Logo Passei Direto
Buscar
Material
páginas com resultados encontrados.
páginas com resultados encontrados.

Prévia do material em texto

<p>INTRODUÇÃO</p><p>A ABORDAGEM PROBLEMATOLÓGICA</p><p>Para começar, é importante entender que Sylvain Auroux propõe uma abordagem problematológica em seu livro Filosofia da Linguagem. O que isso significa? Basicamente, que todo conhecimento é uma resposta a um problema. Ele argumenta que o nosso entendimento de linguagem, assim como qualquer outro campo de conhecimento, se desenvolve porque surgem perguntas ou problemas que precisam ser resolvidos.</p><p>Auroux faz uma distinção interessante entre diferentes tipos de problemas. Primeiro, temos os problemas simples, que podem ser resolvidos aplicando métodos bem conhecidos, como o algoritmo de Euclides. Depois, temos os problemas complexos, que demandam mais reflexão e podem ter várias soluções possíveis. Por fim, ele fala dos problemas absurdos, que são aqueles que não fazem sentido porque os dados são incoerentes ou impossíveis de trabalhar.</p><p>O ponto central aqui é a ideia dos 'problemas não saturados', que são muito relevantes para a filosofia. Ao contrário dos problemas simples, os problemas não saturados nunca têm uma resposta definitiva, e é justamente isso que os torna tão desafiadores e profundos. A filosofia da linguagem, então, lida com questões que nunca podem ser completamente resolvidas, mas que continuam a gerar reflexão e debate.</p><p>PROBLEMAS FILOSÓFICOS DA LINGUAGEM</p><p>A partir dessa ideia de problemas, Auroux nos convida a pensar sobre algumas das grandes questões filosóficas relacionadas à linguagem. A primeira delas é a própria natureza da linguagem. Um dos debates clássicos é sobre se os seres humanos são os únicos capazes de linguagem. Animais conseguem se comunicar, mas será que eles falam? E como a linguagem teria surgido na humanidade? Essas perguntas ainda estão em aberto.</p><p>A segunda grande questão é a relação entre linguagem e pensamento. Podemos pensar sem linguagem? Será que o pensamento está limitado pelas palavras que temos à disposição? Essa é uma das perguntas que gerou muito debate, com autores como Sapir e Whorf, que defendem que a linguagem molda nosso pensamento, enquanto outros acreditam que podemos pensar independentemente das palavras que usamos.</p><p>Por último, temos o problema da linguagem e realidade. Essas são questões fundamentais para entender a relação entre linguagem e significado.</p><p>O CAMPO DA FILOSOFIA DA LINGUAGEM</p><p>Agora, vamos falar sobre o campo da filosofia da linguagem e sua relação com a filosofia da linguística. Embora esses dois campos tenham muito em comum, eles não são exatamente a mesma coisa. A filosofia da linguagem lida com questões muito amplas e abstratas sobre a natureza da comunicação, do significado, da verdade e do pensamento. Já a filosofia da linguística se preocupa mais em entender os fundamentos teóricos da própria linguística, que é a ciência que estuda as línguas.</p><p>Auroux destaca que a filosofia da linguagem tende a unificar essas duas abordagens, mostrando que não podemos separar completamente as questões filosóficas das questões linguísticas. Ele nos mostra que o estudo da linguagem precisa levar em conta tanto os aspectos empíricos — como as estruturas gramaticais e os usos cotidianos da linguagem — quanto as questões filosóficas mais amplas.</p><p>OBJETIVO DO LIVRO</p><p>Por fim, é importante entender o objetivo principal do livro de Auroux. Ele não quer apenas nos apresentar as questões da filosofia da linguagem, mas também mostrar como essas questões se transformaram ao longo do tempo. O livro busca construir o que ele chama de 'uma topografia' do campo da filosofia da linguagem. Ou seja, Auroux quer mapear os principais problemas e debates que marcaram o desenvolvimento dessa disciplina.</p><p>Além disso, ele evita se limitar a uma única tradição teórica. Em vez de defender uma visão específica da linguagem, Auroux nos convida a explorar diferentes perspectivas e a refletir sobre como os problemas filosóficos continuam a evoluir. Ele quer nos mostrar que a filosofia da linguagem é um campo dinâmico, onde as perguntas são muitas vezes mais importantes do que as respostas.</p><p>CAPÍTULO 1: A ESCRITA</p><p>A escrita, como explica Sylvain Auroux, é uma manifestação única da linguagem humana, sendo profundamente ligada à evolução física dos hominídeos. No entanto, embora a linguagem humana envolva aspectos sociais, ela também é uma manifestação individual do corpo humano, envolvendo um controle psicomotor complexo.</p><p>O que é particularmente interessante, como Auroux aponta, é que a linguagem não está limitada ao canal áudio-oral. Existem suportes transpostos, ou seja, formas de comunicação que substituem o áudio-oral, como a linguagem de sinais ou a tamborilada. No entanto, entre todos esses suportes, o mais relevante na história da comunicação humana é a escrita, que permitiu à fala humana subsistir sem a necessidade da presença física do som.</p><p>A REVOLUÇÃO DA ESCRITA</p><p>A invenção da escrita, de acordo com Auroux, foi a primeira grande revolução tecnolinguística da história da humanidade, que aconteceu após a Revolução Neolítica. Nesse período, surgiram várias técnicas fundamentais para a sociedade, como a agricultura e a domesticação de animais. A escrita foi uma dessas inovações cruciais, surgindo como uma forma de registrar informações e ultrapassar as limitações da comunicação exclusivamente oral.</p><p>Diversas civilizações desenvolveram seus próprios sistemas de escrita. Por exemplo, na Mesopotâmia, o sistema cuneiforme apareceu por volta do quarto milênio antes da nossa era; no Egito, a escrita hieroglífica surgiu em torno do mesmo período. O alfabeto grego, por sua vez, foi uma evolução posterior, derivada do alfabeto fenício no século XI a.C. Cada uma dessas escritas desenvolveu suas próprias características únicas, mas todas compartilharam o objetivo de permitir a comunicação sem a necessidade da fala.</p><p>O ORAL E O ESCRITO</p><p>O subtítulo "O oral e o escrito" do capítulo 2 aborda as profundas transformações que a escrita impõe sobre a fala e a linguagem humanas, explorando o impacto dessas duas modalidades de comunicação em diversas esferas sociais e culturais. Partindo da observação de filósofos como Platão e Rousseau, que reconhecem a diferença entre o falar e o escrever, o texto discute como a escrita, ao fixar a língua, altera a sua natureza, padronizando e estabilizando o que na fala é naturalmente variável e flexível.</p><p>1. Estabilidade vs. Variabilidade:</p><p>A escrita impõe uma forma fixa e padronizada à linguagem, enquanto a fala é marcada por variações individuais e sociais. No oral, elementos como idade, sexo, estado de saúde e origem geográfica são perceptíveis, o que não ocorre no escrito, que tende a ser mais "universalizante".</p><p>2. Memória e Fidelidade:</p><p>As sociedades orais funcionam com base em uma memória mais flexível, onde o conteúdo de uma mensagem é mais importante que a sua forma exata. Por outro lado, a escrita exige "fidelidade à letra", promovendo a fixação de textos e, assim, uma diferença radical na forma como a informação é registrada e transmitida.</p><p>3. Descontextualização e Universalidade:</p><p>A escrita permite a descontextualização da fala, o que possibilita maior densidade de informação e complexidade textual. Isso se reflete, por exemplo, na literatura e nos textos científicos, onde a ausência de um interlocutor imediato faz com que o texto se comunique de forma mais abrangente e universal.</p><p>4. Grafematização da Sociedade:</p><p>A grafematização, ou seja, a progressiva dependência da escrita em contextos sociais e culturais, molda a forma como interagimos com o mundo. Desde o uso de mapas e nomes de ruas até o uso de moedas eletrônicas, a escrita permeia praticamente todas as interações humanas.</p><p>A ESCRITA E O NASCIMENTO DAS CIÊNCIAS DA LINGUAGEM</p><p>Para explicar o subtítulo "A escrita e o nascimento das ciências da linguagem", podemos seguir uma estrutura que aborde a relação entre a escrita e o desenvolvimento do conhecimento linguístico, assim como a distinção entre saber epilinguístico e metalinguístico.</p><p>1. A escrita como marco para as ciências da linguagem</p><p>A ideia inicial é que a escrita não só é essencial para a fixação do conhecimento</p><p>linguístico, mas também para o nascimento das ciências da linguagem. Embora seja comum pensar que o desenvolvimento da escrita se baseou em um conhecimento linguístico prévio, a história mostra o contrário: a escrita foi desenvolvida primeiro e, só depois, surgiram reflexões linguísticas estruturadas. Ou seja, as ciências da linguagem emergem após a consolidação da escrita.</p><p>2. Epilinguístico e metalinguístico</p><p>O texto diferencia dois tipos de saber linguístico: o epilinguístico, que é um conhecimento implícito que todos os falantes têm sobre a língua (como saber usar nomes e adjetivos mesmo sem saber explicá-los); e o metalinguístico, que surge quando se desenvolve uma linguagem para falar sobre a própria linguagem (como gramáticas e regras explícitas).</p><p>O nascimento das ciências da linguagem é marcado pela transição de um saber epilinguístico para um saber metalinguístico. Ou seja, enquanto as pessoas sempre souberam usar a linguagem de forma prática, foi a escrita que possibilitou a reflexão formal e explícita sobre essa linguagem.</p><p>3. A escrita como objetificação da linguagem</p><p>A escrita transforma a linguagem em um objeto visível e manipulável, permitindo que seja analisada de forma distanciada. Isso é crucial porque, ao tornar a linguagem fixa e permanente, a escrita permite que ela seja estudada, comparada e analisada em diferentes momentos no tempo.</p><p>Por exemplo, os textos antigos, como os de Homero e o Corão, foram escritos e, por isso, puderam ser preservados e analisados pelas gerações futuras. Esse distanciamento temporal da língua escrita em relação à língua falada cotidiana foi um dos impulsos para o desenvolvimento de estudos linguísticos.</p><p>4. Listas e a organização da linguagem</p><p>Antes das gramáticas formais, as primeiras reflexões sobre a linguagem surgiram por meio de listas, como as de palavras usadas para nomear coisas (bovinos, peixes, armas, profissões). Embora essas listas não fossem necessariamente para o aprendizado da escrita, elas desempenharam um papel importante na sistematização do conhecimento linguístico. Na Mesopotâmia, por exemplo, essas listas eram copiadas nas escolas, desempenhando um papel semelhante ao que gramáticas desempenham hoje no aprendizado da linguagem.</p><p>5. A relação entre escrita e saber metalinguístico</p><p>A escrita, especialmente em civilizações como as babilônicas e egípcias, levou ao desenvolvimento de técnicas para organizar e classificar o conhecimento linguístico. No entanto, o simples ato de escrever não produz automaticamente um saber metalinguístico. Esse saber surge quando há uma necessidade de refletir sobre a própria linguagem, como ocorre nas tradições babilônicas, onde surgiram listas bilíngues e técnicas de anotação fonética.</p><p>DO ORAL AO ESCRITO</p><p>1. Saber epilinguístico e saber metalinguístico</p><p>O texto trata da transição do saber epilinguístico (intuitivo, ligado ao uso da linguagem) para o saber metalinguístico (consciente, sistemático), ressaltando que essa passagem envolve o desenvolvimento de uma consciência linguística. A diferença entre esses dois saberes é que o metalinguístico requer procedimentos mais complexos, que não surgem diretamente da prática oral comum, mas sim de atividades como rituais ou jogos, que descontextualizam a linguagem.</p><p>2. Exemplos de descontextualização da linguagem</p><p>O autor exemplifica com os mantras indianos, nos quais cada verso evoca uma forma casual diferente de um nome divino (théonyme), como em "agni" (fogo) que aparece em diferentes casos (vocativo, acusativo, instrumental etc.). Outro exemplo são as orações dos maias tzeltal, que também apresentam uma estrutura fixa e variável em versos, ajudando a sistematizar a língua.</p><p>3. Relação entre a oralidade e a escrita</p><p>Apesar dessas práticas orais sistematizarem a linguagem, o autor enfatiza que a escrita é o ponto de partida para a criação de uma gramática propriamente dita, por permitir uma sistematização e descontextualização mais profunda. As listas lexicais da antiga Babilônia, por exemplo, organizam paradigmas verbais completos, e esse tipo de organização escrita antecedeu o desenvolvimento da ciência gramatical.</p><p>4. A escrita como base para a ciência da linguagem</p><p>A escrita não anota sons físicos, mas sim fonemas, e foi a partir dessa prática técnica que conceitos como o fonema puderam ser construídos – muito tempo depois, no final do século XIX. O autor sublinha que a ciência da linguagem não surgiu de um saber prévio, mas sim de uma prática técnica (a escrita) que permitiu a sistematização e análise da língua.</p><p>CONCLUSÃO</p><p>Sylvain Auroux oferece uma visão da linguagem que é profundamente enraizada na história das ideias e no desenvolvimento dos sistemas de escrita. Ele vê a escrita como um fenômeno com características próprias e enfatiza a importância de compreender a evolução das concepções linguísticas ao longo do tempo. Sua abordagem crítica o logocentrismo e adota uma perspectiva epistemológica que valoriza a análise histórica e metodológica das teorias linguísticas.</p>

Mais conteúdos dessa disciplina