>A tabela a seguir apresenta a evolução da dívida externa brasileira.</p><p>Observa-se, com o aumento da dívida, que o governo precisa aumentar as reservas</p><p>internacionais para pagar os encargos da dívida. Para o agravamento da situação</p><p>econômica, em 1982 as reservas internacionais declinam.</p><p>TABELA 12 – DÍVIDA EXTERNA BRASILEIRA (1980 -1989 EM US$ MILHÕES)</p><p>Período</p><p>Dívida Externa Reservas Dívida</p><p>Bruta Internacionais Externa</p><p>1.980 53.848 5.853 47.995</p><p>1.981 61.411 6.693 54.718</p><p>1.982 69.654 3.994 65.720</p><p>1.983 81.319 3.972 76.756</p><p>1.984 91.091 11.995 79.096</p><p>1.985 95.857 11.608 84.249</p><p>1.986 101.759 6.760 94.999</p><p>1.987 107.514 7.458 100.056</p><p>1.988 102.555 9.140 93.415</p><p>1.989 99.285 9.679 89.606</p><p>FONTE: Teixeira (2006, p. 52)</p><p>O resultado da adoção de políticas neoliberais no início dos anos 80 pelo</p><p>Reino Unido, sob a liderança de Margaret Thatcher, e pelos Estados Unidos,</p><p>pelo</p><p>presidente Ronald Reagan, influenciou na exportação para tais países. Nos Estados</p><p>Unidos a adoção de medidas monetaristas, como aumento da taxa de juros para</p><p>contenção da inflação, refletiu na redução da oferta monetária, atraiu capitais</p><p>externos e reverteu a desvalorização do dólar. Ainda, diminuiu a liquidez da moeda</p><p>no cenário internacional. O Brasil foi afetado drasticamente em suas exportações de</p><p>matérias-primas e alimentos, reduzindo o seu crescimento (PIRES, 2010).</p><p>A recessão, induzida nos Estados Unidos, reduziu os fluxos comerciais</p><p>no resto do mundo e contribuiu para deflagrar a crise especialmente nos países</p><p>devedores da América Latina. Países exportadores de petróleo, como o México</p><p>e Venezuela, sentiram fortemente a crise, assim como países importadores de</p><p>petróleo, como o Brasil (PIRES, 2010).</p><p>Observe o gráfico a seguir. Até 1980 o PIB brasileiro apresentava elevadas</p><p>taxas de crescimento. Quando tínhamos os reflexos do cenário internacional e</p><p>da política de endividamento e dependência externa, a taxa de crescimento não</p><p>TÓPICO 3 | A CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>E A CRISE INFLACIONÁRIA NO FINAL DOS GOVERNOS MILITARES (1985)</p><p>53</p><p>podia mais ser sustentada e despencou para -4,25%, acabando, assim, com uma</p><p>fase de crescimento econômico. As medidas do Banco Central, de contração da</p><p>oferta monetária, contribuíram para a queda drástica do PIB.</p><p>GRÁFICO 2 - VARIAÇÃO ANUAL DO PIB (%)</p><p>FONTE: Adaptado de Marangoni (2012)</p><p>Os países em desenvolvimento apresentaram redução do crescimento</p><p>entre as décadas de 1960-70 e 1980-90:</p><p>Pode-se mencionar que a taxa média anual de crescimento da formação</p><p>bruta de capital fixo nos EUA caiu de 5,0 no período 1960-68 para 2,5%</p><p>no período 1979-90. No caso da Alemanha, a queda correspondente</p><p>foi de 3,1% para 1,9% e, no caso do Japão, a redução foi de 15,2% para</p><p>5,0% nos períodos mencionados. De fato, essas economias parecem</p><p>estar convergindo para um nível medíocre da ordem de 2% para o</p><p>crescimento do PIB (GONÇALVES, 1999, p. 31-32).</p><p>Como podemos observar, a queda do crescimento nos países em</p><p>desenvolvimento afetou as exportações primárias do Brasil, este que precisa alcançar</p><p>saldos positivos para saldar seus compromissos com a dívida externa. Os índices de</p><p>inflação disparam e o país enfrenta uma das maiores crises de sua história econômica</p><p>logo no início de sua entrada para as denominadas economias industrializadas.</p><p>DICAS</p><p>CANO, Wilson. Brasil - construção e desconstrução do desenvolvimento.</p><p>Economia Sociedade, Campinas, v. 26, n. 2, p. 265-302, 2017.</p><p>Trata-se de um artigo que faz uma reflexão da industrialização e das políticas para o</p><p>desenvolvimento brasileiro desde 1930 até 2016, disponível em: http://www.scielo.br/scielo.</p><p>php?script=sci_arttext&pid=S0104-06182017000200265&lng=en&nrm=iso.</p><p>54</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>O Brasil, México e Argentina, no ano de 1982, possuíam quase 50% do</p><p>total dos empréstimos dos bancos de países desenvolvidos. A crise estourou em</p><p>1982, por conta da insolvência do México, que deixou de pagar os juros aos bancos</p><p>americanos. Ainda, a retração de empréstimos aos países em desenvolvimento</p><p>aguçou mais a queda das atividades econômicas (PIRES, 2010).</p><p>Enquanto isso, no Brasil, as pastas que estavam ocupadas de propor</p><p>soluções para a economia e desenvolvimento enfrentavam sucessivas trocas. No</p><p>Ministério do Planejamento estava Mario Henrique Simonsen e, no Ministério</p><p>da Fazenda, Karlos Heinz Rischbieter. O combate à inflação e manutenção do</p><p>crescimento era prioritário, mas não estavam tendo êxito em sua empreitada. Em</p><p>15 de agosto de 1979, Delfim Netto assume a pasta do Planejamento e o país</p><p>experimentou taxas de crescimento com inflação elevada. A estratégia foi de</p><p>incentivar as exportações primárias por meio de maxidesvalorização cambial da</p><p>ordem de 30% em dezembro de 1979.</p><p>Em 1980, Karlos Heinz Rischbieter pede demissão e no seu lugar assumiu</p><p>Ernane Galvêas. Em outubro de 1980, os credores internacionais não rolaram o</p><p>prazo de pagamento da dívida e o Brasil teve que mudar a política. O Banco</p><p>Central elevou a taxa de juros, e o governo liberou controle de preços e passou</p><p>a cortar os investimentos das estatais (PIRES, 2010). Observe o gráfico a seguir.</p><p>Nele percebe-se que as medidas contracionistas da oferta monetária em 1980 não</p><p>fizeram efeito substantivo nos índices de inflação.</p><p>GRÁFICO 3 – SÉRIE HISTÓRICA DOS ACUMULADOS NO ANO EM PORCENTAGENS – IPCA E INPC</p><p>FONTE: Adaptado de Marangoni (2012)</p><p>TÓPICO 3 | A CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>E A CRISE INFLACIONÁRIA NO FINAL DOS GOVERNOS MILITARES (1985)</p><p>55</p><p>IMPORTANTE</p><p>Qual a diferença entre IPCA E INPC?</p><p>IPCA - O Sistema Nacional de Índices de Preços ao Consumidor — SNIPC produz</p><p>contínua e sistematicamente o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo — IPCA, que</p><p>tem por objetivo medir a inflação de um conjunto de produtos e serviços comercializados</p><p>no varejo, referentes ao consumo pessoal das famílias. A faixa de renda foi criada com o</p><p>objetivo de garantir uma cobertura de 90% das famílias pertencentes às áreas urbanas do</p><p>Sistema Nacional de Índices de Preços ao Consumidor - SNIPC.</p><p>Esse índice de preços tem como unidade de coleta estabelecimentos comerciais</p><p>e de prestação de serviços. É concessionária de serviços públicos e internet e sua coleta</p><p>estende-se, em geral, do dia 01 a 30 do mês de referência.</p><p>Atualmente, a população-objetivo do IPCA abrange as famílias com rendimentos</p><p>de 1 a 40 salários mínimos, qualquer que seja a fonte, residentes nas áreas urbanas das</p><p>regiões de abrangência do SNIPC, as quais são: regiões metropolitanas de Belém, Fortaleza,</p><p>Recife, Salvador, Belo Horizonte, Vitória, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Porto Alegre,</p><p>além do Distrito Federal e dos municípios de Goiânia e Campo Grande.</p><p>INPC - Índice Nacional de Preços ao Consumidor. Média ponderada de índices</p><p>elaborados pela Fundação IBGE para dez regiões metropolitanas brasileiras (São Paulo,</p><p>Rio de Janeiro, Porto Alegre, Curitiba, Belo Horizonte, Salvador, Recife, Belém, Fortaleza e</p><p>Brasília). O INPC é elaborado sob dois conceitos: o amplo, correspondendo a famílias com</p><p>renda mensal entre um a trinta salários mínimos, e o restrito, correpondendo a famílias</p><p>com renda entre um a cinco salários mínimos. O INPC restrito tem sido calculado para dois</p><p>intervalos diferentes de levantamento de preços: um deles relativo ao mês-calendário, e o</p><p>outro correspondente ao período compreendido entre o dia 16 do mês anterior e o dia 15</p><p>do mês de referência. O último cálculo é também denominado IPC, e constitui a base para</p><p>o reajuste ou a indexação de contratos.</p><p>FONTES: IBGE. Índice nacional de preços ao consumidor amplo – IPCA. 2019. <https://</p><p>www.ibge.gov.br/estatisticas-novoportal/economicas/precos-e-custos/9256-indice-</p><p>nacional-de-precos-ao-consumidor-amplo.html?=&t=o-que-e>. Acesso: 30 out. 2018;</p><p>SANDRONI, Paulo. Novo dicionário de economia. São Paulo: Best Seller, 1998. p. 173.</p><p>Após a reeleição indireta de Figueiredo em 1982, o governo pediu ajuda</p><p>ao Fundo Monetário Internacional (FMI), de 4,4 bilhões de dólares, parcelados em</p><p>quatro vezes, mediante o governo assinar carta de intenção e com o FMI do Brasil</p><p>assumir medidas de austeridade. As recomendações do FMI impunham medidas,</p><p>as quais o país seguia a seu modo, e que na realidade não resolveram o problema, e</p><p>o país enfrentou a pior crise da sua história republicana (PIRES, 2010).</p><p>A crise econômica, além de gerar altas taxas de desocupação masculina</p><p>(4,9% no auge da crise, em 1983) e feminina (4,8%, no mesmo ano),</p><p>ainda levou a uma forte retração no mercado de trabalho formal, e,</p><p>em contrapartida, ao crescimento da proporção dos trabalhadores</p><p>sem vínculos formais. Nesse sentido, a participação dos empregados</p><p>sem carteira assinada cresce de 41,9% em 1981 para 47,2% em 1983,</p><p>e apenas em 1987 retorna a níveis próximos aos do início da década</p><p>(41,7%) (OMETTO; FURTUOSO; SILVA, 1995, p. 405).</p><p>56</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>Devido à política contracionista entre 1980 a 1983, o governo teve que enfrentar</p><p>uma forte recessão. A recessão e os efeitos estruturais do II PND contribuíram para</p><p>reverter os déficits na balança comercial, mas não conseguiram impedir a queda nas</p><p>reversas (GIAMBIAGI et al., 2005). O desemprego e a queda do poder aquisitivo da</p><p>massa trabalhadora afetavam dramaticamente o mercado interno:</p><p>Sonia Miriam Draibe aponta um balanço nada animador sobre a</p><p>evolução das turbulências daqueles anos: “No final da década de</p><p>1980, 48,6% da força de trabalho ganhava até dois salários mínimos e</p><p>27,2% da população ocupada recebia um salário mínimo. Para se ter</p><p>uma ideia dos baixos valores salariais e da crescente concentração de</p><p>riqueza, vale assinalar o comportamento de participação da massa</p><p>salarial na renda interna total: cai de 40,79% em 1970 a 37,9% em 1980</p><p>e em 1989 estava estimada em 30% [...]. O Brasil ingressa nos anos</p><p>1990 com cerca de um terço de sua população em estado de pobreza”</p><p>(MARANGONI, 2012, s.p.).</p><p>As receitas do governo também haviam caído e a inflação corroía a receita</p><p>real. Um novo pacote econômico foi proposto em junho de 1983, pelo Conselho</p><p>Monetário, para redução de inflação e para atingir as exigências do FMI.</p><p>Entretanto, o país gerou um superávit comercial para saldar seus encargos com</p><p>o FMI e bancos internacionais. Contudo, o bancos não cumpriram com sua parte,</p><p>e queriam que o Brasil aumentasse seu superávit para pagar mais juros. Assim,</p><p>o governo atrasou os pagamentos e entrou em regime de moratória. A equipe</p><p>econômica de Delfin Netto teve que se preparar nas áreas fiscal e creditícia, pois o</p><p>FMI suspendeu o pagamento de uma parcela. No entanto, uma forte mobilização</p><p>sindical, que teve como resultado uma greve geral, impediu que o Congresso</p><p>aprovasse esse pacote econômico (SOUZA, 2008).</p><p>Insistindo no arrocho salarial, o governo baixou novo pacote impondo o</p><p>Decreto-lei nº 2.045, de 13 julho de 1983, que cortava 20% do INPC na correção</p><p>salarial. A equipe econômica ainda propunha novo pacote e alegava que se o</p><p>Congresso não aceitasse, seriam obrigados a impor novo arrocho salarial.</p><p>Enquanto isso, ficava clara a tendência dos bancos internacionais de pressionarem</p><p>o governo brasileiro a pagar mais juros para entregar parte do empréstimo. Na</p><p>nova carta de intenção junto ao FMI o Brasil elevaria a meta de superávit comercial</p><p>de 6 bilhões de dólares para 9 bilhões de dólares. As medidas, além de impor</p><p>restrições monetárias e credíticas, propunham subsídios para o trigo, cortes nos</p><p>investimentos das estatais. Ficava clara também a preparação do ambiente para</p><p>as multinacionais que teriam outras opções de investimentos. A desestatização e</p><p>o arrocho salarial aumentavam o lucro dos empresários (SOUZA, 2008).</p><p>O decreto não foi aprovado mediante as pressões, mas foi substituído</p><p>pelo Decreto-lei 2.065, de 26 de outubro de 1983, no Congresso. Esse desgaste do</p><p>governo incentivou a pressão para um movimento chamado “Diretas-já”:</p><p>TÓPICO 3 | A CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>E A CRISE INFLACIONÁRIA NO FINAL DOS GOVERNOS MILITARES (1985)</p><p>57</p><p>Emenda apresentada no começo da legislatura de 1983, mais</p><p>precisamente em 2 de março daquele ano, pelo então deputado Dante</p><p>de Oliveira, do PMDB de Mato Grosso. Propunha a convoção de eleições</p><p>diretas para Presidente da República na sucessão de Figueiredo.</p><p>Inaugurada pelo comício de 12 de janeiro de 1984 em Curitiba, a</p><p>“Caravana das Diretas” rodou todo o Brasil e, a partir de 16 de abril, faria</p><p>o comício de encerramento da campanha no Vale do Anhangabaú, São</p><p>Paulo. A Polícia Militar estimou o público presente em um milhão e meio</p><p>de pessoas, mas os jornais chegaram a publicar a cifra de dois milhões.</p><p>Foram as maiores manifestações da história (SOUZA, 2008, p. 163).</p><p>A emenda das “diretas já” foi aprovada na Câmara Federal, e seria o</p><p>fim do regime militar. O ano de 1984 começa a apresentar resultados positivos</p><p>na balança comercial, resultado do PSI, gerando capacidade exportadora</p><p>no período de 1983-1984 (SOUZA, 2008). Entretanto, embora o Brasil fosse</p><p>agora uma economia industrializada, o subdesenvolvimento e as sequelas da</p><p>industrialização tardia perpetuavam.</p><p>O Brasil precisaria aumentar sua capacidade competitiva, além de</p><p>enfrentar os problemas do mercado interno, marcado pela diminuição da renda</p><p>da população, aumento da pobreza, além dos problemas macroeconômicos como</p><p>alta da inflação, arrecadação de receitas, desequilíbrio do balanço de pagamentos</p><p>e desemprego crescente.</p><p>58</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>LEITURA COMPLEMENTAR</p><p>1964: LEMBRANÇAS E TORMENTAS</p><p>Fernando Henrique Cardoso</p><p>Cinquenta e cinco anos passam depressa. A memória se vai, mas ficam</p><p>recordações. No dia 13 de março de 1964 eu estava no Rio, em casa de meu pai.</p><p>À noite fui à Central do Brasil pegar o trem de volta para São Paulo. Meu pai,</p><p>general reformado e ex-deputado federal, residia no Arpoador, no mesmo prédio</p><p>em que moravam minha avó e um tio. Lá também morava Carlos Drummond de</p><p>Andrade. Por Copacabana inteira, passando por Botafogo e pelo Flamengo, havia</p><p>velas acesas nas sacadas de muitos edifícios: a classe média, especialmente a mais</p><p>alta, protestava contra Jango Goulart, presidente da República que convocara</p><p>seus apoiadores a se reunir naquela noite em comício perto da Central do Brasil,</p><p>em frente à Praça da República.</p><p>Tomei o trem indiferente ao que ocorria. Por acaso estavam no trem</p><p>vários amigos: o José Gregori, que viria a ser ministro da Justiça em meu governo,</p><p>Plínio de Arruda Sampaio, que fora meu colega de curso primário no colégio</p><p>Perdizes em São Paulo e se tornaria deputado federal constituinte, e o engenheiro</p><p>Marco Antônio Mastrobono, futuro marido da filha de Jânio Quadros. No jantar,</p><p>conversas e discussões. O “golpe” estava no ar: de quem seria? Não chegamos a</p><p>concluir se dos militares e da “direita”, ou das “forças populares”, com Jango à</p><p>frente, em favor de vagas reformas. Só sabíamos de uma coisa, viesse do lado que</p><p>viesse, sofreríamos as consequências...</p><p>Na época eu era jovem professor-assistente da Faculdade de Filosofia,</p><p>tinha 33 anos e assento no Conselho Universitário da USP como representante</p><p>dos livre-docentes. Pouquíssimos sabiam de minhas relações de família com a</p><p>vida política. Meu pai se elegera deputado federal pelo PTB em 1954. No governo</p><p>de Getúlio, um primo de meu pai havia sido governador do Rio e outro ministro</p><p>da Guerra, o mesmo cargo ocupado por um tio-avô no início dos anos 1930. No</p><p>governo de Juscelino um tio havia presidido o Banco do Brasil.</p><p>Meu pai e muitos familiares pertenciam à ala nacionalista e eram</p><p>favoráveis à campanha do “Petróleo é nosso”, na qual também me envolvi. Nunca</p><p>me esquecerei do vidrinho de petróleo baiano, colocado em uma estante na casa</p><p>do marechal Horta Barbosa, que eu frequentava quando menino, pois sua filha se</p><p>casara com um irmão de meu pai.</p><p>Eu me interessava sobretudo pela Faculdade, na qual me tornei professor</p><p>em 1953, num ambiente avesso a Vargas e distante dos militares.</p><p>Minha participação politica até então havia sido fugaz: no começo dos</p><p>anos 1950, estive próximo da esquerda, do Partidão e do círculo intelectual</p><p>liderado por Caio Prado Júnior na Revista Brasiliense. Rompi com o PC quando</p><p>os soviéticos invadiram a Hungria em 1956. Depois do Relatório Kruschev, da</p><p>mesma época, agitei bastante contra os dirigentes comunistas. Não simpatizava</p><p>TÓPICO 3 | A CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>E A CRISE INFLACIONÁRIA NO FINAL DOS GOVERNOS MILITARES (1985)</p><p>59</p><p>com o populismo de Jango, embora fosse amigo de seu chefe da Casa Civil,</p><p>Darcy Ribeiro. Nada disso impediu que a partir de 1964 eu fosse considerado</p><p>“subversivo” pelos novos donos do poder.</p><p>No início</p><p>o código QR Code, que é um código</p><p>que permite que você acesse um conteúdo interativo</p><p>relacionado ao tema que você está estudando. Para</p><p>utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos</p><p>e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar</p><p>mais essa facilidade para aprimorar seus estudos!</p><p>UNI</p><p>VI</p><p>VII</p><p>UNIDADE 1 – ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À</p><p>CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO .........................1</p><p>TÓPICO 1 – SITUAÇÃO INTERNACIONAL E A INDÚSTRIA PESADA NO BRASIL ...........3</p><p>1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................................3</p><p>2 O RETORNO DE GETÚLIO E A INDUSTRIALIZAÇÃO ............................................................4</p><p>3 O PROJETO DESENVOLVIMENTISTA............................................................................................8</p><p>4 PLANO DE METAS E O CAPITAL ESTRANGEIRO .................................................................... 11</p><p>RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 16</p><p>AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 17</p><p>TÓPICO 2 – REFORMAS, ENDIVIDAMENTO EXTERNO E O MILAGRE ECONÔMICO .........19</p><p>1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 19</p><p>2 CRISE POLÍTICA NOS ANOS 60 ..................................................................................................... 19</p><p>3 A DITADURA MILITAR E O PAEG (1964-1967) ............................................................................ 25</p><p>4 O MILAGRE ECONÔMICO (1968 -1973) ....................................................................................... 30</p><p>RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 39</p><p>AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 40</p><p>TÓPICO 3 – A CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO E A CRISE</p><p>INFLACIONÁRIA NO FINAL DOS GOVERNOS MILITARES (1985) ................ 41</p><p>1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 41</p><p>2 A CRISE INTERNACIONAL E O II PND........................................................................................ 41</p><p>3 A CRISE DA DÍVIDA EXTERNA ..................................................................................................... 47</p><p>4 O GOVERNO FIGUEIREDO E A ECONOMIA BRASILEIRA FRENTE À CRISE</p><p>INFLACIONÁRIA ................................................................................................................................ 50</p><p>LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 58</p><p>RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 60</p><p>AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 61</p><p>UNIDADE 2 – A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE</p><p>ESTABILIZAR A INFLAÇÃO .................................................................................... 63</p><p>TÓPICO 1 – OS PRIMEIROS GOVERNOS PÓS-DITADURA E OS PLANOS</p><p>ECONÔMICOS EM UM MUNDO GLOBALIZADO .............................................. 65</p><p>1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 65</p><p>2 A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E O GOVERNO SARNEY ........................................ 66</p><p>3 NOVA FASE DO GOVERNO SARNEY: SUCESSÕES DE PLANOS ECONÔMICOS</p><p>E TENTATIVAS DE ESTABILIZAÇÃO FRUSTRADAS .............................................................. 75</p><p>RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 81</p><p>AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 83</p><p>sumário</p><p>VIII</p><p>TÓPICO 2 – A CONSOLIDAÇÃO DO REGIME DEMOCRÁTICO: NOVOS RUMOS</p><p>PARA A ECONOMIA BRASILEIRA COM O GOVERNO COLLOR E O</p><p>GOVERNO DE ITAMAR FRANCO ............................................................................ 85</p><p>1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 85</p><p>2 A ELEIÇÃO DE FERNANDO COLLOR DE MELLO .................................................................... 86</p><p>3 O GOVERNO COLLOR E AS MEDIDAS LIBERALIZANTES ................................................... 89</p><p>4 NOVOS RUMOS PARA A ECONOMIA BRASILEIRA COM O PRESIDENTE</p><p>ITAMAR FRANCO ............................................................................................................................... 97</p><p>RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................102</p><p>AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................103</p><p>TÓPICO 3 – REFORMAS, PRIVATIZAÇÕES E OS DESEQUILÍBRIOS</p><p>MACROECONÔMICOS DO PERÍODO FHC .........................................................105</p><p>1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................105</p><p>2 PLANO REAL, SUAS CIRCUNSTÂNCIAS E O PRIMEIRO MANDATO DO</p><p>GOVERNO FHC .................................................................................................................................106</p><p>3 POLÍTICA ECONÔMICA DO SEGUNDO GOVERNO DE FHC ............................................117</p><p>LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................124</p><p>RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................125</p><p>AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................126</p><p>UNIDADE 3 – A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI ..........................127</p><p>TÓPICO 1 – O GOVERNO LULA: MANUTENÇÃO DA POLÍTICA FINANCEIRA</p><p>E MUDANÇAS NA ECONOMIA ...............................................................................129</p><p>1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................129</p><p>2 TRANSIÇÃO DE FHC PARA LULA (2002 A 2003) ......................................................................130</p><p>3 A POLÍTICA ECONÔMICA NO PRIMEIRO GOVERNO LULA ............................................133</p><p>4 PROGRAMAS SOCIAIS E O IMPACTO NA MACROECONOMIA NO GOVERNO LULA ...... 147</p><p>RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................153</p><p>AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................154</p><p>TÓPICO 2 – REELEIÇÃO DO GOVERNO LULA E A CRISE FINANCEIRA</p><p>dos anos 1960, lutava pela organização da carreira universitária</p><p>e pela Fapesp. No Conselho Universitário ajudei a derrotar a “oligarquia”: com</p><p>a ajuda de Hélio Bicudo e Plínio Sampaio, ambos do gabinete do governador</p><p>Carvalho Pinto, elegemos o prof. Ulhôa Cintra para reitor da USP. Por isso eu</p><p>gozava de prestígio em camadas de professores e, sobretudo, de estudantes.</p><p>Recordo-me de duas reuniões na Faculdade de Filosofia na noite de 1º de</p><p>abril de 1964. Em uma, tentava acalmar os estudantes, pois não entendia bem o</p><p>que ocorrera e achava precipitado haver manifestações. Na segunda, tentava o</p><p>mesmo com meus colegas professores. Tamanha era a confusão que houve quem</p><p>propusesse um manifesto contra os militares golpistas que apoiavam Jango...</p><p>Precisei telefonar para um colega, professor da Medicina, pedindo que viesse em</p><p>meu socorro, para evitar o protesto contra Jango que estava sendo deposto.</p><p>Em seguida, a polícia tentou prender outro professor, Bento Prado,</p><p>confundindo-o comigo. Tive que me “esconder”, primeiro em casas de amigos,</p><p>em São Paulo, depois no Guarujá, num apartamento do Thomas Farkas, na</p><p>companhia de Leôncio Martins Rodrigues. De lá sai para ir a Viracopos, cercado</p><p>por familiares e amigos, sob a batuta de Maurício Segall, que se informava e sabia</p><p>dos aeroportos ainda sem listas de subversivos a serem capturados. Voei para</p><p>Buenos Aires, onde me hospedei no apartamento de um colega sociólogo, José</p><p>Num, que mais tarde foi ministro da Cultura de Nestor Kirshner. Da Argentina</p><p>fui para o Chile, carregando comigo os escritos da tese que pretendia defender</p><p>para conquistar uma cátedra que vagara com a saída de Fernando de Azevedo.</p><p>Ruth, minha mulher, ficou em São Paulo. Ela procurou, então, o prof.</p><p>Honório Monteiro, que representava a Faculdade de Direito no Conselho</p><p>Universitário e era afilhado de sua avó. Eu me dava bem com ele, assim como</p><p>com meus vizinhos de cadeira no Conselho, representantes da Faculdade de</p><p>Direito, Luís Eulálio Vidigal e Gama e Silva (que fora ao jantar de comemoração</p><p>de meu doutorado. Mal sabia eu, que anos depois ele assinaria o AI-5...). Quando</p><p>Ruth perguntou ao professor Honório: “O que vai acontecer?” Ele, sabiamente,</p><p>replicou: “nada; vai mudar tudo”. Perdi a condição de professor, que só retomaria</p><p>em outubro de 1968 ao vencer o concurso para a cadeira de Ciência Política. A</p><p>cátedra durou poucos meses. Em 13 de dezembro, Gama e Silva, então ministro</p><p>da Justiça, leu o AI-5 que fechou o Congresso, suspendeu o habeas corpus, cassou</p><p>mandatos e, como vários professores universitários, fui compulsoriamente</p><p>aposentado em abril de 1969.</p><p>A institucionalidade foi quebrada e minha vida mudou. Recordar faz parte</p><p>da História. Celebrar, o quê? No meu caso, exílio, processos e perda de cátedra.</p><p>Rancor? Para quê? Olhar para frente e manter a democracia é o que conta.</p><p>FONTE: <https://brasil.elpais.com/brasil/2019/04/06/opinion/1554587984_909455.html>. Acesso</p><p>em: 8 maio 2019.</p><p>60</p><p>RESUMO DO TÓPICO 3</p><p>Neste tópico, você aprendeu que:</p><p>• O declínio do crescimento econômico caracterizou o fim do período chamado</p><p>de “milagre econômico”. A crise internacional causada pela desvalorização</p><p>do dólar e pelo choque do petróleo diminiu o crescimento das principais</p><p>economias em desenvolvimento. No entanto, o aumento da disponibilidade</p><p>de eurodólares no mercado internacional a juros baixos fez com que países</p><p>como Brasil aumentassem seu endividamento para não sacrificar o seu ritmo</p><p>de crescimento impondo medidas de auteridade devido às externalidades.</p><p>• O governo Geisel, além de contrair novos empréstimos, lançou o II PND,</p><p>desejando seguir com a implantação da indústria pesada e completar o processo</p><p>por meio da substituição de importações.</p><p>• A crise do endividamento dos países do Terceiro Mundo foi agravada em 1979</p><p>pelo novo choque do petróleo e pelo aumento da taxa de juros interna dos</p><p>Estados Unidos.</p><p>• A transição para a redemocratização foi antecedida por alta taxa de inflação,</p><p>declínio das atividades econômicas, arrocho salarial, declínio do poder</p><p>aquisitivo e da renda. Foi marcada também por protestos dos sindicatos e</p><p>pela perda de apoio de setores empresariais e do próprio general Geisel. O</p><p>movimento para eleições indiretas em 1984 foi chamado de “diretas já”.</p><p>61</p><p>1 Quais foram as consequências da dependência externa brasileira no início</p><p>da década de 70?</p><p>2 Por que o governo do general Geisel continuou o endividamento externo do</p><p>Brasil?</p><p>3 Quais foram os principais setores que o II PDN priorizava os investimentos</p><p>públicos?</p><p>4 Explique como o aumento da taxa de juros nos Estados Unidos deflagrou a</p><p>crise nos países do Terceiro Mundo.</p><p>5 Por que a década de 80 foi chamada de “década perdida”?</p><p>AUTOATIVIDADE</p><p>62</p><p>63</p><p>UNIDADE 2</p><p>A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS</p><p>TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM</p><p>PLANO DE ESTUDOS</p><p>A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:</p><p>• apresentar os principais aspectos da economia brasileira no período da</p><p>redemocratização do país;</p><p>• identificar os principais planos econômicos utilizados nos governos após</p><p>a democratização do Brasil;</p><p>• analisar os principais indicadores macroeconômicos após 1985 a 2002;</p><p>• abordar a globalização e as principais consequências da vulnerabilidade</p><p>externa brasileira;</p><p>• apresentar os planos de desnacionalização e as principais privatizações</p><p>das estatais nos anos 90 no Brasil.</p><p>Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você</p><p>encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.</p><p>TÓPICO 1 – OS PRIMEIROS GOVERNOS PÓS-DITADURA E OS PLANOS</p><p>ECONÔMICOS EM UM MUNDO GLOBALIZADO</p><p>TÓPICO 2 – A CONSOLIDAÇÃO DO REGIME DEMOCRÁTICO:</p><p>NOVOS RUMOS PARA A ECONOMIA BRASILEIRA COM O</p><p>GOVERNO COLLOR E O GOVERNO DE ITAMAR FRANCO</p><p>TÓPICO 3 – REFORMAS, PRIVATIZAÇÕES E OS DESEQUILÍBRIOS</p><p>MACROECONÔMICOS: O PERÍODO FHC</p><p>64</p><p>65</p><p>TÓPICO 1</p><p>OS PRIMEIROS GOVERNOS PÓS-DITADURA</p><p>E OS PLANOS ECONÔMICOS EM UM</p><p>MUNDO GLOBALIZADO</p><p>UNIDADE 2</p><p>1 INTRODUÇÃO</p><p>Neste tópico, você poderá analisar o comportamento dos principais</p><p>indicadores econômicos após a redemocratização do Brasil e como as medidas</p><p>adotadas pelo Governo Sarney não foram capazes de estancar um dos</p><p>principais problemas econômicos: a hiperinflação. A nova República não foi</p><p>capaz de gerir a crise e impulsionar o país para o desenvolvimento econômico</p><p>e o aumento de competitividade global que estava se acirrando cada vez mais</p><p>com o avanço da globalização.</p><p>O país continuou com crescentes taxas de inflação, e o contínuo aumento</p><p>dos preços corroía o poder aquisitivo da população. A desigualdade social e a</p><p>situação de extrema pobreza estavam tornando-se endêmicas com o agravamento</p><p>da crise econômica.</p><p>Você também poderá analisar o fenômeno da globalização e os principais</p><p>aspectos que afetaram a economia brasileira, e como os governantes reagiram por</p><p>meio de medidas e planos econômicos na tentativa de inserir o país na tendência</p><p>da mundialização.</p><p>O Brasil tornou-se uma economia industrializada em desenvolvimento.</p><p>Entretanto, os desafios da competitividade global trouxeram à porta vários</p><p>problemas, os quais os novos governantes deveriam propor medidas para afrontá-</p><p>los: como tornar o país mais competitivo com o Estado em crise econômica e</p><p>financeira, sem capacidade para investimento e dependente do crédito externo?</p><p>Neste tópico, discutiremos como o cenário internacional influenciou</p><p>nas mudanças ocorridas internamente e como foram realizadas as primeiras</p><p>propostas de privatização das estatais brasileiras.</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>66</p><p>2 A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E O GOVERNO</p><p>SARNEY</p><p>O processo de redemocratização ocorreu em um momento de profundo</p><p>agravamento das contas públicas do Estado brasileiro. O Brasil enfrentava</p><p>uma dívida externa e isso exigia realizar superávits na balança comercial para</p><p>saldar os compromissos da dívida</p><p>com as instituições credoras. As medidas</p><p>adotadas, além de não conterem a crise inflacionária, agravaram ainda mais</p><p>a arrecadação e, por consequência, a capacidade de investimento do Estado</p><p>também foi muito comprometida.</p><p>Na figura a seguir pode-se observar o principal comício do movimento</p><p>das “Diretas Já”. A principal voz era a do locutor Osmar Santos e contou com o</p><p>apoio de diversos artistas, jogadores de futebol e políticos da época, como Chico</p><p>Buarque, Fafá de Belém, Gilberto Gil, Fernanda Montenegro, Sócrates, Vladimir,</p><p>Franco Montoro, Fernando Henrique Cardoso, Tancredo Neves, Ulysses</p><p>Guimarães, José Serra, Mário Covas, Teotônio Vilela, Eduardo Suplicy, Leonel</p><p>Brizola, Luiz Inácio Lula da Silva, entre outros.</p><p>A emenda do deputado Dante Oliveira que restituía as eleições diretas</p><p>para presidente não foi aprovada, e foi eleito, de forma indireta, Tancredo Neves,</p><p>que faleceu sem ter assumido a presidência em 1985, o que colocou à frente do</p><p>Executivo, o vice, José Sarney. Tancredo Neves morreu em 21 de abril de 1985, de</p><p>infecção generalizada, no Instituto do Coração, em São Paulo. Sua morte causou</p><p>comoção no país. Ele tinha sido eleito de forma indireta, e venceu por 480 a 180</p><p>votos seu oponente, Paulo Maluf. Após sua vitória em 15 de janeiro de 1985, foi</p><p>levado às pressas ao Hospital de Base, em Brasília, com fortes dores abdominais.</p><p>Ele nunca chegou a tomar posse, e por ser o primeiro presidente eleito após longo</p><p>regime militar, o povo estava entusiasmado com a perspectiva de um presidente</p><p>no regime democrático.</p><p>FIGURA 1 – COMÍCIO DAS “DIRETAS JÁ” EM SÃO PAULO</p><p>FONTE: <http://www.saopaulo.sp.gov.br/spnoticias/ultimas-noticias/arquivo-publico-tem-</p><p>exposicao-sobre-os-30-anos-das-diretas-ja/>. Acesso em: 19 nov. 2018.</p><p>TÓPICO 1 | OS PRIMEIROS GOVERNOS PÓS-DITADURA</p><p>67</p><p>Na imagem seguinte pode-se ver que o movimento reuniu mais de 300</p><p>mil pessoas em prol da redemocratização do Brasil, na praça da Sé em São Paulo,</p><p>conforme o Arquivo Público de São Paulo.</p><p>FIGURA 2 – COMÍCIO DA FRENTE DA SÉ DE SÃO PAULO</p><p>FONTE: <http://www.saopaulo.sp.gov.br/spnoticias/ultimas-noticias/arquivo-publico-tem-</p><p>exposicao-sobre-os-30-anos-das-diretas-ja/>. Acesso em: 19 nov. 2018.</p><p>O país, além de estar passando pelo processo de mudança política e de</p><p>reestruturação da administração pública, tinha um legado a corrigir, a inflação. A</p><p>nova equipe econômica teria que encontrar medidas para diminuir o IPCA que</p><p>estava 215,26% em 1984, e continuou em ascensão em 1985 com o índice chegando</p><p>a 242,23% (IBGE apud MARANGONI, 2012). Naquele período, seria necessária a</p><p>elaboração de um plano econômico capaz de reduzir a inflação, contudo, sem</p><p>eliminar o crescimento econômico, conduzindo a uma recessão, como já havia</p><p>ocorrido anteriormente (PIRES, 2010).</p><p>Para esse primeiro desafio da primeira República, pós período militar, foi</p><p>chamado o economista ortodoxo Francisco Dornelles para o Ministério da Fazenda</p><p>(PIRES, 2010). A austeridade fiscal e monetária foram as condutoras das principais</p><p>medidas a partir de 1985. O Ministro Francisco Dornelles, considerado ortodoxo,</p><p>incluiu nas medidas corte nos gastos públicos (corte de 10% no orçamento fiscal</p><p>para 1985) e estavam canceladas novas contratações para o setor público.</p><p>A inflação de março chegou a 12,7%, em abril, Dornelles optou por medidas</p><p>heterodoxas para conter a inflação, como congelamento de preços, modificou o</p><p>cálculo da correção e das desvalorizações cambiais (LACERDA et al., 2006). Em</p><p>maio de 1985, a equipe da Secretaria de Planejamento (SEPLAN), conduzida pelo</p><p>ministro João Sayad, apresenta as primeiras diretrizes econômicas do I Plano</p><p>Nacional de Desenvolvimento da Nova República (I PND – NR), mas a sua versão</p><p>final só foi apresentada em novembro (SOUZA, 2008).</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>68</p><p>Segundo o PND, a preservação do crescimento econômico, o</p><p>equacionamento das finanças públicas e a queda da inflação</p><p>dependiam, fundamentalmente, de uma renegociação da dívida</p><p>externa que reduzisse substancialmente as transferências de recursos</p><p>reais para o exterior (SOUZA, 2008, p. 171).</p><p>IMPORTANTE</p><p>Os termos ortodoxia e heterodoxia, em estudos econômicos, estão associados</p><p>principalmente aos economistas neoclássicos como ortodoxos e heterodoxos aos estudos</p><p>pós-Keynesianos. Gala e Oureiro (2016, p. 5) fazem uma discussão sobre o tema de ortodoxia</p><p>e heterodoxia em pesquisa econômica:</p><p>Em um contexto de incerteza, dizem os economistas pós-keynesianos,</p><p>o comportamento dos agentes é baseado em convenções ou rotinas</p><p>que não só simplificam o processo de tomada de decisão, como</p><p>ainda permitem ao agente econômico lidar com o fato inescrutável</p><p>da extrema precariedade e incompletude do conjunto de informações</p><p>sobre as quais decisões racionais devem ser tomadas. O papel da</p><p>moeda, por exemplo, e da demanda por liquidez adquirem, nesse</p><p>contexto, papel fundamental para explicar o funcionamento do sistema</p><p>econômico; algo que a princípio parece não fazer sentido para o</p><p>programa de pesquisa neoclássico.</p><p>O artigo de Hartmann (2017) faz uma análise dos termos pautado nos debates dos</p><p>autores supracitados:</p><p>Para a ortodoxia, o desenvolvimento econômico decorre do</p><p>crescimento da produtividade que se dá através de dois fatores</p><p>principais: a formação dos trabalhadores e a produtividade</p><p>sistêmica, segundo Lisboa e Pessôa (2016a). Para a heterodoxia, o</p><p>desenvolvimento se dá através do crescimento de atividades produtivas</p><p>específicas, como a indústria. Outro ponto de discordância entre as</p><p>duas linhas de pensamento, segundo esses autores, são as políticas de</p><p>curto prazo. Enquanto para os ortodoxos as economias operam nas</p><p>proximidades do pleno emprego, mesmo havendo algumas sociedades</p><p>que apresentam ociosidade crônica, para os heterodoxos, todas as</p><p>economias apresentam ociosidades dos fatores, logo, a política fiscal</p><p>conduz ao crescimento sem pressionar a inflação. Em seguida, Lisboa</p><p>e Pessôa (2016a) citam como o debate entre ortodoxos e heterodoxos</p><p>é resolvido internacionalmente, sendo a evidência estatística dos</p><p>dados disponíveis o elemento de decisão, enquanto que, no Brasil,</p><p>os economistas divergem sobre os métodos de análise, mesmo</p><p>concordando quanto aos objetivos das políticas. Os economistas</p><p>ortodoxos preferem a evidência de dados, já a heterodoxia parte da</p><p>conclusão, e a visão de mundo determina os principais aspectos de</p><p>funcionamento das economias (HARTMANN, 2017, p. 40).</p><p>TÓPICO 1 | OS PRIMEIROS GOVERNOS PÓS-DITADURA</p><p>69</p><p>FIGURA 3 – SARNEY E TANCREDO NEVES</p><p>FONTE: <http://www.ocorreio.com.br/noticias/24921/constituicao-de-1988-tornou-o-pais-</p><p>ingovernavel-diz-sarney>. Acesso em: 23 nov. 2018.</p><p>Apesar do governo ter mantido o congelamento dos preços, mais</p><p>pressões surgiram do setor privado. Entretanto, em junho o governo decretou</p><p>o descongelamento dos preços privados e públicos, e a infl ação retomou o seu</p><p>crescimento. A equipe econômica encontrava-se, também, em desacordo com a</p><p>forma que se daria a renegociação da dívida externa, e fi cou notória a divergência</p><p>entre os ministros Dornelles e Sayad (LACERDA et al., 2006).</p><p>Outros pontos também geravam divergências entre os ministros, tais como:</p><p>Prolongamento do controle de preços, taxa de juros reais elevada, aspectos</p><p>do ajuste fi scal, correção do salário mínimo, mudança na fórmula de</p><p>cálculo das correções cambial e monetária e o clima nos ministérios e na</p><p>vida política do país fi cou mais tenso (LACERDA et al., 2006, p. 186).</p><p>Dessas divergências e da alta da infl ação para 14%, Dornelles acabou</p><p>perdendo o cargo para Dílson Funaro, em agosto de 1985. Dílson Funaro era</p><p>empresário, formou uma nova equipe de economistas, principalmente com</p><p>economistas da UNICAMP e ligados ao PMDB, dentre eles estavam João Manoel</p><p>Cardoso de Mello e Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo. Ainda, a ênfase dada por</p><p>essa nova equipe era o crescimento econômico, a infl ação deveria ser combatida</p><p>sem recrudescer o desenvolvimento</p><p>econômico (SOUZA, 2008).</p><p>A principal orientação dada foi baixar a taxa de juros, resultado da</p><p>diminuição dos juros dos títulos públicos pagos como pelo aumento da liquidez</p><p>da economia. As linhas de crédito aumentaram em 244,6% no decorrer do ano,</p><p>sendo que o crédito bancário apresentou elevação de 265,1% e, no Banco do Brasil,</p><p>299,9%. As taxas de juros básicas, pautadas na rentabilidade anual das ORTNs</p><p>(Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional), que estavam entre 19% e 21% no</p><p>período de fevereiro e agosto de 1985, caíram para 15,33% em dezembro de 1985.</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>70</p><p>Com maior disponibilidade de crédito e redução de juros aumentou</p><p>a capacidade produtiva dos empresários. Entretanto, o principal propulsor da</p><p>economia foi o mercado interno, em 1985. Foram adotadas medidas tipicamente</p><p>keynesianas, como aumento do salário real e do gasto público, este que foi</p><p>direcionado para salários e para investimentos. O crescimento dos salários</p><p>médios foi de 15% para o Brasil e de 25% na indústria paulista (SOUZA, 2008).</p><p>Em 28 de fevereiro de 1986, o Decreto-lei nº 2.283, de 27 de fevereiro de</p><p>1986, é substituído pelo de nº 2.284, criou o Programa de Estabilização Econômica,</p><p>que foi denominado como Plano Cruzado e criou uma nova moeda, sendo que</p><p>CZ$1,00 = Cr$ 1.000,00 (PIRES, 2010). Esse foi o primeiro plano que abriu guerra</p><p>contra a especulação financeira e comercial e não possuía um viés ortodoxo de</p><p>combate à inflação, puxado pelo arroxo salarial, corte do gasto público e do</p><p>crédito. A correção monetária, até então, era o principal mecanismo para induzir</p><p>aos ganhos dos grupos financeiros, para isso, o plano extinguiu a correção</p><p>monetária. Além disso, as principais medidas do plano eram o congelamento de</p><p>preços e a substituição da moeda cruzeiro pelo cruzado (SOUZA, 2008). A taxa de</p><p>câmbio foi congelada por um ano e o dólar valia Cz$ 13,84.</p><p>De acordo com Francisco Lopes, a inércia inflacionária decorre da</p><p>existência de contratos com cláusulas de indexação. Em uma economia</p><p>indexada, a tendência inflacionária torna-se a própria inflação do</p><p>período anterior e pode ser agravada, ocasionalmente, por flutuações</p><p>decorrentes de choques de oferta (safras agrícolas, choque do petróleo</p><p>etc.) ou de choques de demanda (causados por um descontrole fiscal,</p><p>por exemplo). O ponto fundamental é que essas possíveis fontes</p><p>de flutuação, em vez passageiras, são incorporadas às tendências</p><p>(CASTRO, 2005, p. 121).</p><p>Os novos contratos só poderiam ser indexados (oficialmente) se fossem</p><p>por um período superior a um ano. O índice indexador seria a OTN (Obrigações</p><p>do Tesouro Nacional), que entrou em vigor no lugar das ORTN (Obrigações</p><p>Reajustáveis do Tesouro Nacional), como o índice de preços públicos. A OTN</p><p>foi congelada por doze meses, quando seria ajustada à inflação. Contratos com</p><p>prazos inferiores a um ano não poderiam ser indexados (PIO, 2001).</p><p>IMPORTANTE</p><p>O grupo de economistas heterodoxos</p><p>O grupo de economistas da PUC-RJ envolvido na compreensão do problema</p><p>inflacionário brasileiro e na formulação de alternativas concretas de estabilização para o</p><p>Brasil pode ser facilmente identificado. Ele foi criado no início dos anos 1980, logo após</p><p>o retorno de Pérsio Arida e de André Lara Resende dos Estados Unidos, onde cursaram</p><p>doutorado em Economia no Massachusetts Institute of Technology (MIT).</p><p>TÓPICO 1 | OS PRIMEIROS GOVERNOS PÓS-DITADURA</p><p>71</p><p>Na PUC-RJ, eles se juntaram a outros três  expertos  em estabilização, também</p><p>treinados em universidades norte-americanas — Chico Lopes (Harvard), Edmar Bacha (Yale)</p><p>e Eduardo Modiano (MIT, Sloan Business School) — e uns outros poucos interessados em</p><p>questões tangenciais à estabilização, como política trabalhista (José Márcio Camargo),</p><p>economia do setor público (Rogério Werneck) e questões relacionadas ao endividamento</p><p>externo (Pedro Malan).</p><p>Lopes, Arida e Lara Resende desenvolveram uma nova interpretação do processo</p><p>inflacionário brasileiro. Após empreenderem diversas investigações sobre a validade da Curva</p><p>de Philips para explicar a escalada da inflação no Brasil, eles chegaram a uma conclusão muito</p><p>diferente, que destacava a importância de mecanismos institucionais — cláusulas de indexação</p><p>— para a explicação da falha dos programas de estabilização ortodoxos implementados no</p><p>início da década de 80. Sua contribuição teórica foi chamada de Teoria da Inflação Inercial.</p><p>Alguns dos membros do grupo da PUC-RJ fizeram parte do governo federal nas</p><p>administrações dos presidentes Sarney, Collor, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso.</p><p>Arida e Lara Resende eram filiados ao partido governante — o PMDB — e se juntaram à</p><p>equipe econômica de Sarney na segunda metade de 1985. Uma vez no governo, ajudaram</p><p>a projetar o primeiro plano de estabilização, o Cruzado (1986). O Programa Cruzado foi, em</p><p>grande parte, influenciado por suas ideias, ainda que incluísse um congelamento de preços,</p><p>derivado da abordagem de Chico Lopes — Arida e Lara Resende se opunham.</p><p>Eduardo Modiano, que trouxe importantes contribuições ao desenvolvimento da</p><p>Teoria da Inflação Inercial, fez parte da primeira equipe econômica de Fernando Collor.</p><p>Ele tinha sido um dos que haviam mostrado os impactos negativos dos mecanismos de</p><p>indexação salarial sobre a eficácia das políticas ortodoxas, baseadas no uso de técnicas de</p><p>administração da demanda. A despeito disso, não se pode dizer que os Planos Collor I e II</p><p>derivaram da ideia da inflação inercial. Os heterodoxos estiveram afastados da formulação</p><p>da política de estabilização entre 1987 e 1993.</p><p>Quando Fernando Henrique Cardoso foi indicado ministro da Fazenda por Itamar</p><p>Franco, em março de 1993, os economistas da PUC-RJ retornaram ao governo. Naquela</p><p>época, eles fizeram suas mais importantes contribuições ao processo de estabilização</p><p>no Brasil. Como resultado do processo de aprendizado derivado dos fracassos anteriores</p><p>das políticas de estabilização, de um lado, o total controle sobre o processo de  policy-</p><p>making  exercido pelos economistas da PUC-RJ — particularmente Arida, Lara Resende,</p><p>Bacha, Winston Fritsch e Gustavo Franco —, de outro, o Plano Real é muito mais semelhante</p><p>à proposição inicial de Arida e Lara Resende (1984a).</p><p>FONTE: PIO, Carlos. Uma estabilização heterodoxa no Brasil: ideias e redes políticas. Revista</p><p>Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 16, n. 46, p. 31-54, 2001. Disponível em: <http://www.</p><p>scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-69092001000200002&lng=en&nrm=i-</p><p>so>. Acesso em: 23 nov. 2018.</p><p>A extinção da correção monetária tinha como finalidade desindexar a</p><p>economia, assim, as elevações de preços passadas não seriam transferidas para o</p><p>futuro, e havia o processo de autoalimentação da inflação conhecido como inércia</p><p>inflacionária. O congelamento de preços também passou a ser umas medidas</p><p>fundamentais do plano e contava com a participação popular para denunciar</p><p>aumentos de preços, chamados de “fiscais do Sarney” (SOUZA, 2008).</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>72</p><p>De acordo com Souza (2008), o Plano Cruzado também propiciou ganhos</p><p>para os trabalhadores, além da contenção da inflação por meio do congelamento de</p><p>preços. A poupança dos trabalhadores nas cadernetas de poupança ou no FGTS e</p><p>no PIS/Pasep seria corrigida pela correção monetária para proteção contra a inflação</p><p>(única obrigação financeira ainda protegida pela correção monetária). Ainda,</p><p>existiam outras medidas que aumentaram o poder de compra do trabalhador:</p><p>QUADRO 1 – MECANISMOS PARA PROTEÇÃO DOS SALÁRIOS NO PLANO CRUZADO</p><p>MEDIDA</p><p>1 Preservação do poder de compra médio do semestre anterior à reforma</p><p>econômica.</p><p>2 Concessão de um abono de 8% sobre esse poder de compra do conjunto</p><p>dos salários e de pouco mais de 15% sobre o salário mínimo.</p><p>3 Adoção da escala móvel de salário, que previa o reajuste automático</p><p>sempre que a inflação atingisse 20% em um ano.</p><p>4 Preservação</p><p>dos dissídios coletivos.</p><p>FONTE: Souza (2008, p. 179)</p><p>Como o pacote incluía reduzir a demanda para conter a inflação, congelava</p><p>os salários pela média dos últimos seis meses e o salário mínimo foi fixado em</p><p>Cz$ 804, convertidos em dólares equivaliam a US$ 67. Entretanto, uma vez que a</p><p>inflação ultrapassasse 20% ao mês, os salários poderiam ser reajustados. Assim,</p><p>pela primeira vez foi implantado um seguro-desemprego.</p><p>Contudo, em virtude do aumento salarial antes do congelamento, o</p><p>consumo aumentou e vários produtos começaram a sumir das prateleiras dos</p><p>supermercados. Em virtude da possibilidade de aumento de ganhos, até mesmo</p><p>aqueles produtos que não estavam majorados seus preços trataram de aguardar</p><p>aumentos de preços em função da pressão da demanda.</p><p>A equipe econômica teve que formular novas medidas, denominadas</p><p>“Cruzadinho”, na tentativa de combater essa pressão inflacionária. Dentre</p><p>essas medidas estava a geração de empréstimos compulsórios sobre gasolina,</p><p>álcool, automóveis e viagens internacionais. Além disso, criou-se o Fundo</p><p>Nacional de Desenvolvimento (FND), com o objetivo de colocar esses recursos</p><p>públicos para investimentos. Com essas medidas tinha-se a finalidade de conter</p><p>o consumo especialmente da classe média, por meio do ágio de 25% sobre a</p><p>compra de novos veículos, encarecendo o combustível e desestimulando as</p><p>viagens internacionais (PIRES, 2010).</p><p>No período de 1981 a 1983, muitas empresas foram à falência, principalmente</p><p>as pequenas e médias empresas, que sofreram os impactos dos ajustes ortodoxos</p><p>que o governo teve que fazer em cumprimento das imposições do FMI. Portanto,</p><p>TÓPICO 1 | OS PRIMEIROS GOVERNOS PÓS-DITADURA</p><p>73</p><p>o cenário do mercado de trabalho foi amplamente afetado no período de recessão.</p><p>Em 1984, a oferta de emprego começava a apresentar sinais de recuperação, mas</p><p>sem ter sido capaz de mudar as perdas do período anterior. A partir de 1985, o</p><p>mercado de trabalho se mostrou em expansão e capaz de realmente criar mais</p><p>vagas. Foram gerados mais de 2.100.000 de empregos, um crescimento de 11,55%,</p><p>puxado especialmente pela região Sudeste (ARANDIA, 1991).</p><p>Tomando-se a evolução do emprego segundo setores de atividade</p><p>econômica, o estudo de Mattoso (1986) constata também que tanto a</p><p>indústria de transformação como o comércio e os serviços cresceram</p><p>mais intensamente. O maior crescimento deu-se na Região Sudeste,</p><p>com 13,14%, enquanto as outras regiões cresceram menos. Observa-</p><p>se, ainda, que, na conjuntura de recuperação econômica (1985), a</p><p>participação da Região Sudeste no total dos empregos criados no</p><p>Brasil foi de mais de 66%, respondendo o Estado de São Paulo por</p><p>38,53% e, a Grande São Paulo, por 24,78% (ARANDIA, 1991, p. 151).</p><p>Os resultados do Plano Cruzado se refletiram nas urnas, com uma</p><p>ampla maioria de governadores, deputados federais e senadores eleitos do</p><p>partido PMDB, do presidente José Sarney. O consumo continuou aumentando</p><p>e o PIB apresentou 7,5% em 1986 de crescimento. Entretanto, a situação fiscal</p><p>e as contas externas brasileiras estavam agravando-se. Logo após as eleições</p><p>foi implementado o Plano Cruzado II, que tinha como alvo controlar o déficit</p><p>público, aumentando as tarifas públicas e os impostos indiretos (PIRES, 2010). O</p><p>Plano Cruzado II marcou o encerramento de um plano de combate à inflação com</p><p>participação popular, crescimento econômico e distribuição de renda. A partir de</p><p>novembro, o antiCruzado adotou o pedido do Banco Central de aumentar a taxa</p><p>de juros. A equipe do Ministério do Planejamento era contrária, e preferia utilizar</p><p>medidas de ajuste fiscal, como aumento de impostos que retiraria dinheiro do</p><p>mercado e inibiria o consumo interno, estimulando as exportações e melhorando</p><p>o saldo da balança comercial (SOUZA, 2008).</p><p>Os investimentos produtivos privados de médio e longo prazo ficaram</p><p>muito abaixo do que o governo esperava. Acabou permanecendo a visão</p><p>especulativa e imediatista dos capitalistas brasileiros. Além disso, os grupos</p><p>estrangeiros que tinham suas sucursais no Brasil demonstraram não confiar</p><p>na capacidade de estabilização da economia do Plano Cruzado. Em 1986, as</p><p>multinacionais instaladas no Brasil enviaram todas as remessas permitidas pela</p><p>legislação ao exterior, totalizando um repatriamento de US$737 milhões. Os lucros</p><p>não foram reinvestidos na produção brasileira (BRUM, 2010). Observe a tabela</p><p>a seguir, mesmo a economia apresentando crescimento e redução da inflação,</p><p>os lucros das multinacionais foram repatriados, prejudicando o desempenho do</p><p>plano econômico e da capacidade de produção no Brasil.</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>74</p><p>TABELA 1 – EVOLUÇÃO ANUAL DOS INVESTIMENTOS ESTRANGEIROS DIRETOS NO BRASIL EM</p><p>MILHÕES DE DÓLARES, DO PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB) E DA INFLAÇÃO (%) (1985 – 1989)</p><p>FONTE: BACEN (apud BRUM, 2010, p. 412)</p><p>Ano Ingressos Saída Líquido Crescimento (%) Inflação (%)</p><p>1985 1.061 246 814 7,8 235,1</p><p>1986 632 737 -105 7,5 65</p><p>1987 904 297 608 3,5 415,8</p><p>1988 2.530 275 2.256 -0,1 1.037,60</p><p>1989 1.260 524 735 3,2 1.782,90</p><p>A inflação, no início de janeiro de 1987, havia retomado seu percurso de</p><p>ascensão e o congelamento de preços começou a falhar. Em fevereiro, o governo</p><p>teve que descongelar os preços e as OTNs foram corrigidas e a indexação da</p><p>economia foi retomada (PIRES, 2010). O Ministério da Fazenda decidiu aumentar</p><p>o IPI sobre cinco produtos, e acabou, por consequência, aumentando o preço</p><p>desses produtos (SOUZA, 2008):</p><p>Mas, na verdade, ao aumentar os preços de alguns produtos</p><p>importantes, o governo estava sinalizando para os demais setores</p><p>que também poderiam reajustar seus preços. E foi isso o que ocorreu.</p><p>A inflação que estava represada rompeu o dique. A taxa mensal</p><p>de inflação, que fora de 2,46% em novembro, subiu para 7,56% em</p><p>dezembro, 12,04% em janeiro, 14,11% em fevereiro, 15% em março,</p><p>20,08% em abril e 27,58% em maio (SOUZA, 2008, p. 187).</p><p>Os reflexos no mercado de trabalho, no ano de 1986, exultaram na</p><p>elevação de trabalhadores no mercado informal superior. Tendo aumento de</p><p>12%, em 1985, de trabalhadores assalariados, contra 9,5% em 1986, o emprego dos</p><p>trabalhadores autônomos cresceu cerca de 3,4% e nada menos do que 16,8% em</p><p>1986. Em 1987 o cenário tornou-se ainda mais complexo, e a oferta de emprego</p><p>praticamente estagnou, sendo que o crescimento da população aumentou mais</p><p>do que a geração de emprego (ARANDIA, 1991).</p><p>No entanto, em 1987 as reservas cambiais começaram a cair, a balança</p><p>comercial que, entre 1984-1985, apresentara saldo positivo de 13 bilhões de dólares,</p><p>caiu para menos 8 bilhões de dólares, em 1986. Em fevereiro de 1987, o presidente</p><p>José Sarney declarou a moratória. O ministro Dílson Funaro se viu cada mais</p><p>sem instrumentos para conseguir retomar o crescimento econômico, e o Plano</p><p>Cruzado tornando-se inviável para atender às necessidades macroeconômicas do</p><p>país. Em abril de 1987, o ministro Funaro renunciou e Luiz Carlos Bresser-Pereira</p><p>foi convidado a assumir o Ministério da Fazenda (PIRES, 2010).</p><p>O gráfico que segue apresenta as séries acumuladas do IPCA e do INPC</p><p>entre os anos de 1985 a 1990. Pode-se observar que os planos econômicos não</p><p>foram capazes de solucionar a inflação que se agravou ainda mais nos últimos</p><p>anos da década de 80.</p><p>TÓPICO 1 | OS PRIMEIROS GOVERNOS PÓS-DITADURA</p><p>75</p><p>GRÁFICO 1 – SÉRIE HISTÓRICA DOS ACUMULADOS NO ANO EM PORCENTAGENS – IPCA E INPC</p><p>FONTE: Adaptado de Marangoni (2012)</p><p>Embora o Plano Cruzado tenha-se apresentado exitoso em 1986 no</p><p>combate à inflação e agradando a população, notou-se que o mesmo não teve como</p><p>sustentar-se no ano seguinte, sendo necessário buscar outro plano para a economia</p><p>brasileira. Fica visível a queda da inflação em 1986, mas sem continuidade nos</p><p>anos seguintes. E o temor da hiperinflação não pode ser afastado. Além disso,</p><p>a declaração da moratória trouxe maior incerteza e falta de credibilidade para a</p><p>política econômica que estava sendo adotada.</p><p>3 NOVA FASE DO GOVERNO SARNEY:</p><p>SUCESSÕES DE</p><p>PLANOS ECONÔMICOS E TENTATIVAS DE ESTABILIZAÇÃO</p><p>FRUSTRADAS</p><p>A sucessão de ministros da Fazenda colocou em frente o economista Luiz</p><p>Carlos Bresser-Pereira, que adotou medidas para contenção da inflação, esse</p><p>conjunto de medidas foi chamado de política feijão com arroz. Ele queria reduzir</p><p>o déficit operacional de 8% para 4% e a inflação em torno de 15% a.m. (LACERDA et</p><p>al., 2006). Ele reajustou preços de tarifas de eletricidade em 45%, tarifas telefônicas</p><p>em 34%, o aço em 32%, o pão em 36%, o leite em 27% e os combustíveis em 13%,</p><p>e em 12 de junho de 1987 lançou o plano que congelava salários e preços por três</p><p>meses. Além disso, estabeleceu que os juros reais permaneceriam elevados para</p><p>tentar refreiar o consumo (SOUZA, 2008).</p><p>Nessa altura, os exportadores pressionavam, pois temiam os credores</p><p>internacionais após o Brasil ter declarado a moratória. A nova equipe também</p><p>visava aproximar-se do FMI e do Clube de Paris por meio do novo plano</p><p>macroeconômico. Dessa forma, foram feitas duas desvalorizações do cruzado em</p><p>16,3% no câmbio, promovendo as exportações e o aumento dos pagamentos da</p><p>dívida externa. O plano era de caráter ortodoxo e heterodoxo para combater a</p><p>inflação e reduzir o déficit público (PIRES, 2010). Observe o gráfico a seguir sobre</p><p>a evolução da dívida externa bruta brasileira:</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>76</p><p>GRÁFICO 2 – DÍVIDA EXTERNA BRASILEIRA E RESERVAS INTERNACIONAIS (MILHÕES DE US$)</p><p>FONTE: Adaptado de Conjuntura (2005)</p><p>As principais medidas implementadas em junho de 1987 pelo Plano</p><p>Bresser foram elecancadas por Pires (2010):</p><p>• Congelamento de preços por três meses, com aumento prévio de vários preços</p><p>públicos.</p><p>• Desvalorização cambial de 9,5% e sem congelamento do câmbio.</p><p>• Fim do gatilho e congelamento de salários por três meses (no nível de 12 de</p><p>junho), com o resíduo inflacionário sendo pago em seis parcelas a partir de</p><p>setembro.</p><p>• Criação da URP (Unidade de Referências de Preços), constituída pela média</p><p>geométrica da taxa de inflação dos três meses anteriores. Era preciso corrigir os</p><p>salários a partir de setembro.</p><p>• Aluguéis congelados no nível de junho, sem compensação.</p><p>• Contratação pós-fixada mantida (desvalorização de 15% ao mês).</p><p>• Políticas monetária e fiscal contracionistas, com taxas reais de juros positivas.</p><p>Por um período o plano deu certo no controle da inflação, mas quando os</p><p>preços foram descongelados a inflação voltou a disparar.</p><p>DICAS</p><p>Para quem quer conhecer mais sobre o pensamento de Luiz Carlos Bresser,</p><p>sobre inflação, sugere-se a leitura de seu livro Inflação e recessão, disponível no site: http://</p><p>www.bresserpereira.org.br/Books/InflacaoeRecessao-1Edicao/00-InflacaoeRecessao.pdf.</p><p>Acesso em: 23 nov. 2018.</p><p>TÓPICO 1 | OS PRIMEIROS GOVERNOS PÓS-DITADURA</p><p>77</p><p>Por outro lado, o Brasil apresentou uma proposta para lidar com o</p><p>problema da dívida externa. O Ministro queria fechar um acordo de longo prazo</p><p>que absorvesse a securitização da dívida de médio e longo prazos, adotou cláusulas</p><p>que poderiam precaver a situação do país mediante a deterioração internacional</p><p>e por fim previa estabelecer acordos, primeiro com os bancos credores e depois</p><p>com o FMI (PIRES, 2010).</p><p>Alguns acordos firmados com o funcionalismo público acabaram por alastrar</p><p>o problema do déficit público. Nos meses iniciais do plano Bresser a inflação chegou</p><p>próxima de zero, mas depois não teve mais sucesso, subindo as taxas mensais de</p><p>inflação. Em dezembro de 1987 a taxa de inflação chegou a 14%. Diante das expectativas</p><p>frutradas da população e da dificuldade de se fazer uma reforma tributária, o ministro</p><p>Bresser-Pereira pediu demissão em janeiro de 1988. Assumiu um antigo funcionário</p><p>do Banco do Brasil, e um dos mais ortodoxos membros da equipe do ex-ministro da</p><p>Fazenda Delfim Netto: Maílson da Nóbrega (CASTRO, 2005).</p><p>Diante do evidente fracasso de mais um plano, foram suspensos os</p><p>reajustes salariais dos funcionários públicos e adiaram-se as correções dos</p><p>preços administrados. Em julho de 1988, o governo tentou restabelecer um pacto</p><p>social entre o governo, empresários e trabalhadores. O governo propunha uma</p><p>discussão para estabelecer os preços e oferecia uma metodologia de atualizações</p><p>dos salários e um plano para ajustar as contas públicas. Foi mais uma tentativa</p><p>frustrada (LACERDA et al., 2006).</p><p>O Ministro Mailson da Nóbrega defendia a suspensão da moratória, mas</p><p>para isso deveriam ser feitos cortes nos gastos públicos, manutenção do arrocho</p><p>salarial e elevação da taxa de juros reais. Além disso, a Constituição Federal</p><p>estava no Congresso sendo elaborada para atender às necessidades do país e no</p><p>ensejo de consolidar um pacto democrático com todos os agentes da sociedade</p><p>para estabelecer a democracia (SOUZA, 2008).</p><p>No campo econômico, mediante a pressão do lobby, havia a ideia de</p><p>convencer o campo parlamentar a inserir na Constituição mecanismos que não</p><p>distinguissem as empresas estrangeiras das empresas nacionais, bem como usufruir</p><p>do controle de setores nacionais. Isso não se configurou. Além da nova Constituição</p><p>estabelecer diferenciação entre empresa nacional e empresa estrangeira, estabeleceu</p><p>que a proteção do Estado recaia sobre as empresas nacionais, e que somente</p><p>estas poderiam exercer reserva de mercado em setores estratégicos. Ainda, ficou</p><p>estabelecido que a nacionalização da prospecção e a exploração de recursos do</p><p>subsolo garantiram o monopólio da Petrobras (SOUZA, 2008).</p><p>Em 14 de janeiro de 1989 mais um Plano foi anunciado: o Plano Verão.</p><p>O Plano eliminava todos os mecanismos de indexação, incluindo a Unidade de</p><p>Referência de Preços (URP). Ocorreu uma mudança de moeda, denominada</p><p>de Cruzado Novo, que equivalia a mil cruzados, e tinha a paridade de um por</p><p>um com o dólar. Além disso, o plano incluía algumas medidas ortodoxas como</p><p>redução de gastos com custeio, reforma administrativa para diminuir custos,</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>78</p><p>inibição de emissões de títulos governamentais e limitação do crédito, bem como</p><p>algumas medidas heterodoxas como congelamento de preços e salários. Foram</p><p>decretadas elevações de preços públicos e tarifas antes de mudar a averiguação</p><p>do índice oficial de inflação. A OTN e a OTN-fiscal, que tinham o papel de indexar</p><p>os papéis fixados, foram congeladas e extintas (CASTRO, 2005).</p><p>Acompanhe as taxas de inflação no gráfico a seguir. A partir de 1987 a</p><p>inflação atingiu taxas muito elevadas e o ambiente de incerteza voltou a infiltrar-</p><p>se na economia. A taxa de crescimento a partir de 1988 passou a ser negativa. Em</p><p>1989, embora a economia apresentasse um leve crescimento de 3,2%, a inflação</p><p>seguiu crescente, batendo a maior taxa da década de 80 de 1782,9%. Isso demonstra</p><p>que os Planos Econômicos não foram adequados para conter a hiperinflação.</p><p>GRÁFICO 3 – TAXA ANUAL DE CRESCIMENTO DO PRODUTO INTERNO BRUTO</p><p>(PIB) GLOBAL E DA INFLAÇÃO BRASILEIRA (%)</p><p>FONTE: BACEN (apud BRUM, 2010, p. 422)</p><p>Por outro lado, em 1989 a taxa de emprego cresce para 5,9%. Como pode</p><p>ser observado no gráfico a seguir, a taxa de desemprego seguiu muito baixa</p><p>durante os planos elaborados e implementados no Governo Sarney. Contudo, não</p><p>foi o suficiente para aquecer a economia e salvar a popularidade do presidente.</p><p>TÓPICO 1 | OS PRIMEIROS GOVERNOS PÓS-DITADURA</p><p>79</p><p>GRÁFICO 4 – TAXA DE DESEMPREGO (1981-1989)</p><p>FONTE: IBGE (apud VARGAS; FELIPE, 2015, p. 142)</p><p>Mailson da Nóbrega defendia também um processo de maior abertura</p><p>comercial e privatização. As alíquotas médias de importação foram reduzidas de</p><p>51,3% para 37,4%. Foram eliminados os sistemas especiais de importação, com</p><p>exceção daqueles ligados ao draw-back, ao desenvolvimento regional de incentivo</p><p>e às exportações. A moeda foi valorizada deixando as exportações mais caras. Na</p><p>área de desestatização, foram devolvidas à iniciativa privada 19 estatais que estavam</p><p>no controle do BNDES ou BNDESPAR, por não</p><p>pagamento dos financiamentos.</p><p>Um total de US$ 546,3 milhões devolvidos sem ressarcimento aos cofres públicos.</p><p>Além disso, houve a sinalização de um plano de desestatização mais amplo, mesmo</p><p>sabendo que não teriam tempo para executá-lo (SOUZA, 2008).</p><p>Em 1989, mediante as eleições presidenciais e as esperanças frustradas de</p><p>estabilidade econômica do Brasil, a sociedade apresentava insatisfação com o governo</p><p>vigente. A popularidade do presidente Sarney se esvaiu após as várias tentativas</p><p>fracassadas e isto iria se refletir nas urnas contra o partido do presidente, o PMDB.</p><p>Aos poucos, em 1989, o congelamento de preços foi sendo desfeito, as taxas</p><p>de inflação subiram e o governo subiu novamente as taxas de juros. O cruzado</p><p>foi sendo desvalorizado. A indexação retomou seu percurso por meio da criação</p><p>do Bônus do Tesouro Nacional (BNT). Assim, outro problema foi a suspensão do</p><p>pagamento dos juros da dívida externa, por causa da queda do saldo da balança</p><p>comercial. Assim, termina o comando do executivo pelo presidente Sarney, em</p><p>um verdadeiro caos econômico (LACERDA et al., 2006).</p><p>Os planos heterodoxos não conseguiram por muito tempo dirimir a</p><p>desigualde social que se acentuou com a hiperinflação que corroia o poder aquisitivo</p><p>dos mais pobres e a defasagem salarial enfrentada nos anos 80. Mais uma década</p><p>que os mais pobres e a classe média tiveram maior impacto em seu padrão de vida.</p><p>De acordo com Souza (2008), de 29,5 milhões de pessoas que viviam abaixo da</p><p>linha da pobreza, passaram a 39,2 milhões de pessoas, ou seja, 27,2% da população</p><p>estava em uma situação crítica em 1990. Os mais ricos concentraram maior renda.</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>80</p><p>TABELA 2 – EVOLUÇÃO DA DISTRIBUIÇÃO DE RENDA POR FAIXAS</p><p>ECONÔMICAS DA POPULAÇÃO – 1981 A 1990 (%)</p><p>Grupos 1981 1983 1986 1990</p><p>10% mais pobres 0,9 1,0 1,0 0,8</p><p>20% mais pobres 2,9 2,8 3,1 2,4</p><p>30% mais pobres 5,9 5,6 7,4 5,5</p><p>40% mais pobres 9,7 9,1 1,8 8,5</p><p>50% mais pobres 14,5 13,4 16,2 12,6</p><p>40% intermediários 40,6 40,4 36,5 39,3</p><p>10% mais ricos 44,9 46,2 47,3 48,1</p><p>5% mais ricos 31,9 33,0 33,9 34,4</p><p>1% mais rico 12,1 13,3 14,0 13,9</p><p>FONTE: IBGE/PNAD (apud BRUM, 1997, p. 423)</p><p>O principal desafio para os anos 90 seria a continuidade da inserção do</p><p>processo democrático e a estabilidade econômica. O primeiro presidente eleito</p><p>diretamente seria Fernando Collor de Mello. Este receberia o Estado brasileiro</p><p>com sua capacidade de investimento amplamente afetada pela deterioração de</p><p>suas contas externas, moeda desvalorizada, inflação e perda de credibilidade do</p><p>país no cenário internacional, após as declarações de moratória. Os próximos</p><p>passos da economia brasileira acompanharemos nas próximas unidades.</p><p>81</p><p>RESUMO DO TÓPICO 1</p><p>Neste tópico, você aprendeu que:</p><p>• Em março de 1985, a “Nova República” teria como primeiro presidente</p><p>Tancredo Neves, que adoecido, acaba falecendo, assumindo seu vice, José R.</p><p>Sarney. As primeiras medidas foram de combate ao arrocho salarial e combate</p><p>à inflação. O Presidente Sarney pretendia que fosse elaborado um plano que</p><p>combatesse a inflação sem sacrificar o poder aquisitivo do trabalhador. Era</p><p>uma política recorrente em outros governos que adotaram medidas de arrocho</p><p>salarial para conter o consumo.</p><p>• O Plano Cruzado trouxe popularidade ao presidente Sarney e ao PMDB, que</p><p>era o seu partido. Contudo, ao final da gestão do então presidente, após vários</p><p>planos econômicos fracassados, isso se refletiu nas urnas em 1989.</p><p>• Entre 1985 a 1988, foram efetuadas sucessivas substituições de ministros</p><p>da Fazenda e equipe econômica e lançados vários planos econômicos com</p><p>misturas de políticas ortodoxas e heterodoxas. Assim, acompanhe o quadro a</p><p>seguir com o resumo dos planos e ministros:</p><p>QUADRO 2 – RESUMO DOS PLANOS ECONÔMICOS</p><p>Período Ministro Plano</p><p>Março de 1985 a agosto</p><p>de 1985.</p><p>Francisco Dornelles</p><p>(Ministro da Fazenda)</p><p>João Sayad (Ministro do</p><p>Planejamento).</p><p>I Plano Nacional de</p><p>Desenvolvimento da</p><p>Nova República (PND-</p><p>NR).</p><p>Agosto de 1985. Dílson Funaro (Ministro</p><p>da Fazenda).</p><p>Plano Cruzado (28 de</p><p>fevereiro de 1986, o</p><p>Decreto-lei nº 2.284).</p><p>Novembro de 1986 a</p><p>abril de 1987.</p><p>Dílson Funaro (Ministro</p><p>da Fazenda).</p><p>Plano Cruzado II.</p><p>Abril de 1987. Luiz Carlos Bresser-</p><p>Pereira (Ministro da</p><p>Fazenda).</p><p>Política feijão com arroz.</p><p>Junho de 1987 a janeiro</p><p>de 1988.</p><p>Luiz Carlos Bresser-</p><p>Pereira (Ministro da</p><p>Fazenda).</p><p>Plano Bresser.</p><p>Janeiro de 1988 ao final</p><p>de 1989.</p><p>Maílson da Nóbrega</p><p>(Ministro da Fazenda).</p><p>Plano Verão.</p><p>FONTE: O autor</p><p>82</p><p>• O Plano Cruzado II marcou o encerramento de um plano de combate à inflação</p><p>com participação popular, crescimento econômico e distribuição de renda.</p><p>A partir de novembro, o antiCruzado adotou o pedido do Banco Central de</p><p>aumentar a taxa de juros.</p><p>• Em 1986, o governo declarou a moratória, não cumprindo com as obrigações</p><p>da dívida externa, aumentando a instabilidade macroeconômica.</p><p>• A inflação tornou-se hiperinflação no decorrer da década de 80, aumentou a</p><p>concentração de renda e afugentou os investimentos externos diretos.</p><p>83</p><p>AUTOATIVIDADE</p><p>1 O que significa inflação inercial?</p><p>2 Quais foram as principais medidas do Plano Cruzado?</p><p>3 Por que o Plano Cruzado teve um apelo à participação popular?</p><p>4 Quais foram os motivos que o Plano Cruzado fracassou?</p><p>5 Por que o Plano Cruzado II foi implementado e quais foram as principais</p><p>medidas?</p><p>6 Elenque as principais medidas propostas pelo Plano Bresser.</p><p>7 Apresente um resumo dos principais indicadores econômicos da década de</p><p>80 e justifique se você concorda que a década foi uma década perdida.</p><p>84</p><p>85</p><p>TÓPICO 2</p><p>A CONSOLIDAÇÃO DO REGIME</p><p>DEMOCRÁTICO: NOVOS RUMOS</p><p>PARA A ECONOMIA BRASILEIRA COM</p><p>O GOVERNO COLLOR E O GOVERNO</p><p>DE ITAMAR FRANCO</p><p>UNIDADE 2</p><p>1 INTRODUÇÃO</p><p>Em 1989 ocorrem as eleições presidenciais de forma direta e marcam a</p><p>retomada da consolidação do regime democrático no Brasil. A última eleição</p><p>para presidente da República havia ocorrido em 1960. O presidente eleito foi</p><p>Fernando Collor de Mello, entre 22 candidatos (BRUM, 2010). O novo presidente</p><p>teria a missão de resolver os problemas da crise da capacidade de investimento</p><p>do Estado, uma herança dos governos que antecederam, além de contribuir para</p><p>a consolidação das instituições democráticas com os demais poderes.</p><p>Além da pressão da economia brasileira pautada na dependência externa,</p><p>do Consenso de Washington surgiu um receituário neoliberal que os devedores</p><p>do FMI e Clube de Paris iriam precisar seguir. Ainda, havia o fenômeno da</p><p>globalização, que aumentou a competição internacional. Os desafios para o</p><p>novo presidente eram gigantes. Além de estabilizar os fatores macroeconômicos,</p><p>era necessário preparar o ambiente para o Brasil adequar-se à competitividade</p><p>internacional que se acirrava.</p><p>O principal objetivo deste tópico é apresentar o contexto da economia</p><p>brasileira nos governos de Fernando Collor de Mello e Itamar Franco, e as</p><p>principais medidas econômicas inseridas por tais governantes.</p><p>O governo de Fernando Collor que se iniciou com o lema de “caçador</p><p>de marajás” terminou acusado de corrupção e sofreu impeachment, em 1992.</p><p>Assumiu o seu vice Itamar Franco. A crise política que se instaurou prejudicou</p><p>ainda mais a capacidade de resposta positiva dos indicadores macroeconômicos</p><p>do Brasil. Mediante o cenário de alta inflação, desemprego, dívida pública</p><p>crescente e a dívida externa aumentando, tornando o Brasil ainda mais vulnerável</p><p>aos choques externos, a nova equipe econômica precisava de medidas urgentes</p><p>para recompor a confiança no país.</p><p>Assim, o Presidente Itamar nomeou como Ministro da Fazenda o sociólogo</p><p>Fernando Henrique Cardoso, que iria propor um novo conjunto de medidas</p><p>econômicas com sua equipe para tentar estabilizar a taxa de inflação e melhorar</p><p>os demais indicadores macroeconômicos.</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>86</p><p>Neste tópico, você poderá analisar as principais</p><p>medidas que compuseram</p><p>o Plano Real e quais foram seus impactos na economia brasileira.</p><p>Bons estudos!</p><p>DICAS</p><p>O documentário Laboratório Brasil: 15 anos do Plano Real aborda como os</p><p>presidentes na década de 80 e 90 lidaram com o problema da inflação. A produção da</p><p>TV Câmara (2007), dirigida por Roberto Stefanelli, mostra pessoas que tiveram alguma</p><p>participação naquele cenário de crise econômica e social, além de observadores privilegiados</p><p>daquela situação, como Bresser-Pereira, Gustavo Franco, Fernando Henrique Cardoso,</p><p>Antonio Pallocci, Carlos Alberto Sardenberg, Paulo Nogueira Baptista, Fernando de Holanda</p><p>Barbosa, Bernard Appy, Vicentinho e Pedro Malan. Disponível no Youtube, pelo endereço:</p><p><https://www.youtube.com/watch?v=3LHH7nigO6A>. Acesso em: 26 nov. 2018.</p><p>2 A ELEIÇÃO DE FERNANDO COLLOR DE MELLO</p><p>As primeiras eleições diretas para presidente, após longos anos de</p><p>ditadura militar, ocorreram em 15 de novembro de 1989. Havia muito desgaste</p><p>do governo Sarney e sua imagem estava maculada pelos fracassos dos planos</p><p>econômicos que não contiveram a inflação. Os candidatos não queriam as suas</p><p>imagens associadas ao presidente Sarney, nem o candidato do seu partido Ulisses</p><p>Guimarães (PMDB). Foram 22 candidatos que puseram seu nome ao sufrágio</p><p>ao cargo máximo do executivo. Os principais nomes foram: Luiz Inácio Lula da</p><p>Silva (PT), Leonel Brizola (PDT), Mário Covas (PSDB), Fernando Collor de Mello</p><p>(PRN), Guilherme Afif Domingos (PL) e Enéas Carneiro (PRONA) (SOUZA, 2008).</p><p>O marketing eleitoral de Fernando Collor conquistou, especialmente, os</p><p>mais conservadores da sociedade brasileira. Ele havia fundado um partido novo,</p><p>o Partido da Reconstrução Nacional (PRN), e centrou sua campanha na caça</p><p>aos marajás, que eram entendidos como os funcionários públicos, bem como,</p><p>no combate à corrupção na instituição pública. Prometia profundas reformas</p><p>administrativas e de ajuste da máquina estatal, assim, foi eleito, derrubando</p><p>nomes já bem conhecidos no cenário nacional (CASTRO, 2005).</p><p>Collor obteve 28,5% dos votos válidos, enquanto Lula obteve 16,13% e</p><p>Brizola com 15,53% eliminado para a disputa no segundo turno. No segundo</p><p>turno, o povo foi às urnas no dia 17 de dezembro de 1989 e elegeu Fernando</p><p>Collor com 49,85% dos votos apurados contra 44,32% dos votos apurados para</p><p>Lula (SOUZA, 2008).</p><p>TÓPICO 2 | A CONSOLIDAÇÃO DO REGIME DEMOCRÁTICO: NOVOS RUMOS PARA A ECONOMIA BRASILEIRA</p><p>COM O GOVERNO COLLOR E O GOVERNO DE ITAMAR FRANCO</p><p>87</p><p>Brum (2010) descreve o presidente Collor como ele se apresentou e sua</p><p>imagem foi construída pela mídia com um discurso que explorava o medo</p><p>do avanço político da esquerda no Brasil, além de um discurso moralista e</p><p>anticomunista. Assim, oferecia esperança aos mais pobres com uma expectativa</p><p>de melhora de suas vidas, e pretendia angariar os votos daqueles que tinham</p><p>a religiosidade como uma motivação para justificar seu voto. Tinha uma</p><p>personalidade autoritária, se dizia predestinado ao poder e que iria transformar</p><p>o Brasil em um país de Primeiro Mundo.</p><p>Em 15 de março de 1990, Fernando Collor de Mello assumiu a presidência</p><p>da República e anunciou um novo plano de estabilização econômica, denominado</p><p>Plano Collor. O seu governo iria ser marcado pela recessão causada pelos seus</p><p>planos I e II de estabilização, mas também pela restruturação produtiva que</p><p>foi iniciada derivada também das resoluções do Consenso de Washington.</p><p>A denominação foi dada pelo economista americano John Williamson que foi</p><p>professor na PUC/RJ (LACERDA et al., 2006). O Consenso de Washington tratou-</p><p>se de um receituário neoliberal que propunha, especialmente, aos países em</p><p>desenvolvimento e que estavam endividados com o FMI e com o Banco Mundial</p><p>e outras instituições financeiras e creditícias internacionais vinculadas, medidas</p><p>de liberalização e ajustes, tais como: redução do Estado, privatização, controle</p><p>dos gastos governamentais, ampla desregulamentação, entre outros instrumentos</p><p>liberais (CARVALHO; SILVA, 2000).</p><p>IMPORTANTE</p><p>Você sabe o que foi o Consenso de Washington?</p><p>Um exemplar do protocolo neoliberal, formulado no ano de 1989. O Consenso</p><p>agrega uma conjunção de medidas buscando o desenvolvimento e a ampliação do</p><p>neoliberalismo nos países da América Latina. Suas recomendações tinham alicerce em dez</p><p>pontos principais:</p><p>1) disciplina fiscal;</p><p>2) redução dos gastos públicos;</p><p>3) reforma tributária;</p><p>4) determinação dos juros pelo mercado;</p><p>5) câmbio dependente igualmente do mercado;</p><p>6) liberalização do comércio;</p><p>7) eliminação de restrições para o investimento estrangeiro direto;</p><p>8) privatização das empresas estatais;</p><p>9) desregulamentação;</p><p>10)respeito e acesso regulamentados à propriedade intelectual.</p><p>FONTE: LOPES, Carlos. Crescimento econômico e desigualdade: as novidades pós-consenso</p><p>de Washington. Revista Crítica de Ciências Sociais, v.94, n. não temático, p. 3-20, 2011.</p><p>Disponível em: <https://rccs.revues.org/1475?lang=pt#tocto1n1>. Acesso em: 8 out. 2016.</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>88</p><p>O Brasil enfrentava a crise da dívida externa, não poderia desagradar os</p><p>credores internacionais e perder ainda mais a credibilidade externa, já bastante</p><p>afetada após o pedido de moratória:</p><p>Entretanto, o acatamento do receituário neoliberal afastou as maiores</p><p>desconfianças em relação ao retorno dos capitais internacionais.</p><p>Seguiu-se, no final da década de 80, a implementação do Plano Brady,</p><p>que possibilitou a renegociação dos débitos antigos para prazos mais</p><p>compatíveis com a capacidade de pagamento dos países endividados</p><p>do Terceiro Mundo. Desde então, países ricos e pobres se envolveram</p><p>no processo de crescente interdependência financeira, correndo todos</p><p>os riscos envolvidos (CARVALHO; SILVA, 2000, p. 259).</p><p>O processo de globalização se intensificava e a discussão sobre abertura</p><p>econômica se acirrava nos países em desenvolvimento. No Brasil, o processo</p><p>de substituição de importação já havia esgotado na década de 80, mas o Brasil</p><p>continuava sendo um dos países da América do Sul mais fechados. A discussão</p><p>permeava entre como esses países suportariam a concorrência internacional e como</p><p>tais processos liberalizantes iriam impactar nos indicadores macroeconômicos.</p><p>Joseph E. Stiglitz, ex-presidente do Banco Mundial, declara em seu</p><p>livro, Os exuberantes anos 90, que os Estados Unidos propuseram uma visão da</p><p>liberalização dos mercados tanto para os países desenvolvidos como para os</p><p>países em desenvolvimento, trazendo prosperidade e riqueza. Contudo, como</p><p>se observou no final dos anos 90, somente oportunizou que os ricos e poderosos</p><p>pudessem explorar os mais pobres e fracos. Na América Latina a implantação da</p><p>liberalização comercial foi concentrada na abertura comercial de seus mercados</p><p>para a importação e não foi orientada à exportação, como aconteceu com os países</p><p>asiáticos bem-sucedidos nas últimas décadas. A má gestão da globalização em</p><p>longo prazo pode ser cara para os Estados Unidos, em curto prazo foi benéfica,</p><p>e a história tem provado que o que é bom para os Estados Unidos nem sempre é</p><p>bom para o resto do mundo e vice-versa (STIGLITZ, 2003). Vejamos como ocorreu</p><p>o novo governo democrático brasileiro e como o fenômeno da globalização e o</p><p>receituário do Consenso de Washington podem ser inseridos no contexto brasileiro.</p><p>FIGURA 4 – FERNANDO COLLOR ASSUME A PRESIDÊNCIA DO BRASIL EM 1990</p><p>FONTE: <https://brasil.elpais.com/brasil/2016/04/15/album/1460673173_292998.html#foto_</p><p>gal_1>. Acesso em: 28 nov. 2018.</p><p>TÓPICO 2 | A CONSOLIDAÇÃO DO REGIME DEMOCRÁTICO: NOVOS RUMOS PARA A ECONOMIA BRASILEIRA</p><p>COM O GOVERNO COLLOR E O GOVERNO DE ITAMAR FRANCO</p><p>89</p><p>3 O GOVERNO COLLOR E AS MEDIDAS LIBERALIZANTES</p><p>A discussão sobre o crescimento econômico e a abertura comercial não</p><p>têm uma opinião consensual entre os especialistas da área. A liberalização do</p><p>comércio compreende a redução ou eliminação de tarifas, subsídios, cotas entre</p><p>outras formas de proteção comercial. No entanto, para o sucesso</p><p>de uma política de</p><p>liberalização comercial, os parceiros comerciais devem fazer de forma recíproca.</p><p>Na reunião do GATT (Acordo Geral de Tarifas), em 1986, o Estados Unidos</p><p>propuseram na Rodada do Uruguai que o comércio e serviços fossem incluídos</p><p>da mesma forma que bens na liberalização (CAVES; FRANKEL; JONES, 2001).</p><p>No entanto, a liberalização comercial e a maior abertura econômica para</p><p>países em desenvolvimento abrangem questões de como iniciar o processo sem</p><p>causar impactos danosos na economia. Existe um consenso que demonstra que o</p><p>processo de abertura econômica em países em desenvolvimento deve fazer com</p><p>que os ajustes não impactem tão forte no nível de empregos.</p><p>É indicado que se comece a instaurá-lo em um contexto macroeconômico</p><p>estável, que a taxa de câmbio seja desvalorizada para não cair o nível de</p><p>exportações. A maioria dos especialistas recomenda que a liberalização se inicie</p><p>pelo mercado de bens para depois liberalizar o mercado de capitais. A tese é de</p><p>que a liberalização das restrições ao mercado de capitais incitaria para a entrada</p><p>de capitais, valorizando a moeda, podendo gerar excesso de endividamento</p><p>externo a longo prazo (LACERDA et al., 2006).</p><p>Do ponto de vista macroeconômico, argumenta-se que a possibilidade</p><p>de existência de diferenciais de juros e de rentabilidade de investimento</p><p>incentivaria a entrada de recursos externos em larga escala, cuja</p><p>consequência mais provável seria uma apreciação da taxa de câmbio</p><p>real. Embora se reconheça o potencial regulatório desse movimento,</p><p>existe uma preocupação no que se refere à duração, uma vez que,</p><p>sendo longa, pode gerar um excesso de endividamento externo, que</p><p>é, ao mesmo tempo, causa e consequência da apreciação cambial.</p><p>Esse processo tende a ser compensado com desvalorizações cambiais</p><p>devido ao efeito deletério sobre a economia, como ilustram os casos do</p><p>Chile e da Argentina (anos 1970). Outra consequência é a deterioração</p><p>do balanço de pagamentos causada pelo crescente déficit em conta</p><p>corrente. Esse déficit é impulsionado por um progressivo movimento</p><p>de preços relativos desfavoráveis aos bens comercializáveis, mediante</p><p>combinação de valorização cambial e eliminação de barreiras</p><p>comerciais. Ambos os processos tendem a provocar atrasos no</p><p>processo de liberalização comercial (LACERDA et al., 2006, p. 205).</p><p>De acordo com a CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina), a</p><p>tarifa média de importação na América Latina e Caribe, que era de aproximadamente</p><p>40%, foi reduzida para menos de 15%, sendo que os países foram adotando a</p><p>abertura comercial sem receber uma contrapartida dos países mais ricos. O México</p><p>e Chile aderiram em 1985, a Bolívia em 1986, a Argentina e a Venezuela em 1989, e</p><p>o Brasil, o Peru e a Colômbia entraram no jogo em 1990 (SOUZA, 2008).</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>90</p><p>A eleição de Collor reunia promessas de estabilizar a economia, reduzindo</p><p>a inflação e criando condições para renegociar a dívida externa e instaurar o cenário</p><p>macroeconômico propício para operar as medidas sugeridas pelo Consenso de</p><p>Washington. Na agenda política de governo entraram a pauta de abertura econômica</p><p>e a liberalização e a necessidade de um plano que incluísse a desestatização.</p><p>Em março de 1990, Collor lança o Plano Collor I. A frente do Ministério da</p><p>Economia (o ministério do Planejamento e da Fazenda foi agregado ao Ministério</p><p>da Economia) estava sob responsabilidade de Zélia Cardoso de Mello, a primeira</p><p>mulher a ocupar o ministério no Brasil. Foram reduzidos os ministérios de 23 para</p><p>12 e extintas várias secretarias e instituída campanha de demissão de funcionários</p><p>(GIAMBIAGI et al., 2005). O plano tinha como principal medida a “combinação do</p><p>confisco dos depósitos à vista e aplicações com prefixação da correção dos preços</p><p>e salários, câmbio flutuante, tributação ampliada sobre aplicações financeiras e a</p><p>chamada ‘reforma administrativa’ [...]” (LACERDA et al., 2006, p. 209). O plano</p><p>fundamentava-se em elementos ortodoxos e heterodoxos, especialmente em</p><p>ajustes fiscal e monetário (LOPES; ROSSETTI, 1998).</p><p>A abertura econômica seria fundamental para o sucesso do plano de</p><p>estabilização. A liberalização das importações pressionaria os produtores</p><p>a reduzirem e não a reajustarem os preços de suas mercadorias diante da</p><p>concorrência internacional (PIRES, 2010).</p><p>O confisco determinava que 80% dos depósitos aplicados no overnight,</p><p>em contas correntes e poupanças, e com depósitos acima de NCz$ 50.000,00 (de</p><p>acordo com Giambigi et al. (2005) equivalia a US$1200,00 na cotação da época),</p><p>seriam congelados durante 18 meses. Durante o bloqueio, os valores seriam</p><p>valorizados pela taxa de inflação somadas as taxas de juros de 6% a.a.. Foi criada</p><p>uma nova moeda para substituir o cruzado novo, o Cruzeiro, que tinha a cotação</p><p>1 x 1. As operações financeiras foram taxadas com o imposto (IOF), recaindo</p><p>sobre o volume de ativos financeiros, comercialização de ouro e ações e sobre o</p><p>saque de contas de poupança (PIRES, 2010).</p><p>IMPORTANTE</p><p>O que é bloqueio de liquidez ou confisco?</p><p>O Plano Collor integra o grupo de políticas de estabilização que</p><p>incluíram limitação ou cancelamento da liquidez de haveres monetários</p><p>(moeda manual e depósitos à vista) ou da conversibilidade de haveres</p><p>financeiros em moeda. Tais restrições assumiram formas variadas,</p><p>desde desvalorização nominal, alongamento compulsório de prazos</p><p>e bloqueio temporário até repúdio e anulação. Existiram dezenas</p><p>de programas com medidas desse tipo no século XX, a maioria na</p><p>sequência de guerras e hiperinflações, mas pouco esclarecem sobre os</p><p>casos latino-americanos das últimas décadas, como o Plano Collor. A</p><p>TÓPICO 2 | A CONSOLIDAÇÃO DO REGIME DEMOCRÁTICO: NOVOS RUMOS PARA A ECONOMIA BRASILEIRA</p><p>COM O GOVERNO COLLOR E O GOVERNO DE ITAMAR FRANCO</p><p>91</p><p>expressão bloqueio da liquidez é a mais precisa para designar essas</p><p>iniciativas, por enfatizar o traço específico que as distingue de outras:</p><p>a suspensão (parcial ou total, temporária ou definitiva) do direito ao</p><p>exercício da liquidez de ativos financeiros.</p><p>Medidas desse tipo têm sido designadas como reformas monetárias, por</p><p>incluírem em geral a troca de moeda e por apresentarem motivações</p><p>de ordem monetária — controle da emissão, redução da liquidez ou</p><p>reorganização do meio circulante. Trata-se de denominação imprecisa,</p><p>por ter sido empregada desde o século passado para designar iniciativas de</p><p>política monetária e cambial (Ramalho, 1993, p. 536). A expressão “confisco</p><p>monetário” é adotada por Ramalho (1993, p. 536), sob o argumento de</p><p>que esses programas representam de fato um confisco de valores da</p><p>população pelo Estado, mesmo quando há compromisso explícito de</p><p>devolução ou liberação. Economicamente, os legítimos donos são</p><p>privados (inteiramente ou ao menos em grande extensão) do domínio e do</p><p>usufruto de seus fundos. Para a análise e a caracterização de um programa</p><p>específico, porém, não é irrelevante que inclua o propósito de confiscar</p><p>valores e obrigações ou devolução ao final de certo tempo (CARVALHO,</p><p>2006, p.105-106).</p><p>O confisco gerou grande polêmica, pois tinha o objetivo de retirar dinheiro</p><p>de circulação, entretanto, afetou drasticamente a classe média e o andamento</p><p>das atividades produtivas no país e foi uma das medidas mais impopulares já</p><p>tomadas por uma equipe econômica. De acordo com Lopes e Rossetti (1998), o</p><p>confisco abrangeu em torno de 70% da disponibilidade financeira total. Após o</p><p>choque as disponibilidades líquidas caíram de 25,53% (1989) para 8,89% do PIB</p><p>em março de 1990. O impacto na inflação foi sentido de imediato, em março de</p><p>1990 caiu para 3,29%. Entretanto, no mês seguinte retomou a trajetória de alta,</p><p>5,38% em abril, 9,61% em maio, demonstrando a ineficácia das medidas tomadas.</p><p>No sentido de reduzir os gastos públicos o plano eliminou subsídios e</p><p>incentivos fiscais. Ainda, previa a eliminação de vários órgãos governamentais e</p><p>a realocação ou demissão de 360</p><p>mil funcionários públicos. Ainda como medida</p><p>de reduzir o Estado, previa a privatização de várias empresas estatais. Por outro</p><p>lado, propunha um tarifaço antes de congelar essas tarifas públicas, tais como</p><p>combustíveis, eletricidade, telefonia, serviços postais etc. (PIRES, 2010).</p><p>O Plano Collor I conseguiu alguns resultados como diminuir a dívida interna,</p><p>por meio dos gastos públicos, e elevação da arrecadação do fisco. No período foi</p><p>atingido um superávit operacional de 1,2% do PIB, em 1990, e por meio do superávit</p><p>primário, que foi de 4,5% do PIB (PIRES, 2010). A inflação nos primeiros meses</p><p>apresentou redução de 80% ao mês e nos meses seguintes entre 10%.</p><p>Entretanto, a inflação voltou a elevar-se, ao final de 1990 estava acumulando</p><p>1476,6% pelo IGP. Notou-se que a cultura inflacionária não havia sido debelada,</p><p>além disso os cartéis pressionavam o aumento dos preços alegando o repasse</p><p>de seus custos de produção. Os preços públicos foram congelados, mas depois</p><p>foram corrigidos. Outro fator foi a adequação dos preços relativos em desníveis,</p><p>de acordo com a estrutura interna. Os conflitos distributivos internos entre os</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>92</p><p>diferentes interesses econômicos também ficaram evidentes e agudos no período.</p><p>Externamente, o confronto do Golfo Pérsico também influenciou a alta de</p><p>determinados preços (LOPES; ROSSETTI, 1998). Bresser-Pereira analisa a volta</p><p>da inflação após o Plano Collor, sendo analisada de diferentes ângulos de acordo</p><p>com a corrente de interpretação econômica:</p><p>Por que retornou a inflação? Há três explicações para o fenômeno: a</p><p>monetarista, a keynesiana e a neoestruturalista ou inercialista. Tanto o</p><p>raciocínio monetarista quanto o keynesiano estão apoiados no aumento</p><p>da quantidade de moeda acima das previsões do governo. A análise</p><p>neoestruturalista apoia-se fundamentalmente no desequilíbrio dos preços</p><p>relativos e no conflito distributivo (BRESSER-PEREIRA, 1990, p. 56).</p><p>Todos esses fatores podem ser interpretados para a retomada do ritmo</p><p>de crescimento da inflação e derrubaram a ministra Zélia Cardoso de Mello, que</p><p>foi substituída por Marcílio Marques Moreira. A equipe econômica formulou um</p><p>novo plano para conter a inflação e o apresentou em fevereiro de 1991:</p><p>FIGURA 5 – PRINCIPAIS MEDIDAS DO PLANO COLLOR II</p><p>FONTE: Adaptado de Lopes e Rossetti (1998, p. 378)</p><p>PLANO COLLOR II</p><p>Extinção de indexadores oficiais - Foi criada a TR, taxa referial</p><p>de juros, calculada pelo Banco Central a partir de uma amostra de</p><p>taxas praticadas em CDBs (Certificados de depósitos bancários). O</p><p>objetivo é servir como indexador de tributos e aplicações financeiras.</p><p>Conversão dos salários à média real dos últimos doze meses - as</p><p>correções foram atreladas às variações de preços da cesta básica.</p><p>Congelamento dos Preços - com cláusula de flexibilização, mediante</p><p>análise de estruturas de custos das cadeias produtivas.</p><p>TÓPICO 2 | A CONSOLIDAÇÃO DO REGIME DEMOCRÁTICO: NOVOS RUMOS PARA A ECONOMIA BRASILEIRA</p><p>COM O GOVERNO COLLOR E O GOVERNO DE ITAMAR FRANCO</p><p>93</p><p>PLANO COLLOR II</p><p>Ajuste fi scal - foram eliminados os subsídios praticados, ajustes em</p><p>tarifas públicas (entre 46% e 56,5%), cortes de dispêndios de custeio,</p><p>controle orçamentário de estatais, expansão de impostos sobre ganhos</p><p>de capital e intensifi cação e agilidade nos programas para privatizar.</p><p>Defl acionamento de dívidas - contraídas nos cincos meses anteriores</p><p>ao plano. O defl ator utilizado era composto da multiplicação de</p><p>1,0116 por dia útil.</p><p>Criação de FAFs (Fundos de Aplicação Financeira) - com a fi nalidade</p><p>de alongar as aplicações e evitar a especulação de curto prazo no</p><p>overnight. As carteiras dos FAFs continham obrigatoriamente títulos</p><p>públicos e cotas de fundos de desenvolvimento econômico e social.</p><p>O plano entendia que a indexação da economia era uma das principais</p><p>causas da infl ação, na época a infl ação estava em 20% ao mês. O BTN (Bônus do</p><p>Tesouro Nacional) foi extinto como indexador dos impostos e substituído pela</p><p>TR, que tinha um modelo de foward looking, embutindo expectativas de infl ação</p><p>futura (GIAMBIAGI et al., 2005). O Plano Collor II também incluía medidas para</p><p>tentar conter a especulação da moeda na “ciranda fi nanceira”:</p><p>FIGURA 6 – PRINCIPAIS MEDIDAS DO PLANO COLLOR II(2)</p><p>FONTE: Adaptado de Lopes e Rossetti (1998, p. 378-379)</p><p>As reformas no governo Collor também atingiram a política exterior.</p><p>Paralelamente à implementação do câmbio livre, ocorreu o estímulo da liberalização</p><p>das importações. As listas de produtos com emissão de guias de importação foram</p><p>extirpadas e também os regimes especiais de importação, com exceção da Zona</p><p>Franca de Manaus, drawback e bens de informática. Além disso, foi anunciada uma</p><p>reforma tarifária para reduzir as alíquotas de importação. Vários produtos teriam</p><p>reduções de tarifas graduais nos próximos quatro anos. O objetivo era preparar os</p><p>produtores para uma economia mais aberta e com concorrência internacional. A</p><p>tabela a seguir mostra a redução das tarifas implementadas de 1990 a 1994. Observe</p><p>que a tarifa média em 1990 no Brasil era de 32,2% e foi reduzida a 14,2% em 1994.</p><p>Produtos como veículos de passageiros estavam extremamente protegidos com</p><p>alíquotas de importação de 85%, com redução para 34,3% em 1994.</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>94</p><p>TABELA 3 – ALÍQUOTAS DE IMPORTAÇÃO DE SETORES SELECIONADOS – 1990-1994 (%)</p><p>1990 1991 1992 1993 1994</p><p>Tarifa média 32,2 25,3 21,2 17,1 14,2</p><p>Tarifa modal 40,0 20,0 20,0 20,0 20,0</p><p>Desvio-padrão 19,6 17,4 14,2 7,9 7,9</p><p>Setores Selecionados</p><p>Insumos industriais básicos 12,6 8,3 6,1 4,8 4,3</p><p>Bens de capital 36,0 29,2 25,0 21,0 19,3</p><p>Veículos de passageiros 85,0 59,3 49,3 39,3 34,3</p><p>Peças e acessórios de bens de capital 34,0 27,8 24,3 20,9 19,1</p><p>Peças e acessórios de equipamentos de</p><p>transportes 39,1 31,5 26,3 21,2 18,6</p><p>Outros 51,2 40,7 33,5 25,7 19,3</p><p>FONTE: Giambigi et al. (2005, p. 147)</p><p>A tabela a seguir apresenta as taxas de crescimento do Produto Interno</p><p>Bruto do Brasil. O que podemos deduzir foi que os Planos Collor impuseram uma</p><p>recessão ao país, dados os níveis negativos de crescimento. A inflação não foi contida.</p><p>O Plano Collor conseguiu que reduzisse a inflação de 1.476,60% para 480,20%, ou</p><p>seja, são taxas de hiperinflação, não respondendo à promessa de campanha que</p><p>a inflação seria estancada de um só tiro. Entretanto, apesar da polêmica abertura</p><p>comercial com política de redução tarifária e outros instrumentos liberalizantes, as</p><p>exportações não tiveram um impacto abrupto, ao contrário, obtiveram crescimento</p><p>e apresentaram entre os anos de 1990 a 1992 superávit comercial.</p><p>TABELA 4 – CRESCIMENTO DO PIB, INFLAÇÃO E BALANÇA COMERCIAL (1990 A 1992)</p><p>FONTE: Banco Central do Brasil (apud BRUM, 2010, p. 478)</p><p>Ano Crescimento do PIB Inflação (%) Exportação Importação Saldo</p><p>(%) (US$ milhões) (US$</p><p>milhões)</p><p>(US$</p><p>milhões)</p><p>1990 -4,3 1.476,60 31.414 20.661 10.753</p><p>1991 0,3 480,20 31.620 21.041 10.579</p><p>1992 -0,8 1.158,00 35.793 20.554 15.239</p><p>A abertura comercial provocou ajustes e reestruturação dos setores</p><p>industriais brasileiros. Esses ajustes envolveram a concentração da produção</p><p>nos produtos mais competitivos, diminuíram a diversificação da produção e</p><p>implantaram sistemas de controle de qualidade e estratégias para aumento</p><p>da produtividade. Além disso, muitas empresas, para poderem reduzir seus</p><p>custos, optaram por reduzir o quadro de colaboradores, e pela terceirização e</p><p>desvertizalização (LACERDA et al., 2006).</p><p>TÓPICO 2 | A CONSOLIDAÇÃO DO REGIME DEMOCRÁTICO: NOVOS RUMOS PARA A ECONOMIA BRASILEIRA</p><p>COM O GOVERNO COLLOR E O GOVERNO DE ITAMAR FRANCO</p><p>95</p><p>A maior abertura e a política da liberalização não conseguiram, nos</p><p>primeiros anos, restaurar a confiança dos investidores estrangeiros. As reservas</p><p>internacionais de 1990 que eram US$ 9.973 caíram para US$ 9.406 em 1991, tomando</p><p>maior o impulso somente no ano seguinte. A dívida externa</p><p>bruta continuava</p><p>muito alta, acentuando o nível de dependência externa brasileira. Embora o</p><p>governo estivesse adotando medidas para enxugar a máquina administrativa e</p><p>mostrar resultados positivos no ajustes das contas governamentais, observa-se</p><p>que a dívida líquida foi reduzida em 1991, mas o governo não foi capaz de seguir</p><p>atenuando a dívida, e voltou a crescer em 1992.</p><p>TABELA 5 – DÍVIDA EXTERNA DO BRASIL – US$ MILHÕES (1990 A 1994)</p><p>Ano Dívida Externa Reservas Dívida</p><p>Bruta Internacionais Líquida</p><p>1990 96.546 9.973 86.573</p><p>1991 92.996 9.406 83.590</p><p>1992 110.835 23.754 87.081</p><p>1993 114.270 32.211 82.059</p><p>1994 119.668 38.806 80.862</p><p>FONTE: Adaptado de Conjuntura (2005)</p><p>A dívida externa ainda era um monstro que o governo não conseguira</p><p>aplacar. Neste sentido, caminhar com medidas para reduzir o Estado e enxugar as</p><p>despesas públicas estariam sendo medidas associadas à necessidade de formulação</p><p>de uma reforma administrativa, bem como um plano de privatização. De acordo com</p><p>Pires (2010), em meio às denúncias de corrupção contra o Presidente Collor, em 1992,</p><p>acordos com os credores internacionais foram realizados em detrimentos aos interesses</p><p>nacionais. O negociador da dívida era Pedro Malan, ex-diretor do Banco Mundial</p><p>e consultor do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que renegociou o</p><p>pagamento dos serviços da dívida externa, comprometendo o direcionamento das</p><p>políticas econômicas internas às imposições dos credores internacionais.</p><p>O Plano Nacional de Desestatização foi desenhado com o propósito que</p><p>este contribuísse com a estabilidade e melhorasse o parque industrial brasileiro e</p><p>também seria utilizado para diminuir a dívida pública como moeda da privatização</p><p>por meio da emissão de títulos. Os cruzados bloqueados no Plano Collor I também</p><p>imaginava-se que seriam convertidos em recursos na privatização. Os principais</p><p>setores envolvidos nas primeiras privatizações foram: siderurgia, petroquímica e</p><p>fertilizantes (CASTRO, 2005).</p><p>O quadro a seguir apresenta uma apuração do número de estatais</p><p>privatizadas em cada governo. O total das privatizações foi de US$8.607 e de</p><p>transferências para o setor privado US$3,3 bilhões em dívidas (TEIXEIRA, 2006).</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>96</p><p>QUADRO 3 – BALANÇO DO PND (DEZ. 1994)</p><p>FONTE: BNDS (apud TEIXEIRA, 2006, p. 78)</p><p>Governo Nº de empresas</p><p>desestatizadas</p><p>Valores obtidos</p><p>em moeda</p><p>corrente (US$</p><p>milhões)</p><p>TOTAL obtido</p><p>(US$ milhões)</p><p>Collor 15 16 3.494</p><p>Itamar 18 1.589 5.113</p><p>TOTAL 33 1.605 8.607</p><p>Os resultados das privatizações não atenderam às expectativas iniciais</p><p>proclamadas por Collor. Houve avaliação equivocada das estatais, pois havia</p><p>também a dificuldade de fazer a avaliação adequada devido à própria inflação,</p><p>e algumas dessas empresas também enfrentavam dificuldades financeiras pela</p><p>forma de sua gestão (CASTRO, 2005).</p><p>O Presidente Collor começou a enfrentar o desgaste político e, diante dos</p><p>fracassos com os planos, perdeu o apoio popular e político e enfrentou acusões</p><p>de corrupção. Em 1992, seu próprio irmão caçula o acusou de corrupção com seu</p><p>tesoureiro de sua campanha de governo. A população indignada saiu às ruas</p><p>pedindo o seu impeachment. Ele ainda tentou pedir a sua renúncia, mas o Supremo</p><p>Tribunal Federal acatou o pedido de impeachment feito pelo Congresso Nacional</p><p>e a suspensão dos seus direitos políticos por oito anos (BRUM, 2010). O presidente</p><p>Fernando Collor iniciou sua campanha eleitoral como “caçador de marajás” e não</p><p>terminou seu mandato presidencial, acusado de corrupção, em dezembro de 1992.</p><p>No contexto, assumiu a presidência do Brasil seu vice, Itamar Franco.</p><p>IMPORTANTE</p><p>O impeachment do presidente Collor</p><p>A queda de Collor começou após denúncias de corrupção no governo feitas pelo irmão</p><p>Pedro Collor e que envolviam também o tesoureiro de campanha Paulo César Farias, abrindo</p><p>espaço para o afastamento do então Presidente da República pela Câmara dos Deputados.</p><p>Eram denúncias de tráfico de influência, loteamento de cargos públicos e recebimento de</p><p>propina que teriam beneficiado integrantes do governo, no chamado “esquema PC”.</p><p>O Congresso Nacional se viu, então, obrigado a instalar a Comissão Parlamentar de</p><p>Inquérito (CPI) para investigar o caso. Foram ouvidos a sua secretária Ana Accioly e seu ex-</p><p>motorista Francisco Eriberto, que falaram de um esquema que teria sido operacionalizado,</p><p>em parte, por contas “fantasmas” para a transferência de recursos. Gastos da "Casa da Dinda",</p><p>residência oficial durante o governo Collor, pagos por PC Farais estavam entre as acusações.</p><p>Durante os trabalhos da CPI no Congresso Nacional, a população foi às ruas e estudantes</p><p>TÓPICO 2 | A CONSOLIDAÇÃO DO REGIME DEMOCRÁTICO: NOVOS RUMOS PARA A ECONOMIA BRASILEIRA</p><p>COM O GOVERNO COLLOR E O GOVERNO DE ITAMAR FRANCO</p><p>97</p><p>pintaram o rosto em protesto no movimento que ficou conhecido como os “caras-pintadas”.</p><p>As frases mais utilizadas eram "Fora Collor" e "Impeachment Já". Em uma última manobra,</p><p>Collor tentou que a votação fosse secreta, mas em uma sessão aberta os deputados optaram</p><p>pela abertura do processo de impeachment pela primeira vez na história do Brasil. Sem</p><p>saída, Fernando Collor renunciou com o processo em andamento. Teve os direitos políticos</p><p>cassados por oito anos.</p><p>De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral, o processo de impeachment foi</p><p>admitido no dia 29 de setembro de 1992. Por determinação legal, houve a  suspensão</p><p>imediata do exercício das funções do acusado. No dia 2 de outubro, o vice Itamar Franco</p><p>assumiu interinamente a presidência da República.</p><p>FONTE: O impeachment do presidente Collor. 2018. <http://www.ebc.com.br/noticias/</p><p>politica/2012/09/impeachment-de-collor-faz-vinte-anos>. Acesso em: 29 nov. 2018.</p><p>4 NOVOS RUMOS PARA A ECONOMIA BRASILEIRA COM O</p><p>PRESIDENTE ITAMAR FRANCO</p><p>O desgastante processo de impeachment deixou a população frustrada com</p><p>a classe política e a capacidade de superação da crise. O presidente Itamar Franco,</p><p>do PMDB, tinha a missão de superar o desgaste político como vice-presidente</p><p>de Fernando Collor e elevar os ânimos da população com a possibilidade de</p><p>estabilização da economia.</p><p>Em maio de 1993, o presidente Itamar Franco chama para comandar o</p><p>Ministério da Fazenda o sociólogo Fernando Henrique Cardoso. Em junho,</p><p>o ministro FHC lançou o Programa de Ação Imediata (PAI), dando um novo</p><p>norte para as ações governamentais em curto, médio e longo prazos. O governo</p><p>Itamar Franco retomou vigorosamente o desafio de elaborar políticas de combate</p><p>à inflação e estabilização da economia. As questões referentes à abertura</p><p>comercial e à liberalização seriam mantidas, entretanto, o presidente Itamar</p><p>queria a retomada do crescimento econômico e redução da pobreza, que atingia</p><p>números exorbitantes da população brasileira. Portanto, as políticas recessivas</p><p>anteriormente seriam abandonadas para tentarem induzir o crescimento</p><p>moderado. O Brasil apresentou taxa de crescimento de 4,2% em 1993 e 5,8% em</p><p>1994. Quanto à proposta de ajuste fiscal inserida no PAI pode-se destacar:</p><p>Como propostas de ajuste fiscal uma emenda constitucional de</p><p>estabilização para criar o Fundo Social de Emergência, destinado</p><p>a vigorar por dois anos e uma lista de propostas de alterações da</p><p>Constituição destinadas a reduzir os gastos públicos e a redefinir o</p><p>papel do Estado na economia. Destacavam-se medidas voltadas para</p><p>a reforma da Previdência Social, o planejamento, o financiamento e a</p><p>administração do Estado e a redefinição das relações entre o capital</p><p>nacional e o capital estrangeiro e o papel das empresas estatais</p><p>(REBELO, 1994 apud PIRES, 2010, p. 284).</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>98</p><p>De acordo com Souza (2008), o PAI não passou de um programa</p><p>preparatório para a implantação do Plano Real. A equipe de Fernando Henrique</p><p>levaria o país ao aprofundamento da agenda imposta do Consenso de Washington</p><p>e o plano monetário tinha a base ortodoxa. Para</p><p>INTERNACIONAL ........................................................................................................155</p><p>1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................155</p><p>2 REELEIÇÃO DE LULA E O QUE MUDOU? .................................................................................156</p><p>RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................171</p><p>AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................172</p><p>TÓPICO 3 – CRISE POLÍTICA E A ECONOMIA NOS GOVERNOS DE DILMA E TEMER ....... 173</p><p>1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................173</p><p>2 ELEIÇÃO DA DILMA........................................................................................................................173</p><p>3 A CRISE POLÍTICA E ECONÔMICA NO SEGUNDO MANDATO DE DILMA ................178</p><p>4 TEMER NO PODER ...........................................................................................................................183</p><p>LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................185</p><p>RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................188</p><p>AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................189</p><p>REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................191</p><p>1</p><p>UNIDADE 1</p><p>ECONOMIA BRASILEIRA PÓS</p><p>SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE</p><p>DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE</p><p>IMPORTAÇÃO</p><p>OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM</p><p>PLANO DE ESTUDOS</p><p>A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:</p><p>• entender o processo de industrialização da economia brasileira;</p><p>• compreender o nacionalismo desenvolvimentista empregado à época;</p><p>• analisar as principais causas do fim do modelo de substituição de</p><p>importação;</p><p>• identifcar os fatores que desencadearam a crise inflacionária no final dos</p><p>governos militares.</p><p>Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você</p><p>encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.</p><p>TÓPICO 1 – SITUAÇÃO INTERNACIONAL E A INDÚSTRIA PESADA</p><p>NO BRASIL</p><p>TÓPICO 2 – REFORMAS, ENDIVIDAMENTO EXTERNO E O MILAGRE</p><p>ECONÔMICO</p><p>TÓPICO 3 – CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>E A CRISE INFLACIONÁRIA E FIM DOS GOVERNOS</p><p>MILITARES (1985)</p><p>2</p><p>3</p><p>TÓPICO 1</p><p>UNIDADE 1</p><p>SITUAÇÃO INTERNACIONAL E A</p><p>INDÚSTRIA PESADA NO BRASIL</p><p>1 INTRODUÇÃO</p><p>Ao longo do Tópico 1 você irá se debruçar mais afundo sobre a evolução</p><p>da economia brasileira após Segunda Guerra Mundial. Você irá perceber</p><p>que a trajetória de crescimento da economia brasileira, à época, foi marcada e</p><p>influenciada pelas bruscas reestruturações da economia mundial, como a crise de</p><p>1930 e a Segunda Guerra Mundial. Assim, você irá perceber que a crise que ocorreu</p><p>em 1930 fez com que o modelo econômico brasileiro, baseado na agroexportação,</p><p>sofresse forte declínio, abrindo margens para o processo de industrialização que</p><p>se iniciou com a Era Vargas.</p><p>Para conseguir abarcar seu propósito e para melhor aproveitamento,</p><p>o Tópico 1 foi dividido em três subtópicos. O primeiro refere-se ao retorno de</p><p>Getúlio Vargas e à industrialização pesada. O segundo diz respeito ao projeto</p><p>desenvolvimentista. Ainda, o terceiro refere-se ao Plano de Metas e ao capital</p><p>estrangeiro, que caracterizaram o governo de Juscelino Kubitschek.</p><p>Assim, iniciaremos o primeiro subtópico apresentando o primeiro governo</p><p>Vargas, que se iniciou em 1930 e findou em 1945, período este em que governou</p><p>sem interrupções ou trocas no poder. Durante os estudos, você irá perceber</p><p>que a crise de 1930 marcou a fragilização do modelo agrário e exportador e, ao</p><p>mesmo tempo, a necessidade de uma industrialização como forma de superar os</p><p>constrangimentos externos e desenvolver o país. O governo de Vargas foi marcado</p><p>pela forte intervenção estatal e pela emergência do Processo de Substituição de</p><p>Importações (PSI), marcando o início da industrialização brasileira.</p><p>No segundo subtópico, apresentaremos o projeto nacional</p><p>desenvolvimentista de Vargas, que marcou a implementação do PSI e modificou</p><p>de modo profundo as características da economia brasileira. A população migrou</p><p>do campo para a cidade para trabalhar nas fábricas, fornecendo um aparato de</p><p>mão de obra necessário para o processo de industrialização e urbanização, este</p><p>que estava ocorrendo na época.</p><p>No terceiro e último subtópico, atenção será dada ao Plano de Metas,</p><p>que foi instituído no governo de Juscelino Kubitschek, que governou o país</p><p>de 1956 a 1960. O Plano de Metas foi implementado com o slogan “50 anos de</p><p>progresso em 5 anos de realizações” e pode ser considerado o período de auge</p><p>da industrialização brasileira. O principal objetivo desse plano era estabelecer as</p><p>bases de uma economia industrial madura no país, de modo a aprofundar o setor</p><p>produtor de bens de consumo duráveis.</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>4</p><p>Após a breve apresentação, esperamos que vocês aproveitem ao máximo</p><p>o conteúdo preparado! Bons estudos!</p><p>2 O RETORNO DE GETÚLIO E A INDUSTRIALIZAÇÃO</p><p>Iniciaremos nossos estudos da Unidade 1 abordando o retorno de Getúlio</p><p>Vargas ao poder e os impactos de tal feito no processo de industrialização.</p><p>Contudo, antes disso, é importante falar um pouco sobre as características do</p><p>governo Vargas e recapitular alguns pontos importantes do seu primeiro governo,</p><p>quando foi presidente do Brasil por 15 anos ininterruptos, entre 1930 e 1945.</p><p>De acordo com Sandroni (2010, p. 876), Vargas pode ser considerado o</p><p>“mais influente estadista brasileiro do século XX, chefe máximo do movimento</p><p>trabalhista no país e figura dominante na política do Brasil por 24 anos”. Seu</p><p>governo foi marcado pelo populismo e por uma política econômica nacionalista.</p><p>A respeito do primeiro governo Vargas, é importante ressaltar que a</p><p>crise de 1930 foi um momento que marcou a fragilização do modelo agrário e</p><p>exportador e, ao mesmo tempo, a necessidade de uma industrialização como</p><p>forma de superar os constrangimentos externos e desenvolver o país. Getúlio</p><p>Vargas foi considerado o líder da Revolução de 1930 que teve como consequência</p><p>fim da República Velha. Seu governo, nesta época, foi marcado pela forte</p><p>intervenção estatal e pela emergência do Processo de Substituição de Importações</p><p>(PSI), marcando o início da industrialização brasileira.</p><p>O PSI envolvia protecionismo, a depreciação da moeda local e o controle</p><p>das importações, com vistas ao desenvolvimento da indústria nascente brasileira.</p><p>Pode-se considerar então que esse processo de industrialização ficou conhecido</p><p>por ser fechado em função de dois elementos: por ser uma industrialização voltada</p><p>para contemplar o mercado interno e por depender de medidas protecionistas para</p><p>a indústria nascente (GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).</p><p>Apesar do esforço realizado na época, considera-se que o processo de</p><p>industrialização não foi completo, uma vez que a indústria de bens de capital não</p><p>se desenvolveu, sendo o foco da industrialização brasileira o desenvolvimento</p><p>das indústrias de bens de consumo duráveis e não duráveis.</p><p>IMPORTANTE</p><p>Você sabe qual a diferença entre indústria de bens de capital, indústria de bens de</p><p>consumo duráveis, indústria de bens intermediários e indústria de bens de consumo não duráveis?</p><p>TÓPICO 1 | SITUAÇÃO INTERNACIONAL E A</p><p>5</p><p>A indústria de bens de capital refere-se à produção de máquinas e equipamentos,</p><p>ou</p><p>tanto, como preconizavam os</p><p>principais membros da equipe econômica, que idealizaram o plano monetário,</p><p>primeiramente, o governo precisava organizar a desordem financeira e a</p><p>administrativa interna.</p><p>A ideia de Fernando Henrique era acabar “com a Era Vargas”, ou seja, tirar</p><p>o Estado do controle das atividades econômicas. A proposição era cortar US$20</p><p>bilhões do gasto público, que equivaliam a 34,6% da receita líquida da União.</p><p>Entretanto, o corte ficou em apenas US$ 6 bilhões do orçamento de 1993. A equipe</p><p>também encaminhou para ser votado no Congresso um projeto que limitava as</p><p>despesas com funcionalismo público a 60% da receita corrente da União, estados</p><p>e municípios (SOUZA, 2008).</p><p>O Plano Real foi apresentado em 7 de novembro de 1993. O Plano Real foi</p><p>anunciado na TV e nas cadeias de rádio pelo ministro Fernando Henrique, o qual</p><p>destacava a urgência de ajustar e controlar as contas públicas para que o plano</p><p>obtivesse êxito. À medida que os gastos governamentais fossem condizentes com</p><p>a arrecadação, não seria emitida moeda ou títulos, e a confiança na moeda pela</p><p>população voltaria (PIRES, 2010). A proposta precisava não somente ser apoiada</p><p>pelos políticos que deveriam mudar a Constituição, mas, também, precisava de</p><p>apoio e adesão popular para restaurar a confiança na moeda.</p><p>O Plano Real faz parte de uma família de planos que utilizou a âncora</p><p>cambial como mecanismo para estabilizar os preços. Sua matriz foi o</p><p>plano de estabilização da república de Weimar, concebido e executado</p><p>para combater a hiperinflação alemã de 1923-1924 pelo então presidente</p><p>do Banco Central alemão Hajlmar Schacht, que depois foi ministro da</p><p>Fazenda do Terceiro Reich até 1938 (PAULINO, 2010, p. 281).</p><p>A Medida Provisória nº 434, de 27 de fevereiro de 1994, criou a Unidade</p><p>Real de Valor (URV), que seria o instrumento de conversão para a introdução</p><p>gradual da nova moeda, o Real. A URV exercia a função de unidade de conta.</p><p>Isso significa que o Plano Real atribuiu uma unidade de valor para tentar unificar</p><p>a moeda (LOPES; ROSSETTI, 1998). Observe as funções da moeda que estavam</p><p>sendo buscadas por meio da introdução da URV.</p><p>TÓPICO 2 | A CONSOLIDAÇÃO DO REGIME DEMOCRÁTICO: NOVOS RUMOS PARA A ECONOMIA BRASILEIRA</p><p>COM O GOVERNO COLLOR E O GOVERNO DE ITAMAR FRANCO</p><p>99</p><p>FIGURA 7 – A CRIAÇÃO DA URV E O RESTABELECIMENTO DA</p><p>ESTABILIDADE MONETÁRIA NO BRASIL</p><p>FONTE: Adaptado de Lopes e Rossetti (1998, p. 381-382)</p><p>FUNÇÃO DE UNIDADE DE CONTA</p><p>• Exercida pela URV.</p><p>FUNÇÃO DE MEIO DE PAGAMENTO</p><p>• Exercida pela moeda corrente, temporariamente</p><p>mantida, o Cruzeiro real (CR$).</p><p>FUNÇÃO DE PAGAMENTO DIFERIDOS</p><p>• Exercida concomitantemente pela URV (como</p><p>unidade de conta) e pelo Cruzeiro Real (como</p><p>meio de pagamento).</p><p>FUNÇÃO RESERVA DE VALOR</p><p>• Exercida ainda por meio de um sistema de</p><p>indexação, com correções diárias. Pelo Decreto nº</p><p>1.066, também de 27-02-1994, estabeleceu-se que</p><p>a variação diária da URV expressa em cruzeiros</p><p>reais seria definida por três indices de preços de</p><p>ampla utilidade, o IGP-M, o IPCA-E e o IPC-FIPE.</p><p>Esse sistema bimonetário foi unificado com o Real. Os preços expressos</p><p>em URV foram convertidos em quatro meses. O processo era dado por US$1 =</p><p>1,00URV = R$1,00. Foram emitidas as notas de Real que foram trocadas. A taxa</p><p>oficial era R$1,00 por CR$2.750. O processo de estabilidade seguiu a ortodoxia</p><p>(LOPES; ROSSETTI, 1998).</p><p>A composição do Conselho Monetário Nacional (CMN) também foi</p><p>reduzida a três membros (Ministros da Fazenda e do Planejamento e Presidente</p><p>do Banco Central) e foi criada a Comissão da Moeda e do Crédito (COMOC). Essas</p><p>medidas visavam conceder maior autonomia e independência às autoridades</p><p>monetárias. Criou-se um mecanismo de controle do processo emissor para evitar</p><p>a expansão da base monetária. Ainda, nova forma de cálculo e de aprovação de</p><p>uma programação monetária trimestral que deveria ser expressa pelo COMOC e</p><p>aprovada pelo Congresso Nacional (LOPES; ROSSETTI, 1998).</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>100</p><p>Os principais meios restritivos de liquidez foram, de acordo com Lopes e</p><p>Rossetti (2008):</p><p>• Recolhimento do compulsório de 100% dos depósitos à vista nos bancos</p><p>criadores de moeda.</p><p>• Aumento da taxa de recolhimento sobre os depósitos de poupança de 15% para</p><p>20%, sendo reduzida a faixa livre de aplicações de 15% para 10%.</p><p>• Imposição de recolhimento compulsório de 20% sobre depósitos a prazo.</p><p>• Instituído o câmbio flexível, e o BACEN iria atuar no mercado para influenciar</p><p>na apreciação, criando-se uma âncora para evitar o enfraquecimento da nova</p><p>moeda. O processo de abertura comercial e as medidas liberalizantes foram</p><p>intensificados para também contribuir com a diminuição dos preços praticados</p><p>pelos produtores internamente (LOPES; ROSSETTI, 1998). Embora, veremos</p><p>adiante que a Balança Comercial foi amplamente prejudicada, apresentando</p><p>significativos déficits comerciais.</p><p>• A taxa de juros foi amplamente elevada em agosto de 1993 para aliar-se à</p><p>contenção de circulação de moeda. As taxas de juros praticadas eram de 29%</p><p>a.a., em dezembro foram elavadas aos patamares de 42,57%. Em março de</p><p>1994, a taxa de juros teve uma leve queda para 40% (SOUZA, 2008).</p><p>• Como podemos observar no gráfico seguinte, que expressa as taxas de inflação</p><p>no Brasil, pode-se dizer que o plano Real foi bem-sucedido quanto ao combate</p><p>da inflação. Em 1993, ano de lançamento das primeiras medidas, o acumulado</p><p>da inflação foi de 2708,17%, sendo reduzida em 1994 para 1093,89%. Com a</p><p>gradual aceitação e a implementação do plano monetário, a inflação chegou a</p><p>14,78% no ano de 1995. É um resultado extraordinário após longos anos com</p><p>taxa de inflação anual acima de três dígitos.</p><p>GRÁFICO 5 – ÍNDICE DE INFLAÇÃO NO BRASIL – 1990 A 1995 (%)</p><p>FONTE: Adaptado de Conjuntura (2005)</p><p>TÓPICO 2 | A CONSOLIDAÇÃO DO REGIME DEMOCRÁTICO: NOVOS RUMOS PARA A ECONOMIA BRASILEIRA</p><p>COM O GOVERNO COLLOR E O GOVERNO DE ITAMAR FRANCO</p><p>101</p><p>Essa implementação do Plano Real aconteceu, mas teve seus custos à</p><p>sociedade. A redução do crescimento econômico nos seguintes anos exigiu</p><p>sacrifícios da população. A expansão da dívida pública devido às altas taxas de</p><p>juros praticadas. Com a valorização do real o balanço de pagamentos também</p><p>apresentou-se deficitário nos anos seguintes. Naturalmente, isso refletiu no nível</p><p>de empregos e precarização do trabalho.</p><p>Apesar dos efeitos controvertidos do Plano Real na economia, a</p><p>popularidade de Fernando Henrique havia se consolidado e lhe concedeu a</p><p>eleição com 54,3% dos votos válidos em 3 de outubro de 1994 (BRUM, 2010).</p><p>O presidente Itamar Franco terminou seu mandato deixando o legado da</p><p>estabilidade monetária, mas os louros da vitória foram concedidos ao seu ministro</p><p>da Fazenda, o FHC.</p><p>102</p><p>RESUMO DO TÓPICO 2</p><p>Neste tópico, você aprendeu que:</p><p>• O presidente Fernando Collor de Mello foi o primeiro presidente eleito de</p><p>forma direta em 1989. Teve como principal lema de campanha a caça aos</p><p>marajás, pretendia fazer uma reforma administrativa reduzindo os gastos</p><p>públicos, além de combater a inflação que se mantinha muito elevada.</p><p>• Muitas medidas adotadas pelo governo Collor refletiam as propostas do</p><p>Consenso de Washington, portanto, o governo iniciou um plano de abertura</p><p>comercial, desregulamentação do mercado financeiro, desestatização e redução</p><p>do Estado nas atividades econômicas.</p><p>• O Plano Collor I tinha como principal objetivo reduzir a inflação e fundamentou-se</p><p>no confisco dos depósitos à vista e aplicações com fixação da correção dos preços</p><p>e salários, câmbio flutuante, tributação ampliada sobre aplicações financeiras</p><p>e a chamada reforma administrativa. A medida foi extremamente impopular,</p><p>causando muito desgaste para a imagem do presidente e de sua equipe econômica.</p><p>• O Plano Collor II surgiu em resposta ao anterior, que não foi capaz de criar</p><p>mecanismos de controle da inflação. Lançou-se um congelamento de preços e</p><p>salários, além do deflacionamento de dívidas e ajuste</p><p>fiscal.</p><p>• No final de 1992, ocorreu o impeachment de Fernando Collor de Mello, acusado</p><p>em envolvimento de corrupção. Ele perde seu mandato e seus direitos políticos</p><p>por oito anos e sai com a imagem borrada na história da democracia brasileira.</p><p>• O vice-presidente Itamar Franco assume o governo brasileiro e tenta criar medidas</p><p>de contenção da inflação sem impor uma nova recessão à economia brasileira. Frente</p><p>a essas dificuldades de controle inflacionário, seu ministro da Fazenda, Fernando</p><p>Henrique Cardoso, propõe em 1993 o Programa de Ação Imediata, preparando o</p><p>terreno econômico para lançar o plano de estabilização denominado Plano Real.</p><p>• A equipe econômica do ministro Fernando Henrique estabeleceu o plano</p><p>monetário, mas, primeiramente, o governo precisava organizar a desordem</p><p>financeira e a administração interna.</p><p>• O Plano Real instituiu a URV como unidade de valor e a conversão para a</p><p>nova moeda, o Real, foi gradual. Além disso, utilizou medidas ortodoxas como</p><p>taxas de juros altas e o aumento do compulsório bancário. Os cortes de gastos</p><p>públicos, imposição de gastos governamentais de acordo com a arrecadação,</p><p>privatização, intensificação da abertura comercial e liberalização foram aliados</p><p>na contenção de aumentos de preços internos.</p><p>• O sucesso das medidas só foi começar a refletir em 1995, e isto conferiu a</p><p>presidência ao ex-ministro Fernando Henrique Cardoso.</p><p>103</p><p>AUTOATIVIDADE</p><p>1 Quais foram os principais fatores que contribuíram para a adoção da</p><p>abertura comercial do Brasil no início dos anos 90?</p><p>2 Quais foram as principais medidas adotadas no Plano Collor I?</p><p>3 O que levou o Plano Collor I a não ter conseguido conter o crescimento da</p><p>taxa inflação?</p><p>4 Quais as principais medidas adotadas pelo Plano Collor II?</p><p>5 Quais foram as medidas de política exterior praticadas no governo Collor?</p><p>6 Por que a privatização não obteve os resultados esperados para contribuir</p><p>efetivamente com o pagamento da dívida externa?</p><p>7 O que diferiu o Plano Real dos outros planos econômicos?</p><p>104</p><p>105</p><p>TÓPICO 3</p><p>REFORMAS, PRIVATIZAÇÕES E OS</p><p>DESEQUILÍBRIOS MACROECONÔMICOS</p><p>DO PERÍODO FHC</p><p>UNIDADE 2</p><p>1 INTRODUÇÃO</p><p>O ano de 1994 marcou uma grande mudança no cenário econômico</p><p>brasileiro. Após a implementação de vários planos de estabilização da inflação,</p><p>que ocorreram desde a década de 1980, o Plano Real foi implementado e obteve</p><p>o primeiro sucesso frente ao desafio inflacionário. Esse plano, diferentemente</p><p>dos demais, possuiu um mecanismo de neutralização da inércia inflacionária: a</p><p>implementação gradual da troca de moedas por meio da Unidade Real de Valor</p><p>(URV). Além da URV, foi adotada a ancoragem dos preços, de modo que os preços</p><p>domésticos foram ancorados nos preços internacionais (dólar). Essa estratégia de</p><p>ancoragem dos preços levou a uma apreciação do câmbio.</p><p>Será sobre esse novo período que iremos tratar adiante. Sobre os</p><p>dois mandatos do governo de Fernando Henrique Cardoso e de sua política</p><p>macroeconômica, para, no primeiro mandato, estabilizar a inflação, e no segundo,</p><p>corrigir desequilíbrios e déficits. Assim, iremos, inicialmente, ver que o Plano</p><p>Real, para combater o processo inflacionário, adotou três fases. Na primeira fase</p><p>foi realizado um ajuste fiscal visando diminuir o desequilíbrio orçamentário e</p><p>impedir que desses desequilíbrios decorressem pressões inflacionárias. Na</p><p>segunda fase, houve a indexação da economia já em 1994, substituindo o Cruzeiro</p><p>pela Unidade Real de Valor (URV), e corrigindo o valor diariamente pela taxa de</p><p>inflação dos principais índices. Na terceira, e última fase, realizou-se uma reforma</p><p>monetária, substituindo a URV pela nova moeda: o Real.</p><p>Iremos ver também que, após esses desdobramentos, o aparato político</p><p>econômico do primeiro mandato de FHC obteve sucesso na consolidação</p><p>da estabilidade dos preços. Apesar disso, é possível afirmar que seu primeiro</p><p>mandato terminou em meio a um processo de crise cambial, devido à deterioração</p><p>das contas externas e da situação fiscal. Em relação ao PIB, a trajetória foi de</p><p>baixo crescimento. Devido a esses problemas, no segundo mandato de FHC foi</p><p>necessária uma reorientação da política econômica vigente para combater os</p><p>déficits fiscal e externo. A partir de 1999, ocorreu, então, uma tríplice mudança dos</p><p>regimes: cambial, monetário e fiscal. Ao final deste Tópico 3, será possível verificar</p><p>que a implementação do Plano Real teve como esforço básico a manutenção da</p><p>estabilidade econômica, de modo a controlar o processo inflacionário.</p><p>Desejo a você bons estudos e que aproveite ao máximo nosso material!</p><p>106</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>2 PLANO REAL, SUAS CIRCUNSTÂNCIAS E O PRIMEIRO</p><p>MANDATO DO GOVERNO FHC</p><p>O Plano Real foi anunciado em sete de novembro de 1993 depois de</p><p>inúmeras tentativas de controlar a inflação. Na época, o Presidente da República</p><p>era Itamar Franco que assumiu, como presidente interino, após o impeachment</p><p>de Fernando Collor de Mello. Em 1993, na época da implementação do Plano</p><p>Real, Fernando Henrique Cardoso era ministro da Fazenda.</p><p>Como visto anteriormente, desde a década de 1980, o Brasil sofria com</p><p>o problema de hiperinflação. O Plano Real foi mais um plano que foi anunciado</p><p>como forma de estabilizar a economia, reduzindo a inflação anual de 2.500% para</p><p>menos de 10% em menos de um ano, garantindo, assim, que Fernando Henrique</p><p>Cardoso fosse eleito presidente por dois mandatos consecutivos, 1995 a 1998 e,</p><p>depois, 1999 a 2002 (PAULINO, 2010).</p><p>IMPORTANTE</p><p>Você sabe o que é inflação inercial?</p><p>Bem, vamos lá! Quando falamos sobre inflação inercial nos referimos à memória</p><p>inflacionária. Ou seja, a inflação presente é a inflação passada mais a expectativa de uma</p><p>inflação futura. Deste modo, quando tratamos da inflação inercial, há uma crença de que a</p><p>causa da inflação é a própria inflação! Assim, a inflação passada altera os preços do presente</p><p>e, consequentemente, estará embutida nos preços do futuro, não desaparecendo nunca!</p><p>Para combater a inflação inercial, antes do Plano Cruzado, houve um debate que</p><p>resultou em dois tipos de propostas: o choque heterodoxo que se baseava no congelamento</p><p>de preços e a reforma monetária, com a substituição da moeda ao longo do tempo. Para</p><p>combater o componente inercial da inflação, o Plano Real adotou uma reforma monetária.</p><p>O Plano Real foi concebido para ser implementado gradualmente, com correção dos</p><p>desequilíbrios existentes na economia e sem congelamento de preços, mas sim, uma</p><p>substituição natural da moeda (GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).</p><p>De acordo com o autor, é importante ter em mente que o Plano Real faz parte</p><p>de uma família de planos que, desde a década de 1980, utilizou a âncora cambial</p><p>como mecanismo para estabilizar preços. Apesar do sucesso, é relevante ter em</p><p>mente que os planos, que se utilizam de uma âncora cambial, priorizam a moeda e</p><p>colocam em segundo plano todas as demais variáveis nacionais. Desse modo, todo</p><p>o funcionamento da economia e o bem-estar da população devem se subordinar</p><p>à estabilidade monetária. Além disso, o Plano Real, assim como o Plano Cruzado,</p><p>partiu do diagnóstico de que a inflação brasileira possuía forte componente inercial.</p><p>TÓPICO 3 | REFORMAS, PRIVATIZAÇÕES E OS</p><p>107</p><p>Quando da implantação do Plano Real, a moeda que serviu como âncora</p><p>cambial foi o Dólar, devido à hegemonia internacional e à importância da</p><p>economia norte-americana. Para funcionar, era necessário que o Banco Central</p><p>brasileiro acumulasse divisas que funcionassem como âncora da moeda nacional.</p><p>Assim, era necessário haver liquidez internacional e algumas condições para que</p><p>os proprietários do capital externo (bancos e investidores) deixassem depósitos</p><p>junto ao Banco Central. Tais condições eram:</p><p>1) taxa de juros suficientemente alta para garantir um retorno</p><p>substancialmente maior que o custo de oportunidade de manter</p><p>esses mesmos recursos aplicados em ativos de baixo risco, no</p><p>caso, os Títulos do Tesouro</p><p>dos Estados Unidos; 2) baixo nível de</p><p>endividamento, para garantir que a elevação do passivo externo</p><p>não levasse o Estado brasileiro novamente à insolvência financeira;</p><p>3) disciplina fiscal rigorosa para produzir superávits orçamentários</p><p>— o chamado superávit primário — destinados ao pagamento dos</p><p>juros; e, por último, mas não menos importante, 4) a abertura da</p><p>conta de capitais, de forma a permitir que esses recursos externos</p><p>pudessem sair a qualquer momento do país sem sofrer nenhum tipo</p><p>de constrangimento por parte do governo (PAULINO, 2010, p. 283).</p><p>Grande parte dessas condições já estava prevista no lançamento do Plano</p><p>Real. Além disso, é importante salientar que o nível de endividamento do Estado era</p><p>baixo, no governo Collor, devido ao confisco da poupança que foi realizado. Além</p><p>disso, ainda no governo Collor, foi promovido um choque de juros, os quais foram</p><p>mantidos muito altos, acima da inflação. Esses fatores, juntamente com os baixos</p><p>juros externos, contribuíram para o Brasil captar mais de 40 bilhões de dólares, de</p><p>acordo com Paulino (2010), sendo estes recursos utilizados como lastro inicialmente.</p><p>O quadro que segue mostra a inflação acumulada no período de 1961 a 2006</p><p>em países selecionados. No caso brasileiro, a inflação acumulada no período foi de</p><p>mais de 14 quatrilhões, sendo que ao longo desse período o Brasil teve oito moedas</p><p>diferentes. Essas moedas foram: Cruzeiro (1942-1967), Cruzeiro Novo (1967-1970),</p><p>Cruzeiro (1970-1986), Cruzado (1986-1989), Cruzado Novo (1989-1990), Cruzeiro</p><p>(1991-1993), Cruzeiro Real (1993-1994) e, por fim, Real, desde 1994 (PAULINO, 2010).</p><p>QUADRO 4 – INFLAÇÃO ACUMULADA DE PAÍSES SELECIONADOS – DE 1961 A 2006 (EM %)</p><p>Países Inflação acumulada no período</p><p>Brasil 14.210.480.006.034.800</p><p>Argentina 256.376.764.519.163</p><p>Peru 216.144.603.134</p><p>Uruguai 2.001.304.938</p><p>Turquia 98.325.454</p><p>Chile 81.234.245</p><p>Indonésia 26.392.562</p><p>Israel 9.963.524</p><p>México 649.557</p><p>108</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>África do Sul 4.398</p><p>Espanha 3.130</p><p>Itália 2.134</p><p>Inglaterra 1.486</p><p>Zona do Euro 1.146</p><p>Noruega 916</p><p>FONTE: FGC, IBGE e Banco Mundial (apud LEITE, 2007, p. 85)</p><p>Além do quadro anterior, é importante analisar o gráfico que se segue.</p><p>Este mostra a variação do Índice de Preço ao Consumidor Amplo (IPCA) antes</p><p>da implementação do Plano Real, o que confirma a relevância de se criar uma</p><p>estratégia para combater a inflação inercial brasileira que subiu de modo</p><p>significativo entre as décadas de 1980 e 1990.</p><p>GRÁFICO 6 – VARIAÇÃO ANUAL DO IPCA (ANTES DO PLANO REAL)</p><p>FONTE: <https://www.btgpactualdigital.com/blog/financas/tudo-sobre-inflacao>.</p><p>Acesso em: 20 nov. 2018.</p><p>O diagnóstico do Plano Real apresentado à sociedade era de que a origem da</p><p>inflação brasileira era resultado do descontrole do gasto público, sendo necessário</p><p>reduzir gastos e diminuir o tamanho do Estado (PAULINO, 2010). Foi feita então uma</p><p>reforma administrativa do Estado e da Previdência Social. A reforma administrativa</p><p>tinha como finalidade impedir o crescimento do funcionalismo público, abrindo</p><p>possibilidade de terceirização de diversas atividades na área social. Já a reforma</p><p>da Previdência Social visava acabar com as aposentadorias especiais ou restringi-</p><p>las, aumentar a contribuição dos serviços públicos ativos, estabelecer novas regras</p><p>para desestimular a aposentadoria precoce. É importante salientar que parte dessas</p><p>reformas foi realizada ainda no Governo de Fernando Henrique Cardoso, e parte foi</p><p>realizada durante o mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.</p><p>TÓPICO 3 | REFORMAS, PRIVATIZAÇÕES E OS</p><p>109</p><p>No que se refere às privatizações que ocorreram na época, Paulino (2010)</p><p>afirma que foi aprofundado o processo que se iniciou no Governo Collor, com o</p><p>Programa Nacional de Desestatização (PND). Segundo o autor, o Plano Real não</p><p>foi lançado para defender os trabalhadores e a classe mais baixa da população,</p><p>que eram fortemente afetados pelo problema inflacionário. Mas sim, para atender</p><p>aos capitais globalizados, buscando redefinir a economia brasileira para sua</p><p>inserção na ordem internacional e no ideário do Consenso de Washington.</p><p>Assim, levando em consideração esse diagnóstico, segundo Gremaud,</p><p>Vasconcellos e Toneto Júnior (2011), o Plano Real dividiu o ataque à inflação em</p><p>três fases: ajuste fiscal, indexação completa da economia (Unidade Real de Valor</p><p>- URV) e reforma monetária (transformação da URV em Real - R$).</p><p>O ajuste fiscal visava equacionar o desequilíbrio orçamentário para os</p><p>próximos anos e impedir que daí decorressem pressões inflacionárias.</p><p>Esse ajuste baseava-se em três elementos principais: corte de despesas,</p><p>aumento dos impostos e diminuição nas transferências do governo</p><p>federal. O primeiro ponto referia-se à implementação do Plano de Ação</p><p>Imediata (PAI), lançado em meados de 1993, que determinava um corte de</p><p>gastos da ordem de US$ 7 bilhões nas despesas de investimento e pessoal</p><p>(GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011, p. 449).</p><p>IMPORTANTE</p><p>Você sabe o que foi o Plano de Ação Imediata, mais conhecido como PAI?</p><p>Foi um conjunto de medidas econômicas que foi elaborado em 1993. Esse plano foi</p><p>importante pois deu suporte para a promoção do Plano Real. De acordo com o PAI, existiam seis</p><p>necessidades imediatas para que o Plano Real tivesse êxito. Primeira, a necessidade de realizar</p><p>privatizações de empresas estatais. Segunda, a realização de cortes nos gastos públicos. Terceira,</p><p>o combate à evasão fiscal, principalmente das grandes empresas. Quarta, o controle dos gastos</p><p>no relacionamento com Estados e Municípios. Quinta, o ajuste nos bancos estaduais, através da</p><p>intervenção do Banco Central. E por último, havia a necessidade de redefinição das funções dos</p><p>bancos federais, de modo a enxugar suas estruturas e punir irregularidades.</p><p>Foi criado o Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF),</p><p>de caráter temporário sobre as movimentações financeiras, com a finalidade</p><p>de aumentar a arrecadação. Além disso, para complementar o ajuste fiscal, foi</p><p>aprovado o Fundo Social de Emergência (FSE), que “seria alimentado por 15% da</p><p>arrecadação de todos os impostos” (GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO</p><p>JÚNIOR, 2011, p. 450). Importante salientar que essas medidas de ajustes fiscal</p><p>eram de caráter temporário.</p><p>110</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>Os autores afirmam que, feita a primeira fase, deu-se início à segunda fase: a</p><p>de indexação completa da economia já no ano de 1994. A ideia era substituir a moeda,</p><p>criando um novo indexador: a Unidade Real de Valor (URV), cujo valor, em cruzeiros</p><p>reais, seria corrigido diariamente pela taxa de inflação medida pelos principais índices.</p><p>A URV mantinha uma paridade fixa com o dólar de um para um</p><p>(âncora cambial) e uma série de preços e rendimentos foi convertida em URV.</p><p>Após a conversão de praticamente todos os preços em URV, o governo de</p><p>Fernando Henrique Cardoso introduziu o Real (R$) no dia primeiro de julho</p><p>de 1994, cujo valor era igual ao URV do dia, ou seja, CR$ 2.750,00 (GREMAUD;</p><p>VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011). Assim, todos os preços foram</p><p>convertidos em Real.</p><p>Em um primeiro momento houve uma aceleração inflacionária causada</p><p>pela tentativa de aumento dos preços promovida por alguns agentes. Isso</p><p>ocorreu devido ao “medo de que a seguir fosse implementado um congelamento</p><p>de preços, e com isso os agentes tentaram então se antecipar para evitarem ser</p><p>pegos de surpresa” (SÁ, 2008, p. 22). Posteriormente, com o Plano Real, notou-se</p><p>uma expressiva queda da inflação. Assim, as taxas de inflação mensais passaram</p><p>a variar conforme as condições de demanda e as ocorrências de choque, mas</p><p>sempre com tendência de queda.</p><p>GRÁFICO 7 – EVOLUÇÃO ÍNDICE DE PREÇOS AO CONSUMIDOR – SÃO PAULO</p><p>FONTE: Sá (2008, p. 22)</p><p>Índice de preços ao consumidor - São Paulo (IPC-Fipe)</p><p>60</p><p>50</p><p>40</p><p>30</p><p>20</p><p>10</p><p>0</p><p>jun/94 ago/94 set/94 out/94 nov/94 dez/94jul/94</p><p>No segundo semestre de 1994, com a maxidesvalorização</p><p>do câmbio, o</p><p>governo aplicou também uma política de abertura do mercado interno às</p><p>importações, com a finalidade principal de gerar uma pressão em termos</p><p>de competição externa para os formadores de preço. Como consequência</p><p>da abertura, o mercado nacional se viu inundado de produtos</p><p>importados dos mais variados tipos, fazendo a alegria da classe média</p><p>brasileira naquele momento. Em nome do combate à inflação, o balanço</p><p>de pagamento em conta corrente foi sacrificado, chegando ao ponto de</p><p>tributarem até mesmo as exportações de produtos com preços em alta</p><p>no mercado internacional. A equipe econômica do governo declarou</p><p>inúmeras vezes que o Brasil deveria estar preparado para conviver com</p><p>déficits comerciais por um longo período (SÁ, 2008, p. 23).</p><p>TÓPICO 3 | REFORMAS, PRIVATIZAÇÕES E OS</p><p>111</p><p>Deve-se considerar também que outra consequência do Plano Real foi o</p><p>rápido crescimento da demanda e da atividade econômica. Houve um aumento</p><p>da demanda devido ao aumento do poder aquisitivo das classes de baixa renda.</p><p>Além disso, houve um aumento das operações de crédito, devido à perda de</p><p>receita inflacionária, estimulando a tomada de empréstimos. O aumento da</p><p>demanda provocou o crescimento da atividade econômica. Destaque deve</p><p>ser dado para os setores de bens de consumo duráveis e de bens de capital</p><p>(GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).</p><p>Além disso, os autores afirmam que a implementação do Plano Real levou</p><p>à apreciação (valorização) do câmbio. Isso ocorreu, pois, quando se utiliza a taxa</p><p>cambial para estabilização da economia, há a valorização cambial devido à inflação</p><p>residual, que não é repassada ao câmbio no momento seguinte. Essa estratégia de</p><p>estabilização é eficiente para os bens tradeables. Entretanto, é totalmente ineficaz</p><p>para os bens non-tradeables. Desse modo, o preço desses bens tende a continuar</p><p>subindo. Isso ocorre, pois:</p><p>O crescimento econômico associado à estabilização tende a pressionar</p><p>os salários reais, e como estes setores não sofrem a concorrência</p><p>internacional, podem repassar o aumento de custos para os</p><p>preços, enquanto a demanda encontra-se aquecida (GREMAUD;</p><p>VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011, p. 455).</p><p>IMPORTANTE</p><p>Você sabe o que são bens tradeables e bens non-tradeables?</p><p>Bens tradeables são aqueles produtos que são transacionados mundialmente, ou</p><p>seja, são bens que podem ser importados e exportados pelos países. Como exemplo é</p><p>possível citar os produtos industriais, que são passíveis de importação e exportação, como</p><p>carros, medicamentos, roupas etc.</p><p>Por outro lado, bens non-tradeables são bens que estão vinculados a um local em</p><p>específico. Como exemplo, os aluguéis, as mensalidades escolares, assistência médica etc.</p><p>O que foi dito no parágrafo anterior pode ser visualizado no quadro</p><p>a seguir, que mostra a variação de preços de itens selecionados no período</p><p>subsequente à implementação do Plano Real. Através desse quadro é possível</p><p>verificar que o preço dos bens non-tradeables subiu de modo significativo se</p><p>comparado com o preço dos bens tradeables.</p><p>112</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>QUADRO 5 – VARIAÇÃO DE PREÇOS ACUMULADA DE ITENS SELECIONADOS (1994-1997)</p><p>Item % Item %</p><p>Índice de Preços Por Atacado 22,88 Equipamentos Eletrônicos 11,25</p><p>Índice de Preços ao Consumidor – Brasil 55,04 Serviços de Residência 66,58</p><p>Gêneros Alimentícios 20,93 Roupas 29,01</p><p>Alimentação fora do Domicílio 48,14 Serviços de Vestuário 92,94</p><p>Aluguel 198,12 Medicamentos 39,36</p><p>Roupas de Cama, Mesa e Banho 18,12 Médico, Dentista e Outros 92,46</p><p>Material Escolar 36,41 Peças e Acessórios – Veículos 14,01</p><p>Educação – Cursos Formais 132,13 Serviços de Oficina 28,94</p><p>FONTE: Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011, p. 456)</p><p>Sobre a taxa de câmbio, ainda é preciso salientar que sua valorização não</p><p>se deu apenas por conta da inflação residual. A própria política cambial que foi</p><p>adotada aprofundou a ancoragem dos preços. Como não se fixou uma paridade,</p><p>permitiu-se que o real se valorizasse em termos nominais em relação ao dólar. Assim,</p><p>“nos primeiros meses do plano verificou-se uma queda na taxa de câmbio nominal,</p><p>que passou de R$0,931/US$ em julho de 94 para R$0,842/US$ em novembro de 94”</p><p>(GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011, p. 456).</p><p>A respeito do câmbio, é possível verificar que anteriormente ao Plano</p><p>Real, o câmbio real encontrava-se desvalorizado. Essa tendência inverte-se após a</p><p>implementação do Plano Real (BADANI; HIDALGO, 2005).</p><p>GRÁFICO 8 – EVOLUÇÃO TAXA DE CÂMBIO</p><p>FONTE: Badani e Hidalgo (2005, p. 553)</p><p>TÓPICO 3 | REFORMAS, PRIVATIZAÇÕES E OS</p><p>113</p><p>A valorização cambial e a demanda aquecida, que foram citadas</p><p>anteriormente, levaram ao aparecimento de déficits na balança comercial. Isso</p><p>ocorreu porque as importações aumentaram e, ao mesmo tempo, as exportações</p><p>não tiveram bom desempenho.</p><p>QUADRO 6 – BALANÇO DE PAGAMENTOS BRASIL – 1990 A 1998 (US$ MILHÕES)</p><p>Discriminação 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998</p><p>Balança comercial 10.752 10.580 15.239 13.299 10.466 -3.466 -5.599 -6.753 -6.575</p><p>Exportações 31.414 31.620 35.793 38.555 43.545 46.506 47.747 52.994 51.140</p><p>Importações 20.661 21.040 20.554 25.256 33.079 49.972 53.346 59.747 57.714</p><p>Balança de</p><p>Serviços e Rendas -15.369 -13.543 -11.336 -15.577 -14.692 -18.541 -20.350 -25.522 -28.299</p><p>Serviços -3.596 -3.800 -3.184 -5.246 -5.657 -7.483 -8.681 -10.646 -10.111</p><p>Rendas -11.773 -9.743 -8.152 -10.331 -9.035 -11.058 -11.668 -14.876 -18.189</p><p>Saldo em</p><p>Transações</p><p>Correntes</p><p>-3.784 -1.407 6.109 -676 -1.811 -18.384 -23.502 -30.452 -33.416</p><p>Conta Capital e</p><p>Financeira 4.592 163 9.947 10.495 8.692 29.095 33.968 25.800 29.702</p><p>Investimentos</p><p>Diretos 364 87 1.924 799 1.460 3.309 11.261 17.877 26.002</p><p>Investimentos em</p><p>Carteira 472 3.808 14.465 12.325 50.642 9.217 21.619 12.616 18.125</p><p>Derivativos 1,8 2,7 2,5 5,3 -27,4 17,5 -38,3 -252,6 -459,8</p><p>Outros</p><p>Investimentos 3.753 -3.735 -6.482 -2.717 -43.557 16.200 673 -4.833 -14.285</p><p>Resultado do BP 481 -369 14.670 8.709 7.215 12.919 8.666 -7.907 -7.970</p><p>Reservas</p><p>Internacionais 9.973 9.406 23.754 32.211 38.806 51.840 60.110 52.173 44.556</p><p>FONTE: Banco Central (apud GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011, p. 260)</p><p>A esse respeito, Damasceno (2002) afirma que a política de importação do</p><p>Plano Real possuiu três fases. A primeira, de julho de 1994 ao primeiro trimestre</p><p>de 1995 foi marcada por políticas liberalizantes. Na segunda etapa, por sua vez,</p><p>do segundo trimestre de 1995 ao segundo trimestre de 1996, houve um recuo na</p><p>política de abertura comercial. A última fase, que se iniciou no terceiro trimestre</p><p>de 1996, foi caracterizada por nova flexibilização da política de importação.</p><p>Sobre as importações, é importante mencionar que houve um aumento</p><p>considerável de todos os componentes entre os anos de 1994 e 1995. Apesar disso,</p><p>a importação de dois produtos apresentara maior aumento: dos automóveis</p><p>(208%) e dos bens de consumo (185%). Assim, uma parcela da entrada de recursos</p><p>destinou-se para o financiamento do consumo, segundo Gremaud, Vasconcellos</p><p>e Toneto Júnior (2011).</p><p>114</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>De acordo com Paulino (2010, p. 301), o Plano Real tinha um defeito congênito:</p><p>Por mais que se dissesse que as chamadas “reformas estruturais”</p><p>dariam sustentabilidade ao Plano e que a “âncora cambial” era apenas</p><p>um truque inicial para reverter as expectativas inflacionárias, em todos</p><p>os momentos em que a oferta internacional de dólares diminuiu, o</p><p>reflexo na economia brasileira foi imediato.</p><p>Assim, segundo o autor, a crise cambial mexicana, que ocorreu em</p><p>março de 1995, foi o primeiro grande teste à estratégia implementada no Plano</p><p>Real. Foi a partir dessa crise que se evidenciou a impossibilidade de países</p><p>periféricos honrarem seus compromissos externos com base em uma política</p><p>de câmbio sobrevalorizado em relação ao dólar (PAULINO, 2010). Apesar de</p><p>afetar positivamente as contas externas, a correção do câmbio</p><p>poderia levar à</p><p>volta do processo inflacionário, já que a economia estava aquecida e a memória</p><p>inflacionária e o perigo da indexação ainda se faziam presentes.</p><p>A opção do governo em março de 1995, para fazer frente à perda de</p><p>reservas que o país vinha sofrendo, foi ampliar o controle da demanda</p><p>interna, principalmente com restrições ao crédito e elevação das taxas</p><p>de juros; esta última serviria também para manter a atratividade do país</p><p>para o capital estrangeiro [...]. Além disso, promoveu-se uma tímida</p><p>desvalorização de 6% da taxa de câmbio e alterou-se a política cambial,</p><p>com o alargamento das bandas de flutuações, projetando-se uma</p><p>desvalorização nominal da taxa de câmbio na faixa dos 7% a.a. Também</p><p>buscaram-se alguns incentivos para o estímulo dos exportadores,</p><p>principalmente por meio do Adiantamento dos Contratos de Câmbio</p><p>(ACC), que permitia aos exportadores se beneficiarem das elevadas</p><p>taxas de juros internas. Mais ainda, elevaram-se as tarifas de uma</p><p>série de produtos, destacando-se automóveis, para os quais inclusive</p><p>se introduziu o regime de quotas, o que representou um retrocesso</p><p>no processo de abertura comercial (GREMAUD; VASCONCELLOS;</p><p>TONETO JÚNIOR, 2011, p. 461).</p><p>Os autores afirmam ainda que diante da crise do México, em 1995, o</p><p>governo brasileiro foi bem-sucedido em abortar o ataque especulativo e manter a</p><p>taxa de câmbio. Nessa fase, a política monetária, através da taxa de juros, passou</p><p>a ser o principal instrumento de política econômica. Assim, poderia se controlar a</p><p>inflação, conter a demanda, impedir que os déficits comerciais se tornassem muito</p><p>elevados e, ao mesmo tempo, manter o país atraente para o capital estrangeiro.</p><p>Desse modo, houve uma grande retração da atividade econômica a partir do</p><p>segundo trimestre de 1995.</p><p>A partir dessa retração, o Banco Central do Brasil passou a atuar por</p><p>meio do Programa de Estímulo à Reestruturação e Fortalecimento do Sistema</p><p>Financeiro Nacional (PROER). Esse programa foi um instrumento de atuação</p><p>do Banco Central para saneamento e reorganização do sistema financeiro.</p><p>Além disso, funcionou como instrumento de estímulo ao ajuste administrativo,</p><p>societário e operacional das instituições que integravam o Sistema Financeiro</p><p>Nacional Brasileiro (LEITE JÚNIOR, 2016).</p><p>TÓPICO 3 | REFORMAS, PRIVATIZAÇÕES E OS</p><p>115</p><p>IMPORTANTE</p><p>O que é o PROER?</p><p>O Programa de Estímulo à Reestruturação e Fortalecimento do Sistema Financeiro</p><p>Nacional (PROER) tinha como objetivo assegurar a liquidez e a solvência do Sistema</p><p>Financeiro Brasileiro. As caixas econômicas, as sociedades de crédito, financiamento/</p><p>investimento e as sociedades de crédito podiam participar do PROER. As fontes de recursos</p><p>do programa eram provenientes, na sua grande maioria, do próprio mercado.</p><p>É importante mencionar também que o PROER possuía quatro pontos. O</p><p>primeiro, refere-se à linha especial de assistência financeira vinculada a títulos/operações de</p><p>responsabilidade do Tesouro. O segundo diz respeito à liberação de recursos do compulsório</p><p>sobre recursos à vista para aquisição de CDB. O terceiro refere-se à flexibilização dos limites</p><p>operacionais aplicáveis às instituições financeiras. E, por fim, o quarto ponto diz respeito ao</p><p>diferimento de gastos relativos aos custos/despesas com a reestruturação de instituições</p><p>financeiras (LEITE JÚNIOR, 2016).</p><p>Ainda sobre a taxa de juros pós-crise mexicana, Gremaud, Vasconcellos e</p><p>Toneto Júnior (2011) afirmam que, conforme a volta do acúmulo de reservas após</p><p>essa crise, a taxa de juros entrou em trajetória decrescente. Entretanto, a partir de</p><p>1996, a taxa de juros se estabilizou em torno de 20% a.a., taxa estava muito elevada.</p><p>Em relação aos indicadores econômicos, no primeiro mandato de FHC, a</p><p>taxa média de crescimento do PIB foi de 2,6% a.a. Já o desemprego, que estava</p><p>baixo em 1995, começou a subir após a crise mexicana, assumindo valor recorde</p><p>após a crise asiática.</p><p>QUADRO 7 – INDICADORES ECONÔMICOS (1993-1999)</p><p>FONTE: Banco Central (apud GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011, p. 467)</p><p>Variável 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999</p><p>Taxa de crescimento</p><p>do PIB - % a.a. 4,9 5,9 4,2 2,7 3,3 0,2 0,8</p><p>Taxa de desemprego</p><p>aberto 5,3 5,1 4,6 5,4 5,7 7,6 7,6</p><p>INPC 2.489,0 929,0 22,0 9,1 4,3 2,5 8,4</p><p>Dívida Interna</p><p>Líquida/PIB (dez.) 21,8 23,0 25,5 29,4 30,2 37,1 39,0</p><p>Dívida Externa</p><p>Líquida/PIB (dez.) 16,8 8,6 5,7 3,9 4,3 6,6 10,4</p><p>Dívida Total/PIB</p><p>(dez.) 38,6 31,6 31,2 33,3 34,5 43,7 49,4</p><p>116</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>A crise asiática ocorreu em 1997 e foi deflagrada com a desvalorização da</p><p>moeda da Tailândia, que provocou uma reação em cadeia, atingindo a Malásia,</p><p>a Indonésia, as Filipinas, Hong Kong, a Coreia do Sul, e derrubando a Bolsa de</p><p>Nova York. No Brasil, o reflexo dessa crise foi rápido: “as reservas cambiais, que</p><p>em agosto daquele ano haviam alcançado 63 bilhões de dólares, recuaram, em</p><p>outubro do mesmo ano, para 52 bilhões de dólares” (PAULINO, 2010, p. 301). O</p><p>governo brasileiro, para responder a essa crise, aumentou a taxa de juros e lançou</p><p>pacote fiscal de modo eficaz.</p><p>A partir de 1995 foi dada maior ênfase nas privatizações, e as privatizações</p><p>do setor industrial foram praticamente concluídas. O governo conseguiu que</p><p>as concessões de serviços públicos fossem incluídas no PND. Com a inclusão</p><p>dos setores de energia elétrica, transporte e telecomunicações, esperavam-se</p><p>melhorias nos serviços oferecidos e entradas de investimento no país. A inclusão</p><p>da Companhia Vale do Rio Doce no programa de privatizações estaduais,</p><p>com o apoio do governo federal, a desestatização da RFFSA, o arrendamento</p><p>do Terminal de Contêineres 1 do Porto de Santos e a Escelsa aumentaram a</p><p>arrecadação e colaboraram para o fortalecimento da economia, em um momento</p><p>de crise internacional e tensão interna (LACERDA et al., 2006).</p><p>A alteração na legislação foi uma vitória do governo para aprofundar o</p><p>processo de privatização e, com isso, pôde privatizar o Sistema TELEBRAS e criou</p><p>a Anatel, como agência reguladora. Foram realizadas as licitações das concessões</p><p>de telefonia móvel celular para três áreas do território nacional, totalizando US$4</p><p>bilhões (LACERDA et al., 2006).</p><p>A tabela seguinte apresenta o resultado das privatizações no contexto</p><p>federal. Entre 1995 a 2002 foram 35 empresas privatizadas e o resultado em vendas</p><p>foi de US$19,99 bilhões, o que deu um fôlego para o governo, pois a balança</p><p>comercial no período se apresentava deficitária, devido à valorização do real e</p><p>aos estímulos para a importação.</p><p>TABELA 6 – RESULTADO DAS PRIVATIZAÇÕES PELO PND NO</p><p>ÂMBITO FEDERAL – 1991/2001 (US$ BILHÕES)</p><p>FONTE: BNDES (apud LACERDA et al., 2006, p. 219)</p><p>Período Nº de privatizações</p><p>Resultados Transferências</p><p>Total</p><p>de vendas de débitos</p><p>1991 4 1,61 0,37 1,98</p><p>1992 14 2,40 0,98 3,38</p><p>1993 6 2,62 1,56 4,18</p><p>1994 9 1,96 0,35 2,31</p><p>1995 8 1,00 0,63 1,63</p><p>1996 11 4,08 0,67 4,75</p><p>1997 4 4,26 3,56 7,82</p><p>1998 5 1,66 1,08 2,74</p><p>1999 2 0,13 0,00 0,13</p><p>2000 3 7,67 0,00 7,67</p><p>2001 2 1,19 0,00 1,19</p><p>Total 68 28,48 9,20 37,78</p><p>TÓPICO 3 | REFORMAS, PRIVATIZAÇÕES E OS</p><p>117</p><p>Resumidamente, é possível afirmar que o primeiro mandato do presidente</p><p>Fernando Henrique Cardoso terminou em meio a um processo de crise cambial,</p><p>devido à deterioração das contas externas e da situação fiscal. Em relação ao PIB,</p><p>a trajetória foi de baixo crescimento, sendo então, importante para o segundo</p><p>mandato de FHC a correção dos desequilíbrios, manter a estabilização da inflação e</p><p>recolocar o país em uma trajetória de crescimento (GREMAUD; VASCONCELLOS;</p><p>TONETO JÚNIOR, 2011). Apesar disso, é importante ter em mente que o aparato</p><p>político econômico do primeiro mandato de FHC obteve sucesso na consolidação</p><p>da estabilidade dos preços. Assim, seu primeiro mandato foi caracterizado por</p><p>um período de estabilização com desequilíbrio, o que restringiu o raio de ação da</p><p>política econômica do segundo mandato (OLIVEIRA; TUROLLA, 2003).</p><p>3 POLÍTICA ECONÔMICA DO SEGUNDO GOVERNO DE FHC</p><p>O primeiro mandato de FHC foi exitoso em estabilizar a inflação. Entretanto,</p><p>vários desequilíbrios, como o déficit fiscal e o déficit externo foram se formando</p><p>na economia. Segundo Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011, p. 469), “a</p><p>manutenção do câmbio sobrevalorizado no período significou a ampliação do</p><p>endividamento externo, um aumento significativo da dívida pública e o retardamento</p><p>do crescimento”. Esses desequilíbrios foram justificados em um primeiro momento</p><p>e levando em conta o problema maior, que era o inflacionário. Assim, no segundo</p><p>mandato de FHC foi necessária uma reorientação da política econômica vigente.</p><p>Antes das eleições para presidente de 1998, o governo brasileiro começou a</p><p>negociar um acordo com o FMI, na tentativa de manter a política cambial vigente:</p><p>O Fundo coordenou os esforços de apoio ao Brasil, mediante a organização</p><p>de um pacote de ajuda externa, somando US$ 42 bilhões. US$18 bilhões</p><p>seriam do FMI e o restante de outros organismos multilaterais e de</p><p>diversos governos, entre eles os dos Estados Unidos, a Grã-Bretanha, a</p><p>Itália, a Alemanha, a França, o Japão e a Espanha. Esse primeiro acordo</p><p>contemplava um importante aperto fiscal, com o superávit primário</p><p>passando de 0,0% do PIB em 1998 para 2,6% do PIB em 1999, e 2,8% e</p><p>3,0% do PIB em 2000 e 2001, respectivamente. É importante registrar</p><p>que o acordo não contemplava mudanças na política cambial, que seria</p><p>mantida inalterada (GIAMBIGI et al., 2005, p. 177).</p><p>No entanto, nem o mercado acreditou que não pudesse acontecer a</p><p>desvalorização, nem o Congresso apoiou a medida do pacote de fiscal de cobrança</p><p>de contribuição previdenciária dos servidos públicos inativos.</p><p>O quadro a seguir apresenta as principais mudanças no tocante aos regimes</p><p>cambial, fiscal e monetário, que ocorreram do primeiro para o segundo mandato de</p><p>FHC. Um importante passo para resolver os déficits fiscal e externo ocorreu em 1999</p><p>com uma tríplice mudança dos regimes cambial, monetário e fiscal. O regime cambial</p><p>de bandas cambiais foi substituído por uma flutuação suja. O regime monetário,</p><p>por sua vez, que anteriormente defendia as bandas cambiais, foi substituído pelo</p><p>sistema de metas inflacionárias. Por fim, o regime fiscal foi modificado, levando em</p><p>consideração a manutenção de um superávit primário (OLIVEIRA; TUROLLA, 2003).</p><p>118</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>QUADRO 8 – PRINCIPAIS MUDANÇAS NO REGIME DE POLÍTICA ECONÔMICA NO SEGUNDO</p><p>MANDATO FHC (1999-2002)</p><p>FONTE: Oliveira e Turolla (2003, p. 198)</p><p>Situação no 1º Mandato Data Efetiva</p><p>da Mudança Situação no 2º Mandato</p><p>Regime</p><p>Fiscal</p><p>- Esforços de reformas</p><p>estrutural e patrimonial</p><p>do setor público, com</p><p>a apresentação de</p><p>propostas legislativas e</p><p>privatização.</p><p>- Introdução de medidas</p><p>de controle das finanças</p><p>dos governos estaduais</p><p>e municipais, com</p><p>efeito estrutural, mas</p><p>resultados não imediatos.</p><p>- Controle primário</p><p>insuficiente: aumento do</p><p>déficit primário.</p><p>- Aumento da despesa</p><p>com juros devido à</p><p>instabilidade financeira.</p><p>28 de outubro</p><p>de 1998</p><p>(anúncio do</p><p>Programa de</p><p>Estabilidade</p><p>Fiscal).</p><p>- Ajuste fiscal voltado para</p><p>a geração de superávits</p><p>primários, baseado em aumento</p><p>de receitas e redução de</p><p>despesas.</p><p>- Fadiga reformista, embora</p><p>propostas importantes tenham</p><p>sido implementadas (Lei de</p><p>Responsabilidade Fiscal, fator</p><p>previdenciário).</p><p>Regime</p><p>Monetário</p><p>- Subordinado à âncora</p><p>cambial.</p><p>- Choques externos</p><p>requereram contração</p><p>monetária recorrente.</p><p>12 de janeiro</p><p>de 1999</p><p>(relaxamento</p><p>da âncora</p><p>cambial) e</p><p>maio de 1999</p><p>(introdução</p><p>do regime</p><p>de metas de</p><p>inflação).</p><p>- Metas de inflação,</p><p>possibilitando resposta mais</p><p>suave aos choques.</p><p>Regime</p><p>Cambial</p><p>- Câmbio administrado.</p><p>- Déficits crescentes em</p><p>conta corrente.</p><p>12 de janeiro</p><p>de 1999</p><p>(abandono</p><p>da defesa</p><p>das bandas</p><p>cambiais).</p><p>- Flutuação suja.</p><p>- Reversão dos déficits em conta</p><p>corrente.</p><p>No que se refere ao regime cambial, é importante mencionar que a</p><p>ancoragem cambial foi de grande relevância para a estabilização da inflação no</p><p>primeiro mandato de FHC. O problema foi que essa ancoragem teve uma duração</p><p>excessiva com consequente apreciação do câmbio, o que causou uma deterioração</p><p>nas transações reais e uma acumulação de passivos externos, resultando no</p><p>aumento das despesas na conta de rendas. Assim, “o déficit em conta corrente</p><p>saltou de menos de US$ 2 bilhões em 1994 para níveis superiores a US$33 bilhões</p><p>no fim de 1998, superando 4% do PIB” (OLIVEIRA; TUROLLA, 2003, p. 203).</p><p>TÓPICO 3 | REFORMAS, PRIVATIZAÇÕES E OS</p><p>119</p><p>Desse modo, esses problemas, juntamente com o anúncio de alguns</p><p>escândalos envolvendo o presidente do Banco Central, levaram à substituição</p><p>por Armínio Fraga, que abandonou o sistema de bandas cambiais e passou a</p><p>adotar o sistema de câmbio flutuante. Entretanto, o regime adotado não foi de</p><p>câmbio flutuante puro, mas sim uma flutuação suja. Como resultado imediato,</p><p>houve uma desvalorização cambial de 70% nos primeiros meses (GREMAUD;</p><p>VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).</p><p>Com a mudança para um regime de câmbio flutuante, reinava o medo de que</p><p>a inflação voltasse a subir e se tornasse novamente um problema econômico. Adotou-</p><p>se então uma política monetária restritiva, com o Comitê de Política Monetária,</p><p>adotando-se uma meta para a taxa de juros de 45% a.a. para conter a saída de recursos</p><p>e diminuir a atividade especulativa em torno da taxa de câmbio. Como resultado,</p><p>verificou-se que a inflação sofreu uma elevação significativa em fevereiro, mas abaixo</p><p>da variação cambial. Apesar dessa alta inflacionária, em março já se observa uma</p><p>queda na taxa de inflação, e, em maio, vários índices apresentavam deflação.</p><p>No quadro a seguir é possível verificar a variação dos índices de preços</p><p>ao longo dos anos. De acordo com os dados apresentados, o Índice de Preços por</p><p>Atacado (IPA) foi o que apresentou maior variabilidade.</p><p>QUADRO 9 – ÍNDICES DE PREÇOS – VARIAÇÕES PERCENTUAIS</p><p>Período IGP-DI IPA-DI IPC-Brasil INPC IPCA IPC-FIPE</p><p>1999 19.98 28,90 9,12 8,43 8,94 8,64</p><p>2000 9,81 12,06 6,21 5,27 5,97 4,38</p><p>2001 10,40 11,87 7,94 9,44 7,67 7,13</p><p>2002 26,41 35,41 12,18 14,74 12,53 9,92</p><p>2003 7,67 6,26 8,93 10,38 9,30 8,17</p><p>FONTE: Banco Central (apud Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior, 2011, p. 475)</p><p>Com a adoção do câmbio flutuante sujo e a perda da âncora cambial como</p><p>referencial de preços, o Banco Central brasileiro passou a adotar o sistema de metas</p><p>de inflação medidas pelo IPCA. Essas metas passaram a ser definidas pelo Conselho</p><p>Monetário Nacional e executadas pelo Banco Central (OLIVEIRA; TUROLLI, 2003).</p><p>IMPORTANTE</p><p>Sistema de metas de inflação refere-se a um sistema monetário em que o</p><p>Banco Central atua para que a inflação real esteja alinhada com uma meta preestabelecida.</p><p>O instrumento utilizado para essa finalidade é a taxa de juros e que, por meio do seu impacto</p><p>sobre a demanda, influencia a inflação. “Assim, quando a taxa de inflação se situa acima da</p><p>120</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>meta, o Copom eleva a taxa de juros, quando está abaixo, o Copom reduz a taxa de juros”</p><p>(GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011, p. 475).</p><p>A temática sobre o sistema de metas de inflação ganhou destaque durante</p><p>a década de 1990, sendo que no Brasil esse sistema foi adotado em julho de 1999 por</p><p>meio da Resolução nº 2.615 do Conselho Monetário Nacional. De acordo com Gremaud,</p><p>Vasconcellos e Toneto Júnior (2011), a análise das metas inflacionárias pode ser colocada</p><p>dentro de três alternativas disponíveis:</p><p>• âncora monetária: as autoridades monetárias definem o crescimento do agregado</p><p>monetário;</p><p>• âncora cambial: procedimento utilizado por países como o Brasil e o México para</p><p>estabilizarem a inflação;</p><p>• produto nominal: utiliza-se o produto nominal como referência para a política monetária.</p><p>A relação entre taxa de juros e inflação é considerada um dos sistemas mais</p><p>eficientes de política</p><p>monetária e tem sido utilizada em vários países, como Chile</p><p>(1991), Canadá (1991), Suécia (1993), Espanha (1994), dentre outros. A seguir, o</p><p>gráfico apresenta o comportamento do IPCA desde a introdução do sistema de</p><p>metas de inflação no Brasil. Assim, é possível verificar que:</p><p>[...] o regime alcançou um razoável sucesso nos dois primeiros anos:</p><p>a inflação manteve-se dentro do intervalo estipulado em seu primeiro</p><p>ano, 1999, e no ano 2000 atingiu o centro do intervalo de metas. Em</p><p>2001 e 2002, sob choques externos e internos de elevada magnitude,</p><p>a reação da política monetária foi menos eficiente para assegurar o</p><p>cumprimento das metas (OLIVEIRA; TUROLLI, 2003, p. 205).</p><p>GRÁFICO 9 – CUMPRIMENTO DAS METAS DE INFLAÇÃO (IPCA, VARIAÇÃO</p><p>PERCENTUAL EM DOZE MESES)</p><p>FONTE: Oliveira e Turolla (2003, p. 206)</p><p>TÓPICO 3 | REFORMAS, PRIVATIZAÇÕES E OS</p><p>121</p><p>A principal consequência proveniente da alteração da política monetária</p><p>foi a redução, tanto do nível como da volatilidade da taxa de juros.</p><p>Existiram mudanças em três esferas na condução da economia brasileira:</p><p>cambial, monetária e fiscal. Já abordamos as mudanças relativas ao câmbio e à</p><p>política monetária. Resta-nos abordar a mudança que ocorreu na esfera fiscal, que</p><p>foi o terceiro elemento central da política macroeconômica brasileira.</p><p>A principal alteração na área fiscal foi a introdução do Programa de</p><p>Estabilidade Fiscal, que foi anunciado ainda em 1998, mas apresentou resultados</p><p>a partir do segundo mandato de FHC. Esse Programa passou a determinar um</p><p>patamar de superávit primário do setor público, patamar este necessário para</p><p>a estabilização da razão dívida/produto (OLIVEIRA; TUROLLI, 2003). Assim, a</p><p>partir de 1999, de acordo com Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011), o</p><p>setor público passou a apresentar superávits primários expressivos.</p><p>Esses superávits eram necessários para permitir a absorção de choques na</p><p>economia, liberando a taxa de juros para ser utilizada como política monetária,</p><p>além de permitirem a estabilização da dívida pública. Pode-se considerar,</p><p>então, que o Programa de Estabilidade Fiscal contribuiu significativamente para</p><p>recuperar a confiança na economia brasileira a partir de 1999.</p><p>Esse Programa possuía como premissa básica que o governo não poderia</p><p>gastar mais do que arrecadava, sendo necessário um equilíbrio nas contas públicas.</p><p>Com a implementação do Programa de Estabilidade Fiscal, houve um</p><p>aumento da arrecadação, devido à aprovação da Contribuição Provisória sobre</p><p>Movimentação Financeira (CPMF), que substituiu o IPMF, com alíquota maior</p><p>(0,38%). Além disso, houve também o aumento do Cofins de 2% para 3%, além</p><p>de ter sido estendido para instituições financeiras, e a cobrança da contribuição</p><p>previdenciária dos inativos e pensionistas do setor público (GREMAUD;</p><p>VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011). Por outro lado, as despesas</p><p>continuaram crescendo, dada a vinculação de gastos às receitas. Para acabar com</p><p>essa vinculação, foi estabelecida a Desvinculação de Receitas da União (DRU),</p><p>permitindo, então, a geração de superávits. Com o aumento da carga tributária, o</p><p>governo alcançou, em 1999, um superávit primário de 3% do PIB.</p><p>QUADRO 10 – CARGA TRIBUTÁRIA/PIB (1998-2003)</p><p>FONTE: Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011, p. 479)</p><p>Ano 1998 1999 2000 2001 2002 2003</p><p>Carga Tributária/</p><p>PIB 29,33 31,64 32,84 33,68 35,84 35,54</p><p>122</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>Apesar de ter sido instituída a Desvinculação de Receitas da União (DRU),</p><p>o gasto público primário continuou crescendo. É possível verificar a evolução da</p><p>dívida líquida do setor público e, após uma estabilização nos anos de 1999 e 2000,</p><p>voltou a crescer. Desse modo, “seja em função de uma desvalorização cambial,</p><p>seja em função da elevação da SELIC para controlar as pressões inflacionárias,</p><p>a dívida pública elevou-se continuadamente” (GREMAUD; VASCONCELLOS;</p><p>TONETO JÚNIOR, 2011, p. 481).</p><p>GRÁFICO 10 – DÍVIDA LÍQUIDA DO SETOR PÚBLICO (% DO PIB)</p><p>FONTE: Queiroz e Payés (2013, p. 73)</p><p>Já em 1999 há uma melhora nas contas externas, com uma queda do</p><p>déficit em transações correntes de 27%, queda das importações (em torno de US$</p><p>8 bilhões) e uma menor queda das exportações no ano (US$ 3 bilhões). A queda</p><p>nas importações reflete a mudança cambial e a contenção da demanda. Nos</p><p>anos seguintes, foi possível verificar um aumento das exportações, o que refletiu</p><p>positivamente no saldo da balança comercial.</p><p>QUADRO 11 – EVOLUÇÃO DA BALANÇA COMERCIAL (US$ MILHÕES)</p><p>FONTE: Banco Central (apud GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011, p. 482)</p><p>Discriminação 1998 1999 2000 2001 2002</p><p>Balança Comercial -6.575 -1.199 -698 2.650 13.121</p><p>- Exportações 51.140 48.011 55.086 58.223 60.362</p><p>- Importações 57.714 49.210 55.783 55.572 47.240</p><p>TÓPICO 3 | REFORMAS, PRIVATIZAÇÕES E OS</p><p>123</p><p>De acordo com Lacerda et al. (2006), a intensificação das privatizações, o</p><p>processo de fusões e aquisições e a integração dada no âmbito do MERCOSUL</p><p>são fatores que produziram o estímulo para a entrada de capitais no país. No</p><p>início da década de 90, em torno de US$1 bilhão entrou de investimento externo</p><p>direto no Brasil. No ano 2000, foram captados US$ 32,8 bilhões.</p><p>Resumidamente, é importante mencionar que a implementação do</p><p>Plano Real teve como o esforço básico a manutenção da estabilidade econômica,</p><p>controlando o processo inflacionário. Os dois mandatos de FHC apresentaram</p><p>diferenças no tocante à condução da política macroeconômica.</p><p>No primeiro mandato, o foco era a estabilização da economia com</p><p>controle da inflação, sendo as estratégias adotadas bem-sucedidas neste aspecto.</p><p>Para tanto, era necessário centrar na valorização do câmbio e na âncora cambial.</p><p>O segundo mandato, por sua vez, visando resolver problemas herdados do</p><p>primeiro (desequilíbrio externo, déficit público, baixas taxas de crescimento),</p><p>alterou a política econômica em suas três esferas: cambial, fiscal e monetária.</p><p>Adotou-se, assim, câmbio flutuante sujo, metas de inflação e superávit primário.</p><p>Apesar da melhora na balança comercial e no desempenho fiscal, mesmo com as</p><p>políticas adotadas, o país continuou apresentando baixas taxas de crescimento e</p><p>um crescimento contínuo da dívida pública.</p><p>124</p><p>UNIDADE 2 | A REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL E AS TENTATIVAS DE ESTABILIZAR A INFLAÇÃO</p><p>LEITURA COMPLEMENTAR</p><p>O AMBIENTE INSTITUCIONAL DO PLANO REAL E O</p><p>COMPORTAMENTO DOS AGENTES</p><p>Herton Castiglioni Lopes</p><p>Octavio Augusto Camargo Conceição</p><p>Segundo Veblen (1919), a mudança é um processo difícil e que se</p><p>concretiza apenas quando as condições obrigam. Não foi por acaso que nos anos</p><p>1990 aconteceram uma série de mudanças que resultaram da inconformidade</p><p>da sociedade com o desempenho do período. Nas décadas de 1950, 1960 e até</p><p>mesmo 1970, o Brasil vivenciou taxas elevadas de inflação, mas que vinham</p><p>acompanhadas de índices mais significativos de crescimento econômico.</p><p>Já nos anos 1980 e início dos anos 1990, observaram-se taxas elevadas de</p><p>inflação, mas com um pífio crescimento. Duas forças contraditórias precisam ser</p><p>analisadas nas duas últimas décadas do século passado. A primeira diz respeito</p><p>ao processo de seleção e adaptação sofrido pelos agentes ao atuarem em uma</p><p>economia inflacionária. Nessa perspectiva, a mudança não era bem-vinda porque os</p><p>indivíduos estavam acostumados a operar em uma economia com preços instáveis.</p><p>A segunda diz respeito à constante insatisfação com o baixo crescimento e a crença</p><p>na necessidade de uma série de reformas. Inclusive a própria estabilidade monetária</p><p>passou a ser vista como precondição para retomada do desenvolvimento econômico.</p><p>Assim, enquanto nos Planos anteriores ao Real a necessidade de mudança não foi</p><p>forte o suficiente, nos anos 1990 era superior ao comodismo dos indivíduos.</p><p>Os hábitos compartilhados e o comportamento dos agentes novamente</p><p>seriam fatores fundamentais. Ao contrário do ambiente do Plano Cruzado, onde os</p><p>empresários formaram a crença de que o reajuste de</p><p>preços era um fenômeno normal</p><p>e necessário, no Plano Real passaram a ter prioridade os ganhos de produtividade</p><p>e competitividade. Enfim, ganhos monetários que estariam mais relacionados à</p><p>produção e efetiva capacidade gerencial dos empreendedores. Do ponto de vista dos</p><p>consumidores e assalariados, a crença na necessidade de constantes reajustes salariais</p><p>para manter o poder de compra aos poucos desapareceu, fenômeno influenciado pelo</p><p>seu maior poder aquisitivo e pela abertura da economia ao exterior; o que garantiu</p><p>maiores possibilidades de consumo. Além disso, o comodismo das autoridades</p><p>governamentais, que ganhavam duplamente com a inflação (via imposto inflacionário</p><p>e efeito Tanzi às avessas), foi anulado pelo ajuste fiscal da primeira fase do Plano Real</p><p>(criação do Plano de Ação Imediata e Fundo Social de Emergência). O fato contribuiu</p><p>para eliminar o comportamento governamental de financiar seus gastos com auxílio</p><p>da inflação, reforçando a crença da sociedade na estabilidade de preços.</p><p>Dessa forma, a mudança nas formas institucionais e o Plano Real começariam</p><p>a exercer forte influência sobre os indivíduos, inibindo o comportamento de reajustar</p><p>preços. Como as ações repetidas são importantes para reforçar ou modificar</p><p>os hábitos (Hodgson, 2010), a mudança de comportamento dos empresários,</p><p>consumidores e estado foi fundamental evitar a continuidade da inflação.</p><p>FONTE: Lopes, H. C.; Conceição, O. A. C. A inflação e os planos Cruzado e Real: uma interpretação</p><p>institucionalista. Economia e Sociedade, Campinas, v. 25, n. 56, p. 147-172, abr. 2016. Disponível:</p><p><http://www.scielo.br/pdf/ecos/v25n1/0104-0618-ecos-25-01-00147.pdf>. Acesso: 8 maio 2019.</p><p>125</p><p>RESUMO DO TÓPICO 3</p><p>Neste tópico, você aprendeu que:</p><p>• O Plano Real foi anunciado em 1993, quando Itamar Franco ainda era o</p><p>presidente interino, depois do impeachment de Fernando Collor de Mello.</p><p>• O Plano Real faz parte de uma família de planos que, desde a década de 1980,</p><p>utiliza a âncora cambial como mecanismo para frear a inflação. Além disso,</p><p>o Plano Real, assim como o Plano Cruzado, partiu do diagnóstico de que a</p><p>inflação brasileira possuía forte componente inercial.</p><p>• Fernando Henrique Cardoso foi eleito presidente por dois mandatos</p><p>consecutivos: 1995 a 1998 e, depois, 1999 a 2002.</p><p>• O Plano Real, para combater o componente inercial da inflação, adotou uma</p><p>reforma monetária, sem congelamento de preços, substituindo naturalmente a</p><p>moeda e utilizando uma âncora cambial (dólar).</p><p>• O Plano Real, para combater o processo inflacionário, adotou três fases: ajuste</p><p>fiscal, indexação da moeda à URV e reforma monetária (substituição da URV</p><p>pelo Real).</p><p>• A implementação do Plano Real levou à apreciação do câmbio, processo que</p><p>ocorreu devido à inflação residual e à política cambial (não se fixou uma</p><p>paridade).</p><p>• O Plano Real foi exitoso em combater a inflação. Entretanto, vários desequilíbrios,</p><p>como os déficits fiscal e externo, foram se formando na economia, sendo</p><p>necessário que no segundo mandato de FHC fossem realizadas mudanças</p><p>significativas em três elementos centrais da política macroeconômica: regime</p><p>cambial, regime fiscal e regime monetário.</p><p>126</p><p>1 O Plano Real, assim como o Plano Cruzado, partiu do diagnóstico de que a</p><p>inflação brasileira possuía forte componente inercial. Comente o que seria</p><p>inflação inercial.</p><p>2 Quais foram as três fases do Plano Real para atacar o processo inflacionário?</p><p>Comente.</p><p>3 Como uma valorização cambial e uma demanda fortemente aquecida</p><p>impactaram a economia brasileira no primeiro mandato de FHC?</p><p>4 Comente sobre o PIB e desemprego no primeiro mandato de FHC.</p><p>5 O primeiro mandato de FHC foi exitoso no combate à inflação, mas vários</p><p>desequilíbrios foram se formando na economia brasileira. Como o governo</p><p>agiu para combater esses desequilíbrios no segundo mandato de FHC?</p><p>AUTOATIVIDADE</p><p>127</p><p>UNIDADE 3</p><p>A ECONOMIA BRASILEIRA NO</p><p>INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM</p><p>PLANO DE ESTUDOS</p><p>A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:</p><p>• apresentar os principais aspectos da política macroeconômica do primeiro</p><p>mandato do governo Lula;</p><p>• analisar como se deu a reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva</p><p>e quais foram as medidas adotadas em seu governo em plena crise</p><p>econômica e financeira internacional;</p><p>• identificar as principais propostas de governo da presidente Dilma;</p><p>• analisar indicadores recentes da economia brasileira e a política</p><p>macroeconômica brasileira;</p><p>• compreender os impactos da reeleição da presidente Dilma, a crise</p><p>política instaurada, seu impeachment e os impactos de sua sucessão por</p><p>seu vice, Temer.</p><p>Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você</p><p>encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.</p><p>TÓPICO 1 – O GOVERNO LULA: MANUTENÇÃO DA POLÍTICA</p><p>FINANCEIRA E MUDANÇAS NA ECONOMIA</p><p>TÓPICO 2 – REELEIÇÃO DO GOVERNO LULA E A CRISE FINANCEIRA</p><p>INTERNACIONAL</p><p>TÓPICO 3 – CRISE POLÍTICA E A ECONOMIA NOS GOVERNOS DE</p><p>DILMA E TEMER</p><p>128</p><p>129</p><p>TÓPICO 1</p><p>O GOVERNO LULA: MANUTENÇÃO DA</p><p>POLÍTICA FINANCEIRA E MUDANÇAS</p><p>NA ECONOMIA</p><p>UNIDADE 3</p><p>1 INTRODUÇÃO</p><p>Neste tópico, vamos estudar como foi a transição do Governo FHC para</p><p>o presidente Lula.</p><p>Após dois mandatos, a imagem do presidente Fernando Henrique já</p><p>apresentava desgaste devido à dificuldade de manter o Plano Real. Com o</p><p>acirramento das medidas de austeridade para cumprir os acordos com o FMI, a</p><p>economia apresentava fraco desempenho.</p><p>Como vimos nas unidades anteriores, o Plano Real se apoiava nas</p><p>importações para conter os preços internos e a ancoragem cambial valorizando</p><p>artificialmente o real. Assim, havia dificuldade de exportação dos produtos</p><p>brasileiros e, como consequência, observamos os recorrentes déficits na balança</p><p>comercial. Tais déficits explicam o aumento do desemprego e a falta de estímulo</p><p>à produção interna. Todos os fatores nos dão uma foto do desgaste da imagem do</p><p>presidente Fernando Henrique.</p><p>O objetivo do tópico é apresentar o contexto dessa transição da presidência</p><p>do FHC para o Presidente Lula, e quais as principais medidas realizadas na gestão</p><p>de Lula em seu primeiro mandato, no período de 2003 a 2006.</p><p>Havia muita especulação pelo “mercado” de como seria um governo de</p><p>esquerda no principal cargo do Poder Executivo no país. O discurso mais radical</p><p>de esquerda, como o de fazer auditoria na dívida pública, e do não pagamento</p><p>da dívida e não cumprimento dos acordos com o Fundo Monetário Internacional,</p><p>gerava grande temor e especulação no mercado financeiro.</p><p>Vamos ver neste tópico que o Partido dos Trabalhadores, representado</p><p>por seu candidato, Luis Inácio Lula da Silva, ajustou o discurso de campanha</p><p>de forma mais moderada, como uma maneira de acenar para o mercado que</p><p>teria uma gestão mais alinhada com as regras de mercado, e assim, aos poucos,</p><p>foi amenizando a tensão no mercado financeiro e nos empresários. Além disso,</p><p>muitos eleitores que estavam descontentes com a austeridade do governo passado</p><p>e ansiavam por mais políticas sociais e de combate ao desemprego, e acelaração</p><p>da economia, votaram em Lula com essa perspectiva.</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>130</p><p>Veremos como foi o desempenho desse governo por meio dos indicadores</p><p>econômicos e sociais e as repercursões na economia brasileira.</p><p>Bons estudos!</p><p>2 TRANSIÇÃO DE FHC PARA LULA (2002 A 2003)</p><p>A disputa para o cargo presidencial ocorreu em 2002. Os principais</p><p>candidatos a disputarem o cargo no segundo turno foram: José Serra (PSDB),</p><p>apoiado por Fernando Henrique Cardoso, e o ex-sindicalista, Luiz Inácio</p><p>Lula da Silva (PT). A possibilidade de um governo comandado pela esquerda</p><p>gerou grande expectativa no mercado financeiro, que tinha dúvidas quanto ao</p><p>posicionamento de um governo de esquerda quanto à taxa de câmbio, juros e ao</p><p>cumprimento das obrigações da dívida.</p><p>O Brasil havia recorrido novamente ao FMI em 1998, era clara a pressão</p><p>externa</p><p>sobre a condução da política macroeconômica brasileira. O crescimento da</p><p>economia brasileira, diante da adoção das medidas de austeridade exigidas pelo</p><p>FMI, sem dúvida, deixou o país em uma condição complexa para elevar a taxa</p><p>de crescimento, e a população brasileira enfrentou sacrifícios como desemprego</p><p>elevado e restrição orçamentária.</p><p>Em 2001, o governo estabeleceu novo acordo com o FMI, aumentando</p><p>ainda mais o aperto fiscal e austeridade econômica. Em maio de 2001, a dívida</p><p>líquida do setor público atingira 51,9% do PIB (R$ 618,5 bilhões), enquanto isso,</p><p>o déficit externo seguiu aumentando, piorando as contas nacionais, e o regime de</p><p>câmbio flutuante, instaurado em 1999, começava a demonstrar sinais de colapso.</p><p>O governo ofereceu vantagens aos especuladores e retomou as negociações para</p><p>firmar novo acordo com o FMI. No acordo, o Brasil assumiu um compromisso</p><p>de atingir um superávit primário de 3,35% do PIB, e a meta para 2002 foi elevada</p><p>para 3,5%. As metas do país fazer economia para pagar os detentores de títulos</p><p>públicos não resolviam a situação de descontrole das contas do país e impunham</p><p>sacrifícios à maioria da população (SOUZA, 2008).</p><p>Para acalmar os ânimos do mercado, o candidato Lula deu um sinal claro de</p><p>moderação no posicionamento quanto às futuras práticas na condução da política</p><p>macroeconômica e apresentou a carta de intenção assinada, comprometendo-se</p><p>com as obrigações assumidas pelo governo FHC junto ao FMI.</p><p>Em meados daquele ano o candidato Lula da Silva havia divulgado</p><p>a “Carta ao Povo Brasileiro” em um claro sinal de moderação. Nela</p><p>afirmava-se explicitamente o compromisso de manter o superávit</p><p>primário “necessário para impedir que a dívida interna aumente e</p><p>destrua a confiança...”. Outra sinalização foi dada pela nomeação do</p><p>ex-deputado federal, o então prefeito de Ribeirão Preto/SP, Antônio</p><p>Palocci, como coordenador do programa de governo e que viria a ser,</p><p>posteriormente, o ministro da Fazenda do novo governo. Em agosto,</p><p>o documento “Nota sobre o Acordo com o FMI” comprometia-se a</p><p>respeitar os termos do acordo negociado pelo governo FHC com o</p><p>Fundo (LACERDA et al., 2006, p. 242).</p><p>TÓPICO 1 | O GOVERNO LULA: MANUTENÇÃO DA</p><p>131</p><p>Essa carta mudou os rumos das eleições, pois transmitiu a ideia de que</p><p>seria um presidente da conciliação, após três tentativas fracassadas (1989, 1994</p><p>e 1998) de ser eleito presidente. Ele ressaltou que iria buscar a estabilidade</p><p>macroeconômica, mas com crescimento econômico. A política de juros altos</p><p>de FHC já havia esgotado a sua popularidade, pois havia crescimento baixo,</p><p>desemprego crescente e a população estava insatisfeita. Para piorar, ocorreu</p><p>um apagão em 2001, demonstrando a crise de abastecimento energético do país,</p><p>causada pelo processo de privatização no governo de FHC e por fatores climáticos.</p><p>Lula foi eleito e sua estratégia de campanha menos radical, mais conservadora e</p><p>focada na estabilidade econômica com crescimento funcionou (PIRES, 2010).</p><p>IMPORTANTE</p><p>Os conceitos de esquerda e direita</p><p>O uso das categorias esquerda e direita para indicar preferências políticas remonta</p><p>à Revolução Francesa, na reunião dos Estados Gerais, no final do século XVIII. Delegados</p><p>identificados com igualitarismo e reforma social sentavam-se à esquerda do rei; delegados</p><p>identificados com aristocracia e conservadorismo, à direita. A distinção original entre defesa</p><p>da ordem ou da mudança correspondia a uma disposição espacial e, ao longo do século</p><p>XIX, na Europa, a distinção entre esquerda e direita passa a ser associada com a distinção</p><p>entre liberalismo e conservadorismo.</p><p>Com a expansão do movimento operário e a difusão da perspectiva marxista, o</p><p>conteúdo da posição de esquerda passa a incorporar a defesa dos interesses da classe proletária.</p><p>Com os debates da socialdemocracia no final do século XIX e a revolução russa de 1917, a defesa</p><p>do capitalismo desloca a burguesia para a direita. A emergência do keynesianismo e os estados</p><p>de bem-estar social com suas políticas redistributivas reforçaram a oposição entre a liberdade de</p><p>mercado e o Estado interventor, deslocando também o liberalismo para a direita.</p><p>Esse rápido histórico pretendeu mostrar que o conteúdo das categorias de</p><p>esquerda e direita mudou consideravelmente ao longo do tempo. Entretanto, o significado</p><p>que vincula a defesa da igualdade social, herdeira de princípios socialistas, com a esquerda,</p><p>e a defesa do livre mercado capitalista, com a direita, parece ter sobrevivido aos rearranjos</p><p>mundiais do final do século XX.</p><p>O colapso do socialismo real no leste europeu, a crise fiscal do welfare-state, a</p><p>consequente proliferação do neoliberalismo, a revisão operada pelos partidos social-democratas</p><p>no sentido da chamada terceira via, a onda das chamadas reformas de segunda geração, tudo</p><p>isso parece ter aproximado do centro tanto a esquerda quanto a direita. Na Ciência Política</p><p>contemporânea essa relação entre sistema econômico, posição política e ideologia parece estar</p><p>consolidada. A identificação das identidades e perfis partidários pela sua posição unidimensional</p><p>(na dimensão esquerda-direita) está vinculada a uma determinada concepção teórica acerca da</p><p>competição partidária, qual seja, a teoria econômica da democracia (DOWNS, 1999). Segundo</p><p>esta, os partidos movem-se ao longo do espectro ideológico formulando propostas de políticas</p><p>para obtenção de votos. O artigo na íntegra poderá ser encontrado em: TAROUCO, Gabriela</p><p>da Silva; MADEIRA, Rafael Machado. Partidos, programas e o debate sobre esquerda e direita no</p><p>Brasil. Revista de Sociologia e Política, v. 21, n. 45, p. 149-165, 2013. Disponível em: <http://www.</p><p>scielo.br/pdf/rsocp/v21n45/a11v21n45.pdf>. Acesso em: 8 abr. 2019.</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>132</p><p>No dia 6 de outubro de 2002, 77% dos eleitores que foram às urnas votaram</p><p>em candidatos da oposição ao candidato José Serra, que era apoiado por FHC,</p><p>demonstrando sua insatisfação com a política econômica adotada. No segundo</p><p>turno, que se deu no dia 27 de outubro de 2002, Lula venceu com 61,3% dos votos</p><p>válidos (SOUZA, 2008).</p><p>FIGURA 1 – FERNANDO HENRIQUE CARDOSO PASSA FAIXA PRESIDENCIAL</p><p>PARA LUIZ INÁCIO DA SILVA</p><p>FONTE: <https://www.correiodoestado.com.br/brasilmundo/fhc-visita-lula-em-hospital-em-sp-</p><p>dilma-antecipa-volta-da-europa/296955/>. Acesso em: 12 dez. 2018.</p><p>Outra questão que deve ser destacada é que, a partir da Constituição de 1988,</p><p>qualquer presidente no poder precisa entender que a governabilidade é uma questão</p><p>de alianças, pois o presidencialismo de coalização exige que se construam relações</p><p>com os demais partidos para que seus projetos sejam aprovados no Congresso. A</p><p>ampla fragmentação partidária que se deu no Congresso Nacional dificultava a</p><p>hegemonia para qualquer partido político. Lula fez aliança com um pequeno partido</p><p>de direita, o Partido Liberal (PL), e não fez mais discussões de novas alianças mais</p><p>amplas, até que em 2003 começou a aproximação do partido com o terceiro maior</p><p>número de integrantes no congresso, o PMDB (GIAMBIAGI et al., 2005).</p><p>Nas tentativas de tranquilizar o mercado com uma imagem de um PT</p><p>direcionando suas pautas mais para o centro e a imagem do presidente Lula mais</p><p>moderada, inicia-se o novo governo.</p><p>TÓPICO 1 | O GOVERNO LULA: MANUTENÇÃO DA</p><p>133</p><p>3 A POLÍTICA ECONÔMICA NO PRIMEIRO GOVERNO LULA</p><p>A indicação de Antônio Palocci para o Ministério da Fazenda, em 2003,</p><p>é um sinal claro para o mercado da moderação do então eleito presidente</p><p>Lula. Ainda, o governo estaria mais alinhado com as demandas do mercado</p><p>financeiro. Em 2003, foi divulgado um documento oficial denominado Política</p><p>Econômica e Reformas Estruturais. As diretrizes desse documento se alinhavam a</p><p>um modelo de desenvolvimento pautado na estabilidade econômica, entretanto,</p><p>com gastos governamentais em políticas públicas para as classes mais baixas. O</p><p>texto ainda propunha rever a Lei das Falências, maior autonomia para o Banco</p><p>Central, necessidade de rever as regras</p><p>da aposentadoria do funcionalismo,</p><p>direcionamento do gasto público e várias pautas que eram antes defendidas pelo</p><p>PT como intocáveis passariam a ser revistas (GIAMBIAGI et al., 2005).</p><p>A manutenção da estabilidade monetária no Plano Real foi mantida por</p><p>meio da ancoragem cambial. Entretanto, com o fim do Plano Real em 1999, pois</p><p>foi adotado o câmbio flutuante a partir de janeiro de 1999, rompeu a ancoragem</p><p>cambial e o governo adotou o sistema de metas de inflação. Essa política de</p><p>metas da inflação foi mantida no governo de Lula (2002 a 2005) e também em</p><p>seu segundo mandato (2006 a 2009). O Banco Central acompanha as tendências</p><p>da flutuação da taxa de inflação e autoriza os aumentos ou diminuição da taxa</p><p>básica de juros (a SELIC), de acordo com essas oscilações da inflação (PIRES,</p><p>2010). “Essa política se baseia na fixação de uma meta de inflação para cada ano</p><p>(o centro da meta) e com uma margem de tolerância. Ainda, na utilização da taxa</p><p>de juros como principal instrumento para a manutenção da inflação dentro do</p><p>previsto” (PIRES, 2010, p. 321).</p><p>Assim, o Banco Central montou um “modelo” que correlaciona taxa de</p><p>juros e taxa de inflação. Quanto mais as “expectativas inflacionárias”</p><p>ou a inflação efetiva se afastam da meta de inflação, maior é a taxa</p><p>de juros praticada pelo Banco Central, como forma de tirar moeda de</p><p>circulação (SOUZA, 2008, p. 293).</p><p>Na opinião de Armínio Fraga Neto, ex-presidente do Banco Central, o</p><p>sistema de metas impunha aos governantes a manutenção da estabilidade e da</p><p>condução do governo neste sentido no curto, médio e longo prazo:</p><p>Durante a fase inicial do sistema, definiu-se uma trajetória descendente</p><p>de metas, de forma a reconduzir a inflação para o nível desejado.</p><p>Naquele momento, imaginávamos que tal nível seria, numa primeira</p><p>etapa, algo como 3%-4%, e que, com o tempo, caminharíamos para</p><p>uma taxa próxima à média mundial. Portanto, em seus primeiros</p><p>anos, as metas tiveram o duplo papel de âncora para a inflação e</p><p>de mecanismo de combate à inflação, através da coordenação de</p><p>expectativas. Tal papel duplo voltou a se repetir quando da bem-</p><p>sucedida administração dos efeitos da devastadora crise de confiança</p><p>que nos assolou na transição de 2002-2003 (BACEN, 2011, p. 29).</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>134</p><p>Acompanhe o gráfico a seguir, com dados para os anos de 1999 a 2007.</p><p>Observe que, quando foi instituído, em 1999, o centro da meta de inflação era de</p><p>8%, entretanto, a taxa de inflação (mensurada pelo IPCA) foi de 8,94%, acima do</p><p>centro da meta. Mas em 2000, a política econômica austera fez com que a taxa do</p><p>IPCA ficasse em 5,97% dentro da meta esperada, que era de 6%. O Governo FHC</p><p>terminou seu mandato com inflação muito acima da meta esperada de 4%, com o</p><p>IPCA alcançando 7,67%. O desafio para o novo presidente seria reduzir a inflação</p><p>e manter a estabilidade monetária.</p><p>No entanto, no primeiro ano do seu mandato, a inflação continua num</p><p>ritmo ascendente, a meta de inflação que era de 3,5% ficou longe de ser atingida,</p><p>fechando o ano em 12,53%. Nos anos posteriores, a inflação começou a cair,</p><p>demonstrando que a equipe econômica estava buscando se aproximar da meta</p><p>de inflação e cumprir com a promessa de manter a estabilidade monetária, com a</p><p>mesma política de juros altos. A inflação em 2003 é reduzida para 9,3% e em 2004</p><p>começa a se aproximar da meta de 5,5%, mas a inflação foi ainda de 7,6%. Em</p><p>2005 a meta imposta foi de 4,5% e a inflação foi reduzida a 5,69% e, finalmente,</p><p>em 2006, a inflação caiu para 3,14%, finalmente abaixo da meta da inflação que</p><p>era de 4,5%. Em 2007, a inflação permaneceu no centro da meta.</p><p>GRÁFICO 1 – METAS DE INFLAÇÃO (1999 – 2007)</p><p>FONTE: Adaptado de Banco Central, IBGE e Folha de S. Paulo (2008 apud PIRES, 2010, p. 321)</p><p>Para manter a estabilidade econômica, a política de juros altos foi</p><p>amplamente utilizada, chegando a 45% no governo de FHC. De acordo com</p><p>Giambiagi et al. (2005), entre janeiro de 1999 e dezembro de 2002, a média da taxa</p><p>da SELIC, no governo FHC, foi de 23,4%, enquanto de janeiro de 2003 a junho de</p><p>2008 a média foi de 17,13%. Ou seja, a taxa de juros elevada tem efeitos paradoxais</p><p>na economia. Se por um lado é utilizada no combate à inflação e atrai capitais para</p><p>o país, por outro lado ela sacrifica a produção interna, desestimula as grandes</p><p>empresas a fazerem investimentos produtivos, e tem efeitos devastadores nas</p><p>empresas não financeiras.</p><p>TÓPICO 1 | O GOVERNO LULA: MANUTENÇÃO DA</p><p>135</p><p>O Comitê de Política Monetária (COPOM) é formado pelo Presidente do</p><p>BACEN e Ministro da Fazenda, que se reúnem para determinar a taxa da SELIC.</p><p>A fonte de dados, estes que amparam as decisões do Copom, é um levantamento</p><p>feito pela pesquisa Focus, realizada com a percepção de expectativas inflacionárias</p><p>e expectativas de juros futuros pelo BACEN junto com, aproximadamente, 100</p><p>operadores e analistas do mercado financeiro. Não é paradoxal e duvidosa uma</p><p>pesquisa, esta que induzirá a uma decisão de determinação da taxa de juros a</p><p>ser feita com os principais beneficiários de taxas de juros altas? Dessa forma, é</p><p>perceptível a forte tendência de os juros permanecerem elevados (SOUZA, 2008).</p><p>IMPORTANTE</p><p>O que é o Comitê de Política Monetária (Copom)? Por que foi criado?</p><p>O Comitê de Política Monetária (Copom) é o órgão decisório da</p><p>política monetária do Banco Central do Brasil (BCB), responsável por</p><p>estabelecer a meta para a taxa básica de juros, que no Brasil é a taxa</p><p>Over-Selic, ou taxa Selic. Foi constituído em junho de 1996, e, com isso,</p><p>tornou-se possível estabelecer ritual adequado ao processo decisório</p><p>de política monetária e aprimorar sua transparência (BACEN, 2016, p. 5).</p><p>Quais são os objetivos do Copom?</p><p>No regime de metas para a inflação, implementado no Brasil em 1999,</p><p>os principais objetivos do Copom são: (i) estabelecer as diretrizes da</p><p>política monetária e (ii) definir a meta para a taxa básica de juros no</p><p>Brasil e seu eventual viés. Pautado nesses objetivos, o BCB busca,</p><p>por meio de operações de mercado aberto, manter a taxa Selic diária</p><p>próxima à meta. A meta de inflação de cada ano e os respectivos</p><p>intervalos de tolerância são estabelecidos pelo Conselho Monetário</p><p>Nacional (CMN) com 2 anos de antecedência, sempre em junho. Se,</p><p>em determinado ano, a inflação ultrapassar o intervalo de tolerância</p><p>em torno da meta estabelecida pelo CMN, o presidente do BCB deve</p><p>encaminhar carta aberta ao ministro da Fazenda, explicando as razões</p><p>do não cumprimento da meta, bem como proposta das medidas</p><p>necessárias para trazer a inflação de volta à trajetória predefinida e o</p><p>tempo esperado para que as medidas surtam efeito (BACEN, 2016, p. 5).</p><p>O que é a taxa Selic?</p><p>A taxa Selic, instrumento primário de política monetária do Copom,</p><p>é a taxa de juros média que incide sobre os financiamentos diários</p><p>com prazo de um dia útil (overnight), lastreados por títulos públicos</p><p>registrados no Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic). O</p><p>Copom estabelece a meta para a taxa Selic, e cabe à mesa de operações</p><p>do mercado aberto do BCB manter a taxa Selic diária próxima à meta</p><p>(BACEN, 2016, p. 7).</p><p>FONTE: BACEN. Comitê de Política Econômica (COPOM): série perguntas mais frequentes.</p><p>Brasília: Banco Central do Brasil, 2016. Disponível em: <https://www.bcb.gov.br/conteudo/</p><p>home-ptbr/FAQs/FAQ%2003-Copom.pdf>. Acesso em: 8 abr. 2019.</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>136</p><p>As gestões de Palocci, à frente do Ministério da Fazenda, e de Henrique</p><p>Meirelles, no Banco Central, foram extremamente ortodoxas, enfatizando as</p><p>medidas monetaristas para a contenção de circulação de moeda, mantendo a</p><p>taxa de juros elevada mesmo com a evidente queda da taxa de inflação (SOUZA,</p><p>2008). Meirelles foi ex-presidente do Bank Boston, e toda a equipe da diretoria</p><p>anterior de Armínio Fraga foi mantida, de acordo com Giambiagi et al. (2005),</p><p>dando o indício de continuidade da gestão macroeconômica do governo FHC</p><p>para o mercado financeiro.</p><p>seja, serve como base para outras indústrias. A indústria de bens intermediários diz respeito</p><p>às indústrias de ferro, aço, cimento, petróleo, indústrias que são base para outras indústrias,</p><p>assim como a indústria de bens de capital.</p><p>A indústria de bens de consumo duráveis diz respeito à indústria responsável pela</p><p>produção de produtos que podem ser utilizados mais de uma vez por um longo período.</p><p>Exemplo: eletrodomésticos, automóveis, máquina de lavar roupas etc. Já a indústria de bens</p><p>de consumo não duráveis refere-se à produção de bens que são consumidos imediatamente,</p><p>como alimentos, calçados, bebidas etc.</p><p>Pois bem, após 15 anos no poder, Getúlio Vargas foi então substituído por</p><p>Eurico Gaspar Dutra, que governou o país até 1950, e adotou uma política marcada</p><p>pelo liberalismo econômico, rompendo com a política de industrialização iniciada no</p><p>governo Vargas (PIRES, 2010). É importante ressaltar que esse rompimento foi feito:</p><p>[...] por meio de uma política de abertura da economia nacional, do</p><p>relaxamento dos controles de importação e sobre o capital estrangeiro,</p><p>do desmonte do arcabouço institucional que permitia ampla ação</p><p>estatal na economia e da introdução de uma política de estabilização</p><p>calcada na abertura comercial, no corte do gasto público, no aperto</p><p>monetário e creditício e no arrocho salarial (PIRES, 2010, p. 101).</p><p>Além do rompimento com o Processo de Substituição de Importação</p><p>iniciado por Vargas, o governo Dutra não foi popular. Caracterizou-se pelo arrocho</p><p>dos salários, com congelamento do salário mínimo, além da realização de medidas</p><p>para repreender as classes trabalhadoras mais combativas (IANNI, 1986).</p><p>Após esse período de liberalização da economia que marcou o Governo</p><p>Dutra, Vargas retoma novamente o poder. Ao longo dos governos de Getúlio</p><p>Vargas o PSI foi implementado, o que modificou as características da economia</p><p>brasileira de modo profundo, uma vez que a população migrou do campo para</p><p>trabalhar nas fábricas, promovendo um processo de industrialização e urbanização.</p><p>Assim, quando Vargas retornou à presidência, ele aplicou novamente o PSI,</p><p>gerando envolvimento central do governo na economia. Para dar continuidade</p><p>ao PSI, Vargas tinha como objetivo promover o desenvolvimento da indústria</p><p>pesada no país. Para tanto, fundou a Petrobrás e a Eletrobrás, além de restringir</p><p>a participação do capital externo na economia brasileira (LACERDA et al., 2000).</p><p>Para implementar o PSI, o Estado de Vargas possuía algumas funções</p><p>básicas como a adequação das instituições à indústria nascente; a promoção de</p><p>uma infraestrutura básica, como a construção de portos, ferrovias e estradas; o</p><p>oferecimento de insumos básicos e a captação e distribuição da poupança. Além</p><p>disso, é importante mencionar que, segundo Lacerda et al. (2000), o financiamento</p><p>do governo dava-se mediante a captação de tributos, poupanças compulsórias e</p><p>ganhos no mercado de câmbio.</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>6</p><p>A industrialização brasileira no período Vargas pode ser considerada uma</p><p>industrialização fechada, pois foi voltada para contemplar o mercado interno e com</p><p>medidas protecionistas, como as citadas anteriormente. Mas você deve se perguntar</p><p>como ocorreu o PSI? Houve uma sequência lógica para o PSI? Segundo Gremaud,</p><p>Vasconcellos e Toneto Júnior (2011), houve sim uma sequência importante:</p><p>• Primeiramente, houve um processo de estrangulamento externo, com queda</p><p>do valor das exportações e manutenção de parte da demanda interna por</p><p>importações, gerando escassez de divisas.</p><p>• Para combater o estrangulamento externo, o governo Vargas tomou</p><p>medidas para proteger a indústria nacional preexistente, o que aumentou a</p><p>competitividade e a rentabilidade da produção nacional.</p><p>• Passou-se a produzir internamente o que antes era importado, aumentando a</p><p>renda nacional e a demanda agregada.</p><p>• Novo estrangulamento externo em função do próprio crescimento da demanda,</p><p>que provoca aumento das importações. Desse último ponto da sequência,</p><p>volta-se ao primeiro.</p><p>É importante mencionar que, segundo autores como Fonseca (2003), o</p><p>motor dinâmico do PSI foi o estrangulamento externo, sendo assim, o modelo</p><p>de substituição de importações pode ser entendido como uma resposta ao</p><p>estrangulamento externo, também conhecido como teoria dos choques adversos.</p><p>Desse modo, as crises da agroexportação incidiam sobre a balança comercial,</p><p>fazendo submergir as contradições de uma economia voltada para fora, mas que</p><p>ao mesmo tempo não conseguia gerar divisas para manter pauta de importações</p><p>e pagar o serviço da dívida externa (FONSECA, 2003).</p><p>Tal estrangulamento externo era recorrente e relativo. Recorrente pois</p><p>a tendência era repetir-se sistematicamente ao longo do processo de</p><p>substituição de importações, e relativo porque não poderia haver um</p><p>desequilíbrio externo absoluto que significasse um limite completo</p><p>às importações, as quais deveriam-se manter minimamente para</p><p>fazer face às necessidades relativas aos investimentos e à ampliação</p><p>da capacidade produtiva do país. Os estrangulamentos, assim,</p><p>funcionavam como estímulos e limites ao investimento industrial.</p><p>Tal investimento, nesse momento, passa a ser a variável-chave para</p><p>determinar o ritmo do crescimento econômico nacional, substituindo</p><p>as exportações que eram o ponto-chave do ritmo de crescimento do</p><p>país em sua fase agroexportadora (GREMAUD; VASCONCELLOS;</p><p>TONETO JÚNIOR, 2011, p. 354).</p><p>Assim, é possível considerar que o estrangulamento externo funcionava</p><p>como o principal fator que desencadeava o PSI. Além disso, o PSI ocorreu por</p><p>etapas, ou seja, buscou-se construir um setor após o outro, sendo que a primeira</p><p>etapa objetivava o desenvolvimento essencial da indústria de bens de consumo</p><p>não duráveis, até chegar na etapa de desenvolvimento da indústria de bens de</p><p>capital. As indústrias de bens de consumo duráveis e de bens de consumo não</p><p>duráveis foram as priorizadas, no caso brasileiro.</p><p>TÓPICO 1 | SITUAÇÃO INTERNACIONAL E A</p><p>7</p><p>Em um primeiro momento, de 1930 a 1955, período conhecido como</p><p>“industrialização restringida”, predominou a substituição de importações de bens</p><p>de consumo não duráveis, mas, ao mesmo tempo, o processo de industrialização</p><p>atingiu setores, como minerais não metálicos, metalúrgica, papel/papelão e</p><p>química. Já de 1953 a 1973 a produção voltou-se para os bens de consumo</p><p>duráveis, que impulsionaram a indústria de bens de consumo não duráveis, os</p><p>intermediários e os de capital (FONSECA, 2003).</p><p>O exposto pode ser visualizado na tabela que se segue.</p><p>TABELA 1 – ESTRUTURA DE PRODUÇÃO DOMÉSTICA E IMPORTAÇÃO DE PRODUTOS</p><p>MANUFATURADOS – 1949-1964</p><p>FONTE: Bergman e Malan (1971, apud GREMAUD, VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011, p. 357)</p><p>Bilhões de cruzeiros a preços de 1955</p><p>Bens de consumo Bens de produção Total de produtos</p><p>Ano Não duráveis Duráveis Intermediários Capital Manufaturados</p><p>A) IMPORTAÇÕES</p><p>1949 5,4 8,9 18,2 15,8 48,3</p><p>1955 4,5 2,1 22,6 13,7 42,9</p><p>1959 2,8 2,9 21,2 29,2 56,1</p><p>1964 3,9 1,5 18,6 8,7 32,7</p><p>B) PRODUÇÃO DOMÉSTICA</p><p>1949 140,0 4,9 52,1 9,0 206,0</p><p>1955 200,9 19,0 104,0 18,0 341,9</p><p>1959 258,0 43,1 159,6 59,5 520,2</p><p>1964 319,5 93,8 261,1 79,7 754,2</p><p>IMPORTAÇÕES SOBRE OFERTA TOTAL [A/(A+B)]</p><p>1949 3,7 64,5 25,9 63,7 19,0</p><p>1955 2,2 10,0 17,9 43,2 11,1</p><p>1959 1,1 6,3 11,7 32,9 9,7</p><p>1964 1,2 1,6 6,6 9,8 4,2</p><p>Entretanto, é importante ressaltar que esse processo não foi simples e que</p><p>existiram dificuldades na implementação do PSI. Segundo Gremaud, Vasconcellos</p><p>e Toneto Júnior (2011) existiram quatro dificuldades principais:</p><p>• Tendência ao desequilíbrio externo: aparecia por três razões principais – política</p><p>cambial (caracterizada pelo confisco cambial, desestimulando as exportações</p><p>de produtos agrícolas); indústria sem competitividade (contemplava apenas</p><p>o mercado interno e, assim, não conseguia atuar no mercado internacional);</p><p>e elevada demanda por importações (devido ao investimento industrial e ao</p><p>aumento da renda).</p><p>UNIDADE</p><p>Observe a Tabela 1, que apresenta as datas da reunião do Copom para</p><p>determinar as taxas de juros e o período de vigência até a reunião seguinte. A</p><p>média anual da taxa de juros para o ano de 2003 foi de 22,89%, em 2004 caiu</p><p>para 16,26% a.a., em 2005 19,03% a.a., e ao término do primeiro mandato de Lula</p><p>em 2006 a taxa de juros média ficou em 15,65% a.a. Se observarmos o Gráfico</p><p>anterior, que a inflação caiu a 3,14%a.a. em 2006, abaixo da meta prevista de 4,5%</p><p>a.a., a taxa de juros de 15,65% a.a. era exorbitante, ou seja, uma das taxas de juros</p><p>mais elevadas no mundo.</p><p>TABELA 1 – HISTÓRICO DA TAXA DE JUROS SELIC DE 2003 A 2006 (%)</p><p>Reunião do</p><p>Copom Período de vigência Meta SELIC</p><p>% a.a</p><p>Taxa SELIC</p><p>data % a.m. % a.a.</p><p>18/10/2006 19/10/2006 - 29/11/2006 13,75 1,43 13,67</p><p>30/08/2006 31/08/2006 - 18/10/2006 14,25 1,75 14,17</p><p>19/07/2006 20/07/2006 - 30/08/2006 14,75 1,64 14,67</p><p>31/05/2006 01/06/2006 - 19/07/2006 15,25 1,92 15,18</p><p>19/04/2006 20/04/2006 - 31/05/2006 15,75 1,69 15,72</p><p>08/03/2006 09/03/2006 -19/04/2006 16,50 1,77 16,50</p><p>18/01/2006 19/01/2006 - 08/03/2006 17,25 2,11 17,26</p><p>14/12/2005 15/12/2005 - 18/01/2006 18,00 1,66 18,00</p><p>23/11/2005 24/11/2005 - 14/12/2005 18,5 1,01 18,49</p><p>19/10/2005 20/10/2005 - 23/11/2005 19,00 1,60 18,98</p><p>14/09/2005 15/09/2005 - 19/10/2005 19,50 1,71 19,48</p><p>17/08/2005 18/08/2005 - 14/09/2005 19,75 1,37 19,74</p><p>20/07/2005 21/07/2005- 17/08/2005 19,75 1,44 19,75</p><p>15/06/2005 16/06/2005 - 20/07/2005 19,75 1,80 19,73</p><p>18/05/2005 19/05/2005 - 15/06/2005 19,75 1,37 19,75</p><p>20/04/2005 22/04/2005 - 18/05/2005 19,50 1,35 19,51</p><p>16/03/2005 17/03/2005 - 21/04/2005 19,25 1,69 19,24</p><p>16/02/2005 17/02/2005 - 16/03/2005 18,75 1,37 18,75</p><p>19/01/2005 20/01/2005 - 16/02/2005 18,25 1,20 18,25</p><p>15/12/2004 16/12/2005 - 19/01/2005 17,75 1,63 17,74</p><p>17/11/2004 18/11/2005 - 15/12/2004 17,25 1,27 17,23</p><p>20/10/2004 21/10/2004 - 17/11/2004 16,75 1,11 16,71</p><p>TÓPICO 1 | O GOVERNO LULA: MANUTENÇÃO DA</p><p>137</p><p>15/09/2004 16/09/2004 - 20/10/2004 16,25 1,44 16,23</p><p>18/08/2004 19/08/2004 - 15/09/2004 16,00 1,12 15,90</p><p>21/07/2004 22/07/2004 - 18/08/2004 16,00 1,17 15,83</p><p>16/06/2004 17/06/2004 - 21/07/2004 16,00 1,11 15,79</p><p>19/05/2004 20/05/2004 - 16/06/2004 16,00 1,11 15,79</p><p>14/04/2004 15/04/2004 - 19/05/2004 16,00 1,41 15,80</p><p>17/03/2004 18/03/2004 - 14/04/2004 16,25 1,13 16,09</p><p>18/02/2004 19/02/2004 - 17/03/2004 16,50 1,08 16,28</p><p>21/01/2004 22/01/2004 - 18/02/2004 16,50 1,21 16,30</p><p>17/12/2003 18/12/2003 - 21/01/2004 16,50 1,39 16,32</p><p>19/11/2003 20/11/2003 - 17/12/2003 17,50 1,28 17,32</p><p>22/10/2003 23/10/2003 - 19/11/2003 19,00 1,38 18,84</p><p>17/09/2003 18/09/2003 - 22/10/2003 20,00 1,81 19,84</p><p>20/08/2003 21/08/2003 - 17/09/2003 22,00 1,58 21,84</p><p>23/07/2003 24/07/2003 - 20/08/2003 24,50 1,74 24,32</p><p>18/06/2003 19/06/2003 - 23/07/2003 26,00 2,21 25,74</p><p>21/05/2003 22/05/2003 - 18/06/2003 26,50 1,87 26,27</p><p>23/04/2003 24/04/2003 - 21/05/2003 26,50 1,78 26,32</p><p>19/03/2003 20/03/2003 - 23/04/2003 26,50 2,16 26,32</p><p>19/02/2003 20/02/2003 - 19/03/2003 26,50 1,68 26,30</p><p>22/01/2003 23/01/2003 - 19/02/2003 25,50 1,81 25,36</p><p>FONTE: BACEN (2018, s.p.)</p><p>O presidente Lula recebeu a economia com uma inflação que não era</p><p>uma inflação de demanda, pois a economia estava em recessão há dois anos. A</p><p>aceleração dos preços se deu em virtude da desvalorização do real em 2002, gerando</p><p>aumentos nos preços dos produtos importados, impactando diretamente nos</p><p>produtos com preços administrados. Além da estagnação econômica, o processo</p><p>de abertura da economia, para os produtos estrangeiros, teve forte impacto, e</p><p>isso também continuou a influenciar o processo de recuperação econômica</p><p>no Governo Lula, que seguiu com a mesma dinâmica ortodoxa de controle da</p><p>inflação. A prática de juros altos não só desestimulou as atividades produtivas</p><p>como pressionou a dívida interna pública e criou as expectativas inflacionárias</p><p>nos agentes econômicos (SOUZA, 2008).</p><p>As metas eram elevadas para atingir o superávit primário, mas Palocci e</p><p>Meirelles trabalhariam rigidamente para manter o acordo com o FMI e pagar</p><p>os juros dos rentistas. O superávit primário alcançado foi superior à meta</p><p>proposta pelo FMI. No primeiro ano do governo Lula subiu a meta para 4,337%</p><p>do PIB, foi para 4,61% em 2004, e 4,84% em 2005, e o excedente neste último</p><p>foi de R$10,76 bilhões acima da meta determinada. A meta fiscal imposta pelo</p><p>FMI para esses três anos era de 4,25% do PIB. Para atingir esses superávits, a</p><p>equipe econômica, observando a queda da arrecadação em 2003, impôs cortes</p><p>radicais dos investimentos públicos. Nos anos subsequentes, aumentaram a carga</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>138</p><p>tributária e a arrecadação. Os efeitos dessas políticas foram de desviar o dinheiro</p><p>para o sistema financeiro, no entanto, a economia continuava em um processo</p><p>de estagnação apresentando baixo crescimento (SOUZA, 2008). Além disso,</p><p>houve a meta de 4,25% do PIB de superávit primário para a Lei de Diretrizes</p><p>Orçamentárias para o período de 2004 a 2006 (GIAMBIAGI et al., 2005).</p><p>Nos primeiros trimestres do governo Lula, a Balança Comercial começou a</p><p>apresentar sinais de recuperação, contribuindo para reduzir a cotação do dólar. A</p><p>elevação dos juros, que chegaram a 26,5%, e o saldo da balança comercial fizeram</p><p>com que o dólar recuasse para RS3,00 já no segundo trimestre, mas o risco-país,</p><p>medido pelo C-Bond, caía para 800 pontos (GIAMBIAGI et al., 2005).</p><p>Logo após a sua entrada na presidência, Lula começou a cumprir os</p><p>compromissos de campanha com as denominadas reformas estruturais. Enviou</p><p>ao Congresso Nacional uma proposta de reforma tributária e outra proposta de</p><p>reforma da Previdência Social. Estas foram muito bem recebidas pelo mercado e</p><p>romperam com o estigma do Partido dos Trabalhadores em não propor mudanças</p><p>quanto aos direitos trabalhistas do funcionalismo (GIAMBIAGI et al., 2005).</p><p>IMPORTANTE</p><p>As propostas de reformas de 2003</p><p>Por Fábio Giambiagi</p><p>Juntamente com as medidas de apertos monetário e fiscal, outro elemento</p><p>importante para justificar a “guinada” do mercado após a onda de desconfiança que</p><p>precedeu a eleição de Lula foi o compromisso do novo governo com as chamadas reformas</p><p>estruturais. Assim como no caso da política econômica em geral, tal mensagem também foi</p><p>vista como sinal de continuidade em relação às reformas, ainda incompletas, de 1995-2002.</p><p>Concretamente, esse compromisso se traduziu em dois fatos: o envio ao Congresso</p><p>da proposta de reforma tributária e o encaminhamento, em paralelo com a reforma tributária,</p><p>da proposta de reforma da Previdência Social.</p><p>No primeiro caso, a reforma tributária visava quatro objetivos: (1) uniformizar a</p><p>legislação do ICMS, contribuindo para reduzir as possibilidades de evasão; (2) prorrogar</p><p>a Desvinculação de Receitas da União (DRU), que reduz parcialmente a vinculação das</p><p>despesas às receitas, dando certa margem de manobra à autoridade para remanejar recursos</p><p>e aproveitar receitas para fazer superávit primário; (3) renovar a Contribuição Provisória sobre</p><p>Movimentações Financeiras (CPMF), evitando queda da receita em 2004; e (4) transformar a</p><p>Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) em uma tributação sobre</p><p>o valor adicionado, em substituição à taxação “em cascata” até então prevalecente.</p><p>No caso da Previdência Social, a proposta se concentrou no regime dos servidores</p><p>públicos e, basicamente, contemplou os seguintes elementos mais importantes: taxação,</p><p>através de alíquota contributiva, dos servidores inativos, com a mesma alíquota dos ativos,</p><p>ressalvado um limite mínimo de isenção; antecipação, para todos os funcionários da ativa</p><p>TÓPICO 1 | O GOVERNO LULA: MANUTENÇÃO DA</p><p>139</p><p>(inclusive aqueles já empregados), da idade mínima para aposentadoria integral, de 60 anos</p><p>para os homens e 55 para as mulheres, com previsão apenas para os novos entrantes na</p><p>Emenda Constitucional nº 20, de 1998; e definição do mesmo teto de benefícios do INSS</p><p>para os benefícios dos novos entrantes, com a possibilidade de criação de fundos de pensão</p><p>para a complementação da aposentadoria</p><p>a partir desse limite.</p><p>As propostas estavam longe de completar a agenda de reformas necessárias da</p><p>Previdência Social, esta que, provavelmente, um dia irá requerer uma nova mudança das</p><p>regras de aposentadoria do INSS. Elas foram, porém, muito bem recebidas pelo mercado. A</p><p>razão é que eram providências que, primeiramente, eram mais profundas do que inicialmente</p><p>se imaginava; segundo, representavam um rompimento com as bases corporativas do</p><p>funcionalismo; e terceiro, iam na direção certa de reformas do ajuste fiscal e redução das</p><p>desigualdades.</p><p>FONTE: GIAMBIAGI, Fábio; VILLELA, André; CASTRO, Lavínia Barros; HERMANN, Jennifer.</p><p>Economia Brasileira Contemporânea (1945-2004). Rio de Janeiro: Campus, 2005. p. 209-210.</p><p>Em 2003 a taxa de crescimento da economia apresentou-se muito</p><p>baixa. Pelos valores do PIB em reais, a taxa de crescimento do ano foi de 1,3%,</p><p>apresentando uma significativa melhora no ano de 2004. O crescimento do PIB</p><p>deu-se, fundamentalmente, pela balança comercial que dá sinais de recuperação.</p><p>As medidas ortodoxas de controle monetário e de estabilidade dos fatores</p><p>macroeconômicos impactaram no crescimento do PIB brasileiro.</p><p>TABELA 2 – PIB E PIB PER CAPITA (2000-2006)</p><p>FONTE: Adaptado de IPEA (2017)</p><p>Ano PIB valores correntes em</p><p>1.000.000 (R$)</p><p>PIB per capita em</p><p>valores correntes</p><p>(R$)</p><p>Governo</p><p>2000 1.199.092 6.913</p><p>FHC2001 1.315.755 7.481</p><p>2002 1.488.787 8.351</p><p>2003 1.717.950 9.511</p><p>Lula</p><p>2004 1.957.751 10.703</p><p>2005 2.170.585 11.723</p><p>2006 2.409.450 12.862</p><p>“A taxa de desemprego aumentou e passou de 11,8% em janeiro de 2003</p><p>a 13,2% em novembro do mesmo ano, para depois diminuir de novo. A massa</p><p>salarial sofreu uma forte contração (-12,3%) em 2003, apesar de um aumento do</p><p>salário mínimo em termos reais” (SALAMA, 2010, p. 168). O baixo desempenho</p><p>do crescimento do PIB não estava criando novos postos de trabalho para absorver</p><p>a mão de obra ociosa.</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>140</p><p>As medidas ortodoxas de controle monetário garantiram continuidade da</p><p>estabilização dos fatores macroeconômicos e recuperação da confiança do governo</p><p>Lula no mercado. Por outro lado, houve um custo social muito alto, continuando</p><p>com uma política de retração do crescimento econômico. O gráfico a seguir</p><p>apresenta a evolução do PIB em dólares a partir do ano 2000. Observe que o nível</p><p>da atividade econômica só supera o patamar do ano de 2000 a partir de 2004.</p><p>GRÁFICO 2 – EVOLUÇÃO DO PIB (CÂMBIO MÉDIO – US$)</p><p>FONTE: Adaptado de IPEA (2019)</p><p>De acordo com Souza (2008), o dólar seguiu se desvalorizando, frente ao</p><p>real, até 2005. Nos três primeiros anos do governo Lula, o dólar se desvalorizou</p><p>em relação ao real 42,22%. Observe, na tabela a seguir, que o crescente saldo na</p><p>balança comercial se deve também a essa valorização do real, esta que refletiu</p><p>no saldo da balança comercial que só foi ascendente nos anos subsequentes da</p><p>gestão Lula. Outro fator que pode ser levado em conta é o aumento da entrada</p><p>de investimentos no país. Observe que em 2003 o saldo da conta de transações</p><p>correntes era negativo, devido aos pagamentos da dívida e juros e amortizações</p><p>e, também, a queda de entrada de investimentos no país. A partir de 2004, o saldo</p><p>das transações correntes começa a apresentar superávit e aumentar a cada ano.</p><p>TABELA 3 – EXPORTAÇÃO POR FATOR AGREGADO E CONTAS SELECIONADAS</p><p>DO BALANÇO DE PAGAMENTOS</p><p>FONTE: Adaptado de Departamento e Planejamento do Comércio Exterior – DEPLA e Secretaria</p><p>do Comércio Exterior – SECEX/MDIC (apud IPEA, 2017, p. 9)</p><p>Participação sobre o total % US$ milhões</p><p>ano Básico Semifaturado Manufaturado Exportação Importação</p><p>Saldo</p><p>Comercial</p><p>Transações</p><p>Correntes</p><p>2003 29,0 15,0 54,3 73.084 48.290 24.794 -7.637</p><p>2004 29,1 13,9 54,9 96.475 62.835 33.641 4.177</p><p>2005 29,3 13,5 55,1 118.308 73.606 44.703 11.679</p><p>2006 29,2 14,2 54,4 137.807 91.351 46.457 13.643</p><p>TÓPICO 1 | O GOVERNO LULA: MANUTENÇÃO DA</p><p>141</p><p>Veja, também, que o Brasil iniciou suas exportações no Governo Lula</p><p>com US$48.290.000.000,00 em 2003, e depois passou a exportar, em 2006,</p><p>US$137.807.000.000,00. A pauta de comércio exterior é majoritariamente de</p><p>produtos manufaturados entre 2003 a 2006, sendo os produtos básicos em torno</p><p>de 29% dos produtos comercializados. Além disso, a recuperação do preço das</p><p>commodities também favorece a recuperação da economia brasileira, mesmo</p><p>com a política econômica restritiva.</p><p>Podemos também apontar outros fatores que contribuíram para a</p><p>expansão das exportações relativas ao agronegócio, como a expansão das</p><p>fronteiras agrícolas e os melhoramentos genéticos devido às pesquisas realizadas</p><p>pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA). Por outro lado,</p><p>há expansão de mercados consumidores de países emergentes, como a Índia e</p><p>China. Estes abrem espaço para a participação direta no comércio exterior de</p><p>produtos que incorporam maior tecnologia, aumentando a concorrência e</p><p>obrigando as organizações brasileiras a buscarem medidas para aumentar sua</p><p>competitividade (IPEA, 2017).</p><p>Podemos também atribuir ao governo Lula uma grande mudança no</p><p>posicionamento da diplomacia. Esta manifestou-se com uma política externa</p><p>independente do alinhamento com os Estados Unidos. A diversificação de países</p><p>com os quais o Brasil passou a negociar foi o principal ponto dessas mudanças. O</p><p>então Ministro das Relações Exteriores Celso Amorim fez uma declaração sobre a</p><p>nova condução dos rumos da política externa do governo Lula:</p><p>A diplomacia vive um momento de grande dinamismo que reflete</p><p>as prioridades do governo Lula nas áreas interna e externa, como</p><p>combater a fome e a pobreza, contribuir para a criação de uma nova</p><p>geografia comercial e adotar postura firme e ativa nas negociações</p><p>multilaterais, inclusive regionais. É preciso assegurar um espaço</p><p>regulatório multilateral justo e equilibrado. Ainda, o imperativo de</p><p>preservar a nossa capacidade soberana de defender o desenvolvimento</p><p>que desejamos para o nosso país (SOUZA, 2008, p. 289).</p><p>Durante o governo Lula deu-se ênfase para a aproximação dos países sul-</p><p>sul e retomou-se o fortalecimento do Mercosul (Mercado Comum do Sul). Ao</p><p>nomear o ministro Celso Amorim, que já havia trabalhado com o ex-Presidente</p><p>Itamar Franco na consolidação do Mercosul, ansiava-se por defender os interesses</p><p>do Brasil na arena internacional e demais países emergentes. A formação dos</p><p>blocos e a consolidação seriam formas de fortalecimento desses países emergentes</p><p>na ordem econômica mundial. Ainda, era preciso ampliar a sua capacidade</p><p>de negociação de forma que as grandes potências econômicas levassem em</p><p>consideração os interesses dos países menos desenvolvidos (SOUZA, 2008).</p><p>Ações que se destacaram na política exterior foram os esforços para a criação</p><p>da Comunidade Sul-Americana de Nações (CASA), em seguida denominada</p><p>União da Nações Sul-Americanas (UNASUL). A diplomacia brasileira procurou</p><p>também formar o Grupo dos 20 (G-20) para agir na Organização Mundial</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>142</p><p>do Comércio (OMC). O G 20 tinha o propósito de estabelecer uma agenda</p><p>independente. Além disso, a diplomacia brasileira buscou aprofundar as relações</p><p>comerciais entre países da África e países árabes, a China, a Rússia e a Índia, bem</p><p>como outros países em desenvolvimento, caracterizando uma nova orientação</p><p>externa estratégica brasileira (SOUZA, 2008).</p><p>Vejamos o gráfico a seguir, que apresenta em percentuais o total de</p><p>exportações do Brasil para a China. Observem que há um crescimento muito forte</p><p>das exportações de produtos primários em contraposição da queda da exportação</p><p>de produtos manufaturados. Isso começa a ficar mais evidente a partir de 2000.</p><p>Em 1995, os produtos primários exportados para China estavam abaixo de 40%</p><p>do total exportado. Esse quadro se modifica no período de 2000, invertendo</p><p>a relação da pauta de exportação, que começa a ultrapassar 60% de produtos</p><p>primários. Isto se deve tanto aos anos da implantação do Plano Real, que valorizou</p><p>o Real</p><p>e barateou os produtos chineses, e à evolução do crescimento chinês, que</p><p>necessitava de insumos primários para produzir e aumentar a capacidade de</p><p>consumo de alimentos, aumentando a exportação de commodities brasileiras.</p><p>GRÁFICO 3 – CATEGORIAS DE MERCADORIAS EXPORTADAS DO BRASIL PARA A CHINA,</p><p>PERÍODO SELECIONADO (VALORES EM PERCENTUAL SOBRE VALOR)</p><p>FONTE: Mortatti, Miranda e Bacchi (2011, p. 314)</p><p>Observem ainda que, a partir de 2005, as exportações de produtos primários</p><p>seguem aumentando, fato explicado pelo aumento do preço das commodities. De</p><p>acordo com Pereira (2014), é a elevação do preço das commodities que justifica</p><p>o aumento dos termos de troca e é o principal fator que justifica o aumento da</p><p>proporção de produtos primários em contraposição às manufaturas. Entretanto,</p><p>veremos outros motivos que explicam essa discussão de desindustrialização do</p><p>Brasil, como a entrada de capitais especulativos no país, juros altos e taxa de câmbio</p><p>e como estão relacionados com a falta de competitividade da indústria brasileira.</p><p>TÓPICO 1 | O GOVERNO LULA: MANUTENÇÃO DA</p><p>143</p><p>DICAS</p><p>Você quer compreender um pouco mais sobre a evolução do comércio do</p><p>Brasil com a China? Então leia este artigo disponível gratuitamente: Determinantes do</p><p>Comércio Brasil-China de commodities e produtos industriais: uma aplicação.</p><p>FONTE: MORTATTI, Caio Marco; MIRANDA, Sílvia Helena Galvão de; BACCHI, Mirian Rumenos</p><p>Piedade. Determinantes do Comércio Brasil-China de commodities e produtos industriais: uma</p><p>aplicação VECM. Economia Aplicada, Ribeirão Preto, v. 15, n. 2, p. 311-335, 2011. Disponível</p><p>em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-80502011000200007>.</p><p>Acesso em: 18 dez. 2018.</p><p>Outra questão é que o Brasil começou a reduzir sua participação de</p><p>exportações em comparação com outros países. A tabela a seguir traz um</p><p>comparativo entre países emergentes e as exportações mundiais, e isso nos</p><p>mostra um problema desde as raízes do desenvolvimento brasileiro como</p><p>primário exportador e com baixo valor agregado. Ainda é um problema que está</p><p>comprometendo o dinamismo da economia brasileira.</p><p>Países mais jovens, em termos de independência e de implantação de</p><p>medidas de industrialização, como Cingapura e Coreia do Sul, têm demonstrado</p><p>que o desenvolvimento voltado para a exportação, mas de produtos com maior</p><p>valor agregado, tem se apresentado muito eficiente, quando o país orienta seu</p><p>desenvolvimento e implanta várias medidas de médio e longo prazo para tornar</p><p>o desenvolvimento viável.</p><p>TABELA 4 – EXPORTAÇÕES DE MERCADORIAS – PARTICIPAÇÃO DOS PAÍSES EMERGENTES</p><p>NO TOTAL MUNDIAL (EM US$ MILHÕES)</p><p>FONTE: Adaptada de OMC (apud GIAMBIAGI et al., 2005, p. 347)</p><p>Ano 1970 1980 1990 2000 2005 2006 2007</p><p>Mundo 317.000 2.034.000 3.449.000 6.454.000 10.482.000 12.108.000 13.898.000</p><p>Brasil 2.739 20.132 31.414 55.118 118.529 137.807 160.649</p><p>Rússia 105.565 243.798 303.926 355.177</p><p>Índia 2.026 8.586 17.969 42.379 99.620 120.861 145.228</p><p>México 1.402 19.031 40.711 166.367 213.891 250.441 272.044</p><p>China 2.307 18.099 62.091 249.203 761.953 968.936 1.217.939</p><p>Cingapura 1.554 19.376 52.730 137.804 229.649 271.807 299.271</p><p>Coreia do</p><p>Sul 836 17.512 65.016 172.267 284.419 325.465 371.554</p><p>Taiwan 1.428 19.842 67.245 151.357 198.776 223.660 246.377</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>144</p><p>Giambiagi et al. (2005) ainda advertem que a experiência brasileira</p><p>de desenvolvimento, a partir do Consenso de Washington, foi extremamente</p><p>maléfica para o crescimento. Seguir rigorosamente as medidas do Consenso de</p><p>Washington refletiu no baixo desempenho e participação na economia mundial.</p><p>Quando se compara a experiência brasileira com a asiática, é necessário</p><p>reconhecer que, enquanto os países asiáticos dirigiram seus esforços</p><p>para o crescimento, a aceitação quase incondicional, pelo Brasil, das</p><p>orientações do Consenso de Washington, voltadas principalmente</p><p>para a estabilidade monetária, não apenas impediu o crescimento</p><p>econômico, mas também levou a uma estagnação relativa de sua</p><p>estrutura produtiva, tornando o país cada vez mais independente da</p><p>exportação de commodities e de produtos de menor valo agregado</p><p>(GIAMBIAGI et al., 2005, p. 348).</p><p>A tabela que segue apresenta a participação das exportações de países</p><p>emergentes no comércio mundial. Comparativamente, podemos notar que, embora</p><p>o Brasil tenha aumentado sua participação no comércio mundial a partir de 2005, e</p><p>comparando com os anos 2000, países como Rússia, México, Cingapura, Coréia do</p><p>Sul, Taiwan e China, que em 1980 possuíam participação igual ou inferior ao Brasil</p><p>no comércio mundial, ampliaram sua participação no comércio total, superando</p><p>o Brasil. A gigante China, que tinha 0,9% em 1980, passou a responder por 8,8%</p><p>das exportações no mundo. A Coreia do Sul também destaca-se: em 1980 suas</p><p>exportações correspondiam a 0,9% do total mundial e em 2007 passaram a 2,7% do</p><p>total mundial. Enquanto que o Brasil em 1980 tinha 0,9% do total das exportações, em</p><p>2007 tinha apenas 1,2% das exportações do total mundial. Denota-se a necessidade</p><p>de repensar a inserção mundial do país e suas políticas de desenvolvimento.</p><p>TABELA 5 – EXPORTAÇÃO DE MERCADORIAS – PARTICIPAÇÃO DOS</p><p>PAÍSES EMERGENTES NO TOTAL MUNDIAL (EM %)</p><p>FONTE: Adaptada de OMC (apud GIAMBIAGI et al., 2005, p. 348)</p><p>Ano 1970 1980 1990 2000 2005 2006 2007</p><p>Mundo 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0</p><p>Brasil 0,9 1,0 0,9 0,9 1,1 1,1 1,2</p><p>Rússia 0,0 0,0 0,0 1,6 2,3 2,5 2,5</p><p>Índia 0,6 0,4 0,5 0,7 1,0 1,0 1,0</p><p>México 0,4 0,9 1,2 2,6 2,0 2,1 2,0</p><p>China 0,7 0,9 1,8 3,9 7,3 8,0 8,8</p><p>Cingapura 0,5 1,0 1,5 2,1 2,2 2,2 2,2</p><p>Coreia do</p><p>Sul 0,3 0,9 1,9 2,7 2,7 2,7 2,7</p><p>Taiwan 0,5 1,0 1,9 2,3 1,9 1,8 1,8</p><p>TÓPICO 1 | O GOVERNO LULA: MANUTENÇÃO DA</p><p>145</p><p>O dólar barato foi utilizado no controle da inflação, ressurgindo a âncora</p><p>cambial, pois se utiliza o dólar barato para pressionar os preços internos para</p><p>redução por meio da ameaça de aumento das importações. A valorização do</p><p>real não impactou nas importações inteiramente, porque o governo aumentou a</p><p>diversificação comercial, e os países que se tornaram novos parceiros comerciais</p><p>também tiveram moedas que se valorizaram neste período em relação ao dólar. A</p><p>economia mundial apresentou crescimento neste período de aproximadamente</p><p>5 % ao ano entre 2003 a 2006, estimulando as exportações. Outro mecanismo</p><p>utilizado pelos exportadores era tomar recursos emprestados no exterior como</p><p>a forma de adiantamento de contratos de crédito (ACC) com a finalidade</p><p>de financiamento da produção para a exportação. Ainda, eram necessários</p><p>investimentos no mercado financeiro interno, que possuem juros muito mais</p><p>elevados que no exterior (SOUZA, 2008). Ou seja, emprestar dinheiro barato e</p><p>ganhar com os juros internos altos.</p><p>Durante o ano de 2005, entraram no país, sob a forma especulativa, US$</p><p>59,38. Como se trata de um capital sem paradeiro certo e, além disso, de</p><p>alta rotatividade, ele vai e volta: evadiram-se no mesmo período US$52,72</p><p>bilhões. O intenso movimento de entrada e saída de capitais tende a</p><p>provocar forte volatilidade na taxa de câmbio. Mas como o ingresso é</p><p>maior do que as saídas — no caso, em um montante de US$ 6,66 bilhões</p><p>—, o resultado é o barateamento do dólar (SOUZA, 2008, p. 304).</p><p>A taxa de juros elevada, como já apresentada anteriormente, e os capitais</p><p>especulativos que entraram no país, provocaram a queda da taxa de câmbio</p><p>desvalorizando o dólar, como podemos averiguar no gráfico a seguir, que</p><p>apresenta a taxa de câmbio do dólar e sua cotação em reais do período de 1 de</p><p>setembro de 2004 até a cotação do dia 1 de fevereiro de 2005.</p><p>GRÁFICO 4 – TAXA DE CÂMBIO R$/US$ - SET. 2004 A FEV. 2005</p><p>FONTE: Adaptado de BACEN (apud SOUZA, 2008, p. 305)</p><p>Para contribuir com a valorização do real em relação ao dólar, observou-se</p><p>de 2003 a 2006 o aumento da entrada de Investimento Externo Direto (IED). Já os</p><p>investimentos externos brasileiros no exterior foram irregulares. De 2003 para 2004 o</p><p>investimento no exterior passou de</p><p>US$ 1.986,40 milhões para US$ 11.093,70. Contudo,</p><p>caiu fortemente em 2005, e volta a apresentar um desempenho forte em 2006 com</p><p>US$ 29.331,10 milhões. O acúmulo de reservas internacionais quase que dobrou no</p><p>período de 2003 a 2006, explicado pela entrada de capitais, mas fundamentalmente</p><p>pelas exportações e melhoria dos termos de troca. A dívida externa, embora apresente</p><p>redução, ainda continua sendo um ponto de tensão na economia brasileira.</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>146</p><p>TABELA 6 – EVOLUÇÃO DO INVESTIMENTO ESTRANGEIRO DIRETO, DO INVESTIMENTO</p><p>BRASILEIRO NO EXTERIOR E DA DÍVIDA EXTERNA TOTAL POR DEVEDOR E RESERVAS</p><p>INTERNACIONAIS – ANOS SELECIONADOS – BRASIL (US$ MILHÕES)</p><p>Ano IED Investimento brasileiro no</p><p>exterior</p><p>Reserva internacionais -</p><p>liquidez</p><p>Dívida externa</p><p>total</p><p>2003 19.237,90 1.986,40 49.296,20 235.414,10</p><p>2004 25.800,60 11.093,70 52.934,80 220.182,30</p><p>2005 30.061,90 4.031,50 53.799,30 187.987,40</p><p>2006 32.399,50 29.331,10 85.838,90 199.372,20</p><p>FONTE: BACEN (apud IPEA, 2017, p. 12)</p><p>A tabela que segue destaca alguns indicadores macroeconômicos para</p><p>termos um panorama da política macroeconômica do primeiro mandato do</p><p>presidente Lula. Observem que a taxa de crescimento do PIB saiu do ínfimo</p><p>1,2% em 2003 para 5,7% em 2004. Essa taxa não se manteve, em 2005 a taxa de</p><p>crescimento foi de apenas 3,2% e em 2006 tendo uma leva alta de 4%. Entretanto,</p><p>o poder aquisitivo da população aumentou, pois, analisando o crescimento real</p><p>do salário mínimo (diminuindo a inflação vigente). Em 2003 cresceu 4%, em 2004</p><p>cresceu 3,3%, mas começa a apresentar aumento mais expressivo a partir de 2005.</p><p>Notem que a inflação era de 9,3% até Lula iniciar seu mandato e, em 2006,</p><p>a taxa de inflação foi para 3,1%. A taxa de juros real também se manteve muito</p><p>elevada, somente em 2004 que se destaca uma redução para 7,5%. Contudo,</p><p>nos anos seguintes, a política macroeconômica ortodoxa da equipe econômica</p><p>prevaleceu mantendo taxas de juros altas para conter a inflação e tentar atrair os</p><p>rentistas para a compra dos títulos públicos brasileiros.</p><p>TABELA 7 – INDICADORES MACROECONÔMICOS</p><p>FONTE: Adaptado de BACEN (apud SALAMA, 2010, p. 168)</p><p>Em % 2003 2004 2005 2006</p><p>Taxa de crescimento do PIB 1,2 5,7 3,2 4,0</p><p>FBCF/PIB 15,3 16,1 15,9 16,4</p><p>Taxa do crescimento do salário mínimo em</p><p>termos de reais 4,0 3,3 7,6 12,1</p><p>Taxa de inflação, IPCA (bens de consumo) 9,3 7,6 5,7 3,1</p><p>Taxa de juro real 11,9 7,5 11,9 11,0</p><p>Saldo do balanço das contas correntes em % do</p><p>PIB 0,8 1,8 1,8 1,5</p><p>TÓPICO 1 | O GOVERNO LULA: MANUTENÇÃO DA</p><p>147</p><p>Quando Guido Mantega assume o BNDES, começa a pressionar a equipe</p><p>econômica para reduzir a TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo). Em 2006, Mantega</p><p>assume o Ministério da Fazenda e, contrariamente ao Conselho Monetário e à</p><p>equipe econômica anterior, ele pressiona a reduzir os juros, com fixação em 6,85%</p><p>em setembro de 2006 (SOUZA, 2008).</p><p>Ainda analisando a tabela, podemos observar que a formação bruta</p><p>de capital fixo se manteve quase estável diante da taxa de crescimento. Isso</p><p>foi também em decorrência da taxa de juros alta, e ainda da desconfiança do</p><p>crescimento da demanda. De acordo com Souza (2008), o BNDES foi o principal</p><p>mecanismo de apoio às instituições privadas, estas que precisavam financiar seu</p><p>investimento de longo prazo. Em 2003, os empréstimos do BNDES foram de R$</p><p>35 bilhões, em 2004 foram de R$ 40 bilhões, em 2005 evoluíram para R$ 47 bilhões</p><p>e, em 2006, chegaram a R$ 51,3 bilhões.</p><p>O saldo do balanço da conta corrente começa a melhorar a partir de</p><p>2004 com a elevação de entrada de capitais no país. Como vimos, em 2003</p><p>havia a desconfiança na gestão de um governo de esquerda, e isso afastou os</p><p>investimentos estrangeiros do país. A partir do 2004, com os sinais claros da</p><p>equipe econômica de Lula, com uma continuidade na austeridade nas medidas</p><p>econômicas e um governo mais moderado e fazendo “as pazes” com o mercado, o</p><p>capital estrangeiro começa a retornar. Outro fator era a crise financeira na Europa</p><p>e o aumento do preço das commodities.</p><p>4 PROGRAMAS SOCIAIS E O IMPACTO NA MACROECONOMIA</p><p>NO GOVERNO LULA</p><p>Como vimos até o momento, a política macroeconômica manteve-</p><p>se guiada pela ortodoxia, impingindo um custo social ao país. A estagnação</p><p>econômica imposta no Plano Real e ainda no governo Lula, pelas medidas de</p><p>controle da inflação por meio de juros altos e cortes fiscais, foi a principal causa do</p><p>sacrifício que foi imposto, principalmente, à população mais carente que depende</p><p>de políticas públicas e ao empresário que necessita de crédito.</p><p>Lula criou o Ministério Extraordinário de Segurança Alimentar e Combate</p><p>à Fome (MESA), que teria a função de formular e coordenar a Política Nacional</p><p>de Segurança Alimentar e Nutricional. Entretanto, em 23 de janeiro de 2004, esse</p><p>ministério foi eliminado e Lula criou o Ministério do Desenvolvimento Social e</p><p>Combate à Fome (MDS) (ZIMMERMANN, 2006).</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>148</p><p>Com essa medida, era preciso incrementar a intersetorialidade das ações</p><p>governamentais voltadas para a inclusão social, o combate à fome, a</p><p>erradicação da pobreza e de desigualdades sociais. Ao novo Ministério</p><p>foram transferidas as competências do Ministério Extraordinário de</p><p>Segurança Alimentar e Combate à Fome, do Ministério da Assistência</p><p>Social e da Secretaria-Executiva do Programa Bolsa Família. Uma das</p><p>principais atribuições do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate</p><p>à Fome é a coordenação das políticas nacionais de desenvolvimento social,</p><p>de segurança alimentar e nutricional, de assistência social e de renda</p><p>da cidadania. Além do mais, cabe ao Ministério do Desenvolvimento</p><p>Social e Combate à Fome articular ações entre os governos estaduais,</p><p>municipais e do Distrito Federal, assim como estreitar o relacionamento</p><p>com a sociedade civil no estabelecimento das diretrizes dessas políticas</p><p>(ZIMMERMANN, 2006, p. 150).</p><p>O divisor entre os governos anteriores e o governo Lula foi aumentar a</p><p>verba destinada aos programas sociais, e utilizá-los como política econômica para</p><p>aceleração da economia. Como foi visto, no Governo Lula ocorreu um incremento</p><p>no salário mínimo real. Entretanto, milhares de pessoas estavam no Brasil em</p><p>situação declarada de extrema pobreza, mais precisamente 54 milhões de pessoas.</p><p>Visando redistribuir renda, e contemplar especialmente essa população que</p><p>se encontrava em estado de miséria, foi criado o Programa Fome Zero, que, além</p><p>de transferir renda, procurava criar mecanismos para essas famílias superarem a</p><p>extrema pobreza que se encontravam. Ao contemplar 11,1 milhões de famílias em</p><p>2006, o governo alcançou a meta estimada das pessoas que se encontravam abaixo</p><p>da linha da pobreza (SOUZA, 2008). Observe, a seguir, que o programa começou</p><p>contemplando 3,7 milhões de famílias e, mais tarde, 11,1 milhões em 2006.</p><p>TABELA 8 – FAMÍLIAS ATENDIDAS PELO PROGRAMA FOME ZERO</p><p>FONTE: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (apud SOUZA, 2008, p. 322)</p><p>Ano Famílias (milhões) valor (R$ bilhões)</p><p>2003 3,7 3,4</p><p>2004 6,5 5,3</p><p>2005 8,7 7,5</p><p>2006 11,1 8,3</p><p>DICAS</p><p>Para saber mais sobre os programas integrados, que abrigavam a proteção</p><p>social no Brasil, sugere-se a leitura do texto: Arruda, Denise Ratmann Colin; Pereira, Juliana</p><p>Maria Fernandes; Gonelli, Valéria Maria de Massarani. Trajetória de construção da gestão</p><p>integrada do Sistema Único de Assistência Social, do cadastro único e do Programa Bolsa</p><p>Família para a consolidação do modelo brasileiro de proteção social. In: CAMPELLO,</p><p>Tereza; NERI, Marcelo Côrtes. Programa bolsa família: uma década de inclusão e cidadania</p><p>– sumário executivo. Brasília: IPEA, 2014.</p><p>TÓPICO 1 | O GOVERNO LULA: MANUTENÇÃO DA</p><p>149</p><p>Se você quer entender melhor como funciona o Bolsa Família e seus resultados para</p><p>a economia brasileira e no campo social, sugere-se ler Programa Bolsa Família: uma década</p><p>de inclusão e cidadania - Sumário Executivo, que reúne vários artigos e foi organizado por</p><p>Tereza</p><p>Campello, Ex-Ministra de Estado do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS)</p><p>e Marcelo Côrtes Neri, que foi Ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência</p><p>da República (SAE/PR) e Presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).</p><p>O ano de 2004 constituiu um marco na trajetória de construção do</p><p>novo modelo de proteção social brasileiro, com a criação do Ministério</p><p>do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), a implantação</p><p>do PBF e a aprovação, pelo Conselho Nacional de Assistência Social</p><p>(CNAS), da Política Nacional de Assistência Social (PNAS). A PNAS</p><p>instituiu o Centro de Referência de Assistência Social (Cras), o Centro de</p><p>Referência Especializado de Assistência Social (Creas) e o Programa de</p><p>Atenção Integral à Família (PAIF). Em 2005, com a Norma Operacional</p><p>Básica do Sistema Único de Assistência Social (NOB/Suas), foi</p><p>regulamentado o Suas e deu-se início a uma nova sistemática de gestão</p><p>e de financiamento público, com repasses continuados e transferências</p><p>regulares e automáticas operacionalizadas diretamente do Fundo</p><p>Nacional de Assistência Social (FNAS) aos fundos de assistência social</p><p>dos municípios, Distrito Federal e estados.</p><p>Foram, então, lançadas as bases estruturantes para a implementação,</p><p>no Brasil, de um sistema público, democrático e participativo, com</p><p>descentralização político-administrativa, primazia da responsabilidade</p><p>do Estado e parceria com a sociedade civil, por intermédio da</p><p>participação nos conselhos e das ofertas pelas entidades de assistência</p><p>social (ARRUDA; PEREIRA; GONELLI, 2014, p. 17).</p><p>O Programa Bolsa família é um dos principais programas criados de</p><p>proteção social. Além de garantir renda, apresentou melhoria na frequência das</p><p>crianças na escola. As críticas que se faziam de que aumentaria o número de filhos</p><p>daquelas famílias que recebessem o auxílio ou que diminuiria o número de pessoas</p><p>disponíveis para a busca de trabalho foram quebradas a partir das evidências</p><p>apresentadas nos estudos sobre os resultados do Programa (CAMPELLO; NERI,</p><p>2014). Já em 2003 a pobreza caiu de 28,2% para 22,7%, o menor índice desde que</p><p>a pesquisa começou a ser aplicada desde 1992 (SOUZA, 2008).</p><p>Programas de renda mínima destinados ao combate da pobreza já existiam</p><p>desde 1970. Somente a partir da Constituição Federal de 1988 que houve a criação</p><p>da LOAS (Lei Orgânica da Assistência Social). Esse programa em 1993 ganhou</p><p>importância, sendo que seus beneficiários passaram a receber um salário mínimo. No</p><p>governo FHC, alguns programas de renda mínima foram criados e estavam incluídos</p><p>em vários ministérios. Na realidade, os programas criados com a característica</p><p>de atrelarem a disponibilidade do benefício com a condicionalidade da criança</p><p>frequentar a escola estavam pautados nos programas que foram apresentados na</p><p>campanha do Partido dos Trabalhadores em 1989. No governo FHC, foi implantado</p><p>o Programa Bolsa Escola. Em 1997 foi aprovada lei que estabeleceria programas de</p><p>renda mínima, sendo tais programas compartilhados da responsabilidade entre</p><p>municípios e governo federal. Contudo, a elaboração e execução não foi sucedida,</p><p>poucos municípios se interessaram nas parcerias (ROCHA, 2011).</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>150</p><p>Apesar do Bolsa Escola ser o mais famoso implantado na década de</p><p>noventa, outros programas foram implantados, como o PETI (Programa de</p><p>Erradicação de Trabalho Infantil), em 1996. Em 2001, foi instituído o Auxílio Gás</p><p>e Bolsa Alimentação para contemplar crianças de até seis anos, complementando</p><p>o Bolsa Escola. Em 2001, criou-se o Cadastro Único, mas não foi atingida a meta</p><p>de integrar os programas (ROCHA, 2011).</p><p>Entretanto, a inovação no governo Lula foi a organização de vários</p><p>programas sociais que estavam distribuídos em vários órgãos governamentais,</p><p>agora abrigando os dados dos usuários no mesmo Cadastro Único. Houve a</p><p>integração dos dados de várias famílias e, dessa forma, orientação dentro de</p><p>várias políticas para melhorar sua situação social.</p><p>A tabela a seguir apresenta os vários programas abrigados no Cadastro</p><p>Único. Observem que foi implantado o Bolsa Família, que ampliava e expandia</p><p>o benefício para mais pessoas, porque a exigência estava na renda familiar. Além</p><p>disso, as famílias se qualificavam para receber o Cartão Alimentação, que tinha</p><p>como auxílio financeiro R$50,00 ao mês para todas as famílias com renda per</p><p>capita familiar inferior a um quarto do salário mínimo. A população apta a entrar</p><p>para esse programa quase dobrou. Em outubro de 2004, o programa foi relançado</p><p>já remodelado com o nome Bolsa Família. O programa passou a conceder o</p><p>benefício de R$ 15,00 a R$ 95,00, dependendo de outros critérios como a renda</p><p>familiar e o número de crianças (ROCHA, 2011).</p><p>TABELA 9 – BENEFÍCIOS E DISPÊNDIOS DOS PROGRAMAS FEDERAIS DE</p><p>TRANSFERÊNCIA DE RENDA – SETEMBRO DE 2004</p><p>FONTE: MDS (apud ROCHA, 2011, p. 119)</p><p>Programas Nº de Benefícios Pagos Dispêndio (R$ mil)</p><p>Novos "Programas" 10.295.493 465.986</p><p>Bolsa Escola 3.381.486 78.778</p><p>Bolsa Família 5.035.660 346.687</p><p>Cartão Alimentação 322.317 16.116</p><p>Bolsa Alimentação 251.459 4.836</p><p>Auxílio Gás 1.304.571 19.569</p><p>Benefícios Assistenciais 2.565.857 674.733</p><p>LOAS 1.983.788 518.538</p><p>RMV e PMV 582.069 156.194</p><p>Total Geral 12.861.350 1.140.719</p><p>TÓPICO 1 | O GOVERNO LULA: MANUTENÇÃO DA</p><p>151</p><p>Os denominados Benefícios de Prestação Continuada (BPC) são benefícios</p><p>da assistência social, integrantes do Sistema Único de Assistência Social (SUAS)</p><p>e que estão garantidos pela Constituição Federal de 1988. Estes compreendem</p><p>a acessibilidade de idosos e pessoas com deficiência incapacitante para a vida</p><p>independente e para o trabalho e oferecem condições mínimas para uma vida</p><p>digna (ANSILIERO, 2005).</p><p>Por fim, deve-se ressaltar que, dada sua natureza assistencial, o BPC</p><p>não dá direito à gratificação natalina (décimo terceiro) e tampouco é</p><p>transferido em caso de morte do beneficiário, ou seja, não pode dar</p><p>origem para a pensão por morte. Apenas os valores não retirados em</p><p>vida pelo beneficiário podem ser repassados para outras pessoas da</p><p>família. As Rendas Mensais Vitalícias (RMV), ao contrário, dão direito</p><p>à gratificação natalina e podem dar origem às chamadas Pensões</p><p>Mensais Vitalícias (PMV). No entanto, tais benefícios (RMV e PMV)</p><p>foram extintos e substituídos pelo BPC, permanecendo em estoque</p><p>apenas em função dos antigos beneficiários e de seus dependentes. A</p><p>RMV, cujo pagamento era amparado pela Lei nº 6.179/74, tinha como</p><p>finalidade assegurar às pessoas inválidas ou idosas com mais de 70 anos</p><p>um benefício mensal, como aqueles definitivamente incapacitados para</p><p>o trabalho, que não exercessem atividade remunerada, que tampouco</p><p>percebessem rendimento de outra fonte que fosse superior ao valor do</p><p>benefício assistencial e que comprovassem não possuir meios de prover</p><p>a própria manutenção e nem pela família (ANSILIERO, 2005, p. 1).</p><p>Outras medidas foram utilizadas de acesso ao crédito para os trabalhadores</p><p>e aposentados. A expansão do crédito para o público foi enorme: “o total dos</p><p>empréstimos que os aposentados e pensionistas do INSS tomaram junto à rede</p><p>bancária, em consignação na folha, passou de R$ 612 milhões em setembro de</p><p>2003 para R$ 8,8 bilhões em agosto de 2005” (SOUZA, 2008, p. 323).</p><p>Além disso, outras medidas foram usadas na tentativa de dinamizar o</p><p>mercado interno, como as apresentadas na figura que segue, devolvendo uma parte</p><p>da elevação da carga tributária. Essas medidas de redução e extinção do PIS/Cofins</p><p>sobre produtos da cesta básica e sobre vários insumos têm o objetivo de estimular</p><p>a queda de preços desses produtos essenciais e estimular o consumo das massas.</p><p>Grande parte da população brasileira recebe entre um a dois salários mínimos, ou</p><p>seja, basicamente o salário é destinado ao consumo de alimentos. Medidas como o</p><p>estímulo ao microcrédito também possibilitam estimular a população com renda</p><p>mais baixa a ter crédito, portanto, há estímulo do consumo. Ao estimular</p><p>o acesso</p><p>de financiamento imobiliário, com taxas de juros mais baratas, também o governo</p><p>buscava estimular o segmento da construção civil. O setor tem um potencial</p><p>intenso para estimular a aceleração econômica, pois envolve muitos insumos e gera</p><p>ocupação para diferentes níveis de estudo e capacitação.</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>152</p><p>A extinção da alíquota do PIS/Cofins sobre produtos da cesta básica e sobre vários</p><p>insumos para a produção de alimentos.</p><p>Medidas específicas destinadas a estimular o microcrédito produtivo.</p><p>Ampliação de recursos para o financiamento imbiliário.</p><p>O fim da acumulatividade do PIS/Cofins e da CSLL.</p><p>FIGURA 2 – PRINCIPAIS MEDIDAS PARA DINAMIZAR O MERCADO INTERNO</p><p>FONTE: Adaptada de Souza (2008, p. 323)</p><p>A partir da entrada de Guido Mantega em 2006, o governo passou a dar</p><p>alguns sinais de mudança na condução da política macroeconômica, buscando</p><p>maior crescimento. A taxa de desemprego seguia elevada, e as pessoas em situação</p><p>de pobreza representavam um grande percentual da população. O crescimento</p><p>do PIB ainda não estava produzindo número de novas vagas para contemplar a</p><p>demanda por trabalho. De acordo com o Relatório Anual do Banco Central do</p><p>Brasil (BACEN, 2006), a taxa média do desemprego em 2006 era de 10%. Embora</p><p>a oferta de trabalho continuasse a melhorar, ainda não era o bastante para atender</p><p>às necessidades econômicas da época.</p><p>Com as eleições se aproximando, o governo precisava sinalizar ao povo a</p><p>continuidade e evolução da política macroeconômica, aumentando a perspectiva</p><p>de dinamizar a economia brasileira. Veremos, no próximo tópico, como foi o</p><p>segundo mandato de Lula.</p><p>153</p><p>RESUMO DO TÓPICO 1</p><p>Neste tópico, você aprendeu que:</p><p>• Nas eleições de 2002 para presidente, o mercado financeiro olhava com</p><p>desconfiaça para um possível presidente de esquerda. Luis Inácio Lula da Silva</p><p>foi eleito, mas mudou seu discurso, sendo mais moderado. Para tranquilizar os</p><p>agentes econômicos, Lula nomeou uma equipe econômica de linha ortodoxa</p><p>para seguir com medidas econômicas de controle monetário e estabilidade dos</p><p>fatores macroeconômicos.</p><p>• O governo Lula optou pelo continuismo de política econômica e, portanto, se</p><p>explica o baixo desempenho econômico nos primeiros anos, além do aumento</p><p>do desemprego.</p><p>• A balança comercial apresentou superávits comerciais, contribuindo para</p><p>a facilitação do acúmulo de reservas internacionais e pagamento das</p><p>obrigações da dívida externa. O superávit primário mantido possibilitou o</p><p>pagamento dos rentistas.</p><p>• Os superávits da balança comercial em parte podem ser explicados pela</p><p>valorização das commodities e do aumento do consumo dos países emergentes</p><p>como Índia e China.</p><p>• A diplomacia brasileira apresentou mudanças na sua condução, tratando de</p><p>sair do alinhamento automático com os Estados Unidos e expandir o comércio</p><p>com outros países, como os do mundo árabe, da África e países emergentes.</p><p>Assim, tratou de consolidar o Mercosul e pactos com outros blocos.</p><p>• Os programas sociais foram o grande legado do governo Lula neste período,</p><p>pois a meta de atingir 54 milhões de pessoas na linha da pobreza foi atingida</p><p>em 2008 quando o bolsa família, principal programa do Programa Fome Zero,</p><p>atingiu 11 milhões de famílias.</p><p>154</p><p>1 Por que o mercado financeiro olhava com desconfiança para o presidente</p><p>Lula em 2003 ao assumir o mandato?</p><p>2 Quais foram as estratégias da campanha de Lula para que pudessem</p><p>amenizar sua imagem?</p><p>3 Que fatores contribuíram para expandir as exportações brasileiras?</p><p>4 Qual a importância do Programa Fome Zero?</p><p>5 O que contribuiu para o aumento de reservas internacionais pelo governo</p><p>brasileiro?</p><p>6 Qual foi a principal mudança proposta pelo governo brasileiro em se</p><p>tratando da diplomacia brasileira?</p><p>7 Qual foi o principal instrumento utilizado para conter a inflação no período</p><p>de 2003 a 2006?</p><p>AUTOATIVIDADE</p><p>155</p><p>TÓPICO 2</p><p>REELEIÇÃO DO GOVERNO LULA E A</p><p>CRISE FINANCEIRA INTERNACIONAL</p><p>UNIDADE 3</p><p>1 INTRODUÇÃO</p><p>É óbvio que os eleitores de Lula mais de esquerda esperavam um governo</p><p>contra o neoliberalismo e medidas de fortalecimento do Estado, enquanto que os</p><p>eleitores que não se enquadravam na categoria concederam um voto de confiança,</p><p>mediante o posicionamento mais moderado. O fato é que, entre as contradições</p><p>ideológicas e disputas de grupos econômicos, o primeiro mandato de Lula lhe</p><p>garantiu a reeleição em 2006.</p><p>Com 61% dos votos válidos, Lula foi reeleito no segundo turno em</p><p>outubro de 2006 contra Geraldo Alckmin, do PSDB, que não poupava críticas</p><p>sobre o baixo crescimento durante a gestão de Lula. Este, por sua vez, atacou com</p><p>a acusação de que na gestão do PSDB 76% do patrimônio nacional havia sido</p><p>privatizado (SOUZA, 2008).</p><p>Neste tópico, vamos apresentar como foi o segundo mandato do presidente</p><p>Lula e como se apresentaram os indicadores macroeconômicos brasileiros. O país</p><p>estava na expectativa de aumentar a taxa de crescimento econômico, melhorando</p><p>o desempenho dos setores econômicos. A desigualdade social, após muitos</p><p>anos de austeridade, também havia chegado a um estado crítico, sendo que a</p><p>ampliação do Programa Fome Zero se tornou um sucesso no primeiro mandato</p><p>de Lula. Eram precisos o combate à fome, a integração de vários programas sociais</p><p>no Cadastro Único e melhora do procedimento, implementação e execução das</p><p>políticas públicas. Dar condições para que os cidadãos se desenvolvessem em</p><p>vários aspectos era um grande desafio.</p><p>Além de tudo, veremos que, em termos internacionais, os Estados Unidos</p><p>passariam pela bolha imobiliária e a Europa enfrentaria uma crise financeira.</p><p>Por serem grandes potências econômicas mundiais, obviamente não podemos</p><p>ignorar os seus efeitos nas demais economias. Podemos acompanhar, a seguir, as</p><p>principais medidas para estimular o mercado doméstico interno.</p><p>Discutiremos o pagamento da dívida externa brasileira, o crescimento da</p><p>dívida pública bruta e a tentativa de ruptura com as velhas práticas da ortodoxia</p><p>na pasta econômica.</p><p>Boa leitura!</p><p>156</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>2 REELEIÇÃO DE LULA E O QUE MUDOU?</p><p>O segundo mandato de Lula começava com a expectativa da população</p><p>por uma economia que apresentasse taxas de crescimento altas, já que a taxa de</p><p>inflação se apresentava baixa. O poder aquisitivo da população havia aumentado</p><p>e no mundo os países emergentes apresentavam alto desempenho com taxas de</p><p>crescimento elevadas e aumento do consumo de sua população. Isso contribuía</p><p>com as exportações brasileiras, que passaram a apresentar elevados superávits.</p><p>Logo de sua posse, Lula lançou, em 22 de janeiro de 2007, o Programa</p><p>de Aceleração do Crescimento (2007 a 2010) – PAC. A Ministra-chefe da Casa</p><p>Civil, Dilma Rousseff, representava o segmento do governo desenvolvimentista,</p><p>e o PAC era um primeiro passo para além do monetarismo como plano de</p><p>desenvolvimento. O PAC fora sustentado em um diagnóstico que entendia que</p><p>existiam gargalos que estavam travando o crescimento da economia, como áreas</p><p>de infraestrutura como transporte e energia, e na área social, como habitação e</p><p>saneamento básico. Para destravar a economia seriam necessários investimentos</p><p>nessas áreas. Os três principais objetivos do PAC se centravam: (a) na aceleração</p><p>do crescimento econômico; (b) na elevação de oportunidades de emprego; e (c)</p><p>nas melhorias das condições socioeconômicas da população (SOUZA, 2008).</p><p>Jardim e Silva (2015) afirmam que o presidente Lula alterou a política</p><p>econômica, nos seus oito anos de mandato, da ortodoxia para a heterodoxia:</p><p>A forma como o governo Lula pensou o Brasil nos seus oito anos de</p><p>governo passou pela alteração de uma política econômica ortodoxa para</p><p>uma heterodoxa, buscando responder aos principais instrumentos de</p><p>pressão da ortodoxia econômica. Mais do que iniciativas econômicas,</p><p>o Estado teve iniciativa cultural, na criação de uma visão de mundo</p><p>que buscava otimizar ganhos da política ortodoxa e em diálogo com</p><p>os princípios heterodoxos</p><p>(programas de inclusão social, bancarização</p><p>dos pobres etc.) (JARDIM; SILVA, 2015, p. 39).</p><p>De 2007 a 2010 foram investidos pelo PAC R$ 503,9 bilhões em infraestrutura,</p><p>sendo a previsão total de R$ 619 bilhões. R$ 219,20 bilhões foram investimentos</p><p>realizados pelas estatais como a PETROBRÁS (empresa de economia mista), que</p><p>investiu R$ 148,7 bilhões. Outros R$ 67,80 bilhões de investimentos provinham</p><p>de recursos do orçamento fiscal da União e da seguridade. Ainda, a iniciativa</p><p>privada (empresas, fundos de pensão e fundos do mercado financeiro) investiu</p><p>R$ 216,9 bilhões (JARDIM; SILVA, 2015). Tais investimentos foram distribuídos</p><p>de acordo com a tabela apresentada a seguir:</p><p>TÓPICO 2 | REELEIÇÃO DO GOVERNO LULA E A CRISE FINANCEIRA INTERNACIONAL</p><p>157</p><p>TABELA 10 – INVESTIMENTO EM INFRAESTRUTURA (INVESTIMENTO DO PAC: 2007 – 2010)</p><p>FONTE: Souza (2008, p. 328)</p><p>Destino Valores (R$ bilhões)</p><p>Logística (sobretudo) 58,30</p><p>Orçamento da União 33,00</p><p>Estatais federais de demais fontes 25,30</p><p>Energia 274,80</p><p>Orçamento da União</p><p>Estatais federais de demais fontes 274,80</p><p>Infraestrutura social 170,80</p><p>Orçamento da União 34,80</p><p>Estatais federais de demais fontes 136,00</p><p>Total do PAC 503,90</p><p>Orçamento da União 67,80</p><p>Estatais federais de demais fontes 436,10</p><p>Como podemos observar, a maior parte dos recursos provinha de fonte</p><p>pública. A Ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, argumentou que 76%</p><p>dos recursos provinham do orçamento da União, por meio de investimentos ou</p><p>desoneração, das empresas estatais, e do BNDES e Caixa Econômica Federal por</p><p>meio de financiamentos. O PAC tinha como meta atingir um crescimento do PIB</p><p>de 5% a.a. no período de 2008 a 2010 (SOUZA, 2018).</p><p>Observem que o PIB de 2007 para 2008 teve crescimento de 5%. Embora</p><p>a crise imobiliária nos Estados Unidos já pudesse estar sendo sentida em várias</p><p>partes do mundo, o PAC contribuiu para o Brasil não ser afetado economicamente</p><p>em 2008. Salama (2010) adverte que o Brasil não teria como ficar imune à crise, e</p><p>em 2009 se nota o impacto da crise, com taxa de crescimento de 0,3%, se refletindo</p><p>em uma pequena retração. Em 2010, o PIB brasileiro ultrapassou dois trilhões de</p><p>dólares, crescendo 7,5%.</p><p>GRÁFICO 5 – EVOLUÇÃO DO PIB NO SEGUNDO MANDATO DO GOVERNO</p><p>LULA – 2007 A 2010 (CÂMBIO MÉDIO)</p><p>FONTE: Adaptado de IPEA (2017)</p><p>158</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>A crise financeira norte-americana foi uma crise bancária, e sua causa foi a</p><p>concessão de empréstimos hipotecários para clientes que não tinham capacidade</p><p>de pagamento a partir do momento que a taxa de juros se elevasse. As instituições</p><p>financeiras securitizaram os títulos podres em títulos AAA, na classificação das</p><p>agências de risco. Ou seja, esses títulos eram os refinanciamentos de dívidas</p><p>cujos endividados não tinham comprovado que teriam como pagar a hipoteca</p><p>(BRESSER-PEREIRA, 2009).</p><p>Outro problema que se coloca novamente em voga é a desregulamentação de</p><p>mercados, além de como os movimentos da globalização financeira, sem nenhuma</p><p>regulamentação, podem levar ao colapso. Medidas de intervenção do Estado voltam</p><p>a trazer as recomendações de Keynes para o centro do planejamento de política</p><p>estatal (FILHO FERRARI; PAULA, 2009). De acordo com Sicsú (2008, p. 145):</p><p>Aviso aos liberais: esta crise é resultado da falta de regulamentação</p><p>sobre as instituições financeiras e da falta de políticas públicas</p><p>habitacionais para os “subcidadãos”. Foi a falta de atuação do</p><p>Estado e não a sua ação ativa que causou a crise.</p><p>IMPORTANTE</p><p>A CRISE SUBPRIME AMERICANA</p><p>Por trás da crise sistêmica atual há dois conjuntos de fatores explicativos. Um, de</p><p>natureza conjuntural, envolve a política monetária americana, que elevou a taxa básica de</p><p>juros de 1,00% para 5,25% a.a. entre o segundo trimestre de 2004 e o segundo de 2007.</p><p>Embora isto não tenha gerado uma forte recessão nos EUA – o crescimento real do PIB</p><p>caiu apenas de 4,2% nos 12 meses anteriores (terceiro trimestre de 2003 ao segundo de</p><p>2004) para a média anual de 3,5% no período de juros crescentes – certamente dificultou o</p><p>refinanciamento de dívidas longas (caso típico do crédito imobiliário). Houve contribuição</p><p>também da demora do governo em reconhecer a gravidade do problema, por falha de</p><p>interpretação ou da supervisão bancária. O fato é que, durante boa parte da crise (2006-07),</p><p>o FED mostrou-se mais preocupado com a inflação (que requer juros mais altos) que com a</p><p>deflação de ativos (que exigia um corte rápido nos juros).</p><p>Contudo, a política monetária foi mais um elemento propagador que, propriamente,</p><p>causador da crise, já que no crédito subprime (as famílias de renda baixa e sem comprovação</p><p>e garantias), pivô da crise, os contratos já previam aumentos dos juros após alguns anos.</p><p>Assim, outro fator conjuntural que atuou decisivamente na formação da crise foi o excesso</p><p>de “otimismo espontâneo”, que levou a flagrantes erros de avaliação de riscos por parte dos</p><p>bancos credores, dos devedores e dos que compraram derivativos dos créditos.</p><p>É inevitável, porém, reconhecer a presença de um fator estrutural na raiz dos</p><p>eventos recentes: o novo modelo de regulamentação financeira, que já havia mostrado</p><p>seus efeitos devastadores para as economias emergentes no episódio da crise asiática, e</p><p>agora mostra sua cara também aos mercados norte-americano e europeu, que venderam</p><p>para o resto do mundo como panaceia. Até a crise asiática, os defensores do modelo –</p><p>cujo maior entusiasta era o FMI – atribuíam o problema ao que consideravam limitações</p><p>TÓPICO 2 | REELEIÇÃO DO GOVERNO LULA E A CRISE FINANCEIRA INTERNACIONAL</p><p>159</p><p>típicas dos países em desenvolvimento: a fragilidade dos fundamentos macroeconômicos</p><p>e da supervisão bancária. A crise teria sido, então, detonada por um surto de sabedoria. Os</p><p>investidores estrangeiros, percebendo o perigo, desencadearam um “corretivo” movimento</p><p>de fuga de capital, forçando os emergentes a ajustarem suas políticas macroeconômicas.</p><p>Era preciso reduzir o crescimento, acumular reservas internacionais e manter equilíbrio fiscal</p><p>e baixa inflação (HERMANN, 2009, p. 140).</p><p>FONTE: HERMANN, J. Da liberalização à crise financeira norte-americana: a morte anunciada</p><p>chega ao Paraíso. Revista de Economia Política, São Paulo, v. 29, n. 1, p. 138-141, 2009.</p><p>Disponível em: <https://www.econbiz.de/Record/da-liberaliza%C3%A7%C3%A3o-%C3%A0-</p><p>crise-financeira-norte-americana-a-morte-anunciada-chega-ao-para%C3%ADso-hermann-</p><p>jennifer/10003834768>. Acesso em: 23 dez. 2018.</p><p>A crise imobiliária americana parecia estar contida pelas fronteiras,</p><p>somente em 2008 percebe-se fortemente a crise se alastrando após a quebra do</p><p>banco de investimentos Lehman Brothers. Dessa forma, alastrou-se a incerteza</p><p>quanto à qualidade dos ativos bancários e à idoneidade dos balanços apresentados</p><p>no sistema financeiro (PRADO, 2011). “Construiu-se um imenso sistema bancário</p><p>paralelo, com uma alavancagem 30 vezes superior ao patrimônio líquido das</p><p>instituições. O que se vendia como uma sofisticação bancária assegurada contra</p><p>riscos revelou-se uma alavancagem de alto risco” (PRADO, 2011, p. 14).</p><p>Os Estados Unidos têm o privilégio de emitir a moeda forte e de se</p><p>financiarem com o crédito mundial, embora os déficits gêmeos (fiscal e em conta</p><p>corrente) tenham crescido enormemente (PRADO, 2011). A crise da maior economia</p><p>do mundo poderia afetar especialmente os países da América Latina, já que haveria</p><p>queda no consumo norte-americano e fuga de capitais dos países mais vulneráveis.</p><p>Os efeitos sobre a distribuição de renda na América Latina eram o grande temor.</p><p>No Brasil, os impactos da crise foram amenizados com políticas, ditas</p><p>keynesianas, de estímulo para a aceleração da renda. Observem, no gráfico a</p><p>seguir, que em 2009 o PIB per capita apresenta queda de 1,3% e voltando a elevar-</p><p>se nos anos seguintes.</p><p>GRÁFICO 6 – PIB PER CAPITA BRASIL – 1994-2013 (US$ MIL)</p><p>FONTE: Adaptado de IPEA (2017)</p><p>160</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>NOTA</p><p>Elaboração IPEA. Série</p><p>estimada utilizando-se o PIB preços de 2013, a taxa de</p><p>câmbio real (R$) por dólar americano (US$) comercial (venda) - média de 2013, e a população</p><p>residente. Para 2010 a 2013: resultados preliminares estimados a partir das Contas Nacionais</p><p>Trimestrais - Referência 2000. Série interrompida.</p><p>FONTE: IPEA. Produto interno bruto (PIB) per capita: frequência anual de 1899 até 2013.</p><p>Brasília: IPEA, 2017. Disponível em: <http://www.ipeadata.gov.br/ExibeSerie.aspx?serid=38375>.</p><p>Acesso em: 25 dez. 2018.</p><p>IMPORTANTE</p><p>E Keynes ressurge na crise internacional de 2008?</p><p>Essa popularidade recente de Keynes recebeu um empurrão depois da crise de</p><p>2008, que ressuscitou os ensinamentos do economista inglês, que morreu em 1946. Os</p><p>Estados Unidos e a Europa foram forçados à adoção de políticas anticíclicas para evitar</p><p>um colapso econômico, resgatando bancos privados e injetando bilhões de dólares na</p><p>economia. Contudo, foi o Brasil que deflagrou essa guinada no mundo, mais precisamente</p><p>durante o segundo mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que abandonou uma</p><p>política econômica mais conservadora em termos fiscal e monetário e decidiu induzir o</p><p>crescimento turbinando nos investimentos estatais.</p><p>FONTE: ALVES, F. Inflação, juros e crescimento no governo Dilma: a nova matriz econômica</p><p>brasileira no mundo pós-crise. Rio de Janeiro: Alta Books, 2014. Disponível em: <http://</p><p>webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:HjbhowYUtFYJ:www.altabooks.com.</p><p>br/index.php%3Fdispatch%3Dattachments.getfile%26attachment_id%3D2098+&cd=3&hl=pt-</p><p>BR&ct=clnk&gl=br>. Acesso em: 29 abr. 2019.</p><p>De acordo com o Boletim do Banco Central do Brasil (BACEN, 2009), a</p><p>crise começa a ser amenizada em meados de 2009:</p><p>O dinamismo da demanda interna assegurou, inicialmente, o</p><p>desempenho favorável dos segmentos produtores de bens de menor</p><p>valor agregado e, posteriormente, em ambiente de melhora nas</p><p>condições do mercado de crédito e nas expectativas dos agentes</p><p>econômicos, a recuperação dos segmentos associados a bens de</p><p>consumo de maior valor agregado e a bens de capital. Nesse cenário,</p><p>o consumo privado e os investimentos exerceram contribuições</p><p>respectivas de 2,4 p.p. e de -1,9 p.p. para a variação anual do Produto</p><p>Interno Bruto (PIB) em 2009 (BACEN, 2009, p. 15).</p><p>TÓPICO 2 | REELEIÇÃO DO GOVERNO LULA E A CRISE FINANCEIRA INTERNACIONAL</p><p>161</p><p>O dinamismo do consumo interno também foi alavancado pelas políticas</p><p>de renda mínima do governo brasileiro e pela relativa estabilidade do mercado</p><p>de trabalho (BACEN, 2009). O principal programa social implementado era o</p><p>Bolsa Família, o qual também funcionava como indutor do consumo e contribuiu</p><p>adicionalmente com o crescimento econômico. De acordo com os estudos de</p><p>Neri, Vaz e Souza (2014), cada 1% do PIB gasto no Programa Bolsa Família teria</p><p>o efeito multiplicador de 1,78%, ou seja, o programa tinha impacto positivo no</p><p>crescimento. Ainda, as medidas do PAC continuavam sendo implantadas. No</p><p>entanto, a taxa de produção industrial apresentou um recuo de 7,4%, em 2009, de</p><p>acordo com o Boletim do Bacen (BACEN, 2009).</p><p>A partir de 2009 foi intensificada uma engenharia monetária de</p><p>financiamento da estrutura governamental. O Tesouro vendia títulos aos bancos</p><p>comerciais (incluindo BNDES, Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil) e</p><p>fundos de pensão de empresas públicas como Petros, Funcef e Previ etc. Assim, o</p><p>governo é credor dele mesmo (JARDIM; SILVA, 2015).</p><p>FIGURA 3 – POLÍTICA MONETÁRIA VIA TESOURO – FOMENTO AO CAPITAL PRODUTIVO E PAC</p><p>FONTE: Jardim e Silva (2015, p. 41)</p><p>PAC</p><p>TesouroEstatais</p><p>BNDES,</p><p>BB e CEF</p><p>Bancos</p><p>Comerciais</p><p>Fundos</p><p>de pensão</p><p>Superávit</p><p>Primário</p><p>Empréstimo</p><p>EconomiaDividendos</p><p>Compram</p><p>Títulos</p><p>Devolução</p><p>corrigida</p><p>Descontos</p><p>Assim, os fundos de empresas públicas adquiriam títulos públicos e</p><p>funcionavam como financiadores do governo, da mesma forma que bancos e</p><p>empresas estatais utilizavam-se da mesma prática. “Apesar da influência dos</p><p>fundos de pensão, o grande financiador do PAC é o BNDES, que, somente em</p><p>2011, realizou desembolsos de US$ 73 bilhões no Brasil, enquanto no mesmo ano</p><p>o Banco Mundial havia desembolsado US$ 43 bilhões no mundo todo” (JARDIM;</p><p>SILVA, 2015, p. 44). A política de utilização dos fundos pode dar suporte aos</p><p>programas sociais elaborados pelo governo e contornou a situação de uma</p><p>política ortodoxa para uma política heterodoxa, uma faceta do governo Lula</p><p>atendendo às promessas de governo para criar instrumentos sociais de correção</p><p>da desigualdade social.</p><p>162</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>O governo também fez investimentos em políticas habitacionais. O</p><p>Programa Minha Casa Minha Vida também serviu como medida anticíclica</p><p>e produziu efeitos benéficos socialmente e economicamente. O programa</p><p>habitacional impactou sobre todo o mercado de construção civil e gerou 11,3</p><p>milhões de empregos em 2010, correspondendo a 14% do total da população</p><p>ocupada na economia. Entre 2005 a 2010 a criação de empregos no setor de</p><p>construção civil cresceu 5% a.a. (JARDIM; SILVA, 2015).</p><p>O Brasil precisava em 2007 reduzir a taxa de juros, pois os objetivos eram</p><p>expandir e gerar novos empregos. O Copom, que vinha reduzindo a taxa Selic</p><p>lentamente, acabou parando essas reduções quando a taxa caiu a 11,25% e a</p><p>taxa real 7%. Essa decisão não foi amparada pela tendência da inflação como</p><p>costumava fazer. O Copom, nas atas, admitiu que não foram a pressão exterior</p><p>e a crise da economia norte-americana que estavam pressionando as taxas de</p><p>juros brasileiras. O motivo alegado fora um suposto risco do aumento da taxa de</p><p>inflação, assim, a política de juros elevados conteria a demanda futura, para não</p><p>incitar uma possível inflação (SOUZA, 2008).</p><p>Observem a tabela a seguir. A taxa de juros anual apresenta as maiores</p><p>reduções no ano de 2009, e as consequências da crise internacional foram sentidas</p><p>no Brasil. Contudo, com a retomada do ritmo de crescimento, com o país não</p><p>estando mais tão vulnerável aos choques externos, a equipe econômica justificou</p><p>a austeridade monetária e elevações na taxa de juros para conter uma possível</p><p>demanda futura e expectativas de aumento da inflação futura.</p><p>TABELA 11 – HISTÓRICO DA TAXA DE JUROS SELIC DE 30 NOV. 2006 A 19 JAN. 2011(%)</p><p>Reunião do</p><p>Copom Período de</p><p>vigência</p><p>Meta</p><p>SELIC Taxa SELIC</p><p>% a.a. Data % mensal % a.a.</p><p>08/12/2010 09/12/2010 -</p><p>19/01/2011 10,75 1,21 10,66</p><p>20/10/2010 21/10/2010 -</p><p>08/12/2010 10,75 1,34 10,66</p><p>01/09/2010 02/09/2010 -</p><p>20/10/2010 10,75 1,34 10,66</p><p>21/07/2010 22/07/2010 -</p><p>01/09/2010 10,75 1,21 10,66</p><p>09/06/2010 10/06/2010 -</p><p>21/07/2010 10,25 1,16 10,16</p><p>28/04/2010 29/04/2010 -</p><p>09/06/2010 9,50 1,04 9,4</p><p>17/03/2010 18/03/2010 -</p><p>28/04/2010 8,75 0,93 8,65</p><p>TÓPICO 2 | REELEIÇÃO DO GOVERNO LULA E A CRISE FINANCEIRA INTERNACIONAL</p><p>163</p><p>27/01/2010 28/01/2010 -</p><p>17/03/2010 8,75 1,09 8,65</p><p>09/12/2009 10/12/2009 -</p><p>27/01/2010 8,75 1,09 8,65</p><p>21/10/2009 22/10/2009 -</p><p>09/12/2009 8,75 1,09 8,65</p><p>02/09/2009 03/09/2009 -</p><p>21/10/2009 8,75 1,09 8,65</p><p>22/07/2009 23/07/2009 -</p><p>02/09/2009 8,75 0,99 8,65</p><p>10/06/2009 11/06/2009 -</p><p>22/07/2009 9,25 1,01 9,16</p><p>29/04/2009 30/04/2009 -</p><p>10/06/2009 10,25 1,12 10,16</p><p>11/03/2009 12/03/2009 -</p><p>29/04/2009 11,25 1,40 11,16</p><p>21/01/2009 22/01/2009 -</p><p>11/03/2009 12,75 1,57 12,66</p><p>10/12/2008 11/12/2008 -</p><p>21/01/2009 13,75 1,43 13,66</p><p>29/10/2008 30/10/2008 -</p><p>10/12/2008 13,75 1,53 13,65</p><p>10/09/2008 11/09/2008 -</p><p>29/10/2008 13,75 1,79 13,66</p><p>23/07/2008 24/07/2008 -</p><p>10/09/2008 13,00 1,70 12,92</p><p>04/06/2008 05/06/2008 -</p><p>23/07/2008 12,25 1,61 12,17</p><p>16/04/2008 17/04/2008 -</p><p>04/06/2008 11,75 1,41 11,63</p><p>05/03/2008 06/03/2008 -</p><p>16/04/2008 11,25 1,23 11,18</p><p>23/01/2008 24/01/2008 -</p><p>05/03/2008 11,25 1,18 11,18</p><p>05/12/2007 06/12/2007 -</p><p>23/01/2008 11,25 1,40 11,18</p><p>17/10/2007 18/10/2007 -</p><p>05/12/2007 11,25 1,40 11,18</p><p>05/09/2007 06/09/2007 -</p><p>17/10/2007 11,25 1,18 11,18</p><p>164</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>18/07/2007 19/07/2007 -</p><p>05/09/2007 11,50 1,51 11,43</p><p>06/06/2007 07/06/2007 -</p><p>18/07/2007</p><p>12,00 1,31 11,93</p><p>18/04/2007 19/04/2007 -</p><p>06/06/2007 12,50 1,59 12,43</p><p>07/03/2007 08/03/2007 -</p><p>18/04/2007 12,75 1,38 12,68</p><p>24/01/2007 25/01/2007 -</p><p>07/03/2007 13,00 1,36 12,93</p><p>29/11/2006 30/11/2006 -</p><p>24/01/2007 13,25 1,89 13,19</p><p>FONTE: BACEN (2019, s.p.)</p><p>Como já havíamos apresentado, o Brasil começou a se beneficiar da melhoria</p><p>dos termos de troca, ou seja, da relação dos preços dos produtos pelos preços dos</p><p>produtos de importação. As commodities continuaram com os preços elevados no</p><p>segundo mandato de Lula, portanto, apesar da queda em 2009, em 2010 houve uma</p><p>forte elevação, apresentada no gráfico a seguir. O que aconteceu, também, foi que</p><p>muitos investidores internacionais passaram a investir em commodities, devido à</p><p>crise de mercados tradicionalmente mais sólidos como o norte-americano.</p><p>GRÁFICO 7 – TERMOS DE TROCA – BASE 2005</p><p>FONTE: FUNCEX (apud PEREIRA, 2014, p. 41)</p><p>A política de industrialização no governo Lula ainda não parecia</p><p>responder às necessidades dos empresários. A baixa competitividade esbarrava</p><p>na capacidade competitiva, na taxa de câmbio ainda muito valorizada e,</p><p>sobretudo, na capacidade de pesquisa voltada à inovação (SALAMA, 2010).</p><p>Ficava cada vez mais forte a tendência da economia em voltar-se à vocação inicial</p><p>TÓPICO 2 | REELEIÇÃO DO GOVERNO LULA E A CRISE FINANCEIRA INTERNACIONAL</p><p>165</p><p>primário-exportador — de acordo com a teoria das vantagens comparativas de</p><p>David Ricardo em sua obra The principles of political economy and taxation (1817),</p><p>o país se especializa na produção e exportação do produto que possui custos</p><p>relativos mais baixos). A pauta de exportação brasileira, visivelmente no gráfico a</p><p>seguir, aumentou a sua participação dos produtos básicos, apresentando declínio,</p><p>especialmente, das exportações de produtos manufaturados. Já havíamos</p><p>observado a queda da produção industrial, especialmente, em 2009.</p><p>Retoma-se a discussão no cenário brasileiro de que o Brasil estaria</p><p>vivenciando uma fase rumo à desindustrialização.</p><p>GRÁFICO 8 – EXPORTAÇÃO BRASILEIRA POR FATOR AGREGADO (PARTICIPAÇÃO %)</p><p>FONTE: MDIC/SECEX (apud ASSOCIAÇÃO DE COMÉRCIO EXTERIOR DO BRASIL, 2010, p. 3)</p><p>A inserção internacional do Brasil se apresentava ainda muito problemática.</p><p>Observem o gráfico a seguir. As manufaturas brasileiras são destinadas,</p><p>sobretudo, para os países da América Latina, primeiro porque são países menos</p><p>competitivos em termos industriais, segundo, pois se explicam pelos acordos</p><p>e tratados comerciais, e, terceiro, pela proximidade geográfica que barateia os</p><p>custos de transporte. Em 2010, as exportações de produtos manufaturados para</p><p>a América Latina chegam a 50,5%. No entanto, a comercialização com os Estados</p><p>Unidos de manufaturas brasileiras vem declinando desde 2008, enquanto que</p><p>com os países europeus se manteve com poucas oscilações da participação das</p><p>exportações de manufaturas.</p><p>166</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>GRÁFICO 9 – PARTICIPAÇÃO (%) DOS MERCADOS NO TOTAL DAS</p><p>EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS DE MANUFATURAS</p><p>FONTE: MDIC/ SECEX (apud PEREIRA, 2014, p. 42)</p><p>Os principais importadores latino-americanos das manufaturas brasileiras</p><p>são os países do MERCOSUL. Observe que a política externa SUL-SUL, a partir</p><p>de Lula, favorece o incremento da participação dos países do MERCOSUL na</p><p>comercialização de produtos manufaturados brasileiros. Em 2005, o MERCOSUL</p><p>importava 53% das manufaturas. O percentual se elevou para 61,6% em 2008.</p><p>No ano em que a crise internacional foi mais dura com o Brasil, o percentual</p><p>subiu para 63,8% contribuindo para amenizar os efeitos da crise americana na</p><p>economia brasileira. E, em 2010, ocorre uma pequena retração das exportações de</p><p>manufaturas para o MERCOSUL, sendo que foi de 62,6%.</p><p>GRÁFICO 10 – PARTICIPAÇÃO (%) DAS EXPORTAÇÕES DE MANUFATURAS</p><p>NA AMÉRICA LATINA POR PRINCIPAIS GRUPOS</p><p>FONTE: MDIC/SECEX (apud PEREIRA, 2014, p. 42)</p><p>TÓPICO 2 | REELEIÇÃO DO GOVERNO LULA E A CRISE FINANCEIRA INTERNACIONAL</p><p>167</p><p>Os principais parceiros comerciais do Brasil, em 2010, eram os Estados</p><p>Unidos e a China. O aumento do consumo da China e as elevadas taxas de</p><p>crescimento romperam com a primazia dos Estados Unidos no comércio com</p><p>o Brasil. A China, que estava em 14ª colocada como mercado de destino das</p><p>exportações brasileiras em 1998, passa a ocupar o primeiro lugar em 2009, e</p><p>2º lugar como principal país de origem das importações brasileiras. Embora a</p><p>conta entre Brasil e China seja superavitária, a pauta de exportação do Brasil é</p><p>preocupante (PEREIRA, 2011).</p><p>As relações da China com o Brasil denotam a perpetuação do ciclo vicioso</p><p>da inserção internacional brasileira. Brasil importa mais produtos manufaturados</p><p>da China e é fornecedor de produtos básicos com baixa intensidade tecnológica</p><p>incorporada. Observem a tabela que segue. Os principais produtos que são</p><p>exportados para a China são primários, no topo está o minério de ferro e seus</p><p>concentrados com 29,04%, soja em grão com 26,37% e óleos de petróleo com</p><p>7,82% (os dez primeiros produtos correspondem a 83,49% do total).</p><p>TABELA 12 – RANKING DOS PRINCIPAIS PRODUTOS EXPORTADOS PELO BRASIL PARA A CHINA</p><p>E SUA PARTICIPAÇÃO PERCENTUAL NA RECEITA TOTAL DESSA PAUTA EM 2007</p><p>FONTE: Adaptado de Comtrade (2008 apud MORTATTI; MIRANDA; BACCHI, 2011, p. 315)</p><p>*Sistema Harmonizado de Designação e Codificação de Mercadorias de 2002 (HS 2002 6 dígitos).</p><p>Ranking HS (2002)* Descrição do Produto Participação</p><p>1º 26.01.11 Minérios de Ferro e</p><p>seus concentrados 29,04%</p><p>2º 12.01.00 Soja em grão 26,37%</p><p>3º 27.09.00</p><p>Óleos de Petróleo e</p><p>obtidos de minerais</p><p>betuminosos</p><p>7,82%</p><p>4º 26.03.29</p><p>Minérios de Ferro e</p><p>seus concentrados,</p><p>aglomerados</p><p>5,51%</p><p>5º 47.03.29</p><p>Pastas químicas</p><p>de madeira de não</p><p>coniferas</p><p>3,59%</p><p>6º 15.07.10 Óleo de soja bruto,</p><p>mesmo degomado 2,89%</p><p>7º 4.01.20</p><p>Tabaco total ou</p><p>parcialmente</p><p>destacado</p><p>2,52%</p><p>8º 41.04.11</p><p>Couros e peles</p><p>curtidos, plena flor,</p><p>não divididos; etc</p><p>1,97%</p><p>9º 72.02.93 Ferroligas, ferronióbio 1,92%</p><p>10º 74.03.11</p><p>Cobre refinado,</p><p>cátodos e seus</p><p>elementos</p><p>1,86%</p><p>Top 10 83,49%</p><p>168</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>A inserção do Brasil no mercado internacional estava apresentando um</p><p>quadro de retrocesso no sentido de que ao contrário de outros países emergentes,</p><p>o Brasil reforçava a sua vocação primário-exportadora, ficando muito mais</p><p>suscetível às oscilações de preços das commodities:</p><p>Ao analisarmos as matrizes de exportação de outros países que</p><p>participam ativamente do comércio internacional, como a China</p><p>(onde a participação dos produtos intensivos em recursos naturais é</p><p>de apenas 9,3%), Estados Unidos (15%), México (23%) ou Índia (29%),</p><p>percebe-se que há um equilíbrio entre esses produtos e os de valor</p><p>tecnológico agregado (BRASIL, 2012, p. 20).</p><p>Em 2009, a participação dos produtos básicos na pauta de exportação era</p><p>de 40,5% e foi para 44,6% em 2010. Os produtos semimanufaturados em 2009</p><p>correspondiam a 13,4% e passaram a 14% em 2010. Os produtos manufaturados</p><p>correspondiam em 2009 a 44% da pauta de exportação e em 2010 a 30,4% (AEB, 2011).</p><p>O Brasil, no período entre 2007 a 2010, apresentou saldo positivo na sua</p><p>balança comercial e no saldo das transações correntes, puxadas pelos investimentos</p><p>externos. O gráfico que segue apresenta o comportamento da balança comercial</p><p>brasileira de 2001 a 2010. Embora o crescimento do saldo da balança comercial</p><p>tenha caído de 2009 para 2010, redução de 20,1%, as exportações superaram</p><p>o saldo de 2008, que havia sido de US$ 198 bilhões. Em 2010, as exportações</p><p>atingiram o saldo de US$ 202 bilhões.</p><p>GRÁFICO 11 – BALANÇA COMERCIAL BRASILEIRA</p><p>FONTE: MDIC/SECEX (apud ASSOCIAÇÃO DE COMÉRCIO EXTERIOR DO BRASIL, 2010, p. 1)</p><p>TÓPICO 2 | REELEIÇÃO DO GOVERNO LULA E A CRISE FINANCEIRA INTERNACIONAL</p><p>169</p><p>Até o mandato do Presidente FHC 90% da dívida pública estava dolarizada.</p><p>O problema é que isso deixaria o Brasil engessado para fazer investimentos</p><p>sociais e extremamente vulnerável aos choques externos. No contexto favorável</p><p>de acúmulos de reservas internacionais, o governo de Lula buscou outra forma</p><p>para administrar a dívida pública brasileira:</p><p>O contexto favorável adveio dos resultados positivos nas contas</p><p>externas no início do governo Lula, decorrentes da própria</p><p>desvalorização da moeda, de uma diplomacia ativa em relação à política</p><p>de comércio exterior, associada a uma política externa de orientação</p><p>sul-sul e do aumento dos preços das commodities internacionais.</p><p>Nesse processo de restruturação da dívida pública, no sentido de</p><p>sua “desdolarização”, o alvo principal foram os títulos indexados ao</p><p>câmbio, que passaram de 22% (em 2002) para 1% (em 2008), e os pós-</p><p>fixados, de 61% (em 2002) para 36% (em 2008). Em contrapartida, os</p><p>pré-fixados aumentaram sua participação de 2% (em 2002) para 32%</p><p>(em 2008). Ademais, o estoque da dívida pública líquida caiu de 52%</p><p>do PIB em 2002 para 35% em 2008, voltando aos patamares do período</p><p>do governo Itamar (METRI, 2014, s.p.).</p><p>A tabela a seguir apresenta os resultados do acúmulo de reservas. Além</p><p>de fortalecer a confiança nos fatores macroeconômicos brasileiros, o acúmulo de</p><p>reservas internacionais contribuiu para o pagamento da dívida externa brasileira.</p><p>TABELA 13 – RESERVAS INTERNACIONAIS</p><p>FONTE: Adaptado de IPEA (2017, s.p.)</p><p>Ano Reservas (US$)</p><p>2003 49.296,00</p><p>2004 52.935,00</p><p>2005 53.799,00</p><p>2006 85.839,00</p><p>2007 180.334,00</p><p>2008 193.783,00</p><p>2009 238.520,00</p><p>2010 288.575,00</p><p>Seria adequado afirmar que a eleição de Lula foi um “continuísmo” da</p><p>política econômica de seu antecessor Fernando Henrique Cardoso?</p><p>170</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>Vimos que Lula optou por não adotar as privatizações como plataforma</p><p>de governo. Embora a equipe econômica tenha mantido taxas de juros elevadas</p><p>e austeridade fiscal, especialmente no primeiro mandato de Lula, o segundo</p><p>mandato ficou marcado por uma política com características heterodoxas. Os</p><p>programas sociais, embora muitos deles já existentes, passaram a ocupar uma</p><p>agenda mais ampla na gestão. A gestão da dívida externa foi um rompimento</p><p>com as gestões anteriores e resultou em maior independência para a política</p><p>interna, menor vulnerabilidade externa e o país pôde iniciar uma política de</p><p>desenvolvimento novamente, voltada para dirimir as desigualdades de renda e</p><p>retomada do crescimento.</p><p>Tampouco, porém, se pode negar uma certa continuidade entre as</p><p>políticas dos dois presidentes, sobretudo no primeiro mandato do</p><p>presidente Lula: ampliação de uma bolsa escolar, criada por seu</p><p>predecessor, para uma bolsa família; superávit primário do orçamento</p><p>maior do que o exigido pelo FMI; apreciação da moeda nacional e</p><p>manutenção de taxas de juros muito altas com o objetivo de redução</p><p>da inflação, aplicando a “regra de Taylor”24 de inspiração monetarista.</p><p>Contudo, a filosofia geral começa a ser diferente já no primeiro mandato</p><p>de Lula: o governo se recusa a adotar a política de privatizações,</p><p>preserva o estatuto público do seu grande banco, o BNDES (bem como</p><p>do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal), e escolhe sustentar</p><p>a demanda mediante a elevação do salário mínimo e do crescimento</p><p>dos gastos públicos. É essa política, como vimos, que está na origem de</p><p>uma diminuição das desigualdades, de uma redução da pobreza e de</p><p>uma aceleração do crescimento. Os dois mandatos do presidente Lula,</p><p>portanto, não podem ser assimilados aos de FHC. Há semelhanças, mas</p><p>também profundas diferenças (SALAMA, 2010, p. 178).</p><p>Lula termina seu mandato com registro de desemprego de 7,3%, coloca</p><p>o país como sexta economia mundial, registra US$ 288.575 milhões, aumenta o</p><p>poder aquisitivo do salário mínimo, reduz o número de famílias em situação de</p><p>pobreza. De acordo com Pires (2010), outro diferencial foi o estancamento das</p><p>privatizações, e o BNDES, que estava sendo utilizado para apoiar as privatizações,</p><p>voltou a cumprir seu papel de banco de desenvolvimento para apoiar a</p><p>modernização da indústria e do setor de serviços. Várias universidades federais</p><p>foram abertas e o ensino público superior foi fortalecido com novas contratações.</p><p>O desempenho macroeconômico brasileiro e os programas sociais de</p><p>redução da fome e pobreza garantiram à Lula projeção internacional. Além disso,</p><p>o Brasil iria sediar a Copa do Mundo em 2014 e as Olimpíadas em 2016.</p><p>171</p><p>RESUMO DO TÓPICO 2</p><p>Neste tópico, você aprendeu que:</p><p>• O presidente Lula conseguiu ser reeleito com a campanha sobre o processo de</p><p>redução da pobreza, o crescimento econômico e a consolidação da estabilidade</p><p>econômica. Já no início do seu mandato lançou o Programa de Aceleração do</p><p>Crescimento (PAC).</p><p>• A crise imobiliária dos Estados Unidos de 2008 teve seu impacto mais forte no</p><p>Brasil após a quebra do banco de investimentos Lehamn and Brothers. O Brasil</p><p>teve que lançar medidas keynesianas de indução das atividades econômicas</p><p>pelo Estado.</p><p>• A mudança de Ministro da Fazenda trouxe mais enfaticamente, para o governo</p><p>Lula, a característica de políticas econômicas heterodoxas de controle de inflação</p><p>e medidas de estímulo de desenvolvimento e redução das desigualdades sociais.</p><p>• A política de juros altos continuou orquestrada pela equipe econômica sob um</p><p>novo motivo: as expectativas de inflação futura.</p><p>• A economia brasileira foi fortalecida pelo desempenho do mercado interno e</p><p>pelos crescentes superávits na balança comercial. O preço das commodities</p><p>elevado e o consumo da China especialmente garantiram ao Brasil aumento das</p><p>suas reservas internacionais, podendo efetuar os pagamentos da dívida externa.</p><p>• O aumento do consumo da China e as elevadas taxas de crescimento romperam</p><p>com a primazia dos Estados Unidos no comércio com o Brasil.</p><p>• A ampliação e o fortalecimento dos programas sociais também tiveram impacto</p><p>no fortalecimento e crescimento da economia. Estudos realizados sobre o</p><p>impacto do Bolsa Família demonstraram que, para cada 1% do PIB investido,</p><p>há o impacto de 1,78%.</p><p>172</p><p>AUTOATIVIDADE</p><p>1 Explique o que foi o PAC.</p><p>2 Quais fatores explicam a redução dos produtos manufaturados da pauta de</p><p>exportação brasileira?</p><p>3 Quais são os motivos que endossam a decisão dos técnicos do COPOM de</p><p>seguirem com a política dos juros altos?</p><p>4 Qual a importância dos programas sociais para a economia?</p><p>5 Explique como foi o impacto da crise internacional no Brasil.</p><p>6 O governo de Lula pode ser caracterizado como uma continuidade do</p><p>Governo FHC?</p><p>173</p><p>TÓPICO 3</p><p>CRISE POLÍTICA E A ECONOMIA NOS</p><p>GOVERNOS DE DILMA E TEMER</p><p>UNIDADE 3</p><p>1 INTRODUÇÃO</p><p>A popularidade da gestão de Lula conseguiu que a primeira presidente</p><p>do Brasil fosse do Partido dos Trabalhadores, eleita com mais de 55 milhões de</p><p>votos em 2010 (ALVES, 2014).</p><p>As obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) também</p><p>foram utilizadas como medidas anticíclicas, especialmente no período mais</p><p>problemático que a crise internacional atingiu o Brasil. O Programa Minha</p><p>Casa Minha Vida foi a frente das políticas direcionadas para a habitação. Essas</p><p>políticas deixaram como legado do governo Lula a ativação da economia, mas</p><p>com inclusão social.</p><p>A presidente Dilma tinha um viés mais keynesiano no entendimento de</p><p>política econômica. A expectativa era a de que ela continuasse o governo Lula e o</p><p>processo de desenvolvimento socioeconômico do Brasil.</p><p>Neste tópico estudaremos como foi o desempenho do governo de Dilma,</p><p>sua reeleição, a crise política e econômica que levou ao seu impeachment e a</p><p>sucessão pelo seu vice, Michel Temer.</p><p>Boa leitura!</p><p>2 ELEIÇÃO DA DILMA</p><p>A primeira presidente mulher tinha a missão de continuar as obras do</p><p>PAC e dar continuidade às demais políticas implantadas por seu antecessor e</p><p>principal apoiador para sua eleição, o presidente Lula.</p><p>Os países desenvolvidos estavam saindo da crise de 2008. Parecia</p><p>que o quadro mundial estava melhorando, mas para o Brasil começa a piorar,</p><p>dificultando o cenário para o enfrentamento da presidente Dilma. Luís Eduardo</p><p>Assis (ex-diretor de política monetária do BACEN) descreve a situação:</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA</p><p>1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>8</p><p>• Aumento da participação do Estado com quatro funções principais: adequação do</p><p>arcabouço institucional ao processo de industrialização, geração de infraestrutura</p><p>básica, fornecimento de insumos básicos e captação e distribuição de poupança.</p><p>• Aumento da concentração de renda: havia excedente de mão de obra em</p><p>decorrência do êxodo rural e, consequentemente, baixos salários.</p><p>• Escassez de fontes de financiamento: para resolver o problema de escassez, o</p><p>Estado teve que se valer das poupanças compulsórias, dos recursos provenientes</p><p>da Previdência Social, dos ganhos no mercado de câmbio, do financiamento</p><p>inflacionário e do endividamento externo.</p><p>3 O PROJETO DESENVOLVIMENTISTA</p><p>Em 3 de outubro de 1950, Getúlio Vargas vence as eleições defendendo um</p><p>projeto desenvolvimentista. Na época, Vargas encontrou um país diferente para</p><p>governar, pois, como dito anteriormente, existiram, com o PSI, uma urbanização e</p><p>uma industrialização intensa, sendo que a indústria passou a ser uma espécie de</p><p>“mola propulsora” da economia brasileira. Com a industrialização e urbanização,</p><p>novas classes sociais emergiram, como a burguesia industrial, a classe média e</p><p>a classe trabalhadora. Assim, a base de sustentação política do projeto nacional</p><p>desenvolvimentista era formada por proprietários de terra, o empresariado industrial,</p><p>os trabalhadores urbanos, os sindicatos e os políticos tradicionais (FONSECA, 2003).</p><p>IMPORTANTE</p><p>É válido ressaltar que os segmentos agrários foram importantes, apesar de ser</p><p>uma era concentrada no processo de industrialização. Mas você sabe por que e qual o papel</p><p>desempenhado pelo setor?</p><p>Primeiro, existiam questões econômicas. O setor primário viabilizava o PSI ao</p><p>produzir matérias-primas e bens de consumo dos trabalhadores urbanos, além de gerar</p><p>divisas com a exportação. Segundo, podemos citar as motivações políticas. A esse respeito,</p><p>Fonseca (2003, p. 42) afirma que Vargas sempre mostrou interesse em pactuar com os antigos</p><p>oligarcas e com os segmentos voltados à agroexportação. Assim, “um compromisso implícito</p><p>foi firmado entre o governo e estes segmentos, que receberam em troca a não realização</p><p>da reforma agrária e a não extensão da legislação trabalhista ao campo, sem contar outros</p><p>benefícios, como crédito”.</p><p>Quando tratamos sobre o segundo governo Vargas, é importante que</p><p>você tenha em mente que houve a articulação de um projeto de desenvolvimento</p><p>capitalista, com ênfase no desenvolvimento e modernização da indústria e da</p><p>agricultura. Além disso, houve forte intervenção estatal na economia (FONSECA,</p><p>1987). Assim, Vargas retomou o programa econômico Estado Novo para enfrentar</p><p>problemas no balanço de pagamentos e o surto inflacionário e implementar um</p><p>programa de desenvolvimento com base em investimentos em transporte e</p><p>energia, pontos de estrangulamento da economia brasileira (PIRES, 2010).</p><p>TÓPICO 1 | SITUAÇÃO INTERNACIONAL E A</p><p>9</p><p>Ademais, é relevante ressaltar que o desenvolvimento da indústria pesada</p><p>era outro ponto central do programa de Vargas.</p><p>A política industrializante de Vargas tomaria corpo nos três grandes</p><p>programas de desenvolvimento de sua gestão: o Plano Nacional</p><p>de Reaparelhamento Econômico (PNRE), o Plano Nacional de</p><p>Eletrificação e o projeto de criação da Petrobras. Lançado em 1951, o</p><p>PNRE previa investimentos na indústria de base, na modernização da</p><p>agricultura e, principalmente, nos setores de energia e transporte. [...]</p><p>O Plano Nacional de Eletrificação era ambicioso, previa a duplicação</p><p>da capacidade instalada em dez anos, a implantação da indústria de</p><p>equipamento elétrico pesado e a criação da Eletrobrás, que ficaria</p><p>responsável pela coordenação dos financiamentos, dos investimentos</p><p>e das empresas regionais de eletricidade. O projeto Petrobras visava</p><p>ao desenvolvimento de um setor considerado vital para a economia</p><p>e ao controle nacional de recursos naturais, importantes para a</p><p>independência econômica do país (PIRES, 2010, p. 117-118).</p><p>No seu projeto desenvolvimentista, Vargas adotou uma postura</p><p>nacionalista. Mas apesar disso, a partir de 1953, é importante ressaltar que o</p><p>nacional desenvolvimentismo de Vargas aceitava o capital estrangeiro, desde</p><p>que este tivesse como finalidade acelerar o processo de industrialização e</p><p>modernização agrícola. É possível afirmar então que, apesar do nacionalismo, a</p><p>viabilidade do desenvolvimentismo de Vargas dependia, em grande medida, da</p><p>capacidade de articulação para angariar financiamento externo.</p><p>Assim, Vargas estabeleceu um plano de cooperação com os Estados Unidos.</p><p>Nesse plano, técnicos dos dois países fizeram um diagnóstico da economia brasileira e,</p><p>como resultado, foram gerados 41 projetos setoriais de desenvolvimento (FONSECA,</p><p>2003). Foi neste contexto que o BNDE (Banco Nacional de Desenvolvimento</p><p>Econômico), atual BNDES, foi criado (FONSECA, 2003).</p><p>Em 1951, o governo brasileiro anunciou ter obtido 500 milhões de</p><p>dólares em empréstimos do Banco Mundial e dos Estados Unidos. Em</p><p>cima dessa promessa, montou toda uma estratégia de desenvolvimento.</p><p>Os percalços começaram a ficar evidentes quando se tornou claro que</p><p>o Banco Mundial só financiaria projetos específicos e a seu critério. A</p><p>expectativa era de que o governo brasileiro controlasse os eventuais</p><p>recursos emprestados, indicando que Vargas esperava limitar as</p><p>influências externas sobre as decisões de política econômica. Do</p><p>montante prometido, o Brasil recebeu apenas 63 milhões de dólares</p><p>(PIRES, 2010, p. 120).</p><p>Apesar da necessidade de capital externo para financiar o PSI, é</p><p>importante, segundo Pires (2010), levar em consideração o contexto internacional.</p><p>A Segunda Guerra Mundial, a Grande Depressão e a prioridade dada pelos</p><p>Estados Unidos para a Europa e Japão no pós-guerra diminuíram a entrada de</p><p>capital norte americano no Brasil, o que, de uma certa forma, obrigou o país a</p><p>realizar um desenvolvimento mais autônomo. Entretanto, o financiamento</p><p>interno também apresentava problemas. A esse respeito, é importante mencionar</p><p>que o financiamento interno nesse período se baseava em três pontos principais</p><p>de acordo com Pires (2010, p. 122):</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>10</p><p>1) sistema de câmbio, que implicava a transferência de parte do</p><p>excedente do setor agrário e exportador para a indústria;</p><p>2) nacionalização de setores estratégicos assumidos pelo Estado, o</p><p>que implicava exacerbar o gasto público e, portanto, os déficits</p><p>orçamentários, que eram cobertos, sobretudo, por meio de emissão</p><p>monetária, visto que o mercado de títulos era pequeno. A inflação,</p><p>decorrente desse procedimento, corroía os salários;</p><p>3) a contenção dos salários e a transferência de ganhos de produtividade</p><p>do setor estatal.</p><p>Essa forma de financiar o desenvolvimentismo foi um entrave e se configurou</p><p>em um problema para o projeto de desenvolvimentismo brasileiro. A política de</p><p>confisco cambial diminuía o desenvolvimento da agricultura de exportação, o</p><p>que impactava diretamente na capacidade de importação. Uma alternativa foi a</p><p>emissão de moeda, que gerou aumento da inflação. Esta, por sua vez, corroeu os</p><p>salários, estimulando a atuação sindicalista independente. Como consequência, é</p><p>importante mencionar que a influência de Vargas na classe operária começou a</p><p>diminuir, e houve um aumento da concentração de renda (PIRES, 2010).</p><p>Houve então a eclosão da “Greve dos 300 mil”. Mas o que seria essa greve?</p><p>Você já ouviu falar? De acordo com Ruy (2013), a “Greve dos 300 mil” ocorreu em</p><p>março de 1953. O estopim foi o alto custo de vida, que subiu em torno de 100%</p><p>entre 1943 e 1951, ao mesmo tempo em que o salário cresceu apenas 14%. Ruy</p><p>(2013) afirma que dentre os ganhos dos trabalhadores com a “Greve dos 300 mil”</p><p>é possível citar: o aumento salarial de 32%, o aumento da força dos sindicatos</p><p>formando, inclusive, lideranças sindicais, e a</p><p>BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>174</p><p>[...] talvez baste lembrar a máxima do futebol, de que um bom goleiro</p><p>não deve ser apenas tecnicamente competente, precisa ter sorte</p><p>também. Pois para a gestão da economia do governo Dilma, o ditado</p><p>vale ao revés. Para colher resultados tão ruins, não basta tomar medidas</p><p>tecnicamente equivocadas; é preciso também ter azar. Não há dúvida</p><p>de que o quadro internacional azedou. Medido pelo índice calculado</p><p>pela The Economist, o preço médio das commodities aumentou quase</p><p>170% durante o governo Lula (com direito a um susto passageiro em</p><p>2008). Entre janeiro de 2011 e maio de 2014, o mesmo índice recuou</p><p>23%. Os juros pagos pelos papéis mais longos emitidos pelo Tesouro</p><p>americano também pararam de cair e iniciaram recuperação a partir de</p><p>2013. Aos poucos, os países ricos saem da crise iniciada em 2007/2008 e,</p><p>paradoxalmente, a vida fica mais difícil para nós. Se o mundo se tornou</p><p>um lugar mais perigoso, também é verdade que os erros de política</p><p>econômica recente só fizeram agravar o quadro (ALVES, 2014, p. 14-15).</p><p>A presidente Dilma lançou o PAC 2 para continuar com as políticas</p><p>iniciadas, mas o programa deu ênfase a seis pontos estratégicos, como: transporte,</p><p>energia, Cidade Melhor, Comunidade Cidadão, Minha Casa Minha Vida, Água</p><p>e Luz para Todos. Tais pontos refletem a necessidade de dar ênfase no aspecto</p><p>social com políticas de inclusão. Além disso, seriam investidos em obras para a</p><p>Copa do Mundo e para as Olimpíadas, que o Brasil iria sediar. Entre 2011 a 2014</p><p>foram investidos aproximadamente R$ 1 trilhão em infraestrutura: 50% estava</p><p>destinado para o setor de energia e 30% para o programa habitacional Minha Casa</p><p>Minha Vida (JARDIM; SILVA, 2015). Observe a tabela a seguir, que corresponde</p><p>aos investimentos nos respectivos programas.</p><p>TABELA 14 – PREVISÃO DE GASTOS</p><p>FONTE: Ministério da Fazenda (apud JARDIM; SILVA, 2015, p. 68)</p><p>Eixos 2011 - 2014 Pós - 2014 Total</p><p>PAC Comunidade</p><p>Cidadã 23,0 - 23,0</p><p>PAC Água e Luz</p><p>para todos 30,6 - 30,6</p><p>PAC Cidade</p><p>Melhor 57,1 - 57,1</p><p>PAC Transportes 104,5 4,5 109,0</p><p>PAC Minha Casa,</p><p>Minha Vida 278,2 - 278,2</p><p>PAC Energia 461,6 626,9 1088,5</p><p>Total 955,0 631,4 1.586,4</p><p>TÓPICO 3 | CRISE POLÍTICA E A ECONOMIA NOS GOVERNOS DE DILMA E TEMER</p><p>175</p><p>Dando prosseguimento ao Programa Minha Casa Minha Vida, a previsão</p><p>no PAC 2 era de contemplar 2,6 milhões de famílias e investir R$ 143 bilhões.</p><p>O ministro da Fazenda, Guido Mantega, em 2012, havia anunciado os novos</p><p>investimentos para o setor de construção civil (JARDIM; SILVA, 2015). O gráfico</p><p>que segue mostra os investimentos que tinham sido contratados e as metas que o</p><p>Governo pretendia alcançar.</p><p>GRÁFICO 12 – INVESTIMENTOS DO PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA</p><p>FONTE: Ministério da Fazenda (apud JARDIM; SILVA, 2015, p. 68)</p><p>Os investimentos de infraestrutura para sediar a Copa do Mundo em</p><p>2014 também tinham o objetivo de acelerar a economia brasileira. Os gastos</p><p>foram em torno de 33,1 bilhões de reais. O gráfico a seguir mostra a divisão dos</p><p>investimentos totais para os segmentos. Além da construção dos estádios para</p><p>o bom funcionamento do evento, deveriam ser feitos muitos investimentos em</p><p>infraestrutura nas cidades que receberam a competição, como investimentos</p><p>na melhoria e ampliação de portos e aeroportos, bem como infraestrutura que</p><p>contemplasse a mobilidade urbana dos turistas. Seria o legado da copa: a melhoria</p><p>dos espaços e urbanismo para a população.</p><p>GRÁFICO 13 – INVESTIMENTOS PARA A COPA DO MUNDO 2014 (R$ BILHÕES)</p><p>FONTE: Ministério da Fazenda (apud JARDIM; SILVA, 2015, p. 68)</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>176</p><p>Entretanto, as questões de construção de infraestrutura e mobilidade</p><p>urbana perpassam pelo crivo dos principais envolvidos, ou seja, a população. De</p><p>acordo com Souza (2018, p. 245), a lógica de planejamento urbano e a distribuição</p><p>dos recursos públicos nos eventos das Olimpíadas e da Copa do Mundo no Brasil</p><p>foram elaboradas de acordo com o perfil de políticas públicas top-down, ou seja,</p><p>sem efetiva participação da população, e:</p><p>Os projetos urbanos implantados indicam o fortalecimento do padrão</p><p>corporativo de produção das cidades em uma crescente hegemonia</p><p>da lógica de rentabilidade, financeirização e gestão privada de bens</p><p>e serviços coletivos, com viabilização por grandes investimentos</p><p>públicos (SOUZA, 2018, p. 245).</p><p>Em 2011, a FIESP (Federação da Indústria de São Paulo) entregou</p><p>um documento à presidência fazendo algumas reivindicações. A dita nova</p><p>matriz econômica pregada por Dilma incluía algumas dessas demandas dos</p><p>segmentos empresariais:</p><p>Paradoxalmente, a política econômica do primeiro governo Dilma</p><p>Rousseff tinha atendido a várias das bandeiras defendidas pela</p><p>FIESP ao longo dos anos, no que se chamaria de “nova matriz</p><p>econômica”: redução de taxas de juros e tarifas de energia elétrica;</p><p>desonerações tributárias e crédito subsidiado; desvalorização cambial</p><p>e protecionismo industrial seletivo; concessões de serviços públicos</p><p>para a iniciativa privada. Algumas dessas iniciativas foram, inclusive,</p><p>solicitadas em documento entregue ao governo e assinado em</p><p>conjunto com outras organizações empresariais e centrais sindicais em</p><p>2011 (BASTOS, 2017, p. 3).</p><p>Com relação ao impacto social, o coeficiente Gini do Brasil, calculado</p><p>pelo Banco Mundial, passou de 58,6, em 2002, para 52,9, em 2013. Em 2014,</p><p>um relatório da ONU apontou redução no Índice de Gini de 54,2 para 45,9. O</p><p>resultado significa que as políticas para dirimir a desigualdade social tiveram</p><p>efetividade (COSTAS, 2016).</p><p>As reservas internacionais continuavam altas, embora em 2012 houve um</p><p>destaque e em 2013 observou-se redução das reservas.</p><p>TABELA 15 – RESERVAS INTERNACIONAIS</p><p>FONTE: Adaptado de IPEA (2017)</p><p>Ano Reservas (US$)</p><p>2011 352.012,00</p><p>2012 373.147,00</p><p>2013 358.808,00</p><p>2014 363.551,00</p><p>2015 356.464,00</p><p>2016 365.016,00</p><p>2017 373.972,00</p><p>TÓPICO 3 | CRISE POLÍTICA E A ECONOMIA NOS GOVERNOS DE DILMA E TEMER</p><p>177</p><p>É importante salientar que o ano de 2011 foi marcado tanto pelo efeito do</p><p>ciclo político, já que era o primeiro ano de mandato de Dilma, quanto por uma</p><p>tentativa de tentar reduzir o papel da política fiscal em prol da política monetária</p><p>(DWECK; TEIXEIRA, 2017). Houve, então, uma reversão da política fiscal</p><p>expansionista e uma redução da taxa de juros SELIC. Desse modo, de acordo com</p><p>os autores, “o superávit foi ampliado e houve contenção do ritmo de crescimento</p><p>das despesas” (DWECK; TEIXEIRA, 2017, p. 2).</p><p>Todavia, a partir do final de 2011 e início de 2012, as condições</p><p>internacionais começaram a mudar drasticamente, tornando-se</p><p>cada vez mais adversas. A crise da Zona do Euro combinou-se com</p><p>a desaceleração da economia chinesa e uma recuperação muito lenta</p><p>dos EUA, com impacto negativo na atividade doméstica. A política</p><p>monetária manteve o viés expansionista, com o início de um ciclo de</p><p>rápida redução da taxa básica de juros e redução dos spreads bancários</p><p>empreendida por uma intensa concorrência dos bancos públicos com</p><p>os privados, por meio de expressiva redução das taxas de juros das</p><p>suas diversas linhas de crédito (DWECK; TEIXEIRA, 2017, p. 2-3).</p><p>Além disso, é relevante ressaltar que, ainda em 2011, mais especificamente</p><p>em junho, Antônio Palocci, seu Ministro-chefe da Casa Civil, deixa o cargo, após</p><p>a apresentação de denúncia que seu patrimônio aumentou 20 vezes entre 2006 e</p><p>2010 (ALVES, 2014).</p><p>O gráfico a seguir apresenta o desempenho da economia brasileira, que</p><p>não consegue os resultados de alavancar o crescimento conforme se esperava. Em</p><p>2014, a economia tem uma forte queda sendo o crescimento de 0,1.</p><p>GRÁFICO 14 – VARIAÇÃO DO PIB (%)</p><p>FONTE: Adaptado de BACEN (2014)</p><p>UNIDADE 3 | A ECONOMIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉCULO XXI</p><p>178</p><p>Apesar de não conseguir alavancar os dados econômicos como o</p><p>esperado, houve o crescimento econômico com desaceleração até fim de 2013. Já</p><p>em 2014, quando Dilma disputou as eleições presidenciais com Aécio Neves, o</p><p>nomeação de um novo ministro do</p><p>trabalho, João Goulart, que propôs um aumento de 100% no salário mínimo, para</p><p>vigorar a partir de maio de 1954.</p><p>Devido ao descontentamento do empresariado, Vargas recuou e demitiu</p><p>João Goulart, mas, ao mesmo tempo, manteve o reajuste salarial, o que provocou</p><p>um descontentamento das classes dominantes e dos militares. Esse episódio foi</p><p>importante para a crise final do desenvolvimentismo de Vargas. Além disso,</p><p>a inflação e o desequilíbrio das contas públicas enfraqueceram ainda mais o</p><p>governo. Todo esse cenário econômico e político contribuiu para o golpe, que</p><p>derrubou o governo Vargas, sendo que o agravamento da crise levou, o até então</p><p>presidente, ao suicídio.</p><p>O padrão de desenvolvimento, calcado nos setores de bens de</p><p>capital e intermediários e na expansão da infraestrutura, foi apenas</p><p>parcialmente implementado, devido à ausência de um esquema</p><p>consistente de financiamento da acumulação e em virtude da falta</p><p>de um decidido apoio das classes dominantes para uma ação mais</p><p>abrangente do Estado na economia (PIRES, 2010, p. 125).</p><p>TÓPICO 1 | SITUAÇÃO INTERNACIONAL E A</p><p>11</p><p>TABELA 2 – INDICADORES SELECIONADOS DA ECONOMIA BRASILEIRA (1945-1960)</p><p>Ano</p><p>PIB</p><p>Cresc.</p><p>(%)</p><p>Produto</p><p>industrial</p><p>(%)</p><p>Produto</p><p>agrícola</p><p>(%)</p><p>Produto</p><p>serviços</p><p>(%)</p><p>Formação</p><p>capital</p><p>fixo (%</p><p>PIB)</p><p>Dívida</p><p>externa</p><p>(em</p><p>milhões</p><p>de</p><p>dólares)</p><p>Inflação</p><p>IPC/RJ</p><p>Salário</p><p>mínimo</p><p>real (São</p><p>Paulo</p><p>1944 =</p><p>100)</p><p>1945 3,2 5,5 -2,2 2,9 - 698,1 16,7 80,3</p><p>1946 11,6 18,5 8,4 10,2 - 645,0 16,5 70,9</p><p>1947 2,4 3,3 0,7 7,2 14,9 625,0 21,9 53,8</p><p>1948 9,7 12,3 6,9 6,9 12,7 597,0 3,4 49,6</p><p>1949 7,7 11,0 4,5 7,3 13,0 601,0 4,3 50,4</p><p>1950 6,8 12,7 1,5 7,9 12,8 559,0 9,4 47,9</p><p>1951 4,9 5,3 0,7 6,0 15,4 571,0 12,1 53,0</p><p>1952 7,3 5,6 9,1 5,9 14,8 632,0 17,3 124,8</p><p>1953 4,7 9,3 0,2 1,9 15,1 1.159,0 14,3 101,7</p><p>1954 7,8 9,3 7,9 9,8 15,8 1.317,0 22,6 138,3</p><p>1955 8,8 11,1 7,7 9,2 13,5 1,445,0 23,0 139,3</p><p>1956 2,9 5,5 -2,4 0,0 14,5 1.580,0 21,0 147,0</p><p>1957 7,7 5,4 9,3 10,5 15,0 1.517,0 16,1 153,8</p><p>1958 10,8 16,8 2,0 10,6 17,0 2.044,0 14,8 133,3</p><p>1959 9,8 12,9 5,3 10,7 18,0 2.234,0 39,2 101,7</p><p>1960 9,4 10,6 4,9 9,1 15,7 2.372,0 29,5 130,8</p><p>FONTE: Adaptado de Abreu (1992) e Oliveira (2003)</p><p>Com o suicídio de Vargas, em 1954, assume o governo Café Filho, dando</p><p>início a um período de grande instabilidade política nos próximos 16 meses. Café</p><p>Filho, por motivos de saúde, foi substituído por Carlos Luz, que, por sua vez,</p><p>foi substituído por Nereu Ramos, então presidente do Senado (PIRES, 2010). O</p><p>primeiro ministro da Fazenda de Café Filho foi Eugênio Gudin, que iniciou a</p><p>abertura do país para o exterior, sendo a abertura aprofundada no governo de</p><p>Juscelino Kubitschek.</p><p>4 PLANO DE METAS E O CAPITAL ESTRANGEIRO</p><p>Após estudar sobre a era Vargas, enfatizando o PSI e o desenvolvimentismo,</p><p>daremos um passo à frente e nos concentraremos no período seguinte. Você já</p><p>deve ter ouvido falar sobre Plano de Metas. Qual período da história brasileira</p><p>compreende esse plano? E sobre qual governo o mesmo foi implementado? Sobre</p><p>essas e outras questões que iremos tratar a partir desse momento!</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>12</p><p>Plano de Metas é o plano de desenvolvimento econômico e social, com</p><p>duração prevista para cinco anos, que foi adotado durante o governo de Juscelino</p><p>Kubitschek, também conhecido como JK. Esse Plano ficou popularmente conhecido</p><p>pelo slogan “50 anos de progresso em 5 anos de realizações”. É importante</p><p>mencionar também que o Plano de Metas pode ser considerado um caso bem-</p><p>sucedido de implementação de planejamento estatal, pois o Estado atuou de modo</p><p>importante para a execução, caracterizando o auge do período desenvolvimentista.</p><p>JK governou o Brasil de 1956 a 1960. Segundo Gremaud, Vasconcellos e</p><p>Toneto Júnior (2011), é possível considerar que o período do Plano de Metas foi o</p><p>auge da industrialização brasileira que se iniciou com Getúlio Vargas. Você sabe</p><p>qual era o objetivo principal do Plano? “O principal objetivo era estabelecer as</p><p>bases de uma economia industrial madura no país, especialmente aprofundando</p><p>o setor produtor de bens de consumo duráveis” (GREMAUD; VASCONCELLOS;</p><p>TONETO JÚNIOR, 2011, p. 365).</p><p>Contudo, por que o intuito do Plano de Metas era aprofundar o setor</p><p>produtor de bens de consumo duráveis? A esse respeito, é importante mencionar</p><p>que esse plano foi formulado com base nos estudos do grupo BNDE-Cepal, que</p><p>identificou uma demanda reprimida por bens de consumo duráveis. Além disso,</p><p>esse setor poderia ser uma importante fonte de crescimento, devido à demanda por</p><p>bens intermediários, geração de emprego e estímulo ao desenvolvimento de novos</p><p>setores na economia (GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011). É</p><p>possível considerar então que o Plano de Metas apresentava viés keynesiano.</p><p>A demanda por esses bens vinha da própria concentração de renda</p><p>anterior que elevara os padrões de consumo de determinadas</p><p>categorias sociais. Para a viabilização do projeto, dever-se-ia readequar</p><p>a infraestrutura, além de eliminar os pontos de estrangulamento</p><p>existentes, os quais já haviam sido identificados nos estudos da</p><p>Comissão Mista Brasil-Estados Unidos (CMBEU). Ainda, era necessário</p><p>criar incentivos para a vinda do capital estrangeiro nos setores que</p><p>se pretendia implementar (GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO</p><p>JÚNIOR, 2011, p. 365).</p><p>IMPORTANTE</p><p>De acordo com Keynes (1996, p. 345), o Estado deveria prestar serviços que</p><p>expandissem o bem-estar geral da população, assegurando o que ele chamou de “uma</p><p>socialização dos investimentos”. Isso porque existem áreas em que não há interesse da</p><p>iniciativa privada. Assim, as políticas fiscal, monetária e cambial precisariam ser expansionistas</p><p>para acelerar o crescimento da demanda reprimida, garantindo assim a distribuição de renda</p><p>e o pleno emprego dos fatores.</p><p>TÓPICO 1 | SITUAÇÃO INTERNACIONAL E A</p><p>13</p><p>De acordo com Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011, p. 365-366),</p><p>o Plano de Metas foi dividido em três pontos principais:</p><p>i. investimentos estatais em infraestrutura, com destaque para os</p><p>setores de transporte e energia elétrica. No que diz respeito aos</p><p>transportes, cabe destacar a mudança de prioridades, que, até o</p><p>governo Vargas, centrava-se no setor ferroviário, e passou para o</p><p>rodoviário, que estava em consonância com o objetivo de introduzir</p><p>o setor automobilístico no país;</p><p>ii. estímulo ao aumento da produção de bens intermediários, como o</p><p>aço, o carvão, o cimento, o zinco etc., que foram objeto de planos</p><p>específicos;</p><p>iii. incentivos à introdução dos setores de consumo duráveis e de capital.</p><p>Foram criados grupos executivos e colegiados, também conhecidos</p><p>como comissões setoriais, para formular as políticas para atingir as metas</p><p>setoriais. Esses grupos eram formados por representantes da Sumoc, do BNDE,</p><p>da Cacex e por empresários ligados ao Conselho de Desenvolvimento (PIRES,</p><p>2010). Consideramos que os principais instrumentos de ação governamental</p><p>para atingir as metas foram o tratamento especial ao capital externo, através de</p><p>incentivos, e o estímulo à acumulação privada e ao crédito privado. Além disso,</p><p>investimentos das empresas estatais e crédito com juros baixos (Banco do Brasil</p><p>e BNDE), política de reserva de mercado e concessão de avais para obtenção de</p><p>empréstimos externos foram realizados.</p><p>Ao todo foram estabelecidas 31 metas que abrangiam o setor de energia,</p><p>de transporte, de alimentação, de educação, as indústrias de base, e uma meta</p><p>síntese. Devemos ressaltar que os investimentos totais previstos eram de 355</p><p>bilhões de cruzeiros da época, sendo: 43,4% para o setor de energia, 29% para o</p><p>setor de transportes, 20,4% para a indústria de base, 3,2% para o setor alimentício</p><p>e 3,4% para a educação, sendo os gastos com a área social muito pequenos se</p><p>comparados com as outras áreas (PIRES, 2010).</p><p>Essas metas desejavam atacar os pontos de estrangulamento e impedir o</p><p>surgimento de novos na oferta de infraestrutura</p><p>e de bens intermediários. Além</p><p>disso, essas metas foram estabelecidas, também, com o propósito de gerar novos</p><p>investimentos em setores considerados como pontos de germinação, segundo</p><p>Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011). Os autores citam como ponto de</p><p>germinação a construção da nova capital federal da época, Brasília.</p><p>É preciso salientar também que as metas que foram estabelecidas pelo plano,</p><p>incluíam, além do setor público, o setor privado, desejando o desenvolvimento</p><p>de setores tidos como prioritários.</p><p>É possível afirmar que o cumprimento das metas foi satisfatório. Como</p><p>exemplo, o setor têxtil cresceu 34%, o setor alimentício 54% e o setor de materiais</p><p>de transporte 711% (GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011). A</p><p>tabela que se segue mostra os principais resultados do Plano de Metas.</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>14</p><p>TABELA 3 – PLANO DE METAS – EXPANSÃO PREVISTA E RESULTADOS (1957-1961)</p><p>Setor Previsão Realizado %</p><p>Energia elétrica (1.000KW) 2.000 1.650 82</p><p>Carvão (1.000 t) 1.000 230 23</p><p>Produção de petróleo (1.000 barris/</p><p>dia) 96 75 76</p><p>Refino de petróleo (1.000 barris/dia) 200 52 26</p><p>Ferrovias (1.000 km) 3 1 32</p><p>Rodovias – construção (1.000 km) 13 17 138</p><p>Aço (1.000 t) 5 - -</p><p>Cimento (1.000 t) 1.100 650 60</p><p>Carros e caminhões (1.000 unid.) 170 133 78</p><p>Nacionalização de carros (%) 90 75 -</p><p>Nacionalização de caminhões (%) 95 74 -</p><p>FONTE: Giambiagi et al. (2005, p. 36)</p><p>Já na tabela a seguir é possível verificar a taxa de crescimento dos setores. A</p><p>respeito da taxa de crescimento da indústria, é possível afirmar que houve intensa</p><p>diferenciação industrial em um espaço curto de tempo. Pires (2010) afirmam que</p><p>se instalaram no país indústrias automobilísticas, de construção naval, de material</p><p>elétrico pesado e outras de máquinas e equipamentos. Em consonância com esse</p><p>aumento, houve expansão também de indústrias como a siderurgia, a de metais</p><p>não ferrosos, a química, a de petróleo e a de papel e celulose. A respeito do setor</p><p>agropecuário, Pires (2010, p. 137) afirma que “sua participação no PIB caiu de</p><p>23,5% para 17,5%”. Já em relação ao setor de serviços, é importante considerar</p><p>que apresentou um crescimento abaixo da média, de acordo com os autores.</p><p>TABELA 4 – TAXA DE CRESCIMENTO DOS SETORES (1955-1961)</p><p>FONTE: IBGE (apud GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011, p. 367)</p><p>Ano Indústria Agricultura Serviços</p><p>1955 11,1 7,7 9,2</p><p>1956 5,5 -2,4 0</p><p>1957 5,4 9,3 10,5</p><p>1958 16,8 2 10,6</p><p>1959 12,9 5,3 10,7</p><p>1960 10,6 4,9 9,1</p><p>1961 11,1 7,6 8,1</p><p>TÓPICO 1 | SITUAÇÃO INTERNACIONAL E A</p><p>15</p><p>Apesar de satisfatório, no que diz respeito ao cumprimento das metas</p><p>do plano, existiram problemas, principalmente relacionados com a questão do</p><p>financiamento.</p><p>Os investimentos públicos, na ausência de uma reforma fiscal</p><p>condizente com as metas e os gastos estipulados, precisaram ser</p><p>financiados principalmente por meio de emissão monetária [...].</p><p>Percebe-se que, apesar das rápidas transformações provocadas,</p><p>ampliando e diversificando a matriz industrial brasileira, o Plano de</p><p>Metas aprofundou todas as contradições criadas ao longo do processo</p><p>de industrialização por substituição de importações, tornando claros</p><p>os limites do modelo dentro do arcabouço institucional vigente. Por</p><p>outro lado, essa fase do crescimento industrial brasileiro já representa,</p><p>de certa forma, a superação do próprio modelo de substituição de</p><p>importações (GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR,</p><p>2011, p. 368-369).</p><p>Em relação à aceleração da inflação, é possível afirmar que, entre 1955 e</p><p>1958, esta se manteve no patamar de 15%, e chegou a 52% em 1962 (PIRES, 2010).</p><p>Ademais, segundo os autores, no início da década de 1960 a população urbana</p><p>representava 45% do total, população esta que migrou do campo para a cidade para</p><p>trabalhar nas indústrias. Apesar disso, 48% da População Economicamente Ativa</p><p>(PEA), em 1960, exercia trabalho informal. Enquanto os salários mínimos sofreram</p><p>perdas, a concentração de renda só aumentava: “os 50% mais pobres recebiam o</p><p>equivalente a 17,4% da renda, e os 10% mais ricos, 39,6%” (PIRES, 2010, p. 137-138).</p><p>Assim, houve, nesse período, um crescimento acelerado da economia</p><p>brasileira. Contudo, ao mesmo tempo, esse crescimento não foi dividido com</p><p>toda a população, aguçando as tensões sociais.</p><p>16</p><p>Neste tópico, você aprendeu que:</p><p>• Getúlio Vargas foi presidente do Brasil por dois períodos. Primeiramente de</p><p>1930 a 1945, e depois, de 1951 a 1954, ano em que se suicidou.</p><p>• Getúlio Vargas implementou o Processo de Substituição de Importações (PSI),</p><p>processo este que deu início à industrialização brasileira e teve como marco a forte</p><p>intervenção estatal, o protecionismo, a depreciação da moeda local e o controle das</p><p>importações, com vistas ao desenvolvimento da indústria nascente brasileira.</p><p>• Após grande instabilidade política, Juscelino Kubitschek governou o Brasil de</p><p>1956 a 1960, período no qual implementou o Plano de Metas com o slogan “50</p><p>anos de progresso em 5 anos de realizações”, sendo que esse plano pode ser</p><p>considerado um caso bem-sucedido de implementação de planejamento estatal.</p><p>• O período do Plano de Metas foi o auge da industrialização brasileira que se</p><p>iniciou com Getúlio Vargas. O principal objetivo desse plano era estabelecer as</p><p>bases de uma economia industrial madura no país, especialmente aprofundando</p><p>o setor produtor de bens de consumo duráveis.</p><p>RESUMO DO TÓPICO 1</p><p>17</p><p>1 O que é o Processo de Substituição de Importação (PSI)? Sobre qual governo</p><p>o PSI foi implementado?</p><p>2 Quais foram os períodos em que Getúlio Vargas governou o Brasil?</p><p>3 Como era feito o financiamento do governo Vargas para o Processo de</p><p>Substituição de Importações?</p><p>4 Qual era o principal objetivo do Plano de Metas, implementado no Governo</p><p>de JK?</p><p>5 O Plano de Metas era composto por quantas metas? E qual a finalidade</p><p>dessas?</p><p>AUTOATIVIDADE</p><p>18</p><p>19</p><p>TÓPICO 2</p><p>REFORMAS, ENDIVIDAMENTO EXTERNO</p><p>E O MILAGRE ECONÔMICO</p><p>UNIDADE 1</p><p>1 INTRODUÇÃO</p><p>No presente tópico iremos apresentar, em um primeiro momento, as</p><p>principais causas da crise da década de 1960, traçando as ações tomadas pelos</p><p>presidentes João Goulart e Jânio Quadros, as quais não conseguiram reverter o</p><p>cenário de crise, devido ao elevado endividamento externo provocado pelo Plano</p><p>de Metas de Juscelino Kubitschek.</p><p>Podemos afirmar que a década de 1960 foi marcada por muitas mudanças</p><p>na sociedade brasileira, que passou de uma democracia a uma ditadura militar</p><p>autoritária e repressiva em 1964. Em termos econômicos, passa-se por uma</p><p>grave crise econômica nos primeiros anos da década. A partir de 1967, com a</p><p>instauração do PAEG (Programa de Ação Econômica do Governo), a economia</p><p>brasileira é reestruturada por meio de uma série de reformas, resultando em uma</p><p>recuperação econômica iniciada no primeiro triênio dos anos 1960 até o primeiro</p><p>triênio de 1970, quando observa-se o chamado “milagre econômico”.</p><p>2 CRISE POLÍTICA NOS ANOS 60</p><p>Como observado no tópico anterior, o Plano de Metas de JK produziu</p><p>efeitos de crescimento econômico, com realizações importantes no Brasil.</p><p>Contudo, gerou uma crise que acarretou em uma recessão em 1963, quando</p><p>ocorreu a renúncia de Jânio Quadros, a qual resultou na instauração do regime</p><p>militar em 1964.</p><p>Em comparação com o governo de Juscelino Kubistchek, os primeiros</p><p>anos da década de 1960 foram marcados por uma recessão econômica. Pode-se</p><p>considerar esse período, sobretudo a partir de 1963, como a primeira grave crise</p><p>econômica que sofreu o Brasil em sua etapa industrial. Nesses anos, observou-se</p><p>uma redução substancial dos investimentos e da taxa de crescimento da renda</p><p>brasileira. Verificou-se nesse período uma aceleração da inflação, que atingiu a</p><p>marca de 90% em 1964, o que contribuiu para o golpe militar neste ano. Em suma,</p><p>esses dados negativos, observados na economia brasileira nesses anos, foram</p><p>herança das medidas tomadas durante o Plano de Metas, gerando desequilíbrio</p><p>na economia</p><p>(GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>20</p><p>Após oito meses da tomada do poder, Jânio Quadros renunciou em</p><p>um contexto pouco explicado, com a dificuldade enfrentada pelo</p><p>vice, João Goulart, para assumir o poder. A presidência de João</p><p>Goulart foi conturbada, com troca de ministros em várias ocasiões</p><p>até a eclosão do golpe militar (GREMAUD; VASCONCELLOS;</p><p>TONETO JÚNIOR, 2011, p. 374).</p><p>IMPORTANTE</p><p>FONTE: <https://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/POLITICA/459849-</p><p>CONGRESSO-NACIONAL-DEVOLVE-SIMBOLICAMENTE-MANDATO-DO-PRESIDENTE-</p><p>JOAO-GOULART.html>. Acesso em: 14 out. 2018.</p><p>No regime parlamentarista, ao qual foi submetido o ex-presidente João Goulart, o</p><p>presidente tem suas funções limitadas, pois, nesse momento, os militares utilizavam o veto</p><p>para reduzir o poder do presidente na época, que foi considerado comunista.</p><p>FIGURA - JOÃO GOULART</p><p>Durante o governo Jânio Quadros existiam muitos problemas, pois era</p><p>preciso sanear os passivos externos e internos pela administração de JK. Para</p><p>ilustrarmos os problemas da economia brasileira no começo da década de 1960</p><p>podemos destacar que somente em atrasados comerciais, em coberturas de</p><p>Promessas de Venda de Câmbio (PVC) e em serviços da dívida foram pagos,</p><p>em 1961, aproximadamente U$S 1,5 bilhão. Observava-se também um aumento</p><p>contínuo do nível de preços na economia (REGO; LACERDA; MARQUES, 2013).</p><p>Portanto, Jânio Quadros assumiu com duas metas definidas: eliminar a</p><p>inflação e pagar a dívida externa contraída no governo anterior. Nesse sentido,</p><p>para resolver o problema do estrangulamento do setor externo, o governo Jânio</p><p>atuou em duas frentes: i) a reforma no sistema de câmbio, com base na Instrução</p><p>TÓPICO 2 | REFORMAS, ENDIVIDAMENTO EXTERNO E O MILAGRE ECONÔMICO</p><p>21</p><p>n° 204 da SUMOC (Superintendência da Moeda e do Crédito), que promovia uma</p><p>unificação cambial; e ii) as tentativas de renegociação da dívida externa. Essas</p><p>medidas foram tomadas para combater os déficits no Balanço de Pagamentos e o</p><p>déficit fiscal do governo (REGO; LACERDA; MARQUES, 2013).</p><p>Para atingir seus objetivos, Jânio Quadros inaugura um pacote econômico</p><p>ortodoxo, ou seja, conservador, que incluía algumas ações, sendo elas: i) a</p><p>desvalorização cambial (100%), para incentivar as exportações e atrair dólares;</p><p>ii) a redução do gasto público, para controlar as contas do governo; e iii) uma</p><p>política monetária restritiva, para controlar o índice de preços na economia.</p><p>IMPORTANTE</p><p>Quando falamos em políticas ortodoxas, nos referimos às medidas tomadas pelo</p><p>governo com conservadorismo, isto é, práticas mais tradicionais para atingir os objetivos</p><p>do governo de combater a inflação e promover o desenvolvimento econômico. Dentro</p><p>dessas medidas ortodoxas contracionistas, com vistas à garantia do combate à inflação, por</p><p>exemplo, incluem-se a redução dos gastos públicos, a redução do crédito ao consumidor, o</p><p>aumento dos juros e a expansão da carga tributária. Essas medidas promovem uma redução</p><p>da liquidez na economia, ou seja, da oferta de moeda. Já as medidas ortodoxas expansionistas</p><p>serviriam para aumentar a quantidade de moeda na economia, como a expansão do crédito</p><p>ou o aumento dos gastos públicos. Por outro lado, a heterodoxia envolve práticas políticas</p><p>menos usuais, como o congelamento de preços, realizado na economia no final da década</p><p>de 1980 para combater a inflação.</p><p>Com relação aos resultados do governo de Jânio podemos adiantar que,</p><p>a partir das medidas de combate ao câmbio múltiplo e dos programas de ajuste</p><p>fiscal, expandiram a confiança dos credores internacionais e a visão externa.</p><p>O governo cumpriu as metas de corte de gastos no começo do ano, porém os</p><p>gastos públicos se expandiram em agosto. Devido aos resultados negativos</p><p>de suas decisões, Jânio Quadros não conseguiu levar adiante sua estratégia</p><p>econômica e promoveu uma mudança na orientação da política econômica</p><p>(REGO; LACERDA; MARQUES, 2013).</p><p>Assim, ocorreram mudanças nos rumos da política econômica de</p><p>Jânio Quadros, que passou de conservadora e reducionista à expansionista.</p><p>Nesse momento, não existiam instituições necessárias para executar a política</p><p>macroeconômica corretamente, como o Banco Central, que foi criado nos anos</p><p>seguintes, e existiam poucos instrumentos de política macroeconômica para o</p><p>governo atingir seus objetivos (REGO; LACERDA; MARQUES, 2013).</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>22</p><p>IMPORTANTE</p><p>As políticas macroeconômicas são aquelas adotadas pelo governo para atingir</p><p>seus objetivos econômicos, sendo que os principais são gerar crescimento econômico</p><p>e controlar o aumento de preços na economia (inflação). As políticas macroeconômicas</p><p>são: i) a fiscal, relacionada aos gastos públicos e às fontes de financiamento do governo</p><p>(impostos); ii) a monetária, referente à oferta de moeda e crédito na economia e iii) a cambial,</p><p>relativa à administração da taxa de câmbio e da quantidade de moeda estrangeira (divisas) na</p><p>economia. A política macroeconômica pode ser expansionista, quando busca-se aumentar a</p><p>liquidez para promover emprego e crescimento, ou contracionista, quando deseja-se reduzir</p><p>a liquidez na economia (quantidade de moeda), com vistas a combater a inflação.</p><p>Na primeira fase de seu governo o presidente Jânio Quadros buscou</p><p>aumentar a credibilidade externa e, na segunda etapa, visava alcançar crescimento</p><p>econômico. Além disso, ele expandiu os gastos públicos porque sofreu pressão por</p><p>parte do empresariado industrial. Essas medidas não surtiram o efeito esperado,</p><p>havendo queda de crescimento, o que levou Jânio Quadros à renúncia (REGO;</p><p>LACERDA; MARQUES, 2013).</p><p>João Goulart assumiu em setembro de 1961 e, entre esse mês e janeiro</p><p>de 1963, três gabinetes parlamentares foram formados, mas nenhum conseguiu</p><p>implementar políticas consistentes. Em 1961 a inflação estava em 33,2% ao ano e,</p><p>no ano seguinte (1962), ela chegou a 45,5% ao ano.</p><p>O presidente João Goulart indicou o economista Celso Furtado para ser seu</p><p>Ministro da Fazenda, mas este não conseguiu ter bons resultados em suas ações. O</p><p>economista adotou políticas anti-inflacionárias, ortodoxas, com redução de gastos e</p><p>da liquidez. A população reagiu negativamente à queda dos salários e ao aumento</p><p>dos preços. A tentativa de estabilização fracassou e provocou crescimento negativo</p><p>do PIB per capita: a economia cresceu 6,6% em 1962, mas apenas 0,6% em 1963, com</p><p>inflação de 83,25% (REGO; LACERDA; MARQUES, 2013).</p><p>O chamado Plano Trienal, de Celso Furtado, consistia em uma política</p><p>de desenvolvimento planejada para o triênio 1963/65 e tinha os seguintes</p><p>objetivos: 1) Garantir uma taxa de crescimento em 7%; 2) reduzir a inflação; 3)</p><p>criar condições para a distribuição de renda, 4) aprofundar a ação do governo</p><p>no campo educacional, da pesquisa científica e tecnológica e da saúde pública;</p><p>5) diminuir desigualdades regionais; 6) desenvolver mudanças institucionais; 7)</p><p>solucionar a questão da dívida externa; e 8) orientar os investimentos públicos.</p><p>Os investimentos planejados para a economia para o triênio 1963-65 foram</p><p>de 3,5 trilhões de cruzeiros, com elevação da renda per capita de US$ 323,00</p><p>em 1962 para US$ 363,00 em 1965. Nesse sentido, esperava-se que a indústria</p><p>produzisse mais de 70% dos bens de capital de que a economia necessitava para</p><p>manter um crescimento sustentado de 7%.</p><p>TÓPICO 2 | REFORMAS, ENDIVIDAMENTO EXTERNO E O MILAGRE ECONÔMICO</p><p>23</p><p>Ocorreram muitas lutas sindicais, promovendo a manutenção dos salários</p><p>e diminuindo os lucros das empresas, que não cresceram. Assim, o Plano Trienal</p><p>não obteve êxito nos seus propósitos, o que não significa que ele não tenha sido</p><p>bem elaborado. Contudo, o que impediu seu sucesso foi a falta de sustentação</p><p>política, o que promoveu também a redução do Investimento Externo Direto (IED</p><p>– entrada de empresas estrangeiras) no Brasil e a</p><p>desaceleração do PIB (REGO;</p><p>LACERDA; MARQUES, 2013).</p><p>Como consequência do fracasso de seu plano, em julho de 1963, Furtado</p><p>deixou o governo. Ademais, o fim do governo João Goulart levou ao golpe militar.</p><p>Verificando-se que um período de intenso crescimento do PIB entre 1956 e 1962</p><p>foi interrompido. Nesse sentido, a desaceleração da economia persistiu até 1967.</p><p>A inflação atingiu a casa de 90% em 1964, mostrando os problemas econômicos</p><p>no momento prévio do golpe militar.</p><p>Podemos apontar que a crise da década de 1960 demonstrou a contradição</p><p>entre dois modelos: i) o modelo nacional-desenvolvimentista, baseado no controle</p><p>nacional sobre a economia, na expansão do mercado interno e na atuação maior</p><p>do Estado e na concessão de mais direitos à população; e ii) o modelo mais</p><p>aberto ao capital, sustentado no consumo de elite, no desenvolvimento do setor</p><p>de bens duráveis, na concentração de renda e na monopolização, promovendo</p><p>agravamento das dificuldades externas. A crise indicava o esgotamento das</p><p>Políticas de Substituição de Importações (PSI) (GREMAUD; VASCONCELLOS;</p><p>TONETO JÚNIOR, 2011, p. 374).</p><p>De acordo com Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011, p. 372):</p><p>Muitas são as explicações para essa crise [...]. Podemos dividir tais</p><p>explicações em quatro grandes grupos, dependendo de qual peso</p><p>a explicação atribui a fatores políticos ou econômicos, conjunturais</p><p>ou estruturais. Obviamente que, naquele momento, dependendo da</p><p>explicação que era dada para a crise, soluções diferentes também</p><p>eram propostas.</p><p>QUADRO 1 – A CRISE DOS ANOS 60 E SUAS EXPLICAÇÕES</p><p>FONTE: Gremaud, Vasconcellos e Toneto Júnior (2011, p. 372)</p><p>Crises Conjunturais Estruturais</p><p>Políticas Instabilidade política Crise do populismo</p><p>Econômicas Política econômica</p><p>recessiva de combate</p><p>à inflação</p><p>1- Estagnacionismo – crise do PSI</p><p>2- Crise cíclica endógena de uma economia</p><p>industrial</p><p>3- Inadequação institucional</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>24</p><p>IMPORTANTE</p><p>O populismo esteve presente na política brasileira em alguns momentos, como</p><p>durante o governo Getúlio Vargas. Segundo Bobbio, Matteucci e Pasquino, em seu Dicionário</p><p>de Política (1998, p. 980), “populistas são as fórmulas políticas cuja fonte de inspiração central</p><p>é o povo, o qual é considerado um agregado social homogêneo”.</p><p>O governo de Getúlio Vargas era considerado populista por basear-se no clamor</p><p>popular, ao conceder direitos trabalhistas e buscar apoio popular para as suas políticas</p><p>nacionalistas de desenvolvimento econômico. Segundo Santos (2015, p. 47): “A ideologia</p><p>desenvolvimentista populista institucionalizava o poder político das forças populares,</p><p>incorporando a emergência das massas no jogo político nacional”.</p><p>No primeiro quadrante do quadro anterior, observam-se as explicações</p><p>que levam em conta elementos políticos para desvendar as causas da crise</p><p>da década de 1960. Nesse cenário, verificava-se uma “profunda instabilidade</p><p>política, com a eleição de Jânio Quadros, que contava como vice um candidato de</p><p>uma coligação rival (João Goulart, considerado comunista), revelando os desafios</p><p>enfrentados naquele momento político” (GREMAUD; VASCONCELLOS;</p><p>TONETO JÚNIOR, 2011, p. 372).</p><p>Outro aspecto político que promoveu a recessão dos anos 1960 foi a crise</p><p>do populismo, devido à falta da capacidade dos governantes de “incorporar</p><p>as novas massas urbanas como base de apoio político sem, no entanto, que as</p><p>concessões utilizadas para tal incorporação fossem exageradas do ponto de vista</p><p>patronal” (GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011, p. 373).</p><p>Assim, se o governo concedia muitos direitos trabalhistas para cativar o povo, os</p><p>empresários ficavam insatisfeitos e questionavam o governo.</p><p>Em termos econômicos conjunturais, podemos apontar que os resquícios</p><p>deixados pelo governo de JK foram decisivos para a adoção de uma política econômica</p><p>restritiva com vistas a combater a inflação. Outras visões de cunho econômico, mas</p><p>estruturais, são visões estagnacionistas, que estavam associadas ao esgotamento do</p><p>processo de substituição de importações, pois, para que o crescimento continuasse,</p><p>era necessário desenvolver o setor de bens de capital, o que não ocorreu no Brasil</p><p>(GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO JÚNIOR, 2011).</p><p>Outra corrente defendia que a crise de 1960 era “uma crise cíclica endógena</p><p>típica da economia industrial ou capitalista” (GREMAUD; VASCONCELLOS;</p><p>TONETO JÚNIOR, 2011, p. 372), que estava relacionada a uma “desaceleração</p><p>dos investimentos em bens de capital” (GREMAUD; VASCONCELLOS; TONETO</p><p>JÚNIOR, 2011, p. 372) Ou seja, era vista como uma crise normal vivenciada por</p><p>todas as economias capitalistas em algum momento.</p><p>TÓPICO 2 | REFORMAS, ENDIVIDAMENTO EXTERNO E O MILAGRE ECONÔMICO</p><p>25</p><p>Outro elemento que foi interpretado como uma explicação para a crise era</p><p>a necessidade de reformas institucionais para novos investimentos, pois faltavam</p><p>mecanismos de desenvolvimento adequados no setor público e no privado. Esses</p><p>problemas foram resolvidos no PAEG, que será estudado a seguir.</p><p>3 A DITADURA MILITAR E O PAEG (1964-1967)</p><p>Como visto no item anterior, a crise dos anos 1960 resultou, entre vários</p><p>motivos, “de uma polarização entre distintos interesses representados na</p><p>sociedade brasileira” (PIRES, 2010, p. 161). Uma elite militar que representava o</p><p>interesse dos latifundiários organizou-se para dar o golpe militar, rompendo com</p><p>a ordem legal, em 1º de abril de 1964, com apoio dos EUA.</p><p>Além do setor militar, pode-se afirmar que alguns grupos de civis tinham</p><p>interesse na instauração da ditadura, como pequenos e grandes empresários</p><p>nacionais e representantes de empresas estrangeiras. A classe burguesa industrial</p><p>no Brasil apoiou o golpe para conter a concessão de direitos trabalhistas no país.</p><p>Durante todo o governo militar (1964-1985), a diferença entre os interesses dos</p><p>grupos foi responsável por uma falta de coerência na política econômica do</p><p>período. A primeira ação dos grupos militares foi o Programa de Ação Econômica</p><p>Geral, que buscava “não assegurar o desenvolvimento econômico da nação</p><p>como os planos econômicos adotados anteriormente, mas promover um ajuste</p><p>estrutural, tão necessário à economia brasileira no período” (PIRES, 2010, p. 161).</p><p>O PAEG foi elaborado pelo Ministério do Planejamento e da Coordenação</p><p>Econômica, na figura de Roberto Campos, no governo Castelo Branco. Um dos</p><p>objetivos principais do Programa era reduzir a inflação, que passou de 90% em</p><p>1964 para 30% em 1967. O PAEG representou um conjunto de transformações</p><p>institucionais impostas ao país, reforma bancária e tributária. Baseava-se em uma</p><p>política econômica que garantia investimentos produtivos públicos e privados,</p><p>que eram essenciais ao crescimento econômico do Brasil. Os princípios centrais</p><p>do PAEG eram a retomada do desenvolvimento experimentado no Plano de</p><p>Metas, a estabilidade de preços, a qual era uma prioridade, a atenuação dos</p><p>desequilíbrios regionais e a correção do Balanço de Pagamentos, garantindo o</p><p>equilíbrio das nossas contas externas.</p><p>IMPORTANTE</p><p>O que é o Balanço de Pagamentos de uma economia?</p><p>O Balanço de Pagamentos (BP) é o registro contábil das transações econômicas,</p><p>durante um dado período, entre os seus residentes (que tem o país como centro de interesse)</p><p>e os residentes do resto do mundo.</p><p>UNIDADE 1 | ECONOMIA BRASILEIRA PÓS SEGUNDA GUERRA MUNDIAL À CRISE DO MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÃO</p><p>26</p><p>O BP é dividido em duas grandes contas: a conta corrente, formada pela Balança</p><p>Comercial (exportações menos exportações), a Conta Serviços e Rendas (entram os</p><p>pagamentos dos juros da dívida externa), a Conta Transferências Unilaterais (as doações que</p><p>o país recebe ou envia) e a conta capital, que representa o passivo externo da economia, ou</p><p>seja, os recursos que ela paga da dívida externa, capital de curto prazo que sai da economia</p><p>e Investimento Externo Direto. Para que uma economia seja saudável, o BP deve estar</p>

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