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<p>UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ</p><p>INSTITUTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS</p><p>FACULDADE DE DIREITO</p><p>DISCIPLINA: Teoria do Direito</p><p>DOCENTE: Prof. Dr. Saulo Monteiro M. de Matos</p><p>DISCENTE: Murilo Cardoso Contente</p><p>DATA: 19 de dezembro de 2023</p><p>AULA EXTRA – Teorias Críticas do Direito. Gênero, Raça e Pensamento descolonial.</p><p>TEXTO BASE</p><p>MOREIRA, Adilson et al. Manual de educação jurídica antirracista. São Paulo: Contracorrente, 2022; cap. III: Referenciais teóricos críticos, p. 61–106.</p><p>SOBRE O AUTOR</p><p>O autor Adilson José Moreira é um dos maiores juristas do Brasil, e possui diversos livros que discutem, principalmente, questões antidiscriminatórias em nossa sociedade. Adilson Moreira é bacharel em direito e psicologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Pós-Doutor pela Faculdade de Direito da Universidade de Berkeley. Doutor em Direito Constitucional Comparado pela Faculdade de Direito da Universidade de Harvard. Doutor em Direito Constitucional pela Faculdade de Direito da UFMG com estágio doutoral sanduíche na Faculdade de Direito da Universidade de Yale. Master of Laws pela Faculdade de Direito da Universidade de Harvard. Mestre em Direito Constitucional pela UFMG. Além disso, Adilson Moreira leciona algumas disciplinas em faculdades de direito do país, e desenvolve diversas pesquisas no campo do Direito Constitucional, Direito Antidiscriminatório, Sociologia Jurídica, História do Direito, Direitos Humanos e Psicologia Jurídica.</p><p>VISÃO GERAL DO TEXTO</p><p>CAPÍTULO III – REFERENCIAIS TEÓRICOS CRÍTICOS</p><p>3.1 Teoria Crítica Racial</p><p>3.1.1 Pressupostos gerais</p><p>3.1.2 Realismo racial</p><p>3.1.3 Racialização diferencial</p><p>3.1.4 Branquitude como propriedade</p><p>3.1.5 Legal storytelling</p><p>3.2 Teoria Queer</p><p>3.3 Teoria Decolonial</p><p>3.4 Feminismo interseccional</p><p>3.4.1 Considerações iniciais</p><p>3.4.2 O que é interseccionalidade?</p><p>3.4.3 As origens do conceito: feminismo negro</p><p>3.4.4 Exemplos de abordagem interseccional</p><p>3.4.4.1 Mulheres negras</p><p>3.4.4.2 Homossexuais e transexuais negres</p><p>3.4.4.3 Pessoas negras com deficiência</p><p>PONTOS PRINCIPAIS DAS SEÇÕES</p><p>REFERENCIAIS TEÓRICOS CRÍTICOS</p><p>· O autor afirma que os grupos raciais subalternizados enfrentam diversos problemas por conta da forma que nossa realidade é entendida por operadores jurídicos.</p><p>· É necessário que a educação multicultural seja construída a partir de uma pluralidade de teorias que também expressam uma diversidade de epistemologias.</p><p>3.1 TEORIA CRÍTICA RACIAL</p><p>3.1.1 Pressupostos gerais</p><p>· Para que seja possível a construção de uma educação jurídica antirracista, é necessário uma mudança na forma como pensamos o Direito, principalmente no que se refere às complexas relações entre este e raça.</p><p>· A CRT (Critical Race Theory) é um movimento que começou a desenvolver-se em meados da década de 1970, nos Estados Unidos, e que se notabilizou por sua tentativa de desmascarar as estruturas racistas que sustentam os sistemas jurídicos contemporâneos.</p><p>· Desde sempre a Teoria Crítica Racial trabalha para demonstrar que que o Direito, da maneira como era ensinado e vivido, escondia compromissos ideológicos em favor da dominação de classe, do privilégio branco e do patriarcado.</p><p>· O modelo de educação jurídica que, hoje, impera nos Estados Unidos – e também no Brasil – é fortemente influenciado pela doutrina positivista, incitando os futuros juristas a reconhecerem como racionais e naturais as inúmeras desigualdades que alicerçam a nossa arquitetura normativa.</p><p>3.1.2 Realismo racial</p><p>· Derrick Bell, professor, escritor e ativista pelos direitos civis, define o realismo racial como a percepção de que, o racismo é central, necessário e normal na estruturação da vida coletiva, principalmente, nos Estados Unidos.</p><p>· De acordo com Bell, medidas pontuais e paliativas seriam incapazes de erradicar o racismo, que, ocupando papel estruturante na maneira como distribuímos poder e recursos, precisa ser combatido através de uma reforma radical nos fundamentos econômicos, jurídicos, políticos e culturais de nossa sociedade.</p><p>· Na leitura de Bell, a luta antirracista deve ser, necessariamente, antiliberal e anticapitalista.</p><p>· Não basta que as leis reconheçam a todos, formalmente, como iguais, se as crenças, os hábitos e as instituições diuturnamente promovem a desigualdade.</p><p>· O realismo racial permite repolitizar a interpretação da norma, desnudando os jogos de interesses que operam, a partir do Direito, com o fito de conservar a supremacia branca.</p><p>3.1.3 Racialização diferencial</p><p>· Seres humanos distintos apresentam características fenotípicas distintas; contudo, apenas num sistema racializado, essas diferenças fazem diferença, isto é, servem de critério para que diferentes grupos de pessoas sejam alocadas em níveis sociais diferentes.</p><p>· É o racismo que classifica a humanidade em raças, entendendo que tais e tais aspectos anatômicos são suficientes para determinar minha conduta, meu valor e, por conseguinte, minha função nas estruturas de poder do território em que me situo.</p><p>· A racialização diferencial é a percepção de que os grupos dominantes podem racializar ou desracializar diferentes grupos subordinados.</p><p>· A raça não é um dado biológico, mas uma invenção cultural, que atende a aspirações socioeconômicas e políticoideológicas concretas.</p><p>3.1.4 Branquitude como propriedade</p><p>· A branquitude – isto é, o fato de ser lido como branco pela comunidade – confere, a seu detentor, um conjunto de “bens jurídicos”, de privilégios que o distinguem dos demais.</p><p>· A branquitude funciona como um capital, que dá a seu possuidor uma gama enumerável de prerrogativas.</p><p>· Mesmo em contextos de extrema exploração e violência, trabalhadores brancos, com frequência, se sentem mais próximos de seus algozes que de seus colegas não brancos.</p><p>· Em uma cultura racista, ser aceito como branco é um investimento que pode abrir uma série de portas.</p><p>· A noção de branquitude como propriedade permite ver de que forma, mesmo não adotando valores e crenças francamente racistas, muitas pessoas brancas contribuem para a manutenção do racismo em nossa sociedade, locupletando-se (por vezes, de maneira inconsciente) de uma série de privilégios que a branquitude lhes confere.</p><p>3.1.5 Legal storytelling</p><p>· No âmbito da CRT, legal storytelling é um esforço para resgatar o uso de narrativas (contos, crônicas, memórias pessoais...) na pesquisa e no ensino jurídico.</p><p>· O uso de narrativas, na educação jurídica, recorda-nos que o Direito é feito por e para pessoas reais.</p><p>· Derrick Bell e Patricia Williams foram pioneiros no uso das memórias e das ficcionalizações na análise de temas jurídicos cardeais.</p><p>· O uso do legal storytelling, em classe, pode ampliar o imaginário social, político e jurídico dos alunos. Estimular que a turma ouça (e leia) narrativas e fale (e escreva) seus próprios relatos permite que os estudantes entrem em contato com vivências distintas das suas e se abram à alteridade.</p><p>3.2 Teoria Queer</p><p>· O que tem sido chamado de Teoria Queer diz respeito a um movimento intelectual que procura analisar e problematizar as formas e os discursos a partir dos quais as sociedades liberais regulam o exercício da sexualidade.</p><p>· A teoria queer é uma perspectiva crítica que procura, assim, estabelecer parâmetros para o exame dos diferentes meios de organização social mobilizados para instituir referências a partir das quais as pessoas devem compreender a si mesmas.</p><p>· A Teoria Queer também está interessada em examinar as diferentes dimensões da indisposição cultural em relação a homossexuais nas sociedades atuais.</p><p>· Os estudos no campo da Teoria Queer insistentemente apontam o papel central do Direito no processo de construção da heterossexualidade e da homossexualidade como identidades sociais.</p><p>3.3 Teoria Decolonial</p><p>· A teoria decolonial decorre de uma vertente intelectual crítica que pressupõe uma continuidade de processos de dominação entre grupos humanos em nações que passaram por um processo de colonização.</p><p>· Essa situação de colonialidade impede a construção de uma sociedade na qual todos os grupos possam ter o mesmo nível de inserção social, pois ela procura reproduzir</p><p>a mesma realidade presente durante o período no qual essas sociedades estavam sob a dominação política de outros povos.</p><p>· O colonialismo representa uma forma de dominação de uma nação sobre a outra e é marcado pela imposição do capitalismo como forma de organização econômica, bem como da organização política previamente presente nessas culturas.</p><p>· Apesar dos processos de emancipação política, a ausência de uma revolução cultural capaz de modificar esses meios de regulação faz com que esses fatores permaneçam sendo um aspecto permanente de organização das relações de poder presentes nessas nações.</p><p>· A teoria decolonial está especialmente interessada na crítica da dominação epistêmica que países centrais exercem sobre outros e também na forma como essa relação é reproduzida, dentro desses últimos, por membros das elites em relação às parcelas subordinadas da população.</p><p>3.4 FEMINISMO INTERSECCIONAL</p><p>3.4.1 Considerações iniciais</p><p>· A interseccionalidade constitui-se em um método importante para que pensemos o Direito, razão pela qual, no âmbito de um projeto de ensino jurídico crítico e racializado, é fundamental que nos voltemos a ele.</p><p>· “Interseccionalidade” diz respeito ao cruzamento de diferentes tecnologias de discriminação que se articulam para subjugar indivíduos pertencentes a mais de um grupo vulnerável.</p><p>· Ao se cruzarem, variados eixos de diferenciação e de categorização (raça, gênero, orientação sexual etc.) criam novas e complexas “matrizes de dominação”.</p><p>3.4.2 O que é interseccionalidade?</p><p>· Embora o termo “interseccionalidade” tenha se tornado de uso corrente a partir da obra de Crenshaw (e, também, de Collins), a percepção de como as dominações interseccionais se dão foi construída antes, por mulheres negras combativas.</p><p>· O feminismo negro começou a defender que “cruzássemos as informações”, atentando para a forma como a pertença a mais de um grupo vulnerável cria um verdadeiro ecossistema de violências que se retroalimentam.</p><p>· Atualmente, perspectivas interseccionais são indispensáveis a qualquer debate, no campo do Direito e das políticas públicas, que procure construir estratégias para incluir grupos vulneráveis, reduzindo desigualdades e fortalecendo a democracia.</p><p>· Mais que uma concepção teórica, a interseccionalidade é um método para que interpretemos relações de poder, com mais sensibilidade às diferenças.</p><p>3.4.3 As origens do conceito: feminismo negro</p><p>· Embora a noção de interseccionalidade tenha sido explicitamente formulada somente na década de 1980, a partir dos trabalhos de Collins e Crenshaw, as abordagens interseccionais foram gradualmente forjadas em períodos anteriores – não em especulações abstratas, mas no calor das lutas travadas pelo feminismo negro.</p><p>· Com o fito de superar uma visão monolítica e distorcida das relações de poder, o feminismo negro começou a elaborar propostas que davam visibilidade às experiências particulares e únicas das mulheres pretas e pardas.</p><p>· Muitos têm recorrido hoje às noções de “interseccionalidade” e “racismo interseccional” como grelhas analíticas indispensáveis na reflexão acerca do estado de grupos raciais subordinados.</p><p>· É preciso entender como o racismo impacta, diferentemente, homens e mulheres, adultos e crianças, homossexuais e heterossexuais etc.</p><p>3.4.4 Exemplos de abordagem interseccional</p><p>· A abordagem interseccional ajudou a lançar luz sobre aspectos frequentemente negligenciados pelo movimento negro hegemônico – o qual, por vezes, se concentrou nas experiências de homens negros heterossexuais de classe média sem deficiência.</p><p>· As realidades de mulheres negras, homossexuais negros e pessoas negras com deficiência, em especial, ganharam maior visibilidade a partir do momento em que investigações de natureza interseccional começaram a ser desenvolvidas.</p><p>3.4.4.1 Mulheres negras</p><p>· A autonomia corporal da mulher encontra-se, desde priscas eras, ameaçada.</p><p>· Sendo um fenômeno que acomete, majoritariamente, mulheres pretas e pardas que vivem em regiões marginalizadas, a ligadura compulsória de trompas acabou sendo solenemente ignorada por parcela considerável do feminismo nacional, até que militantes e intelectuais negras começassem a se mobilizar. Trata-se, assim, de um caso emblemático de racismo interseccional.</p><p>3.4.4.2 Homossexuais e transexuais negres</p><p>· Nos Estados Unidos, uma ramificação proeminente da Teoria Racial Crítica é, precisamente, a da QueerCrit (Teoria Racial Crítica Queer), que investiga como negros, latinos, nativos e asiáticos com orientação sexual dissidente experienciam o racismo.</p><p>· A QueerCrit vai demonstrar, dentre outras coisas, que a maioria das iniciativas de combate à transfobia e à homofobia, ignorando a articulação entre raça e orientação sexual, falham em tutelar, precisamente, os grupos mais atingidos pela discriminação.</p><p>3.4.4.3 Pessoas negras com deficiência</p><p>· Recentemente, tem-se desenvolvido, como um desdobramento da Teoria Racial Crítica, a DisCrit (Dis/ability Critical Race Theory, ou Teoria Racial Crítica da D/eficiência), que busca, precisamente, estudar as tecnologias de discriminação que agrilhoam as pessoas negras com deficiência.</p><p>· Pessoas negras com deficiências intelectuais e transtornos psicossociais (como o alcoolismo) correm riscos muito maiores que seus congêneres brancos de serem institucionalizados, isto é, internados (desnecessariamente) em instituições psiquiátricas, nas quais, em tese, não representariam “ameaças a si mesmos e aos demais”.</p><p>Qual a imagem do Direito que está sendo apresentada?</p><p>O autor busca conscientizar juristas para a aplicação de um direito antidiscriminatório, garantindo a todos os seus direitos sem distinção de qualquer natureza. Ademais, são ressaltados e explicados diversos conceitos para facilitar o entendimento da discriminação e preconceito aos quais grupos minoritários são submetidos constantemente. No texto, o autor faz análises a respeito de questões de gênero, raça, sexualidade, etc. Além disso, são feitos comentários a respeito da interseccionalidade, – interação entre dois ou mais fatores sociais que definem uma pessoa – sendo ressaltado pelo autor que essa interseccionalidade existente dificulta mais ainda a inclusão de grupos que são constantemente subalternizados e tratados de maneira discriminatória.</p><p>image1.png</p>