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<p>16/01/2024, 21:41 A luta dos remanescentes de quilombos em Alcântara (MA) | Geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2017/01/05/a-luta-dos-remanescentes-de-quilombos-em-alcantara 1/17</p><p>--></p><p>INÍCIO 〉 GERAL</p><p>QUESTÃO AGRÁRIA</p><p>A luta dos remanescentes de quilombos em</p><p>Alcântara (MA)Alcântara</p><p>Há mais de 30 anos, famílias tiveram as terras tradicionais desapropriadas pelo governo</p><p>Paulo Hebmüller</p><p>Amazônia Real | 05 de janeiro de 2017 às 06:41</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>https://www.brasildefato.com.br/geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>16/01/2024, 21:41 A luta dos remanescentes de quilombos em Alcântara (MA) | Geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2017/01/05/a-luta-dos-remanescentes-de-quilombos-em-alcantara 2/17</p><p>Crianças da comunidade Itamatatiua - Paulo Hebmüller/AmReal</p><p>Hoje não se traz mais o barro do campo em potes equilibrados na cabeça, como nos</p><p>tempos da infância de dona Maria José de Jesus na comunidade remanescente de</p><p>quilombo de Itamatatiua, em Alcântara, no Maranhão. São quase oito décadas desde queAlcântara</p><p>ela se iniciou na prática do ofício de ceramista, tradicional na comunidade. “Comecei na</p><p>idade de uns oito anos. Todos tinham que trabalhar muito desde cedo. Não existiam</p><p>essas coisas de aposentadoria ou Bolsa-Família”, conta.</p><p>Aos 86 anos, dona Maria é uma das mais antigas moradoras do lugar e ainda</p><p>acompanha a manufatura das peças, hoje realizada principalmente no Centro de</p><p>Produção de Cerâmica, erguido há cerca de 25 anos. Ao seu lado, funcionam uma escola</p><p>para ensinar o trabalho com o barro e uma loja para a venda das peças.</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>16/01/2024, 21:41 A luta dos remanescentes de quilombos em Alcântara (MA) | Geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2017/01/05/a-luta-dos-remanescentes-de-quilombos-em-alcantara 3/17</p><p>Domingas de Jesus e Jesus, 65 anos, uma das �lhas de dona Maria, aprendeu a arte com</p><p>a mãe muito antes da existência do centro. “Eu tinha uns cinco anos e ela já nos</p><p>colocava para fazer as tirinhas com o barro. Depois ela ia fazendo os potinhos”, relata.</p><p>A produção era caseira, num forno próprio, e o pai saía para vender as peças. “Tinha</p><p>muito comprador”, lembra Domingas.</p><p>Um dos principais usos dos potes e vasos era o transporte de água. A situação mudou</p><p>com a adoção de poços artesianos e a chegada dos baldes de plástico. A venda caiu</p><p>bastante e, embora o trabalho tradicional com a cerâmica nunca tenha deixado de</p><p>existir, a criação da escola e do centro foi uma das formas de incentivar novamente a</p><p>produção, atualmente mais voltada para peças de artesanato vendidas aos visitantes.</p><p>A extração do barro é controlada pelas mulheres, que o retiram de diferentes partes do</p><p>campo e fazem uma espécie de “rodízio” para dar tempo de descanso e recuperação às</p><p>áreas de uso recente.</p><p>“Só as mais experientes escolhem os locais para retirar a argila. São elas que detêm o</p><p>saber de reconhecer o melhor barro para a feitura das peças”, explica em sua</p><p>dissertação de mestrado o antropólogo Davi Pereira Júnior, nascido na comunidade</p><p>Itamatatiua, que �ca a 90 km de distância de São Luís do Maranhão.</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>16/01/2024, 21:41 A luta dos remanescentes de quilombos em Alcântara (MA) | Geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2017/01/05/a-luta-dos-remanescentes-de-quilombos-em-alcantara 4/17</p><p>Dona Domingas de Jesus e Jesus (Foto: Paulo Hebmüller/AmReal)</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>16/01/2024, 21:41 A luta dos remanescentes de quilombos em Alcântara (MA) | Geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2017/01/05/a-luta-dos-remanescentes-de-quilombos-em-alcantara 5/17</p><p>As cerâmicas da comunidade Itamatatiua (Foto: Paulo Hebmüller/AmReal)</p><p>É também uma mulher, dona Neide de Jesus, 67 anos, a ocupante da mais elevada</p><p>posição de liderança da comunidade, a de “encarregada de terras”. As de�nições sobre</p><p>local de moradia para as cerca de 230 famílias, além da administração de outras</p><p>relações sociais e religiosas fundamentais no lugar, passam por dona Neide, que</p><p>assumiu a função após a morte do pai, seu Eurico, em 1992.</p><p>A desapropriação e a violação de direitos</p><p>Localizada a cerca de 70 km da sede do município de Alcântara – ao qual a forma maisAlcântara</p><p>rápida de chegar, vindo de São Luís, é a travessia de 22 km de barco pela baía de São</p><p>Marcos –, Itamatatiua é o principal povoado de uma rede de 42 comunidades que, para</p><p>os moradores, são “terras de Santa Teresa”.</p><p>Há mais de 30 anos as comunidades quilombolas estão envolvidas na luta por 62 mil</p><p>dos 85 mil hectares identi�cados como pertencentes ao território tradicional. Essas</p><p>terras foram desapropriadas pelo Governo do Estado do Maranhão para a construção do</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>16/01/2024, 21:41 A luta dos remanescentes de quilombos em Alcântara (MA) | Geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2017/01/05/a-luta-dos-remanescentes-de-quilombos-em-alcantara 6/17</p><p>Centro de Lançamento de Alcântara (CLA) da Força Aérea Brasileira (FAB), onde oAlcântara</p><p>governo federal desenvolve o programa aeroespacial com foguetes.</p><p>Para implantar o CLA em 1983, o governo deslocou 312 famílias quilombolas de suas</p><p>terras sem consultá-las, sem pagar indenizações ou reparar os danos sociais, culturais,</p><p>políticos e econômicos a elas. A violação de direitos dessas famílias foi denunciada, em</p><p>2008, na Organização Internacional do Trabalho, em Genebra, na Suíça.</p><p>Aproximadamente 70% dos 22 mil habitantes de Alcântara vivem na área rural, boaAlcântara</p><p>parte em comunidades quilombolas. De acordo com a Fundação Palmares, vinculada ao</p><p>Ministério da Cultura, o município concentra o maior número dessas comunidades</p><p>certi�cadas no Brasil: são 156.</p><p>A Comunidade Itamatatiua foi certi�cada em 2006, mas até agora as terras não foram</p><p>tituladas, etapa �nal do processo de regularização – por sinal, nenhum dos 39 títulos já</p><p>expedidos no Maranhão foi para Alcântara. O Instituto Nacional de Colonização eAlcântara</p><p>Reforma Agrária (Incra) é o responsável pela titulação das comunidades quilombolas.</p><p>Davi Pereira Júnior, atualmente em doutorado na Universidade do Texas, nos Estados</p><p>Unidos, diz que “falta vontade política” para efetivar as titulações. O principal entrave é</p><p>que parte do território quilombola identi�cado se sobrepõe a áreas incluídas nos</p><p>projetos de expansão do CLA.</p><p>Dos 62 mil hectares de terra desapropriados em benefício do CLA, a FAB diz que é em</p><p>uma área de 8.713 hectares que são realizadas as atividades operacionais. Com a</p><p>expansão das atividades e novos projetos de foguetes, a FAB está reivindicando uma</p><p>área de 12.646 hectares na região do litoral de Alcântara para o prosseguimento doAlcântara</p><p>Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE).</p><p>O problema é que essa expansão prevê novamente o deslocamento de famílias</p><p>remanescentes quilombolas das terras tradicionais.</p><p>Em nota enviada à agência  Amazônia Real, a FAB diz que para o CLA ocupar os 12.645</p><p>hectares adicionais no setor nordeste da península de Alcântara “foi acordada aAlcântara</p><p>construção de corredores de acesso e de estradas vicinais para os habitantes das</p><p>comunidades que forem remanejadas para uma área segura, não prejudicando aqueles</p><p>que vivem da pesca”.</p><p>Segundo o Ministério da Defesa, essas famílias seriam realocadas em uma área de 42</p><p>mil hectares “devolvida” dos 62 mil desapropriados do território tradicional na década</p><p>de 80. A proposta não foi aceita pelas comunidades e pelo Movimento dos Atingidos</p><p>pela Base Espacial de Alcântara (MABE).Alcântara</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>16/01/2024, 21:41 A luta dos remanescentes de quilombos em Alcântara (MA) | Geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2017/01/05/a-luta-dos-remanescentes-de-quilombos-em-alcantara 7/17</p><p>Em agosto passado, a Associação Brasileira de Antropologia (ABA), através do Comitê</p><p>Quilombos, divulgou uma nota pública manifestando o apoio à titulação de�nitiva do</p><p>território quilombola de  Alcântara, o reconhecimento e a demarcação dos 85</p><p>milAlcântara</p><p>hectares reivindicados pelas comunidades e pelo MABE.</p><p>“Os quilombolas de Alcântara entendem o território como direito fundamental eAlcântara</p><p>inegociável, entretanto re�ete o ‘preparo’ e o desconhecimento (…), o desrespeito aos</p><p>seus direitos, a constituição e a tratados internacionais por parte do Estado brasileiro</p><p>com suas constantes tentativas de expropriação do território quilombola”, diz a nota da</p><p>ABA.</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>16/01/2024, 21:41 A luta dos remanescentes de quilombos em Alcântara (MA) | Geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2017/01/05/a-luta-dos-remanescentes-de-quilombos-em-alcantara 8/17</p><p>Dona Eloísa Inês de Jesus nasceu na comunidade Itamatatiua (Foto: Paulo</p><p>Hebmüller/AmReal)</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>16/01/2024, 21:41 A luta dos remanescentes de quilombos em Alcântara (MA) | Geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2017/01/05/a-luta-dos-remanescentes-de-quilombos-em-alcantara 9/17</p><p>Enquanto o impasse não é resolvido e a titulação de�nitiva das terras não sai, o</p><p>território segue à espera do reconhecimento de�nitivo da sociedade nacional. Na atual</p><p>situação, os investimentos públicos o�ciais são limitados nas comunidades. Se eles</p><p>existissem, acredita a presidente da Associação de Mulheres de Itamatatiua, o problema</p><p>do êxodo dos jovens à procura de trabalho em outros lugares diminuiria.</p><p>“Se o governo investir alguma coisa dentro da comunidade para que o jovem não saia, é</p><p>melhor. Eu nasci e me criei aqui. Nunca tive vontade de sair”, a�rma dona Eloísa Inês</p><p>de Jesus, de 61 anos.</p><p>O processo de regularização fundiária</p><p>Largo da Igreja em Itamatatiua (Foto: Paulo Hebmüller/AmReal)</p><p>O artigo 68 das Disposições Transitórias da Constituição Federal determina que “aos</p><p>remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é</p><p>reconhecida a propriedade de�nitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos</p><p>respectivos”.</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>16/01/2024, 21:41 A luta dos remanescentes de quilombos em Alcântara (MA) | Geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2017/01/05/a-luta-dos-remanescentes-de-quilombos-em-alcantara 10/17</p><p>Como em tantos outros casos, o princípio expresso no texto de 1988 demorou a ser</p><p>regulamentado, o que só aconteceu de fato com a promulgação do Decreto 4.887,</p><p>assinado em 2003 pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e da Instrução</p><p>Normativa Número 57 do Incra, de 2009.</p><p>De acordo com a instrução, cabe ao Incra fazer “a identi�cação, o reconhecimento, a</p><p>delimitação, a demarcação, a desintrusão, a titulação e o registro imobiliário das terras</p><p>ocupadas pelos remanescentes das comunidades dos quilombos”. Os processos têm</p><p>início com a autode�nição da própria comunidade, que deve ser certi�cada pela</p><p>Fundação Palmares, vinculada ao Ministério da Cultura.</p><p>Até outubro de 2015, o Incra já havia expedido em todo o Brasil 190 títulos em 144</p><p>territórios, englobando 234 comunidades. No Maranhão, são 39 títulos, referentes a 37</p><p>territórios e 38 comunidades. Outros 337 processos de regularização estão abertos na</p><p>Superintendência Regional do Estado.</p><p>O número de áreas tituladas é considerado baixo por organizações que atuam junto aos</p><p>quilombolas. No Amazonas, por exemplo, as sete comunidades reconhecidas nunca</p><p>foram tituladas. A mais conhecida delas é o Tambor, no município de Novo Airão, que</p><p>recebeu certi�cação da Fundação Palmares há quase dez anos.</p><p>Certi�cada em 2006, Itamatatiua foi incluída num processo de titulação que reúne</p><p>outras comunidades de Alcântara e em sua tramitação já cumpriu a etapa de publicaçãoAlcântara</p><p>do Relatório Técnico de Identi�cação e Delimitação (RTID) no Diário O�cial da União</p><p>em novembro de 2008.</p><p>Entretanto, o processo de Itamatatiua está parado desde 2010 porque “há a</p><p>sobreposição de interesses do Estado” envolvendo o CLA, explica o antropólogo Roberto</p><p>Alves de Almeida, analista em Reforma e Desenvolvimento Agrário do Incra. “O</p><p>território quilombola identi�cado se sobrepõe, em parte, ao projeto de expansão dos</p><p>sítios de lançamento de foguetes”, diz.</p><p>O imbróglio envolve os ministérios do Desenvolvimento Agrário, ao qual está vinculado</p><p>o Incra, e os da Defesa e da Ciência, Tecnologia e Inovação. Enquanto o procedimento</p><p>de conciliação não terminar, continua Almeida, “não há como avançar nas demais fases</p><p>do processo: a publicação da portaria de reconhecimento e a titulação do território”.</p><p>O caso é bem anterior e se arrasta desde o início da década de 1980, ainda na ditadura</p><p>militar, com a instalação do então Núcleo do Centro de Lançamento de AlcântaraAlcântara</p><p>(NUCLA), em 1983. Entre 1986 e 87, 312 famílias as comunidades remanescentes foram</p><p>removidas das áreas desapropriadas para a base.</p><p>Em 1991, no governo Fernando Collor, um novo decreto ampliou de 52 mil para 62 mil</p><p>hectares o terreno destinado ao CLA – o que corresponde a mais de 40% da área total</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>16/01/2024, 21:41 A luta dos remanescentes de quilombos em Alcântara (MA) | Geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2017/01/05/a-luta-dos-remanescentes-de-quilombos-em-alcantara 11/17</p><p>do município de Alcântara –, abarcando parte de territórios identi�cados comoAlcântara</p><p>quilombolas.</p><p>Já em 2009 havia sido constituída uma Câmara de Conciliação e Arbitragem da</p><p>Administração Federal na Advocacia-Geral da União para mediar a discussão de</p><p>sobreposição de interesses do Estado, na qual o Ministério da Defesa e o Incra</p><p>defendiam posições opostas. A comissão incluiu também representantes da Secretaria-</p><p>Geral da Presidência, da Casa Civil, do Ministério  do Desenvolvimento Agrário, da</p><p>Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e do Estado-Maior da</p><p>Aeronáutica, entre outros órgãos.</p><p>O território sagrado</p><p>Dona Maria José de Jesus (Foto: Paulo Hebmüller/AmReal)</p><p>Originalmente habitada por índios tupinambás, a região dos atuais municípios de</p><p>Alcântara e Bequimão começou a ser colonizada entre o �nal do século 16 e início do 17Alcântara</p><p>por franceses, logo expulsos pelos portugueses. Como parte da política de ocupação do</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>16/01/2024, 21:41 A luta dos remanescentes de quilombos em Alcântara (MA) | Geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2017/01/05/a-luta-dos-remanescentes-de-quilombos-em-alcantara 12/17</p><p>vasto território, a distribuição de sesmarias pela Coroa Portuguesa incluiu também a</p><p>participação de ordens religiosas.</p><p>A Companhia de Jesus e as ordens de Nossa Senhora do Carmo e de Nossa Senhora das</p><p>Mercês detinham vastas unidades produtivas na região, como fazendas especialmente</p><p>voltadas ao cultivo de algodão. Dominada por senhores de escravos, de engenho e de</p><p>plantações, em meados do século 18, Alcântara era considerada a vila mais prósperaAlcântara</p><p>nesta região da Amazônia Legal.</p><p>Essa situação não perdurou por muito tempo, entretanto. Nas décadas seguintes, fatores</p><p>como a expulsão dos jesuítas dos domínios portugueses, em 1759, e a crise do modo de</p><p>produção baseado em grande propriedade, monocultura e mão de obra escrava levaram</p><p>a um rápido declínio do lugar e à desagregação das fazendas.</p><p>Como aponta o antropólogo Alfredo Wagner Berno de Almeida, professor da</p><p>Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e coordenador do grupo de pesquisa Nova</p><p>Cartogra�a Social da Amazônia, no decorrer do século 19 as propriedades de AlcântaraAlcântara</p><p>consistiam, na maior parte dos casos, em símbolos de um poder que efetivamente não</p><p>mais se baseava nelas, porque seus donos viviam em São Luís ou no Rio de Janeiro,</p><p>exercendo cargos públicos ou tentando a carreira política.</p><p>Com a derrocada do algodão e, mais tarde, dos engenhos de cana-de-açúcar, as ordens</p><p>religiosas e os ricos produtores abandonaram enormes extensões das áreas ou as</p><p>entregaram a moradores, agregados e índios destribalizados. Escravos e ex-escravos –</p><p>libertos ou aquilombados – também se mantiveram nas terras.</p><p>Essa ocupação deu origem a várias territorialidades especí�cas, como as “terras de</p><p>preto” e as “terras de santo”. Na de�nição de Berno de Almeida, as “terras de preto”</p><p>correspondem a domínios doados, entregues</p><p>ou adquiridos por famílias de ex-escravos,</p><p>com ou sem formalização jurídica, e a concessões feitas pelo Estado a essas famílias,</p><p>cujos descendentes permanecem ali há várias gerações.</p><p>Já as “terras de santo” resultam da desagregação das grandes extensões pertencentes à</p><p>Igreja. Nelas, há “uma legitimação jurídica de fato destes domínios, onde o santo</p><p>aparece representado como proprietário legítimo, a despeito das formalidades legais</p><p>requeridas pelo código da sociedade nacional”, ressalta o professor Alfredo Berno de</p><p>Almeida  (as de�nições constam do livro “Terras tradicionalmente ocupadas”, disponível no</p><p>site  Nova Cartogra�a Social da Amazônia).</p><p>A área da fazenda de Itamatatiua, abandonada pelos religiosos da Ordem do Carmo</p><p>ainda na primeira metade do século 19, passou a ser considerada propriedade de Santa</p><p>Teresa D’Ávila – a reformadora carmelita do século 16, canonizada em 1622 pelo papa</p><p>Gregório XV.</p><p>http://novacartografiasocial.com/</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>16/01/2024, 21:41 A luta dos remanescentes de quilombos em Alcântara (MA) | Geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2017/01/05/a-luta-dos-remanescentes-de-quilombos-em-alcantara 13/17</p><p>O antropólogo Davi Pereira Júnior considera que tornar as terras patrimônio da santa foi</p><p>também uma estratégia dos ex-cativos das ordens para se identi�car como seus</p><p>“legítimos herdeiros” e impedir que essas áreas �cassem à disposição do mercado.</p><p>Promessas, ladainhas, batuques e principalmente a grande festa no mês de outubro são</p><p>algumas das marcas das fortes relações dos moradores da comunidade com Santa</p><p>Teresa. “Os mais velhos contam que os primeiros que vieram trouxeram a santa e</p><p>�zeram a promessa que, se não saíssem mais, iam consagrar a festa para ela”, diz dona</p><p>Eloísa Inês de Jesus, outra liderança feminina: é a presidente da Associação de Mulheres</p><p>de Itamatatiua, responsável pelo Centro de Produção de Cerâmica. “Por isso é que temos</p><p>a assinatura da santa”, explica. Os moradores preferem chamá-la de Teresa D’Ávila de</p><p>Jesus, origem da “assinatura” citada por dona Eloísa. Os “de Jesus” são um dos quatro</p><p>principais troncos familiares da comunidade.</p><p>É o núcleo central do povoado, denominado  sítio, que expressa as maiores dimensões</p><p>sociais e simbólicas nas “terras da santa”. Ali é, por assim dizer, a “morada” de Santa</p><p>Teresa, com a igreja dedicada a ela, a cruz no largo, o cemitério, a tribuna da festa em</p><p>sua homenagem, a escola, uma quadra de esporte e outros marcos. “Um território</p><p>sagrado e consagrado às relações sociais entre a Santa e seus devotos, a�lhados,</p><p>parentes e demais moradores da sua terra”, de�ne Pereira Júnior.</p><p>O que diz a Força Aérea Brasileira</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>16/01/2024, 21:41 A luta dos remanescentes de quilombos em Alcântara (MA) | Geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2017/01/05/a-luta-dos-remanescentes-de-quilombos-em-alcantara 14/17</p><p>Lançamento de foguete da base de Alcântara (Foto: ABR)Alcântara</p><p>A reportagem da  Amazônia Real  enviou perguntas sobre o con�ito fundiário envolvendo</p><p>as comunidades quilombolas de Alcântara com o CLA ao Centro de Comunicação SocialAlcântara</p><p>da Aeronáutica. Leia a íntegra das respostas da Força Aérea Brasileira.</p><p>Qual a posição da Força Aérea Brasileira em relação à questão das áreas nas quais há</p><p>projetos de ampliação do CLA, mas que foram identi�cadas, em parte, como territórios</p><p>remanescentes de quilombos?</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>16/01/2024, 21:41 A luta dos remanescentes de quilombos em Alcântara (MA) | Geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2017/01/05/a-luta-dos-remanescentes-de-quilombos-em-alcantara 15/17</p><p>O Comando da Aeronáutica não questiona o direito legítimo das comunidades</p><p>remanescentes de quilombos em relação à titulação de terras. Contudo, existe a</p><p>necessidade de expansão futura da área rumo à faixa litorânea a nordeste da península</p><p>de Alcântara para que possa ser dada continuidade a projetos espaciais estratégicos paraAlcântara</p><p>todo o País.</p><p>Atualmente, o Centro de Lançamento de Alcântara (CLA) dispõe de uma área de 8.713Alcântara</p><p>hectares para a realização das suas atividades operacionais. Com a expansão das</p><p>atividades e novos projetos de foguetes, a área atualmente disponibilizada se tornará</p><p>insu�ciente, exigindo outras áreas no litoral de Alcântara para o prosseguimento doAlcântara</p><p>Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE).</p><p>Há uma previsão para solução do impasse?</p><p>Em 2009, foi constituída a Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração</p><p>Federal (CCAF), no âmbito da Advocacia-Geral da União (AGU), para mediar a discussão</p><p>de sobreposição de interesses do Estado. De um lado, o Ministério da Defesa defendendo</p><p>a utilização da área como um futuro sítio de lançamento. No outro, o Instituto Nacional</p><p>de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) de�nindo a área como parte de</p><p>remanescentes de quilombos. Após a constituição dessa comissão, constituída por</p><p>representantes da Secretaria Geral da Presidência da República, da Casa Civil, do</p><p>Ministério do Desenvolvimento Agrário, do INCRA, da Fundação Cultural Palmares, da</p><p>Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), do Ministério da</p><p>Defesa, do Estado-Maior da Aeronáutica (EMAER) e do Departamento de Ciência e</p><p>Tecnologia Aeroespacial (DCTA), várias reuniões foram realizadas, e houve um consenso</p><p>entre os participantes, favorável ao pleito do CLA em ocupar os 12.645 hectares</p><p>adicionais, no setor nordeste da península.</p><p>Para isso, foi acordada a construção de corredores de acesso e de estradas vicinais para</p><p>os habitantes das comunidades que forem remanejadas para uma área segura, não</p><p>prejudicando aqueles que vivem da pesca.</p><p>Em 2015, foram retomadas as reuniões num Grupo de Trabalho (GT), com a mesma</p><p>representatividade anterior, com o objetivo de rati�car o consenso alcançado no CCAF. O</p><p>grupo trabalha para elaborar um plano estratégico nacional composto de ações a serem</p><p>realizadas ao longo de 2016.</p><p>Qual a proposta e quais as ações da FAB para solucionar o impasse?</p><p>O GT, com representantes de todos os órgãos envolvidos no processo, trabalha para</p><p>apresentar alternativas para implementação do acordo. O GT realizará visitas às</p><p>comunidades quilombolas, com intuito de ouvir e consultar seus interesses e demandas</p><p>e de analisar os impactos psicossociais, para a melhor solução para ambas as partes</p><p>envolvidas.</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>16/01/2024, 21:41 A luta dos remanescentes de quilombos em Alcântara (MA) | Geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2017/01/05/a-luta-dos-remanescentes-de-quilombos-em-alcantara 16/17</p><p>Quais são os objetivos da ampliação do CLA e por que ela é importante?</p><p>A ampliação do CLA é importante para o País adquirir a competência no lançamento de</p><p>satélites que atendam às demandas da Estratégia Nacional de Defesa, a serem</p><p>incorporadas ao PNAE e futuras versões do Veículo Lançador de Satélite (VLS) com</p><p>maior desempenho. Esses projetos possibilitarão ao Brasil dominar, com tecnologia</p><p>própria, o ciclo de desenvolvimento, produção, lançamento e inserção em órbita de</p><p>satélites nacionais por meio de um centro de lançamento situado em território</p><p>brasileiro. Isso representará autonomia no acesso ao espaço e nos permitirá avanços de</p><p>estudos e pesquisas multidisciplinares, além de facilitar o acesso à internet, telefonia</p><p>móvel e TV digital nos mais distantes rincões do Brasil, bem como melhorias na</p><p>educação, na saúde e em outros serviços de caráter público.</p><p>Além disso, o Programa Espacial propicia avanços na previsão climatológica que</p><p>favorecem a prevenção de desastres naturais e incrementos na produtividade agrícola,</p><p>no controle de desmatamentos e incêndios �orestais, no monitoramento de fronteiras</p><p>terrestres e marítimas, no controle de tráfego aéreo, em estudos geofísicos, dentre</p><p>inúmeros outros que bene�ciam a sociedade.</p><p>Como aconteceu a desapropriação dos 62 mil hectares de terras?</p><p>Para que o CLA fosse construído em Alcântara, uma área de 62.000 hectares foiAlcântara</p><p>declarada de utilidade pública pelo Governo Federal. Por questões de segurança, em</p><p>meados da década</p><p>de 1980, 312 famílias foram remanejadas para sete comunidades</p><p>agrícolas construídas pelo então Ministério da Aeronáutica: as agrovilas de Cajueiro,</p><p>Espera, Peptal, Peru, Ponta Seca, Marudá e Só Assim.</p><p>Houve uma preocupação, à época, de que as comunidades fossem agrupadas. Seguindo a</p><p>sua própria organização social, os grupos já existentes e as agrovilas preservaram os</p><p>nomes dos povoados originais. As agrovilas foram concebidas de forma a dispor de</p><p>escola, de igreja, de centro social, de casa de farinha e de lavanderia, além de terem</p><p>sido construídas casas de alvenaria com banheiro, água encanada e luz elétrica,</p><p>diferentemente das habitações originais, que tinham parede de barro e cobertura de</p><p>palha.</p><p>Desde então, o CLA tem procurado manter um relacionamento com as comunidades, por</p><p>meio de ações cívico-sociais, proporcionando atendimento de saúde e educação para a</p><p>cidadania. Além disso, o CLA é o principal empregador do município e estimula a</p><p>criação de empregos indiretos. O CLA é também o maior gerador de impostos para a</p><p>administração municipal que, juntamente aos governos estadual e federal, devem prover</p><p>educação, saúde e políticas públicas para a população local.</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p><p>16/01/2024, 21:41 A luta dos remanescentes de quilombos em Alcântara (MA) | Geral</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2017/01/05/a-luta-dos-remanescentes-de-quilombos-em-alcantara 17/17</p><p>Edição: ---</p><p>RELACIONADAS</p><p>Mais de 90% das terras quilombolas ainda não possuem titulação</p><p>Impacto na luta dos povos indígenas e quilombolas será dramático,</p><p>dizem especialistas</p><p>Maicá (PA): O quilombo que parou um porto</p><p>    </p><p>  </p><p>Todos os conteúdos de produção exclusiva e de autoria editorial do Brasil de Fato podem ser</p><p>reproduzidos, desde que não sejam alterados e que se deem os devidos créditos.</p><p>https://apoie.brasildefato.com.br/?utm_source=site&utm_medium=bannersite&utm_campaign=apoiase</p><p>https://apoie.brasildefato.com.br/?utm_source=site&utm_medium=bannersite&utm_campaign=apoiase</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2016/11/22/mais-de-90-das-terras-quilombolas-ainda-nao-possuem-titulacao</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2016/11/22/mais-de-90-das-terras-quilombolas-ainda-nao-possuem-titulacao</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2016/07/07/entidades-debatem-relacao-de-michel-temer-com-agronegocio</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2016/07/07/entidades-debatem-relacao-de-michel-temer-com-agronegocio</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2016/06/20/o-quilombo-que-parou-um-porto</p><p>https://www.brasildefato.com.br/2016/06/20/o-quilombo-que-parou-um-porto</p><p>https://www.facebook.com/brasildefato</p><p>https://www.twitter.com/brasildefato</p><p>https://www.youtube.com/c/AgenciaBrasildeFato</p><p>https://www.instagram.com/brasildefato/</p><p>https://www.brasildefato.com.br/rss2.xml</p><p>https://creativecommons.org/licenses/by-nd/4.0/deed.pt_BR</p><p>https://creativecommons.org/licenses/by-nd/4.0/deed.pt_BR</p><p>https://creativecommons.org/licenses/by-nd/4.0/deed.pt_BR</p><p>https://creativecommons.org/licenses/by-nd/4.0/deed.pt_BR</p><p>https://www.brasildefato.com.br/</p>

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