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<p>LÍNGUA PORTUGUESA:</p><p>CLASSES DE PALAVRAS</p><p>AULA 5</p><p>Prof. Caio Augusto Lima de Castro</p><p>2</p><p>CONVERSA INICIAL</p><p>Anteriormente, vimos o quão complexa é a definição de palavra, mesmo</p><p>no âmbito da morfologia, que é o módulo gramatical que se destina a investigá-</p><p>la mais detidamente. Contudo, isso não impede que análises morfológicas sejam</p><p>realizadas. Nesta aula, portanto, voltaremos nossa atenção para a estrutura das</p><p>palavras da língua portuguesa e, para tanto, ela está organizada da seguinte</p><p>maneira:</p><p> Tema 1 – Morfemas;</p><p> Tema 2 – Estruturas morfológicas: radical e raiz;</p><p> Tema 3 – Estruturas morfológicas: afixos;</p><p> Tema 4 – Estruturas morfológicas: vogal temática e tema;</p><p> Tema 5 – Estruturas morfológicas: desinências.</p><p>Desejamos que, ao final da aula, você possa ter uma visão geral dos</p><p>elementos que constituem as palavras da língua portuguesa e que tenha uma</p><p>introdução aos conceitos básicos e aos princípios de análise da morfologia.</p><p>TEMA 1 – MORFEMAS</p><p>Para dar início ao estudo dos morfemas da língua portuguesa, vamos</p><p>tomar como ponto de partida as ocorrências apresentadas a seguir:</p><p>1. a) canta</p><p>b) cantava</p><p>c) cantávamos</p><p>O que se mantém e o que se altera entre (1a), (1b) e (1c)? Para facilitar a</p><p>nossa visualização, apresentamos no Quadro 1 uma sugestão de segmentação</p><p>para cada um dos itens em (1).</p><p>Quadro 1 – Segmentação do verbo cantar 1</p><p>canta</p><p>canta va</p><p>canta va mos</p><p>3</p><p>A princípio, vemos que o segmento canta se mantém nas três ocorrências.</p><p>Por sua vez, o segmento va não está presente em (1a) e mos só se encontra em</p><p>(1c). À primeira vista, a divisão apresentada está bem estabelecida, mas será</p><p>isso verdade? Vamos ver o que ocorre se acrescentarmos mais um elemento ao</p><p>paradigma:</p><p>2. a) canta</p><p>b) canto</p><p>c) cantava</p><p>d) cantávamos</p><p>E agora? Certamente, a inserção de (2b) nos leva a uma pequena</p><p>alteração na proposta de segmentação do primeiro quadro.</p><p>Quadro 2 – Segmentação do verbo cantar 2</p><p>cant (a) a</p><p>cant (a) o</p><p>cant a va</p><p>cant a va mos</p><p>Com toda a certeza, a cada elemento segmentado, você é capaz de inferir</p><p>um significado, não é verdade? Vamos tentar explicitar esses significados?</p><p>Comecemos comparando (2c) e (2d). Confrontando cantava e cantávamos,</p><p>sabemos que (2d) indica uma ação desempenhada por mais de uma pessoa,</p><p>incluindo aquele que enuncia. O segmento mos é o termo que nos indica isso.</p><p>Por sua vez, comparando (2a) e (2c), vemos que cantava é uma ação</p><p>ocorrida no passado e ela, de certa forma, se prolonga1. O segmento que nos</p><p>permite chegar a essa conclusão é va.</p><p>Já o segmento cant, presente em todo o paradigma, denota a ação de se</p><p>expressar por meio do som musical produzido pela voz humana. E o segmento</p><p>a2? Este indica que o verbo cantar pertence à primeira conjugação. Da</p><p>comparação entre (2a) e (2b), concluímos que o segmento o indica que a ação</p><p>1 Note a diferença entre cantava e cantou. Aqui, temos envolvida uma noção de aspecto, conceito</p><p>semântico sobre o qual não trataremos nessa discussão.</p><p>2 Na tabela, o fenômeno fonológico de apagamento da vogal temática em canta e canto está</p><p>indicado por (a).</p><p>4</p><p>de cantar foi realizada pela primeira pessoa, no modo indicativo; e o segmento</p><p>a, que a ação foi realizada pela terceira pessoa, também no modo indicativo.</p><p>Neste momento, é possível que você esteja se questionando sobre o que</p><p>esse exercício tem a ver com morfologia e o que nos ajuda a entender sobre os</p><p>morfemas. Então, vamos lá! De acordo com Gonçalves (2019), a morfologia se</p><p>ocupa do estudo da palavra considerando sua estrutura e formação. Ao</p><p>estabelecermos a segmentação das palavras de (1a-c) e (2a-d), nos deparamos</p><p>com os “elementos mínimos significativos” das palavras, ou seja, os morfemas.</p><p>Estes, por sua vez, correspondem à unidade básica de análise da morfologia.</p><p>Outra noção relacionada aos morfemas é o conceito de morfe. Assim, se</p><p>definimos um morfema considerando a semântica, isto é, o significado, a</p><p>definição de morfe está relacionada à representação fonética de determinado</p><p>morfema. Como afirma Gonçalves (2019, p. 28), “por serem entidades abstratas,</p><p>morfemas se concretizam por meio de morfes, aqui entendidos como sua</p><p>representação fonética; constituem a maneira como os morfemas são</p><p>pronunciados, sua concretização efetiva na língua através da fala”.</p><p>TEMA 2 – ESTRUTURAS MORFOLÓGICAS: RADICAL E RAIZ</p><p>Nosso ponto de partida para o estudo das estruturas morfológicas serão</p><p>as ocorrências apresentadas a seguir:</p><p>1. a) mar</p><p>b) s</p><p>Tanto (1a) quanto (1b) são morfemas do português. Mas seriam eles da</p><p>mesma natureza? Repare que mar é uma palavra que denota alguma entidade</p><p>no mundo. Algo como representado na Figura 1.</p><p>5</p><p>Figura 1 – Mar</p><p>Fonte: Songchai W/Shutterstock.</p><p>Já o morfema s refere-se a algo no mundo tal qual mar? Evidentemente</p><p>que isso não é verdade. A designação do morfema s diz respeito a algo</p><p>exclusivamente gramatical, ou seja, remete-nos à ideia de plural. Isso nos</p><p>mostra, portanto, que, embora (1a) e (1b) sejam morfemas, eles não pertencem</p><p>ao mesmo conjunto. Logo, dentro dos estudos morfológicos, dizemos que (1a)</p><p>integra o grupo dos chamados morfemas lexicais e (1b) o dos morfemas</p><p>gramaticais. Nas palavras de Gonçalves (2019, p. 41), os morfemas lexicais</p><p>“veiculam conteúdo que diz respeito ao universo biossocial”, por sua vez, os</p><p>morfemas gramaticais “dizem respeito a significados que especializam as</p><p>noções veiculadas pelos lexicais”.</p><p>Isso posto, vamos considerar o seguinte par de palavras.</p><p>pedra - pedraria</p><p>Se fôssemos “desmontar” as palavras apresentadas, considerando o que</p><p>entre elas há em comum em suas partes, alguém poderia sugerir o seguinte</p><p>arranjo:</p><p>2. a) pedra</p><p>b) pedra-ria</p><p>Como vemos, encontraríamos o termo pedra como o elemento comum</p><p>entre as duas ocorrências. Motivo por esse paradigma, poderíamos pensar que</p><p>pedra é um morfema, isto é, “elemento mínimo significativo de uma palavra”,</p><p>6</p><p>conforme vimos anteriormente. Contudo, essa hipótese é verdadeira? Para</p><p>respondermos à pergunta colocada, vamos introduzir ao paradigma outro</p><p>elemento, conforme apresentado a seguir.</p><p>pedra - pedraria - pedreiro</p><p>Segmentando as palavras, buscando encontrar aquele elemento que lhes</p><p>é comum, encontramos, agora, o seguinte arranjo:</p><p>3. a) pedr-a</p><p>b) pedr-a-ria</p><p>c) pedr-eiro</p><p>Portanto, é o morfema pedr o elemento comum às palavras apresentadas.</p><p>Atente ao fato de que é ele o “elemento originário e irredutível que concentra a</p><p>significação dos vocábulos formais” (Gonçalves, 2019, p. 42). Logo, afirmamos</p><p>que pedr é um radical, visto que radical, em morfologia, “é a palavra despojada</p><p>de todas as suas marcas flexionais e derivacionais” (Gonçalves, 2019, p. 42).</p><p>Neste momento, cabe voltarmos nossa atenção para um conceito que</p><p>está associado ao de radical, porém não são sinônimos absolutos, podendo</p><p>causar uma certa confusão para aquele que inicia os estudos na área da</p><p>morfologia. Trata-se do conceito de raiz. A confusão se justifica pelo fato da raiz</p><p>também se remeter ao elemento irredutível que porta a significação das palavras</p><p>que constituem uma família linguística, todavia, a partir de um viés diacrônico.</p><p>Para ilustrar tal afirmação, Kedhi (1993) traz como exemplo os itens</p><p>associados à palavra comer. Repare o paradigma:</p><p>comedouro - comida - comilona - comilança</p><p>Ao segmentarmos as palavras do conjunto apresentado em busca do</p><p>elemento irredutível significativo, sincronicamente temos o seguinte arranjo:</p><p>4. a) com-e-douro</p><p>b) com-i-da</p><p>c) com-i-lona</p><p>d) com-i-lança</p><p>7</p><p>Assim, com corresponde ao radical. Todavia, sob uma perspectiva</p><p>diacrônica, o resultado a que chegamos não é esse. Etimologicamente, a palavra</p><p>comer deriva do verbo latino edere, o que nos leva à raiz ed, algo bem diferente</p><p>de com, não é verdade?</p><p>Vimos até este ponto as noções de radical e raiz, estando o primeiro</p><p>associada a uma perspectiva sincrônica e o segundo, a um viés diacrônico.</p><p>Tratamos também da subdivisão dos morfemas em morfemas lexicais e</p><p>morfemas gramaticais. No próximo tema, discutiremos sobre os afixos.</p><p>TEMA 3 – ESTRUTURAS MORFOLÓGICAS: AFIXOS</p><p>Para iniciar nosso estudo sobre os afixos, vamos observar com atenção</p><p>as palavras apresentadas a seguir:</p><p>1. a) sorveteiro</p><p>b) crueldade</p><p>c) lentamente</p><p>d) saboroso</p><p>Sob o ponto de vista morfológico, certamente você é capaz de observar</p><p>que a um determinado radical, presente em cada uma das ocorrências, foi</p><p>acrescentado um morfema. Quais foram esses morfemas? Antes de prosseguir</p><p>a leitura, anote em algum lugar sua resposta e, em seguida, confira se acertou.</p><p>Vamos lá!</p><p>Se você anotou sua resposta em algum lugar, acreditamos que tenha</p><p>respondido algo como: eiro; dade; mente; oso. Muito bem! Agora, vamos à outra</p><p>questão: o que esses morfemas têm em comum?</p><p>Caso você esteja buscando encontrar alguma propriedade semântica</p><p>partilhada entre os referidos morfemas, será difícil chegar a um denominador</p><p>comum, visto que cada qual traz consigo um significado particular. Repare que</p><p>eiro, em (1a), refere-se a uma profissão; dade, em (1b), designa uma qualidade</p><p>ou estado, formando um substantivo abstrato; em (1c), mente indica o modo</p><p>como a ação foi realizada; e, finalmente, em (1d), oso remete à abundância.</p><p>Descartando-se, pois, um critério semântico, o que encontramos em comum</p><p>entre esses morfemas?</p><p>Perceba que todos os morfemas apresentados em (1a-d) aparecem após</p><p>o radical, não é verdade? Pois bem, essa é uma propriedade que caracteriza os</p><p>8</p><p>chamados sufixos. Assim, parafraseando Kedhi (1993), sufixo é o afixo que vem</p><p>posposto ao radical.</p><p>Agora, consideremos o próximo conjunto de palavras:</p><p>2. a) desleal</p><p>b) bicampeão</p><p>c) recomeçar</p><p>d) coordenar</p><p>Também aqui, nas ocorrências em (2a-d), verificamos que a um radical</p><p>foi acrescentado um morfema. Quais foram eles? Se você pensou como resposta</p><p>os morfemas: des, bi, re e co, você acertou! E o que eles apresentam em</p><p>comum? Alguém poderia insistir que a semântica possa ser um bom critério para</p><p>encontrarmos uma resposta à questão. No entanto, perceba que des, presente</p><p>em (2a), denota oposição; bi, em (2b), indica duplicidade; re, em (3c), remete-</p><p>nos à noção de repetição; e, por fim, co, em (2d), significa companhia,</p><p>simultaneidade. Sendo assim, a semântica, mais uma vez, não é o melhor</p><p>caminho para respondermos à pergunta colocada.</p><p>Porém, analisando a posição desses morfemas nas formações em (2a-d),</p><p>verificamos que todos aparecem antes dos radicais. Pois bem, essa é uma</p><p>particularidade partilhada entre os chamados prefixos. Assim, mais uma vez</p><p>parafraseando Kedhi (1993), os prefixos correspondem aos morfemas que</p><p>antecedem os radicais.</p><p>Isso posto, podemos, então, afirmar que afixos são “os morfemas que se</p><p>anexam ao radical para mudar-lhe o sentido (por exemplo, fazer/des-fazer) ou</p><p>acrescentar-lhe uma ideia secundária (livro/livr-eco)” (Kedhi, 1993, p. 27).</p><p>Além da posição que ocupam na estrutura das palavras, sufixos e prefixos</p><p>se diferenciam por outras questões. A primeira delas pode ser verificada nas</p><p>ocorrências a seguir:</p><p>3. a) começar/recomeçar</p><p>b) leal/desleal</p><p>c) feliz/felizmente</p><p>d) ágil/agilizar</p><p>Começamos nossa análise considerando as formações (3a) e (3b), pois é</p><p>nelas que se encontram os prefixos re e des. Sob o ponto de vista das classes</p><p>de palavras, a que classe pertencem os termos nelas presentes? Como vemos,</p><p>9</p><p>em (3a) nos encontramos diante de dois verbos. Por sua vez, em (3b), estamos</p><p>diante de dois adjetivos. Será que o mesmo é verificado em (3c) e (3d)?</p><p>Primeiramente, atentemo-nos para o fato de que essas construções</p><p>apresentam os sufixos mente e izar. Agora, considerando a perspectiva das</p><p>classes de palavras, qual é a classe dos termos nelas apresentados? Note que</p><p>em (3c), encontramos um adjetivo (feliz) e um advérbio (felizmente); por sua vez,</p><p>em (3d), temos um adjetivo (ágil) e um verbo (agilizar). Dessa observação,</p><p>concluímos, pois, que a inserção de prefixos não provoca mudança de classe de</p><p>palavra, contudo, a inserção de sufixos sim. Assim, mudança de classe se</p><p>constitui em uma das diferenças entre prefixo e sufixo.</p><p>Continuando nosso estudo, observemos as próximas ocorrências</p><p>apresentadas:</p><p>4. a) natação</p><p>b) chatice</p><p>c) papelaria</p><p>d) abatimento</p><p>e) planetário</p><p>f) consultório</p><p>Se somos falantes nativos do português brasileiro, não temos dificuldades</p><p>em determinar o gênero das palavras apresentadas em (4a-f), não é mesmo?</p><p>Vejamos que em (4a-c), os sufixos ção; ice e ria especificam palavras do gênero</p><p>feminino. Já em (4d-f), os sufixos mento; ário e tório especificam palavras do</p><p>gênero masculino. Essa propriedade não é verificada entre os prefixos. Como</p><p>afirma Gonçalves (2019, p. 53), “por sua posição à esquerda, prefixos jamais</p><p>respondem por esse tipo de informação”. Portanto, a especificação de gênero é</p><p>outra diferença existente entre prefixos e sufixos.</p><p>A última diferença que iremos destacar entre os referidos afixos pode ser</p><p>observada nas próximas ocorrências:</p><p>5. a) megapromoção</p><p>b) recomeçar</p><p>c) contrapiso</p><p>d) francês</p><p>e) furadeira</p><p>f) frentista</p><p>10</p><p>Sob uma perspectiva sintático-semântica, percebemos que em (5a), o</p><p>prefixo mega equivale a um adjetivo, pois não se trata de qualquer promoção,</p><p>mas uma bastante grande. Em (5b), o prefixo re equivale a um advérbio, visto</p><p>que recomeçar é dar início a algo novamente. Em (5c), o prefixo contra é</p><p>equivalente a uma preposição, indicando, pois, uma posição.</p><p>Por sua vez, o sufixo ês, em (5d), denota uma nacionalidade, visto que</p><p>francês é aquele que nasceu na França. Em (5e), o sufixo exprime um</p><p>instrumento e em (5f), uma profissão. Assim sendo, conforme afirma Gonçalves</p><p>(2019, p. 57), “sufixos equivalem, em termos semânticos, a substantivos”.</p><p>Além dos sufixos e dos prefixos, existem outros afixos, tais como infixos,</p><p>circunfixos e transfixos, contudo, não os abordaremos aqui, visto que nosso</p><p>interesse se assenta sobre os morfemas do português brasileiro.</p><p>Vimos nesta seção os sufixos e os prefixos e as diferenças entre cada um</p><p>deles. Ambos fazem parte dos processos de formação de novas palavras, como</p><p>veremos na Aula 6. Avancemos nosso estudo para o próximo tema!</p><p>TEMA 4 – ESTRUTURAS MORFOLÓGICAS: VOGAL TEMÁTICA E TEMA</p><p>Para tratarmos do conceito de vogal temática, tomemos como ponto de</p><p>partida a nuvem de palavras a seguir apresentada:</p><p>Figura 2 – Nuvem de palavras 1</p><p>Nosso desafio é propor uma organização das palavras em subconjuntos,</p><p>de acordo com alguma propriedade morfológica partilhada entre elas. Uma</p><p>hipótese inicial poderia ser considerar a classe a que elas pertencem, contudo,</p><p>11</p><p>imediatamente esse princípio deve ser descartado, visto que todas integram a</p><p>classe dos substantivos.</p><p>Uma observação atenta do conjunto apresentado, porém, poderia nos</p><p>levar a considerar a terminação dessas palavras. Seguindo esse princípio, o</p><p>resultado seria algo como o apresentado no Quadro 3.</p><p>Quadro 3 – Segmentação das palavras conforme terminação</p><p>-a -e -o</p><p>casa ponte bolo</p><p>mapa poste ferro</p><p>rosa pente copo</p><p>cinema balde libido</p><p>Essa organização estabelecida levou em consideração o que, na</p><p>morfologia, denominamos vogal temática. De acordo com Kedhi (1993, p. 34),</p><p>“as vogais temáticas acrescentam-se, normalmente, ao radical para constituir</p><p>uma base, à qual são anexadas as desinências”. As vogais temáticas aqui</p><p>apresentadas — a, e e o — são chamadas de vogais temáticas nominais. A vogal</p><p>temática o apresenta uma variante u em formações como conceitual e ritual.</p><p>Em geral, quando os substantivos terminam em consoante, como ocorre</p><p>em mar, podem ser considerados atemáticos ou não, ou seja, isentos</p><p>de vogal</p><p>temática. Já aqueles que terminam em vogal que é tônica são considerados</p><p>atemáticos; é o caso de chalé e café.</p><p>Consideremos, neste instante, outro conjunto de palavras:</p><p>12</p><p>Figura 3 – Nuvem de palavras 2</p><p>Como no paradigma anterior, nosso desafio é organizar as palavras</p><p>apresentadas considerando alguma propriedade morfológica partilhada entre</p><p>elas. Visto que todas pertencem à classe dos verbos, o critério classe de</p><p>palavras deve ser descartado. Assim sendo, que tal seguirmos conforme o</p><p>raciocínio desenvolvido anteriormente? Atentos à terminação dos verbos,</p><p>poderíamos organizá-los conforme posto Quadro 4.</p><p>Quadro 4 – Segmentação das palavras conforme terminação</p><p>-ar -er -ir</p><p>cantar vender partir</p><p>falar perder sair</p><p>pensar esconder servir</p><p>pedalar merecer pedir</p><p>arrumar abastecer corrigir</p><p>Mais uma vez, essa organização levou em conta a vogal temática de cada</p><p>verbo. Logo, a, e e i são denominadas vogais temáticas verbais. Os verbos</p><p>terminados em ar correspondem à primeira conjugação; os terminados em er, à</p><p>segunda e os terminados em ir, à terceira. Como ocorre nas vogais temáticas</p><p>nominais, as vogais temáticas verbais também apresentam variantes, conforme</p><p>nos explica Kedhi (1993, p. 36). São elas: e e o, variantes da primeira</p><p>13</p><p>conjugação, tal qual verificamos em cantei — verbo na primeira pessoa do</p><p>singular no passado perfeito do modo indicativo — e em cantou, verbo na terceira</p><p>pessoa do singular no passado perfeito do modo indicativo. Outra variante,</p><p>correspondente à segunda conjugação, é a vogal i, a qual aparece em perdia,</p><p>passado imperfeito do indicativo; em perdi, primeira pessoa do singular no</p><p>passado perfeito do indicativo; e em perdido, particípio passado.</p><p>Para finalizarmos a discussão realizada nesta seção, cabe explicitarmos</p><p>o conceito de tema. Para tanto, vamos considerar os seguintes radicais:</p><p>1. a) cant</p><p>b) vend</p><p>c) part</p><p>d) ros</p><p>e) pent</p><p>Ao associarmos a eles suas vogais temáticas, temos como resultado algo</p><p>como: canta, vende, parti, rosa e pente. Ao produto a que chegamos, damos o</p><p>nome de tema. Assim, em morfologia, definimos tema como aquilo que obtemos</p><p>da união entre o radical e a vogal temática. Rocha Lima (2010, p. 247) afirma</p><p>que “ao tema assim constituído agregam-se-lhe desinências e sufixos, para</p><p>assinalar as flexões da palavra ou para a formação de termos derivados”. A</p><p>formação de derivados será vista na nossa última aula, por sua vez, as</p><p>desinências começarão a ser discutidas no próximo tema.</p><p>Vimos até aqui os conceitos de vogal temática e de tema. As vogais</p><p>temáticas se dividem em nominais e verbais e podem apresentar algumas</p><p>variantes, conforme estudamos. Passemos para último tema de nossa aula.</p><p>TEMA 5 – ESTRUTURAS MORFOLÓGICAS: DESINÊNCIAS</p><p>O estudo das desinências leva-nos a um tópico que discutimos quando</p><p>analisamos as classes de palavras. Naquela ocasião, dissemos que as palavras</p><p>se dividem entre aquelas que pertencem ao conjunto das que são variáveis e as</p><p>que integram o grupo das invariáveis. As primeiras alteram sua forma para</p><p>estabelecer as diferentes concordâncias, como a de gênero, no caso dos nomes,</p><p>e a de pessoa, no dos verbos. Por sua vez, as que são invariáveis não têm sua</p><p>morfologia modificada.</p><p>14</p><p>Dentro dessa perspectiva, vamos considerar as ocorrências apresentadas</p><p>a seguir:</p><p>1. a) menino</p><p>b) menina</p><p>c) gato</p><p>d) gata</p><p>Perceba que (1a) e (1c) apresentam palavras de gênero masculino e (1b)</p><p>e (1d) apresentam palavras de gênero feminino. Por motivos que não temos a</p><p>intenção de explicitar neste momento, dados os objetivos de nossa abordagem,</p><p>temos que a corresponde ao morfema que, em português brasileiro, designa o</p><p>gênero feminino. Por sua vez, é o chamado morfema zero3 que denota o gênero</p><p>masculino na língua portuguesa.</p><p>Agora, voltemos nossa atenção aos próximos exemplos:</p><p>2. a) casa</p><p>b) casas</p><p>c) bonito</p><p>d) bonitos</p><p>Podemos reparar que (2b) e (2c) trazem palavras que se encontram no</p><p>plural, o qual é marcado pelo morfema s. Assim sendo, temos que tanto a quanto</p><p>s correspondem a morfemas indicadores da alteração (portanto, da flexão) dos</p><p>substantivos e adjetivos (os chamados nomes). As informações que expressam</p><p>são estritamente gramaticais. A esses morfemas, damos o nome de desinências.</p><p>Nos casos apresentados desinência de gênero e desinência de número,</p><p>como afirma Lima (2010), são elas desinências típicas dos nomes.</p><p>Também é verdade que, assim como os nomes, os verbos se flexionam,</p><p>apresentando um conjunto de desinências. Entretanto, elas serão abordadas na</p><p>Aula 6.</p><p>Vimos aqui o conceito de desinência, que nada mais é do que o termo que</p><p>utilizamos para designar “os morfemas terminais das palavras variáveis” (Kedhi,</p><p>1993, p. 28). Apresentamos mais especificamente as desinências que são</p><p>próprias dos nomes, que são indicadoras de gênero e de número.</p><p>3 Falaremos sobre esse morfema mais especificamente na Aula 6.</p><p>15</p><p>NA PRÁTICA</p><p>Nesta aula, falamos de vários conceitos da morfologia. Agora, queremos</p><p>que você considere a seguinte família de palavras:</p><p>campestre - camponês - campo - campesino</p><p>Determine para esse grupo de palavras:</p><p>a) seu radical; sua raiz (aqui será preciso uma consulta à etimologia da</p><p>palavra);</p><p>b) a vogal temática;</p><p>c) os sufixos presentes.</p><p>Discuta com seus colegas se vocês chegaram às mesmas respostas.</p><p>FINALIZANDO</p><p>Vimos nesta aula alguns conceitos básicos da área da morfologia. Assim,</p><p>tratamos de definir os conceitos de morfema, morfe, radical, raiz, afixos, “prefixo”,</p><p>sufixo, vogal temática, tema e desinência. Como podemos notar, isso não é</p><p>pouca coisa. Por isso, caso esqueça algum deles, não se desespere. Nossa</p><p>intenção é, pouco a pouco, ir familiarizando você ao universo fascinante da</p><p>pesquisa morfológica. Volte quantas vezes forem necessárias a esta aula e,</p><p>lembre-se: estudar, discutir, tirar dúvidas, pesquisar é a melhor forma de</p><p>aprender. Bons estudos!</p><p>16</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>BECHARA, E. Moderna Gramática Portuguesa. 37. ed. Rio de Janeiro:</p><p>Lucerna, 2001.</p><p>GONÇALVES, C. A. Morfologia. São Paulo: Parábola, 2019.</p><p>KEDHI, V. Morfemas do português. 2. ed. São Paulo: Ática, 1993.</p><p>LIMA, C. H. R. Gramática Normativa da Língua Portuguesa. 48. ed. Rio de</p><p>Janeiro: José Olympio, 2010.</p>