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<p>GENÉTICA E</p><p>NEUROANATOMIA</p><p>AULA 3</p><p>Profª Patrícia Carla de Oliveira</p><p>2</p><p>CONVERSA INICIAL</p><p>Iniciaremos esta aula com o estudo das etapas do desenvolvimento</p><p>embrionário que originam o sistema nervoso. Dessa forma, será possível</p><p>entender por que alguns termos são utilizados mesmo quando nos referimos ao</p><p>sistema nervoso adulto. Além disso, esse estudo permite a divisão didática do</p><p>sistema nervoso de acordo com critérios anatômicos e funcionais, bem como a</p><p>compreensão das malformações que podem ocorrer em recém-nascidos.</p><p>Dentro desse contexto, discutiremos sobre a formação dos ventrículos</p><p>encefálicos pela luz do tubo neural durante o desenvolvimento embrionário, bem</p><p>como a formação do líquido que preenche os ventrículos e o espaço</p><p>subaracnóideo no encéfalo e na medula. Entenderemos também os principais</p><p>conceitos sobre a distribuição, componentes e funções das membranas que</p><p>recobrem e protegem o sistema nervoso central: dura-máter, aracnoide e pia-</p><p>máter.</p><p>Por fim, estudaremos sobre a vascularização e as barreiras encefálicas</p><p>do sistema nervoso central, além das correlações anatomoclínicas referentes ao</p><p>conteúdo desta aula.</p><p>TEMA 1 – DESENVOLVIMENTO E ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA NERVOSO</p><p>O sistema nervoso tem origem nas primeiras semanas de vida do</p><p>embrião, portanto, a neuroembriologia (organogênese do sistema nervoso)</p><p>permite a compreensão da disposição anatômica e da nomenclatura utilizada,</p><p>além da compreensão das malformações congênitas do sistema nervoso.</p><p>O folheto embrionário que dá origem ao sistema nervoso é o ectoderma</p><p>que, a partir da terceira semana de desenvolvimento, é induzido pela notocorda</p><p>e se espessa formando a placa neural. A região craniana mais larga dessa placa</p><p>dará origem ao encéfalo e a região caudal mais estreita dará origem a medula</p><p>espinal.</p><p>Para que isso aconteça, a placa neural apresenta progressivamente uma</p><p>invaginação que formará um sulco neural e então a goteira neural. O posterior</p><p>fechamento dessa goteira na quarta semana de vida intrauterina cria o tubo</p><p>neural, responsável pela origem do sistema nervoso central. Esse processo</p><p>chamado neurulação tem início na porção média da placa neural e termina nos</p><p>3</p><p>sentidos cranial (neuroporo anterior) e caudal (neuroporo posterior), isolando o</p><p>ectoderma do meio externo (Figura 1).</p><p>Figura 1 – Formação do tubo neural</p><p>Crédito: Vasilisa Tsoy/Shutterstock.</p><p>Durante a formação do tubo neural, duas projeções dorsolaterais de</p><p>células da placa neural formam uma estrutura chamada crista neural. As células</p><p>da crista neural darão origem a grande parte do sistema nervoso periférico, como</p><p>os gânglios sensoriais dos nervos espinais e cranianos, os gânglios viscerais do</p><p>sistema nervoso autônomo, as células de Schwann e as meninges.</p><p>O tubo neural dilata-se mais na sua extremidade anterior, formando uma</p><p>dilatação denominada vesícula encefálica ou arquencéfalo. Esta originará o</p><p>encéfalo, enquanto a parte posterior do tubo, que não sofre tanta diferenciação,</p><p>dará origem a medula espinal (Schmidt; Prosdócimi, 2017). O lúmen do tubo</p><p>dará origem ao sistema ventricular encefálico e ao canal central da medula.</p><p>Como descrito por Schmidt e Prosdócimi (2017), ao final da quarta</p><p>semana de vida intrauterina, o arquencéfalo formará três dilatações chamadas</p><p>de vesículas encefálicas primordiais (ou primárias): prosencéfalo ou encéfalo</p><p>anterior; mesencéfalo ou encéfalo médio e; rombencéfalo ou encéfalo posterior,</p><p>que é contínuo ao restante do tubo neural, a medula primitiva. Assim, as três</p><p>4</p><p>dilatações formam o encéfalo primitivo e o restante do tubo neural forma a</p><p>medula primitiva, que, futuramente, originará a medula espinal (Figura 2).</p><p>Figura 2 – Formação das vesículas encefálicas primordiais</p><p>Crédito: Vasilisa Tsoy/Shutterstock.</p><p>Na quinta semana de desenvolvimento, as três vesículas primárias</p><p>dividem-se e formam cinco vesículas secundárias: o prosencéfalo se divide em</p><p>telencéfalo e diencéfalo; o rombencéfalo de divide em metencéfalo e</p><p>mielencéfalo; e o mesencéfalo permanece como dilatação única. O telencéfalo</p><p>formará os hemisférios cerebrais e os núcleos de base, enquanto o diencéfalo</p><p>formará o tálamo, o hipotálamo, o epitálamo e o subtálamo. Todas essas</p><p>estruturas juntas formam a região conhecida como cérebro. Por sua vez, o</p><p>metencéfalo formará a ponte e o cerebelo, enquanto o mielencéfalo formará o</p><p>bulbo. O mesencéfalo continua com o mesmo nome no adulto (Figura 3).</p><p>5</p><p>Figura 3 – Formação do encéfalo</p><p>Crédito: Veronika By/Shutterstock.</p><p>As células-tronco existentes no tubo neural e nas vesículas encefálicas</p><p>sofrem divisões celulares sucessivas entre a sexta e a vigésima semanas da</p><p>vida uterina, num processo de proliferação denominado neurogênese. Na</p><p>medida em que são formadas, essas células respondem a sinais químicos</p><p>secretados por outras células do embrião e iniciam o processo de migração para</p><p>a região definitiva do sistema nervoso em que exercerão suas funções.</p><p>A partir daí, acontece a diferenciação e a maturação dessas células, que</p><p>adquirem características morfológicas e bioquímicas específicas no tecido</p><p>nervoso, bem como a mielinização e a formação das redes neuronais. Como o</p><p>resultado dessas etapas anteriores é um número maior de neurônios e sinapses</p><p>do que caracteriza o ser humano após o nascimento, acontece uma morte</p><p>neuronal programada, regulada por fatores neurotróficos no tecido-alvo.</p><p>Para compreender melhor a disposição, a organização e o funcionamento</p><p>do sistema nervoso, este pode ser dividido didaticamente de acordo com critérios</p><p>embriológicos, anatômicos ou funcionais. Anatomicamente, o sistema nervoso é</p><p>dividido em sistema nervoso central (SNC), do qual fazem parte o encéfalo e a</p><p>medula espinal; e sistema nervoso periférico (SNP), composto pelos gânglios</p><p>nervosos, nervos cranianos e nervos espinais. No encéfalo estão localizados</p><p>cérebro, cerebelo e tronco encefálico que, por sua vez, é composto pelo</p><p>mesencéfalo, ponte e bulbo (Figura 4).</p><p>6</p><p>Figura 4 – Divisão anatômica do sistema nervoso</p><p>Crédito: marina_ua/Shutterstock.</p><p>Pelo critério funcional, o sistema nervoso é dividido em sistema nervoso</p><p>somático (SNS), que relaciona o organismo com o meio ambiente de forma</p><p>consciente, e o sistema nervoso visceral (SNV), que realiza controle e inervação</p><p>inconsciente de estruturas viscerais. Nas duas divisões existem vias aferentes</p><p>que levam os estímulos até os centros de controle e vias eferentes que partem</p><p>do sistema nervoso desencadeando respostas voluntárias no SNS e</p><p>involuntárias no SNV. O componente eferente do sistema nervoso visceral é</p><p>denominado sistema nervoso autônomo (SNA) e se divide em simpático e</p><p>parassimpático.</p><p>TEMA 2 – MENINGES</p><p>O sistema nervoso central é revestido por três membranas de origem</p><p>conjuntiva, que protegem e isolam o SNC dos outros tecidos corporais. A</p><p>membrana mais externa é a dura-máter, também chamada de paquimeninge, e</p><p>se relaciona com o crânio e o canal vertebral. A aracnoide é a meninge</p><p>intermediária e a pia-máter recobre diretamente o encéfalo e a medula. Juntas,</p><p>aracnoide e pia-máter formam uma estrutura chamada leptomeninge. A Figura 5</p><p>evidencia as três membranas que recobrem do SNC.</p><p>7</p><p>Figura 5 – Meninges e o SNC</p><p>Crédito: Designua/Shutterstock.</p><p>A dura-máter é a membrana mais superficial, espessa e resistente, devido</p><p>a sua composição de tecido conjuntivo rico em fibras colágenas, vasos</p><p>sanguíneos e nervos. A inervação principal é realizada pelo nervo trigêmeo e a</p><p>artéria meníngea média promove a vascularização mais evidente. De acordo</p><p>com Machado; Raertel (2014), como o encéfalo não possui terminações</p><p>nervosas sensitivas, toda a sensibilidade intracraniana se localiza na dura-máter</p><p>e nos vasos sanguíneos, responsáveis, assim, pela maioria das dores de</p><p>cabeça.</p><p>No encéfalo, a dura-máter</p><p>divide-se em dois folhetos: o periosteal, mais</p><p>externo e aderido aos ossos do crânio, correspondendo, portanto, ao periósteo</p><p>que reveste a face interna desses ossos; e a camada meníngea, mais interna e</p><p>contínua à dura-máter única que envolve a medula espinal. Dessa forma, na</p><p>região encefálica não há um espaço epidural entre os ossos e a dura-máter,</p><p>como aquele observado na região medular. O folheto periosteal não possui</p><p>capacidade de regeneração, o que dificulta a consolidação de fraturas ou perdas</p><p>ósseas no crânio. Porém, essa característica se torna importante e vantajosa,</p><p>visto que calos ósseos nessa região poderiam trazer danos ao encéfalo.</p><p>A camada meníngea está aderida ao folheto externo, mas em algumas</p><p>áreas projeta-se para formar as cinco pregas da dura-máter, que dividem a</p><p>8</p><p>cavidade craniana em compartimentos que se comunicam. São elas: foice do</p><p>cérebro, tenda do cerebelo, foice do cerebelo, diafragma da cela túrcica e cravo</p><p>trigeminal. O espaço gerado entre as camadas da dura-máter, durante a</p><p>formação das pregas, forma os seios venosos responsáveis por receber sangue</p><p>do encéfalo e do globo ocular e drenar sangue para as veias jugulares internas.</p><p>São eles: seio occipital, seio sagital inferior, seio reto, seios transversais direito</p><p>e esquerdo, seio sigmoide, seios intercavernosos, seio esfenoparietal, seio</p><p>petroso superior, seio petroso inferior e seio basilar.</p><p>A aracnoide é uma membrana avascular, delicada e impermeável</p><p>localizada entre a dura-máter e a pia-máter. É separada da pia-máter pelo</p><p>espaço virtual subdural, que contém pequena quantidade de líquido lubrificante,</p><p>e separada da pia-máter pelo espaço subaracnóideo, que contém o líquido</p><p>cerebroespinhal ou líquor, por onde as trabéculas da aracnoide atravessam para</p><p>se ligar à pia-máter. De acordo com Snell (2019), todas as artérias e veias</p><p>cerebrais residem no espaço subaracnóideo, bem como os pontos de saída dos</p><p>nervos cranianos.</p><p>A profundidade do espaço subaracnóideo é variável e as grandes</p><p>dilatações são denominadas cisternas, que contêm grande quantidade de líquor.</p><p>São elas: cisterna magna, cisterna pontinha, cisterna interpeduncular, cisterna</p><p>quiasmática, cisterna superior e cisterna da fossa lateral do cérebro. Martinez,</p><p>Allodi e Uziel (2014) destacam que a cisterna magna é a maior delas e pode ser</p><p>puncionada entre o osso occipital e o atlas para coleta de líquor.</p><p>A aracnoide apresenta algumas projeções chamadas granulações</p><p>aracnoideas, que penetram nos seios da dura-máter, principalmente no seio</p><p>sagital superior, em que se apresentam em maior quantidade. As granulações</p><p>aracnoideas são locais onde o líquor é absorvido e passa para a corrente</p><p>sanguínea e progressivamente se tornam maiores, dando origem aos corpos de</p><p>Paccioni, podendo ocorrer sangramentos.</p><p>A pia-máter é uma membrana fina, delicada e altamente vascularizada</p><p>localizada mais internamente e fixando-se diretamente no SNC, onde cobre os</p><p>giros e desce no interior dos sulcos mais profundo do encéfalo, o que confere</p><p>resistência ao tecido mole que compõe essa estrutura. De acordo com Martinez,</p><p>Allodi e Uziel (2014), a pia-máter medular é mais espessa, firme e menos</p><p>vascularizada do que a craniana, devido ao fato de apresentar uma camada</p><p>adicional externa. A pia-máter forma o ligamento coccígeo juntamente com a</p><p>9</p><p>dura-máter e forma ainda, lateralmente a toda a extensão da medula, uma prega</p><p>longitudinal, constituindo o ligamento denticulado que prende a medula à</p><p>aracnoide e à dura-máter.</p><p>Os vasos arteriais que se dirigem ao tecido nervoso penetram na pia-</p><p>máter. Nesse nível, a pia-máter acompanha inicialmente os vasos, formando os</p><p>espaços perivasculares (Menezes, 2015). Nestes espaços existem</p><p>prolongamentos do espaço subaracnóideo, contendo líquor, que forma um</p><p>manguito protetor em tomo dos vasos, muito importante para amortecer o efeito</p><p>da pulsação das artérias ou picos de pressão sobre o tecido circunvizinho</p><p>(Machado; Raertel, 2014).</p><p>TEMA 3 – VENTRÍCULOS E LÍQUOR</p><p>Durante o desenvolvimento embrionário e a diferenciação das estruturas</p><p>do tubo neural, a luz do tubo na região encefálica origina o sistema ventricular</p><p>formado por cavidades chamadas ventrículos. Os ventrículos estão localizados</p><p>profundamente dentro do núcleo encefálico, são preenchidos pelo líquor e se</p><p>conectam entre sim e com o espaço subaracnóideo por meio de aberturas ou</p><p>forames. Fazem parte do sistema ventricular adulto os ventrículos laterais direito</p><p>e esquerdo, o III e IV ventrículos, além do aqueduto cerebral que comunica o III</p><p>e o IV ventrículos (Figura 6).</p><p>10</p><p>Figura 6 – Sistema ventricular</p><p>Crédito: joshya/Shutterstock.</p><p>Os ventrículos laterais são os maiores, são simétricos e formam um “C”</p><p>no interior de cada hemisfério cerebral. Cada ventrículo lateral se divide em uma</p><p>parte central que ocupa os lobos frontal e parietal e três prolongamentos: o corno</p><p>frontal ou anterior, um corno posterior ou occipital e um corno inferior ou</p><p>temporal. Os três prolongamentos se estendem para dentro dos lobos frontal,</p><p>occipital e temporal, respectivamente.</p><p>Os ventrículos laterais, antigamente denominados I e II ventrículos, se</p><p>comunicam com o III ventrículo por meio do forame interventricular e a porção</p><p>central dos ventrículos laterais localiza-se posteriormente ao forame</p><p>interventricular estendendo-se até a extremidade posterior do tálamo. A porção</p><p>central possui teto, parede medial e assoalho. O corno occipital possui teto e</p><p>parede lateral, estende-se posteriormente no lobo occipital e termina em fundo</p><p>de saco passando pelas fibras do corpo caloso. O corno temporal estende-se</p><p>anteriormente no lobo temporal, possui teto e assoalho, passando pelo</p><p>hipocampo.</p><p>O III ventrículo é uma pequena cavidade ímpar em forma de fenda na</p><p>porção central do diencéfalo, entre o tálamo e o hipotálamo. Comunica-se</p><p>posteriormente com o IV ventrículo por meio do aqueduto do mesencéfalo, é</p><p>11</p><p>atravessado pela aderência intertalâmica e evagina-se formando quatro</p><p>recessos: infundíbulo, óptico, pineal e suprapineal.</p><p>O IV ventrículo tem forma losangular e situa-se anteriormente ao cerebelo</p><p>e posteriormente à ponte e à metade superior do bulbo, se prolongando</p><p>inferiormente com o canal central da medula. Possui duas aberturas laterais</p><p>(forames de Luschka) e uma abertura mediana (forame de Magendie) que</p><p>permitem o fluxo do líquor para o espaço subaracnóideo.</p><p>No interior de todos os ventrículos, existem vasos modificados associados</p><p>à pia-máter, denominados plexos corioides. Estes, junto com as células</p><p>ependimárias, formam o líquor (líquido cerebroespinhal ou fluido</p><p>cefalorraquidiano) a partir do plasma sanguíneo (Schmidt; Prosdócimi, 2017).</p><p>O líquido cerebroespinhal encontra-se nos ventrículos do encéfalo e no</p><p>espaço subaracnóideo em volta do encéfalo e da medula espinal. Seu volume</p><p>aproximado é de 150 mL. É um líquido claro e incolor e possui, em solução, sais</p><p>inorgânicos semelhantes àqueles do plasma sanguíneo. O nível de glicose é</p><p>aproximadamente metade da glicemia e há apenas uma pequena quantidade de</p><p>proteína. Apenas algumas células estão presentes e são linfócitos. A pressão do</p><p>líquido cerebroespinhal é mantida notavelmente constante (Snell, 2019). A</p><p>Figura 7 evidencia a distribuição do líquido cerebroespinal.</p><p>Figura 7 – Líquido cerebroespinal</p><p>Crédito: Hanafi Latif/Shutterstock.</p><p>12</p><p>O líquor apresenta várias funções. O fluxo existente dos ventrículos para</p><p>o sangue promove a remoção de diferentes metabólitos. Como o líquor do</p><p>espaço subaracnóideo envolve o SNC, o encéfalo flutua nesse meio, formando</p><p>uma proteção mecânica contra os traumatismos cranianos. O líquor contém</p><p>anticorpos e leucócitos, o que auxilia a defesa contra agentes e microrganismos</p><p>externos (Meneses, 2015).</p><p>O líquido cerebroespinhal produzido nos ventrículos laterais flui até o</p><p>terceiro ventrículo, posteriormente</p><p>até o quarto ventrículo e, por fim, para o</p><p>espaço subaracnóideo. De acordo com Cosenza (2013), o líquido</p><p>cerebroespinhal então retorna ao sangue, sendo absorvido na região das</p><p>granulações aracnoideas, que são projeções da aracnoide para o interior dos</p><p>seios da dura-máter. Qualquer defeito na reabsorção ou um bloqueio na</p><p>circulação do líquor pode ocasionar o seu acúmulo no interior das cavidades do</p><p>SNC, promovendo as chamadas hidrocefalias.</p><p>TEMA 4 – VASCULARIZAÇÃO E BARREIRAS ENCEFÁLICAS</p><p>Assim como os demais sistemas corporais, o sistema nervoso necessita</p><p>de irrigação sanguínea constante. Um suprimento elevado de glicose e oxigênio</p><p>é necessário para que estruturas tão nobres e especializadas, quanto as que se</p><p>encontram nesse sistema, possam realizar seu metabolismo. Como explica</p><p>Machado e Raertel (2014), a parada da circulação cerebral por mais de dez</p><p>segundos leva o indivíduo à perda da consciência. Após cerca de cinco minutos,</p><p>começam a aparecer lesões irreversíveis pois, como se sabe, a maioria das</p><p>células nervosas não se regeneram. Isso acontece, por exemplo, como</p><p>consequência de paradas cardíacas.</p><p>O encéfalo constitui 2 a 2,5% do peso corpóreo, mas recebe em torno de</p><p>17% do rendimento cardíaco e consome aproximadamente 20% do oxigênio</p><p>utilizado pelo corpo (Schmidt; Prosdócimi, 2017). Os processos patológicos que</p><p>acometem os vasos cerebrais ocorrem com frequência cada vez maior com o</p><p>aumento da vida média do homem moderno. São os acidentes vasculares</p><p>cerebrais (AVC) hemorrágicos ou oclusivos, também denominados isquêmicos</p><p>(tromboses e embolias). Eles interrompem a circulação de determinadas áreas</p><p>encefálicas, causando necrose do tecido nervoso, e são acompanhados de</p><p>alterações motoras, sensoriais ou psíquicas, que podem ser características para</p><p>área e a artéria lesada (Machado; Raertel, 2014).</p><p>13</p><p>Vale lembrar que não existe circulação linfática no sistema nervoso central</p><p>e as artérias que suprem o sistema nervoso normalmente apresentam paredes</p><p>mais finas que as artérias encontradas em outros órgãos, fator esse</p><p>determinante para a maior propensão a rupturas e hemorragias.</p><p>As artérias de maior calibre percorrem a superfície do sistema nervoso no</p><p>espaço subaracnóideo até se tornarem delgadas o suficiente para penetrarem</p><p>em seu parênquima, perfurando, antes disso, a pia-máter. Esta meninge, como</p><p>vimos anteriormente, acompanha toda a superfície do encéfalo e, onde</p><p>especificamente os vasos penetram no parênquima, ela se dobra formando uma</p><p>parede externa e delimitando um espaço perivascular. Esse espaço é de extrema</p><p>importância, pois, pelo fato de conter líquor, é um dos mecanismos existentes</p><p>para absorver o impacto da pulsação das artérias que penetram no cérebro</p><p>(Martinez; Allodi; Uziel, 2014).</p><p>O SNC é irrigado basicamente por dois sistemas arteriais: o carotídeo e o</p><p>vertebral. As artérias carótidas internas sobem pelo pescoço e, após penetrarem</p><p>no crânio, dão origem as artérias cerebral anterior e cerebral média. A primeira</p><p>origina ramos na face medial do cérebro, enquanto a segunda origina vários</p><p>ramos na face dorsolateral do cérebro. As artérias vertebrais que penetram no</p><p>crânio pelo forame magno dão ramos que irão irrigar a medula e o cerebelo e se</p><p>fundem na face ventral da ponte, formando a artéria basilar. Esta última dá</p><p>origem a ramos que vão para o tronco encefálico e o cerebelo e se divide em</p><p>duas artérias cerebrais posteriores, que irrigarão a superfície inferior do cérebro</p><p>(Cosenza, 2013).</p><p>A anastomose entre os ramos das duas artérias carótidas internas e das</p><p>duas artérias vertebrais na base do cérebro forma o círculo arterial do cérebro,</p><p>ou polígono de Willis. Esse polígono permite que o sangue seja distribuído a</p><p>qualquer parte dos hemisférios cerebrais e que rotas alternativas ocorram em</p><p>caso de obstrução de uma das artérias principais do círculo (Figura 8).</p><p>14</p><p>Figura 8 – Vascularização do encéfalo</p><p>Crédito: Medical Media/Shutterstock.</p><p>O sangue que circula no SNC é drenado para veias cerebrais, que levam</p><p>esse sangue para os seios venosos da dura-máter. O sangue segue então para</p><p>as veias jugulares internas, passando para as veias cavas e chegando, no final,</p><p>ao coração. A circulação venosa é mais lenta e a pressão do sangue é mais</p><p>baixa, pois as veias do encéfalo não possuem valvas e são mais calibrosas que</p><p>as artérias. Dessa forma, outros fatores auxiliam a circulação venosa: pulsação</p><p>das artérias próximas, força da gravidade e aspiração da cavidade torácica.</p><p>Para proteger o tecido nervoso de agressões causadas por toxinas e</p><p>microrganismos, existem barreiras encefálicas capazes de impedir ou dificultar</p><p>a passagem de substâncias do sangue para o parênquima nervoso (barreira</p><p>hematoencefálica), do sangue para o líquor (barreira hematoliquórica) e do líquor</p><p>para o tecido nervoso (barreira líquorencefálica). Essas barreiras estão</p><p>presentes no encéfalo e na medula espinal, e permitem a passagem de</p><p>nutrientes e gases, controlando o microambiente do parênquima nervoso. Por</p><p>outro lado, impedem também a passagem de vários medicamentos</p><p>administrados por via sanguínea, diminuindo sua eficácia.</p><p>TEMA 5 – CORRELAÇÕES ANATOMOCLÍNICAS</p><p>O uso, pela mãe, de determinados medicamentos, álcool e drogas, bem</p><p>como a exposição à radiação, pode afetar as diversas etapas do</p><p>desenvolvimento embrionário do sistema nervoso. No primeiro trimestre podem</p><p>15</p><p>interferir na proliferação neuronal e o número menor de neurônios pode originar</p><p>a microcefalia. Já no segundo ou terceiro trimestres a organização neuronal pode</p><p>ficar prejudicada e o menor número de sinapses pode causar atraso no</p><p>desenvolvimento neuropsicomotor.</p><p>Falhas no fechamento do tubo neural são as malformações mais comuns</p><p>do SNC. A espinha bífida e a meningocele ocorrem quando o neuroporo caudal</p><p>não se fecha e o arco vertebral da coluna espinal está incompleto ou ausente,</p><p>sem comprometimento do sistema nervoso. Na espinha bífida a meninge dura-</p><p>máter e a medula são normais, por isso, o quadro é frequentemente</p><p>assintomático, enquanto na meningocele ocorre um déficit ósseo maior, sendo</p><p>assim, a dura-máter sobressai como um balão na região lombossacra contendo</p><p>líquor e raízes medulares, tornando necessária uma correção cirúrgica. Existe</p><p>ainda a mielomeningocele, quando defeitos na formação do tubo neural</p><p>acompanham a abertura óssea e a medula espinal penetra na bolsa meníngea,</p><p>ocasionando grave comprometimento e possível paraplegia (Figura 9).</p><p>Figura 9 – Espinha bífida, meningocele e mielomeningocele</p><p>Crédito: rumruay/Shutterstock.</p><p>Quando o neuroporo craniano não se fecha, o prosencéfalo não se</p><p>desenvolve, resultando em falha no fechamento do crânio, das meninges e do</p><p>couro cabeludo, o que expõem o tecido encefálico remanescente ao líquido</p><p>amniótico cincundante. Essa condição letal é chamada anencefalia. A</p><p>16</p><p>suplementação com ácido fólico é indicada para mulheres que tem intensão de</p><p>engravidar, pois reduz a incidência dos distúrbios de fechamento do tubo neural.</p><p>Infecções nas meninges causadas por bactérias, vírus e fungos são</p><p>conhecidas como meningites e caracterizam-se por sintomas como cefaleias,</p><p>rigidez nucal, febre, vômito e irritação. Os meningiomas, por sua vez, são</p><p>tumores tipicamente benignos originados por meningócitos ou células</p><p>aracnoides. Podem crescer em qualquer lugar das meninges e os principais</p><p>sintomas são cefaleias, convulsões, fraqueza muscular, distúrbios visuais, perda</p><p>auditiva, déficit neurológico focal progressivo e alterações de personalidade e</p><p>comportamento.</p><p>O espaço subaracnóideo é de grande importância clínica na realização de</p><p>punções e introdução de anestésicos ou contrastes para a realização de exames.</p><p>A punção lombar é realizada com o paciente inclinado para frente ou em decúbito</p><p>lateral com o dorso fletido, sendo introduzida uma agulha fina entre a 3ª e 4ª</p><p>vértebras</p><p>para retirar uma amostra do líquido cerebroespinhal, níveis em que</p><p>não há riscos de lesar a medula. A agulha perfura então a dura-máter e a</p><p>aracnoide, entrando na cisterna lombar (Figura 10). Esse é um importante</p><p>instrumento de diagnóstico para avaliar distúrbios do SNC, pois as doenças</p><p>desse sistema podem alterar as células no líquido ou mudar a concentração dos</p><p>seus constituintes químicos (Schmidt; Prosdócimi, 2017).</p><p>Figura 10 – Punção lombar</p><p>Crédito: rumruay/Shutterstock.</p><p>17</p><p>Os aneurismas cerebrais ocorrem mais comumente no local onde duas</p><p>artérias se juntam na formação do polígono de Willis. Nesse ponto, o</p><p>desenvolvimento de um ateroma enfraquece a parede arterial a ponto de ocorrer</p><p>dilatação local. O aneurisma pode comprimir as estruturas vizinhas, como o</p><p>nervo óptico ou outros nervos cranianos, produzindo sinais e sintomas ou</p><p>rompendo-se subitamente no espaço subaracnóideo. No último caso, sobrevém</p><p>dor de cabeça intensa seguida por confusão mental. O grampeamento ou</p><p>ligadura do colo do aneurisma oferece a melhor chance de recuperação (Snell,</p><p>2019).</p><p>NA PRÁTICA</p><p>O aumento anormal do volume do líquido cerebroespinhal e consequente</p><p>aumento dos ventrículos encefálicos é denominado hidrocefalia. Essa condição</p><p>pode comprimir o encéfalo nos ossos do crânio causando cefaleia, náuseas,</p><p>vômitos, distúrbios visuais, incoordenação motora, alterações na personalidade</p><p>e dificuldade de concentração. A hidrocefalia pode ser classificada em</p><p>comunicante obstrutiva, comunicante não obstrutiva e não comunicante. O</p><p>tratamento é realizado por meio de um procedimento cirúrgico chamado</p><p>derivação ventrículo-peritoneal.</p><p>Consulte os livros indicados nas referências e procure explicar a diferença</p><p>entre os tipos de hidrocefalia em relação às suas origens e características.</p><p>Descreva também as etapas do processo cirúrgico utilizado como tratamento da</p><p>hidrocefalia.</p><p>FINALIZANDO</p><p>Durante essa aula foram construídos os principais conceitos referentes</p><p>aos processos que originam o sistema nervoso durante o desenvolvimento</p><p>embrionário. Nesse contexto, entendemos a sequência de eventos desde o</p><p>fechamento do tubo neural, a formação do arquencéfalo, das vesículas</p><p>encefálicas primárias e secundárias, a migração e diferenciação neuronal, até a</p><p>formação completa dos componentes do sistema nervoso, que pode ser dividido</p><p>didaticamente para facilitar seu estudo anatômico e funcional.</p><p>Aprendemos também sobre a formação do sistema ventricular pela luz do</p><p>tubo neural em desenvolvimento, sistema esse composto, nos adultos, pelos</p><p>18</p><p>ventrículos: laterais direito e esquerdo, III e IV ventrículos, além do aqueduto</p><p>cerebral. Além disso, identificamos as meninges como membranas que</p><p>recobrem e protegem o SNC e estudamos sobre seus componentes e sua</p><p>distribuição. O líquor é produzido pelos plexos corioideos e células</p><p>ependimárias, preenche os ventrículos e o espaço subaracnóideo, protege</p><p>mecanicamente o SNC e contém anticorpos e leucócitos que auxiliam na defesa.</p><p>No final, relacionamos as malformações denominadas espinha bífida,</p><p>meningocele, mielomeningocele e anencefalia com o não fechamento adequado</p><p>do tubo neural; e discutimos sobre as meningites, os meningomas e a</p><p>importância da punção lombar no diagnóstico de distúrbios do SNC.</p><p>19</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>COSENZA, R. M. Fundamentos de neuroanatomia. 4. ed. Rio de Janeiro:</p><p>Guanabara Koogan, 2013.</p><p>MACHADO, A.; RAERTEL, L. M. Neuroanatomia funcional. 3. ed. São Paulo:</p><p>Atheneu, 2014.</p><p>MARTINEZ. A.; ALLODI, S.; UZIEL, D. Neuroanatomia essencial. Rio de</p><p>Janeiro: Guanabara Koogan, 2014.</p><p>MENESES, M. S. Neuroanatomia aplicada. 3. ed. Rio de Janeiro: Guanabara</p><p>Koogan, 2015.</p><p>SNELL, R. S. Neuroanatomia Clínica. 7. ed. Rio de Janeiro: Guanabara</p><p>Koogan, 2019.</p><p>Conversa inicial</p><p>Na prática</p><p>FINALIZANDO</p>

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