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<p>UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL</p><p>INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS</p><p>CURSO DE FILOSOFIA</p><p>RICARDO GORON CIDADE</p><p>TRABALHO(1) DA DISCIPLINA DE INTRODUÇÃO À FILOSOFIA</p><p>PORTO ALEGRE - RS</p><p>1. Como Platão define o sofista no diálogo Sofista (apresentar de modo dissertativo</p><p>as seis definições de sofista)?</p><p>No diálogo "Sofista", Platão apresenta seis definições diferentes do sofista, cada uma</p><p>caracterizando uma faceta específica dessa figura, até hoje controversa, na Grécia Clássica.</p><p>Para caracterizar os sofistas e analisar e classificar devidamente o que eles seriam, Platão</p><p>escreve em linguagem clara em vários capítulos relativamente curtos, muitos cujo título do</p><p>próprio capítulo entrega a possível conclusão dialética sobre uma característica do sofista.</p><p>Quem seria o sofista? Ele pode ser considerado um profissional, no sentido de representar</p><p>uma classe de uma profissão? Como ele se difere e se assemelha ou não ao filósofo? Para</p><p>responder a essas e outras prováveis perguntas, Platão cria um diálogo primoroso que nos</p><p>permite mergulhar profundamente na identidade do Sofista— para começar definindo as seis</p><p>principais caracterisiticas de sofistas, são elas:</p><p>1. Caçador de jovens e ignorantes. Nesta definição, Platão descreve o sofista como alguém</p><p>que se aproveita da inexperiência e da ingenuidade dos jovens para ganho pessoal, seja</p><p>financeiro ou de prestígio. Isso ressalta a preocupação de Platão com a manipulação</p><p>intelectual e moral dos indivíduos menos instruídos.</p><p>2. Retórico ou orador. Platão acaba por caracterizar o sofista como alguém habilidoso na arte</p><p>da persuasão e do discurso voltado mais ao público do que a apenas uma pessoa privada. Ele</p><p>enfatiza que os sofistas são mestres na técnica da argumentação, sem necessariamente se</p><p>preocupar com a veracidade das informações passadas ao público— essas que são voltadas ao</p><p>convencimento e não à verdade por ser verdade.</p><p>3. Sofiata Dialética. Platão sugere que o sofista é alguém que se envolve em “sofismas”, ou</p><p>seja, argumentos que parecem corretos superficialmente e “visualmente”, mas que são</p><p>logicamente falaciosos quando examinados em sua totalidade. Essa definição destaca a crítica</p><p>de Platão aos argumentos enganosos e à falta de rigor intelectual dos sofistas. Nota-se, como</p><p>destaque, que nessa definição seria traçada a linha divisória entre o que seria o trabalho de</p><p>um filósofo.</p><p>4. Imitador e feitor de simulacros. Nesta definição, Platão apresenta o sofista como alguém</p><p>que cria uma aparência de conhecimento sem realmente possuí-lo de fato. Os sofistas são</p><p>comparados a artesãos que produzem falsas imagens visuais de sabedoria e de virtude</p><p>humana, sem um verdadeiro compromisso com esses valores ético-morais.</p><p>5. Vendedor de conhecimento. Nesse ponto, Platão retrata o sofista como alguém que vende</p><p>seus ensinamentos e habilidades em troca de dinheiro. Isso sugere uma crítica à</p><p>comercialização do conhecimento e à falta de sinceridade intelectual dos sofistas, que</p><p>colocam o lucro acima da busca pela verdade.</p><p>6. Ser de natureza ou aparência. Na última definição de sofista, Platão aborda a questão</p><p>ontológica do sofista, sugerindo que ele é alguém cuja natureza é difícil de definir</p><p>precisamente. Isso reflete a complexidade e a ambiguidade que Platão percebe na figura do</p><p>sofista.</p><p>Após uma análise criteriosa das características dos sofistas, cabe a formação da</p><p>respectiva crítica de Platão, bem como um aprofundamento em seu entendimento do papel</p><p>social do Sofifta. Primeiramente, ele realiza uma crítica à retórica e ao relativismo moral.</p><p>Platão e outros filósofos, como Sócrates e Aristóteles, criticaram os sofistas por promoverem</p><p>uma visão relativista da verdade e da moralidade, enfatizando a importância de princípios</p><p>universais e objetivos na filosofia, como a busca do bem, do belo e da verdade última.</p><p>Segundamente, o desenvolvimento da filosofia como disciplina sistemática nessa época</p><p>acarretou em uma possível crítica de Platão aos sofistas para contribuir para o</p><p>desenvolvimento da filosofia como uma disciplina rigorosa e sistemática, preocupada com a</p><p>busca pela verdade e pelo conhecimento genuíno. Por último, destaca-se que os ensinamentos</p><p>e métodos dos sofistas tiveram um impacto significativo na educação e na política da Grécia</p><p>antiga. Compreender suas ideias nos permite examinar como essas influências moldaram o</p><p>pensamento e a prática social da época.</p><p>2. Como Platão apresenta a possibilidade de existência de discursos falsos no</p><p>diálogo Sofista? Por que este é um problema filosófico que acarretaria em um possível</p><p>parricídio?</p><p>No diálogo "Sofista" de Platão,é apresentada a possibilidade de existência de</p><p>discursos falsos de maneira crítica e profunda. Para isso, Platão explora como os sofistas,ao</p><p>promoverem discursos que são apenas persuasivos e não fundamentados na verdade objetiva,</p><p>acabam ameaçando esse ideal de conhecimento estável e universal. Eles representam uma</p><p>abordagem relativista, onde a verdade é percebida como algo mutável e subjetivo,</p><p>dependendo do ponto de vista de quem a expressa. Isso contrasta diretamente com a visão de</p><p>Parmênides e, consequentemente, com a visão de Platão sobre a filosofia como busca pela</p><p>verdade absoluta e pelo conhecimento genuíno. Assim sendo, são capazes de produzir</p><p>argumentos persuasivos que, apesar de parecerem verdadeiros à primeira vista( sem julgar</p><p>sua profundidade), são logicamente falaciosos quando analisados de maneira rigorosa. Assim</p><p>sendo, a possibilidade de discursos falsos começa a parecer possível a Platão pela crítica da</p><p>sua escola materna, a escola eleática. Tendo como expoente mais famoso e importante, o</p><p>filósofo Parmênides, a escola Eleata foi o berço do nascimento filosófico de Platão.</p><p>Parmênides defendia a Unidade do Ser (O Ser é). Para tanto, Parmênides argumentava que o</p><p>Ser é uno, imutável e eterno. Ele defendia que o Ser não pode surgir do não-Ser, pois o</p><p>não-Ser não pode ser pensado ou existir de forma alguma.</p><p>Assim, o Ser é a única realidade verdadeira e imutável. Ora, se tudo é imutável e</p><p>eterno e só existe o ser das coisas( tudo aquilo que é), não haveria a possibilidade de falsos</p><p>discursos, pois tudo estaria dentro da unidade do ser e seu imobilismo. Platão, através da</p><p>análise dos sofistas e seus “erros” dialéticos, começa a realizar a crítica da teoria da Unidade</p><p>de Parmênides, destacando o papel dos discursos falaciosos na busca da verdade e do bem.</p><p>Os discursos falaciosos seriam algo como uma visão deturpada da realidade, ou seja algo que</p><p>está ligado à realidade, mas não satisfaz a todos os “critérios” daquilo que é real ( daquilo que</p><p>realmente é). Algo como ideais que ainda não foram dialeticamente lapidados.</p><p>A expressão "parricídio” é utilizada por Platão para indicar uma grave consequência</p><p>filosófica: a negação ou destruição do pensamento e do legado filosófico de Parmênides, um</p><p>dos filósofos pré-socráticos que influenciou profundamente o pensamento de Platão; portanto</p><p>ele o tinha como uma referência em visão de mundo e conhecimento . Parmênides defendia a</p><p>ideia de que a realidade é uma e imutável, e que o conhecimento verdadeiro pode ser</p><p>alcançado através da razão pura, sem depender das aparências sensíveis e esse conhecimento</p><p>seria imutável e uno. No artigo “Ser e linguagem em Platão”, Eliane Christina de Souza,</p><p>Doutora em Filosofia pela Universidade de São Paulo discorre sobre o conflito entre Platão e</p><p>a concepção de Parmênides sobre os discursos:</p><p>Ao tentar definir o sofista como um produtor de enganos e de simulacros verbais,</p><p>em contraposição ao filósofo, que busca as verdades, o Estrangeiro de Eleia</p><p>reconhece que o sofista poderia assim se defender: dizer que o sofista produz</p><p>falsidades implica aceitar a possibilidade de dizer o que não é; mas dizer o que não</p><p>é é impossível, pois Parmênides havia interditado o pensamento e o discurso sobre o</p><p>não-ser. Assim, paradoxalmente, Parmênides fornece aos sofistas o fundamento de</p><p>seu relativismo e traz um grande problema à concepção filosófica de discurso: se</p><p>não se pode dizer o não-ser, não se pode dizer o falso; se</p><p>não se pode dizer o falso,</p><p>todo discurso é verdadeiro; se todo discurso é verdadeiro, o discurso não pode</p><p>especificar o ser de cada coisa; portanto, o discurso não informa nada sobre o ser,</p><p>apenas faz afirmações ao infinito.</p><p>Todavia, após a abertura de Platão para possibilidade de discursos falsos para se poder</p><p>definir o que é o ser das coisas, existe algo que não poderá fazer parte da Unicidade, pois é</p><p>falso( separado dela), não compactua com o Ser. A abertura dessa possibilidade seria como</p><p>“matar” a filosofia de um pai para Platão e sua filosofia. Porém destaca-se que Platão, por</p><p>meio do Personagem Estrangeiro, mantém o que veio de herança de Parmênides, a saber o</p><p>princípio da discursividade do ser.</p><p>Após a análise minuciosa da concepção de discursos falsos, vale analisar as três</p><p>Implicações desse novo pensamento para a filosofia platônica:</p><p>1. Crítica à persuasão superficial. Platão argumenta que não é suficiente que um discurso seja</p><p>persuasivo; é crucial que ele seja fundamentado em argumentos sólidos e em uma busca</p><p>sincera pela verdade.</p><p>2. Desenvolvimento da dialética. A crítica aos sofistas e à filosofia de Parmênides incentivou</p><p>Platão a desenvolver a dialética como um método de investigação filosófica. Através da</p><p>dialética, Platão busca revelar contradições e inconsistências nos argumentos, ajudando a</p><p>distinguir entre discursos verdadeiros e falsos. Destaca-se também o desenvolvimento da</p><p>teoria das ideias de Platão, onde os discursos falsos seriam como as sombras na caverna, pois</p><p>se referem ao que é e existe, no entanto não faz jus completamente ao real e verdadeiro,</p><p>necessitando ainda de lapidações para aproximar-se do mundo como ele de fato é.</p><p>3. Busca pela verdade objetiva. Para Platão, a filosofia é uma jornada em direção à verdade</p><p>objetiva e universal. Os discursos falsos dos sofistas representam uma ameaça a essa busca;</p><p>se não analisados com a devida cautela e diferenciação, podem colocar em perigo a própria</p><p>essência da filosofia como um empreendimento racional e sistemático de busca pelo bem e</p><p>pela Verdade.</p><p>3. Por que é importante para Platão apresentar a possibilidade de existência de</p><p>discursos falsos e como o sofista é definido após a apresentação do que é discurso falso no</p><p>diálogo Sofista?</p><p>Para Platão, a questão dos discursos falsos tem uma importância mister na sua</p><p>filosofia porque ele estava interessado em distinguir entre o conhecimento genuíno e a mera</p><p>aparência de conhecimento. Essa aparência de conhecimento seria algo como a Memética dos</p><p>objetos do real, mas que não representam o ser com sua totalidade, podendo ter</p><p>representações enganosas sobre o ser.</p><p>No caso da análise de Platão: tem-se que o princípio de não-contradição da lógica</p><p>eleata (monismo de Parmênides) , juntamente com o princípio da discursividade do ser, se</p><p>arma ou sobre uma ontologia monista ou sobre uma multiplicidade de seres idênticos a si</p><p>mesmos e completamente distintos dos outros. Justamente o que busca Platão seria</p><p>reconciliar as identidades( características) múltiplas dos seres reais e a possibilidade de</p><p>comparação entre os diferentes seres por suas intersecções, sem a necessidade de cobrir-se no</p><p>discurso a ontologia total do ser em si mesmo. Portanto, para Platão, é possível a</p><p>multiplicidade de predicados sobre um mesmo ser. Assim sendo, os discursos falsos sobre um</p><p>determinado ser, podem ser ditos e devidamente pensados, pois tais ditos podem ser</p><p>verdadeiros relativos a outro ser. Se A é A, aquilo que dissemos de A não altera a sua</p><p>concepção na realidade, apenas pode revelar a falsidade do nosso discurso, caso esse se prove</p><p>falacioso. O que é necessário, nesse ponto, é a separação do discurso do real, não uma</p><p>separação completa, mas apenas a possibilidade de gerar-se ideias equivocadas sobre o real</p><p>sem prejudicar a veracidade total do real e do ser.</p><p>Para postular esse pensamento, Platão relativiza o pensamento monista de Parmênides</p><p>e coloca em xeque a unidade do ser, permitindo uma análise múltipla do ser, incluindo</p><p>múltiplos predicados que não esgotam necessariamente a formação do ser, que diverge do</p><p>real ao também contemplá-lo; pois aquilo que se diz do não-ser, pode ser usado para definir</p><p>esse mesmo ser ao distingui-lo pela negação dos demais seres. Um enunciado verdadeiro diz</p><p>algo sobre o real, um enunciado falso nada diz sobre o real, apesar de seu sentido poder ser</p><p>dito e compreendido.</p><p>Disso, explicita-se que cada ser é em sua especificidade predicativa resulta de suas</p><p>relações de participação e não-participação (não-ser). Tudo dito acima, foi a busca de platão</p><p>de permitir que seja feita a participação do ser, sendo o que se é em si e também em relação</p><p>aos outros, e aquilo que nega, ou seja o não-ser( não se pode dizer do ser sem relacionar com</p><p>aquilo que o ser não é).</p><p>Após elucidar a importância dos discursos falsos para Platão é importante demonstrar</p><p>como o sofista é visto no final da análise. Assim sendo, Platão define o sofista como alguém</p><p>que é hábil na produção de discursos falsos (pseudo-logoi) que têm a aparência de serem</p><p>verdadeiros (pseudēs), mas não tem compromisso com o real. O sofista é caracterizado por</p><p>sua habilidade em persuadir os outros através da retórica (na maioria dos casos pública) e da</p><p>argumentação, não necessariamente com o objetivo de buscar a verdade objetiva (tarefa nobre</p><p>executada por filósofos) , mas sim para ganhar debates e impressionar audiências.</p><p>Essa definição é crucial porque Platão está enfatizando que o sofista não está</p><p>interessado na verdadeira investigação filosófica ou na busca pelo conhecimento genuíno</p><p>( verdade por trás do ser das coisas). Em vez disso, ele manipula as palavras e os argumentos</p><p>para criar uma ilusão de conhecimento, enganando aqueles que não são capazes de discernir</p><p>entre o verdadeiro que se diz daquilo que é, ou seja, episteme e a mera opinião( doxa).</p><p>Portanto, após a discussão sobre discursos falsos, Platão conclui que o sofista é aquele</p><p>que em geral produz esses discursos falaciosos, utilizando suas habilidades retóricas para</p><p>criar uma aparência de verdade mimética que pode ser enganadora e prejudicial para o</p><p>entendimento correto da realidade. Essa definição reflete a crítica de Platão à sofística como</p><p>uma prática que compromete a busca pela verdade em favor da manipulação discursiva e da</p><p>persuasão superficial do público ou de um ser privado.</p><p>Bibliografia</p><p>PLATÃO. O Sofista, Teeteto. Edição bilíngue, tradução de H. N. Fowler. Cambridge-London:</p><p>Loeb Classical Library, 1996.</p><p>SOUZA, Eliane Christina de; "Ser e linguagem em Platão". CRAIA, Eládio Constantino</p><p>Pablo. (Org.). Crítica e Hermenêutica. Cascavel: Edunioeste, 2006, v. 1.</p><p>SOUZA, Eliane C. de. "Sobre a teoria da participação das formas no Sofista de Platão".</p><p>Revista de Filosofia HYPNOS, Ano 2, N. 3.</p><p>REALE, G; ANTISERI, D. História da Filosofia. Volume I. São Paulo, Editora Paulus, 2003.</p><p>PLATÃO, República. Tradução Maria Helena da Rocha Pereira. 9. ed. Lisboa: Fundação</p><p>Calouste Gulbenkian, 2001.</p><p>ARISTÓTELES. Poética. Tradução de Eudoro de Souza. 1. ed. São Paulo: Abril Cultural,</p><p>1973 (Coleção Os Pensadores).</p><p>DISCIPLINA: INTRODUÇÃO À FILOSOFIA TURMA “B”</p><p>DOCENTE: SCHEILA CRISTIANE THOMÉ</p><p>DISCENTE: RICARDO GORON CIDADE</p><p>PORTO ALEGRE - RS</p><p>26/07/2024</p>