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<p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>1</p><p>Base estatística</p><p>“When you can measure what you are speaking about, and express it in</p><p>numbers, you know something about it; but when you cannot measure it, when you</p><p>cannot express it in numbers, your knowledge is of a meagre and unsatisfactory kind”</p><p>Lorde Kelvin</p><p>“O objetivo da medição na Abordagem de Incerteza não é determinar um</p><p>valor verdadeiro tão melhor quanto possível. Preferencialmente, supõe-se que a</p><p>informação oriunda da medição permite apenas atribuir ao mensurando um intervalo</p><p>de valores razoáveis, com base na suposição de que a medição tenha sido efetuada</p><p>corretamente” (vocabulário internacional de metrologia, 2012)</p><p>1- Introdução</p><p>“O objetivo da medição é (...) estabelecer, com base nas informações disponíveis a</p><p>partir da medição, uma probabilidade de que este valor essencialmente único se encontre</p><p>dentro de um intervalo1 de valores da grandeza medida” [ISOGUM].</p><p>Para sermos capaz de compreender este objetivo, é necessária uma revisão dos</p><p>termos utilizados na ciência da medição (metrologia) e da estatística.</p><p>2- Mensurando</p><p>Determinar um valor que todos os interessados aceitem para uma determinada</p><p>grandeza é importante para a troca de informações entre estes interessados. Esta troca de</p><p>informações permite o desenvolvimento da área afetada por esta grandeza.</p><p>Em engenharia, supor que existe um valor verdadeiro de uma grandeza é uma</p><p>hipótese muitas vezes desnecessária. Os efeitos da grandeza medida na propriedade de</p><p>engenharia desejada são muito afetados por condições de contorno muitas vezes não</p><p>controláveis.</p><p>Por exemplo, a determinação do valor verdadeiro do consumo de um automóvel é</p><p>uma tarefa muito difícil, pois há diversas grandezas que influenciam este mensurando: o tipo e</p><p>a qualidade do combustível, o modo de conduzir do condutor, o tipo de trânsito enfrentado no</p><p>dia a dia, a temperatura ambiente. O gráfico abaixo indica o valor do consumo de combustível,</p><p>1 Outra forma de pensar é que buscamos um intervalo em torno do resultado declarado de medição que</p><p>abranja uma fração conhecida “p” (tipicamente p=95%) dos resultados possíveis, onde “p” é a</p><p>probabilidade de abrangência. O ISO/GUM, na seção 6.2.2, informa que os termos intervalo de</p><p>confiança e nível de confiança não devem ser utilizados quando se referem à incerteza de medição. São</p><p>termos específicos utilizados na estatística frequentista, conceitos que não se aplicam à incerteza</p><p>conforme definida no Vocabulário Internacional de Metrologia [Kyriazis].</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>2</p><p>durante cerca de 3 anos e 30 mil de quilômetros registrados, dos 50 mil rodados neste</p><p>período.</p><p>Consumo (km/l) de um veículo durante três anos, em função da velocidade do veículo (km/h). O círculo</p><p>representa a velocidade e o consumo médios e o “x”, os medianos.</p><p>2</p><p>Fonte: elaboração do autor.</p><p>A velocidade média e a mediana estão representadas pelo círculo e pelo ‘X’,</p><p>respectivamente. Observe que a média não representa um valor provável de ser obtido</p><p>experimentalmente. Esta característica é típica de resultados de grandezas com</p><p>comportamento não linear.</p><p>As grandezas de influência na definição da grandeza de interesse, esta chamada de</p><p>mensurando, devem ser padronizadas para garantir uma comparação entre valores. A questão</p><p>importante é o que será feito com a informação resultante do experimento.</p><p>No exemplo, se o que interessa é quanto será gasto por mês com combustível, as</p><p>condições padronizadas deveriam incluir variações de velocidade e de relação de marchas</p><p>estaticamente compatível com a forma de conduzir típica da população interessada no seu</p><p>trajeto típico. Se o que interessa é o consumo em função da velocidade, ou o efeito do uso do</p><p>ar condicionado no consumo, provavelmente, a velocidade e a relação de marcha deveriam ser</p><p>mantidas constantes durante todo o ensaio.</p><p>O que é necessário para o engenheiro conhecer sobre a grandeza a ser medida? Com</p><p>qual exatidão? Estas não são perguntas fáceis de serem respondidas.</p><p>Por outro lado, a resposta, em engenharia, deve ser entendida não como o valor</p><p>verdadeiro da grandeza, mas como a propriedade medida de alguma forma que todos possam</p><p>2</p><p>Poucos pontos foram obtidos apenas com gasolina, particularmente pontos obtidos em viagens longas.</p><p>Saber exatamente qual é a característica do combustível não é uma tarefa simples. Os valores foram</p><p>obtidos a partir de dados do computador de bordo do automóvel, verificados periodicamente por</p><p>outros meios.</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>3</p><p>reproduzir e que tenda a ser a propriedade que interessa ao projetista, com a incerteza</p><p>adequada para ele. É esta resposta que define o mensurando. Em engenharia a maioria dos</p><p>mensurandos é normalizada, ou seja, está definida em normas técnicas (no Brasil, normas da</p><p>ABNT).</p><p>Alguns exemplos de mensurando:</p><p>1. A temperatura ambiente é uma grandeza muito utilizada em todas as áreas. Normalmente,</p><p>sua utilização é como uma grandeza de influência3 do experimento que está sendo realizado.</p><p>Seguem alguns exemplos de mensurando que podem ser chamados de “temperatura</p><p>ambiente”:</p><p>1.a) “Temperatura medida, sempre no mesmo horário em um termômetro colocado em uma</p><p>das paredes do laboratório. O local escolhido deve estar livre de insolação e fluxo de ar”. Este</p><p>mensurando é utilizado, normalmente, quando as condições ambientais do laboratório estão</p><p>controladas por um sistema de controle de temperatura. O registro deste mensurando, por</p><p>exemplo, é necessário pela norma ABNT ISO 9000, ou ABNT ISO 17025.</p><p>1.b) Temperatura medida com um termômetro de vidro em béquer com cerca de 1 litro de</p><p>água. O béquer deve estar no mesmo ambiente, mas deve estar afastado do experimento para</p><p>este não afete a “temperatura ambiente”. Este mensurando é utilizado durante ensaios no</p><p>qual o valor médio da temperatura ambiente deve ser mantido registrado, para eventuais</p><p>análises ou correções dos dados.</p><p>1.c) Média da temperatura de uma parede de madeira de 2,5 cm de espessura, pintada de</p><p>preto, a uma distância determinada pela norma do equipamento sob teste, montado na</p><p>situação mais crítica permitida pelo manual de instalação do equipamento. (norma ABNT IEC</p><p>60335-1)</p><p>1.d) A temperatura medida por estações meteorológicas do Instituto Nacional de</p><p>Meteorologia (no Mirante de Santana) é, normalmente, chamada de “temperatura do</p><p>munícipio de São Paulo”. Uma das razões da escolha de uma determinada estação é que há</p><p>dados históricos obtidos há vários anos. As condições de instalação de uma estação</p><p>meteorológica são normalizadas pela Organização Meteorológica Mundial (OMM).</p><p>1.e) A “temperatura ambiente” para a caracterização da vida útil de uma lâmpada “led” é um</p><p>mensurando que deve ser muito bem controlado. Um sistema de exaustão normalizado</p><p>garante um fluxo baixo e constante de ar (ambos os termos normalizados) sobre a lâmpada.</p><p>Nestas condições, a temperatura ambiente é definida como a média de duas temperaturas na</p><p>entrada do ar e de duas na saída, devendo ser medida com termopar de tipo especificado.</p><p>Além disso, esta temperatura deve ser mantida constante (de forma normalizada) para</p><p>permitir uma comparação adequada entre as vidas úteis de várias lâmpadas de um mesmo</p><p>fabricante ou de lâmpadas similares produzidas por vários fabricantes. Observe que para o</p><p>3 Grandeza de influência: Grandeza que, numa medição direta, não afeta a grandeza efetivamente</p><p>medida, mas afeta a relação entre a indicação e o resultado de medição. [VIM, 2012].</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>4</p><p>usuário final da lâmpada, o valor do mensurando “temperatura ambiente durante o ensaio”</p><p>não é importante, afinal a “sua” temperatura ambiente provavelmente será muito</p><p>menos</p><p>controlável ou conhecida.</p><p>2. Algumas propriedades estatísticas de variáveis aleatórias são comumente utilizadas como</p><p>parte da definição de mensurando. Alguns exemplos:</p><p>2.a) o valor médio de “n” medidas de uma determinada grandeza é muito usado como</p><p>mensurando. Por exemplo, se um dado é jogado “n” vezes, e o mensurando é a média dos</p><p>valores obtidos, o resultado tende 3,5 à medida que “n” tende a infinito [LAW]. Observe que o</p><p>valor do mensurando, 3,5, nunca acontece em nenhum resultado experimental. Para fins de</p><p>engenharia, o valor de “n” em geral é limitado para reduzir os custos do experimento.</p><p>2.b) o valor da mediana (ou moda) de “n” medidas é muitas vezes utilizado como mensurando</p><p>que represente o valor de um lote de peças. A escolha da mediana em engenharia ocorre ou</p><p>porque os valores medidos possuem ordens de grandeza diferentes, ou porque o valor obtido</p><p>pela média pode ser não representativo de um valor possível de ocorrer, como apresentado</p><p>em 2.a.</p><p>2.c) o valor mínimo (ou máximo) de uma grandeza (por exemplo a massa) de um lote de peças.</p><p>Este mensurando é típico quando o processo no qual a peça será inserida possui uma</p><p>tolerância: valores abaixo (ou acima) de um valor especificado não “cabem” no processo.</p><p>2.d) o número de valores de um lote de “n” peças testadas que satisfaz algum requisito. Este</p><p>mensurando é típico no controle de qualidade em engenharia.</p><p>3- Valor verdadeiro e valor convencional de uma grandeza</p><p>4</p><p>Como determinar a veracidade5 de um mensurando? Afinal, em algum momento,</p><p>todos eles estão sujeitos à indeterminação experimental.</p><p>A maioria dos mensurandos é função de diversas grandezas, como: valor do π ou do</p><p>número de Euler; da velocidade da luz; da temperatura ambiente; de valores obtidos lidos em</p><p>diversos instrumentos ao “mesmo” tempo, etc.</p><p>Como deve ser definida uma grandeza que é base para as outras? Tomemos por</p><p>exemplo a velocidade da luz. Hoje esta grandeza é utilizada como um valor convencional para</p><p>as medições. O “metro” é definido a partir da velocidade da luz. Caso um novo método for</p><p>utilizado e torne possível medir com maior exatidão o tempo que a luz demora para percorrer</p><p>um determinado espaço, não será a velocidade que será ajustada, mas o comprimento.</p><p>4</p><p>Valor verdadeiro (Valor duma grandeza compatível com a definição da grandeza.) e valor convencional</p><p>(Valor atribuído a uma grandeza por um acordo, para um dado propósito).[VIM, 2012]</p><p>5 Veracidade (Grau de concordância entre a média dum número infinito de valores medidos repetidos e</p><p>um valor de referência.[VIM, 2012].</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>5</p><p>Assim sendo, mesmo que a luz não possua um valor verdadeiro de velocidade (no</p><p>sentido de que é impossível saber com total exatidão seu valor), está convencionado</p><p>internacionalmente que seu valor é c=299 792 458 m/s.</p><p>Um exemplo de valor verdadeiro que possui incerteza (não é exato) ocorre num</p><p>processo de comparação de medições feitas com dois instrumentos (processo utilizado</p><p>tipicamente em calibrações). A medida feita com o instrumento mais exato é adotada como o</p><p>valor verdadeiro da medição. Pode-se assim definir o erro do instrumento sendo calibrado</p><p>como a diferença entre o valor medido e o valor verdadeiro.</p><p>Exemplos de valores verdadeiros e de valores convencionais</p><p>1. O valor do π não é conhecido ou conhecível com total exatidão (é um número irracional!).</p><p>Hoje, para fins da compreensão dos fenômenos físicos ou para acordos comerciais (volume de</p><p>gás em um cilindro, por exemplo), o número de “algarismos significativos” conhecidos do valor</p><p>de π é infinitamente maior do que o necessário para qualquer aplicação. Veja na figura abaixo</p><p>a evolução do número de algarismos do π ao longo do tempo [VALORDEPI]</p><p>Fonte: elaborado pelo autor a partir de [VALORDEPI]</p><p>Pode-se considerar que, para um determinado experimento, o valor do π, escolhido com um</p><p>número de algarismos significativos suficientemente grande é um valor verdadeiro, com</p><p>incerteza desprezível. Outro experimento pode exigir outro valor verdadeiro do π. O valor não</p><p>está convencionado, e continua sendo objeto de pesquisa, na área de algoritmos. Por outro</p><p>lado, em calculadoras e planilhas de cálculo, o número de algarismos significativos é</p><p>relativamente pequeno. No software Excel, por exemplo, ele possui “apenas” 15 algarismos</p><p>significativos, o que equivale ao conhecimento do valor do π da Idade Média!</p><p>2. Valores convencionais são fundamentais na área de química e em física. Eles podem ser</p><p>recuperados em (http://physics.nist.gov/cuu/Constants/index.html ou [CODATA]</p><p>Alguns exemplos:</p><p>1</p><p>100</p><p>10.000</p><p>1.000.000</p><p>100.000.000</p><p>10.000.000.000</p><p>1.000.000.000.000</p><p>100.000.000.000.000</p><p>1400 1500 1600 1700 1800 1900 2000</p><p>n</p><p>Ano</p><p>Número de algarismos significativos conhecidos de ππππ ao longo dos últimos séculos</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>6</p><p>Atm: 101 325 Pa – exato.(atmosfera padrão). Observe que garantir que um experimento foi</p><p>realizado exatamente em 1 atm é impossível, pois não é possível medir a pressão atmosférica</p><p>sem introduzir alguma incerteza na medição. Mas caso seja necessário corrigir um</p><p>mensurando que dependa da pressão (por exemplo o volume de um gás), para o valor a 1 atm,</p><p>este valor exato pode ser utilizado.</p><p>No. de Avogadro: A= 6,022 141 29(27) x 1023 mol-1, número entre parênteses representa o</p><p>desvio padrão, ou incerteza padrão. O valor desta constante encontra-se dentro do intervalo</p><p>entre 6,022 141 02 e 6,022 141 56 (x 1023 mol-1), com probabilidade de 68%.</p><p>Constante de gravitação G= 6,673 84 (80) x 10-11 m3 kg-1 s-2</p><p>Permeabilidade magnética do vácuo (µ0) 4π10-7 H/m (exato) Observe que apesar de não haver</p><p>incerteza na definição da permeabilidade, seu valor exato é desconhecível, já que o π é</p><p>irracional!</p><p>Permissividade dielétrica do vácuo: ε0 exata, calculada a partir da equação: c2 = 1/( µ0. ε0).</p><p>Observe que esta grandeza depende da definição de outras duas, ambas definidas como sendo</p><p>exatas. Seu valor numérico, por outro lado, é desconhecível (também é irracional).</p><p>3. No processo de calibração de um instrumento, o instrumento de referência deve possuir</p><p>uma incerteza no valor medido de 3 a 10 vezes melhor do que o instrumento sob calibração.</p><p>Durante o processo, ambos os instrumentos medem o mesmo valor ao “mesmo” tempo. O</p><p>valor medido pelo instrumento de referência, com seu intervalo, é considerado o valor</p><p>verdadeiro do mensurando do experimento.</p><p>4- Grandezas de influência</p><p>O que se espera de uma grandeza medida com qualquer instrumento? Naturalmente,</p><p>dentro da exatidão necessária e suficiente para o estudo, valores que sejam estatisticamente</p><p>representativos do valor da grandeza.</p><p>É normal que haja flutuações na medição desta grandeza, quer seja porque a grandeza</p><p>não pode ser mantida constante nas condições do experimento, quer seja porque a</p><p>instrumentação não é totalmente exata, nunca.</p><p>Quando se procura um valor verdadeiro de uma grandeza (o que normalmente é</p><p>improdutivo em engenharia), procura-se estabelecer uma estabilidade máxima de todas as</p><p>grandezas que influenciam na medição: temperatura, pressão etc. Por exemplo, caso</p><p>queiramos medir o valor do metro utilizando a velocidade da luz no vácuo e um cronômetro</p><p>muito exato, devem ser criadas condições de mínima densidade do ar. O vácuo sempre poderá</p><p>ser mais “perfeito” com a melhoria da tecnologia, o que fará com que o metro seja conhecido</p><p>com exatidão6 cada vez maior. Se o objetivo for conhecer valores cada vez mais próximos do</p><p>valor verdadeiro do metro, o vácuo deve ser sempre aperfeiçoado, entre outras características</p><p>do experimento.</p><p>6</p><p>No ar, à pressão atmosférica, a velocidade é cerca de 0,03% menor do que no vácuo “perfeito”. Em</p><p>2014, a incerteza do metro era de 4 partes em um bilhão.</p><p>Métodos Experimentais</p><p>em Engenharia</p><p>7</p><p>E se quisermos medir a distância máxima percorrida por um automóvel com uma</p><p>determinada quantidade de combustível? Não faz sentido realizar o experimento no vácuo, ao</p><p>menos não com os motores a explosão de hoje. Naturalmente, a pressão e a temperatura</p><p>ambiente modificam o atrito da carroceria do automóvel com o ar, modificando assim a</p><p>distância percorrida pelo automóvel. Do ponto de vista da engenharia, não há um valor exato</p><p>desta distância máxima, já que as condições ambientais dependem do país, das estradas, da</p><p>época do ano, etc. E estas condições ambientais modificam não apenas o arrasto do</p><p>automóvel, mas também o desempenho do motor.</p><p>Em engenharia, o que se busca é apenas um valor de comparação entre diversas</p><p>medições, sob condições previamente acordadas e conhecidas. Estas condições devem</p><p>inclusive levar em consideração a facilidade de se reproduzir o experimento em países</p><p>diferentes. A incerteza da medição desta grandeza deve ser especificada e só faz sentido</p><p>buscar a redução desta incerteza se a relação da grandeza com o desenvolvimento do projeto</p><p>de engenharia for muito bem conhecido. Ou seja, todas as grandezas que influenciam a</p><p>medida devem ser conhecidas para que a incerteza do mensurando seja conhecida. Estas são</p><p>as grandezas de influência deste mensurando.</p><p>Exemplos de grandezas de influência</p><p>1. A definição de grandeza de influência dificulta sua exemplificação, pois é necessário</p><p>conhecer bem o mensurando para que os exemplos possam ser dados. Apenas para ilustrar, se</p><p>o mensurando for a temperatura ambiente da cidade de São Paulo, a resolução do</p><p>instrumento utilizado certamente seria uma grandeza de influência deste mensurando.</p><p>2. Se o mensurando for o volume de um gás medido na temperatura ambiente, a temperatura</p><p>ambiente provavelmente seria uma grandeza de influência importante.</p><p>3. A própria definição do mensurando é uma grandeza de influência. Uma definição</p><p>incompleta das condições nas quais foram realizados os experimentos e anotados os</p><p>resultados, torna o valor do mensurando dependente das condições não definidas. Esta é</p><p>chamada de grandeza de influência “definicional”. No caso do exemplo do consumo do</p><p>automóvel, é possível imaginar infinitas mudanças de definição que alteram o valor do</p><p>mensurando7.</p><p>5- Distribuições estatísticas</p><p>Como representar o valor da grandeza medida, considerando a existência de uma</p><p>“incerteza de medição”8?</p><p>A representação de um intervalo que abranja o seu valor verdadeiro com uma</p><p>probabilidade adequada é a meta de todas as representações, quer seja de uma grandeza de</p><p>7</p><p>Por exemplo, o mensurando é modificado se é definido o peso do condutor, a inclinação da pista, a</p><p>octanagem do combustível, etc.</p><p>8</p><p>“Incerteza de medição Parâmetro não negativo que caracteriza a dispersão dos valores atribuídos a</p><p>um mensurando, com base nas informações utilizadas.” [VIM]</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>8</p><p>influência ou do próprio mensurando. O ISO GUM (“Guide for uncertainty measurements”)</p><p>[ISOGUM] propõe que este intervalo seja padronizado para que possa ser facilmente</p><p>compreendido e utilizado na determinação de mensurando complexos, típicos de engenharia.</p><p>Esta padronização levou à definição de “incerteza padrão”9.</p><p>Para compreender este intervalo, vamos analisar o comportamento de algumas</p><p>distribuições estatísticas.</p><p>5.1- Distribuição uniforme</p><p>Para compreender a representação do valor mais provável para uma grandeza, vamos</p><p>discutir o conceito de distribuições de probabilidades. Suponhamos um experimento que seja</p><p>a escolha de um número real aleatório entre 0 e 1 e sua classificação como um número</p><p>pertencente a uma das seguintes classes:</p><p>- classe 0,05: um número entre 0 e 0,1;</p><p>- classe 0,15: entre 0,1 e 0,2 10</p><p>Analogamente, até a classe 0,95, para números entre 0,9 e 1,0.</p><p>Suponha que o mensurando seja o valor da classe deste número escolhido. Teremos,</p><p>portanto, 10 valores possíveis para o mensurando: 0,05; 0,15; 0,25; 0,35; 0,45; 0,55; 0,65;</p><p>0,75; 0,85 e 0,95;</p><p>Se o experimento for realizado uma única vez, 100% dos resultados experimentais</p><p>(apenas 1!) terão o mesmo valor.</p><p>Se o experimento for realizado 2 vezes, a probabilidade do valor ser o mesmo é muito</p><p>baixa (1/número de classes). Portanto é mais provável que 50% dos valores obtidos sejam de</p><p>uma classe e 50% de outra.</p><p>Se o experimento for realizado um número muito grande de vezes, é muito provável</p><p>que os valores do mensurando obtidos seja distribuídos homogeneamente, com probabilidade</p><p>de 10% de estar em cada uma das 10 classes. O efeito do número de vezes neste experimento</p><p>está simulado na figura 2. O número de vezes (np) foi determinado por</p><p>np=2n</p><p>9 Todas as definições necessárias à compreensão deste texto foram retiradas de [VIM]: Incerteza</p><p>padrão: “Incerteza de medição expressa na forma dum desvio-padrão”.</p><p>10</p><p>Deve ser feita uma escolha se o limite da classe pertence à classe inferior ou superior.</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>9</p><p>Fonte: elaborado pelo autor</p><p>Observa-se que com um número suficiente de medidas a distribuição fica uniforme, ou</p><p>seja, a probabilidade do mensurando ser qualquer valor dos 10 possíveis é 10%, e a</p><p>probabilidade de ser algum número diferente dos 10 possíveis é zero. Esta distribuição de</p><p>resultados de mensurando, relativamente comum em engenharia, é chamada de distribuição</p><p>uniforme ou retangular. Observe que quanto maior for o número de classes, menor a</p><p>probabilidade do mensurando ser de uma determinada classe (100 classes, 1%, 1000 classes,</p><p>0,1% etc.). No limite, a probabilidade de um número real ser um determinado valor é zero. De</p><p>qualquer forma, independentemente do número de classes, a distribuição de probabilidades é</p><p>uma distribuição retangular11</p><p>.</p><p>Qual seria a melhor forma de representar o valor deste mensurando, definido como</p><p>pertencente a uma das 10 classes citadas?</p><p>Se um número muito grande de medidas tiver sido realizado, uma maneira</p><p>(incompleta) seria afirmar que:</p><p>“o mensurando possui certamente um valor entre 0,05 e 0,95” (lembre-se da definição</p><p>deste mensurando).</p><p>Esta maneira não é o suficiente. Afinal se todas as leituras tivessem sido iguais a 0,55,</p><p>esta afirmação continuaria verdadeira (o mensurando possui valor entre 0,05 e 0,95), mas o</p><p>resultado não indica o mesmo experimento.</p><p>11</p><p>Uma alternativa para a representação deste tipo de fenômeno é definir a função densidade de</p><p>probabilidade, que é a divisão entre a probabilidade da classe e seu comprimento.</p><p>0</p><p>2</p><p>4</p><p>6</p><p>8</p><p>10</p><p>12</p><p>0.05</p><p>0.15</p><p>0.25</p><p>0.35</p><p>0.45</p><p>0.55</p><p>0.65</p><p>0.75</p><p>0.85</p><p>0.95</p><p>0</p><p>20</p><p>40</p><p>60</p><p>80</p><p>100</p><p>n(Número de vezes que o experimento foi realizado é np= 2n)</p><p>Percentual de valores experimentais em cada classe</p><p>Classe</p><p>P</p><p>ro</p><p>ba</p><p>bi</p><p>lid</p><p>ad</p><p>e</p><p>da</p><p>c</p><p>la</p><p>ss</p><p>e</p><p>(%</p><p>)</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>10</p><p>Portanto é necessário acrescentar alguma informação sobre o tipo de distribuição dos</p><p>resultados. Uma maneira mais adequada de informar o resultado seria:</p><p>“o mensurando possui certamente um valor entre 0,05 e 0,95, com uma probabilidade</p><p>de ocorrência distribuída homogeneamente neste intervalo”. Esta frase poderia ser</p><p>representada pela equação:</p><p>“Mensurando = (0,50 +/- 0,45), com o intervalo indicado representando 100% dos</p><p>valores obtidos, em uma distribuição uniforme”.</p><p>Outra forma de representar o mesmo mensurando, totalmente equivalente à anterior,</p><p>seria:</p><p>“Mensurando = (0,50 +/- 0,30), com o intervalo indicado representando cerca de 67%</p><p>dos valores obtidos, em uma distribuição uniforme”. Observe que o intervalo é apenas</p><p>aproximado, pois os limites dependem do tamanho da classe escolhido, no caso 0,1.</p><p>Uma outra maneira de representar o mensurando é a partir do conhecimento de sua</p><p>variância, definida pela equação abaixo (para n amostras):</p><p>�� = ∑ (�� − �̅)����</p><p>(� − 1)</p><p>É possível calcular a variância de um mensurando que possua uma distribuição</p><p>retangular. Se o número de pontos tende ao infinito e o número de classes também, a</p><p>somatória acima torna-se a integral:</p><p>�� =</p><p>��� (� − �̅)����������� , com a=(xmax-xmin)/2, e, neste exemplo, xmin =0, xmax =1, e</p><p>�̅=0,5.</p><p>“a” é metade da amplitude da distribuição uniforme.</p><p>A integral acima resulta, para a distribuição retangular:</p><p>�� = ��3</p><p>Define-se a incerteza padrão (u) como a raiz quadrada da variância [ISOGUM]:</p><p>X</p><p>x</p><p>� − �̅</p><p>2a</p><p>�̅ xmax xmin</p><p>�̅</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>11</p><p>� = �√3</p><p>Assim, outra forma que representa o mesmo mensurando seria:</p><p>“Mensurando = (0,50 +/- 0,26), com o intervalo indicado representando</p><p>aproximadamente o valor da incerteza padrão da distribuição uniforme”12.</p><p>Esta forma de representar o mensurando é a indicada em várias normas,</p><p>particularmente na norma ABNT ISO17025 [ISO17025], aplicável a laboratórios de ensaio e</p><p>calibração no Brasil pelo INMETRO. Considerando as dificuldades de determinar com exatidão</p><p>a incerteza padrão (neste caso é relativamente simples), a norma indica que a incerteza</p><p>padrão deve ser apresentada apenas com dois algarismos significativos.</p><p>Apesar deste tipo de distribuição ser comum em engenharia, ela não é prática para a</p><p>definição de mensurandos mais complexos. Na apresentação da distribuição triangular, vamos</p><p>fazer uma operação simples com dois mensurandos com distribuição uniforme, para</p><p>demonstrar este ponto.</p><p>Exemplos de distribuição uniforme:</p><p>1. O uso de equipamentos digitais é cada vez mais comum em engenharia (por exemplo:</p><p>multímetros, termômetros, balanças, etc...). Este tipo de equipamento, em alguma etapa (ou</p><p>em várias etapas) do processo de medição, realiza uma conversão do sinal analógico medido</p><p>para um valor digital. Esta conversão pode ser realizada para o seu uso em um</p><p>microcontrolador ou apenas para indicar o valor medido em um display. O número de bits da</p><p>representação digital do valor medido define a resolução desta conversão. A figura abaixo</p><p>mostra um exemplo da variação do valor convertido, utilizando um conversor de 5 bits.</p><p>12</p><p>Pode-se demonstrar que a probabilidade do mensurando se encontrar no intervalo (�̅ ± �) na</p><p>distribuição uniforme é de 58%.</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>12</p><p>Fonte: elaborado pelo autor</p><p>Neste tipo de conversor, caso seja feita uma leitura “16”, ela deve ser representada</p><p>por exemplo por:</p><p>leitura = 16 num intervalo de “-0” a “+4”, com o intervalo indicado representando</p><p>100% dos valores possíveis, em uma distribuição uniforme. Observe que este intervalo é</p><p>assimétrico13.</p><p>Neste caso, o valor lido “16” indica que o valor verdadeiro está entre 16 e 20.</p><p>Naturalmente, neste exemplo, estamos desprezando qualquer incerteza do processo de</p><p>medição que não esteja associada à resolução do equipamento. Em outros termos, uma das</p><p>incertezas das grandezas que influenciam o valor atribuído ao mensurando é a resolução do</p><p>conversor analógico digital do equipamento utilizado.</p><p>2. As balanças digitais também apresentam os valores medidos utilizando distribuições</p><p>retangulares. Por exemplo, uma determinada balança, para a mesma massa, pode apresentar,</p><p>conforme sua configuração14, os seguintes valores:</p><p>Massa medida = (0,296 +/- 0,002) kg, com o intervalo indicado representando 100 %</p><p>dos valores medidos devidos à resolução, em uma distribuição uniforme; ou</p><p>13</p><p>Um conversor AD típico possui um intervalo simétrico em relação ao valor indicado no instrumento.</p><p>14</p><p>Uma grande quantidade de balanças comerciais possui resolução configurável para 2 ou 5 gramas.</p><p>0</p><p>4</p><p>8</p><p>12</p><p>16</p><p>20</p><p>24</p><p>28</p><p>32</p><p>36</p><p>40</p><p>44</p><p>48</p><p>52</p><p>56</p><p>60</p><p>64</p><p>0 10 20 30 40 50 60</p><p>V</p><p>a</p><p>lo</p><p>r</p><p>C</p><p>o</p><p>n</p><p>v</p><p>e</p><p>rt</p><p>id</p><p>o</p><p>Valor medido</p><p>Valor da conversão analógico digital do</p><p>valor medido</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>13</p><p>Massa medida = (0,295 +/- 0,005) kg, com o intervalo indicado representando 100 %</p><p>dos valores medidos devidos à resolução, em uma distribuição uniforme.</p><p>Observe que a medição da massa da amostra sob teste, certamente possui outras</p><p>grandezas que influenciam os resultados. Por exemplo, na maioria das balanças comerciais, o</p><p>valor da aceleração da gravidade do local interfere no valor da massa medida. Lembre-se que,</p><p>neste caso, variações da aceleração da gravidade não afetam o valor verdadeiro da massa</p><p>inercial da amostra sob teste, mas afetam o valor medido pelo equipamento.</p><p>5.2- Distribuição triangular</p><p>A distribuição triangular de probabilidades também não é rara em processos de</p><p>medição utilizados em engenharia.</p><p>Suponhamos que o mensurando M é o resultado da soma de dois mensurandos</p><p>definidos por distribuições uniformes, com um número muito grande de repetições do</p><p>experimento:</p><p>M = X+Y</p><p>sendo X e Y as classes (entre 0,05 e 0,95) de dois números reais aleatórios entre 0 e 1,</p><p>conforme descrito no item anterior.</p><p>Observa-se que os resultados experimentais deste novo mensurando poderiam ser</p><p>valores entre 0,10 (0,05+0,05) e 1,90 (0,95+0,95), em passos de 0,10. A figura abaixo mostra os</p><p>possíveis valores obtidos para o mensurando M.</p><p>Fonte: elaborado pelo autor</p><p>0,05 .15 .25 .35 .45 .55 .65 .75 .85 .95</p><p>.05.15.25.35.45.55.65.75.85.95</p><p>0</p><p>0.5</p><p>1</p><p>1.5</p><p>2</p><p>X</p><p>Valores do mensurando</p><p>M = X + Y</p><p>Y</p><p>M</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>14</p><p>Observa-se na figura que o número de vezes que o valor do mensurado é “1,0” é</p><p>máximo, e que o número de vezes em que é “0,10” (ou “1,90”) é mínimo: apenas quando</p><p>X=0,05 e Y=0,05 o valor de M=0,10 (ou X=0,95 e Y=0,95, M=1,90).</p><p>A representação da distribuição de probabilidades do mensurando “M” está na figura</p><p>abaixo.</p><p>Fonte: elaborado pelo autor</p><p>Esta distribuição de probabilidades é aproximadamente triangular. Caso o número de</p><p>classes tendesse ao infinito teríamos uma distribuição perfeitamente triangular. O mesmo</p><p>aconteceria se o mensurando passasse a ser o resultado da soma da escolha de dois números</p><p>reais aleatórios entre 1 e 0 15.</p><p>Uma descrição deste mensurando, seria:</p><p>15</p><p>Observe que, se o mensurando fosse a soma de um número entre 0 e 1 com outro que é múltiplo</p><p>deste, a distribuição seria retangular. Isto acontece, pois os valores estão correlacionados, ou seja, não</p><p>são variáveis aleatórias independentes.</p><p>0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 2</p><p>0</p><p>1</p><p>2</p><p>3</p><p>4</p><p>5</p><p>6</p><p>7</p><p>8</p><p>9</p><p>10</p><p>M=X+Y</p><p>Valor do Mensurando M</p><p>P</p><p>ro</p><p>ba</p><p>bi</p><p>lid</p><p>ad</p><p>e</p><p>do</p><p>M</p><p>en</p><p>su</p><p>ra</p><p>nd</p><p>o</p><p>(%</p><p>)</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>15</p><p>“o mensurando possui certamente um valor entre 0,10 e 1,90, com uma probabilidade</p><p>de ocorrência distribuída aproximadamente de forma triangular neste intervalo”. Esta frase</p><p>poderia ser representada pela equação:</p><p>“Mensurando = (1,00 +/- 0,90), com o intervalo indicado representando 100% dos</p><p>valores obtidos, em uma distribuição triangular em classes de 0,10, simétrica”</p><p>Caso a representação fosse a sugerida pela ABNT ISO17025 [ISO17025], precisaríamos</p><p>calcular a variância da distribuição triangular simétrica e determinar a incerteza padrão. Seu</p><p>valor é:</p><p>� = �√6</p><p>Sendo a metade do valor da base do triângulo (neste caso: a =0,90)</p><p>“Mensurando = (1,00 +/- 0,37), com o intervalo indicado representando</p><p>aproximadamente o valor da incerteza padrão da distribuição triangular” 16.</p><p>Observa-se, neste exemplo, que a soma de dois mensurandos com distribuição</p><p>uniforme, resulta em um mensurando com distribuição triangular. O mesmo ocorre com a</p><p>subtração. Se a operação que definisse o mensurando fosse uma multiplicação, a distribuição</p><p>resultante seria outra.</p><p>Para fins de engenharia, a definição de um mensurando</p><p>não raramente inclui a</p><p>combinação de grandezas medidas, combinações com funções mais complicadas do que a</p><p>soma ou a multiplicação. Assim, a busca pela representação de “qualquer” distribuição,</p><p>utilizando-se uma distribuição aproximada nos levará à distribuição normal…</p><p>Exemplos de distribuição triangular</p><p>1. O mensurando definido como a subtração entre a massa do alimento colocado no prato e a</p><p>massa do prato, ambas medidas com uma balança digital, possui um valor verdadeiro que se</p><p>encontra no intervalo calculado a partir de uma distribuição triangular. Isto acontece pois o</p><p>mensurando é a subtração de duas grandezas com distribuição retangular, associada à</p><p>resolução da balança.</p><p>Observe que, se o mensurando fosse a massa do alimento junto com o prato, medida</p><p>com uma balança digital após a taragem da balança (em que a balança é “zerada” só com a</p><p>massa do prato), a distribuição seria retangular. Isto acontece, pois a balança só faz a</p><p>conversão analógico digital uma vez e indica o mensurando. Se a massa usada para tarar a</p><p>balança for de outro prato, não se pode afirmar que a distribuição seja retangular ou triangular</p><p>sem uma análise mais cuidadosa do comportamento das massas de diversos pratos.</p><p>16</p><p>Ou “Mensurando = (1,00 +/- 0,37), com o intervalo indicado representando 65 % dos valores medidos</p><p>devidos à resolução, em uma distribuição triangular”.</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>16</p><p>2. a) Outro exemplo, decorrente dos já mostrados, é o mensurando definido como o valor</p><p>médio de dois valores que apresentam a distribuição uniforme (a leitura de um instrumento</p><p>digital, por exemplo). Caso o fenômeno que queremos medir varie a ponto do valor do</p><p>equipamento digital indicar valores distintos, a distribuição resultante seria triangular. Por</p><p>exemplo:</p><p>M=(X+Y)/2, com</p><p>X=(10,6 +/- 0,1) com o intervalo indicado representando 100 % dos valores medidos</p><p>devidos à resolução, em uma distribuição uniforme; e</p><p>Y=(11,4 +/-0,1) com o intervalo indicado representando 100 % dos valores medidos</p><p>devidos à resolução, em uma distribuição uniforme.</p><p>O mensurando “média” seria</p><p>M=(11,0 +/- 0,1) com o intervalo indicado representando 100 % dos valores medidos</p><p>somente devidos à resolução das grandeza medidas, em uma distribuição triangular.</p><p>Caso fosse uma média de mais medições, a distribuição deixaria de ser triangular.</p><p>Observe que o valor do intervalo do mensurando (+/-0,1) não abrange as leituras das</p><p>grandezas X ou Y. Abrange apenas todos os valores possíveis da média de uma medida</p><p>realizada de X e uma medida realizada de Y! 17</p><p>2.b) Por outro lado, usando ainda a definição de mensurando acima, se a resolução da</p><p>instrumentação fosse pior, poderíamos ter:</p><p>X=(11 +/- 1) com o intervalo indicado representando 100 % dos valores medidos</p><p>devidos à resolução, em uma distribuição uniforme;</p><p>Y=(11 +/- 1) com o intervalo indicado representando 100 % dos valores medidos</p><p>devidos à resolução, em uma distribuição uniforme</p><p>O mensurando “média” apresentaria o seguinte valor:</p><p>M=(11 +/- 1) com o intervalo indicado representando 100 % dos valores medidos</p><p>devidos à resolução, em uma distribuição retangular. Afinal a resolução de X e Y, grandeza de</p><p>influência de M, não é suficiente para representar como as grandezas estão variando. Em</p><p>outras palavras, há uma grande correlação entre as medidas de X e Y, correlação esta causada</p><p>17</p><p>Se esperamos que o valor “11,0” tenha probabilidade não nula de pertencer às grandezas X, Y ou M,</p><p>precisamos considerar outra grandeza de influência: a variância característica das grandezas X e Y. Ela</p><p>pode ser obtida a partir de “n” medidas de X ou Y. Ou seja, precisamos de alguma ferramenta estatística</p><p>para considerar a dispersão de dados caso façamos várias vezes o teste, calculando para cada par (Xi,Yi)</p><p>um valor de Mi. Isto exige o estudo de outra distribuição, tipicamente a “normal”.</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>17</p><p>pela incapacidade do instrumento diferenciar duas grandezas próximas. Neste caso, aumentar</p><p>o número de medições não altera o tipo de distribuição.</p><p>3. Outro exemplo de distribuição aceita em engenharia como triangular é a medição sujeita à</p><p>paralaxe de medição em equipamento com ponteiros, por um operador com experiência. O</p><p>valor mais provável do mensurando é aquele visto no ângulo no qual não há paralaxe. À</p><p>medida que o operador experiente se desloca desta posição ideal, o valor medido muda, mas a</p><p>probabilidade de ser registrado será cada vez menor. Observe que a amplitude do intervalo a</p><p>ser colocado depende do instrumento e da experiência do operador.</p><p>4. A dimensão do ponteiro (ou da marcação no instrumento) também introduz uma grandeza</p><p>de influência no mensurando que pode ser representada por uma distribuição triangular.</p><p>Afinal se, na utilização de um equipamento analógico pede-se que o valor seja um dos valores</p><p>marcados no equipamento, o operador tende a colocar o ponteiro “exatamente” sobre a</p><p>marcação. Ou seja, a probabilidade de ser o valor pedido é máxima em um ponto e tende a ser</p><p>reduzida à medida que o ponteiro sai desta marcação. Este tipo de distribuição existe em</p><p>instrumentos que reduzem o efeito da paralaxe a praticamente zero, com o uso de espelhos</p><p>ou de projeção luminosa do ponteiro sobre a escala. Neste caso, a amplitude “2a” está</p><p>associada à espessura do ponteiro.</p><p>5.3- A distribuição normal</p><p>Uma propriedade desejada para o uso na representação de um resultado é que haja</p><p>uma forma simples de se obter e representar o intervalo para o valor verdadeiro de um</p><p>mensurando. Em muitos casos, isto ocorrerá para mensurandos que são determinados a partir</p><p>de inúmeras grandezas que também possuem valores verdadeiros dentro de intervalos.</p><p>A solução para isto é a utilização da distribuição normal. A soma, subtração,</p><p>multiplicação, divisão e outras operações de duas ou mais grandezas que possuem este tipo de</p><p>distribuição resultam em intervalos que podem ser estimados sempre a partir das variâncias</p><p>das distribuições das grandezas que compõem o mensurando.</p><p>Mas o que é a distribuição normal? Para defini-la com rigor teremos inicialmente que</p><p>definir a função densidade de probabilidade de uma distribuição.</p><p>5.3.1-Função densidade de probabilidade de uma distribuição</p><p>Como mostrado na distribuição retangular, o tamanho da classe escolhida no exemplo</p><p>define a probabilidade do valor pertencer a esta classe. Entretanto, a divisão entre a</p><p>probabilidade da classe e o tamanho da classe é constante.</p><p>Para tornar o exemplo mais didático, vamos supor que o número do exemplo</p><p>possuísse a unidade de metros. Se houver 10 classes, a probabilidade é de 10 %: cada classe</p><p>com uma largura de 0,1m (a variável aleatória exemplificada possui um valor entre 0 m e 1 m,</p><p>dividida em 10 classes: largura da classe (1-0)/(10). A relação entre a probabilidade da classe e</p><p>sua largura seria 100 %/m. Se fossem 100 classes, seria 1% por 0,01m, resultando em 100%/m.</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>18</p><p>A figura abaixo representa a função densidade de probabilidade desta distribuição, para dois</p><p>números distintos de classes: 10 e 100.</p><p>Fonte: elaborado pelo autor</p><p>Observe que a distribuição é sempre uniforme. Se o número de classes tende a</p><p>infinito, pode-se definir uma função de densidade de probabilidade uniforme e igual a:</p><p>f= 100%/m</p><p>Naturalmente, a integral de 0 m a 1 m seria 100%, afinal todos os valores estão dentro</p><p>deste intervalo. Para se calcular o valor da probabilidade do mensurando estar em uma</p><p>determinada classe, basta multiplicar f pela largura da classe.</p><p>Se o número de classes se tornar infinito, a probabilidade de ocorrência de qualquer</p><p>valor é zero. Por outro lado, se quisermos saber a probabilidade do valor do mensurando estar</p><p>entre x1 e x2 bastar fazer a integração da função de</p><p>densidade de probabilidades entre estes</p><p>dois limites:</p><p>!(�</p><p>≤ � < ��) = $ %(�)���&</p><p>�'</p><p>Define-se a função probabilidade acumulada F como:</p><p>( = !(−∞ < � < ��) = $ %(�)���&</p><p>*+</p><p>Naturalmente, a integral de 0 m a 1 m da distribuição retangular seria 100%, afinal</p><p>todos os valores estão dentro deste intervalo.</p><p>A função triangular do exemplo, com número de classes tendendo a infinito, seria:</p><p>0</p><p>20</p><p>40</p><p>60</p><p>80</p><p>100</p><p>120</p><p>0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0</p><p>%</p><p>/m</p><p>Número estimado (m)</p><p>Valor da função densidade de probabilidade uniforme, discretizada em 10 e 100</p><p>classes</p><p>100 classes</p><p>10 classes</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>19</p><p>f = x.100%, para 0≤x<1</p><p>f = (2-x)*100%, para 1≤x<2</p><p>f = 0 para os outros intervalos.</p><p>com x sendo o valor da variável aleatória, em metros (Ver figura abaixo).</p><p>Fonte: elaborado pelo autor</p><p>A função de densidade de probabilidade normal é uma função contínua (figura abaixo)</p><p>que segue a equação:</p><p>%(�, -, .) = 1√20.� 12*</p><p>(�*3)&�4& 5, −∞ < � < ∞, . > 0.</p><p>sendo µ a média e σ o desvio padrão que caracterizam a distribuição.</p><p>0</p><p>20</p><p>40</p><p>60</p><p>80</p><p>100</p><p>120</p><p>-0,5 0 0,5 1 1,5 2 2,5</p><p>%</p><p>/m</p><p>Soma de dois números estimados (m)</p><p>Valor da função de densidade de probabilidade triangular</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>20</p><p>Fonte: elaborado pelo autor</p><p>Demonstra-se que a variância da distribuição normal é calculável a partir do</p><p>conhecimento do valor do desvio padrão σ. Por outro lado, se o número de pontos medido for</p><p>infinito o desvio padrão pode ser calculado por:</p><p>. = √��</p><p>Observe que se uma grandeza apresenta uma distribuição normal, sua incerteza</p><p>padrão, tal como definida na norma, será igual ao valor do desvio padrão.</p><p>5.3.2- Usando a distribuição normal em engenharia</p><p>Suponhamos que um engenheiro queira projetar um elevador para 16 passageiros e</p><p>que seja confortável18 para a maioria (90%?) das pessoas que o usem. E que conforto esteja</p><p>definido como sendo:</p><p>- o passageiro não deve ser obrigado a abaixar a cabeça para entrar no elevador ou</p><p>permanecer nele;</p><p>- o passageiro não deve ser obrigado a sair do elevador por excesso de peso, apesar do</p><p>número de passageiros ser menor ou igual ao nominal.</p><p>Sabe-se que a população da região onde o elevador será instalado possui uma altura</p><p>média de 1,75 m (incluindo as diversas opções de altura do salto de sapato) e que a</p><p>distribuição das alturas pode ser representada por uma normal com desvio padrão de 0,15 m.</p><p>Sabe-se também que a massa média é de 75 kg com distribuição aproximadamente normal</p><p>com desvio de 10 kg (incluindo homens e mulheres).</p><p>18</p><p>As condições de projeto de um elevador estão sujeitas a diversas normas nacionais que restringem as</p><p>opções do engenheiro.</p><p>0%</p><p>5%</p><p>10%</p><p>15%</p><p>20%</p><p>25%</p><p>30%</p><p>35%</p><p>40%</p><p>45%</p><p>-3 -2 -1 0 1 2 3</p><p>Probabilidade</p><p>(%/x)</p><p>x</p><p>Função densidade de probalidade "normal", para</p><p>média = 0 e desvio padrão = 1</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>21</p><p>Para o cálculo da altura do elevador (e do batente da porta), basta calcular a integral</p><p>da função densidade de probabilidade de alturas da população até o valor que resulte em 0,9</p><p>(90%). É aceitável que a função densidade de probabilidade a ser usada seja a normal, com</p><p>média de 1,75 e desvio padrão de 0,15m.</p><p>Já para o cálculo da força que o motor (cabos, etc...) deve suportar, devemos</p><p>considerar que o que interessa é a distribuição da média de 16 passageiros. Ou seja, grupos de</p><p>16 passageiros, apesar de alguns terem peso acima da média, tendem a ter um peso igual a</p><p>16x75kg = 1200 kg, com um desvio padrão calculado pela equação de propagação de</p><p>variâncias:</p><p>�9�::� ;<</p><p>= ><::?�: @A�B�:� = 16 �>?>AC�çã?�</p><p>Ou na forma, mais comum:</p><p>.Fé�H� �1 IJ�KL� �1 M�F��ℎL "�" = .população√�</p><p>Assim, para o cálculo do motor, teríamos uma massa média do grupo de 16 pessoas igual a</p><p>(1200 +/-40) kg, com o intervalo representando a incerteza padrão de uma distribuição</p><p>normal. Observe que o mesmo valor pode ser obtido multiplicando por 16 o valor do</p><p>mensurando “massa média de pessoas em grupos de 16”, cuja função densidade de</p><p>probabilidade possui média de 75 kg, e desvio padrão de 2,5 kg.</p><p>5.3.3- Estimando os valores médios e o desvio padrão de um determinado mensurando</p><p>Antes de mais nada, devemos ter certeza que a distribuição normal é a que representa</p><p>suficientemente bem a população de interesse (por exemplo, tamanho de peças ou altura de</p><p>pessoas).</p><p>Por exemplo, para conhecer a distribuição das alturas de pessoas, devemos medir a</p><p>população. Suponhamos que o mensurando (h) seja a altura de uma pessoa medida com um</p><p>instrumento digital de resolução de 4 cm (para ficar visível no gráfico...). Na abcissa temos os</p><p>valores possíveis do mensurando. Na ordenada, temos o número de pessoas da população que</p><p>está em cada uma das classes definidas pelo mensurando.</p><p>Para fins de comparação, na figura abaixo foram superpostas duas linhas contínuas:</p><p>uma supondo que a distribuição deste mensurando fosse normal e outra, que fosse retangular.</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>22</p><p>Fonte: elaborado pelo autor</p><p>Naturalmente, nem a distribuição normal nem a distribuição uniforme, e</p><p>provavelmente nenhuma outra conhecida, representa exatamente a distribuição dos valores</p><p>do mensurando. Supor que a distribuição é retangular elimina alturas que existem na</p><p>população. Supor que é normal, acrescenta alturas que não existem (pela definição de</p><p>distribuição normal, a probabilidade da altura ser negativa (entre – infinito e zero) não é</p><p>zero!).</p><p>Por outro lado, a distribuição normal possui só dois parâmetros, ambos de fácil</p><p>estimativa: valor médio e desvio padrão. Além disso, ela facilita a identificação de intervalos de</p><p>outros mensurandos que dependam da altura. Normalmente, esta é a função densidade de</p><p>probabilidade utilizada.</p><p>Em engenharia, na maioria das vezes não se conhecem exatamente todos os valores</p><p>que o mensurando pode assumir. Apesar de sabermos que um comprimento de uma peça</p><p>nunca é negativo, saber exatamente o seu valor é impossível (exigiria um processo de medição</p><p>com instrumentos de resolução infinita, entre outros absurdos). Além disso, dentro de uma</p><p>determinada faixa, o valor possível para o mensurando pode ser qualquer um, de forma</p><p>contínua.</p><p>Por outro lado, se supusermos que a distribuição dos valores do mensurando é</p><p>normal, em torno de uma média e com um desvio padrão, ambos estimáveis, torna-se simples</p><p>estimar estes valores.</p><p>A média de um mensurando com distribuição normal corresponde à estimativa do</p><p>valor mais provável deste mensurando. Estatisticamente, prova-se que o valor mais provável</p><p>para a média da distribuição de um mensurando com distribuição normal, é a média de “n”</p><p>medidas realizadas em uma amostra. A figura a seguir mostra o efeito de “n” números na</p><p>média calculada. Os números foram gerados aleatoriamente no Matlab, utilizando uma função</p><p>adequada para isto (normrnd). O valor médio esperado é zero e desvio padrão 1.</p><p>0</p><p>200</p><p>400</p><p>600</p><p>800</p><p>1000</p><p>1200</p><p>1400</p><p>1,30 1,40 1,50 1,60 1,70 1,80 1,90 2,00 2,10</p><p>Q</p><p>u</p><p>a</p><p>n</p><p>ti</p><p>d</p><p>a</p><p>d</p><p>e</p><p>d</p><p>e</p><p>p</p><p>e</p><p>ss</p><p>o</p><p>a</p><p>s</p><p>n</p><p>a</p><p>c</p><p>la</p><p>ss</p><p>e</p><p>Mensurando altura (m)</p><p>Altura da população de uma cidade</p><p>Distribuição Normal</p><p>Numero de pessoas</p><p>em cada classe</p><p>Distribuição Uniforme</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>23</p><p>Fonte: elaborado pelo autor</p><p>Já estimar o desvio padrão do mensurando a partir de uma amostra é um pouco mais</p><p>difícil. O gráfico a seguir foi traçado para mostrar o efeito do tamanho da amostra (“n”) no</p><p>comportamento da equação da variância s2, obtendo-se então o desvio padrão, a partir de:</p><p>U�� = V∑ (�� − �̅)����</p><p>(� − 1)</p><p>Fonte: elaborado pelo autor</p><p>10</p><p>0</p><p>10</p><p>1</p><p>10</p><p>2</p><p>10</p><p>3</p><p>10</p><p>4</p><p>-0.3</p><p>-0.2</p><p>-0.1</p><p>0</p><p>0.1</p><p>0.2</p><p>0.3</p><p>0.4</p><p>0.5</p><p>0.6</p><p>0.7</p><p>Número de pontos</p><p>V</p><p>al</p><p>or</p><p>m</p><p>éd</p><p>io</p><p>Média de n ptos gerados aleatóriamente, segundo uma distribuição normal.</p><p>10</p><p>0</p><p>10</p><p>1</p><p>10</p><p>2</p><p>10</p><p>3</p><p>10</p><p>4</p><p>0</p><p>0.2</p><p>0.4</p><p>0.6</p><p>0.8</p><p>1</p><p>1.2</p><p>1.4</p><p>Número de pontos</p><p>D</p><p>es</p><p>vi</p><p>o</p><p>P</p><p>ad</p><p>ra</p><p>o</p><p>Desvio padrão de n ptos gerados aleatóriamente, segundo uma distribuição normal.</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>24</p><p>No gráfico abaixo está a representação do mensurando (valor médio) em função do</p><p>número de pontos gerados, utilizando como barra de erro o valor do desvio padrão (√s2) dos</p><p>dados obtidos. Lembre-se que neste exemplo, o valor médio real da população é zero, e o</p><p>desvio padrão possui valor 1 19.</p><p>Fonte: elaborado pelo autor</p><p>Neste exemplo, mostra-se que a média de poucos números (menos que algumas</p><p>dezenas) não permite representar com boa exatidão o valor do mensurando “média da</p><p>população” (o que equivale à média de infinitos pontos, ou, ao menos, de todos os pontos de</p><p>uma determinada “população”). Há formas estatísticas para estimar o intervalo de forma mais</p><p>adequada, como por exemplo, utilizando-se a distribuição de Student para estimar a variância</p><p>da população a partir da variância da amostra, em função do tamanho da amostra [ISOGUM].</p><p>5.3.4- Exemplos de distribuições normais</p><p>1. Um tipo de mensurando, que possui distribuição que tende a ser normal, é a combinação de</p><p>“n” quaisquer grandezas de influência, particularmente quando seus intervalos são finitos</p><p>[VUOLO].</p><p>1.a) A temperatura TebulSP na qual a água da torneira entra em ebulição, neste momento, nas</p><p>condições de uma cozinha típica de São Paulo é um mensurando que depende de diversos</p><p>outros: pressão atmosférica do local (em uma cidade como São Paulo, há diferenças de</p><p>19</p><p>Como os números foram gerados aleatoriamente, é improvável que com poucos números gerados a</p><p>média ou o desvio padrão sejam “próximos” dos valores de referência da função (neste exemplo, “0” e</p><p>“1”, respectivamente). Isto pode ser visto no gráfico. O efeito do número de pontos no desvio padrão</p><p>em geral é tão grande que a incerteza padrão de um mensurando de uma distribuição normal</p><p>(numericamente igual ao desvio padrão do mesmo mensurando), por norma, nunca deve ter mais do</p><p>que dois algarismos, independentemente do número de medições.</p><p>10</p><p>0</p><p>10</p><p>1</p><p>10</p><p>2</p><p>10</p><p>3</p><p>10</p><p>4</p><p>-1.5</p><p>-1</p><p>-0.5</p><p>0</p><p>0.5</p><p>1</p><p>1.5</p><p>2</p><p>Número de pontos</p><p>V</p><p>al</p><p>or</p><p>d</p><p>o</p><p>m</p><p>en</p><p>su</p><p>ra</p><p>nd</p><p>o</p><p>Valor médio de variáveis aleatórios com distribuição normal</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>25</p><p>pressão por diversas razões); composição da água (conforme a composição, mesmo a</p><p>definição de temperatura de ebulição deve ser refinada, pois líquidos multifásicos não</p><p>possuem apenas uma temperatura de ebulição); o método de medição da temperatura</p><p>(incluindo cuidado na homogeneização da amostra, tipo e massa do termômetro utilizado); o</p><p>método de garantir que todas as medições sejam feitas no mesmo instante (“neste momento”</p><p>é uma definição difícil de ser realizada) etc. Com todas as grandezas de influência deste</p><p>mensurando, se forem realizadas “n” medições, provavelmente chegaremos a um valor para</p><p>TebulSP que apresentará uma distribuição “suficientemente normal”, com variância sXYZ[\]^� . O</p><p>desvio padrão desta distribuição “quase normal” poderia ser estimado por .TebulSP = dsTebulSP2 20.</p><p>1.b) Considere agora que o mensurando TMEDIOebulSP seja a média de 5 medições representando</p><p>o mensurando TebulSP em 5 lugares suficientemente separados geograficamente entre eles. O</p><p>mensurando TMEDIOebulSP também tenderá a ter uma distribuição normal, ou seja, se ele for</p><p>medido 100 vezes (500 medições de TebulSP), estes 100 valores tenderão a ter uma distribuição</p><p>normal. Demonstra-se que a média dessas 100 medidas de TMEDIOebulSP tenderá a ser a média de</p><p>todas as TebulSP. Já o desvio padrão destas 100 medidas tenderá a ser o desvio padrão</p><p>.TMedioebulSP = 4TebulSP√h . Esta propriedade, o desvio padrão de um mensurando que é a média de</p><p>“n” medidas é o desvio padrão das “n” medidas, dividido por raiz de “n”, torna interessante</p><p>definir mensurandos que sejam a média de outro mensurando. Afinal, quanto maior o “n”,</p><p>mais constante é o valor da raiz da variância dos resultados e mais nos aproximamos do desvio</p><p>padrão da população, um número constante. Como o desvio padrão da média de “n” medições</p><p>é calculado pelo desvio padrão dividido pela raiz de “n”, no limite, o desvio padrão da média</p><p>seria “zero”. O problema para seu uso em engenharia é o custo de se realizar “n” medições.</p><p>1.c) Considere que o mensurando possua um valor verdadeiro totalmente exato. Ele exigiria</p><p>uma definição extremamente precisa, ou melhor, a incerteza dita definicional (ligada à sua</p><p>definição) deveria ser zero. Por exemplo: o comprimento de uma linha21 de material insensível</p><p>à temperatura, medida com um instrumento exato22. Suponhamos que o instrumento de</p><p>medição também seja exato, mas que o operador (não muito treinado!) leia valores diferentes</p><p>distribuídos de forma aproximadamente normal. Neste caso, quanto maior for o número de</p><p>medições, mais a média se aproximará do valor verdadeiro, e menor será a incerteza da</p><p>medição. O desvio padrão da média das leituras tende a ser a incerteza padrão da medição.</p><p>1.d) Consideremos agora que queremos saber o comprimento de uma barra, cujas superfícies</p><p>não são ideais (não são perfeitamente paralelas, são rugosas etc.) ainda usando o instrumento</p><p>ideal. Aumentar o número de medições não trará mais informações sobre o valor verdadeiro</p><p>deste comprimento: ele não existe sem um intervalo! Aumentar o número de medições, por</p><p>20</p><p>Seria interessante (e econômico) não ser necessário fazer “n” medições. Vamos ver que, conhecendo</p><p>as incertezas padrão de cada uma das grandezas de influência, poderemos estimar a incerteza padrão</p><p>do mensurando com apenas uma medida de cada grandeza de influência.</p><p>21</p><p>Se fosse uma barra, a definição deveria incluir o paralelismo exato entre os planos de corte da barra.</p><p>22</p><p>A exatidão certamente estaria limitada, ao menos, a dimensões nas quais o comprimento do átomo</p><p>não interviesse no valor do mensurando. Afinal, este comprimento, quando definido, é uma grandeza</p><p>com variação estocástica.</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>26</p><p>outro lado, permitirá conhecer com maior precisão o valor do intervalo que abrange os</p><p>comprimentos possíveis da barra. Se quisermos que esta barra encaixe em um determinado</p><p>vão, naturalmente poderemos calcular a probabilidade disto acontecer, se conhecermos a</p><p>distribuição normal dos comprimentos medidos, com respectivo valor médio e desvio padrão.</p><p>1.e) Suponhamos que queremos calcular o volume da barra do exemplo 1.d. Podemos dizer</p><p>que, apesar do seu comprimento não ser exato, seu volume pode ser. Assim, apesar dela não</p><p>possuir um “único comprimento” o volume calculado a partir do comprimento médio de “n”</p><p>medidas certamente tende a ser o valor verdadeiro do volume desta barra (o valor verdadeiro</p><p>do volume da barra é exato!). Comparando este exemplo com o anterior vemos que:</p><p>- a média de “n” medidas é um excelente indicador do comprimento da barra para fins de</p><p>engenharia (tanto para conhecimento deste mensurando, quanto para cálculo do volume);</p><p>- a utilização do “desvio padrão das ‘n’ medidas” ou do “desvio padrão da média de ‘n’</p><p>medidas” é uma escolha dependente da aplicação (para descrever o comprimento da barra, é</p><p>mais adequado o desvio padrão; para o cálculo do volume, bastaria utilizar o desvio padrão da</p><p>média).</p><p>1.f) Um erro comum no uso do valor médio e do desvio padrão é quando há uma tendência</p><p>nas medições, não considerada na definição do intervalo no momento da medição. Voltemos</p><p>ao caso da barra ideal. Se o operador experiente utilizar um micrômetro para a realização da</p><p>medição, provavelmente ele sempre medirá o mesmo valor e a incerteza será apenas aquela</p><p>associada à exatidão do micrômetro. Por outro lado, se um operador não posicionar as faces</p><p>do micrômetro paralelas às da barra, ele</p><p>poderá medir valores maiores que o valor verdadeiro,</p><p>mas não há como ele medir valores menores! Assim a tendência é haver uma dispersão de</p><p>valores, que serão sempre maiores que o valor verdadeiro. Resumindo, apenas com</p><p>experiência é que se torna possível o uso do desvio padrão de medições para definir um</p><p>intervalo que tenha uma probabilidade conhecida de abranger o valor verdadeiro.</p><p>2. Em engenharia a maioria dos resultados de “n” medidas pode ser considerada como tendo</p><p>uma distribuição normal, apesar dela apresentar probabilidade não nula de ser negativa, ou</p><p>próxima ao infinito. Há algumas exceções que exemplificam isto:</p><p>2.a) A altura da população de uma cidade e outras grandezas relacionados a seres bissexuais</p><p>não raramente podem ser consideradas bimodais [SCHILLING]: há a média das alturas das</p><p>mulheres e dos homens (ver figura ilustrativa abaixo).</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>27</p><p>Figura Histograma “vivo” da altura de 143 estudantes da Universidade de Connecticut</p><p>(mulheres vestidas de branco e homens vestidos de preto).</p><p>Fonte: Adaptado de [SCHILLING].</p><p>2.b) Para a avaliação das condições de crescimento de um garoto(a) há gráficos (ver abaixo)</p><p>que mostram a probabilidade acumulada em função da altura ou do “peso” (massa em kgf)</p><p>[CDC]. Observe que 50% dos garotos de 20 anos possuem altura menor que 1,765 m. A</p><p>simetria do percentil acumulado de 5% e 95% indica que a curva normal é uma representação</p><p>razoável da distribuição real. Observe que 50% dos garotos possuem peso menor que 70,5 kgf.</p><p>Por outro lado os percentis 5% e 95% não são simétricos em relação ao valor de 50%,</p><p>indicando que a curva não é normal. Neste caso, dizer que 50% dos garotos têm peso maior</p><p>que 70,5 kfg, e 50%, menor, não indica que o peso médio é de 70,5 kgf. Para aplicações de</p><p>engenharia, normalmente a suposição de normalidade tanto para altura, como para massa,</p><p>em geral é suficiente. Naturalmente, esta suposição precisa ser revista se o engenheiro estiver</p><p>desenvolvendo algum equipamento médico.</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>28</p><p>Fonte: Adaptado de [CDC].</p><p>2.c) Ensaios de número de falhas em relação a alguma tensão (no sentido de esforço grande</p><p>sobre a peça, seja por tensão elétrica, mecânica, radiação, etc) costumam possuir uma</p><p>distribuição “log normal”23. Isto ocorre, pois, a partir de uma determinada ordem de grandeza</p><p>da tensão, o número de falhas sobe exponencialmente (ou seja, a distribuição de “log” do</p><p>número de falhas é mais ou menos normal).</p><p>2.d) Em ensaios do tipo “peças com defeito”, a avaliação é do tipo passa ou não passa. O</p><p>mensurando “número de peças com defeito” possui o que se denomina de distribuição</p><p>binomial. À medida que o número de peças tende a infinito, a aproximação normal passa a ser</p><p>adequada. Ou seja, pode-se definir um número médio de falhas, e um intervalo confiável</p><p>baseado na raiz quadrada da variância da distribuição.</p><p>2.e) Distribuições que possuem muitos valores próximos a zero, não são definidas para valores</p><p>negativos e cuja variância é muito grande são mal representadas pela distribuição normal.</p><p>Nestes casos uma distribuição de Weibull costuma ser mais adequada. Um exemplo é a</p><p>velocidade do vento, necessária para estimar a energia eólica de uma determinada região. Esta</p><p>distribuição tenderá a ser bem representada por uma normal, quando o valor médio for muito</p><p>maior que a variância.</p><p>23</p><p>Se y=log(x), e se x for “log normal”, y é normal. A multiplicação de distribuições normais tende a ser</p><p>log normal, mas são bem aproximadas pela normal.</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>29</p><p>6- Considerações finais</p><p>Nesta apostila foi visto que o conhecimento da distribuição estatística de um</p><p>mensurando é fundamental para representá-lo. Não basta conhecer o seu valor mais provável,</p><p>mas é fundamental conhecer o intervalo no qual o valor verdadeiro se encontra, com</p><p>probabilidade conhecida. Para isto, é necessária experiência de quem especifica o que quer</p><p>medir.</p><p>Em seguida cabe a pergunta: se conheço todas as grandezas que interferem na</p><p>definição de um mensurando e como elas interferem na determinação do seu valor, como</p><p>determinar o mensurando e sua distribuição? Ou, utilizando a terminologia do vocabulário</p><p>internacional de metrologia: como calcular a “incerteza-padrão combinada”24 a partir das</p><p>diversas grandezas de influência do meu mensurando?</p><p>A resposta será dada em outra apostila (BC1707- “Expressão de valores experimentais”).</p><p>7- Referências</p><p>[CDC] Gráfico de altura-idade e peso-idade, disponível em www.cdc.gov/growthcharts,</p><p>acessado em 31/01/2015.</p><p>[CODATA] Disponível em http://www.codata.org/committees-and-groups/fundamental-</p><p>physical-constants</p><p>[ISO17025] http://www.inmetro.gov.br/credenciamento/acre_lab.asp, acessado em</p><p>27/01/2015.</p><p>[ISOGUM] Avaliação de dados de medição - Guia para a expressão de expressão de incerteza</p><p>de medição – GUM2008. Disponível em</p><p>http://www.inmetro.gov.br/inovacao/publicacoes/gum_final.pdf, acessado em 23/01/2015.</p><p>[Kyriazis] “Uso do termo probabilidade de abrangência”, Gregory Kyriazis, Valter Y. Aibe, João</p><p>A. Pires Alves, Renato N. Teixeira e Dalni M. E. Santo Filho. NOTA TÉCNICA DO COMITÊ DE</p><p>AVALIAÇÃO DA INCERTEZA DE MEDIÇÃO. Disponível em</p><p>http://www.inmetro.gov.br/noticias/conteudo/nt04.pdf , acessado em 23/01/2015.</p><p>[LAW] “Law of large numbers”, disponível em</p><p>http://en.wikipedia.org/wiki/Law_of_large_numbers]</p><p>[SCHILLING] Is Human Height Bimodal? Mark F. SCHILLING, Ann E. WATKINS, and Wiliam</p><p>WATKINS. The American Statistician, August 2002, Vol. 56, No. 3, pp 223-229. (consultado em</p><p>23/01/15 em http://www.biostat.jhsph.edu/bstcourse/bio751/papers/bimodalHeight.pdf)</p><p>[VUOLO] VUOLO, J. H. Fundamentos da teoria de erros. Editora Edgard Blücher, 2a edição, São</p><p>Paulo, 1996.</p><p>24 Incerteza-padrão combinada: Incerteza-padrão obtida ao se utilizarem incertezas-padrão individuais</p><p>associadas às grandezas de entrada num modelo de medição.</p><p>Métodos Experimentais em Engenharia</p><p>30</p><p>[VALORDEPI] “Chronology of computation of pi”. Disponível em</p><p>http://en.wikipedia.org/wiki/Chronology_of_computation_of_%CF%80, Acessado em</p><p>23/01/2015</p><p>[VIM] Vocabulário Internacional de Metrologia: conceitos fundamentais e gerais de termos</p><p>associados (VIM 2012). Duque de Caxias, RJ: INMETRO, 2012. 94 p.</p><p>Autor</p><p>Apostila elaborada pelo prof. Julio Carlos Teixeira e revisada pela profa. Denise Consonni.</p>