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<p>HIDROLOGIA APLICADA</p><p>TEXTO BÁSICO</p><p>Disciplina Ministrada na Universidade Estadual do Rio Grande do</p><p>Sul, para o curso de graduação em Engenharia de Bioprocessos e</p><p>Biotecnologia na unidade de Caxias do Sul.</p><p>�������� �</p><p>��������</p><p>�������� �</p><p>��������</p><p>�������� �</p><p>��������</p><p>�������� �</p><p>��������</p><p>����</p><p>adrianorpaz@yahoo.com.br</p><p>Setembro/2004</p><p>2</p><p>������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>����������</p><p>������������������</p><p>����������������������</p><p>����������������������</p><p>����������������������</p><p>��������</p><p>Aspectos gerais</p><p>A Hidrologia pode ser entendida como a ciência que estuda a água, como a</p><p>própria origem da palavra indica (do grego): hidrologia = hydor (“água”) + logos</p><p>(“ciência” ou “estudo”). Entretanto, uma boa definição adotada por vários autores é a</p><p>seguinte:</p><p>“Hidrologia é a ciência que trata da água na Terra, sua ocorrência,</p><p>circulação e distribuição, suas propriedades físicas e químicas e sua</p><p>reação com o meio ambiente, incluindo sua relação com as formas</p><p>vivas” (Definição do U.S. Federal Council of Service and Technology,</p><p>citada por Chow, 1959, apud Tucci, 2000).</p><p>Como se pode perceber pela definição acima, a hidrologia é uma ciência</p><p>consideravelmente ampla, cujo escopo de trabalho abrange diversas sub-áreas mais</p><p>específicas, como por exemplo:</p><p>- Hidrometeorologia: trata da água na atmosfera;</p><p>- Limnologia: estuda os lagos e reservatórios;</p><p>- Potamologia: estuda os rios;</p><p>- Oceanografia: estuda os oceanos;</p><p>- Hidrogeologia: estudas as águas subterrâneas;</p><p>- Glaciologia: trata da ocorrência de neve/gelo na natureza.</p><p>3</p><p>Entretanto, cabe salientar que a maioria dos estudos envolve mais de uma das</p><p>sub-áreas, já que os fenômenos e processos envolvendo a água na natureza (ocorrência,</p><p>distribuição, propriedades físico-químicas, etc.) estão interrelacionados de tal forma que</p><p>a explicação e o entendimento dos mesmos só são alcançados mediante a reunião dos</p><p>conhecimentos das diversas sub-áreas. Por exemplo, como estudar os processos de</p><p>deposição de nutrientes e sedimentos em um reservatório (limnologia) sem a</p><p>caracterização do aporte dessas substâncias oriundo do curso d’água (rio) barrado para</p><p>formar o reservatório (potamologia)?</p><p>Tornando a análise um pouco mais geral, face ao caráter de escassez atribuído à</p><p>água atualmente, sendo reconhecida a importância em preservar e usar racionalmente</p><p>esse recurso, uma vasta gama de profissionais tem se dedicado a estudar a hidrologia,</p><p>entre eles os engenheiros, economistas, estatísticos, químicos, biólogos, químicos,</p><p>matemáticos, geólogos, agrônomos, geógrafos, etc.</p><p>Os problemas relacionados à água geralmente requerem um enfoque</p><p>multidisciplinar, segundo o qual diversos especialistas contribuem em suas áreas para</p><p>entender a situação e alcançar a melhor alternativa, sob determinados critérios. Um</p><p>exemplo disso é um projeto que vise o barramento de um rio para formação de um</p><p>reservatório, com o objetivo de captar água para abastecimento humano e irrigação.</p><p>Simplificadamente, poder-se-ia dizer que o hidrólogo seria responsável pela</p><p>caracterização da área contribuinte ao reservatório, estimando a vazão afluente e</p><p>dimensionando a barragem; ao especialista em hidráulica caberia projetar o sistema de</p><p>captação, bombeamento e distribuição da água; o biólogo analisaria o impacto do</p><p>barramento do rio sobre o ecossistema, em particular sobre a biota aquática, bem como</p><p>no levantamento das espécies que habitam a região a ser alagada; o sociólogo (e</p><p>psicólogo) estaria envolvido com a remoção da população residente na área alagada pela</p><p>barragem, a qual seria realocada; a vegetação que ficaria submersa com o enchimento</p><p>do lago iria se degradar, merecendo o devido monitoramento da qualidade da água, que</p><p>poderia ser realizado por um especialista na área de saneamento/química; o agrônomo</p><p>iria definir as condições de irrigação das culturas agrícolas atendidas, e assim por</p><p>diante.</p><p>4</p><p>Por outro lado, também cabe salientar que, a despeito dos vários profissionais</p><p>envolvidos na problemática da água, os estudos hidrológicos, propriamente ditos,</p><p>geralmente envolvem técnicas originárias ou desenvolvidas a partir de conceitos de</p><p>outras áreas, mas que o profissional que lida com a hidrologia deve estar familiarizado e</p><p>ser capaz de aplica-las e entender seus resultados. Entre tais técnicas pode-se citar:</p><p>teoria estocástica, séries temporais, análise multicritério, teoria das decisões, análise</p><p>econômica, programação dinâmica, inteligência artificial, otimização, interpretação de</p><p>imagens de satélite, etc.</p><p>Breve histórico da hidrologia</p><p>A importância da água na história da humanidade é identificada quando se</p><p>observa que os povos e civilizações se desenvolveram às margens de corpos d’água,</p><p>como rios e lagos. A seguir serão listados alguns fatos marcantes da história da</p><p>hidrologia, de maneira superficial, sendo maiores detalhes encontrados na bibliografia</p><p>pesquisada, citada ao final deste documento.</p><p>• Diversos autores citam registros de que no Egito Antigo, na época dos</p><p>faraós, existiram obras de irrigação e drenagem. Também na Mesopotâmia,</p><p>na região conhecida como Crescente Fértil, entre os rios Tigre e Eufrates, a</p><p>água já era usada para irrigação.</p><p>• Os filósofos gregos são considerados os primeiros a estudar a hidrologia</p><p>como ciência. Por exemplo, Anaxágoras, que viveu entre 500 e 428 a. C,</p><p>tinha conhecimento de que as chuvas eram importantes na manutenção do</p><p>equilíbrio hídrico na Terra.</p><p>• Mas apenas na época de Leonardo da Vinci é que o ciclo hidrológico veio a</p><p>ser melhor compreendido. Um fato relevante foi o realizado por Perrault, no</p><p>século 17, que analisou a relação precipitação-vazão, comparando a</p><p>precipitação com dados de vazão.</p><p>• No século 19 dá-se o início de medições sistemáticas de vazão e</p><p>precipitação;</p><p>• Até a década de 30, prevalece o empirismo, procurando descrever os</p><p>fenômenos naturais, enquanto até a década de 50 é predominante o uso de</p><p>indicadores estatísticos dos processos envolvidos;</p><p>5</p><p>• Com o advento do computador em conjunto com o aprimoramento de</p><p>técnicas estatísticas e numéricas, deu-se um grande avanço na hidrologia.</p><p>Foram desenvolvidos modelos precipitação-vazão e avanços na hidrologia</p><p>estocástica. O escoamento subterrâneo, a limnologia e a modelação</p><p>matemática de processos constituem outros desenvolvimentos importantes.</p><p>A modelagem ajuda a entender e explicar padrões de ocorrência e possibilita</p><p>simular cenários futuros, fornecendo subsídios importantes para responder a perguntas</p><p>do tipo “o que aconteceria se...?”. Um exemplo de modelagem de processos é a</p><p>simulação da circulação da água e do transporte de poluentes em um lago ou rio. Com</p><p>um modelo computacional, é possível inferir sobre o que aconteceria se ocorresse um</p><p>vazamento de óleo próximo a um lago, em termos de áreas atingidas, tempo de</p><p>deslocamento da mancha de óleo, etc. Isso tudo sem o processo estar ocorrendo, apenas</p><p>hipoteticamente, o que permite prever impactos e traçar alternativas de combate</p><p>previamente.</p><p>Ocorrência de água na Terra</p><p>Considera-se, atualmente, que a quantidade total de água na Terra, estimada em</p><p>cerca de 1.386 milhões de km3, tem permanecido de modo aproximadamente constante</p><p>durante os últimos 500 milhões de anos. Entretanto, as quantidades de água estocadas</p><p>na Terra sob as diferentes formas (ou nos diferentes “reservatórios”) variaram</p><p>substancialmente nesse período.</p><p>Na Figura 1.1 é apresentada a distribuição da água na Terra, conforme</p><p>Shiklomanov (1997) apud Setti et al. (2001).</p><p>Verifica-se que cerca de 97,5% do volume total de água na Terra estão nos</p><p>oceanos (água salgada), sendo apenas 2,5% do total constituído por água doce. Por sua</p><p>vez, a água doce é encontrada principalmente sob a forma de geleiras, que representam</p><p>68,7% do total de água doce. Considerando que</p><p>no solo, conforme a</p><p>topografia (relevo), a presença de obstáculos, como rochas, raízes, plantas, etc, sob ação</p><p>da gravidade. Ocorre, então, a formação de pequenos cursos d’água, os córregos, que</p><p>também vão confluindo uns aos outros até alcançarem os rios.</p><p>Nota-se, portanto, que há um longo caminho da água precipitada na bacia até o</p><p>curso d’água principal, escoando inicialmente sobre o solo nas superfícies vertentes e</p><p>daí seguindo o direcionamento da rede de drenagem, dos menores filetes de água até os</p><p>maiores rios.</p><p>Entretanto, a água que corre nos rios não tem como origem apenas o escoamento</p><p>superficial sobre as superfícies vertentes da bacia. Uma parte da vazão4 do rio é</p><p>proveniente do escoamento sub-superficial e subterrâneo, como descrito no Capítulo 2.</p><p>Ou seja, parcela da água precipitada que infiltra vai escoar sub-superficialmente e outra</p><p>4 Vazão = volume por unidade de tempo, geralmente em m3/s ou l/s.</p><p>47</p><p>parcela vai se juntar ao escoamento subterrâneo, alimentando os rios. A rigor, há ainda a</p><p>parcela da precipitação que cai diretamente sobre a superfície dos rios, mas que é</p><p>geralmente desprezível, se for considerada relativamente às demais contribuições.</p><p>Resumindo, em um corpo d’água o escoamento tem como origem as seguintes</p><p>componentes:</p><p>- precipitação direta sobre a superfície do corpo d’água;</p><p>- escoamento superficial nas vertentes da bacia;</p><p>- escoamento sub-superficial;</p><p>- escoamento subterrâneo.</p><p>Hidrograma</p><p>Para estudar ou avaliar o escoamento superficial, é de grande utilidade o traçado</p><p>do hidrograma, que consiste em um gráfico da evolução da vazão ao longo do tempo.</p><p>Para um rio, o hidrograma se refere a uma seção transversal específica, já que ao longo</p><p>do seu curso o rio vai recebendo mais contribuições (volumes de água) e aumentando</p><p>sua vazão5, de jusante para montante. Assim, tomando uma determinada seção de um</p><p>rio, o hidrograma correspondente indica o volume de água escoado por unidade de</p><p>tempo através daquela seção.</p><p>Como comentado anteriormente, há um longo percurso para a água precipitada</p><p>percorrer até atingir uma determinada seção do rio principal na bacia, além de</p><p>“intervirem” ao longo desse caminho outras etapas do ciclo hidrológico, como</p><p>evaporação, transpiração, infiltração, etc. Portanto, o comportamento da vazão ao longo</p><p>do tempo é o resultado de todos os processos e etapas do ciclo hidrológico que</p><p>ocorreram na bacia hidrográfica em questão, desde a ocorrência da precipitação até a</p><p>composição dessa vazão.</p><p>Vendo a bacia hidrográfica como um sistema físico, cuja entrada é a precipitação</p><p>e a saída é a vazão no seu exutório, como comentado no Capítulo 3, entende-se que o</p><p>hidrograma representa a “resposta” da bacia, naquele ponto ou seção considerada, à</p><p>precipitação que ocorreu na sua área de contribuição. E o modo como ocorre essa</p><p>“resposta”, ou seja, o formato do hidrograma (como evoluiu a vazão ao longo do</p><p>5 Em capítulo posterior, será dado maior ênfase às características do fluxo de água em um rio</p><p>propriamente dito (fluxo fluvial).</p><p>48</p><p>Vazão no Rio Uruguai (RS), seção em Garruchos</p><p>0</p><p>5.000</p><p>10.000</p><p>15.000</p><p>20.000</p><p>25.000</p><p>30.000</p><p>35.000</p><p>27/jul 06/ago 16/ago 26/ago 05/set 15/set 25/set</p><p>data (ano de 1965)</p><p>va</p><p>zã</p><p>o</p><p>(</p><p>m</p><p>3/</p><p>s)</p><p>tempo), é reflexo direto das particularidades de cada bacia hidrográfica, estando</p><p>envolvidos fatores como grau de urbanização, tipo de solo, área, etc.</p><p>A título de curiosidade e ilustração, na Figura 5.1 é apresentado um hidrograma</p><p>composto por dados observados (vazões diárias medidas no próprio rio)6 no Rio</p><p>Uruguai, na seção localizada em Garruchos, a cerca de 300 km a montante de</p><p>Uruguaiana. Esse hidrograma é referente ao período entre julho e setembro de 1965,</p><p>com destaque para a cheia que ocorreu entre os dias 16 e 30 de agosto.</p><p>Figura 5.1 – Hidrograma na seção transversal do Rio Uruguai localizada em Garruchos,</p><p>no período de 27/jul/1965 a 15/set/1965.</p><p>O hidrograma no Rio Uruguai apresentado ilustra bem a questão da resposta da</p><p>bacia a um evento chuvoso. Observa-se que a vazão no rio oscilava em torno de 1.000</p><p>m3/s até 16 de agosto, quando começa a aumentar relativamente rápido, superando</p><p>30.000 m3/s por volta do dia 24 de agosto. Claramente, essa ascensão do hidrograma foi</p><p>devido à ocorrência de uma precipitação intensa na área de contribuição a montante.</p><p>Antes da precipitação, praticamente apenas o escoamento subterrâneo estava</p><p>contribuindo para a formação daquela vazão no rio, em torno de 1.000 m3/s.</p><p>Então, dada à ocorrência de um evento chuvoso, a resposta da bacia ou o</p><p>hidrograma resultante tem tipicamente o aspecto daquele mostrado na Figura 5.2, ao</p><p>qual se aproxima bem o hidrograma observado no Rio Uruguai.</p><p>6 Também no capítulo sobre Fluxo Fluvial serão descritos os métodos de medição de vazão.</p><p>49</p><p>Figura 5.2 – Hidrograma típico resultante da ocorrência de uma precipitação na área</p><p>contribuinte.</p><p>No hidrograma esquemático da Figura 5.2, convém destacar alguns pontos</p><p>interessantes:</p><p>- em resposta à precipitação ocorrida, apresentada no alto da figura, a vazão no rio</p><p>começa a subir a partir do instante correspondente ao ponto A, alcançando o pico (ponto</p><p>de máxima vazão) em B e depois decrescendo;</p><p>- o trecho de subida do hidrograma, entre os pontos A e B, é a curva de ascensão do</p><p>hidrograma, enquanto o trecho B-C é a curva de depleção;</p><p>- no hidrograma em questão, parte da vazão é devido ao escoamento superficial nas</p><p>vertentes e parte é devido à alimentação do rio pelas águas subterrâneas (escoamento</p><p>subterrâneo), sendo cada parcela correspondente indicada na figura – do eixo horizontal</p><p>até a curva azul claro corresponde à vazão contribuinte do escoamento subterrâneo; de</p><p>tal curva até a curva azul escuro (hidrograma propriamente dito) corresponde à</p><p>contribuição do escoamento superficial na bacia;</p><p>50</p><p>- o ponto C caracteriza o instante de tempo em que não há mais escoamento superficial</p><p>devido àquela precipitação contribuindo para essa seção do rio; esse ponto C é</p><p>conhecido como ponto de inflexão;</p><p>- também é interessante a caracterização do tempo de pico (tpico), ou seja, o tempo</p><p>transcorrido desde o centro de massa da precipitação até o hidrograma atingir seu</p><p>máximo.</p><p>O traçado da curva indicativa da parcela do hidrograma referente à contribuição</p><p>do escoamento subterrâneo (curva azul claro) compreende o que se chama de separação</p><p>do escoamento superficial. Geralmente são adotados métodos gráficos para o traçado</p><p>dessa curva, cuja descrição foge ao propósito deste texto, podendo ser encontrados</p><p>alguns exemplos em Tucci (2000).</p><p>Convém ressaltar que, desde o início da precipitação (instante de tempo t0),</p><p>transcorreu um certo tempo até que essa água precipitada atingisse o curso d’água na</p><p>seção em questão, o que só ocorreu no instante de tempo tA, referente ao ponto A, que já</p><p>foi indicado como o início da ascensão do hidrograma. Novamente, isso é decorrente de</p><p>todos os processos que estão envolvidos de certa forma no caminho desde a ocorrência</p><p>da precipitação até a vazão no rio.</p><p>Tempo de Concentração</p><p>Uma característica importante do hidrograma de uma bacia é o tempo de</p><p>concentração (tc), definido como sendo o tempo necessário para que toda a bacia</p><p>hidrográfica contribua para o ponto (seção) analisado. Em outras palavras, o tempo de</p><p>concentração também pode ser entendido como o tempo necessário para que a água</p><p>precipitada no ponto mais distante da bacia se desloque até a seção analisada.</p><p>Na prática, há diversas equações empíricas que correlacionam aspectos físicos</p><p>da bacia com o tempo de concentração, sendo uma forma usual de estimar esse</p><p>parâmetro. A equação de Kirpich e a desenvolvida pelo California Culverts</p><p>Practice</p><p>são dois exemplos:</p><p>385,077,0989,3 −⋅⋅= SLtC (Kirpich)</p><p>385,0155,157 −⋅⋅= HLtC (Califonia Culverts Practice)</p><p>51</p><p>onde: tC é o tempo de concentração (min); L é o comprimento do rio principal (km); S é</p><p>a declividade do rio principal (m/m); H é a diferença de cota entre o exutório da bacia e</p><p>o ponto mais a montante (m).</p><p>Fatores intervenientes no hidrograma</p><p>Como já comentado, o hidrograma constitui a resposta da bacia à ocorrência de</p><p>uma determinada precipitação, sendo resultado de todos os processos envolvidos que</p><p>acontecem na bacia desde o instante em que a chuva cai até atingir o rio. Então, ao</p><p>imaginar esse caminho e os processos envolvidos, percebe-se que há diversos fatores</p><p>que influenciam no modo como a bacia vai responder à precipitação, ou seja, em como</p><p>é o comportamento da vazão ao longo do tempo – o hidrograma. Os seguintes fatores</p><p>podem ser listados como os principais: características fisiográficas da bacia; tipo de</p><p>solo; uso e ocupação do solo; intervenções no rio; características da precipitação.</p><p>Características fisiográficas da bacia</p><p>Aspectos como forma, área, relevo e rede de drenagem têm grande influência na</p><p>forma do hidrograma. Por exemplo, uma bacia com formato arredondado tende a</p><p>apresentar o pico do hidrograma maior do que o de uma bacia de formato mais</p><p>alongado, considerando semelhantes as demais condições. Como o escoamento ocorre</p><p>pela ação da gravidade, é intuitiva a percepção de que uma bacia com maiores</p><p>declividades do terreno também está sujeita a maiores cheias (hidrogramas mais</p><p>acentuados) do que aquelas mais planas.</p><p>No mesmo sentido, o fato de apresentar uma rede de drenagem melhor</p><p>distribuída espacialmente (mais ramificada e com menor “espaço” entre os cursos</p><p>d’água) também facilita o escoamento superficial e aumenta a vazão de pico no exutório</p><p>da bacia.</p><p>Tipo de solo</p><p>Conforme a bacia apresente solos mais ou menos permeáveis, haverá maior ou</p><p>menor infiltração, respectivamente, ditando portanto a geração de escoamento</p><p>superficial. Solos argilosos, por exemplo, apresentam menor permeabilidade do que</p><p>solos arenosos. Também influencia a questão da umidade inicial do solo, ou seja, a</p><p>umidade do solo no instante em que ocorre a precipitação. Obviamente, se o solo já está</p><p>52</p><p>urbanizada</p><p>rural</p><p>saturado ou com uma certa umidade, decorrente de uma precipitação anterior, ao ocorrer</p><p>a nova precipitação sua capacidade de absorver essa água será nula ou bem inferior</p><p>àquela se ele estivesse em condições normais, repercutindo na maior geração de</p><p>escoamento superficial7.</p><p>Uso e ocupação do solo</p><p>Analogamente ao tipo de solo, o tipo de atividade ou de ocupação da bacia</p><p>reflete diretamente no escoamento superficial, pois áreas urbanas, florestas e campos</p><p>agrícolas, por exemplo, apresentam diferentes comportamentos quanto à capacidade de</p><p>infiltração e de armazenamento da água precipitada.</p><p>Áreas urbanas apresentam praticamente toda a área coberta por superfícies</p><p>impermeáveis, fazendo com que quase todo o total precipitado escoe superficialmente,</p><p>ao passo que em áreas rurais uma parcela da precipitação infiltra no solo. Assim, no</p><p>primeiro caso, o hidrograma apresenta um pico mais acentuado e que ocorre mais rápido</p><p>do que no segundo caso, como ilustra a Figura 5.3.</p><p>Figura 5.3 – Comparação esquemática entre os hidrogramas de uma bacia rural e depois</p><p>na situação urbanizada (Fonte: adaptado de Tucci, 2000).</p><p>Intervenções no rio</p><p>Procurando atender suas necessidades, o homem tem alterado substancialmente</p><p>os rios e arroios, seja na forma de barramentos como através de desvios, retificação e</p><p>canalização do rio. A construção de barragens altera drasticamente a variação natural da</p><p>vazão no rio a jusante da obra e, portanto, o hidrograma no trecho em questão é</p><p>7 Esse processo será melhor discutido em capítulo específico referente à Infiltração.</p><p>53</p><p>natural</p><p>regularizada</p><p>totalmente dependente do modo como é operada a barragem, do quanto de vazão ela</p><p>“deixa passar” para jusante – a vazão no rio a jusante de uma barragem é normalmente</p><p>referida como vazão regularizada (Figura 5.4).</p><p>As intervenções humanas no sentido de retificar e canalizar o curso d’água</p><p>também repercutem na forma do hidrograma, já que a canalização geralmente</p><p>possibilita um fluxo mais rápido, com maiores velocidades do escoamento.</p><p>Figura 5.4 – Comparação esquemática dos hidrogramas em um rio a montante</p><p>(hidrograma natural) e a jusante de uma barragem (hidrograma regularizado) (Fonte:</p><p>adaptado de Tucci, 2000).</p><p>Características da precipitação</p><p>Além dos demais fatores mencionados, que são função da própria bacia, as</p><p>características da precipitação também influenciam bastante o formato do hidrograma.</p><p>Chuvas rápidas mas com maior intensidade tendem a provocar hidrogramas com</p><p>maiores picos do que chuvas de menor intensidade e maior duração, cujo hidrograma é</p><p>“mais achatado”, ou seja, a vazão é mais uniforme ao longo tempo, relativamente ao</p><p>primeiro caso – a Figura 5.5 traz um exemplo.</p><p>Mas a distribuição espacial da chuva também repercute significativamente no</p><p>aspecto do hidrograma, pois a ocorrência da precipitação em uma área próxima à seção</p><p>do rio em análise vai gerar maiores vazões do que se essa mesma precipitação ocorresse</p><p>apenas na cabeceira da bacia.</p><p>54</p><p>P1</p><p>P2</p><p>P1</p><p>P2</p><p>Figura 5.5 – Comparação esquemática entre os hidrogramas resultantes de uma</p><p>precipitação mais concentrada no tempo (P1) e uma uniformemente distribuída no</p><p>tempo (P2) (Fonte: adaptado de Tucci, 2000).</p><p>Precipitação efetiva</p><p>Como já comentado, a principal origem do escoamento superficial é a</p><p>precipitação. Entretanto, apenas uma parcela da precipitação que atinge o solo gera</p><p>escoamento superficial, já que parte evapora, infiltra ou fica armazenada em depressões</p><p>do solo (Figura 5.6).</p><p>Figura 5.6 – Principais “destinos” do total precipitado que atinge o solo.</p><p>À parcela da precipitação que produz escoamento superficial dá-se o nome de</p><p>precipitação efetiva. Para sua determinação, os principais métodos são aqueles que</p><p>utilizam equações de infiltração, índices e o método SCS.</p><p>55</p><p>Na tentativa de representar o processo de infiltração da água no solo, foram</p><p>desenvolvidas algumas equações, que serão descritas em capítulo posterior deste texto.</p><p>Tais equações não são normalmente empregadas para a determinação da precipitação</p><p>efetiva por requererem uma caracterização do solo da região, para estimar os parâmetros</p><p>da infiltração, o que nem sempre está disponível.</p><p>Índices</p><p>O uso de índices consiste em um método simplificado de determinar a</p><p>precipitação efetiva, através do emprego de um fator constante, chamado índice. Tal</p><p>fator pode ser estimado a partir dos dados de vazão ou adotando-se um valor pré-</p><p>ajustado com base em eventos anteriores de chuva ou com base no valor estimado para</p><p>outras bacias com características semelhantes.</p><p>O índice αααα é um fator constante multiplicativo da precipitação total (P), cujo</p><p>resultado é a precipitação efetiva (Pef), sendo seu valor geralmente entre 0,8 e 0,9</p><p>(Tucci, 2000):</p><p>PPef ⋅= α</p><p>Outro índice é o φφφφ, cujo valor também constante deve ser subtraído do total</p><p>precipitado para obter a precipitação efetiva:</p><p>φ−= PPef ,</p><p>onde φ pode ser determinado dividindo-se a diferença entre o total precipitado e o total</p><p>escoado pelo número de intervalos de tempo em que a precipitação foi discretizada:</p><p>t</p><p>tt</p><p>n</p><p>QP� �−</p><p>=φ ,</p><p>onde Pt e Qt é a precipitação e a vazão no instante de tempo t, e nt é o número de</p><p>intervalos de tempo.</p><p>Seguindo o mesmo raciocínio, o índice w também constitui um valor constante a</p><p>ser descontado da precipitação total para obter a precipitação efetiva:</p><p>wPPef −=</p><p>,</p><p>sendo que na estimativa de tal índice é considerado explicitamente um termo para</p><p>contabilizar as perdas iniciais de precipitação – parâmetro S, cujo valor é adotado –:</p><p>56</p><p>t</p><p>tt</p><p>n</p><p>SQP</p><p>w � � −−</p><p>=</p><p>Método SCS</p><p>Esse método foi desenvolvido pelo Soil Conservation Service, do Departamento</p><p>de Agricultura dos EUA, em 1957, baseado em estudos que procuraram correlacionar a</p><p>precipitação total e a efetiva. Tais estudos indicaram uma relação do tipo:</p><p>( ) ddPP nn</p><p>ef −+= ,</p><p>onde P é a precipitação total, Pef é a precipitação efetiva, n é um coeficiente empírico e</p><p>d = P - Pef.</p><p>Fazendo algumas suposições e considerações, foi obtida a seguinte expressão</p><p>para determinação da precipitação efetiva:</p><p>( )</p><p>SP</p><p>SP</p><p>Pef 8,0</p><p>2,0 2</p><p>+</p><p>−</p><p>= (se P > 0,2S)</p><p>onde S representa a retenção potencial do solo, isto é, a sua capacidade de armazenar</p><p>água.</p><p>Este método considera que para cada precipitação ocorrem perdas iniciais</p><p>(evaporação, infiltração, etc) da ordem de 0,2S e, portanto, caso a precipitação seja</p><p>inferior a tais perdas iniciais, não há formação de escoamento superficial, ou seja, a</p><p>precipitação efetiva é zero:</p><p>0=efP (se P < 0,2S)</p><p>Para estimar o valor de S, estabeleceu-se a relação desse parâmetro com um</p><p>outro, o chamado CurveNumber (CN), que não possui significado físico em si mas tem</p><p>seu valor diretamente relacionado ao tipo e umidade do solo e à ocupação da bacia. A</p><p>relação entre S e CN é:</p><p>254</p><p>25400</p><p>−=</p><p>CN</p><p>S</p><p>A definição do valor de CN é feita por consulta a valores tabelados, em função</p><p>do tipo do solo, da umidade antecedente do solo (condições de umidade do solo</p><p>anteriormente à ocorrência da precipitação que está sendo analisada), e do tipo de</p><p>atividade/ocupação que é desenvolvida na bacia.</p><p>57</p><p>Grupo Descrição</p><p>Fonte: Porto (1995).</p><p>Solos barrentos com teor de argila de 20 a 30%, mas sem</p><p>camadas argilosas impermeáveis ou contendo pedras até</p><p>profundidades de 1,2m. No caso de terras roxas, esses dois limites</p><p>máximos podem ser de 40% e 1,5m. Nota-se a cerca de 60 cm de</p><p>profundidade, camada mais densificada que no Grupo B, mas</p><p>ainda longe das condições de impermebialidade.</p><p>C</p><p>Solos argilosos (30 - 40% de argila total) e ainda com camada</p><p>densificada a uns 50 cm de profundidade. Ou solos arenosos</p><p>como do Grupo B, mas com camada argilosa quase impermeável,</p><p>ou horizonte de seixos rolados.</p><p>D</p><p>Solos arenosos com baixo teor de argila total, inferior a 8%, não</p><p>havendo rocha nem camadas argilosas, e nem mesmo</p><p>densificadas até a profundidade de 1,5 m. O teor de húmus é</p><p>muito baixo, não atingindo 1%.</p><p>A</p><p>Solos arenosos menos profundos que os do Grupo A e com menor</p><p>teor de argila total, porém ainda inferior a 15%. No caso de terras</p><p>roxas, esse limite pode subir a 20% graças à maior porosidade. Os</p><p>dois teores de húmus podem subir, respectivamente, a 1,2 e 1,5%.</p><p>Não pode haver pedras e nem camadas argilosas até 1,5m, mas é,</p><p>quase sempre, presente camada mais densificada que a camada</p><p>superficial.</p><p>B</p><p>Condição Descrição</p><p>Fonte: Porto (1995).</p><p>I</p><p>Solo úmido (próximo da saturação): as chuvas, nos últimos</p><p>cinco dias, foram superiores a 40 mm, e as condições</p><p>meterológicas foram desfavoráveis a altas taxas de evaporação.</p><p>III</p><p>II</p><p>Solos secos: as chuvas, nos últimos cinco dias, não</p><p>ultrapassaram 15 mm.</p><p>Situação média na época das cheias: as chuvas, nos últimos</p><p>cinco dias, totalizaram de 15 a 40 mm.</p><p>Inicialmente deve-se escolher o tipo de solo dentre os quatro grupos</p><p>especificados na Tabela 5.1. Em seguida, é definida a condição de umidade antecedente</p><p>do solo, sendo estabelecidas três condições especificadas na Tabela 5.2. Independente</p><p>de qual condição de umidade do solo foi escolhida na tabela anterior, o próximo passo</p><p>consiste em escolher o valor do CN para a condição de umidade II, conforme o uso do</p><p>solo e o tratamento feito na sua superfície (Tabela 5.3). Por fim, caso a condição de</p><p>umidade não seja a II, procede-se à conversão do valor do CN escolhido no passo</p><p>anterior, utilizando-se da Tabela 5.4.</p><p>Tabela 5.1 – Tipos de solo considerados pelo SCS para escolha do CN.</p><p>Tabela 5.2 – Condições de umidade antecedente do solo considerados pelo SCS para</p><p>escolha do CN.</p><p>58</p><p>A B C D</p><p>Uso residencial</p><p>Tamanho médio do lote % Impermeável</p><p>até 500 m2 65 77 85 90 92</p><p>1000 m2 38 61 75 83 87</p><p>1500 m2 30 57 72 81 86</p><p>Estacionamentos pavimentados, telhados 98 98 98 98</p><p>Ruas e estradas:</p><p>pavimentadas, com guias e drenagens 98 98 98 98</p><p>com cascalho 76 85 89 91</p><p>de terra 72 82 87 89</p><p>Áreas comerciais (85% de impermebialização) 89 92 94 95</p><p>Distritos industriais (72% de impermebialização) 81 88 91 93</p><p>Espaços abertos, parques, jardins:</p><p>boas condições, cobertura de grama > 75% 39 61 74 80</p><p>condições médias, cobertura de grama > 50% 49 69 79 84</p><p>Terreno preparado para plantio, descoberto</p><p>plantio em linha reta 77 86 91 94</p><p>Culturas em fileira</p><p>linha reta condições ruins 72 81 88 91</p><p>condições boas 67 78 85 89</p><p>curva de nível condições ruins 70 79 84 88</p><p>condições boas 65 75 82 86</p><p>Cultura de grãos</p><p>linha reta condições ruins 65 76 84 88</p><p>condições boas 63 75 83 87</p><p>curva de nível condições ruins 63 74 82 85</p><p>condições boas 61 73 81 84</p><p>Pasto</p><p>linha reta condições ruins 68 79 86 89</p><p>condições médias 49 69 79 84</p><p>condições boas 39 61 74 80</p><p>curva de nível condições ruins 47 67 81 88</p><p>condições médias 25 59 75 83</p><p>condições boas 6 35 70 79</p><p>Campos condições boas 30 58 71 78</p><p>Florestas condições ruins 45 66 77 83</p><p>condições médias 36 60 73 79</p><p>condições boas 25 55 70 77</p><p>Fonte: Porto (1995).</p><p>Uso do solo/Tratamento/Condições hidrológicas</p><p>Grupo hidrológico de solos</p><p>Tabela 5.3 – Valores de CN em função da cobertura do solo e do tipo hidrológico de</p><p>solo, para a condição de umidade II.</p><p>59</p><p>Fonte: Porto (1995).</p><p>15 30 50</p><p>23 40 60</p><p>19 35 55</p><p>31 50 70</p><p>27 45 65</p><p>40 60 79</p><p>35 55 75</p><p>51 70 87</p><p>45 65 83</p><p>63 80 94</p><p>57 75 91</p><p>78 90 98</p><p>70 85 97</p><p>100 100 100</p><p>87 95 99</p><p>Condições de umidade</p><p>I II III</p><p>Tabela 5.4 – Conversão dos valores de CN conforme as condições de umidade</p><p>antecedente do solo.</p><p>Transformação da precipitação em vazão</p><p>Com já foi comentado em capítulos anteriores, o papel hidrológico da bacia</p><p>hidrográfica é o de transformar uma entrada de volume de água concentrada no tempo –</p><p>a precipitação – em uma saída de água mais distribuída no tempo – a vazão –. Isso é o</p><p>que se chama de transformação chuva-vazão.</p><p>Um dos principais interesses da hidrologia consiste justamente em estimar a</p><p>transformação chuva-vazão, ou seja, tentar estimar qual a resposta da bacia hidrográfica</p><p>dada a ocorrência de uma determinada precipitação. Isso tem grandes aplicações como,</p><p>por exemplo, estimar os impactos sobre a vazão em um rio e sobre o meio ambiente</p><p>decorrentes de mudanças na ocupação do solo, como a impermeabilização de áreas pela</p><p>urbanização ou o desmatamento. Outro exemplo é a previsão e controle de enchentes.</p><p>Há duas formas mais usadas para realizar a transformação chuva-vazão: (i)</p><p>métodos simplificados que procuram estimar características do hidrograma; (ii)</p><p>modelagem do processo “chuva-vazão”.</p><p>No primeiro caso, são empregadas equações empíricas que estimam parâmetros</p><p>como a vazão</p><p>e o tempo de pico do hidrograma, por exemplo, sendo mais comuns os</p><p>métodos racional e do hidrograma unitário. Utilizando modelos hidrológicos (modelos</p><p>chuva-vazão), no outro caso, procura-se reproduzir os processos físicos envolvidos na</p><p>60</p><p>transformação chuva-vazão, sendo necessária uma grande quantidade de informações,</p><p>como dados históricos observados chuva e vazão, caracterização espacial do tipo e uso</p><p>do solo, parâmetros específicos para diversas equações, informações de relevo, rede de</p><p>drenagem, etc, além de um alto custo de recursos e de tempo.</p><p>Em função de fatores como objetivo do estudo, características da bacia (área,</p><p>tempo de concentração, homogeneidade, rede de drenagem), escala de trabalho,</p><p>disponibilidade e qualidade de informações, tempo e recursos disponíveis, deve-se optar</p><p>entre as duas metodologias citadas para estimar a transformação chuva-vazão.</p><p>Em projetos de drenagem urbana, geralmente são empregados métodos</p><p>simplificados, como o racional e do hidrograma unitário, os quais são descritos a seguir.</p><p>Método racional</p><p>Esse método consiste apenas em estimar a vazão de pico do hidrograma para</p><p>uma determinada bacia, considerando que a vazão é diretamente proporcional à área da</p><p>bacia e à intensidade da chuva. Essa consideração assume que a precipitação ocorre</p><p>uniformemente em toda a área da bacia, e também que a intensidade é constante ao</p><p>longo da duração da precipitação – em outras palavras, distribuição espacial e temporal</p><p>uniformes da precipitação.</p><p>A expressão do método racional, adotando unidades usuais para a área da bacia e</p><p>a intensidade da chuva, é:</p><p>AiCQp ⋅⋅⋅= 275,0 ,</p><p>onde Qp é a vazão de pico do hidrograma; i é a intensidade da chuva (mm/h); A é a área</p><p>da bacia (km2); C é o coeficiente de escoamento superficial (adimensional); e o valor</p><p>0,275 é usado para conversão de unidades.</p><p>O valor do coeficiente C é escolhido conforme o tipo de ocupação do solo,</p><p>denotando uma maior ou menor tendência à geração de escoamento superficial (Tabela</p><p>5.5). Caso a ocupação da bacia seja relativamente diversificada, podendo-se identificar</p><p>sub-áreas homogêneas, correspondendo a diferentes valores do coeficiente de</p><p>escoamento superficial, o valor a adotar pode ser determinado pela média ponderada</p><p>daqueles referentes a cada sub-área:</p><p>�</p><p>=</p><p>⋅=</p><p>n</p><p>j</p><p>jjm AC</p><p>A</p><p>C</p><p>1</p><p>)(</p><p>1</p><p>,</p><p>61</p><p>Ocupação do solo C</p><p>Fonte: adaptado de Porto (1995).</p><p>Subúrbios com alguma edificação : partes de arrabaldes e subúrbios com pequena densidade</p><p>de construções</p><p>0,10 a 0,25</p><p>Matas, parques e campos de esportes : partes rurais, áreas verdes, superfícies arborizadas,</p><p>parques ajardinados e campos de esporte sem pavimentação</p><p>0,05 a 0,20</p><p>Edificações com poucas superfícies livres : partes residenciais com construções cerradas, ruas</p><p>pavimentadas</p><p>0,50 a 0,60</p><p>Edificações com muitas superfícies livres : partes residenciais com ruas macadamizadas ou</p><p>pavimentadas, mas com muitas áreas verdes</p><p>0,25 a 0,50</p><p>Edificações muito densas : partes centrais, densamente construídas de uma cidade com ruas e</p><p>calçadas pavimentadas</p><p>0,70 a 0,95</p><p>Edificações não muito densas : partes adjacentes ao centro, de menor densidade de</p><p>habitações, mas com ruas e calçadas pavimentadas</p><p>0,60 a 0,70</p><p>onde: Cm é o coeficiente médio de escoamento superficial; A é área total da bacia; Cj e</p><p>Aj são o coeficiente de escoamento superficial e a área da bacia correspondentes ao tipo</p><p>de ocupação j, respectivamente; n é a quantidade de tipos de ocupação identificados na</p><p>bacia.</p><p>Em função das simplificações consideradas no método, a aplicação do mesmo é</p><p>recomendada para pequenas bacias, com área inferior a 3 km2 ou tempo de concentração</p><p>inferior a 1 h. Em bacias de tal ordem de grandeza, a consideração de distribuição</p><p>espacial e temporal uniforme da precipitação é mais aceitável.</p><p>Tabela 5.5 – Coeficientes de escoamento superficial em função da ocupação do solo.</p><p>Método do hidrograma unitário</p><p>Como já comentado diversas vezes, a resposta da bacia a uma dada precipitação</p><p>é a vazão no seu exutório, representada pelo hidrograma. Nesse sentido, desenvolveu-se</p><p>o conceito de hidrograma unitário (HU), que corresponde à resposta da bacia a uma</p><p>precipitação unitária.</p><p>O HU está associado a uma duração específica da precipitação, ou seja, o HU é a</p><p>resposta da bacia a uma precipitação unitária com determinada duração (Figura 5.7).</p><p>Para outra duração de chuva, já corresponderia um outro HU. Tais HUs representam</p><p>uma característica da bacia, sendo reflexo de todos aqueles fatores intervenientes no</p><p>processo de transformação chuva-vazão que dizem respeito à bacia (área, rede de</p><p>drenagem, relevo, tipo e cobertura do solo, etc).</p><p>Entretanto, o conceito de hidrograma unitário assume simplificadamente a</p><p>uniformidade das distribuições espacial e temporal da precipitação.</p><p>62</p><p>çã á</p><p>çã</p><p>Sabendo-se a resposta d abacia a uma</p><p>precipitação unitária de duração d</p><p>(ou seja, o HU)</p><p>Dado que ocorreu uma precipitação P</p><p>de mesma duração d na bacia</p><p>Determina-se a resposta da bacia</p><p>a essa precipitação P</p><p>(ou seja, o hidrograma resultante)</p><p>Figura 5.7 – Esquema ilustrativo do conceito de Hidrograma Unitário.</p><p>A Figura 5.8 ilustra o processo de estimar o hidrograma da bacia a partir do</p><p>hidrograma unitário. Esse constitui a resposta da bacia a uma precipitação unitária de</p><p>determinada duração (por exemplo, d) e, ao ocorrer uma outra precipitação de mesma</p><p>duração d, o hidrograma correspondente é estimado com base naquele HU.</p><p>A forma como é feita tal estimativa é fundamentada em dois princípios básicos</p><p>que norteiam a idéia central do método, que são os princípios da proporcionalidade e da</p><p>superposição.</p><p>Segundo o princípio da proporcionalidade, para uma precipitação P de duração</p><p>igual à da precipitação unitária do HU, a resposta da bacia a tal precipitação P tem a</p><p>mesma duração do HU, sendo as vazões proporcionais ao HU, como ilustra a Figura</p><p>5.9.</p><p>Figura 5.8 – Resumo simplificado do método do hidrograma unitário.</p><p>63</p><p>precipitação unitária</p><p>duração d</p><p>HU</p><p>P = 2 x precipitação unitária</p><p>duração do escoam. superficial</p><p>Hidrograma devido à P</p><p>Q</p><p>2Q</p><p>Figura 5.9 – Princípio da proporcionalidade no conceito do HU.</p><p>Já pelo princípio da superposição, o método do HU considera que, dada a</p><p>ocorrência de precipitações consecutivas no tempo, cada uma delas produz uma resposta</p><p>na bacia independente da outra (proporcional ao HU, pelo primeiro princípio). Como</p><p>ilustra a Figura 5.10, o hidrograma 1 representa a resposta da bacia à precipitação P1,</p><p>enquanto o hidrograma 2 corresponde à precipitação P2. Tais hidrogramas são</p><p>calculados independentemente da ocorrência do outro, apenas fazendo a</p><p>proporcionalidade em relação ao HU (na figura em questão, embora P1 e P2 tenham</p><p>graficamente o mesmo valor, a regra é válida para quaisquer volumes precipitados). O</p><p>hidrograma resultante da ocorrência das duas precipitações (P1 e P2), que ocorreram em</p><p>intervalos de tempo consecutivos, é dado pela soma das ordenadas dos hidrogramas 1 e</p><p>2, para cada instante de tempo.</p><p>A partir de dados históricos observados de vazão e precipitação, há alguns</p><p>procedimentos para estimar o HU da bacia para determinada duração, como aqueles</p><p>descritos em Tucci (2000). Entretanto, não é comum a disponibilidade de tais</p><p>informações, impossibilitando a aplicação desses procedimentos. Para contornar essa</p><p>dificuldade foram desenvolvidos hidrogramas unitários “artificiais”, estimados com</p><p>base em relações empíricas a partir de características físicas da bacia e do tempo de</p><p>concentração – são os chamados hidrogramas unitários sintéticos (HUS).</p><p>64</p><p>duração d</p><p>P1 P2</p><p>Hidrog. 1</p><p>Hidrog. 2</p><p>Q1</p><p>Q2</p><p>Q = Q1 + Q2</p><p>Qp</p><p>tp</p><p>tb</p><p>d</p><p>precipitação</p><p>escoamento</p><p>superficial</p><p>tempo</p><p>Figura 5.10 – Princípio da superposição no conceito do HU.</p><p>Um dos hidrogramas unitários sintéticos (HUS) mais comuns é o do SCS, que</p><p>possui uma forma triangular (Figura 5.11), sendo suas dimensões especificadas pelas</p><p>relações abaixo:</p><p>Ctd ⋅= 133,0</p><p>CP t</p><p>d</p><p>t ⋅+= 6,0</p><p>2</p><p>Pb tt ⋅= 67,2</p><p>P</p><p>P t</p><p>A</p><p>Q 08,2=</p><p>onde: d é a duração da precipitação (h); tc é o tempo de concentração da bacia (h); tp é o</p><p>tempo de pico do HUS (h); tb é o tempo de base do HUS (duração do escoamento</p><p>superficial – h); Qp é a vazão de pico do HUS (m3/s); A é a área da bacia (km2).</p><p>Figura 5.11 – Hidrograma Unitário Sintético do SCS.</p><p>65</p><p>Assim, segundo o SCS, a resposta da bacia à precipitação unitária é um</p><p>hidrograma triangular, cuja vazão de pico é estimada pela relação apresentada</p><p>anteriormente, assim como o tempo de pico e a duração do escoamento superficial (ou</p><p>tempo de base). Valem para o HUS os mesmos princípios que norteiam o HU</p><p>(proporcionalidade e superposição).</p><p>Dada a ocorrência de precipitações consecutivas de diferentes lâminas de água,</p><p>aplicando-se os princípios de proporcionalidade e superposição obtém-se o hidrograma</p><p>final resultante da bacia, como ilustrado na Figura 5.10 para o caso de duas</p><p>precipitações. Em tal exemplo, a superposição foi realizada graficamente, o que se torna</p><p>inviável quando se pensa em um maior número de precipitações.</p><p>Convém aqui fazer um esclarecimento. Ao se falar em precipitações</p><p>consecutivas, está se referindo aos volumes precipitados em cada intervalo de tempo</p><p>igual à duração estabelecida na precipitação unitária do HU (lembrando: o HU é</p><p>definido para uma determinada duração da chuva). Na prática, tem-se um volume total</p><p>precipitado que é discretizado (dividido) no tempo em tais intervalos de tempo.</p><p>Para realizar a superposição dos hidrogramas de cada precipitação individual, ou</p><p>seja, para aplicar o método do hidrograma unitário, faz-se o que se chama de</p><p>convolução. Esse processo nada mais é do que: (i) cálculo das ordenadas do hidrograma</p><p>(as vazões propriamente ditas) referentes a cada precipitação individual em intervalos</p><p>de tempo discretizados; e (ii) a soma das ordenadas dos diversos hidrogramas nos</p><p>intervalos de tempo correspondentes. A atenção maior deve-se dar ao “deslocamento”</p><p>no tempo dos hidrogramas de cada precipitação, conforme o instante de tempo em que</p><p>ocorreu cada uma delas.</p><p>A seguir é apresentado um exemplo ilustrativo da convolução.</p><p>Seja um hidrograma unitário da bacia definido pelos seguintes pontos (Figura</p><p>5.12):</p><p>no tempo t = 1, vazão q1;</p><p>no tempo t = 2, vazão q2;</p><p>no tempo t = 3, vazão q3;</p><p>no tempo t = 4, vazão q4.</p><p>66</p><p>1 2 3 4 t1 2 3 4 t</p><p>Figura 5.12 – Hidrograma Unitário Sintético do SCS do exemplo.</p><p>Agora, supondo que ocorreu uma precipitação P1 no instante de tempo t = 0 e</p><p>em seguida outra precipitação P2 em t = 1 (volumes de água precipitados iguais a P1 e</p><p>P2, respectivamente), tem-se que:</p><p>- o hidrograma resultante exclusivamente da precipitação P1 tem as seguintes</p><p>ordenadas:</p><p>em t = 0, Q0 = 0;</p><p>em t = 1, Q1 = P1.q1;</p><p>em t = 2, Q2 = P1.q2;</p><p>em t = 3, Q3 = P1.q3;</p><p>em t = 4, Q4 = P1.q4.</p><p>- o hidrograma resultante exclusivamente da precipitação P2 é:</p><p>em t = 0, Q0 = 0;</p><p>em t = 1, Q1 = 0;</p><p>em t = 2, Q2 = P2.q1;</p><p>em t = 3, Q3 = P2.q2;</p><p>em t = 4, Q4 = P2.q3;</p><p>em t = 5, Q5 = P2.q4.</p><p>Deve ser ressaltado que cada a resposta da bacia a cada precipitação foi</p><p>considerada tendo início no intervalo de tempo seguinte à ocorrência da precipitação (no</p><p>HUS desse exemplo, a precipitação ocorreu em t = 0 e a vazão gerada iniciou-se em t =</p><p>1). Dessa forma, a precipitação P1 ocorreu em t = 0, provocando uma vazão na seção</p><p>considerada que se inicia em t = 1. Analogamente, a primeira resposta à precipitação P2</p><p>(ocorrida em t = 1), foi no tempo t = 2.</p><p>67</p><p>Assim, o hidrograma resultante das duas precipitações é:</p><p>em t = 0, Q0 = 0;</p><p>em t = 1, Q1 = P1.q1;</p><p>em t = 2, Q2 = P1.q2 + P2.q1;</p><p>em t = 3, Q3 = P1.q3 + P2.q2;</p><p>em t = 4, Q4 = P1.q4 + P2.q3;</p><p>em t = 5, Q5 = P2.q4.</p><p>68</p><p>������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��((((����</p><p>���#��#�������#���#��#�������#���#��#�������#���#��#�������#����</p><p>#�#�����'��#�!����</p><p>#�#�����'��#�!����</p><p>#�#�����'��#�!����</p><p>#�#�����'��#�!����</p><p>����</p><p>Introdução</p><p>Como já visto em capítulos anteriores, apenas uma parcela da precipitação gera</p><p>efetivamente escoamento superficial, em uma bacia hidrográfica. Do total precipitado,</p><p>parte é interceptada pela vegetação, parte evapora, parte infiltra, parte é absorvida pela</p><p>vegetação e eliminada pela transpiração e ainda uma parte fica retida em depressões do</p><p>solo.</p><p>Todos esses processos compõem (juntamente com outros não mencionados) o</p><p>chamado ciclo hidrológico e representam “perdas” na bacia hidrográfica. Vendo a bacia</p><p>como um sistema físico, que transforma uma entrada de água concentrada no tempo</p><p>(precipitação) em uma saída de água mais distribuída (escoamento superficial), e</p><p>sabendo então que o escoamento representa apenas uma parte da precipitação, as demais</p><p>parcelas do total precipitado são comumente referidas como perdas, por representarem</p><p>volumes de água de difícil utilização direta para aproveitamento humano.</p><p>Neste capítulo, serão tratadas especificamente as etapas de interceptação e</p><p>retenção superficial (ou armazenamento em depressões do solo).</p><p>Interceptação</p><p>A interceptação pode ser definida como a retenção de parte da precipitação</p><p>acima da superfície do solo, o que pode ocorrer devido à vegetação ou outras formas de</p><p>obstrução, sendo normalmente considerada apenas a primeira.</p><p>A maior parte do volume de água interceptado é então “perdida” através da</p><p>evaporação, ou seja, “deixa” de gerar escoamento superficial por evaporar. Dependendo</p><p>69</p><p>do estudo hidrológico desenvolvido, a interceptação pode ser desprezível ou ser</p><p>considerada embutida junto com outras perdas em um termo ou coeficiente único.</p><p>Entretanto, dependendo principalmente do tipo e densidade da cobertura vegetal na</p><p>bacia e das características da precipitação, o volume retido na vegetação pode ser bem</p><p>significativo e merecer um tratamento específico no processo de transformação chuva-</p><p>vazão.</p><p>Por exemplo, Linsley (1949) apud Tucci (2000) menciona que, sob determinadas</p><p>condições, a interceptação pode ser de 25% do total precipitado anual em uma bacia</p><p>hidrográfica. Já segundo Wingham (1970) apud Tucci (2000), o volume interceptado</p><p>pela vegetação pode atingir 250 mm ao ano em regiões úmidas com florestas.</p><p>Processo de interceptação</p><p>O processo de interceptação pela cobertura vegetal é ilustrado pela seqüência da</p><p>Figura 6.1, apresentada abaixo.</p><p>Figura 6.1 – Processo de interceptação da precipitação pela vegetação.</p><p>Considerando a não ocorrência de precipitação por um certo período de tempo,</p><p>ou seja, sem precipitação anterior, a cobertura vegetal se apresenta “seca”, isto é, sem</p><p>volume de água acumulado na superfície das folhas. Ao iniciar uma precipitação</p><p>(Figura 6.1-a), parte atravessa a folhagem, passando entre os espaços entre as folhas, e</p><p>parte é interceptada por elas. À medida que a precipitação continua, as folhas passam a</p><p>acumular um volume de água na sua superfície (Figura 6.1-b), o que vai variar de</p><p>acordo com o tamanho, forma, estrutura, etc, de cada folha. Esse volume acumulado na</p><p>vegetação passa a sofrer ação da radiação solar e parte evapora. Chega-se a um ponto</p><p>em que o volume de água armazenado nas folhas é tanto que passa a escoar pelos galhos</p><p>e troncos ou “precipitando” novamente pelas suas bordas (Figura 6.1-c).</p><p>(a) (b) (c)</p><p>70</p><p>Pode-se perceber, pelo processo descrito anteriormente, que o volume de água</p><p>interceptado</p><p>pela vegetação varia ao longo do tempo, desde o início da precipitação,</p><p>quando estava “sem água acumulada” (ou seja, podia ocupar toda a sua capacidade de</p><p>armazenamento) até passado algum instante de tempo, quando fica com sua capacidade</p><p>preenchida.</p><p>Conclui-se, então, que a maior parte da interceptação ocorre no início da</p><p>precipitação e vai diminuindo ao longo do tempo, tendendo a zero. Um gráfico típico do</p><p>volume interceptado pela vegetação no decorrer do tempo, em termos percentuais do</p><p>total precipitado, tem a forma apresentada na Figura 6.2.</p><p>Figura 6.2 – Comportamento típico da evolução da interceptação ao longo do tempo</p><p>transcorrido de precipitação, em uma bacia hidrográfica, em termos de percentual do</p><p>total precipitado.</p><p>Fatores intervenientes na interceptação</p><p>Os principais fatores que determinam o processo de interceptação são: as</p><p>características da precipitação, as condições climáticas, as características da vegetação e</p><p>a época do ano, que envolve os anteriores. Tais fatores são brevemente comentados a</p><p>seguir:</p><p>- Características da precipitação: com base na descrição do processo de interceptação,</p><p>feito anteriormente, é fácil perceber que a intensidade, duração e volume da precipitação</p><p>vão influenciar tal processo. Como descrito, a maior parcela da interceptação ocorre no</p><p>início da precipitação e, portanto, uma chuva com maior duração implica em um maior</p><p>71</p><p>período de tempo com menores taxas de interceptação. Da mesma forma, chuvas mais</p><p>intensas tendem a ter uma parcela menor do total precipitado sendo interceptada, já que</p><p>dificultam a retenção da água na folhagem e mais rapidamente “saturam” a capacidade</p><p>de armazenamento da vegetação. O gráfico da Figura 6.3 apresenta duas curvas do</p><p>percentual de interceptação ao longo do tempo, referentes a precipitações de</p><p>intensidades diferentes, que ilustram o comentário anterior.</p><p>Figura 6.3 – Comportamento relativo de duas precipitações de mesma duração e</p><p>intensidades diferentes, em termos do percentual que é interceptado.</p><p>- Condições climáticas: as condições de vento, umidade e temperatura do ar vão influir</p><p>na taxa de evaporação da água interceptada pela vegetação; ao evaporar mais, “libera-</p><p>se” a capacidade de armazenamento da vegetação, que pode então acumular mais água.</p><p>- Características da vegetação: a densidade de folhas (número de folhas por unidade de</p><p>área) vai representar a área de cobertura vegetal e, portanto, a área de interceptação; o</p><p>tamanho e a forma das folhas vai influir na capacidade da vegetação em armazenar</p><p>água; também interfere a disposição dos troncos, facilitando ou não o escoamento por</p><p>eles.</p><p>- Época do ano: como o regime de chuvas, o clima e a própria vegetação (devido aos</p><p>ciclos de crescimento, reprodução e troca de folhagem) variam ao longo do ano,</p><p>conclui-se que a interceptação é um processo que também varia durante o ano.</p><p>72</p><p>Balanço hídrico da interceptação</p><p>A equação da continuidade ou o balanço hídrico da interceptação pode ser</p><p>escrito simplificadamente da seguinte forma (Figura 6.4):</p><p>Pi = P – T – C,</p><p>onde Pi é a precipitação interceptada, P é a precipitação total, T é a precipitação que</p><p>atravessa a cobertura vegetal e C é a precipitação que escorre pelos galhos e troncos.</p><p>Figura 6.4 – Representação das variáveis do balanço hídrico da interceptação.</p><p>Interceptação: medição das variáveis</p><p>A medição das parcelas que compõem o balanço hídrico do processo de</p><p>interceptação merece uma atenção especial, como comentado a seguir:</p><p>- total precipitado (P): como se precisa saber o quanto está precipitando sem a</p><p>“interferência” da vegetação (antes que ocorra a interceptação), os equipamentos</p><p>comuns (pluviômetros ou pluviógrafos) são utilizados com a ressalva da sua</p><p>localização, procurando-se dispor os mesmos acima do topo da vegetação ou em áreas</p><p>próximas sem cobertura vegetal (clareiras);</p><p>- precipitação que atravessa a vegetação (T): esta variável representa a parcela da</p><p>precipitação que passa entre a folhagem e atinge a superfície e, portanto, os</p><p>instrumentos utilizados devem estar dispostos abaixo da vegetação; podem ser usados</p><p>pluviômetros, com um maior número de equipamentos para diminuir o efeito da</p><p>variabilidade espacial da interceptação, ou instrumentos específicos desenvolvidos para</p><p>cada caso; na Figura 6.5 é apresentado um equipamento desenvolvido por Silva et al.</p><p>(2000) para a região do Cariri paraibano.</p><p>- escoamento pelos troncos (C): geralmente, essa parcela representa apenas de 1% a</p><p>15% do total precipitado e é de difícil quantificação, requerendo o desenvolvimento de</p><p>instrumentos específicos para cada situação em particular, conforme o objetivo do</p><p>estudo, o tipo de vegetação e o regime de chuvas da região.</p><p>73</p><p>Figura 6.5 – Equipamento desenvolvido por Silva et al. (2000) para medição da parcela</p><p>da precipitação que atravessa a vegetação, no Cariri paraibano, sendo composta por</p><p>calha que capta a água e conduz a um pluviômetro digital.</p><p>Estimativa da interceptação</p><p>Para a estimativa da interceptação, existem fórmulas conceituais que relacionam</p><p>o volume interceptado durante uma precipitação com a capacidade de interceptação da</p><p>vegetação e a taxa de evaporação, procurando descrever o processo em si, ou seja,</p><p>embutindo um significado físico. Um exemplo é a equação de Horton (modificada por</p><p>Meriam), apresentada a seguir:</p><p>( ) dE</p><p>A</p><p>Av</p><p>eSvPi SvP ⋅⋅+−⋅= − /1 ,</p><p>onde Pi é a precipitação interceptada (mm); Sv é a capacidade de interceptação da</p><p>vegetação (mm) P é a precipitação total (mm); Av é a área coberta pela vegetação; A é a</p><p>área total; E é a taxa de evaporação (mm/h); d é a duração da chuva (h).</p><p>É freqüente ainda a utilização de equações empíricas, desenvolvidas com base</p><p>no ajuste de equações relacionando as variáveis envolvidas a uma série de dados</p><p>monitorados, para a estimativa da interceptação. Um exemplo é a equação da forma:</p><p>nPbaPi ⋅+= ,</p><p>onde Pi é a precipitação interceptada, P é a precipitação total e a, b, n são coeficientes,</p><p>os quais podem ser ajustados para um determinado tipo de vegetação, por exemplo.</p><p>74</p><p>Retenção superficial</p><p>Tão logo tem início a precipitação e o escoamento superficial, parcela do volume</p><p>de água é “impedida” de escoar, ficando armazenada em depressões do solo, formando</p><p>poças, ou mesmo áreas maiores como lagoas e banhados, situados em áreas mais baixas</p><p>do terreno. Esse processo é chamado de retenção superficial. O volume retido e</p><p>armazenado superficialmente só diminui, então, sob ação da evaporação ou por</p><p>infiltração.</p><p>O processo de retenção superficial varia principalmente em função do relevo</p><p>(declividade do terreno e depressões), tipo de solo (mais ou menos permeável) e</p><p>cobertura do solo (áreas urbanas, matas, campos, etc). Assim, é mais predominante a</p><p>retenção superficial em áreas rurais, que apresentam uma superfície mais irregular, com</p><p>depressões no solo. Em bacias urbanas, podem ser projetados reservatórios de detenção,</p><p>para acumular água da precipitação, aliviando os condutos de drenagem pluvial.</p><p>A retenção superficial é de difícil quantificação, podendo, para grandes bacias,</p><p>serem analisadas as curvas de nível do terreno e empregadas técnicas de sensoriamento</p><p>remoto, como a interpretação de imagens de satélite, para identificação e estimativa das</p><p>áreas mais baixas do terreno, onde possivelmente podem ser acumulados volumes de</p><p>água.</p><p>75</p><p>������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��))))����</p><p>��!�</p><p>��������!�</p><p>��������!�</p><p>��������!�</p><p>����������</p><p>Aspectos gerais</p><p>O processo de infiltração pode ser definido como a passagem de água da</p><p>superfície para o interior do solo, o qual depende fundamentalmente da disponibilidade</p><p>de água para infiltrar, da natureza do solo, do estado da sua superfície, e das quantidades</p><p>inicialmente presentes de ar e água no seu interior.</p><p>Simplificadamente,</p><p>pode-se considerar o solo dividido em duas zonas, que são a</p><p>zona de aeração e a zona de saturação. A primeira é caracterizada por apresentar os</p><p>vazios do solo parcialmente ocupados pela água, variando conforme a ocorrência de</p><p>precipitação, características do solo, etc. Por ser a camada em contato com a superfície,</p><p>a água nela presente sofre ação da evaporação e também é absorvida pelas raízes das</p><p>plantas, sendo eliminada depois pela transpiração, em função da fotossíntese. Também</p><p>ocorre a ascensão da água devido ao efeito de capilaridade, mas, conforme os vazios do</p><p>solo vão sendo ocupados pela água, esta tende a romper as forças capilares e se deslocar</p><p>verticalmente para baixo, sob ação da gravidade.</p><p>A zona de saturação, como o próprio nome sugere, é caracterizada pela presença</p><p>de água nos vazios do solo em sua capacidade máxima, isto é, pela saturação do solo.</p><p>Tal camada constitui as águas subterrâneas, sendo válida a distribuição hidrostática de</p><p>pressões (pressão varia linearmente na vertical conforme a altura da camada saturada</p><p>acima) e ocorre o escoamento sob ação da gravidade. Também ocorre ascensão da água</p><p>da zona de saturação para a zona de aeração, por efeito da capilaridade.</p><p>Figura 7.1 – Zonas de aeração e de saturação no solo.</p><p>76</p><p>Grandezas características</p><p>A caracterização da infiltração basicamente envolve a capacidade de infiltração e</p><p>a taxa de infiltração, grandezas que facilmente podem ser confundidas entre si, mas que</p><p>denotam aspectos bem distintos.</p><p>A capacidade de infiltração pode ser entendida como a quantidade máxima que</p><p>um solo, sob determinadas condições, pode absorver (por unidade de tempo e por</p><p>unidade de área horizontal, ou seja, lâmina de água por unidade de tempo). Em outras</p><p>palavras, a capacidade de infiltração representa o potencial do solo em absorver água,</p><p>naquele instante, sob tais condições.</p><p>Já a taxa de infiltração é a taxa efetiva com que está ocorrendo, naquele instante,</p><p>a infiltração no solo. Percebe-se, então, que taxa de infiltração ≤ capacidade de</p><p>infiltração.</p><p>Então em um determinado instante de tempo, para o solo sob as condições desse</p><p>instante, tem-se a quantidade máxima que pode infiltrar (capacidade de infiltração) e a</p><p>quantidade que efetivamente está infiltrando nesse momento (taxa de infiltração). A</p><p>infiltração só ocorrerá em uma taxa igual à capacidade de infiltração quando a</p><p>intensidade da precipitação for superior à capacidade, ou seja, quando a água disponível</p><p>para infiltrar for superiora à capacidade do solo em absorvê-la.</p><p>Perfil de umidade do solo</p><p>Considerando que já passou um certo tempo sem a ocorrência de precipitação,</p><p>ao iniciar uma precipitação as camadas superiores do solo vão se umedecendo de cima</p><p>para baixo. Nesse instante, o perfil típico da umidade do solo é aquele mostrado na</p><p>Figura 7.2-a, no qual a umidade é maior próximo à superfície e diminui à medida que se</p><p>percorre o solo para baixo.</p><p>Continuando o aporte de água, isto é, continuando a precipitação, a tendência é a</p><p>saturação de toda a profundidade do solo. Mas, normalmente, a precipitação é capaz de</p><p>saturar apenas as camadas mais superficiais do solo.</p><p>Quando a precipitação cessa, a umidade no interior do solo se redistribui, e a</p><p>água das camadas superficiais tende a descer para camadas mais profundas, sendo parte</p><p>também evaporada ou absorvida pela vegetação. Resulta com isso que o perfil de</p><p>77</p><p>�</p><p>��</p><p>��</p><p>�</p><p>�</p><p>��</p><p>�</p><p>���� �</p><p>�</p><p>��</p><p>�����</p><p>�</p><p>���</p><p>����</p><p>�</p><p>��</p><p>��</p><p>�</p><p>�</p><p>��</p><p>�</p><p>���� �</p><p>�</p><p>��</p><p>�����</p><p>�</p><p>���</p><p>����</p><p>(a) (b)</p><p>umidade no solo fica invertido, relativamente ao início da precipitação, sendo a maior</p><p>umidade do solo agora nas camadas inferiores do solo (Figura 7.2-b).</p><p>Figura 7.2 – Perfis de umidade do solo: (a) transcorrido algum tempo do início da</p><p>precipitação; (b) e algum tempo depois de cessar a precipitação.</p><p>Evolução da capacidade de infiltração durante a precipitação</p><p>O exame do processo de infiltração desde o início da precipitação até após esse</p><p>aporte de água cessar também pode ser feito enfocando-se a evolução da capacidade de</p><p>infiltração do solo.</p><p>Suponha-se que ocorra uma precipitação de intensidade menor do que a</p><p>capacidade de infiltração do solo, para as condições em que ele se encontrava. Então, se</p><p>o aporte de água é menor do que a capacidade que o solo tem de absorver água, toda a</p><p>precipitação vai infiltrar. Tem-se que, nesse instante de tempo, está ocorrendo uma taxa</p><p>de infiltração inferior à capacidade de infiltração do solo.</p><p>Como descrito anteriormente, à medida que a água vai infiltrando no solo, este</p><p>vai se umedecendo e, conseqüentemente, vai “perdendo” capacidade de infiltração ou</p><p>sua capacidade de absorver água. Caso a precipitação continue, atinge-se um estágio em</p><p>que a capacidade de infiltração diminuiu tanto que se iguala à precipitação. Ou seja,</p><p>perdeu-se a “folga” que tinha anteriormente, quando o solo apresentava uma certa</p><p>capacidade de infiltração e não era preciso utilizá-la por completo para infiltrar toda a</p><p>água. A umidade do solo aumentou de tal maneira que sua capacidade de absorver água</p><p>diminuiu e está igual à precipitação (nesse instante, a taxa de infiltração é igual à</p><p>capacidade infiltração).</p><p>78</p><p>I</p><p>Io</p><p>Is</p><p>I</p><p>Io</p><p>Is</p><p>Supondo-se a continuação da precipitação, tem início a formação do escoamento</p><p>superficial, e a taxa e a capacidade de infiltração diminuem exponencialmente, sendo</p><p>iguais entre si.</p><p>Caso a precipitação cesse, é interrompido o aporte de água na superfície e não</p><p>ocorre mais infiltração. Logo, a taxa de infiltração é nula, enquanto a capacidade de</p><p>infiltração inicia a crescer, à medida que a água tende a descer para as camadas mais</p><p>profundas ou ser evaporada/absorvida pela vegetação na parte mais superficial. Ao</p><p>ocorrer nova precipitação, todo o processo acontece novamente.</p><p>Dessa forma, tem-se que a capacidade de infiltração do solo, durante a</p><p>precipitação, varia ao longo do tempo, sendo a curva típica de infiltração da forma</p><p>daquela apresentada na Figura 7.3. Em tal curva, a capacidade de infiltração é máxima</p><p>no início da precipitação (com valor Io) e vai decaindo com o tempo, tendendo</p><p>assintoticamente a um valor constante, que é a capacidade de infiltração do solo</p><p>saturado (Is).</p><p>Figura 7.3 – Curva de infiltração típica.</p><p>Para estimativa da infiltração foram desenvolvidas várias equações empíricas,</p><p>como a equação de Horton por exemplo, desenvolvida a partir de experimentos de</p><p>campo:</p><p>( ) kt</p><p>sst eIIII −⋅−+= 0 ,</p><p>onde It é a taxa de infiltração no instante de tempo t; Is é a taxa mínima de infiltração</p><p>(solo saturado); I0 é a taxa de infiltração inicial (em t=0); k é uma constante.</p><p>79</p><p>Tal equação representa o decaimento da taxa de infiltração ao longo do tempo,</p><p>sendo válida para uma precipitação sempre superior à capacidade de infiltração (Tucci,</p><p>2000).</p><p>Fatores intervenientes no processo de infiltração</p><p>Os principais fatores que intervêm no processo de infiltração são:</p><p>- tipo de solo: aspectos como porosidade, tamanho e arranjo das partículas do solo vão</p><p>influir na capacidade do solo em absorver água (exemplo: solos arenosos apresentam</p><p>maior tendência à infiltração do que solos argilosos, mais impermeáveis) (Pinto, 1976);</p><p>- umidade do solo: conforme o solo se apresente com maior ou menor teor de umidade,</p><p>menor ou maior será sua capacidade de infiltração, ou seja, sua capacidade de “receber</p><p>mais água”;</p><p>- estado da superfície do solo: o mesmo tipo de solo pode apresentar regiões com</p><p>diferentes capacidades de infiltração, face ao estado da superfície; por exemplo, solos</p><p>compactados, seja devido ao trânsito de veículos, rebanhos, etc, tornam-se menos aptos</p><p>a infiltrar (mais impermeáveis) do que o mesmo solo no seu estado “natural”;</p><p>- cobertura vegetal: a presença de uma densa cobertura vegetal favorece a infiltração,</p><p>visto</p><p>que dificulta o escoamento superficial (obstrução ao escoamento pelas raízes,</p><p>troncos, restos de folhas, etc), aumentando a disponibilidade de água para infiltrar; além</p><p>disso, ao cessar a precipitação, as raízes absorvem parcela da água na camada de</p><p>aeração, agilizando o processo de aumento da capacidade de infiltração;</p><p>- temperatura: o fator temperatura influi por alterar a viscosidade da água, sendo mais</p><p>fácil a infiltração para uma menor viscosidade (capacidade de infiltração nos meses</p><p>frios < capacidade nos meses quentes);</p><p>- precipitação: como a infiltração depende de haver água disponível para infiltrar, a</p><p>intensidade, duração e o volume total da precipitação irão influir substancialmente nesse</p><p>processo.</p><p>Tendo em vista os fatores enumerados anteriormente, percebe-se que a</p><p>capacidade de infiltração em uma bacia hidrográfica varia espacialmente, já que</p><p>apresenta áreas com diferentes tipos de solo, com diferentes estados de compactação e</p><p>de umidade, áreas de cobertura da vegetação variáveis, etc.</p><p>80</p><p>Além disso, a capacidade de infiltração varia temporalmente, tanto ao longo do</p><p>ano, devido à sazonalidade da precipitação, à variação da cobertura vegetal, à</p><p>temperatura, etc, como também durante o próprio evento chuvoso, à medida que a</p><p>umidade do solo vai variando, conforme foi descrito no item anterior.</p><p>Determinação da capacidade de infiltração</p><p>Os instrumentos mais comuns para a determinação da capacidade de infiltração</p><p>são os chamados infiltrômetros, constituídos por 2 cilindros (anéis) metálicos, de</p><p>diâmetro entre 20 e 90 cm.</p><p>Tais anéis são cravados verticalmente no solo, deixando uma certa altura livre</p><p>acima da superfície do solo. Em seguida, é adicionada água continuamente aos dois</p><p>cilindros, mantendo-se uma lâmina de água entre 5 e 10 mm. A capacidade de</p><p>infiltração é determinada dividindo-se o volume de água adicionado ao cilindro inferior</p><p>pelo tempo e pela área da sua seção transversal.</p><p>O anel externo tem a função meramente de tornar a infiltração da água no</p><p>cilindro interno exclusivamente (aproximadamente) na vertical (Figura 7.4). Caso</p><p>contrário, o solo com baixa umidade nas laterais iria absorver parcela da água que</p><p>infiltrou pelo cilindro interno, e o volume de água infiltrado, portanto, não representaria</p><p>a capacidade de infiltração daquela área do solo definida pela sua seção transversal.</p><p>Figura 7.4 – Representação da determinação da capacidade de infiltração com a</p><p>utilização de anéis concêntricos (infiltrômetros).</p><p>81</p><p>Na Figura 7.5, é apresentada uma foto de ensaio de infiltração realizado na</p><p>região do Cariri paraibano por Silva et al. (2000), empregando anéis concêntricos. Face</p><p>ao objetivo daquele estudo, que procurou analisar a interação solo-vegetação-atmosfera,</p><p>quanto aos balanços radiativo, de energia e hídrico, a infiltração foi determinada a partir</p><p>do perfil de umidade do solo, utilizando equipamento especializado (sonda TDR e</p><p>resistores em cápsulas porosas, instaladas em diferentes profundidades do solo) (Figura</p><p>7.6).</p><p>Figura 7.5 – Foto de ensaio de infiltração usando anéis concêntricos, realizado por Silva</p><p>et al. (2000) no Cariri paraibano.</p><p>Figura 7.6 – Foto apresentando instalação de sonda TDR e resistores em cápsula porosa,</p><p>para obtenção do perfil de umidade do solo na região do Cariri paraibano por Silva et al.</p><p>(2000).</p><p>82</p><p>������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��****����</p><p>%+���������#%+���������#%+���������#%+���������#����</p><p>%+�������&�������%+�������&�������%+�������&�������%+�������&�����������</p><p>Evaporação</p><p>Dentro do ciclo hidrológico, a evaporação é o processo físico no qual se</p><p>transfere água do estado líquido para a atmosfera no estado de vapor, ocorrendo</p><p>principalmente devido à radiação solar e aos processos de difusão turbulenta e</p><p>molecular.</p><p>De uma superfície líquida qualquer, exposta à ação da radiação solar (ou a outra</p><p>fonte de energia), devido à evaporação partículas de água escapam para a atmosfera.</p><p>Entretanto, simultaneamente a esse processo ocorre uma “troca” de partículas no sentido</p><p>inverso, na medida que partículas de água na forma gasosa presentes na atmosfera se</p><p>chocam com a superfície líquida e são absorvidas por esta. A evaporação continua então</p><p>até que ocorra um equilíbrio entre o número de partículas que escapam para a atmosfera</p><p>e o número de partículas que são absorvidas pela superfície líquida. Quando esse</p><p>equilíbrio acontece, tem-se que o ar em contato com a água está saturado, isto é, está</p><p>com sua capacidade máxima de vapor de água preenchida, para aquelas condições de</p><p>temperatura e pressão. Conforme a pressão e temperatura, tem-se diferentes graus de</p><p>saturação do ar.</p><p>Portanto, a evaporação compreende uma troca de água entre dois corpos, que são</p><p>a superfície evaporante e a atmosfera. Para que esse processo ocorra, é necessária uma</p><p>fonte de energia (no caso, a radiação solar) e de um gradiente de concentração de vapor.</p><p>Tal gradiente é dado pela diferença entre a pressão de saturação do vapor, na</p><p>temperatura da superfície evaporante, e a pressão de vapor do ar. Em outras palavras,</p><p>esse gradiente pode ser entendido como a diferença entre a pressão de vapor quando o</p><p>ar está saturado (que seria a pressão máxima, pois estaria com a máxima quantidade de</p><p>vapor) e a pressão de vapor do ar nas condições reais, no instante em que está sendo</p><p>analisado o processo.</p><p>83</p><p>Fatores que influenciam o processo de evaporação</p><p>Pode-se dizer que a ocorrência da evaporação em uma bacia hidrográfica é</p><p>função de:</p><p>- radiação solar: constitui a principal fonte de energia para o processo de evaporação,</p><p>que consome cerca de 585 cal/g (à 25o C) (Tucci, 2000). A quantidade de radiação</p><p>emitida pelo Sol que atinge a superfície terrestre não é uniforme, variando com a</p><p>posição geográfica, a presença de gases na atmosfera, a época do ano e as condições</p><p>climáticas locais;</p><p>- pressão de vapor: como já comentado, a existência de um gradiente de concentração</p><p>de vapor é uma das condições necessárias para a ocorrência do processo, sendo a</p><p>evaporação diretamente proporcional a tal gradiente;</p><p>- temperatura do ar: a temperatura tem influência no sentido de que, quanto maior a</p><p>temperatura, maior é a capacidade do ar em ter vapor de água (o ar suporta uma maior</p><p>quantidade de vapor), sendo maior a pressão de saturação do ar, aumento o gradiente de</p><p>concentração de vapor e, assim, aumentando a evaporação;</p><p>- umidade do ar: a umidade do ar representa a quantidade de vapor de água presente no</p><p>ar, interferindo na pressão exercida por essa quantidade de vapor. Quanto maior a</p><p>umidade, tem-se que a quantidade de vapor presente é mais próxima da quantidade</p><p>máxima possível (saturação) e, portanto, mais próxima é a pressão exercida por essa</p><p>quantidade de vapor em relação à pressão de saturação (ou seja, menor é o gradiente), e</p><p>menor é a evaporação;</p><p>- vento: o vento atua no sentido de renovar o ar saturado acima da superfície evaporante</p><p>(ele retira o ar com maior umidade ou saturado e repõe com ar mais seco), permitindo</p><p>sempre a ocorrência de um gradiente de concentração de vapor.</p><p>Balanço de energia</p><p>A radiação solar, que tem comprimento de onda curto, constitui a principal fonte</p><p>de energia para o processo de evaporação na superfície terrestre. Entretanto, apenas</p><p>parcela da radiação emitida pelo Sol atinge a superfície, já que uma parte do total</p><p>emitido é absorvida pela atmosfera (gases e outras partículas presentes) e outra parte é</p><p>dispersa para o espaço, como ilustra a Figura 8.1. Da parcela de radiação que atinge a</p><p>superfície, parte é refletida e parte é absorvida.</p><p>84</p><p>A radiação absorvida pela superfície resulta no aquecimento desta, provocando a</p><p>evaporação e a emissão de radiação térmica em direção à atmosfera. Ao contrário da</p><p>radiação emitida pelo Sol, a radiação térmica emitida pela superfície aquecida tem</p><p>comprimento de onda longo, fazendo com que ela seja muito absorvida pelos gases</p><p>presentes na atmosfera, como H2O, CO2, NO3, etc. O aquecimento da atmosfera resulta</p><p>na emissão de radiação de volta para a superfície, constituindo o que se chama de Efeito</p><p>Estufa.</p><p>Figura 8.1 – Balanço de energia esquemático (Fonte: adaptado de Schneider, 1987, apud</p><p>Tucci, 2000).</p><p>Estimativa da evaporação</p><p>Existem diversos métodos para estimar a evaporação que ocorre em uma</p><p>determinada bacia hidrográfica, sendo os principais:</p><p>- métodos de transferência de massa: baseados na primeira Lei de Dalton, segundo a</p><p>qual a evaporação é relacionada com a pressão de vapor da seguinte forma:</p><p>)( as eebE −⋅= ,</p><p>onde E é a evaporação, b é um coeficiente empírico, es é a pressão de vapor de saturação</p><p>(na temperatura da superfície evaporante) e ea é a pressão de vapor em uma certa altura</p><p>acima da superfície evaporante.</p><p>- balanço de energia: alguns métodos procuram representar o balanço de energia</p><p>descrito no item anterior (Figura 8.1), empregando equações empíricas e/ou conceituais,</p><p>85</p><p>para determinar a evaporação. O mais conhecido é o método de Penman, cuja descrição</p><p>pode ser encontrada em Tucci (2000) e foge aos objetivos desse texto.</p><p>- equações empíricas: com base em medições e observações de campo, foram</p><p>desenvolvidas algumas equações empíricas para estimar a evaporação. Entretanto, elas</p><p>geralmente são restritas para uso nas regiões onde foram desenvolvidas e para algumas</p><p>condições específicas.</p><p>- balanço hídrico: uma forma de estimar a evaporação de um lago ou reservatório é</p><p>através do balanço hídrico, pelo qual são computadas as entradas e saídas de volumes de</p><p>água. Já que a evaporação constitui uma das saídas, caso se tenha conhecimento das</p><p>demais componentes do balanço, pode-se estimá-la. A equação geral é da forma:</p><p>- evaporímetro: também pode-se estimar a evaporação que ocorre em uma bacia</p><p>hidrográfica com o emprego de evaporímetros, que medem diretamente o poder</p><p>evaporativo da atmosfera, estando sujeitos aos efeitos de radiação, temperatura, vento e</p><p>umidade do ar (Tucci, 2000). Os dois tipos mais usuais são os atmômetros e os tanques</p><p>de evaporação. Os primeiros, como o de Piché (mais conhecido), são constituídos</p><p>basicamente por um recipiente com água conectado a uma placa porosa, onde ocorre a</p><p>evaporação, cuja medida é feita no recipiente. Os tanques de evaporação são</p><p>empregados com maior freqüência e constituem tanques de aço ou ferro galvanizado,</p><p>dispostos enterrados, na superfície, fixos ou flutuantes. O chamado tanque Classe A é o</p><p>mais conhecido (Figura 8.2), devendo ser disposto sobre um estrado de madeira. A</p><p>evaporação é estimada pela medição do rebaixamento da lâmina de água no tanque,</p><p>mas, como este proporciona condições mais propícias à evaporação, por ter dimensões</p><p>reduzidas, ser de material condutor, etc, normalmente é aplicado um coeficiente de</p><p>valor entre 0,6 e 0,8 na medição do tanque, para estimar a evaporação na bacia (ou seja,</p><p>a evaporação que ocorre na bacia é considerada como 60 a 80% daquela medida no</p><p>tanque Classe A).</p><p>variação do volume</p><p>armazenado</p><p>volume afluente da</p><p>bacia contribuinte</p><p>volume efluente (captações,</p><p>comportas, etc)</p><p>volume precipitado sobre a</p><p>superfície líquida</p><p>volume evaporado da</p><p>superfície líquida</p><p>= -</p><p>+ -</p><p>+</p><p>86</p><p>Figura 8.2 – Evaporímetro tipo tanque Classe A (Fonte: Villela, 1975).</p><p>Evapotranspiração</p><p>O termo evapotranspiração é empregado para denotar a evaporação que ocorre a</p><p>partir do solo em conjunto com a transpiração dos vegetais, em uma bacia hidrográfica.</p><p>Além dos estudos hidrológicos de modo geral, a evapotranspiração constitui um</p><p>interesse especial para o balanço hídrico agrícola, onde são avaliadas as</p><p>disponibilidades e as demandas hídricas, servindo para verificar a necessidade de</p><p>irrigação (época, quantidade).</p><p>A evapotranspiração é um dos processos envolvidos na interação solo-</p><p>vegetação-atmosfera, através da qual ocorrem trocas de calor, energia e água, e que</p><p>constitui objeto de estudo de muitas pesquisas atualmente.</p><p>Praticamente o total de água eliminada pelas plantas ocorre a partir dos</p><p>estômatos, situados na superfície das folhas, sendo tal perda de água motivada pela</p><p>diferença de pressão de vapor no ar acima da superfície da folha e a pressão de vapor no</p><p>espaço interno da folha. Percebe-se, assim, que o processo de evapotranspiração é</p><p>complexo e dinâmico, já que envolve organismos vivos, o que resulta na escassez de</p><p>informações e na dificuldade de quantificação.</p><p>Evapotranspiração potencial x real</p><p>Costuma-se usar um valor de referência para evapotranspiração, em alguns</p><p>estudos hidrológicos, que é o que se chama de evapotranspiração potencial, cuja</p><p>definição é:</p><p>87</p><p>Evapotranspiração potencial (ETP) é a quantidade de água transferida para a</p><p>atmosfera por evaporação e transpiração, na unidade de tempo, de uma superfície</p><p>extensa completamente coberta de vegetação de porte baixo e bem suprida de água</p><p>(Penman, 1956, apud Tucci, 2000).</p><p>Enquanto que a evapotranspiração real é a quantidade de água transferida para a</p><p>atmosfera por evaporação e transpiração, nas condições reais (existentes) de fatores</p><p>atmosféricos e umidade do solo. Logo, a evapotranspiração real é igual ou menor que a</p><p>evapotranspiração potencial (ETR ≤ ETP).</p><p>Por serem escassas as informações a respeito da evapotranspiração real, são</p><p>usados, geralmente, os valores de evapotranspiração potencial (estimados por equações</p><p>conceituais ou empíricas), sendo depois aplicadas relações entre a ETR e a ETP.</p><p>Estimativa da evapotranspiração</p><p>Existem alguns métodos desenvolvidos para a estimativa da evapotranspiração,</p><p>como aqueles baseados na temperatura (exemplo: método de Thornthaite) ou na</p><p>radiação. Também existem formas de medição direta, como através do emprego do</p><p>lisímetro, ou indireta, através de medições sucessivas da umidade do solo.</p><p>O lisímetro é constituído por um reservatório de solo de volume em torno de</p><p>1 m3, no qual tem-se controle dos volumes de água fornecidos, infiltrados e</p><p>armazenados no solo, de modo que o balanço de volume (ou de peso) permite estimar o</p><p>quanto foi absorvido pela vegetação e transpirado.</p><p>88</p><p>������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��,,,,����</p><p>-</p><p>�.��-</p><p>�+��</p><p>-</p><p>�.��-</p><p>�+��</p><p>-</p><p>�.��-</p><p>�+��</p><p>-</p><p>�.��-</p><p>�+��</p><p>����</p><p>Generalidades</p><p>Até meados do século XX, o estudo sobre rios se limitava, principalmente, aos</p><p>aspectos hidrológicos envolvidos tendo objetivos econômicos como a geração de</p><p>energia hidroelétrica e projetos de canalização e retificação de rios. Assim, procurava-se</p><p>saber o “funcionamento” do rio visando tão somente determinar possíveis locais para</p><p>barramento e construção de hidroelétricas.</p><p>Entretanto, com o tempo passou-se a fazer uma abordagem sistêmica de rio,</p><p>considerando-o como um local onde ocorrem múltiplos eventos físicos, químicos e</p><p>biológicos (Schwarzbold, 2000). Dentro dessa nova visão, o rio é entendido como um</p><p>sistema pulsátil, regulado pelo regime hidrológico de sua bacia hidrográfica, já que se</p><p>encontra sujeito a uma grande variação dos níveis de água e vazões ao longo do tempo,</p><p>com a ocorrência de cheias periódicas (pulsos de inundação). Todo o ecossistema do rio</p><p>é dependente dessa “pulsação”, de forma que a sua interrupção ou alteração (que ocorre</p><p>principalmente devido à ação antrópica) repercute na biota aquática, no transporte de</p><p>sedimentos e nutrientes, etc.</p><p>O rio também é visto como um sistema de fluxo extremamente aberto, contínuo</p><p>e que está em permanente busca de equilíbrio dinâmico. Ele interage com o ambiente ao</p><p>redor de diversas formas, como na troca de sedimentos e nutrientes, regulando a</p><p>formação da paisagem e dando condições de vida para diversas espécies e, de acordo</p><p>com a evolução das condições do meio, procura se re-adaptar.</p><p>Ainda segundo</p><p>Schwarzbold (2000), ao rio é atribuída uma função renal na</p><p>paisagem, na medida que ele “recebe”, “transforma” e “entrega”. O rio recebe tudo que</p><p>é drenado pela sua bacia hidrográfica, seja de forma pontual ou difusa. De forma</p><p>pontual tem-se, por exemplo, o lançamento dos efluentes de uma indústria, cuja</p><p>localização se identifica claramente. De forma difusa estão referidos todos os materiais</p><p>e substâncias carreados pelo escoamento superficial sobre o solo – a passagem da água</p><p>89</p><p>erode o solo e leva consigo nutrientes, poluentes, restos de vegetais, sedimentos, etc,</p><p>disponíveis sobre a superfície do solo, até o rio.</p><p>Boa parte das substâncias que aporta ao rio é transformada por ele: fisicamente,</p><p>ocorre a transformação dos materiais em solução por dissolução ou por abrasão (atrito</p><p>com o leito do rio e com outras partículas em suspensão); quimicamente, ocorre a</p><p>transformação dos nutrientes, a formação de soluções eletrolíticas, a oxidação de</p><p>moléculas, etc; biologicamente, no rio também ocorrem oxi-reduções de compostos pela</p><p>atividade bacteriana.</p><p>A função de entrega está associada ao fato de que, tanto o que o rio transformou</p><p>quanto o que se manteve inalterado é transferido por ele, trecho a trecho, para jusante.</p><p>Geralmente, um rio é caracterizado por apresentar três regiões distintas, que são:</p><p>(i) curso superior ou terras altas: composta por um canal estreito, corredeiras e</p><p>cachoeiras, onde a água tem temperaturas mais baixas e alta oxigenação;</p><p>corresponde à região da cabeceira da bacia, onde nasce o rio e o terreno</p><p>apresenta maiores declividades;</p><p>(ii) curso médio: região de transição entre o curso superior e o curso inferior;</p><p>(iii) curso inferior ou terras baixas: por se situar na parte mais baixa da bacia, e</p><p>com menor declividade, o rio tende a apresentar maior largura nessa região,</p><p>formando grandes planícies de inundação, com uma diversidade de formas</p><p>de canais e meandros.</p><p>Na Figura 9.1 é apresentado o perfil longitudinal típico de um rio, ou seja, o</p><p>traçado da cota do leito do rio desde sua nascente até a sua foz. Obviamente, como o</p><p>escoamento ocorre devido à ação da gravidade, a nascente do rio é em terras mais altas</p><p>(de maiores cotas do terreno), “descendo” até a sua foz. Em geral, no trecho inicial as</p><p>declividades são maiores, enquanto que, na parte inferior já próximo à foz, apresenta-se</p><p>praticamente plano (Figura 9.2).</p><p>Já na Figura 9.3 é apresentada uma seção transversal do rio, formada pela calha</p><p>principal e pela planície de inundação. O nível da água permanece na calha principal na</p><p>grande parte do tempo, ocorrendo o extravasamento para a planície de inundação na</p><p>época de cheia. Quando isso ocorre, o escoamento passa a se dar também pela planície,</p><p>embora nessa região o escoamento se processe com menores velocidades (relativamente</p><p>ao escoamento na calha principal), devido à resistência proporcionada pela vegetação,</p><p>árvores, rochas, etc, que ocupam a planície.</p><p>90</p><p>calha principal do rio</p><p>planície de inundação</p><p>(b)</p><p>(a)</p><p>Figura 9.1 – Exemplo típico do perfil longitudinal de um rio, da nascente à foz (a</p><p>distância se refere ao comprimento do próprio rio, desde a sua nascente).</p><p>Figura 9.2 – Ilustração da topografia do terreno ao longo do rio, caracterizando as partes</p><p>alta (1), média (2) e baixa (3). (Fonte: adaptado de EPA, 1998).</p><p>Figura 9.3 – Seção transversal de um rio, com indicação da calha principal e da planície</p><p>de inundação, onde: (a) nível da água no rio quando o escoamento está apenas na calha</p><p>principal; (b) nível da água no rio na época de cheia, ocupando a planície de inundação.</p><p>(1)</p><p>(2)</p><p>(3)</p><p>91</p><p>É importante ter em mente sempre que a vazão do rio está diretamente</p><p>relacionada à seção transversal do rio especificada – para cada seção, há uma vazão</p><p>correspondente, podendo ser semelhantes ou bastante distintas entre si, conforme a</p><p>distância no rio entre elas e outros fatores. Na Figura 9.4 são indicadas, para uma</p><p>determinada seção transversal do rio, a profundidade, a largura, a área e a velocidade do</p><p>escoamento.</p><p>Figura 9.4 – Indicação das variáveis profundidade, largura, área e velocidade do</p><p>escoamento em uma seção transversal de um rio (Fonte: adaptado de EPA, 1998).</p><p>Equacionamento matemático do escoamento em rios</p><p>O escoamento em rios ou fluxo fluvial é regido por leis físicas, que são a</p><p>equação da conservação da massa (ou equação da continuidade), equação da</p><p>conservação da energia e a conservação da quantidade de movimento. Para representar</p><p>o escoamento, são utilizadas as variáveis vazão, velocidade e profundidade do</p><p>escoamento.</p><p>Considerando o escoamento em superfície livre (como é o fluxo fluvial), pode-se</p><p>dividir em dois tipos de escoamento principais: (a) permanente, quando não há variação</p><p>ao longo do tempo da velocidade do escoamento e do nível da água; (b) não-</p><p>permanente: quando há tal variação.</p><p>Embora constitua uma simplificação na maioria das vezes, a consideração de um</p><p>escoamento permanente geralmente é adotada para estudos envolvendo cálculo de</p><p>remanso, análise de cheias, análise de qualidade de água e dimensionamento de obras</p><p>hidráulicas. Esse tipo de escoamento pode ainda ser dividido em: (i) uniforme, quando a</p><p>velocidade e profundidade do escoamento são constantes no espaço; (ii) não-uniforme:</p><p>quando há variação no espaço das variáveis do escoamento.</p><p>92</p><p>dxqOI</p><p>dt</p><p>dS</p><p>⋅+−=</p><p>O escoamento não-permanente constitui uma situação que ocorre na maioria dos</p><p>problemas hidrológicos envolvendo o escoamento em rios e canais, sendo caracterizado</p><p>pela variação no tempo e no espaço das condições do escoamento.</p><p>Normalmente, são adotadas diversas simplificações para a definição das</p><p>equações que descrevem o escoamento em rios, sendo as principais as listadas a seguir:</p><p>- água como fluido incompressível e homogêneo: despreza-se os efeitos de</p><p>compressibilidade da água e consideram-se propriedades homogêneas em todo o</p><p>rio (massa específica e viscosidade constantes, por exemplo).</p><p>- pressão hidrostática na vertical: considera-se que na vertical a pressão em um</p><p>determinado ponto no interior da coluna de água varia conforme a sua</p><p>profundidade (pressão atmosférica + pressão da coluna de água acima);</p><p>- aproximação da declividade do fundo do rio;</p><p>- escoamento unidimensional: a rigor, a água se movimenta dentro do rio nas três</p><p>dimensões espaciais, mas como o escoamento na direção longitudinal (direção</p><p>do comprimento) do rio é preponderante, normalmente se desprezam as demais;</p><p>- aproximação da seção transversal: a geometria natural da seção transversal do</p><p>rio é aproximada por retas, formando trapézios e retângulos;</p><p>- variação gradual das seções transversais: em um rio, a seção transversal varia ao</p><p>longo do seu comprimento, e se considera, então, uma variação gradual entre</p><p>duas seções transversais diferentes consecutivas, o que não necessariamente</p><p>pode ser verdade a rigor.</p><p>Para um trecho de rio de comprimento dx (Figura 9.5), cuja vazão de entrada</p><p>pela seção de montante é I e vazão de saída pela seção de jusante é O, tendo ainda uma</p><p>contribuição lateral q ao longo de todo o seu comprimento, tem-se que a variação do</p><p>volume de água S armazenado em tal trecho é dado por:</p><p>A contribuição lateral q representa uma vazão por unidade de comprimento,</p><p>resultante do escoamento superficial sobre as vertentes da bacia, que contribui para o rio</p><p>ao longo do seu percurso.</p><p>93</p><p>q</p><p>x</p><p>Q</p><p>t</p><p>A</p><p>=</p><p>∂</p><p>∂</p><p>+</p><p>∂</p><p>∂</p><p>fSAgSAg</p><p>x</p><p>y</p><p>Ag</p><p>x</p><p>AQ</p><p>t</p><p>Q</p><p>⋅⋅−⋅⋅=</p><p>∂</p><p>∂</p><p>⋅+</p><p>∂</p><p>∂</p><p>+</p><p>∂</p><p>∂</p><p>0</p><p>2 )/(</p><p>A expressão anterior representa o balanço de massa no trecho dx, de onde pode-</p><p>se derivar a equação abaixo, que constitui a equação da continuidade na sua forma</p><p>usualmente empregada:</p><p>onde: A é a área da seção transversal ao escoamento; t é o tempo; Q é a vazão; x é a</p><p>distância ao longo do comprimento do rio; q é a vazão de contribuição</p><p>as águas doces contidas em rios e lagos</p><p>constituem as formas mais acessíveis ao uso humano e de ecossistemas, tem-se um</p><p>percentual muito pequeno de água disponível – em torno de 0,27% da água doce o que</p><p>corresponde a 0,007% do volume total de água.</p><p>6</p><p>Assim, embora a Terra apresente 1.386 milhões de km3 de água, considera-se</p><p>que o que está disponível ao uso humano é apenas 0,007% dessa quantidade.</p><p>Reservatório</p><p>Volume</p><p>(x 103 km3)</p><p>% do</p><p>volume</p><p>total</p><p>% do</p><p>volume</p><p>de água</p><p>doce</p><p>Oceanos 1.338.000,0 96,5379 -</p><p>Subsolo: 23.400,0 1,6883 -</p><p>Água doce 10.530,0 0,7597 30,0607</p><p>Água salgada 12.870,0 0,9286 -</p><p>Umidade do solo 16,5 0,0012 0,0471</p><p>Áreas congeladas 24.064,0 1,7362 68,6971</p><p>Antártida 21.600,0 1,5585 61,6629</p><p>Groenlândia 2.340,0 0,1688 6,6802</p><p>Ártico 83,5 0,0060 0,2384</p><p>Montanhas 40,6 0,0029 0,1159</p><p>Solos congelados 300,0 0,0216 0,8564</p><p>Lagos 176,4 0,0127 -</p><p>Água doce 91,0 0,0066 0,2598</p><p>Água salgada 85,4 0,0062 -</p><p>Pântanos 11,5 0,0008 0,0328</p><p>Rios 2,1 0,0002 0,0061</p><p>Biomassa 1,1 0,0001 0,0032</p><p>Vapor d'água na atmosfera 12,9 0,0009 0,0368</p><p>Armazenamento total de água salgada 1.350.955,4 97,4726 -</p><p>Armazenamento total de água doce 35.029,1 2,5274 100,0</p><p>Armazenamento total de água 1.385.984,5 100,0 -</p><p>Figura 1.1 – Distribuição da água na Terra (adaptado de Shiklomanov, 1997, apud Setti</p><p>et al. 2001).</p><p>2,5%</p><p>97,5%</p><p>Água doce</p><p>Água salgada</p><p>30%</p><p>69%</p><p>1%</p><p>outros</p><p>água doce no</p><p>subsolo água</p><p>congelada</p><p>7</p><p>������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>����������</p><p>���</p><p>�������</p><p>��������</p><p>�������</p><p>��������</p><p>�������</p><p>��������</p><p>�������</p><p>���������</p><p>Descrição geral</p><p>Embora tenham sido estimados os volumes em cada um dos “reservatórios” na</p><p>Terra (ver Figura 1.1), é importante lembrar que a água está em constante movimento,</p><p>constituindo o que se denomina de ciclo hidrológico. Esse ciclo tem o Sol como</p><p>principal fonte de energia, através de sua radiação, e o campo gravitacional terrestre</p><p>como a principal força atuante.</p><p>A Figura 2.1 apresenta um esquema do ciclo hidrológico, identificando as</p><p>diversas etapas que o compõem.</p><p>8</p><p>Figura 2.1 – Ciclo hidrológico (fonte: adaptado de EPA, 1998).</p><p>De maneira simplificada, o ciclo hidrológico pode ser descrito da seguinte</p><p>forma:</p><p>- ocorre evaporação da água dos oceanos e formação do vapor de água;</p><p>- sob determinadas condições, o vapor precipita na forma de chuva, neve, granizo,</p><p>etc (precipitação);</p><p>- parte da precipitação não chega nem a atingir a superfície terrestre, sendo</p><p>evaporada;</p><p>- boa parte da precipitação atinge diretamente a superfície de lagos e oceanos, daí</p><p>evaporando parcela;</p><p>- da precipitação que atinge a superfície terrestre, uma parte é interceptada pela</p><p>cobertura vegetal (interceptação), de onde parte evapora e parte acaba</p><p>escorrendo até o solo;</p><p>- da precipitação que chega ao solo, parcela infiltra sub-superficialmente</p><p>(infiltração), e desta uma parte escoa até corpos d’água próximos, como rios e</p><p>lagos (escoamento sub-superficial);</p><p>- uma parte infiltrada percola atingindo os aqüíferos (percolação), que escoam</p><p>lentamente até rios e lagos (escoamento subterrâneo);</p><p>- ainda quanto à parte da precipitação que atinge o solo, esta vai escoar</p><p>superficialmente (escoamento superficial), sendo retida em depressões do solo,</p><p>sofrendo infiltração, evaporação ou sendo absorvida pela vegetação. O</p><p>“restante” do escoamento superficial segue para rios, lagos e oceanos, governada</p><p>pela gravidade;</p><p>- a vegetação, que retém água das depressões do solo e infiltrações, elimina vapor</p><p>d’água para a atmosfera (transpiração), através do processo de fotossíntese;</p><p>- a água que alcança os rios, seja por escoamento superficial, sub-superficial ou</p><p>subterrâneo, ou mesmo precipitação direta, segue para lagos e oceanos,</p><p>governada pela gravidade.</p><p>Cabe ressaltar que o ciclo hidrológico não apresenta um “começo” nem um</p><p>“fim”, já que a água está em movimento contínuo, sendo o início da descrição do ciclo</p><p>realizado a partir da evaporação dos oceanos apenas por questões didáticas.</p><p>9</p><p>Outro fato a ser ressaltado é que a evaporação está presente em quase todas as</p><p>etapas do ciclo.</p><p>Um termo normalmente usado para denotar a evaporação associada à</p><p>transpiração da vegetação é a evapotranspiração.</p><p>Apesar de haver algumas divergências quantos aos valores estimados de autor</p><p>para autor, convém comentar que cerca de 383.000 km3 de água evaporam por ano dos</p><p>oceanos (Wundt, 1953, apud Esteves, 1988). Isso equivaleria à retirada de uma camada</p><p>de 106 cm de espessura dos oceanos por ano. Desse total evaporado, estima-se que 75%</p><p>retornem diretamente aos oceanos sob a forma de precipitação, enquanto os 25%</p><p>restantes precipitam sobre os continentes.</p><p>Uma curiosidade evidenciada por Esteves (1988) é que a composição química da</p><p>precipitação oceânica difere nitidamente da continental, particularmente no que diz</p><p>respeito à concentração de íons como Na+, Mg2+ e Cl-, maior na precipitação oceânica.</p><p>O ciclo hidrológico, como já colocado anteriormente, promove a movimentação</p><p>de enormes quantidades de água ao redor do planeta. Entretanto, algumas das fases do</p><p>ciclo são consideradas rápidas e outras muito lentas, se comparadas entre si. A Tabela</p><p>2.1 ilustra esse comentário, ao apresentar alguns períodos médios de renovação da água</p><p>nos diferentes “reservatórios”. Tais valores dizem respeito ao tempo necessário para que</p><p>toda a água contida em cada um dos reservatórios seja renovada – dentro de uma visão</p><p>bastante simplificada, é claro, da “entrada”, “circulação” e “saída” de água neles.</p><p>Tabela 2.1 – Período de renovação da água em diferentes reservatórios na Terra.</p><p>Fonte: Shiklomanov (1997) apud Setti et al. (2001).</p><p>Reservatórios Período médio de renovação</p><p>Oceanos 2.500 anos</p><p>Águas subterrâneas 1.400 anos</p><p>Umidade do solo 1 ano</p><p>Áreas permanentemente congeladas 9.700 anos</p><p>Geleiras em montanhas 1.600 anos</p><p>Solos congelados 10.000 anos</p><p>Lagos 17 anos</p><p>Pântanos 5 anos</p><p>Rios 16 dias</p><p>Biomassa algumas horas</p><p>Vapor d'água na atmosfera 8 dias</p><p>10</p><p>A princípio, as etapas de precipitação e evaporação são consideradas as mais</p><p>importantes dentro do ciclo hidrológico, pensando em termos de volume de água</p><p>movimentado. Entretanto, à medida que se diminui a escala de análise, as demais fases</p><p>do ciclo se tornam muito importantes. Por exemplo, analisando uma determinada área</p><p>de dezenas de hectares, a interceptação, infiltração, percolação e escoamento superficial</p><p>são bastante relevantes para entendimento dos processos hidrológicos.</p><p>Impactos sobre o ciclo hidrológico</p><p>Observando a descrição do ciclo hidrológico, é fácil perceber o quanto ele é</p><p>condicionado pelas características locais, como clima, relevo, tipo de solo, uso e</p><p>ocupação do solo, geologia, tipo de cobertura vegetal, rede hidrográfica (rios), etc. Por</p><p>exemplo, a interceptação que ocorre em uma área com mata nativa é muito superior à de</p><p>áreas agrícolas, como o cultivo de fumo e arroz. Em áreas com solo tipo argiloso, pouco</p><p>permeável, a infiltração se dá em menor quantidade do que em áreas com solo arenoso,</p><p>mais permeável, enquanto que em áreas pavimentadas essa fase já não ocorre</p><p>praticamente. Como o escoamento se processa movido pela ação da gravidade, em</p><p>terrenos mais íngremes a tendência é ocorrer menor retenção da água em depressões do</p><p>solo, com escoamentos mais rápidos do que em terrenos mais planos, onde há maior</p><p>propensão ao acúmulo de água, facilitando a infiltração.</p><p>O homem vem modificando o meio em que vive, de modo à “adequá-lo” às suas</p><p>necessidades, o que repercute em sensíveis alterações do ciclo hidrológico. Por</p><p>exemplo, pode-se citar o barramento de rios, que modifica o regime de escoamento,</p><p>aumenta a evaporação e eleva o nível das águas subterrâneas (lençol freático), além de</p><p>outras conseqüências sobre a biota aquática. Outro exemplo é a impermeabilização do</p><p>solo devido</p><p>de três</p><p>seções transversais do rio (variando ao longo da profundidade e da largura da seção) –</p><p>em cada seção, as regiões com tonalidade mais escura de azul indicam maior velocidade</p><p>do escoamento da água (Fonte: adptado de EPA, 1998).</p><p>Medição com molinete hidrométrico</p><p>Esse método consiste em determinar a área da seção transversal do rio e medir a</p><p>velocidade do escoamento em diversos pontos da seção com o emprego de molinetes,</p><p>obtendo-se a velocidade média em cada vertical da seção e daí calculando-se a vazão. O</p><p>molinete é um instrumento de formato alongado dotado de hélice, sendo a velocidade</p><p>determinada em função do número de ciclos por segundo que a hélice realiza, quando</p><p>submetida ao fluxo.</p><p>Dependendo das condições locais (profundidade, correntes, largura, etc) a</p><p>medição pode ser efetuada a vau (atravessando-se o rio “caminhando”), em barcos ou a</p><p>partir de passarelas.</p><p>Método acústico</p><p>Esse método consiste na obtenção das profundidades e velocidades a partir da</p><p>análise do eco de pulsos de ultrasom (ondas acústicas de alta freqüência) refletidas pelas</p><p>partículas sólidas em suspensão na massa líquida e pela superfície sólida do fundo</p><p>(Santos et al., 2001) – ADCP (Acoustic Doppler Current Profiler). Assim,</p><p>simultaneamente, durante uma travessia do rio com uma embarcação na qual o</p><p>99</p><p>instrumento é afixado, é feita a batimetria (levantamento da “topografia” do fundo do</p><p>rio), o levantamento da trajetória de travessia e dos perfis e direções de velocidades –</p><p>informações que integradas fornecem a vazão que atravessa a vazão.</p><p>Método químico</p><p>Esse método é geralmente adotado para rios de pouca profundidade e com leito</p><p>rochoso, onde o uso de molinete é dificultado, e consiste em injetar uma substância</p><p>concentrada e medir a concentração em um certo ponto a jusante. A partir das</p><p>concentrações injetada e medida a jusante é determinada a vazão do rio. A escolha da</p><p>substância deve levar em conta os custos de aquisição, não ser corrosivo nem tóxico, ser</p><p>de fácil medição da concentração, ser bem solúvel e não estar presente naturalmente na</p><p>água do rio (Santos et al., 2001). Segundo tais autores, o bicromato de sódio é bastante</p><p>usado, além de isótopos radiativos (Na24, Br82, P32) ou mesmo sal comum (NaCl).</p><p>Medição com flutuadores</p><p>Esse método consiste simplesmente em determinar a velocidade de</p><p>deslocamento de um objeto flutuante, medindo o tempo necessário para que ele percorra</p><p>um trecho de rio de comprimento conhecido. É geralmente empregado quando não se</p><p>dispõe de outros tipos de equipamentos ou quando da ocorrência de vazões muito altas,</p><p>que colocam em risco a medição por parte dos técnicos ou danificam os instrumentos.</p><p>Uso de dispositivos regulares</p><p>Determinados dispositivos, como vertedores triangulares ou calhas Parshall, têm</p><p>a relação entre o nível da água e a vazão que os atravessa bem conhecidas, regidas por</p><p>equações da hidráulica, as quais foram determinadas teoricamente ou com experimentos</p><p>em laboratório. Assim, em alguns casos (geralmente vazões muito pequenas), pode-se</p><p>optar por instalar algum desses dispositivos na seção transversal e, a partir da</p><p>observação do nível da água, calcular a vazão pela equação hidráulica correspondente.</p><p>Medição do nível da água</p><p>Como já comentado, em alguns casos a consideração de uma relação única entre</p><p>o nível da água e a vazão em uma seção transversal do rio é aceitável, constituindo o</p><p>que se chama de curva-chave. Assim, medindo-se o nível da água obtém-se a vazão</p><p>correspondente através de tal curva.</p><p>100</p><p>A medição do nível da água é geralmente realizada com o emprego de réguas</p><p>linimétricas ou linígrafos. As réguas (hastes de madeira ou metal graduadas) são</p><p>instaladas ao longo da seção transversal (fincadas no solo) e a leitura é feita diretamente</p><p>por um observador, que comparece ao local periodicamente – geralmente, uma ou duas</p><p>leituras diárias, às 7h e às 17h. Os linígrafos são instrumentos que registram</p><p>continuamente a variação do nível da água, havendo os linígrafos de bóia e os de</p><p>pressão. Os primeiros (bóia) registram o nível da água a partir da transmissão do</p><p>movimento de flutuador preso a um cabo, enquanto o segundo tipo determina o nível da</p><p>água em função da pressão detectada por um sensor específico.</p><p>101</p><p>������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>���/�/�/�/����</p><p>0���&����#��#�&#���#���&0���&����#��#�&#���#���&0���&����#��#�&#���#���&0���&����#��#�&#���#���&����</p><p>(baseado em Tucci, 2000, e Santos et al., 2001)</p><p>Introdução</p><p>Após ocorrida uma precipitação, descontados os volumes interceptados pela</p><p>vegetação, evapotranspirados, infiltrados e retidos nas depressões do solo, forma-se um</p><p>escoamento superficial pelas superfícies vertentes da bacia hidrográfica. A trajetória e a</p><p>velocidade desse escoamento são ditadas pelos “obstáculos” encontrados, como</p><p>irregularidades na superfície do solo, depressões, inclinação, rochas, árvores, etc. Por</p><p>isso, o fluxo perde uma parcela da energia durante seu percurso pelas vertentes (função</p><p>do atrito), sendo parte dessa energia gasta para desagregar solos e rochas, deslocando</p><p>partículas do seu local de origem até pontos a jusante, seja na própria superfície ou até</p><p>arroios e rios.</p><p>Durante o escoamento nos rios, também ocorre o deslocamento de partículas do</p><p>seu leito (fundo e paredes laterais), as quais são levadas pelo fluxo para jusante, assim</p><p>como aquelas partículas que aportaram vindo do escoamento das vertentes.</p><p>Assim, paralelo ao ciclo hidrológico, tem-se o que se denomina de ciclo</p><p>hidrossedimentológico, referente ao transporte de sedimentos na bacia hidrográfica.</p><p>Por sedimentos são entendidos os materiais erodidos e suscetíveis ao transporte e</p><p>deposição. O ciclo hidrossedimentológico é intimamente vinculado e dependente ao</p><p>ciclo hidrológico, visto que o primeiro necessita de escoamento superficial nas vertentes</p><p>e na rede de drenagem, o qual é “proporcionado” pelo segundo, para haver o</p><p>deslocamento, transporte e deposição de partículas sólidas.</p><p>O ciclo hidrossedimentológico é visto como um ciclo aberto, já que o</p><p>deslocamento e transporte de sedimentos sempre ocorrem para trechos a jusante da</p><p>bacia hidrográfica. Por exemplo, uma partícula sólida antes localizada na superfície</p><p>vertente da bacia, ao ser carreada pelo escoamento superficial até um rio, não mais</p><p>retorna àquele ponto na vertente, podendo ser levada para trechos a jusante do rio ou ser</p><p>depositada em planícies de inundação, também a jusante do local de origem.</p><p>102</p><p>Importância do estudo do transporte de sedimentos</p><p>Pode-se afirmar que o interesse pelo estudo do ciclo hidrossedimentológico é</p><p>relativamente recente, sendo motivado pelo aspecto de integração da gestão dos</p><p>recursos hídricos e da gestão ambiental, preconizado na legislação atual (Lei n. 9.433,</p><p>de 08/01/1997, que institui a Política Nacional dos Recursos Hídricos), bem como pela</p><p>maior conscientização geral a respeito dos riscos de degradação dos solos, leitos dos</p><p>rios e dos ecossistemas fluviais e também dos riscos de contaminação dos sedimentos</p><p>por produtos químicos, com sérios impactos ambientais.</p><p>A seguir são enumerados e comentados alguns dos principais problemas</p><p>associados aos transportes de sedimentos, que muitas vezes acarretam custos</p><p>econômicos e ambientais:</p><p>(a) remoção intensa de solos, fertilizantes e pesticidas: de acordo com o tipo de solo e a</p><p>ocupação que se faz dele (mata nativa, lavoura, área de desmatamento, etc), pode haver</p><p>uma perda intensa de solos, levando junto fertilizantes e pesticidas, trazendo prejuízos</p><p>para a agricultura (custos com mais adubos e agrotóxicos) e ambientais, na medida que</p><p>tais substâncias interferem no ecossistema de diversas maneiras; por isso, o manejo do</p><p>solo e da lavoura como um todo (preparo do solo, época de adubação, forma de</p><p>irrigação, etc)</p><p>devem ser avaliados para minimizar o problema;</p><p>(b) recobrimento de áreas de lavoura por sedimentos estéreis, ocorrendo perdas de</p><p>produção agrícola; isso ocorre devido a sedimentos carreados de áreas da superfície</p><p>vertente a montante das lavouras e também pelo próprio rio, quando este extravasa e</p><p>parte dos sedimentos transportados é depositada na planície de inundação;</p><p>(c) assoreamento de reservatórios: a construção de reservatórios ou açudes obstrui o</p><p>transporte natural de sedimentos pelos rios, e pela menor velocidade do escoamento da</p><p>água nos açudes (em relação ao rio), as partículas que estão sendo transportadas se</p><p>depositam no fundo, causando o assoreamento; dependendo da intensidade com que</p><p>esse processo ocorra, o reservatório pode perder boa parte de sua capacidade de</p><p>armazenagem de água; convém ressaltar que isso tem uma série de impactos no</p><p>ambiente a jusante da barragem, já que tais sedimentos vão “fazer falta em algum lugar”</p><p>– por exemplo, no caso de rios que correm para o mar, o impedimento do aporte de</p><p>sedimentos trazidos pelo rio pode intensificar o processo de erosão das áreas costeiras</p><p>pelo mar, já que este antes retirava os sedimentos trazidos pelo rio;</p><p>103</p><p>(d) necessidade de manutenção de sistemas de irrigação e drenagem: o acúmulo de</p><p>sedimentos depositados nos sistemas de irrigação e drenagem, como valas de derivação</p><p>e condução de águas, prejudica o funcionamento adequado para o qual foram</p><p>projetados, necessitando de manutenção e, com isso, provocando mais custos</p><p>econômicos;</p><p>(e) necessidade de dragagem de vias navegáveis e portos: as vias navegáveis, seja em</p><p>rios ou lagos, necessitam de certa profundidade para que navios de maior porte (que</p><p>possuem maior calado8) possam passar; dependendo da dinâmica de sedimentos na</p><p>bacia, essas vias podem necessitar de dragagens periódicas, a fim de retirar os</p><p>sedimentos depositados e manter uma profundidade desejada; por exemplo, no Lago</p><p>Guaíba (RS) há um Canal de Navegação (na verdade, uma série de canais escavados,</p><p>com profundidades maiores que o restante do lago, em torno de 6 m, ligando o Delta do</p><p>Jacuí até a Lagoa dos Patos), onde há a necessidade de dragagem dos sedimentos</p><p>trazidos principalmente pelos rios formadores do lago – rios Jacuí, Caí, Sinos e Gravataí</p><p>– para manter a profundidade e mantê-la navegável para navios de maior calado;</p><p>(f) degradação da qualidade de água: a maior presença de partículas sólidas na água de</p><p>rios e lagos (em suspensão ou dissolvidos) traz prejuízos ao ambiente, ao aumentar a</p><p>turbidez e diminuir a passagem da luz solar, entre outros, e também prejuízos</p><p>econômicos, por aumentar os custos de remoção dessas partículas na água captada para</p><p>abastecimento público de água ou de indústrias;</p><p>(g) erosão de rodovias, ferrovias e oleodutos: o manejo do solo incorreto e a ausência de</p><p>estruturas de contenção (como valas de drenagem) podem acarretar na erosão de</p><p>rodovias, ferrovias e oleodutos, devido ao escoamento superficial, com grandes</p><p>transtornos e prejuízos financeiros;</p><p>(h) necessidade de remoção de sedimentos em áreas inundadas: com a passagem da</p><p>onda de cheia, os sedimentos depositados precisam ser removidos, acarretando custos</p><p>adicionais.</p><p>Ciclo hidrossedimentológico</p><p>O ciclo hidrossedimentológico descreve os processos que regem o deslocamento</p><p>de partículas sólidas em uma bacia hidrográfica, que são: desagregação, erosão,</p><p>transporte, decantação, depósito e consolidação. Cada um deles é comentado a seguir:</p><p>8 Calado: termo usado para se referir à altura das embarcações que fica abaixo da linha da água, função do</p><p>tipo de embarcação e do peso da carga que está sendo transportada.</p><p>104</p><p>- desagregação: refere-se ao desprendimento de partículas sólidas do meio ao qual</p><p>fazem parte, causada por variações de temperatura, reações químicas, ações mecânicas,</p><p>etc; além de ações antrópicas, o impacto das gotas da chuva é o principal agente</p><p>desagregador, daí resultando a importância em se manter uma cobertura vegetal na</p><p>bacia e o impacto causado pelo desmatamento; como resultado, a desagregação “gera”</p><p>uma massa de partículas sólidas exposta à ação do escoamento superficial;</p><p>- erosão: processo de deslocamento do local de origem das partículas da superfície do</p><p>solo (vertentes) ou dos leitos dos rios, sob efeito do escoamento da água; tal</p><p>deslocamento ocorre quando as forças hidrodinâmicas exercidas pelo escoamento</p><p>ultrapassam a resistência oferecida pelas partículas (peso próprio de cada partícula e</p><p>forças de coesão entre elas) – para as partículas mais finas, é mais importante a força de</p><p>coesão, enquanto para as maiores a resistência devido ao peso próprio predomina;</p><p>- transporte: refere-se ao processo de transporte do material erodido pela água; as</p><p>partículas mais pesadas se deslocam sobre ou junto ao fundo, por rolamento,</p><p>deslizamento e/ou através de pequenos “saltos”; nesse caso, o material transportado é</p><p>exclusivamente material localizado no fundo dos rios, constituindo o que se chama de</p><p>arraste ou descarga sólida de fundo; as partículas mais leves, por sua vez, são</p><p>deslocadas no seio do escoamento (“flutuando”) e, nesse caso, o material é originado</p><p>tanto das superfícies vertentes quanto do próprio fundo dos rios e constitui a chamada</p><p>descarga sólida em suspensão;</p><p>- decantação ou sedimentação: processo pelo qual as partículas mais finas</p><p>transportadas em suspensão tendem a restabelecer contato com o fundo sob efeito da</p><p>gravidade;</p><p>- depósito: refere-se à parada total das partículas em suspensão recém decantadas sobre</p><p>o fundo ou daquelas transportadas por arraste;</p><p>- consolidação: após o depósito, consiste no acúmulo de partículas sobre o fundo do rio</p><p>e na compactação do depósito resultante, sendo motivada pelo próprio peso das</p><p>partículas, pela pressão hidrostática (peso da coluna de água acima), entre outros.</p><p>Convém esclarecer bem a diferença entre os processos de depósito e decantação,</p><p>já que, por exemplo, uma partícula recém decantada pode continuar movimentando-se</p><p>após entrar em contato com o fundo do rio – ou seja, ela decantou mas não se depositou.</p><p>105</p><p>Observa-se, claramente, que o transporte de sedimentos pelo rio constitui um</p><p>fenômeno complexo, sendo dependente tanto do fornecimento de material, cuja origem</p><p>são os processos erosivos nas vertentes e no leito/margens do rio, quanto da energia do</p><p>fluxo. Isso atribui ao transporte de sedimentos uma grande variação no tempo e no</p><p>espaço.</p><p>Embora as atividades antrópicas interfiram substancialmente em alguns casos, o</p><p>ciclo hidrossedimentológico é um processo natural e faz parte da evolução da paisagem.</p><p>Como resultado, tem-se a moldagem das feições das bacias hidrográficas, incluindo os</p><p>perfis longitudinais dos rios, as redes de drenagem, a forma dos leitos dos rios, etc.</p><p>Em uma bacia hidrográfica, podem ser identificadas três “peças” principais do</p><p>sistema natural de produção de sedimentos, que são (Figura 10.1): (i) interflúvios ou</p><p>vertentes; (ii) leitos ou calhas dos rios; (iii) planícies aluviais ou várzeas.</p><p>(i) interflúvios ou vertentes: área de captação da precipitação e produção de</p><p>sedimentos; às vertentes, é atribuído o papel principal de “geração de</p><p>sedimentos” na bacia, tal qual a “geração de escoamento”;</p><p>(ii) calhas dos rios: nelas ocorre a concentração do escoamento e tem como</p><p>papel principal o de transportar o conjunto água+sedimentos produzido nas</p><p>vertentes até a saída da bacia; também “produz” sedimentos, devido à erosão</p><p>das margens e do próprio leito do rio;</p><p>(iii) planícies aluviais ou várzeas: são as áreas que “envolvem” os rios,</p><p>principalmente nas áreas baixas da bacia, funcionando ora como produtoras</p><p>de sedimentos ora como fornecedoras; quando o escoamento do rio está</p><p>limitado à calha principal (época de estiagem ou baixas vazões), as planícies</p><p>contribuem produzindo sedimentos para o</p><p>rio, ao ocorrer escoamento</p><p>superficial devido a uma precipitação; por outro lado, quando o escoamento</p><p>do rio extravasa a calha principal (época de cheia) e passa a ocorrer também</p><p>pela planície, esta passa a receber sedimentos transportados pelo rio, que</p><p>nela se depositam devido a menor velocidade do escoamento nessa região e</p><p>aos obstáculos (árvores, pedras, vegetação, etc).</p><p>106</p><p>Figura 10.1 – Principais “peças” do sistema natural de produção de sedimentos em uma</p><p>bacia hidrográfica.</p><p>Estimativa da produção de sedimentos</p><p>Com o objetivo de estimar a produção de sedimentos em uma bacia hidrográfica,</p><p>foram desenvolvidos alguns métodos, sendo o principal aquele baseado na Equação</p><p>Universal da Perda de Solos (USLE – Universal Soil Loss Equation). Tal método</p><p>consiste na previsão da erosão de origem hídrica e, por ser relativamente simples quanto</p><p>aos parâmetros adotados e por permitir a obtenção de parte das informações necessárias</p><p>através de geoprocessamento (interpretação de imagens de satélite), é bastante utilizado.</p><p>Segundo o referido método, a perda de solo calculada por unidade de área (A –</p><p>t/ha/ano) é estimada da seguinte forma:</p><p>PCLSKRA ⋅⋅⋅⋅= ,</p><p>onde R é um índice de erosividade da chuva; K é um fator de erodibilidade do solo; LS</p><p>é um fator topográfico; C é um fator de uso e manejo do solo; P é um fator de prática</p><p>conservacionista.</p><p>Observa-se, portanto, que o método USLE estima a perda de solo devido à</p><p>erosão hídrica levando em conta a “capacidade” da chuva em causar erosão, as</p><p>características do solo e do uso/manejo feito nele, além da topografia (relevo) da bacia.</p><p>Por geoprocessamento, vários daqueles fatores podem ser obtidos de forma distribuída</p><p>espacialmente na área da bacia, permitindo fazer uma estimativa da perda de solos</p><p>também distribuída. Isso possibilita inferir sobre quais áreas são mais propensas à perda</p><p>de solos, bem como prever qual o impacto de mudanças na ocupação da bacia ou na</p><p>forma de manejo do solo sobre a perda de solos. Tais informações são bastante úteis no</p><p>107</p><p>planejamento e gerenciamento da bacia, tanto em termos de recursos hídricos quanto de</p><p>desenvolvimento urbano e ocupação do solo.</p><p>Transporte fluvial de sedimentos</p><p>Os sedimentos são transportados ao longo dos cursos d’água sobre três formas</p><p>principais: (a) dissolvidos na água, constituindo a carga dissolvida; (b) em suspensão no</p><p>escoamento (carga em suspensão); (c) deslizando ou rolando no fundo do rio (carga do</p><p>leito).</p><p>A ocorrência de cada um dos tipos de transporte vai depender de vários fatores,</p><p>tais como a disponibilidade de sedimentos (quantidade e granulometria) e as</p><p>características do escoamento nas vertentes e no rio. Em particular, a concentração dos</p><p>sedimentos em suspensão varia ao longo de uma dada seção transversal do rio, na</p><p>medida que a velocidade do escoamento também varia, como foi visto no capítulo sobre</p><p>Fluxo Fluvial (ver Figura 9.9). Assim, tal concentração varia da superfície até o fundo</p><p>do rio, e também ao longo da largura da seção transversal, sendo que o maior transporte</p><p>(máxima descarga sólida) ocorre na região de maiores velocidades do escoamento.</p><p>Distribuição dos sedimentos ao longo dos cursos d’água</p><p>Como a morfologia do rio e o fluxo fluvial apresentam características distintas</p><p>ao longo do comprimento do rio, desde a cabeceira até sua foz (ver capítulo sobre Fluxo</p><p>Fluvial), os sedimentos transportados também variam conforme o trecho de rio</p><p>considerado (alto, médio ou baixo curso). Embora possa haver variações conforme as</p><p>particularidades de cada bacia, de modo geral pode-se considerar o seguinte:</p><p>- alto curso: área da bacia com maior degradação, devido às maiores declividades e</p><p>maiores velocidades do escoamento; o rio transporta elevadas quantidades de material</p><p>grosseiro, havendo, portanto, o predomínio de arraste;</p><p>- médio curso: corresponde à área de maior estabilidade, de modo que não há elevados</p><p>acréscimos ou perdas de volume de sedimentos transportados, os quais apresentam</p><p>granulometria média;</p><p>- baixo curso: região onde ocorre o predomínio da deposição de sedimentos, já que</p><p>morfologicamente o rio tende a apresentar menores velocidades do escoamento,</p><p>desenvolvendo-se em áreas mais planas e com seções transversais mais largas; nessa</p><p>região, o rio transporta praticamente só partículas finas (em suspensão ou dissolvidas).</p><p>108</p><p>Entretanto, como a vazão do rio apresenta comportamento temporal bastante</p><p>variável, função do regime de precipitação na bacia contribuinte, entre outros fatores, o</p><p>transporte de sedimentos também varia ao longo do tempo. Assim, as maiores vazões</p><p>transportam os maiores volumes de sedimentos, estando fortemente correlacionados</p><p>entre si. Deve ser ressaltado, contudo, que tal relação não é linear, isto é, o volume de</p><p>sedimentos transportados não é linearmente proporcional à vazão, havendo relações</p><p>empíricas desenvolvidas para determinadas regiões, geralmente da forma exponencial.</p><p>Medição do transporte de sedimentos</p><p>Ao se medir o transporte de sedimentos efetuado por um rio, o objetivo é</p><p>determinar a descarga sólida, ou seja, a quantidade de sedimentos que passa em uma</p><p>seção transversal do rio por unidade de tempo. Logo, assim como a vazão, a medição da</p><p>descarga sólida está associada a uma determinada seção transversal do rio, sendo</p><p>esperados diferentes resultados para distintas seções, função de uma série de fatores,</p><p>como já mencionado anteriormente.</p><p>Embora não haja uma distinção bem clara, o transporte total de sedimentos ou a</p><p>descarga sólida total é composto pela descarga sólida dissolvida, descarga sólida em</p><p>suspensão e pela descarga sólida do leito. O conjunto da primeira e da segunda é</p><p>chamado geralmente de sólidos totais em suspensão.</p><p>Para a medição direta do transporte de sedimentos em um rio, o método mais</p><p>comum é o emprego de técnicas de amostragem e o posterior cálculo do volume</p><p>transportado. O objetivo nesse caso é a obtenção de amostras representativas dos</p><p>sedimentos transportados na seção transversal, caracterizando sua tipologia e</p><p>concentração, sendo usado para isso amostradores padronizados e técnicas apropriadas.</p><p>A medição dos sólidos totais em suspensão (carga dissolvida e em suspensão) é</p><p>feita através da coleta de amostras que são analisadas em laboratório. Há dois tipos</p><p>principais de procedimento de amostragem: (i) amostragem por integração na vertical,</p><p>quando o amostrador é deslocado na vertical com velocidade constante; (ii) amostragem</p><p>pontual, quando o amostrador dispõe de mecanismo de abertura/fechamento, o qual é</p><p>acionado apenas para determinados pontos da seção transversal, onde vão ser coletadas</p><p>as amostras. Em ambos os casos os amostradores constituem recipientes de formato</p><p>semelhante a alguns molinetes hidrométricos (usados para medir a velocidade do</p><p>escoamento), mas com abertura na parte frontal ao escoamento, por onde é feita a coleta</p><p>da água com sedimentos.</p><p>109</p><p>Um método mais moderno de estimar o transporte de sedimentos em suspensão</p><p>e dissolvidos é através do emprego de equipamento ADCP (Acoustic Doppler Current</p><p>Profiler), o qual emite ondas sonoras e, através da recepção das respostas a essas ondas,</p><p>estima os sedimentos na água, além da velocidade do escoamento e da batimetria</p><p>(“relevo do fundo”) do corpo d’água.</p><p>A medição da descarga sólida do leito diretamente é bastante dificultada pela</p><p>própria característica dos sedimentos (tamanho, peso, etc), tornando tal medição de</p><p>complexa operacionalização e pouco uso prático. Há espécies de armadilhas</p><p>desenvolvidas para realizar a coleta, bem como certos tipos de amostradores portáteis de</p><p>fundo. Um meio mais comum é através da medição indireta. Nesse caso, são medidas</p><p>variáveis mais facilmente obtidas, como velocidade do escoamento, quantidade e</p><p>granulometria da descarga sólida em suspensão e granulometria do material</p><p>do fundo,</p><p>sendo estimada então a descarga sólida do fundo em função de tais variáveis, através de</p><p>uma relação semi-empírica.</p><p>110</p><p>������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��������������</p><p>1#&#���!������1#&#���!������1#&#���!������1#&#���!����������</p><p>Introdução</p><p>Alguns autores atribuem a criação do termo desertificação ao período no final</p><p>dos anos 40, com o objetivo de caracterizar as áreas que estavam se tornando</p><p>“parecidas” com desertos ou desertos que estavam se expandindo. Considera-se que o</p><p>primeiro registro, ou o evento que deu início à discussão sobre o processo de</p><p>desertificação, tenha sido ainda nos anos 30, decorrente de um fenômeno ocorrido no</p><p>meio-oeste americano, conhecido como Dust Bowl, onde intensa degradação dos solos</p><p>afetou área de cerca de 380.000 km2 nos estados de Oklahoma, Kansas, Novo México e</p><p>Colorado (MMA, 1999).</p><p>Outro evento histórico marcante e decisivo para o reconhecimento da ocorrência</p><p>de um processo que gera intensos impactos econômicos, ambientais e sociais foi a</p><p>grande seca ocorrida no início dos anos 70, na região localizada abaixo do deserto do</p><p>Saara, conhecido como Sahel, na qual mais de 500.000 pessoas morreram de fome</p><p>(MMA, 1999). Nesse período, de modo geral foram identificados grandes movimentos</p><p>migratórios e intensos processos de devastação ambiental em toda a África.</p><p>Assim, inicialmente se pensava em fatores isolados locais como os geradores</p><p>desse processo de desertificação, ainda não completamente compreendido, ou seja, o</p><p>problema ocorria em regiões específicas e era decorrente de particularidades regionais.</p><p>Com o passar dos anos, os estudiosos verificaram que o referido processo ocorria em</p><p>todos os continentes, principalmente em países que tinham parte do seu território com</p><p>clima do tipo semi-árido e sujeito à seca. Também houve muita discussão e até uma</p><p>certa polêmica quanto às causas da desertificação, sendo atribuída ora a processos</p><p>naturais e ora a processos induzidos pelo homem (havia estudiosos defendendo cada</p><p>uma das hipóteses). Em meio a esse contexto, deu-se início, portanto, ao entendimento</p><p>de que a desertificação constituía um problema de escala mundial, necessitando de</p><p>ações de caráter global.</p><p>111</p><p>Essa crescente importância dispensada ao tema pode ser compreendida</p><p>observando as conferências e debates promovidos ao longo dos anos. Em 1972, em</p><p>Estocolmo (Suécia), durante a Conferência Internacional sobre Meio Ambiente, foram</p><p>discutidas diversas questões ambientais, entre elas a desertificação. Nesse evento, ficou</p><p>acertado que tal assunto merecia uma atenção especial e, em 1977, em Nairóbi</p><p>(Quênia), foi realizada a Conferência das Nações Unidas sobre Desertificação – tratava-</p><p>se, agora, de uma conferência exclusiva sobre a desertificação.</p><p>Já em 1992, durante a ECO-92 (Conferência das Nações Unidas sobre Meio</p><p>Ambiente e Desenvolvimento) no Rio de Janeiro, foi aprovada a Agenda 21 (documento</p><p>constituído por um conjunto de diretrizes e recomendações sobre desenvolvimento</p><p>sustentável e preservação do meio ambiente). O capítulo 12 desse documento trata</p><p>especificamente da desertificação, sendo intitulado “Manejo de ecossistemas frágeis: a</p><p>luta contra a desertificação e a seca”.</p><p>Ainda durante a ECO-92 ficou acertado sobre a necessidade da realização de</p><p>uma convenção sobre a desertificação e, em 26/12/1996 foi aprovada então a</p><p>Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação. A convenção é um</p><p>instrumento jurídico considerado “forte”, pois obriga as partes signatárias (aqueles que</p><p>assinaram a convenção) a assumir uma série de compromissos, estabelecidos na própria</p><p>convenção. Com relação à referida convenção sobre desertificação, os países signatários</p><p>ficaram obrigados a elaborar um Programa de Ação Nacional de Combate à</p><p>Desertificação, o qual é conhecido como PAN.</p><p>Cita-se que, até 1992, cerca de 179 países eram signatários da Convenção das</p><p>Nações Unidas de Combate à Desertificação. O Brasil aderiu em junho de 1997, tendo</p><p>lançado seu PAN em agosto de 2004. A consulta ao PAN brasileiro pode ser feita</p><p>através da página eletrônica da Secretaria de Recursos Hídricos do Ministério do Meio</p><p>Ambiente, cujo endereço eletrônico é http://desertificacao.cnrh-srh.gov.br. A descrição</p><p>e comentários sobre o referido programa brasileiro de combate à desertificação fogem</p><p>ao escopo desse texto.</p><p>Conceito de desertificação</p><p>A definição mais aceita para o termo desertificação é a proposta durante a</p><p>Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação, segundo a qual</p><p>“desertificação é a degradação da terra nas zonas áridas, semi-áridas e sub-úmidas</p><p>112</p><p>secas resultante de fatores diversos tais como as variações climáticas e as</p><p>atividades humanas”.</p><p>A classificação de uma região em árida, semi-árida, etc, é usualmente</p><p>determinada em função do grau de aridez, que é estabelecido por sua vez em função da</p><p>quantidade de água advinda da precipitação e da perda máxima possível de água por</p><p>evaporação e transpiração (evapotranspiração potencial). É adotado o seguinte índice</p><p>indicativo do grau de aridez:</p><p>potencial piraçãoevapotrans</p><p>ãoprecipitaç</p><p>aridez de índice =</p><p>A classificação da região segundo o índice de aridez segue os seguintes valores:</p><p>Hiper-árido < 0,03</p><p>Árido 0,03 – 0,20</p><p>Semi-árido 0,21 – 0,50</p><p>Sub-úmido seco 0,51 – 0,65</p><p>Sub-úmido úmido > 0,65</p><p>No que diz respeito às variações climáticas, a seca é um fenômeno típico das</p><p>regiões semi-áridas. Então, de certa forma a fauna e a flora de tais regiões está adaptada</p><p>às variações climáticas que ocorrem, embora, claro, possam ocorrer variações não muito</p><p>freqüentes de maior intensidade, tendo maior impacto sobre todo o ecossistema.</p><p>Já no que diz respeito às ações de degradação da terra induzidas pelo homem,</p><p>deve-se entendê-las como tendo, pelo menos, cinco componentes principais:</p><p>- degradação das populações animais e vegetais: refere-se principalmente à</p><p>degradação biótica e à perda de biodiversidade9;</p><p>- degradação do solo: efeito físico (erosão hídrica e eólica; compactação pelo uso</p><p>de mecanização pesada) e/ou químico (salinização – acúmulo de sais – ou</p><p>sodificação – acúmulo de sódio);</p><p>- degradação das condições hidrológicas de superfície: principalmente através da</p><p>perda da cobertura vegetal, que desempenhava a importante função de reter o</p><p>escoamento superficial, aumentando a infiltração no solo, além de proteger as</p><p>9 Sobre o tema biodiversidade há a publicação muito interessante intitulada “Seria melhor mandar</p><p>ladrilhar? Biodiversidade – como, para que, por quê”, Nurit Bensusan (org.), UnB, 2002.</p><p>113</p><p>camadas do solo do impacto das gotas e do transporte de sedimentos, os quais</p><p>atingem os corpos d’água;</p><p>- degradação das condições hidrogeológicas (águas subterrâneas): principalmente</p><p>devido a modificações nas condições de recarga;</p><p>- degradação da infra-estrutura econômica e da qualidade de vida nos</p><p>assentamentos humanos.</p><p>Dessa forma, é possível entender desertificação como um processo no qual</p><p>ocorre a degradação das terras, consistindo na perda de produtividade biológica e</p><p>econômica das terras agrícolas, das pastagens e das áreas de mata nativa, devido às</p><p>variabilidades climáticas e às atividades humanas.</p><p>Principais causas e conseqüências da desertificação</p><p>Além das variações climáticas, já comentado a respeito, as principais causas da</p><p>desertificação devido às atividades humanas são:</p><p>- desmatamento (a retirada da cobertura vegetal causa uma série de impactos,</p><p>como a menor capacidade do ambiente em suportar a vida animal, diminuição da</p><p>biodiversidade, exposição do solo à erosão hídrica e eólica, lixiviação do solo,</p><p>etc);</p><p>- salinização dos solos por irrigação, devido ao manejo inadequado: diminui a</p><p>capacidade do solo em suportar o crescimento da flora,</p><p>tornando-o menos fértil,</p><p>o que por sua vez acarreta outros impactos;</p><p>- sobre-pastoreio (pastoreio em excesso): pode causar a compactação excessiva do</p><p>solo, diminuindo a infiltração da água, e também contribuir para o esgotamento</p><p>dos recursos naturais, no caso das pastagens;</p><p>- esgotamento dos solos e dos recursos hídricos por procedimentos intensivos e</p><p>não adaptados às condições ambientais;</p><p>- manejo inadequado da agropecuária;</p><p>- aumento da demanda por alimentos, água e energia, em virtude do crescimento</p><p>populacional;</p><p>- inadequação dos sistemas produtivos (exploração além da capacidade de suporte</p><p>do ambiente).</p><p>114</p><p>Pelo exposto anteriormente, já se pode visualizar uma série de conseqüências</p><p>decorrentes do processo de desertificação. As principais delas podem ser agrupadas e</p><p>enumeradas do seguinte modo:</p><p>- degradação da terra causa sérios problemas econômicos:</p><p>• setor agrícola é o principal afetado, devido à diminuição da produção,</p><p>perda da capacidade produtiva de áreas agrícolas, aumento dos custos</p><p>com adubação, etc;</p><p>• com a maior susceptibilidade do solo à erosão, ocorre também o</p><p>assoreamento de rios e reservatórios, desencadeando uma gama de</p><p>conseqüências, como custos de tratamento da água para consumo,</p><p>remoção de sedimentos, etc.</p><p>- extinção de espécies nativas:</p><p>• extinção de espécies com valor econômico (usadas na indústria para</p><p>extração de subprodutos, etc);</p><p>• extinção de espécies com potencial uso na agropecuária, melhoramento</p><p>genético, indústrias farmacêutica, química, etc;</p><p>• perda da biodiversidade.</p><p>- problemas sociais agravados:</p><p>• redução da qualidade de vida;</p><p>• diminuição da renda;</p><p>• aumento da desnutrição;</p><p>• migração para centros urbanos (e daí decorrem outros problemas, como</p><p>de infra-estrutura, desemprego, violência urbana, etc);</p><p>• com isso, verifica-se que a desertificação agrava o desequilíbrio regional,</p><p>na medida que as regiões mais pobres são mais prejudicadas e se tornam</p><p>ainda mais “distantes” das áreas mais desenvolvidas;</p><p>Panorama do processo de desertificação atual</p><p>Apenas para dar uma idéia da dimensão do problema da desertificação, são</p><p>apresentados alguns números a respeito desse processo. Por exemplo, dados mundiais</p><p>indicam que cerca de 60.000 km2 de terras férteis são colocadas fora de produção</p><p>115</p><p>devido à desertificação, por ano. Alguns estudos também apontam que quase 1/3 de</p><p>toda a superfície do planeta pode ser afetada direta ou indiretamente as conseqüências</p><p>da desertificação, abrangendo em torno de 100 países.</p><p>Estima-se que, em todo o mundo, nas áreas susceptíveis à desertificação e à</p><p>seca, vivem hoje cerca de 900 milhões de pessoas e, dessas, cerca de 200 milhões já</p><p>estão afetadas por este processo, conforme dados do relatório “Status of Desertification</p><p>and Implementation of the U. N. Plan of Action to Combat Desertification”, elaborado</p><p>pelo PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente).</p><p>Outros estudos indicam que, na América do Sul, cerca de 170 milhões de</p><p>hectares foram degradados, devido ao desmatamento e superpastagem, enquanto no</p><p>Caribe a urbanização acelerada e mal planejada resultou na perda de terras para uso</p><p>agrícola, proteção de bacias e conservação da biodiversidade.</p><p>A seguir é apresentada uma série de fotografias de regiões atingidas pelo</p><p>processo de desertificação (Figuras 11.1 e 11.2), as quais ilustram a grave situação de</p><p>degradação decorrente desse processo.</p><p>Figura 11.1 – Fotografias de diversas regiões em todo o planeta atingidas por intenso</p><p>processo de desertificação. (Fonte: IICA, 2004).</p><p>116</p><p>Figura 11.2 – Fotografias de diversas regiões em todo o planeta atingidas por intenso</p><p>processo de desertificação. (Fonte: IICA, 2004).</p><p>No Brasil, o Ministério do Meio Ambiente elaborou um mapa de</p><p>susceptibilidade à desertificação (Figura 11.3). Como é observado em tal figura, esse</p><p>processo atinge predominantemente a região Nordeste do país, além da parte norte de</p><p>Minas Gerais. Segundo esse levantamento, as áreas consideradas com muito alta</p><p>susceptibilidade à desertificação foram estimadas em cerca de 238.600 km2, enquanto</p><p>na categoria de alta e moderada susceptibilidade as áreas foram de 384.000 km2 e</p><p>358.000 km2, respectivamente.</p><p>Figura 11.3 – Mapa de susceptibilidade à desertificação no Brasil.</p><p>117</p><p>No Nordeste do Brasil, o processo de desertificação ocorre sob duas formas</p><p>principais:</p><p>(i) difusa no território: abrangendo diferentes níveis de degradação do solo,</p><p>vegetação e recursos hídricos;</p><p>(ii) concentrada em pequenas porções do território, com intensa degradação dos</p><p>recursos da terra; existem quatro núcleos de desertificação: Gilbués (PI),</p><p>Irauçuba (CE), Seridó (RN) e Cabrobó (PE). Na Figura 11.4 é ilustrado um</p><p>exemplo da gravidade do problema, no município de Gilbués.</p><p>Figura 11.4 – Foto da Ponte do Boqueirão (Gilbués, PI), com 12 m de vão,</p><p>mostrando a situação do rio completamente assoreado. (Fonte: PAN-Brasil, 2004).</p><p>Segundo estimativas de 1992, cerca de 98.600 km2 foram considerados com</p><p>situação muito grave em relação à desertificação e 81.900 km2 com situação tida como</p><p>grave (Figura 11.5), o que ressalta a necessidade de implementação de ações para</p><p>amenizar o problema. Em tal figura também consta a localização dos quatro núcleos de</p><p>desertificação já citados.</p><p>Considerando o mapa de grau de afetamento da desertificação para todo o Brasil</p><p>(Figura 11.6), observa-se que, além das áreas afetadas na região Nordeste e na parte</p><p>norte de Minas Gerais, há uma área no Rio Grande do Sul classificada como “áreas de</p><p>atenção especial”, situada na porção sudoeste do estado.</p><p>O sudoeste do Rio Grande do Sul vem sofrendo ao longo dos anos um intenso</p><p>processo de degradação ambiental, representado pela transformação de grandes</p><p>118</p><p>extensões de terra em areia. Tal processo é motivado principalmente por fatores</p><p>naturais, mas intensificado pela adoção de práticas de manejo do solo inadequadas.</p><p>Figura 11.5 – Mapa do grau de afetamento das áreas devido ao processo de</p><p>desertificação no Nordeste do Brasil.</p><p>Figura 11.6 – Mapa do grau de afetamento da desertificação no Brasil.</p><p>119</p><p>Há uma discussão sobre o processo de degradação ambiental que ocorre no</p><p>sudoeste gaúcho, onde diversos autores consideram a existência de um processo</p><p>chamado de arenização. Esse termo é descrito por Suertegaray et al. (2001) como o</p><p>processo de retrabalhamento de depósitos arenosos pouco ou não consolidados que</p><p>acarreta nestas áreas uma dificuldade de fixação da cobertura vegetal, devido à intensa</p><p>mobilidade dos sedimentos pela ação das águas e dos ventos. Conseqüentemente,</p><p>arenização indica uma área de degradação relacionada ao clima úmido, onde a</p><p>diminuição do potencial biológico não resulta em definitivo em condições de tipo</p><p>deserto – ao contrário, a dinâmica dos processos envolvidos nesta degradação dos solos</p><p>é fundamentalmente derivada da abundância da água.</p><p>Ainda segundo Suertegaray et al. (2001), a região de ocorrência dos areais está</p><p>localizada no sudoeste do Rio Grande do Sul, a partir do meridiano de 54º em direção</p><p>oeste até a fronteira com a Argentina e o Uruguai. A degradação do solo nesta área</p><p>apresenta-se sob a forma de areais, que ocupam uma larga faixa onde localizam-se os</p><p>municípios de Alegrete, Cacequi, Itaquí, Maçambará, Manuel Viana, Quaraí, Rosário do</p><p>Sul, São Borja, São Francisco de Assis e Unistalda.</p><p>A seguir é transcrito texto descritivo sobre o processo de arenização no Rio</p><p>Grande do Sul, extraído da referência citada anteriormente.</p><p>A formação dos areais, interpretada a partir de estudos geomorfológicos,</p><p>associada à dinâmica hídrica e eólica indica que os areais resultam inicialmente de</p><p>processos hídricos. Estes, relacionados com uma topografia favorável permitem, numa</p><p>primeira fase, a formação de ravinas e voçorocas.</p><p>Estas, na continuidade do processo,</p><p>desenvolvem-se por erosão lateral e regressiva, conseqüentemente, alargando suas</p><p>bordas por outro lado, à jusante destas ravinas e voçorocas em decorrência do</p><p>processo de transporte de sedimentos pela água durante episódios de chuvas</p><p>torrenciais, formam-se depósitos arenosos em forma de leques. Com o tempo esses</p><p>leques vão se agrupando e em conjunto dão origem a um areal. O vento que atua sobre</p><p>essas areias, em todas as direções, permite a ampliação deste processo, o qual pode ser</p><p>observado na Figura 11.7, onde se percebe a existência de uma vertente de elevada</p><p>declividade à montante do areal. Este contato abrupto derivado de litologias diferentes</p><p>favorece o escoamento das águas e o surgimento de ravinas. Estas ravinas, por</p><p>entalhamento de seu canal, atingem o lençol freático e desencadeiam processos de</p><p>voçorocamento. A ampliação dessas voçorocas, cuja evolução é remontante, possibilita</p><p>120</p><p>a jusante o alargamento do canal de escoamento, deposições em forma de leques e a</p><p>formação de areais.</p><p>Os areais ocorrem sobre unidades litológicas frágeis (depósitos arenosos) em</p><p>áreas com baixas altitudes e declividades. São comuns nas médias colinas ou nas</p><p>rampas em contato com escarpas de morros testemunhos (Figuras 11.7 e 11.8). Sobre</p><p>outro aspecto a formação de ravinas e voçorocas, processos que estão na origem dos</p><p>areais, podem também ser resultado do pisoteio do gado e do uso de maquinaria</p><p>pesada na atividade agrícola, originando sulcos e desencadeando condições de</p><p>escoamento concentrado.</p><p>Figura 11.7 – Representação da formação de areais em rampas (Fonte: Suertegaray et</p><p>al., 2001).</p><p>121</p><p>Figura 11.8 – Representação da formação de areais em colinas (Fonte: Suertegaray et</p><p>al., 2001).</p><p>122</p><p>������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��������������</p><p>������</p><p>#��#�#���#��#&������</p><p>#��#�#���#��#&������</p><p>#��#�#���#��#&������</p><p>#��#�#���#��#&����</p><p>(baseado em Tucci, 2000)</p><p>Origem das enchentes</p><p>A ocorrência de enchentes está vinculada principalmente à ocorrência de uma</p><p>precipitação intensa – grande volume de água precipitado em um curto período de</p><p>tempo –, que acarreta um grande aporte de água ao rio rapidamente. Esse aporte de água</p><p>concentrado corresponde a um volume de água maior do que aquele que o rio tem</p><p>capacidade de transportar, normalmente, na sua calha principal. Dessa forma, ocorre o</p><p>extravasamento do rio, ou seja, o rio “sai” da sua calha principal e “invade” a planície</p><p>de inundação e áreas ribeirinhas, caracterizando a ocorrência de inundações.</p><p>É importante frisar que um mesmo volume precipitado caindo na mesma região</p><p>pode não acarretar em inundações, dependendo do tempo que essa precipitação levou</p><p>para acontecer. Caso a intensidade da precipitação seja relativamente pequena, isto é, o</p><p>volume precipitado tenha ocorrido ao longo de uma grande duração, o rio pode ser</p><p>capaz de escoar toda a água resultante da transformação chuva-vazão. É fácil perceber</p><p>que quanto maior a intensidade da chuva maior é a tendência de causar inundações,</p><p>mantidas as demais características constantes – basta lembrar dos processos envolvidos</p><p>na transformação chuva-vazão (saturação do solo, infiltração, interceptação, etc).</p><p>Problemática das enchentes</p><p>A problemática da ocorrência de enchentes está associada principalmente à</p><p>ocupação das áreas de várzeas (ou planícies de inundação) pela população e à</p><p>freqüência da ocorrência das enchentes. Essa última se refere ao fato de que a</p><p>ocorrência de enchentes está vinculada à aleatoriedade do regime de precipitação na</p><p>bacia contribuinte, fazendo com que o rio extravase e inunde suas planícies de</p><p>inundação com uma certa freqüência, determinada nos estudos hidrológicos</p><p>empregando técnicas estatísticas.</p><p>Os prejuízos proporcionados pelas inundações são decorrentes principalmente da</p><p>ocupação das planícies de inundação pela população, seja para habitação, recreação, uso</p><p>123</p><p>agrícola, comercial, industrial, etc. Tal ocupação é associada, muitas vezes, ao próprio</p><p>desenvolvimento histórico da região, na medida que a proximidade com os corpos</p><p>d’água (rios, arroios, lagos, etc) facilita o consumo de água, proporciona opção de lazer,</p><p>banho, pesca, etc, além do uso dos rios como via de transporte.</p><p>Entretanto, a despeito das razões históricas de ocupação das áreas próximas a</p><p>rios e lagos, o que tem ocorrido é o crescimento desordenado e acelerado das cidades,</p><p>principalmente dos grandes centros urbanos. Isso causa uma pressão para ocupação das</p><p>áreas ribeirinhas, na busca de áreas para expansão da cidade, seja irregularmente ou não.</p><p>Paralelo a isto, a urbanização da bacia contribuinte ao rio proporciona um aumento no</p><p>escoamento superficial, fazendo com que, para um mesmo volume precipitado durante o</p><p>mesmo tempo, passe a ocorrer um aporte maior de água ao rio e que chega mais rápido</p><p>– devido à redução da infiltração, armazenamento nas depressões, interceptação, etc</p><p>(ver capítulo sobre Escoamento Superficial). Esse aporte maior e mais concentrado no</p><p>tempo faz com que as inundações sejam mais intensas (impactando áreas maiores) e</p><p>mais freqüentes. Observa-se, portanto, que a ocorrência de enchentes tem trazido</p><p>prejuízos maiores, tanto em termos de perdas de vidas quanto em termos econômicos,</p><p>intensificados justamente pela ocupação das áreas ribeirinhas e pela urbanização da</p><p>bacia contribuinte (Figura 12.1).</p><p>Figura 12.1 – Esquema ilustrativo do agravamento dos prejuízos causados pelas</p><p>enchentes.</p><p>Apesar de haver ocupação regulamentada de áreas sujeitas a inundações, o</p><p>principal tipo de ocupação é feito irregularmente e pela população mais carente, por não</p><p>ter condições de ocupar áreas “seguras” na cidade, geralmente de elevados custos, e</p><p>nem de residir em áreas mais distantes (devido aos custos de deslocamento). Essa</p><p>ã çã á ã çã á çã</p><p>ê í</p><p>ô</p><p>ê í</p><p>ô</p><p>124</p><p>população prefere então ocupar as áreas ribeirinhas, mesmo às vezes sabendo do risco</p><p>de inundações. Enquanto isso, a população com melhores condições financeiras ocupa</p><p>áreas da bacia geralmente com pequeno risco de inundação. Assim, a ocorrência das</p><p>enchentes traz prejuízos principalmente à população mais carente, agravando ainda mais</p><p>os problemas sociais.</p><p>É importante não deixar de ressaltar que a ocupação das áreas ribeirinhas</p><p>também está associada à freqüência de ocorrência das cheias. Cada região tem um</p><p>regime pluviométrico específico que condiciona a ocorrência periódica de precipitações</p><p>mais intensas e, conseqüentemente, de inundações. A despeito da aleatoriedade do</p><p>regime de chuvas e de vazões no rio, estatisticamente há uma tendência de que as</p><p>enchentes ocorram com uma certa freqüência, caracterizando o tempo de retorno, ou</p><p>seja, o tempo estimado para que um determinado evento seja igualado ou superado pelo</p><p>menos uma vez. No caso de enchentes associadas a tempos de retorno relativamente</p><p>altos, como 10 ou 20 anos, por exemplo, o que ocorre muitas vezes é que a população</p><p>“ganha confiança” de que a área é segura e ignora avisos e esforços das autoridades</p><p>competentes para removê-los. As pessoas têm a percepção errada das enchentes,</p><p>supondo que, por habitarem o local há vários anos e nunca terem presenciado alguma</p><p>enchente, duvidam que ocorram inundações ali.</p><p>Condições hidrológicas que influenciam a ocorrência de enchentes</p><p>Os fatores que regem ou influenciam a ocorrência de enchentes, em uma</p><p>determinada bacia hidrográfica, podem ser agrupados em (a) naturais e (b) artificiais, os</p><p>quais são descritos e comentados a seguir.</p><p>(a) Fatores naturais</p><p>Tais fatores são propiciados pela bacia no seu estado natural (relevo, forma da</p><p>bacia, tipo de precipitação, cobertura vegetal, capacidade de drenagem, tipo de solo,</p><p>etc). Além das características</p><p>físicas da bacia, como as já enumeradas, há características</p><p>climatológicas que influenciam o processo, com destaque para a distribuição temporal e</p><p>espacial da precipitação (ou seja, onde ocorre a precipitação e como ela se desenvolve</p><p>ao longo da sua duração). Geralmente, as precipitações mais intensas atingem</p><p>justamente pequenas áreas localizadas.</p><p>As áreas mais planas nas margens dos rios estão mais sujeitas à ocorrência de</p><p>inundações, também sendo geralmente as preferidas para ocupação pela população.</p><p>125</p><p>Conforme as características da rede de drenagem (dimensões das seções transversais</p><p>dos arroios e rios, grau de ramificação, sinuosidade dos rios, etc), pode ocorrer a subida</p><p>do nível da água de vários metros em um curto intervalo de tempo, até mesmo em</p><p>poucas horas.</p><p>A presença da cobertura vegetal natural aumenta a infiltração de parte da</p><p>precipitação e protege o solo contra erosão, já que o impacto das gotas de chuva é o</p><p>principal fator natural de desagregação das partículas do solo, tornando-as expostas ao</p><p>escoamento superficial (ver capítulo sobre Transporte de Sedimentos). O aporte de</p><p>sedimentos em excesso aos cursos d’água provoca o assoreamento dos mesmos,</p><p>diminuindo sua capacidade de escoamento, na medida que os sedimentos depositados</p><p>no fundo diminuem a seção transversal disponível para o escoamento.</p><p>O efeito das características físicas da bacia sobre a maior ou menor tendência à</p><p>ocorrência de cheias foi apresentado em capítulos anteriores deste texto (“Bacia</p><p>Hidrográfica” e “Escoamento Superficial”), não sendo novamente discutido aqui.</p><p>(b) Fatores artificiais</p><p>O principal agravante de origem “artificial” para o problema das cheias é a</p><p>urbanização da bacia contribuinte, que acarreta na impermeabilização da superfície,</p><p>diminuindo a infiltração e aumentando o escoamento superficial. Isso torna as</p><p>inundações mais freqüentes e mais intensas – cheias ocorrem mais rapidamente e com</p><p>picos de vazão maiores, atingindo níveis de água maiores.</p><p>Previsão de cheias</p><p>Como já foi colocada antes, a ocorrência de enchentes pode trazer prejuízos</p><p>econômicos e perdas de vidas, dependendo de sua intensidade e do local. Por isso muita</p><p>atenção tem sido dispensada ao que se chama de previsão de cheias, que é caracterizada</p><p>sob duas formas principais, quanto ao tempo de antecedência da previsão: (i) previsão</p><p>de curto prazo; (ii) previsão de longo prazo.</p><p>(i) Previsão de curto prazo</p><p>A previsão de curto prazo, também conhecida como previsão em tempo atual ou</p><p>em tempo real, é utilizada para alertar a população ribeirinha e os operadores de obras</p><p>hidráulicas durante a ocorrência de um evento, com uma antecedência de horas ou dias,</p><p>função do tempo de deslocamento da água na bacia até a seção do rio em questão.</p><p>126</p><p>Para a previsão em tempo real é necessário um sistema de coleta e transmissão</p><p>de dados, geralmente precipitação e nível de água no rio, estando associado geralmente</p><p>a um Plano de Defesa Civil, constituído por um conjunto de ações visando combater a</p><p>situação. Esse tipo de previsão pode ser realizado com base em:</p><p>- previsão da precipitação: é feita a previsão da precipitação com radar e sensoriamento</p><p>remoto, estimando em seguida a subida do nível da água no rio através da representação</p><p>do processo de transformação chuva-vazão na bacia contribuinte;</p><p>- conhecida a precipitação ocorrida: é feita a medição da precipitação ocorrida, cujo</p><p>registro é transmitido (geralmente via rede telemétrica, rádio ou telefonia celular) para</p><p>uma central, onde é feita a estimativa da cheia no rio, através da transformação chuva-</p><p>vazão – este caso difere do anterior apenas pelo fato da precipitação ser medida e não</p><p>estimada;</p><p>- conhecida a vazão no rio em uma seção a montante: é realizada a medição do nível do</p><p>rio em uma seção a montante (a partir da qual se estima a vazão correspondente, com o</p><p>uso da curva-chave – ver capítulo sobre Fluxo Fluvial) e estimada a vazão e nível da</p><p>água no rio em uma seção de interesse a jusante. Também aqui é necessário algum</p><p>sistema de transmissão das informações recém registradas, como rede telemétrica, rádio</p><p>ou telefone. Essa forma proporciona um menor tempo de previsão, o qual é função do</p><p>tempo de deslocamento da cheia da seção de montante onde se mediu a vazão até a</p><p>seção de interesse – dependendo do trecho e do rio, pode ser de apenas algumas horas.</p><p>- conhecida a precipitação ocorrida e a vazão no rio em uma seção a montante: este caso</p><p>compreende uma combinação dos dois anteriores, sendo feita a estimativa da</p><p>transformação chuva-vazão com base no valor medido de precipitação e, em seguida,</p><p>estimado o deslocamento da onda de cheia até a seção de interesse, usando a vazão na</p><p>seção a montante.</p><p>(ii) Previsão de longo prazo</p><p>A previsão de longo prazo é caracterizada pela quantificação das chances de</p><p>ocorrência de uma determinada inundação, estatisticamente, sem precisar quando</p><p>ocorrerá.</p><p>127</p><p>Medidas para controle das enchentes</p><p>Apesar de que se possa afirmar que as variações climáticas existem e os</p><p>fenômenos naturais são aleatórios, medidas devem ser tomadas no sentido de minimizar</p><p>os danos potenciais das cheias. Tais medidas são comumente divididas em dois grandes</p><p>grupos, as medidas estruturais e as não-estruturais. O primeiro grupo compreende</p><p>medidas que modificam o sistema fluvial, procurando evitar os prejuízos decorrentes</p><p>das inundações, embora não propiciem uma proteção completa, havendo um risco de</p><p>que ocorra uma cheia para a qual as medidas tomadas não suportem. Já as medidas ditas</p><p>não-estruturais visam reduzir os prejuízos com as enchentes pela “melhor convivência”</p><p>da população com tais eventos. O ideal geralmente apontado é composto por uma</p><p>combinação de medidas estruturais e não-estruturais. A seguir, cada um desses grupos é</p><p>descrito e comentado em mais detalhes.</p><p>(a) Medidas estruturais</p><p>- controle da cobertura vegetal: a vegetação interfere no processo chuva-vazão,</p><p>reduzindo o pico da cheia, amortecendo o escoamento, retardando-o, reduzindo</p><p>a erosão, etc;</p><p>- controle da erosão do solo: uma maior erosão implica no assoreamento do rio e</p><p>conseqüente diminuição da área transversal disponível para conduzir as águas;</p><p>geralmente, é recomendado o reflorestamento, estabilização das margens,</p><p>práticas agrícolas adequadas (agroecologia), etc;</p><p>- construção de diques: constituem muros laterais aos rios ou arroios, geralmente</p><p>de concreto ou terra, protegendo áreas ribeirinhas contra o extravasamento da</p><p>água da calha principal do rio; geralmente essa medida apenas transfere o</p><p>problema para jusante;</p><p>- modificações no rio: o objetivo no caso é permitir uma maior capacidade de</p><p>condução do escoamento no rio, o que é alcançado geralmente aumentando a</p><p>velocidade do escoamento ou a área da seção transversal do rio, com custos</p><p>elevados na maioria das situações; para aumentar a velocidade, geralmente</p><p>aumenta-se a declividade do fundo do rio, através de escavação do leito, ou</p><p>retiram-se obstruções ao escoamento, como restos de árvores, rochas, etc; o</p><p>aumento da área transversal é realizado com dragagens do fundo do rio ou</p><p>alargamento da seção;</p><p>128</p><p>- construção de reservatórios: a implantação de barragens nos rios permite reter</p><p>boa parte do volume de água da cheia, o qual é liberado para o trecho de jusante</p><p>do rio de forma mais distribuída no tempo.</p><p>(b) Medidas não-estruturais</p><p>- regulamentação de áreas ribeirinhas, visando definir regras de ocupação de tais</p><p>áreas, como por exemplo a finalidade do uso (recreação, comercial, etc);</p><p>- regulamentação do uso no solo da bacia contribuinte, com o intuito de amenizar</p><p>o aumento do escoamento superficial decorrente do processo de urbanização; um</p><p>exemplo é a definição de um percentual da área dos empreendimentos a ser</p><p>mantida permeável;</p><p>- zoneamento de áreas de inundação, procurando identificar e mapear as áreas</p><p>mais sujeitas às inundações;</p><p>- serviço de previsão e alerta contra cheias, para antever com algum tempo de</p><p>antecedência a ocorrência de cheias e acionar uma série de ações previamente</p><p>estabelecidas, de modo a minimizar os prejuízos;</p><p>- plano de evacuação: baseado no zoneamento e no sistema de previsão e alerta,</p><p>pode ser traçado um plano de evacuação direcionado para as áreas mais sujeitas</p><p>às cheias ou com maiores riscos, o qual é acionado conforme o sistema de alerta.</p><p>Para o zoneamento de áreas de inundação, é feito anteriormente um estudo para</p><p>determinação dos riscos associados a diversos níveis de enchentes, sendo traçado para</p><p>cada uma delas um mapa indicativo das áreas atingidas, sobre o qual define-se o</p><p>zoneamento das áreas de inundação. Isso permite elaborar um conjunto de regras de</p><p>ocupação para as áreas com maior risco de inundação, com o objetivo principal de</p><p>minimizar perdas materiais e de vidas humanas com as grandes enchentes.</p><p>129</p><p>������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��������������</p><p>2��#</p><p>�&������</p><p>�����&2��#</p><p>�&������</p><p>�����&2��#</p><p>�&������</p><p>�����&2��#</p><p>�&������</p><p>�����&����</p><p>(baseado em Tucci, 1998)</p><p>Introdução</p><p>Antes de discutir os principais aspectos da modelagem hidrológica convém</p><p>esclarecer o conceito de um “modelo”. A definição citada por Tucci (1998) é que se</p><p>trata da “representação de algum objeto ou sistema, em uma linguagem ou forma de</p><p>fácil acesso e uso, com o objetivo de entendê-los e buscar suas principais respostas</p><p>para diferentes entradas”. Assim, considerando um modelo que represente um</p><p>determinado sistema, quanto mais complexo este sistema for, mais desafiador e</p><p>necessário é o modelo.</p><p>No caso de uma bacia hidrográfica, o uso de modelos hidrológicos visa</p><p>fundamentalmente entender seu comportamento para utilizar seus recursos e proteger</p><p>suas características.</p><p>Empregando os modelos hidrológicos, é possível prever ou estimar a resposta do</p><p>sistema (uma bacia hidrográfica, um trecho de rio, uma parte do solo, um aqüífero, uma</p><p>lagoa, etc) a diferentes situações, tais como a ocorrência de eventos extremos</p><p>(precipitações de grande intensidade com elevado tempo de retorno), modificações do</p><p>uso do solo, ocorrência de períodos de estiagem e cenários de planejamento e</p><p>desenvolvimento da região. Em outras palavras, o modelo propicia simular situações</p><p>que virão ou poderão vir a acontecer, como a urbanização de parte da bacia, o</p><p>desenvolvimento das atividades econômicas, etc, procurando avaliar como o sistema</p><p>modelado irá responder a tais alterações.</p><p>Para sistema uma definição bastante citada é a de Doodge (1973) apud Tucci</p><p>(1998), segundo a qual sistema “é qualquer estrutura, esquema ou procedimento, real</p><p>ou abstrato, que num dado tempo de referência interrelaciona-se com uma entrada,</p><p>causa ou estímulo de energia ou informação, e uma saída, efeito ou resposta de energia</p><p>ou informação”. Simplificadamente, considera-se que o funcionamento do sistema</p><p>consiste em responder a uma determinada entrada produzindo uma saída. Dentro desse</p><p>contexto, o modelo seria, então, a representação do sistema.</p><p>130</p><p>Convém também deixar claro que o modelo hidrológico constitui uma</p><p>ferramenta, de grande potencial e utilidade, mas que não deve ser encarado como um</p><p>objetivo. O desenvolvimento de um modelo sem as informações necessárias para</p><p>“alimentá-lo” e sem a devida interpretação dos seus resultados gerados não auxilia no</p><p>entendimento do comportamento dos sistemas. Por isso é fundamental que o</p><p>profissional encarregado pelo uso do modelo tenha conhecimento dos processos físicos</p><p>e do sistema que estão sendo modelados, bem como do próprio modelo.</p><p>Dificuldades na aplicação de modelos hidrológicos</p><p>A modelagem hidrológica geralmente é dificultada ou limitada por:</p><p>- heterogeneidade física da bacia: uma bacia hidrográfica geralmente apresenta uma</p><p>grande diversificação espacial do tipo do solo, cobertura vegetal, topografia, presença</p><p>de áreas urbanas/impermeáveis, ocupação do solo, características da rede de drenagem,</p><p>etc, o que dificulta a sua representação dentro de um modelo hidrológico;</p><p>- heterogeneidade dos processos envolvidos: associada à heterogeneidade física da</p><p>bacia, há a variação espacial da “forma” e da “intensidade” com que acontecem os</p><p>processos que ocorrem e influenciam o sistema modelado; por exemplo, a infiltração da</p><p>água precipitada no solo pode ocorrer de modo bastante distinto entre áreas</p><p>relativamente próximas da bacia, dependendo do tipo de solo, da ocupação do terreno,</p><p>do estado de umidade e compactação desse solo, etc;</p><p>- informações disponíveis: a escassez de informações é, muitas vezes, um dos principais</p><p>limitantes no detalhamento e representação dos processos dentro dos modelos</p><p>hidrológicos; seja em termos quantitativos quanto qualitativos, a falta de informações</p><p>que permitam uma caracterização suficiente do sistema a ser modelado pode levar a</p><p>resultados gerados pelo modelo distantes do fenômeno representado ou mesmo</p><p>incapacitar a realização da modelagem;</p><p>- objetivo do estudo: este fator atua mais no sentido de direcionar a escolha do modelo a</p><p>ser empregado, visto que, muitas vezes, o que se procura obter como resposta da</p><p>modelagem pode não justificar o emprego de modelos hidrológicos mais complexos,</p><p>que requeiram um maior esforço computacional, maior número de informações, etc;</p><p>- recursos disponíveis: a limitação de recursos computacionais, de tempo, financeiros, e</p><p>de pessoal qualificado também pode acabar restringindo a aplicação de modelos mais</p><p>complexos, ou com um detalhamento maior dos processos a serem representados.</p><p>131</p><p>Assim, o que ocorre geralmente é a simplificação do comportamento espacial</p><p>das variáveis e dos fenômenos representados no modelo em diferentes graus,</p><p>dependendo dos fatores anteriormente enumerados, motivada também pela dificuldade</p><p>em formular matematicamente alguns processos.</p><p>Questionamento sobre o uso de modelos</p><p>Após o início do contato com os modelos hidrológicos, é comum surgirem</p><p>algumas dúvidas a respeito do tema, motivadas principalmente por uma percepção</p><p>errada da aplicação da modelagem.</p><p>Um dos principais questionamentos consiste em discutir o por quê da</p><p>necessidade dos modelos hidrológicos, já que é possível medir as variáveis hidrológicas.</p><p>O uso dos modelos visa, principalmente, tentar estimar como seria ou será a resposta do</p><p>sistema estudado a eventos futuros, antecipando-os. Sem eles, os modelos, a avaliação</p><p>só seria possível após o acontecimento do evento em si, monitorando-o através de</p><p>equipamentos (pluviômetros, linígrafos, etc). A essa altura (quando está ocorrendo o</p><p>evento), poucas ações poderiam ser feitas para minimizar seus prejuízos ou gerir seus</p><p>impactos, no caso de uma precipitação intensa, por exemplo – esse é o caso típico da</p><p>aplicação do modelo almejando avaliar o impacto da ocorrência de um evento extremo</p><p>estatisticamente possível. O modelo permite investigar ainda sobre possíveis mudanças</p><p>futuras na bacia, como urbanização, desmatamento, modificações em um rio, construção</p><p>de reservatórios, etc.</p><p>Por outro lado, outra questão que surge é justamente em sentido contrário à</p><p>dissertação anterior, ao discutir qual a necessidade de continuar o monitoramento de</p><p>variáveis hidrológicas, já que se dispõe de um modelo que representa o sistema. Esse</p><p>pensamento é totalmente errôneo, pois o que subsidia a validade do modelo é</p><p>justamente a alimentação do mesmo com informações, entre elas as variáveis</p><p>hidrológicas medidas. O ideal é que, sempre que possível, novas informações (recém</p><p>coletadas) sejam incorporadas e o modelo tenha seu desempenho re-avaliado e seja</p><p>novamente ajustado. Então, o que ocorre é que, quanto menos informações estão</p><p>disponíveis, geralmente maiores são as incertezas dos prognósticos dos modelos.</p><p>Tipos de modelos</p><p>Uma classificação básica dos modelos é quanto à forma com que representam</p><p>os</p><p>sistemas, sendo divididos em modelos físicos, analógicos e matemáticos. Os modelos</p><p>132</p><p>físicos representam o sistema por um protótipo em escala menor. São bastante utilizados</p><p>na hidráulica, como modelos de vertedor de barragens, modelos de praias, de portos,</p><p>etc. Já os modelos analíticos são caracterizados por funcionarem fazendo analogia com</p><p>equações que regem diferentes fenômenos. O exemplo mais comum desse caso é a</p><p>analogia entre as equações do escoamento hidráulico e de um circuito elétrico.</p><p>O modelo matemático, por sua vez, representa a natureza do sistema através de</p><p>equações matemáticas. Isso os torna mais versáteis, permitindo facilmente que sejam</p><p>modificados e que seja obtida uma análise rápida de diferentes situações de um mesmo</p><p>sistema ou até de vários sistemas. Imagine um modelo matemático desenvolvido para</p><p>representar a circulação da água e o transporte de contaminantes em um rio. Caso seja</p><p>interesse estudar como a dispersão e a propagação para jusante do contaminante é</p><p>influenciada pelas dimensões da seção transversal do rio, bastaria alterar os valores no</p><p>modelo matemático e executar o cálculo novamente. Por outro lado, a mesma análise</p><p>sendo feita em um modelo físico, constituído por um “protótipo” do rio (por exemplo,</p><p>usando argila), requereria um enorme esforço, na medida que para cada seção</p><p>transversal estudada seria necessário reconstruir todo o modelo reduzido.</p><p>As desvantagens do modelo matemático residem principalmente na dificuldade</p><p>de representar matematicamente alguns processos físicos e na necessidade de discretizar</p><p>os processos no tempo e no espaço. Sabe-se que os processos naturais são contínuos</p><p>(por exemplo, a vazão em um rio varia continuamente de um valor em um determinado</p><p>instante do tempo a outro – ou seja, por mais rápida que seja a variação, não ocorrem</p><p>“saltos” de um valor para outro). Entretanto, na modelagem matemática,</p><p>simplificadamente, os processos são estudados em intervalos de tempo e em alguns</p><p>pontos do espaço. Em outras palavras, o modelo matemático calcula as variáveis</p><p>hidrológicas em passos de tempo pré-determinados (por exemplo, a cada minuto, hora,</p><p>dia, etc) e em alguns pontos do sistema. A forma como é feita tal discretização no tempo</p><p>e no espaço é função de uma série de fatores, não cabendo aqui discorrer sobre a</p><p>questão, mas é interessante perceber que quanto mais fina seja a discretização (menor</p><p>passo de tempo e distância entre os pontos no espaço), mais próxima da realidade do</p><p>sistema está sendo a sua representação no modelo, caso haja informações tão detalhadas</p><p>para alimentar o modelo.</p><p>133</p><p>Aplicação dos modelos hidrológicos</p><p>Antes de comentar sobre a aplicação dos modelos hidrológicos, é interessante</p><p>apresentar algumas definições fundamentais para a compreensão da modelagem:</p><p>- fenômeno: processo físico que produz alteração no estado do sistema (exemplos:</p><p>evaporação, infiltração, precipitação, etc);</p><p>-variável: valor que descreve quantitativamente um fenômeno, variando no espaço e no</p><p>tempo (exemplo: vazão em um rio, que é a variável que descreve o estado do</p><p>escoamento);</p><p>- parâmetro: valor que caracteriza o sistema, podendo também variar no tempo e no</p><p>espaço (exemplos: área da bacia, coeficiente de permeabilidade do solo, rugosidade do</p><p>rio, coeficiente de difusão, etc).</p><p>- simulação: processo de utilização do modelo.</p><p>A simulação ou uso do modelo envolve basicamente três etapas: (i) estimativa</p><p>ou ajuste; (ii) verificação; (iii) previsão.</p><p>(i) Estimativa ou ajuste dos parâmetros: essa fase é também conhecida como calibração</p><p>do modelo e consiste na determinação dos valores dos parâmetros do mesmo; a</p><p>estimativa de tais valores depende da disponibilidade de dados históricos, da medição</p><p>de amostras e da determinação de características físicas do sistema. Há diferentes</p><p>formas de se estimar os parâmetros do modelo:</p><p>i.a – Estimativa sem dados históricos: esse caso é usado quando não há registros</p><p>das variáveis dos sistemas, sendo os valores dos parâmetros determinados em função da</p><p>caracterização física do sistema. Normalmente, a literatura especializada estabelece</p><p>faixas de valores (intervalo de variação) para cada parâmetro, em função de observações</p><p>em campo/laboratório ou do significado físico do parâmetro.</p><p>i.b – Ajuste por tentativas: nessa situação, os parâmetros têm seus valores</p><p>variados, sendo comparados os resultados do modelo com os valores das variáveis</p><p>medidas. Por exemplo, em um modelo que simula a transformação chuva-vazão, um</p><p>determinado parâmetro pode ser ajustado variando-se seu valor e observando como o</p><p>hidrograma gerado pelo modelo se comporta em relação ao hidrograma medido –</p><p>134</p><p>obviamente, procura-se o valor do parâmetro que melhor ajuste os valores calculados</p><p>aos observados (que os torne mais próximos entre si). A decisão do melhor ajuste é</p><p>baseada geralmente na análise visual (graficamente) ou através de coeficientes</p><p>estatísticos. Este método requer a existência de valores medidos das variáveis de entrada</p><p>e saída do modelo;</p><p>i.c – Ajuste por otimização: esse caso é semelhante ao anterior, diferindo</p><p>basicamente na forma com que os valores dos parâmetros são variados, buscando o</p><p>melhor ajuste entre os valores calculados pelo modelo e os observados por medições.</p><p>Neste caso, é empregado algum método matemático que propicie o valor ótimo de cada</p><p>parâmetro, como programação linear, não-linear, algoritmos genéticos, etc.</p><p>i.d – Amostragem: aqui o valor do parâmetro é obtido por medição da</p><p>característica específica do sistema; por exemplo, pode ser feita a análise em laboratório</p><p>para determinação do coeficiente de permeabilidade do solo.</p><p>(ii) Verificação: nesta fase o modelo já calibrado (ou seja, com os valores dos</p><p>parâmetros ajustados) é verificado ou testado com outro conjunto de dados – valores das</p><p>variáveis de entrada e saída distintos dos utilizados na fase de ajuste. Agora, os valores</p><p>das variáveis de saída são usados apenas para comparação com o resultado gerado pelo</p><p>modelo, sendo verificado se o modelo simula o sistema satisfatoriamente.</p><p>(iii) Previsão: esta é a fase da simulação onde o modelo, estando ajustado e verificado, é</p><p>utilizado para representar a saída do sistema para situações desconhecidas, como</p><p>alternativas de projeto (intervenções na bacia) ou modificações futuras possíveis na</p><p>bacia.</p><p>É importante ressaltar que a qualidade dos resultados da previsão com o modelo</p><p>é função da representatividade dos períodos de dados usados nas fases anteriores (ajuste</p><p>e verificação), da discretização do sistema e da capacidade do modelo em simular as</p><p>novas condições impostas.</p><p>135</p><p>Classificação dos sistemas e modelos</p><p>Neste item são apresentadas algumas classificações dos sistemas e dos modelos,</p><p>fazendo-se já a ressalva que nem sempre um sistema classificado como um certo tipo</p><p>será representado por um modelo do mesmo tipo – as classificações são independentes.</p><p>* Concentrado x distribuído</p><p>O modelo concentrado é caracterizado por não levar em conta a variabilidade</p><p>espacial das variáveis, que são consideradas funções apenas do tempo. Já o modelo dito</p><p>distribuído têm variáveis e parâmetros que variam ao longo do espaço (além do tempo).</p><p>O exemplo mais clássico são os modelos chuva-vazão (que simulam a transformação da</p><p>chuva em vazão), onde os concentrados consideram a bacia como um elemento único e</p><p>os distribuídos subdividem-na em áreas menores, fazendo a referida transformação em</p><p>cada uma dessas sub-áreas. A rigor, não existiria modelo distribuído, pois ele seria</p><p>concentrado em cada subdivisão menor.</p><p>* Estocástico x determinístico</p><p>Na modelagem estocástica, é considerada a chance de ocorrência das variáveis,</p><p>ao ser introduzido o conceito de probabilidade. O modelo determinístico, por sua vez,</p><p>segue uma lei definida, sem considerar as chances de ocorrência dos valores</p><p>à urbanização, o que diminui a parcela infiltrada e aumenta o escoamento</p><p>superficial, causando alagamentos. O desmatamento é outro exemplo, na medida em</p><p>que diminui a interceptação, deixando os solos expostos à ação das gotas de chuva e do</p><p>escoamento superficial, que erodem o solo e carreiam nutrientes e sedimentos para rios</p><p>e lagos.</p><p>Para ilustrar o efeito da substituição da cobertura natural do solo pela</p><p>urbanização sobre o ciclo hidrológico, tem-se a Figura 2.2. Observa-se que, após uma</p><p>impermeabilização entre 30% e 50% da superfície, o escoamento superficial passa a</p><p>11</p><p>corresponder a 55% do total precipitado, enquanto esse percentual era equivalente a</p><p>apenas 10% da precipitação para a situação de cobertura natural do solo.</p><p>Figura 2.2 – Ilustração do efeito da urbanização sobre o ciclo hidrológico (os</p><p>percentuais se referem à parcela da precipitação que “segue” cada uma das fases do</p><p>ciclo). Fonte: adaptado de EPA (1998).</p><p>Além de alterar as fases do ciclo hidrológico, as atividades antrópicas1 têm uma</p><p>série de repercussões sobre o meio ambiente, tais como: contaminação de corpos</p><p>d’água, devido ao lançamento de efluentes de origem industrial, agrícola ou doméstico</p><p>(esgoto das cidades); introdução de espécies exóticas (espécies que não eram</p><p>encontradas na região na região e foram introduzidas pelo homem); ocupação de</p><p>planícies de inundação; mudanças globais no clima; desmatamento; contaminação do ar,</p><p>ocasionando chuvas ácidas, etc (Tabela 2.2).</p><p>1 atividade antrópica = aquela relativa à ação humana.</p><p>12</p><p>Tabela 2.2 – Atividade humana e seus impactos sobre a disponibilidade hídrica. (Fonte:</p><p>adaptado de Tundisi, 2000).</p><p>Atividade humana Impacto nos ecossistemas aquáticos Valores/serviços em risco</p><p>Construção de</p><p>represas</p><p>Alteração do fluxo dos rios, transporte</p><p>de nutrientes e sedimentos,</p><p>intereferência na migração e</p><p>reprodução de peixes</p><p>Habitats, pesca comercial e</p><p>esportiva, deltas e suas</p><p>economias</p><p>Construção de</p><p>diques e canais</p><p>Destruição da conexão do rio com as</p><p>áreas inundáveis</p><p>Fertilidade natural das várzeas e</p><p>controles das enchentes</p><p>Alteração do canal</p><p>natural dos rios</p><p>Danos ecológicos dos rios. Modificação</p><p>dos fluxos dos rios</p><p>Habitats, pesca comercial e</p><p>esportiva. Produção de</p><p>hidroeletricidade e transporte.</p><p>Drenagem de áreas</p><p>alagadas</p><p>Eliminação de um componente</p><p>fundamental dos ecossistemas</p><p>aquáticos</p><p>Biodiversidade. Funções naturais</p><p>de filtragem e reciclagem de</p><p>nutrientes. Habitats para peixes e</p><p>aves aquáticas.</p><p>Desmatamento/uso</p><p>do solo</p><p>Mudança de padrões de drenagem,</p><p>inibição da recarga natural dos</p><p>aquíferos, aumento da sedimentação</p><p>Qualidade e quantidade da água,</p><p>pesca comercial, biodiversidade</p><p>e controle de enchentes.</p><p>Poluição não</p><p>controlada Prejuízo da qualidade da água</p><p>Suprimento de água. Custos de</p><p>tratamento. Pesca comercial.</p><p>Biodiversidade. Saúde humana.</p><p>Remoção excessiva</p><p>de biomassa</p><p>Diminuição dos recursos vivos e da</p><p>biodiversidade</p><p>Pesca comercial e esportiva.</p><p>Ciclos naturais dos organismos.</p><p>Introdução de</p><p>espécies exóticas</p><p>Supressão das espécies nativas.</p><p>Alteração dos ciclos de nutrientes e</p><p>ciclos biológicos</p><p>Habitats, pesca comercial.</p><p>Biodiversidade natural e</p><p>estoques genéticos.</p><p>Poluentes do ar</p><p>(chuva ácida)</p><p>Perturbação da composição química de</p><p>rios e lagos</p><p>Pesca comercial. Biota aquática.</p><p>Recreação. Saúde humana.</p><p>Agricultura</p><p>Mudanças globais no</p><p>clima</p><p>Alteração drástica do volume dos</p><p>recursos hídricos, dos padrões de</p><p>distribuição da precipitação e</p><p>evaporação, riscos de enchente</p><p>Suprimento de água, transporte,</p><p>produção de energia elétrica,</p><p>produção agrícola, pesca.</p><p>Crescimento da</p><p>população e padrões</p><p>gerais do consumo</p><p>humano</p><p>Aumento na pressão para construção</p><p>de hidroelétricas, da poluição da água,</p><p>da acidificação de lagos e rios.</p><p>Modificação do ciclo hidrológico.</p><p>Praticamente todas as atividades</p><p>econômicas que dependem dos</p><p>serviços dos ecossistemas</p><p>aquáticos.</p><p>Usos da água</p><p>Os setores usuários das águas são diversos, utilizando-as para diferentes fins.</p><p>Dependendo do uso, há a necessidade de derivação da água e ocorre um consumo (uso</p><p>consuntivo), retornando determinada parcela da água aos corpos d’águas. Outros usos,</p><p>13</p><p>como a navegação, por exemplo, são considerados não consuntivos, pois não alteram a</p><p>quantidade deste recurso na natureza.</p><p>Na Tabela 2.3 são listados os principais usos da água, explicitando algumas</p><p>características: existência ou não de derivação de águas do seu curso natural; a</p><p>finalidade e os tipos de uso; as perdas por uso consuntivo da água; os requisitos de</p><p>qualidade exigidos para cada uso e; os efeitos da utilização, especialmente de qualidade.</p><p>Tabela 2.3 – Usos da água (Fonte: adaptado de Barth, 1987, apud Setti et al., 2001).</p><p>Forma Finalidade Tipo de uso Uso consuntivo Requisitos de</p><p>qualidade Efeitos nas águas</p><p>abastecimento</p><p>urbano</p><p>abastecimento</p><p>doméstico, industrial,</p><p>comercial e público</p><p>baixo, de 10%, sem</p><p>contar as perdas nas</p><p>redes</p><p>altos ou médios, influindo</p><p>no custo do tratamento</p><p>Poluição orgânica e</p><p>bacteriológica</p><p>abastecimento</p><p>industrial</p><p>sanitário, de processo,</p><p>incorporação ao</p><p>produto, refrigeração e</p><p>geração de vapor</p><p>médio, de 20%,</p><p>variando com o tipo de</p><p>uso e de indústria</p><p>médios, variando com o</p><p>tipo de uso</p><p>Poluição orgânica,</p><p>substâncias tóxicas,</p><p>elevação de</p><p>temperatura</p><p>irrigação</p><p>irrigação artificial de</p><p>culturas agrícolas</p><p>segundo diversos</p><p>métodos</p><p>alto, de 90% Médios, dependendo do</p><p>tipo de cultura</p><p>Carreamento de</p><p>agrotóxicos e</p><p>fertilizantes</p><p>abastecimento</p><p>doméstico ou para</p><p>dessedentação de</p><p>animais</p><p>baixo, de 10% Médios Alterações na qualidade</p><p>com efeitos difusos</p><p>Com</p><p>derivação</p><p>de águas</p><p>aqüicultura estações de</p><p>piscicultura e outras baixo, de 10% Altos Carreamento de</p><p>matéria orgânica</p><p>geração</p><p>hidroelétrica</p><p>acionamento de</p><p>turbinas hidráulicas</p><p>perdas por evaporação</p><p>do reservatório baixos alterações no regime e</p><p>na qualidade da água</p><p>navegação</p><p>fluvial</p><p>manutenção de</p><p>calados mínimos e</p><p>eclusas</p><p>não há baixos lançamento de óleo e</p><p>combustíveis</p><p>recreação, lazer</p><p>e harmonia</p><p>paisagística</p><p>natação e outros</p><p>esportes com contato</p><p>direto, como iatismo e</p><p>motonáutica</p><p>lazer contemplativo</p><p>altos, especialmente</p><p>recreação de contato</p><p>primário</p><p>não há</p><p>pesca</p><p>com comerciais de</p><p>espécies naturais ou</p><p>introduzidas através de</p><p>estações de</p><p>piscicultura</p><p>não há</p><p>altos, nos corpos d'água,</p><p>correntes, lagos, ou</p><p>reservatórios artificiais</p><p>alterações na qualidade</p><p>após mortandade de</p><p>peixes</p><p>assimilação de</p><p>esgotos</p><p>diluição,</p><p>autodepuração e</p><p>transporte de esgotos</p><p>urbanos e industriais</p><p>não há não há</p><p>poluição orgânica,</p><p>física, química e</p><p>bacteriológica</p><p>sem</p><p>derivação</p><p>das águas</p><p>usos de</p><p>preservação</p><p>vazões para assegurar</p><p>o equilíbrio ecológico</p><p>não há médios melhoria da qualidade</p><p>da água</p><p>14</p><p>Escassez da água</p><p>Há algum tempo atrás, predominava a idéia da abundância da água na natureza,</p><p>o que não gerava preocupação quanto à quantidade de água consumida ou desperdiçada</p><p>por determinado uso. Entretanto, atualmente tem-se tentado tornar cada vez mais</p><p>consensual a noção de escassez de água, pelo menos em termos relativos, em virtude da</p><p>crescente demanda por esse valioso recurso.</p><p>São diferenciados dois tipos de escassez: (a) escassez quantitativa e (b) escassez</p><p>qualitativa.</p><p>A escassez quantitativa decorre da falta de água em quantidade suficiente para</p><p>atender àqueles usos pretendidos, sendo comum a ocorrência no Nordeste brasileiro</p><p>(região semi-árida, principalmente). Cabe salientar aqui a irregular distribuição</p><p>temporal (precipitações concentradas em poucos meses do ano) e espacial (abundância</p><p>de água na Amazônia e escassez no semi-árido nordestino).</p><p>A escassez qualitativa é resultante da falta de qualidade suficiente da água para</p><p>atender os usos</p><p>das</p><p>variáveis. Simplificadamente, pode-se afirmar que enquanto o modelo determinístico</p><p>“produz” a mesma saída para uma mesma entrada, no modelo estocástico a relação entre</p><p>entrada e saída é estatística (há chances de ocorrência para cada determinado valor).</p><p>* Conceitual x empírico</p><p>Um modelo é referido como conceitual quando as funções utilizadas levam em</p><p>consideração os processos físicos, enquanto no modelo empírico as funções empregadas</p><p>foram desenvolvidas para ajustar os valores medidos e observações em</p><p>campo/laboratório, sem retratar o processo físico em si.</p><p>Dentro do contexto de gerenciamento dos recursos hídricos, pode-se dividir os</p><p>modelos em três categorias principais:</p><p>- modelos de comportamento, que são utilizados para descrever o comportamento</p><p>dos sistemas e, desse modo, prognosticar a resposta do sistema a diferentes</p><p>136</p><p>situações; exemplos: modelo de circulação da água e transporte de</p><p>contaminantes em um rio; modelo chuva-vazão; etc.</p><p>- modelos de otimização, que procuram obter a “melhor” solução para uma</p><p>determinada situação, atendendo a objetivos pré-definidos; exemplo: modelo de</p><p>operação de reservatório;</p><p>- modelos de planejamento, que simulam condições globais de um sistema maior</p><p>(acoplam modelos de comportamento e de otimização);</p><p>A seguir são enumerados alguns exemplos de modelos hidrológicos:</p><p>- modelos que simulam o escoamento da água em rios, lagos, banhados, etc, como</p><p>os modelos hidrodinâmicos uni, bi ou tridimensionais;</p><p>- modelos de transformação chuva-vazão;</p><p>- modelos de escoamento das águas subterrâneas;</p><p>- modelos de operação de reservatórios;</p><p>- modelo de balanço hídrico no solo;</p><p>- modelo de previsão de cheias;</p><p>- modelo de transporte de constituintes e de reações cinéticas (modelagem de</p><p>qualidade de água), os quais podem estar acoplados a modelos de circulação da</p><p>água, a modelos chuva-vazão, modelos de águas subterrâneas, etc.</p><p>137</p><p>Referências Bibliográficas</p><p>ANA, 2004. Agência Nacional de Águas. Página eletrônica (www.ana.gov.br),</p><p>acessada em novembro/2004.</p><p>EPA, 1998. Stream Corridor Restoration – principles, processes and practices.</p><p>Environmental Protection Agency, EUA.</p><p>Esteves, F., 1988. Fundamentos de Limnologia. Ed. Interciência/FINEP, Rio de</p><p>Janeiro.</p><p>Hobeco, 2003. Catálogo eletrônico de instrumentos e telemetria de</p><p>Hidrometeorogia. Hobeco Sudamericana Ltda, Rio de Janeiro.</p><p>IPH, 2001. Plano Diretor de Drenagem Urbana de Caxias do Sul, Instituto de</p><p>Pesquisas Hidráulicas (IPH/UFRGS), SAMAE.</p><p>MMA, 1999. III Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas,</p><p>Ministério do Meio Ambiente (MMA), Secretaria de Recursos Hídricos (SRH).</p><p>PAN-Brasil, 2004. Programa de Ação Nacional de Combate à Desertificação e</p><p>Mitigação dos Efeitos da Seca, Ministério do Meio Ambiente, Secretaria de</p><p>Recursos Hídricos.</p><p>Pinto, N.; Holtz, A.; Martins, J.; Gomide, F., 1976. Hidrologia Básica. Ed. Edgard</p><p>Blücher Ltda, MEC.</p><p>Rosman, P., 1989. Modelos de Circulação em Corpos d’Água Rasos. In: Silva, R (ed.).</p><p>Métodos Numéricos em Recursos Hídricos, vol. 1, ABRH.</p><p>Santos, I. et al., 2001. Hidrometria Aplicada. Lactec, Curitiba.</p><p>Schwarzbold, A., 2000. O que é um rio? Revista Ciência e Ambiente, n. 21,</p><p>Universidade Federal de Santa Maria (RS).</p><p>Setti, A.; Lima, J.; Chaves, A.; Pereira, I., 2001. Introdução ao Gerenciamento de</p><p>Recursos Hídricos. Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) – Agência</p><p>Nacional de Águas (ANA).</p><p>Silva, F.; Paz, A.; Gomes, R.; Souza, E.; Silans, A., 2000. Estudo Experimental da</p><p>Interação Solo Vegetação Atmosfera na Região do Cariri. Anais do V Simpósio de</p><p>Recursos Hídricos do Nordeste, ABRH, Natal.</p><p>138</p><p>Spiegel, M., 1972. Estatística. Coleção Schaum, Ed. McGraw-Hill do Brasil.</p><p>Studart, T. Apostila da Disciplina de Hidrologia Aplicada, Universidade Federal do</p><p>Ceará.</p><p>Suertegaray, D. et al., 2001. Projeto Arenização no Rio Grande do Sul, Brasil: Gênese,</p><p>Dinâmica e Espacialização. Revista Bibliográfica de Geografía y Ciencias</p><p>Sociales, n. 287, Universidad de Barcelona.</p><p>Tucci, C., 1998. Modelos Hidrológicos. Editora da Universidade, ABRH, Porto Alegre.</p><p>Tucci, C. 2000. (org.) Hidrologia – ciência e aplicação. Editora da Universidade,</p><p>ABRH, Porto Alegre.</p><p>Tundisi, J., 2000. Limnologia e Gerenciamento Integrado de Recursos Hídricos.</p><p>Revista Ciência e Ambiente, n. 21, Universidade Federal de Santa Maria (RS).</p><p>Villela, S., 1976. Hidrologia Aplicada. Ed. McGraw-Hill, São Paulo.</p><p>pretendidos, ocasionada principalmente pelo lançamento de esgotos das</p><p>várias origens.</p><p>Assim, por ser um recurso escasso, a água é considerada dotada de valor</p><p>econômico, como dispõe a Lei 9.433 de 19972, a chamada Lei das Águas. Por isso, além</p><p>da gestão da oferta de água (busca de novos mananciais de abastecimento ou aumento</p><p>da exploração dos existentes), praticada há mais tempo, tem-se ressaltado a necessidade</p><p>da gestão da demanda pela água. Isso visa proporcionar um uso racional desse recurso e,</p><p>para tanto, diversos instrumentos estão previstos na referida lei, entre eles alguns</p><p>instrumentos econômicos, como a outorga e a cobrança pela água. A outorga se refere</p><p>basicamente à concessão do direito de utilização da água, seja para captá-la, para usá-la</p><p>como diluição de esgotos (efluentes) ou para geração de energia elétrica, a ser emitida</p><p>pelo órgão responsável. A cobrança diz respeito ao pagamento de um valor pela retirada</p><p>da água do corpo d’água ou pelo lançamento de efluentes no mesmo.</p><p>2 Lei Federal n. 9.433, de 8 de janeiro de 1997, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, cria</p><p>o Sistema Nacional de Recursos Hídricos e dá outras providências.</p><p>15</p><p>������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>����������</p><p>������������� !���������������� !���������������� !���������������� !�������</p><p>Conceito de bacia hidrográfica</p><p>A expressão bacia hidrográfica é usada para denotar a área de captação natural</p><p>da água de precipitação que faz convergir os escoamentos para um único ponto de saída,</p><p>que é chamado de exutório. A bacia é constituída por um conjunto de superfícies</p><p>vertentes – terreno sobre o qual escoa a água precipitada – e de uma rede de drenagem</p><p>formada por cursos d’água que confluem até resultar um leito único no exutório.</p><p>Figura 3.1 – Superfícies vertentes e rede de drenagem que compõem uma bacia</p><p>hidrográfica.</p><p>Superfícies</p><p>Vertentes</p><p>Rede de</p><p>drenagem</p><p>16</p><p>Relembrando os processos envolvidos no ciclo hidrológico (Capítulo 2), a bacia</p><p>hidrográfica pode ser considerada como um sistema físico, cuja entrada é o volume de</p><p>água precipitado e cuja saída é o volume de água escoado pelo exutório. Entretanto, esse</p><p>é um sistema aberto, já que nem toda a precipitação (entrada de água) se torna</p><p>escoamento no exutório (saída) ou fica armazenada na própria bacia. Há perdas</p><p>intermediárias, relativas aos volumes evaporados, transpirados (pela vegetação) ou</p><p>infiltrados profundamente (Figura 3.2). Tais volumes de água representam parcela da</p><p>entrada no sistema que é “perdida” para a atmosfera ou para camadas profundas do</p><p>subsolo.</p><p>Figura 3.2 – Representação da bacia hidrográfica como um sistema aberto.</p><p>Mesmo com esse aspecto de sistema aberto, o estudo hidrológico se dá a nível de</p><p>bacia hidrográfica, cujo papel hidrológico é entendido como sendo o de transformar</p><p>uma entrada de volume de água concentrada no tempo (que é a precipitação) em uma</p><p>saída de água de forma mais distribuída no tempo (escoamento pelo exutório).</p><p>Nesse meio termo, ou seja, entre a ocorrência da precipitação e a vazão de saída</p><p>da bacia, decorrem todos os processos descritos no Capítulo 2, compondo o Ciclo</p><p>Hidrológico. Há interceptação pela vegetação, erosão do solo, evaporação, transpiração,</p><p>armazenamento da água em depressões do solo, infiltração sub-superficial e profunda,</p><p>etc. Ocorrem também os diversos usos da água pela população residente na bacia, como</p><p>captação de água para abastecimento doméstico, uso para lazer, banho, lançamento de</p><p>esgotos e efluentes industriais, entre outros. Entretanto, como acontece cada processo do</p><p>ciclo ou cada uso da água e em que intensidade vai variar conforme as características da</p><p>���������</p><p>�</p><p>��</p><p>�</p><p>�������</p><p>�</p><p>���������</p><p>�</p><p>�������</p><p>����������</p><p>limite da bacia</p><p>hidrográfica</p><p>rede de drenagem</p><p>17</p><p>bacia, como relevo, topografia, cobertura vegetal, tipo de solo, geologia, presença de</p><p>áreas urbanas, atividades agropecuárias ou industriais, etc.</p><p>Na Figura 3.3 são apresentados dois gráficos, denominados de hietograma e</p><p>hidrograma. O primeiro se refere à representação da precipitação ocorrida ao longo do</p><p>tempo, enquanto o hidrograma retrata o comportamento da vazão ao longo do tempo.</p><p>Tais gráficos são apenas exemplos típicos e serão discutidos em mais detalhes no</p><p>Capítulo referente ao Escoamento Superficial, mas permitem visualizar o papel</p><p>hidrológico da bacia, transformando a entrada de água concentrada no tempo em uma</p><p>saída mais distribuída.</p><p>Figura 3.3 – Exemplo de gráficos da precipitação ao longo do tempo (hietograma) e da</p><p>vazão (hidrograma), ilustrando o papel hidrológico de uma bacia hidrográfica.</p><p>Simplificadamente, pode-se descrever o processo de transformação da</p><p>precipitação em vazão do seguinte modo: a precipitação que cai sobre as vertentes</p><p>(superfícies que contribuem para os cursos d’água da rede de drenagem) infiltra-se</p><p>totalmente no solo até saturá-lo. Nesse instante, decresce a taxa de infiltração, que passa</p><p>a ser inferior à precipitação e aumenta o escoamento superficial (Figura 3.4), que segue</p><p>até a rede de drenagem e daí até o exutório da bacia. Esse processo de formação do</p><p>escoamento superficial é geralmente caracterizado como uma “produção de água” pelas</p><p>vertentes.</p><p>18</p><p>À medida que se processa o escoamento superficial nas vertentes, ocorre</p><p>também o transporte de partículas do solo (sedimentos), devido à força erosiva das gotas</p><p>da chuva e à própria ação do escoamento. Isso é referido como “produção de</p><p>sedimentos” pelas vertentes, de forma análoga à produção de água, e será melhor</p><p>discutido no Capítulo referente ao Transporte de Sedimentos.</p><p>Importante ressaltar que as superfícies vertentes e a rede de drenagem são</p><p>indissociáveis, visto que estão em constante interação. Durante a precipitação, as</p><p>vertentes contribuem para os arroios e rios com água e sedimentos carreados.</p><p>Entretanto, quando ocorre cheia no rio, este extravasa da sua calha principal, alcançando</p><p>a planície de inundação, ocorrendo fluxo inverso de água e sedimentos (agora no</p><p>sentido calha do rio para planície de inundação).</p><p>Figura 3.4 – “Produção” de escoamento superficial nas superfícies vertentes de uma</p><p>bacia hidrográfica.</p><p>Delimitação da bacia hidrográfica</p><p>Como já mencionado, a bacia hidrográfica é vista como o conjunto de áreas que</p><p>contribuem para um determinado ponto. Entretanto, como definir tal área de</p><p>contribuição, também conhecida como área de drenagem? Normalmente, os limites da</p><p>bacia são estabelecidos analisando a topografia do terreno (relevo), através das curvas</p><p>de nível (linhas indicativas da altitude do terreno – cotas – em relação a um referencial,</p><p>como o nível do mar). Seja utilizando mapas impressos ou arquivos eletrônicos, a bacia</p><p>hidrográfica é delimitada identificando as áreas de maior cota, que constituem os</p><p>19</p><p>chamados divisores topográficos da bacia. Como o escoamento se dá pela ação da</p><p>gravidade, e a bacia é definida como o conjunto de áreas que contribuem para um ponto,</p><p>é fácil perceber que as regiões de terreno mais elevado estabelecem uma divisão entre a</p><p>parte do terreno cujo escoamento segue até o rio em questão e a parte cujo escoamento</p><p>segue para outro rio de outra bacia.</p><p>Também é importante ter em mente o conceito de “bacias dentro de bacias”, o</p><p>qual é ilustrado pela Figura 3.5. Tendo o ponto A como base, a área contribuinte, ou</p><p>seja, sua bacia hidrográfica é a indicada em tal figura. Entretanto, essa bacia está</p><p>inserida na bacia do ponto B que, por sua vez, está contida na bacia do ponto C. Assim,</p><p>conforme a escala em que se trabalhe e, principalmente, o interesse do estudo a ser</p><p>realizado, serão tomadas as bacias “maiores” ou as sub-bacias e micro-bacias.</p><p>Figura 3.5 – Delimitação da área contribuinte conforme o ponto considerado (A, B ou</p><p>C, cuja localização é indicada pelas setas).</p><p>Voltando à questão da delimitação de uma bacia, a rigor existem três tipos de</p><p>divisores de bacias: divisor topográfico, baseado no relevo; divisor geológico, em</p><p>função das características geológicas; e divisor freático, estabelecido de acordo com a</p><p>posição do lençol freático (nível das águas subterrâneas no subsolo) (Figura 3.6). Mas,</p><p>devido à falta de informações e à não praticidade no estabelecimento dos divisores</p><p>geológicos e freáticos, geralmente são empregados apenas os divisores topográficas</p><p>para identificar e delimitar uma bacia.</p><p>A</p><p>B</p><p>C</p><p>20</p><p>Figura 3.6 – Indicação dos divisores topográficos e freáticos de uma bacia hidrográfica</p><p>(Fonte: Villela, 1975).</p><p>Bacia hidrográfica x gestão dos recursos hídricos</p><p>Com base nas definições de bacia hidrográfica, percebe-se porque se adota a</p><p>bacia hidrográfica como unidade para a gestão dos recursos hídricos. Como a bacia</p><p>define todas as áreas contribuintes para um ponto, isso significa que os impactos, ações,</p><p>intervenções, projetos em um ponto da bacia poderão repercutir em toda a área a jusante</p><p>da área afetada inicialmente. Por exemplo, o lançamento de efluentes de uma indústria</p><p>em um determinado ponto de um arroio irá influir na qualidade da água em todo o</p><p>restante do arroio a jusante, bem como nos demais cursos d’água para o qual tal arroio</p><p>conflui. Outro exemplo diz respeito ao desmatamento de uma parte da área da bacia,</p><p>cujo efeito (maior geração de escoamento superficial) será sentido nos trechos a jusante</p><p>da bacia. Assim, os problemas relativos à água são comumente tratados pensando na</p><p>bacia hidrográfica onde estão inseridos, cuja delimitação prevalece sobre os limites</p><p>municipais e estaduais, por exemplo.</p><p>Por isso, a Lei 9.433 (1997) estabelece como um dos princípios a definição da</p><p>bacia hidrográfica como unidade territorial para implementação da Política Nacional de</p><p>Recursos Hídricos.</p><p>21</p><p>O território brasileiro foi dividido inicialmente em 8 regiões hidrográficas (R.</p><p>H.), mas atualmente, segundo a Resolução 32 do Conselho Nacional de Recursos</p><p>Hídricos (CNRH) de 15 de outubro de 2003, são estabelecidas 12 regiões hidrográficas</p><p>(Figura 3.6): R. H. do Amazonas; R. H. do Tocantins; R. H. do Paraguai; R. H. do</p><p>Paraná; R. H. do Atlântico Nordeste Ocidental; R. H. do Atlântico Nordeste Oriental; R.</p><p>H. do Parnaíba; R. H. do São Francisco; R. H. do Atlântico Leste; R. H. do Atlântico</p><p>Sudeste; R. H. do Atlântico Sul; R. H. do Uruguai.</p><p>Figura 3.7 – Divisão hidrográfica nacional (Fonte: adaptado de ANA, 2004).</p><p>O Estado do Rio Grande do Sul, portanto, está inserido nas Regiões</p><p>Hidrográficas do Uruguai e do Atlântico Sul. Por outro lado, o próprio Estado foi</p><p>dividido em três regiões hidrográficas menores, que são: a Região Hidrográfica do</p><p>Uruguai, a Região Hidrográfica do Guaíba e a Região Hidrográfica do Litoral (Figura</p><p>3.8).</p><p>Vale ressaltar aqui que o conceito de região hidrográfica difere um pouco de</p><p>bacia hidrográfica. As regiões hidrográficas foram traçadas com base nas bacias</p><p>hidrográficas mas respeitando alguns limites geopolíticos. Por exemplo, tem-se a</p><p>Região Hidrográfica Amazônica. Parte da bacia contribuinte ao rio Amazonas está além</p><p>R.H. Amazônica</p><p>R.H. Atlântico</p><p>Nordeste Ocidental</p><p>R.H. Atlântico</p><p>Nordeste Oriental</p><p>R.H. do Parnaíba</p><p>R.H. do</p><p>Tocantins</p><p>R.H. do São</p><p>Francisco</p><p>R.H. Atlântico Leste</p><p>R.H. Atlântico Sudeste</p><p>R.H. Atlântico Sul</p><p>R.H. do Uruguai</p><p>R.H. do</p><p>Paraná</p><p>R.H. do Paraguai</p><p>22</p><p>da fronteira do Brasil, de modo que o traçado da região correspondente seguiu a</p><p>delimitação do país na parte norte.</p><p>No caso do Rio Grande do Sul, a Região Hidrográfica do Uruguai constitui o</p><p>conjunto de áreas que drenam para o Rio Uruguai, embora haja uma parcela de área</p><p>contribuinte a esse corpo d’água situada na Argentina e no Uruguai. A Região</p><p>Hidrográfica do Guaíba contempla todas as áreas cuja contribuição segue para o Lago</p><p>Guaíba. Já a Região Hidrográfica do Litoral é composta pelas áreas que drenam</p><p>diretamente para o oceano ou para o sistema de lagoas Mirim, Mangueira e Lagoa dos</p><p>Patos.</p><p>Figura 3.8 – Divisão hidrográfica do Estado do Rio Grande do Sul.</p><p>23</p><p>Fisiografia da bacia hidrográfica</p><p>A caracterização física da bacia hidrográfica, em termos de relevo, rede de</p><p>drenagem, forma e área de drenagem, constitui o que se denomina de fisiografia. Para</p><p>essa caracterização são utilizados mapas, fotografias aéreas, imagens de satélite</p><p>(sensoriamento remoto) e levantamentos topográficos. Até um tempo atrás utiliza-se</p><p>instrumentos como o curvímetro e o planímetro, que permitiam calcular comprimentos e</p><p>áreas sobre mapas impressos. Entretanto, hoje em dia são empregados programas</p><p>computacionais específicos, facilitando e agilizando enormemente essa tarefa.</p><p>A seguir serão apresentadas algumas características fisiográficas mais utilizadas.</p><p>Área da bacia</p><p>A área da bacia (A) corresponde a sua área de drenagem, cujo valor corresponde</p><p>à área plana entre os divisores topográficos projetada verticalmente. O conhecimento da</p><p>área da bacia permite estimar qual o volume precipitado de água, para uma certa lâmina</p><p>de precipitação3, pela expressão:</p><p>volume precipitado = lâmina precipitada x área da bacia</p><p>Como exemplo, a bacia do rio Caí tem uma área estimada em 4.983 km2,</p><p>enquanto a área da bacia dos rios Taquari-Antas é de cerca de 26.536 km2.</p><p>Forma da bacia</p><p>A forma da bacia, obviamente, é função da delimitação da área da bacia e tem</p><p>influência no tempo transcorrido entre a ocorrência da precipitação e o escoamento no</p><p>exutório. Em bacias de formato mais arredondado esse tempo tende a ser menor do que</p><p>em bacias mais compridas, como ilustra a Figura 3.9 para três bacias hipotéticas.</p><p>Dois coeficientes são comumente empregados como indicativos da forma da</p><p>bacia: fator de forma e coeficiente de compacidade.</p><p>- Fator de forma: esse coeficiente é definido pela relação entre a largura média da</p><p>bacia e o comprimento axial do curso d’água principal ( )CL . A largura média L</p><p>é calculada pela expressão:</p><p>3 O conceito de lâmina de precipitação é definido no Capítulo 4 – Precipitação.</p><p>24</p><p>cL</p><p>A</p><p>L = ,</p><p>e, portanto, o fator de forma fK é determinado por:</p><p>2</p><p>cc</p><p>f L</p><p>A</p><p>L</p><p>L</p><p>K ==</p><p>Esse coeficiente dá uma idéia da tendência da bacia a cheias e, a princípio,</p><p>comparando-se duas bacias, aquela de maior fator de forma estaria mais</p><p>propensa a cheias do que a outra.</p><p>- Coeficiente de compacidade: esse coeficiente é definido como a relação entre o</p><p>perímetro da bacia e a circunferência de um círculo de mesma área da bacia.</p><p>Assim, considerando uma bacia de área A e um círculo também de área A, tem-</p><p>se que:</p><p>r</p><p>P</p><p>P</p><p>P</p><p>K</p><p>cículo</p><p>bacia</p><p>c</p><p>π2</p><p>== e 2rA π=</p><p>Logo:</p><p>A</p><p>P</p><p>Kc 28,0=</p><p>Pela sua definição, se 1=cK a forma da bacia é um círculo, sendo mais</p><p>“irregular” quanto maior o valor desse coeficiente, o que implica em uma menor</p><p>tendência a cheias.</p><p>Figura 3.9 – Bacias hipotéticas de mesma área, onde o tempo entre a precipitação e a</p><p>vazão no exutório tende a ser na seguinte ordem: t2<t1<t3, devido à forma da bacia.</p><p>25</p><p>Rede de drenagem</p><p>A rede de drenagem é constituída pelo rio principal e seus afluentes. O rio</p><p>principal é identificado a partir do exutório da bacia, “subindo o rio”, ou seja,</p><p>percorrendo o sentido inverso do fluxo da água, até percorrer a maior distância (em</p><p>outras palavras, o rio principal é aquele maior curso d’água do exutório até a cabeceira</p><p>da bacia). Quatro indicadores são utilizados, geralmente, para descrever a rede de</p><p>drenagem de uma bacia: ordem dos cursos d’água, densidade de drenagem, extensão</p><p>média do escoamento superficial</p><p>e sinuosidade do curso d’água principal, os quais serão</p><p>descritos a seguir.</p><p>- Ordem dos cursos d’água: esse parâmetro dá uma idéia do grau de ramificação</p><p>da rede de drenagem, sendo a regra mais usual de classificar cada curso d’água a</p><p>que considera que todos os cursos d’água que não recebem afluência de outros</p><p>são de ordem 1; dois de ordem n formam um curso d’água de ordem n+1; dois</p><p>de ordens diferentes formam um de ordem igual àquele formador de maior</p><p>ordem. A bacia hipotética da Figura 3.10 exemplifica esse processo.</p><p>Figura 3.10 – Classificação dos cursos d’água de uma bacia quanto à ordem.</p><p>- Densidade de drenagem: esse índice é definido pela relação entre o comprimento</p><p>total dos cursos d’água da bacia )(� cl e sua área:</p><p>A</p><p>l</p><p>D c</p><p>d</p><p>�</p><p>=</p><p>Os valores mais usuais da densidade de drenagem são: 2/5,35,0 kmkm Dd ≤≤ .</p><p>- Extensão média do escoamento superficial: representa a distância média que</p><p>água teria que percorrer, em linha reta, do ponto onde atingiu o solo até a rede de</p><p>drenagem. Para sua determinação, considera-se um retângulo de área igual à da</p><p>26</p><p>�= Clx �= Clx</p><p>mlmlml2</p><p>ml4</p><p>ml2 ml2</p><p>ml4 ml4</p><p>bacia e com o maior lado igual à soma do comprimento total dos cursos d’água,</p><p>como exemplifica a Figura 3.11.</p><p>Figura 3.11 – Retângulo auxiliar de área igual à da bacia, para determinação da extensão</p><p>média do escoamento superficial.</p><p>Interpretando o retângulo anterior como sendo a bacia, é fácil perceber que a</p><p>distância média que a água precipitada percorre até alcançar a rede de drenagem</p><p>é um quarto do seu lado menor. No caso do retângulo, a rede de drenagem se</p><p>limita ao curso d’água central, cujo comprimento é equivalente ao comprimento</p><p>total dos cursos d’água da bacia original.</p><p>Como o retângulo da Figura 3.11 tem área igual à da bacia, tem-se que:</p><p>�</p><p>=�⋅=</p><p>c</p><p>mm l</p><p>A</p><p>l lxA</p><p>4</p><p>4</p><p>- Sinuosidade do curso d’água principal: representa a relação entre o comprimento</p><p>do rio principal )( cL e a distância entre a nascente (cabeceira) e a foz )( cd ,</p><p>medida em linha reta. Esse termo dá uma idéia da “quantidade” de curvatura do</p><p>rio, sendo determinado pela expressão:</p><p>c</p><p>c</p><p>c d</p><p>L</p><p>S =</p><p>A Figura 3.12 ilustra a definição das variáveis cL e cd , enquanto a Figura 3.13</p><p>mostra um rio nos EUA que apresenta grande sinuosidade, evidenciada pela quantidade</p><p>de meandros.</p><p>27</p><p>CLCL</p><p>CdCd</p><p>Figura 3.12 – Representação do comprimento do rio principal )( cL e a distância entre</p><p>sua foz e nascente )( cd .</p><p>Figura 3.13 – Foto de um rio nos EUA dando idéia da sinuosidade de um curso d’água</p><p>natural.</p><p>Relevo da bacia</p><p>As características do relevo da bacia têm influência direta sobre o escoamento</p><p>superficial, principalmente na velocidade do escoamento e na maior ou menor tendência</p><p>ao armazenamento da água na superfície ou depressões do solo. Entretanto, o relevo</p><p>também influencia a evaporação, a precipitação e a temperatura, por serem função da</p><p>altitude, dentre outras variáveis.</p><p>28</p><p>- Declividade da bacia: bacia com maior declividade tende a ter maior velocidade</p><p>do escoamento e ser mais susceptível à erosão do solo, caso este esteja</p><p>descoberto; a declividade da bacia é geralmente estimada pelo método das</p><p>quadrículas, analisando as curvas de nível do terreno. O referido método foge ao</p><p>escopo desta disciplina e não é descrito neste texto.</p><p>- Declividade do curso d’água principal: para dois pontos quaisquer do curso</p><p>d’água, a declividade é determinada pela relação entre a diferença total de</p><p>elevação do leito (cotas) e a distância horizontal entre eles:</p><p>..</p><p>1</p><p>horizdist</p><p>Cota</p><p>DC</p><p>∆</p><p>=</p><p>- Curva hipsométrica: representação gráfica do relevo médio da bacia, indicando</p><p>para cada cota do terreno a porcentagem da área da bacia situada acima ou</p><p>abaixo dessa cota. A Figura 3.14 mostra um exemplo típico de uma curva</p><p>hipsométrica, na qual 38% da área da bacia está situada acima da cota 50 m.</p><p>Figura 3.14 – Exemplo de uma curva hipsométrica, segundo a qual, por exemplo, 38%</p><p>da área da bacia está em cotas superiores à 50 m.</p><p>29</p><p>������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��""""����</p><p>��#�����������#�����������#�����������#�������������</p><p>Aspectos gerais</p><p>A precipitação é entendida como qualquer forma de água proveniente da</p><p>atmosfera que atinge a superfície terrestre, como, por exemplo, neve, granizo, chuva,</p><p>orvalho, geada, etc. O que diferencia as várias formas de precipitação é o estado em que</p><p>a água se encontra.</p><p>Devido a sua capacidade de gerar escoamento, a chuva constitui a forma de</p><p>precipitação de maior interesse para a hidrologia. Como visto nos Capítulos 2 e 3</p><p>anteriores, parcela da chuva que atinge o solo gera escoamento nas vertentes da bacia</p><p>hidrográfica, alcançando a rede de drenagem e daí seguindo até o exutório da bacia.</p><p>Como a precipitação constitui a “entrada” de água na bacia hidrográfica,</p><p>tomando-a como um sistema físico, a estimativa da precipitação em uma bacia dá idéia</p><p>da disponibilidade hídrica nela, servindo para avaliar a necessidade de irrigação, a</p><p>previsão de enchentes nos rios, a operação de hidroelétricas, o atendimento às demandas</p><p>para abastecimento público, etc.</p><p>Mecanismo de formação da precipitação</p><p>A precipitação ocorre a partir da presença de vapor d’água na atmosfera, que sob</p><p>determinadas condições precipita na forma de neve, gelo, chuva, etc.</p><p>Para a ocorrência de chuva, deve-se haver condições propícias para o</p><p>crescimento das gotas de água, até que elas possuam peso superior às forças que as</p><p>mantêm em suspensão na atmosfera. Esse crescimento se dá principalmente devido à</p><p>presença dos chamados núcleos de condensação nas nuvens, que são partículas</p><p>orgânicas, sais, cristais de gelo, produtos resultantes da combustão, entre outros. As</p><p>gotas de chuva tendem a condensar sobre tais partículas e, mediante alguns processos</p><p>30</p><p>físicos, ocorre o crescimento das gotas, em parte devido ao choque das primeiras com</p><p>outras gotas menores. Ao atingir peso suficiente, as gotas precipitam.</p><p>Classificação da precipitação</p><p>A ocorrência de precipitação está geralmente relacionada à ascensão de ar</p><p>úmido, após o qual se dá o processo de condensação sobre os núcleos e de crescimento</p><p>das gotas, descritos no item anterior. Mas há diferentes mecanismos agindo no sentido</p><p>de causar a referida ascensão do ar úmido e, conforme o tipo de mecanismo, as</p><p>precipitações são classificadas em:</p><p>- Convectivas: a ascensão do ar úmido e quente decorrente de uma elevação</p><p>excessiva de temperatura; como o ar quente é menos denso, ocorre uma brusca</p><p>ascensão desse ar que, ao subir, sofre um resfriamento rápido, gerando</p><p>precipitações intensas com pequena duração, cobrindo pequenas áreas; ocorrem</p><p>com freqüência em regiões equatoriais;</p><p>- Orográficas: a ascensão do ar quente e úmido, proveniente do oceano, ocorre</p><p>devido a obstáculos orográficos, como montanhas e serras; ao subir, ocorre o</p><p>resfriamento e em seguida a precipitação; são caracterizadas por serem de</p><p>pequena intensidade, mas longa duração, cobrindo pequenas áreas; como as</p><p>montanhas constituem um obstáculo à passagem do ar úmido (com “potencial”</p><p>para formar precipitação), normalmente existem áreas no lado oposto</p><p>caracterizadas por baixos índices de precipitação, sendo chamadas de “sombras</p><p>pluviométricas”;</p><p>- Frontais: neste tipo de precipitação, a ascensão do ar decorre do “encontro” entre</p><p>massas de ar frias e quentes; como resultado, o ar mais quente e úmido sofre</p><p>ascensão, resfria-se e ocorre a precipitação, caracterizada por longa duração e</p><p>intensidade média, cobrindo grandes áreas.</p><p>31</p><p>Caracterização da precipitação</p><p>Uma precipitação, no caso chuva, é caracterizada pelas seguintes grandezas:</p><p>- altura pluviométrica (P): representa a espessura</p><p>média da lâmina de água</p><p>precipitada, sendo geralmente adotada como unidade o milímetro (mm);</p><p>significa a espessura da lâmina de água que recobriria toda a região, supondo-se</p><p>que não houvesse infiltração, evaporação nem escoamento para fora da região;</p><p>- duração (t): representa o período de tempo durante o qual ocorreu a precipitação;</p><p>geralmente se utilizam horas (h) ou minutos (min) como unidade;</p><p>- intensidade (i): fazendo-se a relação da lâmina de água precipitada com o</p><p>intervalo de tempo transcorrido, obtém-se a intensidade dessa precipitação,</p><p>geralmente em mm/h ou mm/min; assim i = P/t;</p><p>- tempo de recorrência (Tr): representa o número médio de anos durante o qual se</p><p>espera que uma determinada precipitação seja igualada ou superada; por</p><p>exemplo, ao se dizer que o tempo de recorrência de uma precipitação é de 10</p><p>anos, tem-se que, em média, deve-se esperar 10 anos para que tal precipitação</p><p>seja igualada ou superada.</p><p>Medição da precipitação</p><p>Os instrumentos usuais de medição da precipitação são o pluviômetro e o</p><p>pluviógrafo, descritos sucintamente a seguir.</p><p>O pluviômetro é constituído por um recipiente metálico dotado de funil com anel</p><p>receptor (Figura 4.1), geralmente com uma proveta graduada para leitura direta da</p><p>lâmina de água precipitada. Esse instrumento armazena a água da chuva e, fazendo-se a</p><p>leitura da proveta, tem-se a lâmina precipitada (P). Normalmente, a leitura é feita</p><p>diariamente, às 7h da manhã, por uma pessoa encarregada (operador) – geralmente, um</p><p>morador da região, cujo acesso diário ao equipamento seja fácil, e que recebe orientação</p><p>do órgão/empresa responsável pelo monitoramento.</p><p>32</p><p>Assim, o pluviômetro indica a precipitação ocorrida nas últimas 24 horas, desde</p><p>a última leitura, a qual é anotada pelo operador em uma caderneta diariamente.</p><p>Figura 4.1 – Foto de um pluviômetro. (Fonte: Studart, 2003).</p><p>O outro instrumento utilizado para registrar a precipitação, o pluviógrafo, difere</p><p>do pluviômetro basicamente por possuir um mecanismo de registro automático da</p><p>precipitação, gerando informações mais discretizadas no tempo, isto é, informações em</p><p>intervalos de tempo menores. Os equipamentos mais antigos utilizam um braço</p><p>mecânico para traçado de um gráfico em papel graduado com os valores precipitados</p><p>(Figura 4.2). Os pluviógrafos mais modernos armazenam tais informações em meio</p><p>magnético (Figura 4.3) ou enviam em tempo real por sistema de transmissão remoto de</p><p>dados.</p><p>Para acionamento do mecanismo de registro, seja em papel ou em meio</p><p>magnético, há dois tipos principais de sensores: cubas basculantes, cujo enchimento e</p><p>vertimento aciona o registro; reservatório equipado com sifão, sendo a variação do nível</p><p>no reservatório a responsável pelo acionamento do registro.</p><p>Dessa forma, o pluviógrafo permite ter informações mais detalhadas ao longo do</p><p>tempo, além de uma maior precisão também. Outra grande vantagem é não necessitar da</p><p>visita diária do operador, cuja visita fica restrita à troca de papel ou para descarregar os</p><p>dados em um computador portátil, em períodos como 15 dias ou um mês. Em tais casos,</p><p>33</p><p>o operador já passa a ser alguém com conhecimento mais especializado, geralmente um</p><p>técnico.</p><p>Figura 4.2 – Foto de pluviógrafo com mecanismo de registro em papel graduado.</p><p>(Fonte: Studart, 2003).</p><p>Figura 4.3 – Foto de pluviógrafo com mecanismo de registro em meio magnético.</p><p>(Fonte: Hobeco, 2003).</p><p>34</p><p>Análise de dados de precipitação</p><p>Um posto de medição de chuva (posto pluviométrico) é instalado e mantido com</p><p>o objetivo de obter uma série ininterrupta de dados de precipitação ao longo dos anos.</p><p>Entretanto, é comum a ocorrência de problemas mecânicos ou com o operador, de modo</p><p>que normalmente existem períodos sem registros das precipitações ou com falhas nas</p><p>observações.</p><p>Como falhas são designados dados cujos valores são incoerentes ou denotam</p><p>erros grosseiros, os quais são detectados por análise visual no primeiro contato com a</p><p>série histórica de dados ou mesmo só no momento do processamento das informações,</p><p>durante os estudos hidrológicos.</p><p>São comuns as falhas cuja origem é o preenchimento errado da caderneta pelo</p><p>operador, constando valores absurdos de tão elevados ou com casas decimais acima da</p><p>precisão do instrumento. Por exemplo, em dados diários, uma precipitação de 1000 mm</p><p>com certeza representa uma falha de leitura, pois esse valor equivale ao precipitado</p><p>anual em algumas regiões. Outro exemplo é um valor de 1,25 mm, sabendo que o</p><p>pluviômetro usado tem graduação de 0,1 mm.</p><p>Também pode ocorrer que o operador não pôde comparecer ao local e “estime”</p><p>um valor para leitura, que, às vezes, é perceptível – o operador repete o último valor</p><p>anotado ou coloca zero, por exemplo.</p><p>Entretanto, as falhas também podem ter origem em problemas mecânicos no</p><p>sensor ou no registrador do instrumento, causado por intempéries ou até por animais ou</p><p>vandalismo.</p><p>Enfim, é normal que as séries históricas de precipitação contenham falhas, as</p><p>quais devem ser identificadas e excluídas, tornando as séries com “espaços” sem</p><p>informação. Isso por que os estudos hidrológicos requerem séries contínuas de</p><p>precipitação. Vale lembrar que, por exemplo, um dia com falha já incapacita o uso do</p><p>valor da precipitação mensal naquele mês, dada pela soma das precipitações diárias.</p><p>Preenchimento de falhas</p><p>Para realizar o preenchimento de falhas em séries de dados de precipitação,</p><p>tornando-as contínuas, são usualmente empregados os métodos da ponderação regional,</p><p>regressão linear e uma combinação dos dois anteriores. A seguir tais métodos serão</p><p>35</p><p>brevemente apresentados, sendo a descrição detalhada encontrada na bibliografia</p><p>indicada ao final deste documento.</p><p>- Método da ponderação regional</p><p>Este método consiste em estimar a precipitação ocorrida no posto com falha</p><p>considerando-a proporcional às precipitações em postos vizinhos, sendo o fator de</p><p>proporcionalidade função da precipitação média em tais postos, levando em</p><p>consideração ainda a precipitação média no próprio posto com falha.</p><p>Tal método é utilizado selecionando ao menos três postos vizinhos àquele com</p><p>falha, os quais devem estar localizados em região climatologicamente semelhante ao</p><p>posto com falha.</p><p>Por exemplo, considerando que em uma série de dados de um posto X tenham</p><p>sido encontradas falhas, e considerando que existem os postos Y, Z e W situados em</p><p>regiões de clima semelhante e com dados disponíveis, as falhas citadas podem ser</p><p>preenchidas pela seguinte equação, conforme o método da ponderação regional:</p><p>Xm</p><p>Wm</p><p>W</p><p>Ym</p><p>Y</p><p>Zm</p><p>Z</p><p>X P</p><p>P</p><p>P</p><p>P</p><p>P</p><p>P</p><p>P</p><p>P ⋅��</p><p>�</p><p>�</p><p>��</p><p>�</p><p>�</p><p>++=</p><p>3</p><p>1</p><p>,</p><p>onde PXm, PYm, PZm e PWm são as precipitações médias nos postos X, Y, Z e W,</p><p>respectivamente; PX, é a precipitação no posto X a determinar; PY, PZ e PW são as</p><p>precipitações nos postos Y, Z e W, respectivamente, no intervalo de tempo referente</p><p>àquele da precipitação no posto X a determinar.</p><p>Esse método é normalmente usado para séries mensais ou anuais, não sendo</p><p>recomendado para séries diárias, devido à grande variabilidade temporal e espacial da</p><p>precipitação.</p><p>- Método da regressão linear</p><p>Outro método de preenchimento de falhas de dados de precipitação consiste em</p><p>utilizar a técnica da regressão linear simples ou múltipla, segundo a qual a precipitação</p><p>no posto com falhas é correlacionada estatisticamente com a precipitação em um posto</p><p>vizinho com dados disponíveis, no caso da regressão simples, ou vários postos vizinhos,</p><p>no caso da regressão múltipla.</p><p>Basicamente, o referido método consiste em ajustar uma equação do tipo (para</p><p>regressão linear múltipla):</p><p>36</p><p>dPcPbPaP WZYX +⋅+⋅+⋅= ,</p><p>onde Px é a precipitação a ser determinada no posto X com falha; Py, Pz e Pw são as</p><p>precipitações nos postos vizinhos Y, Z e</p><p>W, respectivamente; a, b, c, d são coeficientes</p><p>a ajustar com base nas séries de dados disponíveis dos quatro postos.</p><p>O método mais comum de determinar os coeficientes a, b, c, d é o método dos</p><p>mínimos quadrados, que procura ajustar tais valores de modo a minimizar o somatório</p><p>do quadrado das distâncias de cada valor em relação à média e cuja descrição foge ao</p><p>escopo deste texto, mas é facilmente encontrada em qualquer livro de Estatística, como</p><p>por exemplo Spiegel (1972).</p><p>- Método da ponderação regional com base em regressões lineares</p><p>Sendo uma combinação dos dois métodos anteriores, este consiste em</p><p>estabelecer regressões lineares entre o posto com falhas e cada um dos postos vizinhos</p><p>selecionados. Para cada regressão linear, obtém-se um coeficiente de correlação (que</p><p>estima o “grau de correlação” em cada regressão) e a partir desses coeficientes são</p><p>determinados os pesos de cada posto na equação de determinação da precipitação no</p><p>posto com falha.</p><p>Assim, a precipitação no posto com falha é determinada por uma ponderação das</p><p>precipitações nos postos vizinhos, sendo os pesos de cada posto estabelecidos em</p><p>função do grau de correlação dos seus dados com os do posto com falhas, obtidos</p><p>mediante regressão linear. Maiores informações sobre esse método podem ser</p><p>encontradas em Tucci (2000).</p><p>Análise de consistência</p><p>Dispondo das séries de precipitação sem falhas, preenchidas por algum dos</p><p>métodos descritos anteriormente, convém realizar uma análise de consistência, para</p><p>avaliar a homogeneidade das informações entre os postos pluviométricos. Embora à</p><p>primeira vista os dados possam estar com valores supostamente coerentes, é possível</p><p>haver inconsistência nas informações dos totais precipitados, oriundos de problemas</p><p>como troca de operador, troca de equipamento, mudança nas condições vizinhas ao</p><p>local onde o equipamento está instalado, etc.</p><p>37</p><p>Caso sejam identificadas inconsistências, devem ser revistas as falhas</p><p>preenchidas bem como tentar identificar outras falhas não apontadas inicialmente.</p><p>Para detectar tais inconsistências, geralmente são empregados os métodos da</p><p>Dupla Massa e do Vetor Regional. O primeiro método é descrito resumidamente a</p><p>seguir, enquanto o segundo pode ser encontrado em detalhes em Tucci (2000).</p><p>- Método da Dupla Massa</p><p>Este é um método simples, desenvolvido pelo U.S. Geological Survey (Tucci,</p><p>2000), o qual consiste em traçar em um gráfico os totais acumulados de precipitação do</p><p>posto a consistir (posto cuja consistência se quer analisar) versus os totais acumulados</p><p>de um posto base de comparação.</p><p>Se os pontos de tal gráfico se alinharem em uma reta aproximada, isso indica</p><p>uma proporcionalidade entre os dados dos dois postos em questão, como ilustra a Figura</p><p>4.4-a.</p><p>Figura 4.4 – Exemplos de resultados da análise de consistência do Posto Y tendo como</p><p>base o posto X (totais precipitados acumulados).</p><p>(a) (b)</p><p>(c) (d)</p><p>38</p><p>Entretanto, pode ocorrer que os pontos se alinhem em uma reta até certo instante</p><p>e em outra a partir daí, sendo duas retas de declividades diferentes (Figura 4.4-b). Isso</p><p>indica uma mudança de tendência no posto a consistir (no caso, posto Y), que pode ser</p><p>causada por erros sistemáticos (por exemplo, mudança do operador, que está fazendo a</p><p>leitura do instrumento erroneamente), por alterações climáticas, como a construção de</p><p>um lago artificial próximo ao local de medição, entre outras.</p><p>Também pode ocorrer dos pontos se alinharem em duas ou mais retas de mesma</p><p>declividade (paralelas) (Figura 4.4-c). A principal causa são erros de transcrição dos</p><p>dados, causados pelo operador ou durante o processamento das informações.</p><p>Quando o gráfico dos totais acumulados apresenta a forma da Figura 4.4-d, onde</p><p>os pontos estão distribuídos de forma dispersa, sem haver nenhuma tendência clara, isso</p><p>indica, geralmente, que os postos em questão apresentam regimes pluviométricos</p><p>distintos, não devendo ser usados conjuntamente nos estudos hidrológicos.</p><p>Análise de freqüência dos totais precipitados</p><p>Uma análise simples e rápida de se fazer sobre os totais precipitados é verificar</p><p>com qual freqüência eles ocorreram historicamente, com base nos dados observados</p><p>disponíveis. Para tanto, os dados são dispostos em ordem decrescente de valores, sendo</p><p>atribuído a cada um deles um número (m) correspondente a sua ordem – o primeiro</p><p>(maior valor) recebe o valor m = 1, o segundo m = 2, e assim sucessivamente até o</p><p>número de dados ou registros disponíveis, representado por n. O valor de m varia então</p><p>de 1 até n.</p><p>A freqüência (F) é determinada pelas equações abaixo, conforme se opte pelo</p><p>método da Califórnia ou de Kimball:</p><p>n</p><p>m</p><p>F =</p><p>1+</p><p>=</p><p>n</p><p>m</p><p>F</p><p>Convém ressaltar que o valor de F representa a freqüência com que o valor da</p><p>precipitação de ordem m foi igualada ou superada, tendo como fonte de informações a</p><p>série de dados disponíveis. Como já ressaltado, a precipitação é um fenômeno aleatório,</p><p>(método da Califórnia)</p><p>(método de Kimball)</p><p>39</p><p>de grande variabilidade temporal e espacial, e a estimativa da freqüência F apenas dá</p><p>uma idéia da probabilidade de ocorrência de cada valor da precipitação na área em</p><p>estudo, havendo técnicas estatísticas mais complexas para realizar previsões mais</p><p>confiáveis.</p><p>Precipitação média em uma bacia</p><p>Os postos pluviométricos registram a precipitação pontual, naquele local onde</p><p>estão instalados e, devido à variabilidade espacial e temporal da precipitação, as</p><p>medições em postos geograficamente próximos são distintas. Para os estudos</p><p>hidrológicos acerca de uma bacia hidrográfica, uma das informações mais</p><p>imprescindíveis é o regime pluviométrico da região. Uma forma, então, de incorporar as</p><p>medições pontuais dos postos e espacializar tais informações para a área da bacia é</p><p>determinando a precipitação média.</p><p>A precipitação média em uma bacia é entendida como sendo a lâmina de água de</p><p>altura uniforme sobre toda a sua área, associada a um período de tempo (um dia, um</p><p>mês, etc.). Obviamente, isso constitui uma simplificação, mas que permite inferir sobre</p><p>o regime pluviométrico da região e servir de comparação entre bacias.</p><p>Com base nos dados disponíveis de postos inseridos na área da bacia</p><p>hidrográfica ou em regiões próximas, costuma-se estimar a precipitação média em uma</p><p>bacia empregando o método aritmético, o método de Thiessen ou o método das isoietas,</p><p>os quais serão descritos a seguir.</p><p>Método artimético</p><p>Esse método é o mais simples e consiste apenas em obter a precipitação média a</p><p>partir da média aritmética das precipitações nos postos selecionados. Assim, supondo</p><p>que estejam disponíveis dados dos postos X, Y, Z e W, a precipitação média na bacia da</p><p>Figura 4.5 pode ser estimada como:</p><p>4</p><p>WZYX</p><p>m</p><p>PPPP</p><p>P</p><p>+++</p><p>= ,</p><p>onde PX, PY, PZ, PW, são as precipitações nos postos X, Y, Z e W, respectivamente, e Pm</p><p>é a precipitação média na bacia.</p><p>40</p><p>Figura 4.5 – Postos com dados disponíveis para estimativa da precipitação média da</p><p>bacia do exemplo.</p><p>Esse método não considera a localização geográfica dos postos, relativamente à</p><p>bacia. Para o exemplo dado, a precipitação registrada no posto W tem a mesma</p><p>“importância” daquela medida em Y, situada no interior da bacia, na estimativa da</p><p>precipitação média via o método aritmético.</p><p>Método de Thiessen</p><p>Esse método determina a precipitação média em uma bacia a partir das</p><p>precipitações observadas nos postos disponíveis, incorporando um peso a cada um</p><p>deles, em função de suas “áreas de influência”. Com base na disposição espacial dos</p><p>postos, são traçados os chamados polígonos de Thiessen, que definem a área de</p><p>influência de cada posto em relação à bacia em questão.</p><p>Dessa forma, a precipitação média é obtida pela ponderação dos valores</p><p>registrados em cada posto e de suas áreas de influência. Considerando</p><p>quatro postos</p><p>com informação disponível (postos X, Y, Z e W), a precipitação média estimada por</p><p>esse método é:</p><p>A</p><p>PAPAPAPA</p><p>P WWZZYYXX</p><p>m</p><p>⋅+⋅+⋅+⋅</p><p>= ,</p><p>onde: PX, PY, PZ, PW são as precipitações nos postos X, Y, Z e W, respectivamente; AX,</p><p>AY, AZ, AW são as áreas de influência dos postos X, Y, Z e W; Pm é a precipitação média</p><p>na bacia; A é a área da bacia que, no caso, corresponde à soma das áreas AX, AY, AZ, AW.</p><p>41</p><p>Para o traçado dos polígonos de Thiessen, inicialmente os postos são unidos por</p><p>linhas retas formando um polígono fechado (Figura 4.6-b); em seguida, são traçadas</p><p>retas perpendiculares aos segmentos que unem os postos, dividindo-os em duas partes</p><p>iguais (Figura 4.6-c); essas retas perpendiculares são prolongadas até o cruzamento com</p><p>as demais, definindo os polígonos de Thiessen e, portanto, as áreas de influência de</p><p>cada posto na bacia (Figura 4.7).</p><p>Figura 4.6 – Exemplo do traçado dos polígonos de Thiessen, para estimativa da</p><p>precipitação média na bacia, com base nos dados dos postos X, Y, Z e W.</p><p>Figura 4.7 – Definição dos polígonos de Thiessen e das áreas de influência dos postos</p><p>X, Y, Z e W para estimativa da precipitação média na bacia do exemplo.</p><p>Esse método incorpora, portanto, a questão da disposição espacial dos postos,</p><p>relativamente à bacia, diferindo a “importância” de cada posto através da hipótese que</p><p>(a) (b) (c)</p><p>(a) (b)</p><p>42</p><p>cada um teria sua área de influência na bacia. Como essas áreas não variam, visto que os</p><p>postos têm localização fixa, o cálculo pode ser automatizado, agilizando o processo.</p><p>Entretanto, uma crítica a esse método é que ele não leva em conta as</p><p>características do relevo, apresentando bons resultados parar terrenos levemente</p><p>ondulados e também quando há uma boa densidade de postos de medição da</p><p>precipitação.</p><p>Método das isoietas</p><p>O método das isoietas, como o próprio nome sugere, utiliza as isoietas para</p><p>determinação da precipitação média em uma bacia. As isoietas são linhas de igual</p><p>precipitação, traçadas para um evento específico ou para uma determinada duração. Por</p><p>exemplo, pode-se ter um mapa com as isoietas referentes ao evento chuvoso ocorrido</p><p>em tal data, ou as isoietas de precipitação mensal na bacia. Enquanto a primeira seria</p><p>obtida a partir dos dados do evento especificado, a segunda seria com base nas séries de</p><p>dados mensais disponíveis.</p><p>As isoietas são determinadas por interpolação a partir dos dados disponíveis nos</p><p>postos da área em estudo, podendo depois ser ajustadas conforme o relevo. Na Figura</p><p>4.8 é apresentado um exemplo fictício das isoietas em uma bacia hidrográfica,</p><p>correspondendo a valores mensais.</p><p>Figura 4.8 – Exemplo de isoietas mensais, com valores em mm.</p><p>43</p><p>A precipitação média na bacia pode ser obtida, portanto, a partir das isoietas</p><p>traçadas, fazendo uma média ponderada em função das áreas entre duas isoietas</p><p>consecutivas e o valor médio entre elas, como mostra a expressão a seguir:</p><p>A</p><p>PP</p><p>A</p><p>P</p><p>ii</p><p>ii</p><p>m</p><p>� ��</p><p>�</p><p>�</p><p>��</p><p>�</p><p>�</p><p>�</p><p>�</p><p>�</p><p>�</p><p>�</p><p>� +</p><p>⋅</p><p>=</p><p>+</p><p>+ 2</p><p>1</p><p>1,</p><p>,</p><p>onde Ai,i+1 é a área entre a isoieta i e a consecutiva i+1; Pi e Pi+1 são as precipitações</p><p>referentes às isoietas i e i+1; Pm é a precipitação média na bacia; e A é a área da bacia</p><p>que, no caso, é equivalente ao somatório das áreas entre as isoietas.</p><p>O emprego das isoietas para determinação da precipitação média em uma bacia</p><p>tem a vantagem de que leva em consideração a disposição espacial dos postos na bacia,</p><p>quando realiza a interpolação para traçado das isoietas, e também o relevo da bacia, ao</p><p>permitir ajustar o traçado por ele.</p><p>Precipitações máximas</p><p>A precipitação máxima é entendida como aquela ocorrência extrema, com</p><p>duração, distribuição espacial e temporal críticas para uma área ou bacia hidrográfica.</p><p>Em diversos estudos hidrológicos, o maior interesse é justamente conhecer ou estimar</p><p>qual a precipitação máxima, ou seja, qual o total de precipitação, sua duração e</p><p>distribuição espacial e temporal que sejam críticas para a área em estudo. Geralmente,</p><p>para os estudos de drenagem urbana e de previsão de enchentes torna-se imprescindível</p><p>a caracterização das precipitações máximas. Além disso, os dados de vazão estão menos</p><p>disponíveis do que de precipitação e, com base nestes, pode-se determinar a</p><p>precipitação máxima e então estimar a vazão de enchente na bacia.</p><p>É importante perceber que uma precipitação máxima deve ser caracterizada</p><p>pelas grandezas intensidade, duração e freqüência ou tempo de retorno. Dizer que a</p><p>precipitação máxima em uma certa bacia é 120 mm não permite saber nada, sem</p><p>informar a duração, pois esse total precipitado pode ocorrer em um dia ou em um mês,</p><p>representando situações completamente distintas. E ao associar a intensidade e duração</p><p>da precipitação com seu tempo de retorno, é possível ter uma idéia da freqüência de</p><p>ocorrência da precipitação máxima especificada e, portanto, o quanto determinado</p><p>projeto está “vulnerável” ou “seguro” ao considerar tal precipitação máxima.</p><p>44</p><p>Assim, para caracterizar a precipitação máxima em uma área, são normalmente</p><p>empregadas as chamadas curvas i-d-f ou curvas intensidade-duração-freqüência. Tais</p><p>curvas são obtidas a partir de dados de pluviógrafos, como apresentado por Tucci</p><p>(2000).</p><p>Para um determinado tempo de retorno (Tr), a curva i-d-f estabelece as máximas</p><p>intensidades da precipitação (i) para cada duração (t), tendo geralmente a seguinte</p><p>forma:</p><p>4</p><p>2</p><p>)( 3</p><p>1</p><p>c</p><p>c</p><p>r</p><p>ct</p><p>Tc</p><p>i</p><p>+</p><p>⋅</p><p>= ,</p><p>onde c1, c2, c3, c4, são coeficientes ajustados para cada região; i é a intensidade da</p><p>precipitação em mm/h; t é a duração em minutos e Tr é o tempo de retorno em anos.</p><p>Por exemplo, as curvas i-d-f para a cidade de Curitiba (PR) e para a região do</p><p>Parque da Redenção, em Porto Alegre (RS), são:</p><p>15,1</p><p>217,0</p><p>)26(</p><p>5950</p><p>+</p><p>⋅</p><p>=</p><p>t</p><p>T</p><p>i r (curva i-d-f de Curitiba – PR)</p><p>88,0</p><p>052,0</p><p>)12(</p><p>1265</p><p>+</p><p>⋅</p><p>=</p><p>t</p><p>T</p><p>i r (curva i-d-f da Redenção, Porto Alegre –RS)</p><p>Assim, para um tempo de retorno de 10 anos, a precipitação máxima com</p><p>duração de 2 horas, para a área próxima ao Parque da Redenção, em Porto Alegre, tem</p><p>intensidade de 19 mm/h. Já para Curitiba, essa precipitação tem intensidade de 32</p><p>mm/h.</p><p>Outra forma de apresentar a curva i-d-f é graficamente, como exemplifica a</p><p>Figura 4.9, referente à cidade de Caxias do Sul, na qual são traçadas as curvas para os</p><p>tempos de retorno de 2, 5 e 10 anos. Por exemplo, para um Tr = 10 anos e uma duração</p><p>de 2 h, a intensidade da precipitação máxima em Caxias do Sul é em torno de 30 mm/h.</p><p>45</p><p>Figura 4.9 – Curva i-d-f de Caxias do Sul, para os tempos de retorno de 2, 5 e 10 anos</p><p>(nas ordenadas, tem-se a intensidade da precipitação, em mm/h; nas abscissas, a duração</p><p>da precipitação, em horas) (Fonte: IPH, 2001).</p><p>46</p><p>������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��������</p><p>��$$$$����</p><p>%&����#����'��#�!����</p><p>%&����#����'��#�!����</p><p>%&����#����'��#�!����</p><p>%&����#����'��#�!����</p><p>����</p><p>Introdução</p><p>Conforme visto no Capítulo 2, uma das etapas do ciclo hidrológico compreende</p><p>o escoamento superficial, cuja principal origem é a precipitação. Notadamente, dentre as</p><p>várias formas de precipitação (granizo, neve, chuva, etc), ao se estudar o escoamento</p><p>superficial o maior interesse e praticamente o único se resume à chuva, pela própria</p><p>capacidade de gerar escoamento superficial.</p><p>Relembrando o ciclo hidrológico, a precipitação que atinge o solo vai sendo</p><p>armazenada nas depressões do solo e infiltrando até saturá-lo, quando então o</p><p>escoamento superficial fica mais intenso. Esse é o chamado escoamento superficial</p><p>“livre”, que ocorre sobre as diversas superfícies que compõem a bacia hidrográfica. Tal</p><p>escoamento passa, então, a constituir a microrrede de drenagem, formando pequenos</p><p>canaletes de água que procuram seguir caminhos preferenciais</p>das variáveis. Simplificadamente, pode-se afirmar que enquanto o modelo determinístico “produz” a mesma saída para uma mesma entrada, no modelo estocástico a relação entre entrada e saída é estatística (há chances de ocorrência para cada determinado valor). * Conceitual x empírico Um modelo é referido como conceitual quando as funções utilizadas levam em consideração os processos físicos, enquanto no modelo empírico as funções empregadas foram desenvolvidas para ajustar os valores medidos e observações em campo/laboratório, sem retratar o processo físico em si. Dentro do contexto de gerenciamento dos recursos hídricos, pode-se dividir os modelos em três categorias principais: - modelos de comportamento, que são utilizados para descrever o comportamento dos sistemas e, desse modo, prognosticar a resposta do sistema a diferentes 136 situações; exemplos: modelo de circulação da água e transporte de contaminantes em um rio; modelo chuva-vazão; etc. - modelos de otimização, que procuram obter a “melhor” solução para uma determinada situação, atendendo a objetivos pré-definidos; exemplo: modelo de operação de reservatório; - modelos de planejamento, que simulam condições globais de um sistema maior (acoplam modelos de comportamento e de otimização); A seguir são enumerados alguns exemplos de modelos hidrológicos: - modelos que simulam o escoamento da água em rios, lagos, banhados, etc, como os modelos hidrodinâmicos uni, bi ou tridimensionais; - modelos de transformação chuva-vazão; - modelos de escoamento das águas subterrâneas; - modelos de operação de reservatórios; - modelo de balanço hídrico no solo; - modelo de previsão de cheias; - modelo de transporte de constituintes e de reações cinéticas (modelagem de qualidade de água), os quais podem estar acoplados a modelos de circulação da água, a modelos chuva-vazão, modelos de águas subterrâneas, etc. 137 Referências Bibliográficas ANA, 2004. Agência Nacional de Águas. Página eletrônica (www.ana.gov.br), acessada em novembro/2004. EPA, 1998. Stream Corridor Restoration – principles, processes and practices. Environmental Protection Agency, EUA. Esteves, F., 1988. Fundamentos de Limnologia. Ed. Interciência/FINEP, Rio de Janeiro. Hobeco, 2003. Catálogo eletrônico de instrumentos e telemetria de Hidrometeorogia. Hobeco Sudamericana Ltda, Rio de Janeiro. IPH, 2001. Plano Diretor de Drenagem Urbana de Caxias do Sul, Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH/UFRGS), SAMAE. MMA, 1999. III Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas, Ministério do Meio Ambiente (MMA), Secretaria de Recursos Hídricos (SRH). PAN-Brasil, 2004. Programa de Ação Nacional de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca, Ministério do Meio Ambiente, Secretaria de Recursos Hídricos. Pinto, N.; Holtz, A.; Martins, J.; Gomide, F., 1976. Hidrologia Básica. Ed. Edgard Blücher Ltda, MEC. Rosman, P., 1989. 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