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<p>1</p><p>Controle de constitucionalidade</p><p>Em visão panorâmica, pode-se afirmar que as turmas, câmaras, seções, etc.</p><p>(órgãos fracionários) estão dispensados de gerar a cisão funcional de competência</p><p>(remessa do tema ao plenário do Tribunal ou ao órgão especial, se houver) nas</p><p>seguintes hipóteses:</p><p>a) Quando já existir pronunciamento anterior do plenário ou órgão especial do</p><p>próprio tribunal, ou, ainda, pronunciamento do Supremo Tribunal Federal sobre a</p><p>questão (art. 949, parágrafo único, do novo CPC).</p><p>b) Quando a decisão do órgão fracionário for relativa às normas de direito pré-</p><p>constitucional, isto é, acerca do fenômeno da recepção ou revogação qualificada</p><p>de normas anteriores à nova Constituição, que, materialmente, não lhe guardam</p><p>compatibilidade vertical.</p><p>c) Quando a decisão for de órgão fracionário do STF (Primeira ou Segunda</p><p>Turmas), em sede de recurso extraordinário (RE), em virtude da sua competência</p><p>constitucional recursal insculpida no art. 102, III, a, CRFB/88.</p><p>Dessarte, vale, em seguida, examinar cada uma dessas hipóteses um pouco mais</p><p>detalhadamente, começando-se pelo mandamento legal de caráter processual do</p><p>CPC. Nesse sentido, em nome do princípio da economia processual e da</p><p>segurança jurídica (Pedro Lenza acrescenta a ideia de desejada racionalização</p><p>orgânica da instituição judiciária brasileira), o dispositivo legal processual autoriza a</p><p>dispensa do rito previsto no art. 97 da Constituição toda vez que já haja decisão do</p><p>órgão especial ou pleno do tribunal, ou do próprio STF. Portanto, a cisão funcional</p><p>de competência não será observada nessas hipóteses por força da dicção legal do</p><p>parágrafo único do art. 949 do antigo Código de Processo Civil, que têm a seguinte</p><p>redação: “os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao</p><p>órgão especial, a arguição de inconstitucionalidade, quando já houver</p><p>pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal”. Portanto, fica</p><p>dispensada a cisão funcional de competência, sem a necessidade de se enviar a</p><p>2</p><p>questão da inconstitucionalidade para o órgão especial ou para o plenário do</p><p>tribunal. Ou seja, as câmaras ou turmas dos tribunais passam a ostentar</p><p>competência para pronunciar, elas próprias, a inconstitucionalidade da lei. Tal</p><p>dispensa à reserva de plenário reflete a evolução da jurisdição constitucional pátria</p><p>que se vem buscando imprimir celeridade aos processos judiciais. O novo CPC</p><p>seguiu essa tendência de posicionamento estabelecendo que:</p><p>Art. 949. Se a arguição for:</p><p>I – rejeitada, prosseguirá o julgamento;</p><p>II – acolhida, a questão será submetida ao plenário do tribunal ou ao seu órgão</p><p>especial, onde houver.</p><p>Parágrafo único. Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário</p><p>ou ao órgão especial a arguição de inconstitucionalidade quando já houver</p><p>pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a</p><p>questão.</p><p>Muito embora ainda haja divergência doutrinária acerca da constitucionalidade da</p><p>regra que dispensa os órgãos fracionários dos tribunais nesse caso, a</p><p>jurisprudência dos tribunais superiores caminhou firme na direção da sua</p><p>compatibilidade vertical com o texto constitucional.</p><p>Uma vez examinada a primeira exceção à reserva de plenário, cumpre, em</p><p>seguida, examinar a intrincada questão acerca da necessidade ou não da cisão</p><p>funcional de competência na hipótese de leis ou atos normativos pré-</p><p>constitucionais que sejam incompatíveis com a Constituição Federal de 1988. A</p><p>questão, portanto, é saber se o afastamento da aplicação do direito pré-</p><p>constitucional necessita ou não ser submetido à cláusula de full bench? Em outras</p><p>palavras, a pergunta é: as decisões dos órgãos fracionários que reconhecem a não</p><p>recepção de lei anterior em face da Constituição devem ser submetidas à reserva</p><p>de plenário? Em essência, o debate gira em torno da ideia de que a norma</p><p>infraconstitucional anterior à nova Constituição que com ela seja materialmente</p><p>incompatível não é declarada inconstitucional, mas, sim, revogada ou não</p><p>3</p><p>recepcionada. A questão não é de inconstitucionalidade, mas, sim, de não</p><p>recepção ou revogação. Muito embora haja grande controvérsia na doutrina acerca</p><p>dessa temática, o importante aqui é destacar a corrente que entende que o direito</p><p>pré-constitucional incompatível com a superveniência do texto constitucional estaria</p><p>revogado ou não recepcionado. Não há que se falar em inconstitucionalidade de</p><p>direito pré-constitucional. No escólio de Gilmar Mendes:</p><p>“No julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 2, Rel. Min. Paulo</p><p>Brossard, Tribunal Pleno, DJ de 21-11-1997, o Supremo Tribunal Federal não</p><p>conheceu da ação por impossibilidade jurídica do pedido e assentou que o vício da</p><p>inconstitucionalidade é congênito à lei e há de ser apurado em face da Constituição</p><p>vigente ao tempo de sua elaboração. Assim, lei anterior não pode ser</p><p>inconstitucional em relação à Constituição superveniente, nem o legislador poderia</p><p>infringir Constituição futura, pois a “acesso à justiça” e do contraditório, na medida</p><p>em que os efeitos são estendidos para partes que não estavam presentes na lide</p><p>originária. Constituição sobrevinda não torna inconstitucionais leis anteriores com</p><p>ela conflitantes, mas as revoga. Cf. MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo</p><p>Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p.</p><p>1010.</p><p>Para o constitucionalista pátrio, caberia registrar duas peculiaridades importantes</p><p>relativas à vigência de normas no tempo: “não aplicação da cláusula de reserva de</p><p>plenário (art. 97, CF) e da fórmula de comunicação ao Senado (art. 52, X, CF). (...)</p><p>e a nova ordem constitucional revoga a norma por ela não recebida por motivo de</p><p>incompatibilidade material”.</p><p>Por esse motivo, torna-se dispensável a observância da reserva de plenário nas</p><p>hipóteses de normas infraconstitucionais anteriores à Constituição. Em síntese, as</p><p>decisões dos órgãos fracionários que reconhecem a não recepção de leis</p><p>anteriores em face da Constituição não se submetem à reserva de plenário. Isso</p><p>significa dizer que o Supremo Tribunal Federal, por não admitir o controle abstrato</p><p>de direito pré-constitucional em sede de ação direta de inconstitucionalidade,</p><p>mantém sua posição de reconhecer competência aos órgãos fracionários dos</p><p>4</p><p>tribunais, em sede de controle difuso de constitucionalidade, de decidir pela não</p><p>aplicação de lei ou ato normativo promulgado anteriormente à Constituição Federal,</p><p>sem observar a cláusula do full bench. Com esse mesmo tipo de intelecção, o</p><p>Superior Tribunal de Justiça já decidiu que “a cláusula de reserva de plenário</p><p>somente é aplicável na hipótese de controle difuso em que deva ser declarada a</p><p>inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, não se aplicando</p><p>aos casos (como o dos autos) em que se reputam revogadas ou não</p><p>recepcionadas normas anteriores à Constituição vigente”.</p><p>Por fim, mas não menos importante, vamos examinar agora a terceira exceção à</p><p>reserva de plenário, qual seja, a decisão final de mérito do órgão fracionário do</p><p>STF (Primeira ou Segunda Turma), em sede de recurso extraordinário, que não</p><p>precisa gerar a cisão funcional de competência, ou seja, não há necessidade de a</p><p>Turma enviar a questão constitucional para o Plenário do Supremo Tribunal</p><p>Federal, uma vez que tem competência para fazê-lo de per si. Tal entendimento</p><p>(dispensa da cláusula da reserva de plenário para as Turmas do STF em recurso</p><p>extraordinário) decorre da interpretação do art. 102, III, a, da Constituição de 1988,</p><p>cuja dicção estabelece que compete ao STF julgar, mediante recurso</p><p>extraordinário, as causas decididas em única ou última instancia, quando a decisão</p><p>recorrida contrariar dispositivo da Carta Ápice. Assim, pode-se afirmar que, em</p><p>regra, no julgamento do RE, as Turmas do STF (órgãos fracionários) têm</p><p>competência para fazer a declaração incidental de inconstitucionalidade,</p><p>sem</p><p>observar o princípio do colegiado (cláusula do full bench). Assim, não resta dúvida</p><p>de que a cláusula do full bench não se aplica ao próprio Supremo Tribunal Federal</p><p>no julgamento de recursos extraordinários, na medida em que o rol taxativo do art.</p><p>102 estabelece que é sua função primordial a declaração de inconstitucionalidade,</p><p>em sede de recurso extraordinário, nos termos do 102, III, a, da Constituição de</p><p>1988.</p><p>Cf. GÓES, Guilherme Sandoval, MELLO, Cleyson de Moraes. Controle de</p><p>constitucionalidade. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2016, p. 177-188.</p>