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Wilton Rezende de Freitas Edileuza Pereira Silva Julio Cesar Franco Sérgio Querino Antunes Economia brasileira contemporânea Catalogação elaborada pelo Setor de Referência da Biblioteca Central Uniube Freitas, Wilton Rezende de. F884e Economia brasileira contemporânea / Wilton Rezende de Freitas, Edileuza Pereira Silva, Julio Cesar Franco, Sérgio Querino Antunes. – Uberaba: Universidade de Uberaba, 2020. 188 p. : il. Programa de Educação a Distância – Universidade de Uberaba. Inclui bibliografia. ISBN 978-85-7777-927-7 1. Economia – Brasil. 2. Industrialização – Brasil. 3. Brasil – Comércio exterior. I. Silva, Edileuza Pereira. II. Franco, Julio Cesar. III. Antunes, Sérgio Querino. IV. Universidade de Uberaba. Programa de Educação a Distância. V. Título. CDD 330.0981 © 2020 by Universidade de Uberaba Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Universidade de Uberaba. Universidade de Uberaba Reitor Marcelo Palmério Pró-Reitor de Educação a Distância Fernando César Marra e Silva Coordenação de Graduação a Distância Sílvia Denise dos Santos Bisinotto Editoração e Arte Produção de Materiais Didáticos-Uniube Revisão textual Erlane Silva Nunes Diagramação Douglas Silva Ribeiro Ilustrações Getty Images. Acervo Uniube Projeto da capa Agência Experimental Portfólio Edição Universidade de Uberaba Av. Nenê Sabino, 1801 – Bairro Universitário Wilton Rezende de Freitas Especialização em Finanças e Controladoria pela Faculdade de Ciências Econômicas do Triângulo Mineiro (FCETM). Graduação em Administração pela Universidade de Uberaba (Uniube). Professor das disciplinas na área de gestão, tais como Gestão Estratégica, Gestão da Produção, Macroeconomia, Gestão da Logística e Gestão de Materiais na Universidade de Uberaba (Uniube). Edileuza Pereira Silva Mestrado em Desenvolvimento Econômico pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Graduação em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Professora nas áreas de Introdução à Economia, Economia do Meio Ambiente e Comércio Internacional na Faculdade de Ciências Econômicas do Triângulo Mineiro (FCETM). Coordenadora do Curso de Ciências Econômicas da Faculdade de Ciências Econômicas do Triângulo Mineiro. Júlio Cesar Franco Especialização em Gestão Empresarial pela Fundação Getulio Vargas (FGV/RJ). Graduação em Comunicação Social – Publicidade e Propaganda – pela Universidade de Uberaba (Uniube). Sérgio Querino Antunes Mestrado em Educação pela Universidade de Uberaba (Uniube). MBA em Gestão Empresarial e Especialização em Administração Financeira e Controladoria pelo Instituto Nacional de Pós-Graduação (INPG). Sobre os autores Graduação em Administração de Empresas pela Universidade de Uberaba (Uniube). Graduação em Ciências Contábeis pela Universidade de Uberaba (Uniube). Professor nos cursos de Administração e Ciências Contábeis da Universidade de Uberaba (Uniube). Sumário Apresentação .............................................................................................................VII Capítulo 1 Industrialização no Brasil: constituição, auge e declínio do modelo de substituição de importações.......................... 1 1.1 A formação industrial brasileira e o modelo de substituição de importações ......... 4 1.2 Esgotamento do modelo de substituição de importações .................................... 16 Capítulo 2 O Brasil e a nova ordem mundial .......................................35 2.1 Crise dos anos 1980 e planos de combate à inflação .......................................... 38 2.2 Combate à inflação no Brasil nos anos 1990 ........................................................ 51 2.3 O Brasil e as transformações na economia mundial ............................................. 60 2.4 O Brasil e as crises financeiras internacionais ...................................................... 74 Capítulo 3 A era Fernando Henrique Cardoso e o Plano Real ...........87 3.1 Governo FHC: contexto histórico .......................................................................... 89 3.2 Governo FHC: características principais ............................................................... 92 3.3 Considerações finais............................................................................................ 107 Capítulo 4 De Lula a Temer: os desafios da economia brasileira no século XXI ....................................................................111 4.1 Governo Lula: dos avanços socioeconômicos aos escândalos de corrupção ... 114 4.1.1 Do PSDB ao PT: uma nova perspectiva de poder .................................... 114 4.1.2 Características políticas, sociais e econômicas do Governo Lula ............ 117 4.1.3 Os escândalos de corrupção ..................................................................... 123 4.2 Governo Dilma Rousseff: a trilha do impeachment ............................................. 125 4.2.1 A primeira mulher presidente do Brasil ...................................................... 125 4.2.2 Características políticas, sociais e econômicas do Governo Dilma .......... 126 4.3 Governo Michel Temer: o que mudou no país em dois anos e meio de governo? .............................................................................................................. 130 4.4 Considerações finais............................................................................................ 131 Capítulo 5 Fundamentos do comércio exterior .................................135 5.1 Políticas do comércio exterior no Brasil .............................................................. 138 5.1.1 Redução dos níveis de proteção ............................................................... 148 5.1.2 A divergência de enfoques aplicados ao caso brasileiro ........................... 151 5.1.3 O debate político da abertura comercial .................................................... 154 5.1.4 Alguns resultados da política comercial nos anos 1990 ............................ 156 5.1.5 Especialização no mercado internacional ................................................. 157 5.1.6 Produtividade ............................................................................................. 160 5.1.7 Ciência e tecnologia ................................................................................... 161 5.1.8 Comércio exterior ....................................................................................... 162 5.2 Crescimento econômico ...................................................................................... 165 5.2.1 Distribuição de renda e emprego ............................................................... 167 5.3 Sistema administrativo (Siscomex) ..................................................................... 169 Prezado(a) aluno(a), é um prazer tê-lo(a) conosco. Este é o livro que servirá de base para seus estudos sobre economia brasileira contemporânea! Em disciplinas anteriores, você estudou a economia sobre duas perspectivas: a microeconomia e a macroeconomia. Nesses estudos, conheceu o conceito de economia e a sua importância na gestão das empresas e do bem público. Continuaremos, neste livro, com o estudo da economia no Brasil, mas sob uma ótica histórica. Você, certamente, já leu ou ouviu falar sobre fatos como: a queima das sacas de café promovida pelo governo brasileiro na primeira metade do século XX para garantir a competitividadedo café brasileiro na economia global, o boom industrial instituído pelo governo Vargas, o plano de metas criado por JK, que tinha por ambição fazer com que o Brasil crescesse 50 anos em 5. A história econômica do Brasil é rica e foi determinante para a situação atual de nosso país e, por conseguinte, de nossas empresas. O presente livro compõe-se de cinco capítulos. A seguir, você terá uma breve síntese do conteúdo a ser abordado em cada um dos capítulos. Os capítulos 1 e 2 abordam os principais fatos históricos da economia brasileira ocorridos durante o século XX, com ênfase na temática da industrialização no Brasil, bem como na inserção do Brasil no mercado Apresentação mundial a partir do neoliberalismo dos anos 90. Nesse contexto também será feito uma análise sobre a papel do Brasil no cenário de crises mundiais. Seguindo a trajetória, os capítulos 3 e 4 abordam nossa história econômica recente, com uma análise dos governos FHC, Lula, Dilma e Temer. Serão abordadas temáticas que envolvem a economia como viés para a análise política governamental. Por fim, o capítulo 5 faz uma introdução às políticas do comércio exterior no Brasil. Você conhecerá os modelos de apoio governamental e as relações comerciais externas, que possuem o intuito de promoção do bem-estar social e crescimento econômico do país. O objetivo desta disciplina é compreender a importância da relação entre política e economia no desenvolvimento do nosso país. Questões fundamentais da economia interferem diretamente nas ações do Estado. E cabe ao profissional das Ciências Sociais e Humanas compreender tais relações para compor sua análise teórica das políticas contemporâneas. Desejamos-lhe uma produtiva leitura e um excelente aprendizado! Edileuza Pereira Silva / Wilton Rezende de Freitas Introdução Em algum momento de seus estudos, ou de sua vida, você já parou para refletir a respeito das origens dos problemas brasileiros em relação a inflação, balanço de pagamentos, distribuição de renda, estrutura industrial, entre outros? Já se perguntou de que maneira a situação econômica do país pode influenciar a atuação das empresas, ainda que situadas em pequenos municípios? Às vezes temos a impressão de que acontecimentos nacionais, ou macroeconômicos, não nos afetariam em nossos pequenos redutos. Todavia, é engano imaginar que o quadro inflacionário do país, ou o atraso tecnológico das estruturas produtivas, ou, Industrialização no Brasil: constituição, auge e declínio do modelo de substituição de importações Capítulo 1 ainda, a forma de endividamento do governo não afetam nossa vida, nossos negócios e nosso trabalho. Nesse contexto é que se insere o estudo que iniciaremos agora a respeito da economia brasileira contemporânea. O estudo do quadro atual da economia brasileira envolve o entendi- mento de questões importantes do nosso processo de formação econômica . Nesse sentido, é de extrema importância descrever e analisar o modelo de industrialização do Brasil, com seus avanços e retrocessos. Pensando em apresentar um conjunto de informações e análises que possa auxiliá-lo posteriormente a entender os porquês de muitas características atuais da economia brasileira, dividimos este capítulo em dois itens principais: a) formação industrial brasileira e o modelo de substitu- ição de importações – nesse tópico apresentaremos os aspectos básicos da industrialização brasileira, baseada na substituição de produtos, antes importados, por outros fabricados em território nacional; b) esgotamento do modelo de substituição de impor- tações brasileira – esse item apresenta os resultados dessa estratégia de industrialização e os elementos que conduziram ao seu esgotamento. Ao fim desse 2 UNIUBE processo, o Brasil passa a ser considerado, do ponto de vista técnico e prático, uma nação industrializada, mas com sérios problemas que a conduzirão a uma grave crise nos anos 1980. Bons estudos! Objetivos Esperamos que, ao terminar o estudo deste capítulo, você seja capaz de: • descrever a formação industrial brasileira; • analisar o modelo de substituição de importações; • discutir os avanços e retrocessos no processo de indus- trialização no Brasil. Para alcançar esses objetivos, você deverá ler atentamente este capítulo e desenvolver as atividades propostas. Esquema 1.1 A formação industrial brasileira e o modelo de substituição de importações 1.2 Esgotamento do modelo de substituição de importações UNIUBE 3 1.1 A formação industrial brasileira e o modelo de substituição de importações Prezado(a) aluno(a), começaremos agora o estudo da economia brasileira contemporânea, adotando como ponto de partida os primórdios da in- dustrialização nacional. Desse modo, você terá a oportunidade de saber como a indústria, no Brasil, surgiu e se desenvolveu. De maneira geral, pode-se dizer que a indústria no Brasil teve seu início no final do século XIX, com a produção de bens destinados ao mercado consumidor interno. Até então, a característica fundamental da economia nacional era a produção concentrada em poucos produtos, de origem agrícola ou pecuária, destinados ao mercado externo. Por outro lado, a demanda interna era suprida por vários tipos de bens manufaturados importados. Uma vez que a maior parte da produção nacional destinava- -se às exportações, a capacidade para importar dependia diretamente dos preços e das quantidades dos produtos exportados no mercado internacional . Nesse contexto, a geração de renda na economia brasileira dependia do comportamento da demanda externa por nossos produtos. Como a maior parte das atividades produtivas internas estava ligada ao setor exportador, pode-se dizer que o dinamismo da economia nacional era definido pelo setor externo. Tal quadro prevaleceu até a crise de 1929, a chamada Grande Depressão, quando a demanda internacional por produtos brasileiros, principal- mente o café, apresentou uma brusca redução. Grande Depressão Crise econômica mundial iniciada nos Estados Unidos em 24 de outubro de 1929, a chamada Quinta-Feira Negra, com a quebra da Bolsa de Valores de Nova York. 4 UNIUBE Como resultado, ocorreu o que se conhece na literatura especializada como um movimento de reversão do centro dinâmico da economia nacio- nal, ou seja, a partir de então o elemento determinante do nível de renda da economia brasileira passou a ser o mercado interno, com destaque para a produção industrial, em substituição à produção agrícola. A reversão no centro dinâmico pode ser visualizada quando se apresen- tam os dados do valor adicionado à economia pelas produções industrial e agrícola no período: • entre 1928 e 1929, a agricultura era responsável por 52,5% do valor adicionado na economia, enquanto a indústria respondia por apenas 22,7% desse total; • entre 1940 e 1945, tal quadro havia se modificado – a indústria rep- resentava 36,1% de todo o valor adicionado na economia e o setor agrícola havia reduzido sua participação para 37,1%. Perceba que o carro-chefe da economia nacional, até a década de 1930, era a agricultura. Após a Grande Depressão, a agricultura cedeu espaço para a indústria como forma de evitar importações e estimular o consumo interno de produtos “genuinamente” nacionais. Tal deslocamento esteve diretamente relacionado ao modo como o presi- dente brasileiro da época, Getúlio Vargas, reagiu à crise. A fim de evitar que houvesse uma propagação do problema para todas as atividades da economia, o governo promoveu uma política que visava manter o nível de renda do setor exportador, o que teve como consequência a manutenção da demanda. UNIUBE 5 É famosa na história brasileira a queima de café promovida por Getúlio Vargas. Você já leu sobre esse fato? Se não leu ou quer conhecê-lo melhor, pesquise notícias, documentários e artigos sobre ele, o que com certeza enriquecerá seuaprendizado! SAIBA MAIS Para facilitar a sua pesquisa sobre a história da queima de café, sugerimos a leitura de um artigo da revista Veja, disponível na Internet (<http://veja. abril.com.br/historia/crash-bolsa-nova-york/brasil-crise-do-cafe-exportacoes- falencias.shtml>), de outubro de 1929, intitulado A bola da vez?. Ele relata a ocasião da quebra da Bolsa de Nova York e da crise do café no Brasil. Ao término da matéria, há um vídeo da época (1929) que retrata a queima de sacas de café pelo governo brasileiro como forma de aumentar seu preço no mercado. Assista-o. Por fim, anote as ideias principais deste estudo e socialize com seus colegas. Entre os instrumentos políticos adotados pelo governo brasileiro para minimizar os impactos da crise global, tivemos a emissão de moeda doméstica. Ao comprar o café dos produtores, o governo fazia com que fossem mantidos o emprego e a renda de muitas pessoas que continuavam a consumir, evitando o fechamento de muitos estabelecimentos ligados ao setor de café. O governo também promoveu uma política de desvalorização cambial, a fim de tornar o café atrativo no mercado internacional. A consequência de tal ação foi o encarecimento dos produtos es- trangeiros no mercado interno, o que gerou outro SAIBA MAIS Para facilitar a sua pesquisa sobre a história da queima de café, sugerimos a leitura de um artigo da revista Veja, disponível na Internet (<http://veja. abril.com.br/historia/crash-bolsa-nova-york/brasil-crise-do-cafe-exportacoes- falencias.shtml>), de outubro de 1929, intitulado A bola da vez?. Ele relata a ocasião da quebra da Bolsa de Nova York e da crise do café no Brasil. Ao término da matéria, há um vídeo da época (1929) que retrata a queima de sacas de café pelo governo brasileiro como forma de aumentar seu preço no mercado. Assista-o. Por fim, anote as ideias principais deste estudo e socialize com seus colegas. Taxa de câmbio desvalorizada O valor da taxa de câmbio é alto e a moeda nacional está enfraquecida em relação à moeda estrangeira. 6 UNIUBE problema, uma vez que boa parte da demanda era atendida pelas im- portações. A solução era recorrer aos produtos nacionais, atrativos por seus preços, que passaram a ter o papel de substituir os produtos manufaturados antes importados. Assim, tem início o modelo brasileiro de industrialização conhecido como substituição de importações. Cabe destacar que a produção interna de bens antes importados não pôs fim às importações nem teve como objetivo direto reduzi-las. Na ver- dade, ocorreu exatamente o oposto. O avanço do processo de substituição de importações aumen- tou o valor das compras externas em virtude da necessidade de se importar bens que antes não eram importados, como é o caso de bens inter- mediários e de bens de capital. A princípio, a produção aproveitou-se de capacidade produtiva ociosa existente nos setores produtores de bens consumidos internamente. Todavia, essa capacidade era pequena e, assim que ela se esgotou, recorreu-se à importação de máquinas e equipamentos, inclusive alguns de empresas estrangeiras que haviam falido com a crise. De modo geral, a industrialização por substituição de importações podia ser definida como um processo de industrialização fechado, que atendia a estímulos advindos do setor externo, mais especificamente desequilíbrios ou estrangulamentos externos, sendo realizado em etapas sucessivas. Bens intermediários Os bens que são agregados ou transformados na produção de outros bens e são consumidos totalmente no processo produtivo. São matérias- -primas, insumos e componentes. Bens de capital Bens utilizados na fabricação de outros bens e que não se desgastam totalmente no processo produtivo. É o caso de máquinas, equipamentos e instalações. Capacidade ociosa Capacidade produtiva existente na economia, mas não utilizada. UNIUBE 7 Além disso, apresentava, a princípio, um caráter extremamente nacio- nalista. Entendamos cada uma dessas características. Em primeiro lugar, a industrialização apresentava caráter fechado porque era voltada ao mercado consumidor interno. Além disso, em razão de ser uma indústria em fase inicial de implantação, dependia de medidas protecionistas que favorecessem seus produtores em relação aos con- correntes externos. No que diz respeito ao estímulo do desequilíbrio ou estrangulamento ex- terno, a substituição de importações ocorre, a princípio, em razão de uma restrição do mercado externo. Dada a redução do valor das exportações, houve uma diminuição na geração das divisas necessárias à importação de bens industrializa- dos importantes para a manutenção do padrão interno de consumo, que foi mantido pela política governamental de proteção ao setor cafeeiro. Para solucionar o estran- gulamento externo, adotaram-se medidas que acabaram favorecendo a indústria nacional já existente, como o caso da desvalorização do câmbio, da elevação das tarifas de importação, entre outros, gerando grandes oportunidades para os empresários brasileiros realizarem investimentos altamente lucrativos. Assim, ocorreu uma série de investimentos na in- dústria, a fim de substituir importações, aumentando a renda nacional e a demanda agregada. Todavia, o aumento da demanda traduziu-se novamente em aumento das importações, fosse de maneira direta, pela compra de bens indus- trializados, fosse pela ampliação dos investimentos que necessitavam de equipamentos e matérias-primas importados. Como o ritmo de cres- Divisa Moeda estrangeira. 8 UNIUBE cimento das importações é em geral mais rápido do que o crescimento das exportações, nova crise recolocou-se, retomando-se o processo. Assim, os estrangulamentos ou desequilíbrios externos eram um ele- mento que estimulava e, ao mesmo tempo, limitava a evolução do pro- cesso de substituição de importações. A industrialização, em substituição às importações, ocorreu em etapas sucessivas, e, em cada uma delas, um setor industrial era o mais atin- gido. O primeiro setor a se desenvolver foi o de bens de consumo não duráveis, seguido pelo setor de bens intermediários e pelo de bens de capital. Tal sequência gerava problemas de de- manda entre setores. É importante ter em mente que, uma vez que a produção depende de bens intermediários e de bens de capital, essa demanda precisava ser suprida por meio de importações. É preciso que se faça aqui uma ressalva. O desenvolvimento de um dos setores não era completamente isolado dos demais; ou seja, havia sem- pre o crescimento dos demais setores, mas em uma proporção menor. Por fim, a substituição de importações caracterizava-se pela ideia de “construção nacional”; ou seja, alcançar o desenvolvimento e a autonomia com base na industrialização, de forma a superar as restrições externas e a tendência à especialização na exportação de produtos primários. É importante ressaltar também, em todo esse quadro, que o Estado passou a desempenhar, a partir dos anos 1930, com o início do governo de Getúlio Vargas, papel crucial no estímulo ao processo de industrialização. Após Bens de consumo não duráveis Incluem-se nesse setor bens como calçados, alimentos, bebidas, têxteis, entre outros. UNIUBE 9 a Segunda Guerra Mundial, tal participação tornou-se mais articulada, traduzindo-se na criação de órgãos de regulação, controle e planejamento das atividades econômicas do país. Afinal, Getúlio Vargas era seguidor do, então em evidência, John Keynes , papa da macroeconomia, que defendia a intervenção do governo no mercado como forma de assegurar o pleno emprego de recursos. Como resultado prático de intervenção estatal no setor industrial nesse período, citam-se a criação da Companhia Siderúrgica Nacional, em 1942; do Conselho Nacional do Petróleo, em 1940; da Companhia Vale do Rio Doce, em 1943; e da Companhia Nacional de Álcalis, em 1944. Perceba que as empresascriadas estavam todas ligadas à indústria de bens intermediários, importante elo da cadeia produtiva ainda deficiente no país. Nesse contexto, faz-se necessário mencionar a ocorrência da Segunda Guerra Mundial, durante a qual a atitude do governo nacional foi nova- mente proteger o setor cafeeiro, mantendo sua renda e a demanda interna para os produtos industriais. Durante o período, houve uma melhoria no quadro de exportações brasileiras, inclusive com a venda, para os países aliados, de produtos industrializados, como calçados e têxteis, tendo em vista que os países industrializados haviam direcionado sua produção para as atividades de guerra. Em consequência, o Brasil pôde acumular um expressivo saldo comercial durante a guerra. Todavia, as mesmas razões que estimulavam as exportações tornavam as importações ex- tremamente difíceis. As principais potências aliadas eram a China, a França, a Grã- -Bretanha, a União Soviética e os Estados Unidos. O Brasil se integrou aos aliados em 1943. 10 UNIUBE A associação de tais fatores tornou-se um estímulo a uma nova onda de investimentos na indústria. Entretanto, em virtude da dependência brasileira da importação de equipamentos, o aumento na produção não ocorreu em magnitude suficiente para o atendimento da demanda exis- tente, apesar da plena utilização da capacidade produtiva instalada. Além disso, a elevação da produção industrial trouxe à tona diversos pontos de estrangulamento na economia, localizados principalmente nas áreas de energia, transportes, indústria de base e equi- pamentos industriais. Em um primeiro momento, parecia que o modelo de industrialização por substituição de importações parecia estar se esgotando . Aliás, por falar em pontos de estrangulamento, a economia brasileira de hoje ainda os possui em alguns setores, quais sejam: portos sucateados, estradas esburacadas, aeroportos que operam com ineficiência. Esses pontos de estrangulamento foram batizados de Custo Brasil e, por conta deles, o produto brasileiro perde competitividade em relação àqueles similares que são produzidos no mercado internacional. O fim da Segunda Guerra Mundial marca também o fim do governo de Getúlio Vargas, deposto em 1945, em seu lugar assumindo Eurico Gaspar Dutra. A princípio, sob o governo de Dutra, houve a adoção de políticas econômicas mais liberais, com o mínimo de controle em cada setor. No que se refere às importações, elas voltaram a crescer a fim de atender à demanda que havia permanecido reprimida durante os anos da guerra e à reposição de equipamentos desgastados e não substituídos durante o período de interrupção das importações. Houve um desperdício inicial Pontos de estrangulamento Áreas de demanda insatisfeita. UNIUBE 11 das divisas em importações de bens supérfluos, o que levou a uma crise cambial e ao aumento da inflação. Diante de tais problemas, o governo retornou ao intervencionismo na economia, adotando um rígido controle das importações e da taxa de câmbio. As divisas acumuladas passaram a ser usadas em um processo de reestruturação industrial, priorizando as importações de equipamen- tos e matérias-primas para a indústria, dando o impulso para uma nova aceleração na industrialização substitutiva de importações. Nesse período, o setor industrial consolidou-se como o mais dinâmico da economia, contando, para tanto, com o apoio governamental por meio de uma política creditícia que incluía empréstimos do Banco do Brasil a diversos setores-chave da indústria privada. Começou também a ser avaliada uma política específica para o petróleo, dada a vulnerabilidade da economia brasileira quanto ao abastecimento, tornada evidente com a Segunda Guerra. Assim, iniciaram-se as discussões que, no segundo governo Vargas, acabaram por dar origem à Petrobras, em 1953, um marco do nacionalismo econômico. Em 1951, Getúlio Vargas retorna ao poder ao vencer as eleições presi- denciais de 1950. Sua volta representou a continuidade do processo de industrialização por substituição de importações, a ser conduzido de acordo com uma orientação nacionalista e intervencionista. Para isso, utilizou-se do controle das taxas de câmbio e da manutenção do poder de compra dos salários, favorecendo o aumento do consumo e fortalecendo, portanto, o mercado interno e, indiretamente, o processo de substituição de importações. 12 UNIUBE Vale salientar o estabelecimento dos leilões cambiais no que se refere ao controle das importações. Nesses leilões, as importações eram dife- renciadas de acordo com a essencialidade do bem para a indústria e para a agricultura. Assim, passou a vigorar um sistema de taxas de câmbio múltiplas, por meio do qual foram favorecidos os interesses in- dustriais e desenvolvimentistas. Todavia, em 1953, o controle das taxas de câmbio, em conjunto com a redução dos preços internacionais do café, gerou descontentamentos no setor exportador agrário, uma vez que levava à transferência de renda do setor para a área industrial por meio do chamado confisco cambial. A concretização do confisco ocorreu por meio da Instrução 70 da Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc). Por meio dessa instrução, com o propósito de equilibrar o balanço de pagamen- tos do Brasil, definia-se que os dólares recebidos pelos exportadores de café seriam comprados pelo governo a preços menores que os vigentes no mercado de câmbio. A renda adicional era uti- lizada para financiar projetos de desenvolvimento industrial. Embora o café não fosse mais o centro dinâmico da economia, ainda era importante para a geração de divisas, justificando a continuidade da política cafeeira em posição de destaque no quadro da política econômica. Do ponto de vista do relacionamento internacional, Vargas se mostrou abertamente contrário ao alinhamento incondicional do Brasil aos Estados Confisco cambial Um imposto sobre a exportação de produtos primários sob a forma de taxas de câmbio diferenciadas. Amplamente utilizado pelo Estado nos anos 1940 e 1950 como a forma por excelência para transferir renda da agricultura exportadora para a indústria. Sumoc Criada em 2 de fevereiro de 1945, surgiu com a finalidade de exercer as funções de um Banco Central, ainda inexistente no Brasil. UNIUBE 13 Unidos. Com tal resistência, Vargas pretendia constituir certo poder de negociação com os Estados Unidos, o que poderia favorecer o Brasil na obtenção de crédito para o financiamento do projeto industrial nacional. Nesse contexto foi criada a Comissão Mista Brasil-Estados Unidos, em 1951, que contou, para o financiamento de alguns de seus projetos em infraestrutura e indústrias de base, com recursos advindos do Banco Mundial e do Eximbank. É preciso lembrar que o presidente norte- americano na época, Harry Truman, tinha como diretriz de política externa a realização de investimentos governamentais em países subdesenvolvidos, a fim de conter possíveis movimentos em direção ao socialismo. Tal disposição favoreceu os projetos de Getúlio Vargas, pois permitiu a entrada de recursos públicos americanos no país. O confisco cambial, aliado à elevação dos salários, acirrou o antagonismo de representantes da elite agrário-exportadora, vinculada ao modelo de desenvolvimento internacionalizado. Assim, em meio a uma grave crise, ocorreu a deposição e o suicídio de Vargas, em agosto de 1954. Tendo fracassado o projeto governamental de Vargas, ganhou força a vertente da classe dominante nacional, que pretendia aprofundar as relações com o capitalismo internacional por meio da associação ao capital ex- terno e interrupção do modelo nacionalista baseado na substituição de importações. Com a morte de Vargas, ascendeu ao poder o vice-presidente, Café Filho. Um marco do curto período do governo de Café Filho foi a Instrução 113 da Sumoc, que previa que o governopoderia emitir Socialismo Sistema filosófico, político e econômico que propõe a estatização dos bens e dos meios de produção, para que o Estado os administre e distribua. 14 UNIUBE licenças de importação, sem cobertura cambial que correspondesse aos investimentos estrangeiros no país, para conjuntos de equipamentos ou, em situações extremas, para equipamentos complementares a conjuntos já existentes. Tal medida visava atrair os investimentos externos para o Brasil, sendo um dos elementos principais que favoreceram a internacionalização da economia brasileira em detrimento da proposta nacionalista da substituição de importações. No governo subsequente, de Juscelino Kubitschek, tal tendência foi mantida, levando os industriais brasileiros a trabalharem de maneira associada ao capital estrangeiro, invariavelmente em posição subordinada. PARADA OBRIGATÓRIA Para aprofundar seus conhecimentos, sugerimos que você pesquise sobre o processo de substituição de importações. É importante conhecer detalhes da economia brasileira na era Vargas, sua evolução e, sobretudo, suas características no que tange a esse processo. Pois bem, até aqui você estudou o advento da industrialização brasileira por meio do modelo de substituição de importações. Conheceu as características desse modelo, quais segmentos da economia nacional ele beneficiou e os principais incentivadores, entre eles, Getúlio Vargas. Na segunda parte deste capítulo, você estudará o esgotamento do modelo de substituição de importações, o Milagre Econômico e, por fim, conhecerá sob quais condições chegamos à década de 1980, denomi- nada "década perdida", quando o Brasil atingiu o seu mais alto grau de endividamento externo. PARADA OBRIGATÓRIA Para aprofundar seus conhecimentos, sugerimos que você pesquise sobre o processo de substituição de importações. É importante conhecer detalhes da economia brasileira na era Vargas, sua evolução e, sobretudo, suas características no que tange a esse processo. UNIUBE 15 1.2 Esgotamento do modelo de substituição de importações Ao assumir o governo em 1956, Juscelino Kubitschek deparou com um quadro de desequilíbrios econômicos, tanto internos quanto externos. Sua opção para solucionar tais problemas foi a adoção de uma política assumidamente industrializadora, tendo como objetivo realizar o que seu slogan de campanha propunha: “50 anos em 5”. Com base nessa lógica, foi elaborado o Plano de Metas, cuja característica principal foi promover uma nova configuração para a indústria, em um período de tempo relativamente curto, com a articulação direta do Estado. Nesse sentido, a preocupação prevista no Plano de Metas era de que houvesse um desenvolvimento industrial completo, ou seja, que fossem também constituídos os segmentos produtores de bens intermediários e de capital. Vale salientar que o Plano de Metas apresentava uma lógica que já ultra- passava o mero processo de substituição de importações, uma vez que não se constituía apenas em uma resposta pontual ao estrangulamento externo. De maneira geral, o Plano de Metas pode ser dividido em duas princi- pais frentes de sustentação ao processo de industrialização: na primeira encontram-se os investimentos em infraestrutura e energia a serem promovidos pelo governo, sendo por ele diretamente executados ou por meio de empresas estatais; na segunda, os projetos destinados à insta- lação, ampliação e modernização da produção de bens intermediários, de consumo duráveis e de capital, com base em uma série de incentivos 16 UNIUBE creditícios e cambiais. Para atender a tal propósito, o Plano de Metas dividiu-se em 31 metas, envolvendo cinco setores da economia: • energia: elétrica, nuclear, carbonífera e petrolífera; • transporte: construção e reequipamento de estradas de ferro, cons- trução e pavimentação de rodovias, portos e barragens, marinha mercante, transportes aéreos; • indústrias de base: aço, alumínio, metais não ferrosos, cimento, álcalis, papel e celulose, borracha, exportação de ferro, veículos moto- rizados, construção naval, maquinaria pesada e equipamento elétrico; • alimentação: trigo, armazéns e silos, frigoríficos, matadouros, meca- nização da agricultura, fertilizantes; • educação. A construção de Brasília aparecia nesse contexto como uma metassín- tese. Representava o desejo da integração do território nacional, com a criação de um novo Brasil, cuja expansão estaria voltada ao interior, que seria ligado ao restante do país por meio das rodovias. Para a execução do plano, foi criada uma série de comissões setoriais com a função de administrar e criar as condições necessárias para que cada setor atingisse suas metas. É o caso, por exemplo, do Grupo Ex- ecutivo da Indústria Automobilística (Geia). Do ponto de vista dos recursos financeiros utilizados, deveriam ser instituídas três políticas que viabilizassem a concretização do plano: obtenção de recursos externos, elevação do investimento público e in- UNIUBE 17 centivos à ampliação dos investimentos privados. Assim, constituiu-se o chamado tripé econômico, base do novo modelo industrial brasileiro, congregando capital privado nacional, capital privado estrangeiro e capital estatal nacional. Em função da reduzida capacidade para importar, problema já presente na economia desde o período 1954-1955, incentivou-se a entrada do capital estrangeiro no Brasil. O objetivo era que fossem instaladas no país empresas estrangeiras, preferencialmente em setores que exigiam maior capacidade tecnológica, a fim de que a produção interna desses bens proporcionasse economia das já escassas divisas. Os instrumentos utilizados para realizar tal política já eram velhos conhecidos na política econômica brasileira: as Instruções 70 e 113 da Sumoc. No que se refere à Instrução 70, a estrutura de leilões cambiais por ela prevista possibilitou ao governo manipular incentivos cambiais, permitindo a aplicação de uma taxa de câmbio favorecida para importações consideradas fundamentais (petróleo, papel, trigo etc.) e o recolhimento pelo governo dos ágios obtidos nos leilões de divisas para a importação dos demais produtos. A situação favorecia o governo nos dois casos. No primeiro, permitia-lhe controlar importantes preços internos e, no segundo, lhe garantia uma fonte significativa de recursos fiscais e um instrumento para incentivo ao desenvolvimento setorial. Como o objetivo era atrair capital estrangeiro, usou-se esse instrumento para criar taxas de câmbio favoráveis à remessa de lucros, Ágio Importância paga a mais pelo comprador sobre o valor nominal de um título. 18 UNIUBE amortizações, juros, importações de equipamentos, entre outros, por parte das empresas estrangeiras. No caso da Instrução 113, que permitia a impor- tação de equipamentos sem cobertura cambial, simplesmente registrando-a como capital inves- tido no país, criava condições extremamente favoráveis para a entrada de equipamentos, num primeiro momento, e, posteriormente, para a remuneração dos investimentos estrangeiros eventualmente realizados no Brasil. Como resul- tado, muitas empresas multinacionais vieram para o país. No que diz respeito aos investimentos públicos, o Estado, além de in- centivar, proteger e subsidiar a iniciativa privada, assumiu um caráter empresarial, envolvendo-se na construção e manutenção da infraestrutura e na produção de alguns insumos básicos. A ampliação do papel do Estado compreendeu a expansão das atividades de empresas estatais, a consti- tuição de fundos de investimentos, vinculados e não vinculados, ou simplesmente a expansão do gasto público. Nesse contexto, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE) assumiu o papel de agência administradora desses fundos. No caso específico da ampliação do papel do Estado, é bom lembrar que ele também se tornou responsável pelo fornecimentode Subsidiar Oferecer subsídio, ou seja, pagamento efetuado pelo Estado a alguns segmentos da atividade produtiva do país, a fim de estimular a cobrança de preços menores que os custos de produção. Sem cobertura cambial Não há remessa de divisas ao exterior para pagamento da mercadoria. Multinacionais Empresas que operam com capacidade significativa em vários países. UNIUBE 19 insumos industriais, como aço e derivados de petróleo, às empresas privadas, nacionais e estrangeiras, a preço barato. Por fim, o capital privado nacional recebeu um conjunto de estímulos para investimentos direcionados às áreas consideradas prioritárias pelo Plano de Metas. Tais incentivos incluíam de vantagens cambiais a finan- ciamentos de longo prazo a taxas de juros negativas e longo período de carência, oferecidos pelo Banco do Brasil e pelo BNDE, e a reserva de mercado. Esta última era baseada na Lei do Produto Similar Nacional, que proibia a importação de produtos estrangeiros que tivessem similares produzidos no Brasil. Os investimentos privados, de modo geral, eram complementares aos investimentos das empresas estrangeiras. Nesse sentido, um segmento da atividade produtiva que expressa com clareza essa nova configuração da industrialização no Brasil é a indústria automobilística. O Estado era responsável por oferecer incentivos, em- préstimos a juros negativos, proteção, subsídios, insumos industriais por meio da Companhia Siderúrgica Nacional e da Petrobras; as empresas nacionais produziam autopeças e autopartes, enquanto às empresas estrangeiras cabia a montagem e a construção de componentes de maior valor agregado. Em todo esse processo ocorreu um movimento de desnacionalização da produção no setor, o que se repetiu em outros setores dinâmicos da economia, como o químico-farmacêutico, o petro- químico, o metal-mecânico e o eletroeletrônico, entre outros. Apesar de algumas metas propostas não terem sido alcançadas, os resultados do plano foram considerados satisfatórios, havendo inclusive setores que superaram as metas, como é o caso da construção de rodo- vias. Do ponto de vista de sua estratégia de desenvolvimento industrial, 20 UNIUBE pode-se considerar que o Plano de Metas foi um sucesso, uma vez que a industrialização, antes resultante de estrangulamentos externos, pas- sou a ser alvo de um projeto de orientação estatal. O crescimento ocor- rido no período resultou da concentração de esforços e da definição de prioridades, com o objetivo de preencher as lacunas da cadeia produtiva. Como resultado final, tem-se, apesar das falhas, um sistema industrial integrado que superou os principais problemas nos setores produtores de bens de capital e insumos. Todavia, nem todos os efeitos do Plano de Metas foram positivos. O de- senvolvimento industrial baseado no setor de bens duráveis promoveu a concentração industrial – uma vez que a escala de produção exigida por esses setores é elevada –, a concentração de renda – dado que a produção é intensiva em capital com pequena geração proporcional de postos de trabalho –, além de promover a disparidade entre os salários pagos aos trabalhadores desses setores (maiores) e os trabalhadores ligados aos setores tradicionais da economia. Uma análise macroeconômica mais abrangente revela que os principais problemas resultantes do Plano de Metas estavam relacionados ao balanço de pagamentos, aos gastos públicos e à inflação. O balanço de pagamentos apresentava déficits que vinham sendo cobertos com recursos exter- nos, na forma de investimento direto estrangeiro e empréstimos de curto prazo. Com a queda no fluxo de recursos externos, a crise da balança comercial provocada pela redução do valor das Déficit Saldo negativo do balanço de pagamentos. Investimento direto estrangeiro Recursos que se transferem de uma empresa para outro país a fim de estabelecer uma filial ou adquirir participação com poder de voto em empresa nacional. UNIUBE 21 exportações fez com que se acentuassem os resultados negativos do balanço. Tal situação tornou-se mais grave a partir de 1958, dado o aumento das importações, condição inerente ao modelo de industrial- ização que criava outras demandas em relação a produtos vindos do exterior. Tal crise acabou obrigando o governo de Juscelino Kubitschek a declarar moratória em meados de 1959. Os gastos públicos haviam saído do controle do governo, e grande parte dos recursos destinados aos investimentos governamentais foram obtidos por meio da expansão monetária, ou seja, emissão de nova quantidade de moeda. Todo esse quadro contribuía para a aceleração da inflação, que reduzia o poder de compra dos salários, sobretudo nas classes de renda média e baixa, traduzindo-se em conflitos, manifestos e greves em diversos setores. Ao fim do mandato de JK, o Brasil podia ser considerado um país indus- trial, mas com grande participação do capital estrangeiro. Tal situação provocaria o choque de forças antagônicas nos anos 1960: de um lado os defensores da substituição de importações; de outro os que acreditavam que a associação ao capital internacional era a melhor estratégia para o desenvolvimento industrial nacional. Nesse embate, sairia vencedora a tese do desenvolvimento associado e dependente. O curto período de governo de Jânio Quadros, sucessor de Kubitschek, não lhe permitiu formular qualquer plano de desenvolvimento. Em seu lugar, após sua renúncia em agosto de 1961, apenas sete meses depois de sua eleição, assumiu João Goulart, o vice-presidente. Inicialmente, Moratória Suspensão do pagamento da dívida. 22 UNIUBE sua posse foi vetada pelos ministros militares, gerando uma crise política no país, solucionada parcialmente pela aprovação, no Congresso, de medida que im- plantava no Brasil o parlamentarismo, restringindo os poderes do presidente. O governo de João Goulart foi bastante tumultuado, marcado por uma forte instabilidade política, econô- mica e social. Herdeiro que era das ideias políticas trabalhistas de Ge- túlio Vargas, despertava a desconfiança dos representantes da direita brasileira de que pudesse executar no Brasil ações de caráter socialista. Além disso, o quadro econômico era de fato muito complicado, com déficit no balanço de pagamentos, queda na produção agropecuária e na produção industrial, elevada emissão monetária e baixo crescimento da economia como um todo. Em 6 de janeiro de 1963, ocorreu um plebiscito nacional que definiu pela volta do presidencialismo como sistema de governo no Brasil. A partir de então, João Goulart voltou-se para a implanta- ção do chamado Plano Trienal, cujo objetivo era combater a inflação e garantir o desenvolvimento com base no aprofundamento do processo de substituição de importações. Embora fosse um plano de caráter de- senvolvimentista no curto espaço de tempo em que esteve em vigor, foi praticamente abandonado já em maio de 1963, devido à necessidade de se combater a grave crise inflacionária pela qual passava o país. Uma das mudanças desejadas por João Goulart era a reforma agrária, por ele assinada em 13 de março de 1964, durante comício realizado Plebiscito Consulta popular feita antes da elaboração ou aprovação de uma lei. Parlamentarismo É um sistema de governo em que o poder legislativo oferece a sustentação política ao poder executivo. No parlamentarismo, o poder executivo é, geralmente, exercido por um primeiro- -ministro. UNIUBE 23 na estação da Central do Brasil, decretando a desapropriação das terras ao longo das rodovias e ferrovias em torno dos grande açudes. Tal atitude acelerou sua queda. Em 31 de março de 1964, João Goulart foi deposto pelo Golpe Militar de 1964, pelo qual implantou-se no Brasil um regime militar fortemente autoritário. Com o Golpe Militar, os conflitos políticos existentes foram resolvidos de forma autoritária.No campo econômico, a crise, especialmente a acelera- ção inflacionária, foi combatida com a adoção do Programa de Ação Econômica do Governo (Paeg). Considerava-se que a inflação era de demanda, tendo como causas principais os déficits públicos, o elevado volume de crédito concedido às em- presas e os aumentos de salários em proporção maior que a produtividade do trabalho. Nesse contexto, promover a aceleração do crescimento econômico, controlar a inflação, reduzir os desequilíbrios setoriais e regionais, aumentar o nível de investimento e, portanto, do emprego, equacionar a tendência aos desequilíbrios externos eram os objetivos principais do Paeg. Vale lembrar que houve uma alteração na estratégia de combate à inflação. Prevaleceu a ideia de que, para haver crescimento, a inflação era uma consequência inevitável. Portanto, extingui-la não seria possível, devendo a política econômica preocupar-se em minimizar seus efeitos. Ao mesmo tempo, o tratamento deveria ser gradual, ou seja, mantendo a inflação sob controle, baixando pouco a pouco seu nível. De maneira mais específica, as medidas de contenção da inflação do Paeg envolviam a redução dos déficits públicos por meio da diminuição dos gas- Inflação de demanda Elevação de preços provocada pelo excesso de demanda agregada em relação à oferta agregada. 24 UNIUBE tos e aumento das receitas. Isso foi conseguido à custa de uma reforma tributária e do aumento das tarifas públicas. Conseguiu-se reduzir o déficit de 4,2% do Produto Interno Bruto (PIB), em 1963, para 1,1% em 1966. O aumento da arrecadação foi transformado, posteriormente, na concessão de incentivos fiscais e subsídios aos setores considerados estratégicos. Outra medida adotada foi a restrição ao crédito e monetária. As taxas de juros foram elevadas e, como resultado, houve o aumento das falências, concordatas, fusões e incorporações, principalmente nas pequenas e mé- dias empresas, funcionando como mecanismo de geração de capacidade ociosa, que seria importante elemento para a retomada subsequente do crescimento econômico. Como última medida, o governo passou a determinar os reajustes sala- riais, por meio da política salarial, a fim de conter as reivindicações e romper as expectativas dos trabalhadores em relação a aumentos de salários. A consequência foi a redução do salário real. Vale ressaltar a reforma financeira promovida no período. De fato, no Brasil, naquele momento, a estrutura do sistema financeiro já se mostrava insuficiente para financiar o crescimento da atividade produtiva, espe- cificamente a industrial. O objetivo da reforma era ampliar o volume de poupança na economia e criar mecanismos de financiamento adequados. A política de estabilização, promovida pelo Paeg entre 1964 e 1967, teve como resultado a estagnação da economia. Por outro lado, obteve sucesso no controle da inflação e criou as condições para a retomada do crescimento no momento posterior, que ficou conhecido como Milagre Econômico Brasileiro. UNIUBE 25 Entre 1968 e 1973, a economia brasileira cresceu a taxas elevadas, em média 10% ao ano, com picos de até 13%. Adotou-se então a correção monetária, que, ao possibilitar a prática de juros reais positivos, estimulava a poupança e ampliava a capacidade de financiamento da economia. SAIBA MAIS Você sabia que o período do Milagre Econômico destacou a economia brasileira, tornando-a uma das mais robustas daquela época, crescendo a taxas hoje comparadas às do crescimento da China? No ano de 1968, a eco- nomia brasileira cresceu 9,8%. Em 1973, bateu seu recorde histórico de 14%! Nesse período, criou-se também o Conselho Monetário Nacional (CMN), cujo objetivo era realizar o controle monetário. Ele passou a ser o responsável por definir as regras, metas e diretrizes da política econômica, agora conduzida de maneira independente. O Banco Central do Brasil foi criado para ser o órgão executor da política monetária e fiscalizador do sistema financeiro. O financiamento à habitação também foi favorecido com a criação do Sistema Financeiro de Habitação (SFH) e do Banco Nacional da Habitação (BNH). Por fim, promoveu-se a reforma do mercado de capitais, a partir da qual o mercado tornou-se especializado e segmentado, passando a existir, para cada segmento do mercado de crédito, instituições especializadas. SAIBA MAIS Você sabia que o período do Milagre Econômico destacou a economia brasileira, tornando-a uma das mais robustas daquela época, crescendo a taxas hoje comparadas às do crescimento da China? No ano de 1968, a eco- nomia brasileira cresceu 9,8%. Em 1973, bateu seu recorde histórico de 14%! Políticas de estabilização Políticas direcionadas a manter o nível de preços sob controle. 26 UNIUBE Assim, aos bancos comerciais caberia o crédito de curto prazo, com base na captação de depósi- tos à vista; às financeiras estava reservado o crédito ao consumidor; os bancos de investi- mento se ocupariam do crédito de médio e longo prazos; os bancos de desenvolvimento estaduais seriam responsáveis por financiar ações de projetos de fomento. As Bolsas de Valores, corretoras e distribuidoras estavam subordinadas ao Banco Central. Contribuíram para esse crescimento as reformas adotadas no período anterior, a capacidade ociosa gerada no setor industrial e, do ponto de vista externo, o crescimento pelo qual passava a economia mundial no período. Por outro lado, a política econômica da época estava orientada para a busca da expansão econômica. Os fatores que contribuíram para esse crescimento foram: • retomada do investimento público em infraestrutura; • aumento do investimento das empresas estatais, motivado pela aplica- ção do realismo tarifário associado a uma maior liberdade de atuação; • aumento da demanda por bens duráveis de consumo, devido ao au- mento do crédito ao consumidor após a reforma financeira; • crescimento do setor de construção civil, motivado pelos recursos do Sistema Financeiro da Habitação; Mercado de capitais Rede de bolsas de valores e instituições financeiras (bancos, companhias de investimento e de seguro). UNIUBE 27 • elevação das exportações, motivada pelas políticas cambiais de minidesvalorizações que buscaram manter a taxa real de câmbio auxiliando o setor exportador, e os incentivos fiscais ao setor, visando a diversificação das exportações; • expansão do setor de bens de capital no período de 1971-1973, atingindo em todo o período (1968-1973) uma média de crescimento de 18%; • aumento do setor de bens intermediários, com média de 13,5%. Pode-se dizer que o Milagre Econômico Brasileiro está diretamente relacionado à capacidade ociosa gerada no período anterior. Essa ca- pacidade possibilitou o crescimento da produção e do emprego quando da recuperação dos níveis de demanda, a partir da segunda metade dos anos 1960. Recuperada a demanda para os bens de consumo duráveis, automaticamente foram estimulados os setores produtores de bens de capital e insumos intermediários. Aliadas a isso, as condições externas de demanda e internas de crédito possibilitaram ao setor produtor de bens de consumo não duráveis a expansão da produção e o incremento das exportações. Todavia, a elevação na renda provocada pelo crescimento acelerado passou a pressionar a capacidade dos setores produtores de bens de capital e insumos intermediários. Em razão disso, elevou-se a demanda por importações, gerando déficits crescentes nas contas de transações correntes, compensados via endividamento externo. O fato de o mercado financeiro internacional contar, neste período, com grande volume de recursos (alta liquidez) favoreceu esse endividamento. Assim, ao final 28 UNIUBE do período do Milagre Econômico, ocorreu uma situação de crescimento com endividamento. Um ponto que merece destaque no contexto do Milagre Econômico Brasileiroé a consolidação do poder estatal no controle da economia. O Estado controlava os principais preços (câmbio, salários, juros, tarifas) e respondia pela maior parte das decisões de investimento, fosse por meio do investimento público, fosse por meio dos incentivos fiscais e subsídios aos setores estratégicos. Ao mesmo tempo, adotou políticas salariais que implicaram perdas significativas, ampliando o conflito distributivo. A piora na distribuição de renda, apesar de ter sido esse o período de maior crescimento da economia brasileira, é a principal crítica ao Milagre. A partir de 1973, o crescimento da economia brasileira começou a declinar. Em 1974, o país foi atingido pelo primeiro choque do petróleo, responsável pela elevação dos custos de produção em escala mundial, refletindo-se em aceleração da taxa de inflação e redução dos investi- mentos estrangeiros diretos. É importante ressaltar que o crescimento econômico brasileiro, acele- rado durante o Milagre, com a ocupação de toda a capacidade ociosa, gerou desequilíbrios refletidos na balança comercial e nas pressões inflacionárias. Manter o ciclo de expansão econômica dependia de uma situação externa favorável, o que não mais ocorria em razão do choque do petróleo. As transações correntes do balanço de pagamentos tiveram seus déficits acentuados, tanto por conta do aumento do valor das impor- tações de petróleo, como por conta da continuidade das importações de bens de capital e insumos básicos, necessários para manter o nível de produção corrente no Milagre. Para cobrir tais déficits, foram utilizados UNIUBE 29 recursos externos e reservas cambiais internas, demonstrando quão vulnerável estava a economia nacional. Assim, o resultado da crise do petróleo para o Brasil foi a piora das contas externas, novas pressões inflacionárias e a redução das taxas de crescimeto econômico. Internamente, a grande questão que se estabeleceu em 1974 foi como enfrentar a crise. De um lado, estavam os partidários do ajustamento, que previam a contenção da demanda interna e a correção do desequilíbrio nas contas externas. De outro, os defensores de uma política de finan- ciamento e continuidade do crescimento, operando um ajuste gradual dos preços enquanto existissem recursos financeiros abundantes no mercado internacional. Como alternativa a essa dicotomia, lançou-se o II Plano Nacional de De- senvolvimento (II PND), colocado como uma estratégia de financiamento, mas promovendo um ajuste na oferta de longo prazo que permitisse reduzir as importações e melhorasse a capacidade exportadora do país, concomitantemente à manutenção do crescimento econômico. Na ver- dade, o governo militar escolheu a continuidade da expansão econômica acreditando que a crise do petróleo teria curta duração e aproveitando-se do crédito internacional barato. A estratégia implementada pelo II PND representou a última tentativa de manutenção do modelo de industrialização por substituição de importações. Promoveu uma mudança radical na estrutura de industrialização até então vigente no país. Ao contrário do padrão existente, o plano visava concentrar os investimentos no setor produtor de bens de capital e insumos intermediários por meio do investimento privado nacional. Além disso, buscava-se alterar a matriz energética, ao se reduzir a 30 UNIUBE dependência brasileira em relação ao petróleo e aumentar a produção de energia elétrica. Outro objetivo era aumentar a exportação de insumos industriais, minério de ferro, alumínio, aço etc. A racionalidade do modelo centrava-se na ideia de que os investimentos das empresas estatais acabariam gerando demandas que estimulariam o setor privado a realizar investimentos no setor de bens de capital. Diante dessa possibilidade, o governo concedeu diversos incentivos ao setor privado. Para a consecução desses objetivos, houve um isolamento do Estado, que se transformou em empresário, fazendo uso das empresas estatais. Do ponto de vista dos recursos financeiros necessários, utilizou-se, em grande medida, dos empréstimos externos, transferidos para as empresas privadas nacionais via BNDES. Além disso, os empréstimos externos eram utilizados no financiamento das importações temporárias necessárias à realização dos investimentos iniciais. Como resultado, a dívida externa cresceu, sendo composta principalmente por tomada de empréstimos por parte das empresas estatais. Vale salientar que tais empresas eram forçadas ao endividamento externo, uma vez que o acesso ao crédito interno era restrito a elas. A busca de recursos externos cumpriria também a função de resolver o problema brasileiro de reduzido volume de divisas. Assim, tinha início o processo de estatização da dívida externa brasileira . A fim de implantar o II PND, o Estado assumiu a conta, dados os baixos níveis das taxas de juros internacionais – enquanto elas se situavam nesse patamar, era possível efetuar os pagamentos dos juros, mas corria-se o risco de que, a qualquer momento, elas pudessem ser Estatização da dívida externa O Estado passou a ser cada vez mais o responsável pelo endividamento externo da economia brasileira. UNIUBE 31 alteradas, devido ao seu caráter flutuante. Em futuro não muito distante, esse se tornaria no principal problema da economia brasileira. PARADA OBRIGATÓRIA Para aprofundar seus conhecimentos, sugerimos que você pesquise so- bre a crise e o milagre de 1960 a 1973. É importante conhecer a origem, a dinâmica e as consequências do Milagre Econômico na economia brasileira contemporânea. No fim dos anos 1970 e início dos anos 1980, a situação da economia brasileira era precária. Do ponto de vista internacional, ocorreu o se- gundo choque do petróleo e a elevação nas taxas de juros internacionais, principalmente por parte dos Estados Unidos, aumentando as pressões inflacionárias e a dívida externa brasileira, em um momento em que o endividamento externo do país era bastante grande. Tal situação tornou- -se insustentável. Internamente, a situação fiscal do governo já começava a se deteriorar. Em síntese, o II PND conseguiu substituir consideravelmente as impor- tações de produtos intermediários e impulsionar a indústria nacional de bens de capital, porém aumentou o endividamento externo brasileiro, assim como as pressões inflacionárias e a concentração de renda. Nos início dos anos 1980, podia-se, com certeza, afirmar que o Brasil havia atingido a condição de nação industrializada, todavia imersa em uma crise de endividamento externo, que obrigou o governo a adotar políticas de ajuste nas contas externas, e uma forte crise inflacionária. PARADA OBRIGATÓRIA Para aprofundar seus conhecimentos, sugerimos que você pesquise so- bre a crise e o milagre de 1960 a 1973. É importante conhecer a origem, a dinâmica e as consequências do Milagre Econômico na economia brasileira contemporânea. 32 UNIUBE Além disso, estava inserido em um contexto internacional de restrições no que refere a recursos financeiros, mas era considerado amplamente competitivo do ponto de vista do avanço do processo de globalização. O quadro mais contemporâneo da economia brasileira, incluindo a crise dos anos 1980 e o posicionamento brasileiro no contexto econômico mundial durante o processo chamado de abertura comercial (década de 1990), será nosso objeto de estudo do próximo capítulo. Até lá! Resumo Prezado(a) aluno(a), neste primeiro capítulo, você estudou o processo de industrialização nacional, de seus primórdios, quando a economia brasileira era, essencialmente, do tipo agrícola, até a década de 1980, quando o Brasil passou por uma de suas piores e mais longas crises econômicas. Neste estudo, você aprendeu que a crise econômica mundial de 1929 foi o estopim para o início da industrialização brasileira. Doravante, iniciou-se o processo de substituição de importações, cujo objetivofoi fortalecer o parque industrial interno. Entre as décadas de 1930 e 1980, esse modelo, que substituía a importação pela produção interna, passou por altos e baixos. Dentre seus bons momentos está o Milagre Econômico da década de 1960, quando a economia brasileira cresceu a taxas de 10% ao ano. Por outro lado, o desenvolvimento observado no Milagre Econômico custou-nos caro, pois foi acompanhado pelo endividamento externo. Na década de 1970, com o advento das crises do petróleo, o Brasil mergulhou em uma das mais sérias crises UNIUBE 33 econômicas de sua história, o que rendeu à década de 1980 o título de “a década perdida”. Por fim, você aprendeu que o endividamento externo, aliado aos altos índices de inflação, foi responsável pelo declínio do modelo de substi- tuição de importações e acabou por estimular, na década de 1990, a abertura econômica – assunto que você estudará no próximo capítulo. Referências CARNEIRO, Ricardo. Desenvolvimento em crise: a economia brasileira no último quarto do século XX. São Paulo: Unesp, IE-Unicamp, 2002. GONTIJO, Cláudio; OLIVEIRA, Fabrício Augusto de. Subprime: os 100 dias que abalaram o capital financeiro mundial e os efeitos da crise sobre o Brasil. Belo Horizonte: Coregom, 2009. GREMAUD, Amaury Patrick; VASCONCELLOS, Marco Antônio Sandoval de; TONETO JUNIOR, Rudinei. Economia brasileira contemporânea. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002. LANZANA, Antônio Evaristo Teixeira. Economia brasileira: fundamentos e atualidade. São Paulo: Atlas, 2001. REGO, José Márcio; MARQUES, Rosa Maria (Orgs.). Economia brasileira. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. REVISTA VEJA NA HISTÓRIA. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/historia/ crash-bolsa-nova-york/brasil-crise-do-cafe-exportacoes-falencias.shtml>. Acesso em: 20 abr. 2010. 34 UNIUBE O Brasil e a nova ordem mundial Capítulo 2 Edileuza Pereira Silva / Wilton Rezende de Freitas Introdução Nesta etapa de estudos, concluiremos a nossa análise a respeito da economia brasileira. Os últimos anos têm marcado uma série de transformações para o Brasil, incluindo a superação de um processo inflacionário crônico e de um período de baixo cresci- mento econômico. No início dos anos 1980, a economia brasileira passava por um momento de extrema crise, com causas centradas principal- mente no endividamento externo do país, além de uma inflação que corroia todo o poder de compra da população, com efeitos mais danosos sobre aqueles que possuíam renda reduzida. Diante desse quadro, os governos que se sucederam a partir do fim do regime militar adotaram o combate à inflação como meta prioritária. Para tanto, utilizaram-se dos chamados pacotes econômicos, a maioria deles baseados no congelamento de preços e salários. Implantados nos anos 1980 e início dos anos 1990, tais planos não conseguiram atingir o resultado almejado – ou seja, controlar a inflação. Apenas nos anos 1990, com a adoção do Plano Real, que não promoveu nenhum tipo de congelamento, a inflação foi contro- lada. Todavia, o efeito da estabilização foi o baixo crescimento econômico. Nesse contexto, cabe destacar que o mundo passava por trans- formações significativas, com destaque para o processo de globalização em suas vertentes financeira, econômica e produ- tiva. Tal quadro demandou que o país adotasse estratégias de inserção nessa nova conjuntura que se estabelecia. É verdade que o novo contexto de globalização, ressaltadas as imensas vantagens que proporcionou, trouxe também a possibilidade de crises que se propagam mundo afora. Nos anos 1990 e 2000, tais crises tornaram-se fato corriqueiro, impondo aos governantes, inclusive no Brasil, o desenvolvi- mento de estratégias de política econômica eficientes para enfrentá-las. É esse o contexto de estudo que estamos iniciando agora. Pen- sando em apresentar um conjunto de informações e análises que possam auxiliá-lo no entendimento do comportamento da economia brasileira na atualidade, o presente capítulo está di- vidido em quatro itens principais: 36 UNIUBE a) crise dos anos 1980 e planos de combate à inflação – você estudará as características da economia brasileira nesse período, com destaque para as razões da crise pela qual passava o país e os planos de combate à inflação implantados no período; b) combate à inflação no Brasil nos anos 1990 – nesse momento, apresentaremos as políticas de combate à inflação no Brasil, com destaque para o Plano Real, o plano de maior sucesso na promoção da estabilização da economia brasileira; c) o Brasil e as transformações na economia mundial – será feita uma análise sobre as transformações da economia mundial nos últimos anos, com destaque para o processo de globalização e de como o Brasil se inseriu nesse novo contexto; d) o Brasil e as crises financeiras internacionais – mostrará as recentes crises financeiras mundiais e seus efeitos sobre a economia brasileira. Destacaremos as crises relacionadas à vulnerabilidade externa dos países emergentes. Bons estudos! UNIUBE 37 Objetivos Esperamos que, ao terminar o estudo deste capítulo, você seja capaz de: • descrever o processo de crise da economia brasileira nos anos 1980; • definir as políticas de combate à inflação previstas nos planos econômicos adotados no Brasil a partir da segunda metade dos anos 1980; • discutir as transformações ocorridas na economia mundial e seus efeitos para a economia brasileira; • analisar as crises financeiras internacionais; • julgar de que forma as crises financeiras internacionais afetaram a economia brasileira. Esquema 2.1 Crise dos anos 1980 e planos de combate à inflação 2.2 Combate à inflação no Brasil nos anos 1990 2.3 O Brasil e as transformações na economia mundial 2.4 O Brasil e as crises financeiras internacionais 2.1 Crise dos anos 1980 e planos de combate à inflação Você já ouviu dizer que, para o Brasil, a década de 1980 foi perdida? Pois é, os anos 1980 marcaram o fim do ciclo de expansão vivido pelo 38 UNIUBE país nos anos 1970. Mas o que significa dizer que a década foi perdida? De modo geral, o uso de tal expressão está associado a um movimento de retração da produção industrial e a menores taxas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do país. Além disso, os níveis de desem- prego eram elevados, a inflação atingia índices altíssimos e as contas externas eram caóticas. Mas o que fez o Brasil chegar a tal ponto? Que caminhos foram procurados para solucionar tais problemas? A solução de fato foi alcançada? A resposta para tais questões envolve o entendimento não só da situação brasileira no final dos anos 1970 e início dos anos 1980, mas também do quadro apresentado pela economia mundial nesse período. Conforme explicitado anteriormente, ao final dos anos 1970, mais es- pecificamente em 1979, do ponto de vista interno, a situação fiscal do governo já era bastante precária. A carga tributária estava reduzida, o pagamento de juros da dívida interna havia aumentado, as estatais eram deficitárias e o orçamento do governo apresentava vários déficits. No que se refere ao setor externo, ocorreu o segundo choque do petróleo e a elevação das taxas de juros internacionais. Além disso, o crédito in- ternacional tornou-se mais escasso e os prazos para pagamento, cada vez menores. Como o grau de endividamento do país era elevado e as taxas de juros flutuantes, a dívida externa brasileira aumentou. A combi- nação de tais fatores resultou em um desequilíbrio das contas externas Mas o que fez o Brasil chegar a tal ponto? Que caminhos foram procurados para solucionar tais problemas? A solução de fato foi alcançada? UNIUBE 39 e no aumento significativo da inflação, que ao final do ano alcançou a marca de 77%. Diante de tal quadro, a política adotada pelo governo de João Batista Figueiredo, último presidente militar do Brasil, foi uma tentativa dereedi- tar o Milagre Econômico. Nesse sentido, as medidas iniciais basearam- -se no controle dos juros, no reajuste semestral e por faixas dos salários, na desvalorização cambial de 30% e na prefixação da correção monetária e da correção cambial para 1980 com valores inferiores aos da inflação de 1979. O objetivo era influenciar as expectativas inflacionárias dos agentes econômicos para 1980. Os resultados do ponto de vista do crescimento econômico foram expressivos. Em 1980, o PIB brasileiro elevou-se 9,1% em relação ao ano anterior. Todavia, esse crescimento resultou em pressões sobre o Balanço de Pagamentos e em uma aceleração da inflação: os preços estavam 110% mais altos ao fim de 1980. Tinha início uma das maiores recessões já enfrentadas pela eco- nomia brasileira. De modo geral, pode-se dizer que a crise dos anos 1980 apresentou vínculo muito forte com o endividamento externo brasileiro, que foi acentuado a partir de fins dos anos 1960. É preciso entender, nesse contexto, que havia no fim dos anos 1960 uma grande liquidez no sistema financeiro internacional, principalmente em dólares. Tal fato era decorrente dos déficits comerciais norte-americanos, Recessão Redução no crescimento de uma economia. De modo geral, caracteriza-se a ocorrência de recessão quando o Produto Interno Bruto (PIB) se contrai por dois trimestres consecutivos. Liquidez Volume de dinheiro em circulação no mercado. 40 UNIUBE financiados por emissões monetárias. Dito de outro modo, os Estados Unidos apresentavam um nível de consumo maior do que sua capacidade de produção. Para atender a essa expansão do mercado consumidor, as importações se elevaram, sendo financiadas pela emissão de dólares. Uma vez que bancos de diferentes países passaram a aceitar depósitos em dólar, houve, gradativamente, uma ampliação de recursos para empréstimos no mercado internacional. Tal situação acentuou-se a partir de 1974, quando os dólares ganhos com o petróleo pelos países árabes passaram a ser depositados nesse mesmo mercado. A elevada disponibilidade de crédito no sistema financeiro internacional ia ao encontro das necessidades de países em desenvolvimento, que precisavam de recursos para financiar seus projetos de industrialização. O caso do Brasil não era diferente. A consequência dessa combinação foi o aumento do endividamento externo dos países em desenvolvimento, incluindo-se aí o Brasil. A partir de 1968 a dívida externa brasileira começou a crescer em ritmo acelerado, sendo, em sua maior parte, privada. Os principais tomadores de empréstimos eram empresas multinacionais e bancos estrangeiros. Com a implantação do II PND, esse quadro foi alterado e o endividamento externo do país passou a ser composto principalmente por empréstimos feitos pelas empresas estatais, uma vez que tinham mais condições de conseguir levantar recursos no exterior. Conforme dito anteriormente, promoveu-se uma estatização da dívida externa brasileira. O primeiro choque do petróleo, em 1973, contribuiu para o aumento do endividamento externo brasileiro. Os altos déficits em transações cor- rentes foram financiados com o endividamento externo. Além disso, o au- UNIUBE 41 mento no preço do petróleo começou a provocar um quadro inflacionário mundo afora. Para enfrentar essa situação, os países desenvolvidos começaram a aumentar as suas taxas de juros já em 1974. O segundo choque do petróleo em 1979 tornou esse quadro ainda mais compli- cado, levando a novo aumento nas taxas de juros internacionais. Nesse contexto, cabe destacar que o Brasil apresentava um quadro de dívida baseado em taxas de juros flutuantes – ou seja, a dívida externa brasileira era corrigida com base em uma taxa de juros variável. Quando os juros internacionais se elevaram em 1979, o endividamento brasileiro, e tam- bém de outros países da América Latina, cresceu proporcionalmente. Vale ressaltar que um ponto importante nesse quadro todo foi a mudança de política econômica estabelecida pelos Estados Unidos. A partir de 1979, o Banco Central dos Estados Unidos da América (Federal Reserve Bank) passou a adotar uma política monetária restritiva, visando conter o crescente processo de elevação dos preços dentro da economia norte- -americana. Para tanto, tornou mais restritas as condições de crédito e elevou as taxas de juros. Na prática, isso significou que os Estados Unidos passaram a absorver a liquidez internacional. Esse quadro tornou a situação das contas externas dos países endividados, incluindo o Bra- sil, extremamente complicada, uma vez que au- mentava a necessidade de divisas para o pagamento da dívida, que se multiplicava por conta do aumento dos juros americanos, e estes faziam com que os recursos fossem direcionados para a economia americana. Como resultado, os países em desenvolvimento apresentaram sérios problemas com a dívida externa, inclusive interrompendo seus paga- Divisas Moeda estrangeira. 42 UNIUBE mentos, como é o caso do México, em 1982. Cresce, a partir de então, a gravidade da situação, uma vez que os credores internacionais pas- sam a temer que outros países sigam o mesmo caminho do México. Assim, deixam de financiar a rolagem das dívidas dos países em desenvolvi- mento. A partir de então, com o apoio de seus governos e do Fundo Monetário Internacional (FMI), os credores internacionais passam a exigir dos países endividados um ajuste externo para honrar o pagamento da dívida. No caso do Brasil, a redução do fluxo de empréstimos, aliada ao aumento nos pagamentos de juros da dívida, estrangulou as contas externas com a expressiva elevação nos déficits no balanço de transações correntes. O ajuste externo brasileiro começou a ser posto em prática no final de 1980, por meio de uma política de controle da demanda doméstica visando reduzir a necessidade de divisas. A partir de 1983, o país passou a gerar significativos superávits comerciais com o objetivo de pagar os juros da dívida. Assim, o Brasil passou a ser um transferidor de recursos para o exterior, e as divisas geradas pelo setor exportador eram, na sua maior parte, direcionadas para o pagamento da dívida externa. Essa primeira fase do ajuste externo ocorreu de forma voluntária, ou seja, o Brasil não recorreu ao FMI. Todavia, a moratória mexicana, em 1982, interrompeu completamente o fluxo de recursos voluntários direcionados aos países em desenvolvimento, levando o Brasil a buscar ajuda do FMI. É importante lembrar que essa ajuda estava condicionada à adoção de uma política econômica, negociada com o Fundo, que permitisse superar Rolagem Adiar pagamento de dívida. Consiste na troca de títulos vencidos de uma dívida velha por títulos a vencer no futuro, que passam a constituir uma dívida nova. UNIUBE 43 as restrições externas. Nesse sentido, as medidas adotadas pelo Brasil envolviam duas frentes principais: conter a demanda agregada interna e tornar a estrutura de preços relativos favorável ao setor externo. O primeiro grupo de medidas expressou-se via redução dos gastos pú- blicos, aumento da taxa de juros interna e restrição ao crédito e redução do salário real, que além de diminuir a demanda agregada interna pos- sibilitou a geração de maiores excedentes para a exportação. Já no segundo grupo, promoveu-se a desvalorização da moeda nacional e o estímulo ao aumento da competitividade da indústria nacional via redução de alguns preços públicos e o oferecimento de subsídios à exportação. Do ponto de vista da geração de superávits nas contas externas do país, as políticas acima listadas foram bem-sucedidas. Todavia, gerou-se uma grave recessão interna em 1981 e 1983, e baixo crescimento em 1982, com forte queda na produção de bens e serviços, aumento no nível de desemprego e redução na renda per capita do país. Além disso, a inflação acelerou-se em 1982. Em 1984,
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