Logo Passei Direto
Buscar
Material
páginas com resultados encontrados.
páginas com resultados encontrados.
left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

Prévia do material em texto

<p>113</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>Unidade III</p><p>7 AS TEORIAS DO JORNALISMO</p><p>Antes de detalharmos as principais teorias do jornalismo, é importante entendermos o contexto de</p><p>desenvolvimento das diversas correntes teóricas que envolvem a atividade. Como vimos nas unidades</p><p>anteriores, ao longo de sua trajetória, o jornalismo atravessou várias fases1, acompanhando, como era</p><p>de se esperar, a própria evolução das sociedades contemporâneas.</p><p>Uma das primeiras questões a serem analisadas é o fato de que nem todos os autores que estudam</p><p>o jornalismo concordam com a necessidade de haver um recorte específico para a atividade. Nesse caso,</p><p>opta-se por incluir as análises nesse campo nas teorias da comunicação.</p><p>Tomando como referência o livro de Felipe Pena, Teorias do jornalismo, que é uma das principais</p><p>referências nessa área para as escolas de jornalismo, consideramos necessário haver o recorte, uma vez</p><p>que acreditamos que as discussões específicas sobre o fazer jornalístico contribuem para a formação dos</p><p>futuros profissionais, além de servir de base para o aprimoramento das práticas profissionais de quem</p><p>já está na área.</p><p>Em sua obra, Pena (2005) parte da análise das sistematizações propostas por professores como Nelson</p><p>Traquina, Jorge Pedro Sousa, Michael Kunczik, José Marques de Melo e Nilson Lage, pesquisadores que</p><p>têm contribuído para o aprofundamento dos estudos sobre jornalismo no Brasil.</p><p>Como ponto inicial, devemos observar que a teoria do jornalismo se ocupa de duas questões básicas,</p><p>como descreve Pena:</p><p>1) Por que as notícias são como são? 2) Quais são os efeitos que essas</p><p>notícias geram? A primeira parte preocupa-se fundamentalmente com a</p><p>produção jornalística, mas também envereda pelo estudo da circulação do</p><p>produto, a notícia. Esta, por sua vez, é resultado da interação histórica e da</p><p>combinação de uma série de vetores: pessoal, cultural, ideológico, social,</p><p>tecnológico e midiático (2005, p. 20).</p><p>A partir daí, cada uma das abordagens teóricas formula suas respostas. Essa é uma observação</p><p>importante porque reforça a necessidade de pensarmos que não existe exatamente uma hierarquia</p><p>entre as teorias; ou seja, uma não é melhor do que a outra. O que vamos analisar, na aplicação delas, é</p><p>a adequação ao objeto de estudo.</p><p>1 Referimo-nos, neste caso, à divisão feita por Ciro Marcondes Filho, no livro Comunicação e jornalismo: a saga dos</p><p>cães perdidos, no qual ele traça um quadro evolutivo de quatro épocas distintas.</p><p>114</p><p>Unidade III</p><p>Em termos didáticos, para facilitar a compreensão do assunto, podemos pensar que, assim como</p><p>acontece com as teorias da comunicação, não há uma forma única de analisar o jornalismo, até porque</p><p>precisamos levar em consideração o aspecto que está sendo observado na investigação em questão.</p><p>O foco é a linguagem jornalística? O canal empregado para transmitir aquela informação? Os efeitos</p><p>gerados na recepção daquela mensagem? Enfim, há uma série de elementos que devem ser considerados</p><p>quando nos propomos a realizar esse tipo de investigação.</p><p>A despeito das dificuldades, a compreensão dos aspectos teóricos e conceituais da atividade</p><p>jornalística é fundamental para que os profissionais que atuam nessa área tenham condições de realizar</p><p>o seu trabalho, que, vale enfatizar, é extremamente importante para a sociedade.</p><p>A questão é: se, no capitalismo tardio, a informação é tão estratégica,</p><p>quem serão seus mediadores? Nesse ponto é que o jornalismo assume uma</p><p>função vital. E é por isso que estou interessado em discutir seus conceitos e</p><p>teorias. Com a convergência tecnológica, que traz hibridação de contextos</p><p>midiáticos e culturais em fluxos de informação com velocidade cada vez</p><p>mais acelerada, o profissional da imprensa precisa ter uma formação sólida</p><p>e específica para assumir o papel de mediador. Em outras palavras, ele</p><p>precisa ser um especialista. Ninguém gostaria de entrar em um hospital e ser</p><p>atendido por um contador. Ou ser defendido no tribunal por um veterinário.</p><p>Então, por que seria diferente com o jornalismo? (PENA, 2005, p. 14).</p><p>Ainda com relação ao contexto de desenvolvimento das teorias do jornalismo, é importante diferenciar</p><p>o que entendemos por notícia. Ela assume contornos distintos nas várias abordagens teóricas, mas</p><p>podemos iniciar com essa definição de Genro Filho (1987), que demarca bem a forma como o jornalismo</p><p>se desenvolveu a partir do século XIX:</p><p>A notícia jornalística não pode ser considerada como uma modalidade</p><p>da informação em geral. Não foi a transmissão genérica da experiência</p><p>- o que sempre ocorreu em sociedade - e sim a transmissão sistemática,</p><p>por determinados meios técnicos, de um tipo de informação necessária</p><p>à integração e universalização da sociedade, a partir da emergência do</p><p>capitalismo, que deu origem à notícia jornalística (online).</p><p>Essa definição alinha-se com o entendimento de que o jornalismo, tal como conhecemos e</p><p>praticamos hoje, nasce e se desenvolve de acordo com o avanço do próprio capitalismo. Não se trata</p><p>de um aspecto secundário, como pode parecer num primeiro momento, porque isso vai determinar,</p><p>inclusive, as abordagens teóricas desenvolvidas sobre a atividade.</p><p>Outra reflexão importante é que as pesquisas iniciais sobre o jornalismo foram desenvolvidas</p><p>dentro de determinado contexto, o da grande mídia. A partir da década de 2000, com a consolidação</p><p>do webjornalismo, os acontecimentos passam a ser disponibilizados também por outros agentes, os</p><p>usuários da internet. Com isso, entram em cena outras questões que devem ser analisadas, como o fato</p><p>de que o jornalista não ocupa mais papel central na mediação social dos acontecimentos.</p><p>115</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>Nesse sentido, tornaram-se mais frequentes também as investigações que envolvem a questão da</p><p>interatividade, presente em posts, comentários e fóruns.</p><p>Lembrete</p><p>A compreensão dos aspectos teóricos e conceituais da atividade</p><p>jornalística é fundamental para que os profissionais realizem bem o seu</p><p>trabalho, que é extremamente importante para a sociedade.</p><p>7.1 O mito da objetividade jornalística</p><p>O debate sobre a objetividade jornalística faz parte da atividade desde o início, uma vez que a</p><p>necessidade de separar fatos e opiniões foi importante, ainda no início do chamado Segundo Jornalismo,</p><p>para que a imprensa demarcasse a posição que assumiria na sociedade moderna.</p><p>Vejamos esta análise feita por Genro Filho (1987):</p><p>Não há dúvida que a chamada “objetividade jornalística” esconde uma</p><p>ideologia, a ideologia burguesa, cuja função é reproduzir e confirmar</p><p>as relações capitalistas. Essa objetividade implica uma compreensão do</p><p>mundo como um agregado de “fatos” prontos e acabados, cuja existência,</p><p>portanto, seria anterior a qualquer forma de percepção e autônoma em</p><p>relação a qualquer ideologia ou concepção de mundo. Caberia ao jornalista,</p><p>simplesmente, recolhê-los escrupulosamente como se fossem pedrinhas</p><p>coloridas. Essa visão ingênua, conforme já foi sublinhado, possui um fundo</p><p>positivista e funcionalista. Porém, não é demais insistir, essa “ideologia da</p><p>objetividade” do jornalismo moderno esconde, ao mesmo passo que indica,</p><p>uma nova modalidade social do conhecimento, historicamente ligado</p><p>ao desenvolvimento do capitalismo e dotado de potencialidade que o</p><p>ultrapassam (online).</p><p>A partir da leitura dessa análise, já fica claro que essa questão não é secundária para o exercício do</p><p>jornalismo. E, como veremos ao longo do nosso estudo, ela é objeto de muitos embates entre os próprios</p><p>pesquisadores desde o início da atividade. Compreensível, uma vez que a discussão sobre a subjetividade</p><p>no jornalismo diz respeito ao próprio entendimento sobre a natureza do jornalismo.</p><p>Ao analisar o assunto, Pena (2005) também enfatiza a necessidade de compreendermos que no</p><p>jornalismo a subjetividade não deve ser vista como uma oposição à objetividade. Segundo o autor, o que</p><p>está em jogo nesse caso é o reconhecimento da inevitabilidade. Ou seja, justamente pela constatação</p><p>de que os fatos são construídos</p><p>de</p><p>noticiabilidade como o conjunto de critérios e operações que fornecem</p><p>a aptidão de merecer um tratamento jornalístico, isto é, possuir valor</p><p>como notícia. Assim, os critérios de noticiabilidade são o conjunto de</p><p>valores-notícia que determinam se um acontecimento, ou assunto, é</p><p>susceptível de se tornar notícia, isto é, de ser julgado como merecedor de</p><p>ser transformado em matéria noticiável e, por isso, possuindo valor-notícia</p><p>(TRAQUINA, 2005, p. 63).</p><p>Ao abordar a forma como o tema tem sido estudado na história do jornalismo, Traquina cita ainda</p><p>a importância do estudo realizado por Hebert Gans, em 1979, que teve como foco os telejornais de três</p><p>cadeias norte-americanas, CBS, ABC e NBC, além das revistas de informação Newsweek e Time.</p><p>Nesse trabalho, foi evidenciada a relevância dos critérios adotados na produção jornalística, a partir</p><p>da verificação da semelhança entre as notícias publicadas, confirmando que não se trata de um acaso,</p><p>mas de um padrão, determinado por uma série de fatores.</p><p>É esta a proposta que fundamenta a Teoria do Newsmaking: a constatação de que os valores-notícia</p><p>estão presentes em todo o processo de produção jornalística, da seleção à elaboração das matérias.</p><p>Portanto, como define Traquina (2005) ao elaborar o conceito, existe um processo de construção da notícia.</p><p>Refletindo sobre o emprego da Teoria do Newsmaking nas pesquisas sobre jornalismo, é importante</p><p>enfatizar que, nesse caso, as propostas partem para análises específicas sobre o fazer jornalístico,</p><p>contemplando desde o valor-notícia até as questões relacionadas à rotina do trabalho jornalístico, como</p><p>as fontes utilizadas, o tipo de veículo de comunicação, as linhas editoriais etc.</p><p>Contribuindo para a reflexão sobre o ambiente no qual o jornalismo se assenta, Sousa (1999) cita</p><p>diversos fatores que exercem pressão sobre a atividade e que são considerados nos estudos feitos a</p><p>partir da perspectiva do newsmaking:</p><p>• deadlines cada vez mais apertadas;</p><p>• devido à internet, perda do seu papel de gatekeeper privilegiado da informação publicamente</p><p>difundida;</p><p>• obrigação de narrar histórias complexas em situações de incerteza, sem todos os dados disponíveis</p><p>ou todas as fontes acessíveis;</p><p>• pressão pela competição;</p><p>142</p><p>Unidade III</p><p>• constrangimento pela gestão dos recursos humanos, financeiros e materiais da sua organização</p><p>noticiosa;</p><p>• falta de tempo para ponderar devidamente sobre a pertinência e o significado dos acontecimentos e</p><p>das ideias que seleciona e, consequentemente, sobre a pertinência e o significado da informação</p><p>que vai disponibilizar ao público;</p><p>• necessidade de notável know how, quer sobre jornalismo e técnicas de expressão jornalística, quer</p><p>sobre a área em que se especializou, além de uma agenda de contatos rica e diversificada.</p><p>Convenhamos que, no global, são exigências nada fáceis de cumprir.</p><p>De qualquer modo, talvez não estejamos a assistir a um enfraquecimento do</p><p>jornalismo, mas apenas à volatilização de uma certa concepção de jornalismo,</p><p>resultante da condensação sobre a atividade jornalística de uma série de</p><p>forças constrangentes, nem sempre resultantes de estratégias lineares e</p><p>menos ainda claras de poder e dominação. Neste quadro, a formação do</p><p>jornalista e o entendimento público esclarecido e desmistificado sobre o que</p><p>é o jornalismo torna-se crucial (SOUSA, 1999, online).</p><p>Lembrete</p><p>A Teoria do Newsmaking pressupõe que as notícias são como são em</p><p>função das rotinas de produção do jornalismo.</p><p>Observação</p><p>É na acepção da Teoria do Newsmaking que o trabalho jornalístico</p><p>passa a ser visto não como espelho da realidade, e sim como construção</p><p>da realidade.</p><p>8.5 A Teoria do Agendamento</p><p>A Teoria do Agendamento, ou Agenda Setting, como se costuma utilizar nos estudos, é baseada no</p><p>conceito de agendamento que foi proposto, em 1972, por Maxwell E. McCombs e Donald Shaw.</p><p>Confira a definição feita por Pena:</p><p>A Teoria do Agendamento defende a ideia de que os consumidores de</p><p>notícias tendem a considerar mais importantes os assuntos que são</p><p>veiculados na imprensa, sugerindo que os meios de comunicação agendam</p><p>nossas conversas. Ou seja, a mídia nos diz sobre o que falar e pauta nossos</p><p>relacionamentos (2005, p. 144).</p><p>143</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>Para entender os seus pressupostos, contudo, temos que voltar alguns anos, mais precisamente, para</p><p>a década de 1920. Nesse período, foi lançado o livro Opinião pública, do jornalista Walter Lippmann</p><p>(1922), que buscava reforçar “a pregação do uso de métodos científicos contra a subjetividade na</p><p>profissão, para fazer frente às distorções factuais verificadas na cobertura da Primeira Guerra Mundial”</p><p>(CASTRO, 2013, p. 5).</p><p>Diversos autores enfatizam a importância desse trabalho para o desenvolvimento da Teoria do</p><p>Agendamento. Como explica Vizeu (2002), logo no primeiro capítulo, sob o título “The world outside and</p><p>the pictures in our heads”, Lippmann mostra que a mídia (a imprensa, essencialmente, nesse momento</p><p>histórico) pode ser considerada a principal ligação entre os acontecimentos do mundo e as imagens</p><p>desses acontecimentos na nossa mente.</p><p>Lippmann iria antecipar em 50 anos todo um conjunto de pesquisas em</p><p>torno da teoria do agendamento (McCOMBS; SHAW, 1972), que foi, no fim</p><p>do século XX, uma das linhas de pesquisa mais dinâmicas no estudo da</p><p>mídia e do jornalismo. Basicamente, a hipótese do agendamento sustenta</p><p>que as pessoas agendam seus assuntos e conversas em função do que a</p><p>mídia veicula (VIZEU, 2002, p. 2).</p><p>Em sua análise sobre as premissas dessa teoria, Pena destaca aspectos que devem ser avaliados com</p><p>atenção. A partir desses estudos, houve uma mudança no foco das investigações, porque o objetivo</p><p>passa a ser entender de que maneira as pessoas apreendem (e aprendem) as informações e formam seu</p><p>conhecimento sobre o mundo. Para exemplificar, o autor cita o caso de veículos como a televisão, que</p><p>mudam nossa forma de aprendizado.</p><p>[...] passamos a nos acostumar com a velocidade das edições e a telegrafia</p><p>da linguagem. Reflexões profundas e demoradas tornam-se mais difíceis</p><p>para as gerações que crescem em frente aos aparelhos de TV. O tempo da</p><p>cognição é outro (PENA, 2005, p. 146).</p><p>Outro aspecto importante é a hipótese de a Agenda Setting não defender que a imprensa tenha</p><p>intenção de persuadir. Segundo a interpretação de autores como Pena (2005), a influência da mídia</p><p>nas conversas dos cidadãos é resultado da dinâmica organizacional das empresas de comunicação;</p><p>ou seja, isso acaba acontecendo a partir da adoção dos critérios de noticiabilidade e da própria</p><p>cultura jornalística.</p><p>Na maioria dos casos, estudos baseados nessa teoria referem-se à confluência</p><p>entre a agenda midiática e a agenda pública. Entretanto, seus objetivos não</p><p>são verificar mudanças de voto ou de atitude, mas sim a influência da mídia</p><p>na opinião dos cidadãos sobre que assuntos devem ser prioritariamente</p><p>abordados pelos políticos (PENA, 2005, p. 146).</p><p>144</p><p>Unidade III</p><p>Dando sequência às análises baseadas nessa teoria, devemos analisar também outros conceitos que</p><p>ajudam a entender de que forma os meios de comunicação influenciam os temas que serão discutidos</p><p>na sociedade. Essa análise é feita com base no artigo de Juliana Brum (2003), citando o texto de</p><p>Hohlfeldt (1997):</p><p>• Acumulação: capacidade que a mídia tem de dar relevância a determinado tema, destacando-o</p><p>do imenso conjunto de acontecimentos diários.</p><p>• Consonância: apesar de suas diferenças e especificidades, as mídias possuem traços em</p><p>comum e semelhanças na maneira pela qual atuam na transformação do relato de um</p><p>acontecimento em notícia.</p><p>• Onipresença: um acontecimento que, transformado em notícia, ultrapassa os espaços</p><p>tradicionalmente por ele ocupados. O acontecimento de polícia pode ser abordado em outras</p><p>editorias dos meios de comunicação.</p><p>• Relevância: quando determinado acontecimento é noticiado por todas as diferentes mídias,</p><p>independentemente do enfoque que lhe seja atribuído.</p><p>• Frame temporal: período</p><p>de levantamento de dados das duas ou mais agendas (isto é, a agenda</p><p>da mídia e a agenda pública, por exemplo).</p><p>• Time-lag: intervalo decorrente entre o período de levantamento da agenda da mídia e a agenda</p><p>do público, ou seja, como se pressupõe a existência e um efeito da mídia sobre o público.</p><p>• Centralidade: capacidade que as mídias têm de colocar determinado assunto como algo</p><p>importante.</p><p>• Tematização: está implicitamente ligada à centralidade, pois é a capacidade de dar o destaque</p><p>necessário (sua formulação, a maneira pela qual o assunto é exposto), de modo a chamar a</p><p>atenção. Um dos desdobramentos deste item é a suíte de uma matéria, ou seja, os múltiplos</p><p>enfoques que a informação recebe para manter a atenção do receptor.</p><p>• Saliência: valorização individual dada pelo receptor a determinado assunto noticiado.</p><p>• Focalização: maneira pela qual a mídia aborda determinado assunto, utilizando determinada</p><p>linguagem e recursos de editoração.</p><p>Para Pena (2005), essas características:</p><p>apontam para uma relativização dos pressupostos originais da teoria</p><p>do agendamento, o que é demonstrado pelas pesquisas de campo mais</p><p>recentes. Elas continuam confirmando o efeito da agenda, mas não de</p><p>forma tão determinista. Uma relativa consciência pública do fenômeno</p><p>145</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>talvez contribua para diminuir sua eficácia. Além disso, se o paradigma</p><p>recente é o do acúmulo, é preciso um longo espaço de tempo para fazer uma</p><p>avaliação lúcida sobre a influência da imprensa no modo de hierarquizar os</p><p>acontecimentos importantes e agendar nossos assuntos e concepções sobre</p><p>eles, o que é o fator mais importante (p. 147).</p><p>Ao analisar as limitações da Agenda Setting, Barros Filho (2001) observa que, como não existe uma</p><p>determinação sobre a definição dos prazos, muitos pesquisadores acabam concentrando os estudos em</p><p>períodos curtos, mas os pressupostos da teoria exigem a análise dos efeitos no longo prazo. O autor</p><p>também indica a falta de rigor na utilização dos termos.</p><p>Observamos que essa falta de rigor costuma começar pela própria noção</p><p>de agendamento. O que é a determinação da agenda (agenda setting)?</p><p>Trata-se de dar a conhecer ao receptor (que, não fosse pelos meios, não se</p><p>inteiraria do fato)? Ou se trata de uma hierarquização temática (quando os</p><p>meios determinam qual a importância a dar a este ou àquele fato)? Ou ainda</p><p>de impor uma abordagem específica ao fato, enfocando o tema desta ou</p><p>daquela maneira? (BARROS FILHO, 2001, p. 180-181).</p><p>Lembrete</p><p>Na maioria dos casos, estudos baseados na Teoria do Agendamento</p><p>referem-se à confluência entre a agenda midiática e a agenda pública.</p><p>8.6 As abordagens teóricas contemporâneas do jornalismo</p><p>Figura 28 – Redação na era digital</p><p>Disponível em: https://bit.ly/3cvdGPc. Acesso em: 5 nov. 2021.</p><p>146</p><p>Unidade III</p><p>Ao abordar os desafios do ensino do jornalismo, Oliveira (2020b, p. 13) enfatiza a necessidade de</p><p>“quebrar a glamourização da atividade e refletir sobre o papel que a atividade tem na consolidação</p><p>de uma democracia ainda incipiente, que não chegou à periferia, independentemente do suporte ou</p><p>plataforma tecnológica”.</p><p>Essa necessidade de o jornalismo ampliar as perspectivas usadas para tratar os assuntos objetos de</p><p>pauta é a base do jornalismo emancipatório. Dennis Oliveira detalha essa proposta no livro Jornalismo e</p><p>emancipação: uma prática jornalística baseada em Paulo Freire, publicado em 2017 e resultado da tese</p><p>apresentada ao concurso de livre-docência da Escola de Comunicação e Artes.</p><p>No caso do jornalismo emancipatório, vale lembrar que não se trata apenas de contemplar a</p><p>diversificação dos assuntos. Para além da forma, é preciso incluir o posicionamento: “só se pretende ser</p><p>emancipatório se considerar o contexto vivido como opressor. E há uma posição tomada, que é a do</p><p>oprimido” (OLIVEIRA, 2017, p. 184).</p><p>O próprio Oliveira esclarece, logo no prefácio da obra citada, que o livro articula assuntos que são</p><p>ímpares na sua trajetória pessoal e acadêmica, como “a educação como ação libertadora, o jornalismo e</p><p>o seu compromisso com o interesse público, a luta contra o racismo e o compromisso político por uma</p><p>sociedade mais igualitária” (OLIVEIRA, 2017, p. 7). Nesse sentido, vale citar, o autor coordena um projeto</p><p>laboratorial com os alunos da graduação, o jornal comunitário da comunidade São Remo.</p><p>É importante enfatizar, no caso, a relevância assumida pelas dimensões relacionais nesses debates</p><p>sobre a ação emancipadora do jornalismo. Assim, deve-se pensar nas fontes consultadas não apenas</p><p>como “pessoas que falam, mas sim como seres sociais, inseridos em determinados contextos e lugares</p><p>que sinalizaram para certas falas e atitudes” (OLIVEIRA, 2017, p. 191).</p><p>Insere-se nessa problemática o que Oliveira (2020b) denomina como jornalismo da cultura do silêncio.</p><p>[...] se atua na construção de um circuito restrito de fontes legitimadas</p><p>pelos indicadores eurocêntricos e estabelece uma agenda pública a partir da</p><p>percepção de um “atraso estrutural” nas singularidades latino-americanas</p><p>que legitima práticas como: a) invisibilidade de experiências e vivências</p><p>protagonizadas por setores populares e, em determinados momentos,</p><p>deslocamento de tais eventos para uma perspectiva exótica ou disfuncional</p><p>(portanto, passível de ser reprimida); b) estabelecimento de hierarquias de</p><p>fala a partir da legitimidade acadêmica; c) estabelecimento de hierarquias</p><p>de fala a partir da legitimidade dos centros do capitalismo mundial (expresso,</p><p>por exemplo, na preferência de notícias produzidas pelas agências de notícias</p><p>situadas nestes países centrais, cobertura dos eventos destes países, adesão</p><p>acrítica a tais agendas, entre outros (p. 130).</p><p>Sob a perspectiva do cenário latino-americano, uma das questões centrais que se colocam para o</p><p>jornalismo emancipatório são as perspectivas do pensamento descolonial, importantes para demarcar</p><p>147</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>as dificuldades enfrentadas em função do padrão colonial do poder, que, em última instância, atua para</p><p>restringir a esfera pública.</p><p>Nesse contexto, projetos baseados na ação emancipatória têm um papel fundamental, na medida</p><p>em que possibilitam pensar na efetivação de espaços democráticos e inclusivos, o que envolve, por</p><p>exemplo, a consciência da cultura de direitos humanos e, no caso dos jornalistas, a compreensão sobre</p><p>o seu papel social.</p><p>No atual cenário político e econômico, marcado pelas disputas nem sempre democráticas</p><p>pela ocupação dos espaços sociais, esforços investigativos dessa natureza podem contribuir para o</p><p>aprimoramento da produção da mídia hegemônica e contra-hegemônica.</p><p>Em busca de outros tipos de abordagem para os estudos de jornalismo, também se destacam as</p><p>pesquisas relacionadas ao avanço das novas tecnologias. Em artigo publicado no Observatório da</p><p>Imprensa, Carlos Eduardo Lins da Silva (2015) cita projetos que têm sido realizados em instituições</p><p>de ensino e pesquisa nos Estados Unidos e na Europa Ocidental.</p><p>No caso dos estudos etnográficos, cientistas sociais vêm usando técnicas antropológicas da etnografia</p><p>para estudar as mudanças na atividade devido à revolução digital, com a imersão de pesquisadores em</p><p>redações por longos períodos de tempo.</p><p>Um bom exemplo é Making online news: newsroom ethnographies in the second decade of</p><p>internet journalism, de David Domingo e Chris Paterson, que documenta como jornalistas lidam com as</p><p>inovações da profissão trazidas pela internet, como eles resistem a elas, incorporam-nas seletivamente</p><p>e as harmonizam com suas práticas antigas.</p><p>Na mesma linha, o pesquisador cita a realização de estudos qualitativos para tentar estabelecer relação</p><p>entre conteúdo jornalístico e mudanças sociais verificáveis. Um dos exemplos da primeira abordagem é</p><p>Measuring the online impact of your information project, de Dana Chinn, da Knight Foundation.</p><p>O terceiro projeto indicado são as pesquisas realizadas, especialmente em comunidades pequenas e</p><p>com veículos jornalísticos locais, para</p><p>aferir quanto a atividade jornalística contribui para aumentar o</p><p>nível de conhecimento sobre assuntos específicos ou alterar a opinião de pessoas sobre certos temas, ou</p><p>ainda para gerar iniciativas de atuação social. Entre elas, destacam-se Engaging audiences: measuring</p><p>interactions, engagement and conversions, do J-Lab da Escola de Comunicação da American University,</p><p>e The engagement metric: a resource for newsrooms, do Reynolds Journalism Institute.</p><p>No estudo das teorias do jornalismo, é importante ainda avaliarmos a proposta de Sousa (2006a),</p><p>que defende a lógica do agrupamento, propondo uma teoria do jornalismo que, fazendo uso das várias</p><p>propostas teóricas, encara as notícias como o resultado de um processo de construção em que interagem</p><p>várias forças.</p><p>Para essa Teoria Unificadora ou Multifatorial, o pesquisador elaborou uma função matemática,</p><p>contemplando os seguintes aspectos:</p><p>148</p><p>Unidade III</p><p>• Força pessoal (Fp): as notícias resultam, parcialmente, das pessoas e das suas intenções, da</p><p>capacidade pessoal dos seus autores e dos atores que nela e sobre ela intervêm.</p><p>• Rotinas (R): as notícias são, parcialmente, fruto das rotinas (R) que jornalistas e organizações</p><p>noticiosas desenvolvem para: adquirir vantagens estratégicas na captura de acontecimentos,</p><p>fazendo face à erupção, muitas vezes imprevista, de acontecimentos no espaço e no tempo;</p><p>evitar críticas; e assegurar que o produto jornalístico seja fabricado no horário normal da jornada</p><p>de trabalho.</p><p>• Tempo (T): o fator tempo é um dos principais fatores de constrangimento dos jornalistas e das</p><p>organizações jornalísticas, afetando, portanto, o processo de produção de notícias. As notícias</p><p>refletem, por consequência, em maior ou menor grau, os constrangimentos de tempo.</p><p>• Força social: as notícias são fruto das dinâmicas e dos constrangimentos do sistema social (força</p><p>social extraorganizacional – Fseo) e do meio organizacional em que foram construídas e fabricadas</p><p>(força sócio-organizacional – Fso).</p><p>• Força ideológica (Fi): as notícias são originadas por conjuntos de ideias que moldam os processos</p><p>sociais e a própria estruturação social, proporcionam referentes comuns e dão coesão aos grupos,</p><p>normalmente em função de interesses, mesmo quando esses interesses não são conscientes</p><p>e assumidos.</p><p>• Força cultural (Fc): as notícias são um produto do sistema cultural em que são produzidas, que</p><p>condiciona tanto as perspectivas que se têm do mundo quanto a significação que se atribui a esse</p><p>mesmo mundo (mundividência).</p><p>• Força do meio físico (Fmf): as notícias dependem do meio físico em que são fabricadas.</p><p>• Força dos dispositivos tecnológicos (Fdt): as notícias dependem dos dispositivos tecnológicos</p><p>usados no seu processo de fabrico e difusão.</p><p>• Força histórica (Fh): as notícias são um produto da história, durante a qual agiram as restantes</p><p>forças que enformam as notícias que existem no presente. A história proporciona os formatos, as</p><p>maneiras de narrar e descrever, os meios de produção e difusão etc. O presente fornece o referente</p><p>que sustenta o conteúdo e as circunstâncias atuais de produção. Ao ser simultaneamente histórica</p><p>e presente, a notícia é sincrética.</p><p>Segundo Sousa (2006a), essa visão, mais sistemática, tem ainda a vantagem de permitir ultrapassar</p><p>eventuais contradições e oposições apontadas por Traquina nas diferentes teorias, como a oposição</p><p>entre os conceitos de construção e de distorção.</p><p>[...] as notícias são uma construção e, portanto, não são, nem poderiam ser,</p><p>espelhos das realidades a que se referem. Há sempre algum grau de distorção</p><p>entre a realidade e as notícias [...] À semelhança das ciências exatas e naturais,</p><p>149</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>as ciências humanas e sociais devem procurar agregar os dados dispersos</p><p>fornecidos pela pesquisa em teorias integradoras suscetíveis de explicar</p><p>determinados fenômenos com base em leis gerais preditivas, mesmo que</p><p>probabilísticas. [...] uma teoria do jornalismo deve partir da observação de</p><p>que há notícias jornalísticas e de que estas têm efeitos. Em resultado desta</p><p>evidência, uma teoria do jornalismo deve centrar-se no produto jornalístico</p><p>- a notícia jornalística, explicando como surge, como se difunde e quais os</p><p>efeitos que gera (SOUSA, 2006a, p. 230).</p><p>Num ambiente marcado pela transformação digital, que tem alterado de forma substantiva os modos</p><p>de produção, distribuição e recepção do jornalismo, temos hoje muitos pesquisadores analisando esse</p><p>cenário de mudanças da atividade.</p><p>Storch e Feil (2021), no artigo intitulado “Concepções sobre inovação no jornalismo: tendências nas</p><p>pesquisas entre 2017 e 2019”, detalham as temáticas que têm se destacado nas pesquisas focadas em</p><p>inovação no jornalismo, como:</p><p>• Descrição de soluções para buscar a sustentabilidade das operações, como o investimento em</p><p>estratégias de mobilidade para a produção e circulação de conteúdo.</p><p>• Uso de métricas e dados para gestão de negócios.</p><p>• Apontamentos de contribuições do design thinking para engajamento da audiência.</p><p>• Propostas de modelo de negócio com base na curadoria de conteúdo, no uso de agregadores de</p><p>conteúdo ou de crowdfunding e até mesmo de financiamento externo.</p><p>• Investigações que analisam as reconfigurações das rotinas de produção devido aos processos de</p><p>convergência midiática ou à implementação de uma rotina temporal baseada no imediato (com a</p><p>migração das lógicas do impresso para o digital).</p><p>• Da mesma forma, quando um novo formato narrativo passa a ser explorado na redação, como a</p><p>produção de vídeos em 360 graus, existirá a necessidade de reorganização dos fluxos de trabalho.</p><p>• O jornalismo de dados, que tem suas metodologias de trabalho mais difundidas no contexto</p><p>brasileiro, aparece destacado em duas pesquisas que tentam compreender suas implicações nas</p><p>rotinas de trabalho dos jornalistas.</p><p>As temáticas levantadas nas investigações focadas em inovação, como você deve ter percebido,</p><p>trazem à tona alguns dos desafios mais prementes para a atividade, que são a busca de novas formas de</p><p>financiamento e a necessidade de inserir a atividade no ambiente digital.</p><p>Outro ponto importante, quando pensamos na área de pesquisa de jornalismo, é o próprio emprego</p><p>das novas tecnologias como apoio para a realização dos estudos. Em termos de abordagem teórica, o</p><p>150</p><p>Unidade III</p><p>que se percebe ao avaliar as pesquisas divulgadas nos congressos da área é que os caminhos não são</p><p>muito diferentes daqueles que foram indicados pelos pesquisadores de gatekeeper, agendamento e</p><p>newsmaking; daí a importância de entendermos os pressupostos desses estudos.</p><p>Resumo</p><p>Nesta unidade, começamos apresentando um dos dilemas que</p><p>envolvem as teorias do jornalismo: nem todos os autores que estudam o</p><p>jornalismo concordam com a necessidade de haver um recorte específico</p><p>para a atividade.</p><p>Mostramos, porém, como as discussões específicas sobre o fazer</p><p>jornalístico contribuem para a formação dos futuros profissionais, além de</p><p>servir de base para o aprimoramento das práticas profissionais de quem</p><p>já está na área.</p><p>Abordamos também o debate sobre a objetividade jornalística,</p><p>revelando que ela faz parte da atividade desde o início, uma vez que a</p><p>necessidade de separar fatos de opiniões foi importante, ainda no início do</p><p>chamado Segundo Jornalismo, para que a imprensa demarcasse a posição</p><p>que assumiria na sociedade moderna.</p><p>Em termos de trajetória, mostramos que os primeiros estudos sobre</p><p>jornalismo são situados na Alemanha, em 1690, na Universidade de Leipzig.</p><p>No Brasil, a despeito de as primeiras pesquisas terem sido realizadas no</p><p>fim do século XIX, é apenas a partir da década de 1960 que temos um</p><p>aprofundamento da produção intelectual nessa área.</p><p>No caso das teorias, vimos as referências do Funcionalismo e da Teoria</p><p>Crítica, cujos pressupostos foram importantes para o desenvolvimento dos</p><p>estudos com foco específico no jornalismo.</p><p>Ao nos aprofundarmos nesse assunto, apresentamos as premissas que</p><p>orientam a Teoria do Espelho,</p><p>do Newsmaking, do Agendamento e do</p><p>Gatekeeper, detalhando suas respectivas visões sobre o fazer jornalístico,</p><p>bem como os autores mais importantes em cada corrente de pensamento.</p><p>Em alguma medida, como vimos, todas essas teorias ainda são</p><p>importantes para se pensar o exercício do jornalismo na atualidade, a</p><p>despeito das transformações que têm ocorrido na produção, distribuição e</p><p>recepção da produção jornalística.</p><p>151</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>Exercícios</p><p>Questão 1. Considere o texto e a charge.</p><p>Quinze minutos do mais importante telejornal brasileiro dedicados a uma simples troca de cadeiras.</p><p>Sai Fátima, entra Patrícia, continua Bonner. Jornalismo fantasia em estado puro, sério concorrente à</p><p>inesquecível edição do Jornal Nacional de 28/7/1998, que dedicou 10 minutos ao nascimento de Sasha,</p><p>a filha da apresentadora Xuxa: naquela noite, a reportagem sobre a privatização do sistema Telebrás,</p><p>então o maior leilão do gênero realizado no mundo, ganhou exatos 4 minutos e 35 segundos.</p><p>Disponível em: https://bit.ly/3CwKodv. Acesso em: 2 mar. 2018.</p><p>Figura 29</p><p>Disponível em: https://bit.ly/3CwKodv. Acesso em: 2 mar. 2018.</p><p>Com base na leitura e nos seus conhecimentos, avalie as afirmativas.</p><p>I – A charge ilustra a Teoria da Agenda Setting, segundo a qual a mídia pauta assuntos que são do</p><p>interesse do público, aqueles que estão de acordo com os critérios de noticiabilidade.</p><p>II – O texto, em consonância com a Teoria do Espelho, justifica o tempo dedicado a cada matéria no</p><p>telejornal, indicando que os fatos são sempre refletidos pela imprensa de modo desinteressado.</p><p>III – Sugere-se que alguns assuntos são pautados e destacados pela mídia com a intenção de desviar</p><p>a atenção da população de temas de maior repercussão social, como se observa na charge.</p><p>152</p><p>Unidade III</p><p>É correto o que se afirma somente em:</p><p>A) I.</p><p>B) II.</p><p>C) III.</p><p>D) I e III.</p><p>E) II e III.</p><p>Resposta correta: alternativa C.</p><p>Análise das afirmativas</p><p>I – Afirmativa incorreta.</p><p>Justificativa: para a Teoria do Agendamento, a mídia pauta os temas e as perspectivas que se abordam</p><p>nas conversas diárias.</p><p>II – Afirmativa incorreta.</p><p>Justificativa: o texto mostra que a distribuição do tempo não é desinteressada. Ao contrário, revela</p><p>que a edição é pautada por interesses políticos e econômicos.</p><p>III – Afirmativa correta.</p><p>Justificativa: o texto e a charge mostram que a atenção do público foi atraída por notícias de menor</p><p>(ou nenhum) impacto social. No texto, afirma-se que o tempo para fatos relevantes foi reduzido para</p><p>dar espaço a assuntos pouco relevantes.</p><p>153</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>Questão 2. Considere os dois títulos a seguir, publicados no mesmo veículo com poucos minutos</p><p>de diferença.</p><p>Figura 30</p><p>Disponível em: https://bit.ly/3wHmkDt. Acesso em: 13 out. 2021.</p><p>Com base na leitura e nos seus conhecimentos, avalie as afirmativas.</p><p>I – Os dois títulos referem-se ao mesmo fato e, assim, não há diferença de efeito de sentido entre</p><p>eles, como preconiza a Teoria do Espelho.</p><p>II – A substituição do sujeito no segundo título revela a intenção de não especificar quem foi o</p><p>responsável pelo fato.</p><p>III – Os dois títulos apresentam efeito de objetividade, como preconizam os manuais de redação</p><p>desde meados do século XX.</p><p>É correto o que se afirma em:</p><p>A) I, II e III.</p><p>B) I e II, apenas.</p><p>C) II e III, apenas.</p><p>D) I e III, apenas.</p><p>E) II, apenas.</p><p>Resposta correta: alternativa C.</p><p>154</p><p>Unidade III</p><p>Análise da questão</p><p>Os dois títulos apresentam efeito de objetividade, pois não se valem de palavras valorativas ou de</p><p>marcas da primeira pessoa. Apesar de se referirem ao mesmo fato, o efeito de sentido construído é</p><p>diferente nos dois títulos. No segundo, a pessoa (importante socialmente, pois se trata de um herdeiro</p><p>de uma grande empresa) tem sua identidade poupada.</p><p>155</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>Audiovisuais</p><p>CHATÔ, o rei do Brasil. Direção: Guilherme Fontes. Brasil: GFF Filmes, 2015. 102 min.</p><p>CIDADÃO Kane. Direção: Orson Welles. EUA: Mercury Productions, 1941. 119 min.</p><p>A ERA do rádio. Direção: Woody Allen. EUA: Orion Pictures, 1987. 148 min.</p><p>GUERRA de Canudos. Direção: Sérgio Rezende. Brasil: Rio Filme, 1997. 170 min.</p><p>NANOOK, o esquimó. Direção: Robert Flaherty. EUA: Les Frères Revillon, 1922. 78 min.</p><p>SEMANA de 22. Direção: Joyce Abram. Brasil: TV Cultura, 2002. 40 min.</p><p>TODOS os homens do presidente. Direção: Alan J. Pakula. EUA: Wildwood Enterprises, 1976. 138 min.</p><p>VLADO – 30 anos depois. Direção: João Batista de Andrade. Brasil: Oeste Filmes Brasileiros; TAO</p><p>Produções Artísticas, 2005. 90 min.</p><p>Textuais</p><p>BARROS FILHO, C. Ética na comunicação: da informação ao receptor. São Paulo: Moderna, 2001.</p><p>BARROS FILHO, C. et al. Teoria da comunicação em jornalismo. São Paulo: Saraiva, 2010.</p><p>BELTRÃO, L. Iniciação à filosofia do jornalismo. São Paulo: Edusp, 1992.</p><p>BENTO, C. M. Correspondentes de guerra do Brasil que acompanharam a FEB na Itália. 2016.</p><p>Disponível em: https://bit.ly/3D8iXYK. Acesso em: 11 nov. 2021.</p><p>BRUM, J. A hipótese do Agenda Setting: estudos e perspectivas. Revista Razon y Palabra, n. 35, 2003.</p><p>Disponível em: https://bit.ly/3ctJd3Z. Acesso em: 19 nov. 2021.</p><p>CASTRO, A. Teorias do jornalismo, universidade e profissionalização: desenvolvimento internacional e</p><p>impasses brasileiros. 2013. Disponível em: https://bit.ly/30j0daE. Acesso em: 11 nov. 2021.</p><p>COSTA, F. P.; GUERRIERO, S. Augusto Comte e a lei dos três estados. In: AZEVEDO, J. E. (org.). Introdução</p><p>às Ciências Sociais. São Paulo: Évora Uni, 2017.</p><p>FOLHA DE S.PAULO. Princípios editoriais. 12 mar. 2019. Disponível em: https://bit.ly/3F3JJSE.</p><p>Acesso em: 8 nov. 2021.</p><p>156</p><p>GENRO FILHO, A. O segredo da pirâmide: para uma teoria marxista do jornalismo. Porto Alegre: Tchê, 1987.</p><p>GLOBO. Princípios Editoriais do Grupo Globo. Rio de Janeiro, 6 ago. 2011. Disponível em:</p><p>https://glo.bo/3n3mpOL. Acesso em: 8 nov. 2021.</p><p>HANZEN, E. Novas teorias sobre a produção jornalística. Observatório da Imprensa, 23 nov. 2015. 877. ed.</p><p>Disponível em: https://bit.ly/3bZ1ZQJ. Acesso em: 8 nov. 2021.</p><p>HOHLFELDT, A.; VALLES, R. R. Conceito e história do jornalismo brasileiro na “Revista de Comunicação”.</p><p>Porto Alegre: EDIPUCRS, 2008.</p><p>LAGE, N. A bolha ideológica e o destino do jornalismo. Alceu, v. 2, n. 3, p. 40-53, jul./dez. 2001.</p><p>Disponível em: https://bit.ly/309QkvE. Acesso em: 11 nov. 2021.</p><p>MARCONDES FILHO, C. Comunicação e jornalismo: a saga dos cães perdidos. São Paulo:</p><p>Hacker Editores, 2000.</p><p>MARQUES, A. Gatekeeping: do desenvolvimento da teoria às aplicações na pesquisa. In: PÔRTO JR., G.</p><p>et al. (orgs.). Media effects: ensaios sobre teorias da comunicação e do jornalismo. v. 5. Newsmaking,</p><p>gatekeeping e teoria social. Porto Alegre: Editora Fi; Boa Vista: EdUFRR, 2018. Disponível em:</p><p>https://bit.ly/3HAdvk3. Acesso em: 19 nov. 2021.</p><p>MELO, J. M. Jornalismo opinativo: gêneros opinativos no jornalismo brasileiro. 3. ed. Campos de Jordão:</p><p>Mantiqueira, 2003.</p><p>MELO, J. M. Jornalismo: compreensão e reinvenção. São Paulo: Saraiva, 2009.</p><p>MOTTA, L. G. F. De um a outro paradigma: continuidades e descontinuidades da pesquisa em</p><p>jornalismo no Brasil e na América Latina. Brazilian Journalism Research, v. 9, n. 1, p. 52-75, jun. 2013.</p><p>Disponível em: https://bit.ly/3DeRnJy. Acesso em: 11 nov. 2021.</p><p>OLIVEIRA, D. Iniciação aos estudos de jornalismo. São Paulo: Instituto Abya Yala, 2020a.</p><p>OLIVEIRA, D. Jornalismo e emancipação: uma prática jornalística baseada em Paulo Freire.</p><p>Curitiba: Appris, 2017.</p><p>OLIVEIRA, D. Jornalismo no Brasil: cães vira-latas farejando os rastros da democracia. In: ENCONTRO</p><p>NACIONAL DE PROFESSORES DE JORNALISMO, 19., 2020, São Paulo. São Paulo, 2020b. Disponível em:</p><p>https://bit.ly/3kUQ3nX. Acesso em: 8 jan. 2021.</p><p>PENA, F. A TV digital no imaginário tecnológico: identidades, mediação e sociabilidades nas fantasias</p><p>do telejornalismo on-line. Alceu, v. 7, n. 13, p. 98-110, jul./dez. 2006. Disponível em:</p><p>https://bit.ly/3D7fb1N. Acesso em: 11 nov. 2021.</p><p>157</p><p>PENA, F. Teoria do jornalismo. São Paulo: Contexto, 2005.</p><p>SANTOS, P.</p><p>D. O jornalismo enquanto objeto de estudo. Ação Midiática, v. 18, p. 202-225, ago. 2019.</p><p>Disponível em: https://bit.ly/3kqH1P2. Acesso em: 11 nov. 2021.</p><p>SBPJOR. Apresentações e autores. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISADORES EM JORNALISMO,</p><p>18., 2020. Disponível em: https://bit.ly/3D1dpiP. Acesso em: 8 nov. 2021.</p><p>SHOEMAKER, P. J.; VOS, T. P. Teoria do gatekeeping: seleção e construção da notícia. Porto Alegre: Penso, 2011.</p><p>SILVA, C. E. L. Três abordagens para conhecer melhor a atividade jornalística. Observatório da Imprensa,</p><p>857. ed., 30 jun. 2015. Disponível em: https://bit.ly/30p7t4R. Acesso em: 11 nov. 2021.</p><p>SILVA, F. F. Jornalismo móvel. Salvador: EDUFBA, 2015. Disponível em: https://bit.ly/3F89WPX.</p><p>Acesso em: 22 set. 2021.</p><p>SILVA, G.; PONTES, F. S. Teorias da notícia: impasses para a teoria do jornalismo. 2009. Revista Unisinos,</p><p>v. 11, n. 3, set./dez. 2009. Disponível em: https://bit.ly/3c0LQKD. Acesso em: 11 nov. 2021.</p><p>SODRÉ, N. W. História da imprensa no Brasil. São Paulo: Mauad, 1999.</p><p>SOUSA, J. P. As notícias e os seus efeitos: as “teorias” do jornalismo e dos efeitos sociais dos media</p><p>jornalísticos. Revista da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Fernando Pessoa,</p><p>1999. Disponível em: https://bit.ly/3Cbx3qW. Acesso em: 11 nov. 2021.</p><p>SOUSA, J. P. Construindo uma teoria multifactorial da notícia como uma teoria do jornalismo. Revista</p><p>da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Fernando Pessoa, p. 1-47, 2006a.</p><p>Disponível em: https://bit.ly/3okhFUh. Acesso em: 11 nov. 2021.</p><p>SOUSA, J. P. Elementos de teoria e pesquisa da comunicação e dos media. 2. ed. revista e ampliada.</p><p>Revista da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Fernando Pessoa, 2006b.</p><p>Disponível em: https://bit.ly/3F5keQS. Acesso em: 11 nov. 2021.</p><p>SOUSA, J. P. Pesquisa e reflexão sobre jornalismo até 1950: a institucionalização do jornalismo como</p><p>campo de conhecimento e campo científico. Revista da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da</p><p>Universidade Fernando Pessoa, 2013. Disponível em: https://bit.ly/3C6VRQM. Acesso em: 11 nov. 2021.</p><p>SOUSA, J. P. Pesquisa em jornalismo: o desbravamento do campo entre o século XVII e o século XIX.</p><p>Revista da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Fernando Pessoa, n. 4, p. 42-53,</p><p>2007. Disponível em: https://bit.ly/3F8tJPf. Acesso em: 22 set. 2021.</p><p>STORCH, L. S.; FEIL, B. E. M. Concepções sobre inovação no jornalismo: tendências nas pesquisas</p><p>entre 2017 e 2019. Estudos em Jornalismo e Mídia, v. 18, n. 1, jan./jun. 2021. Disponível em:</p><p>https://bit.ly/3F6YF2h. Acesso em: 11 nov. 2021.</p><p>158</p><p>TRAQUINA, N. Teorias das notícias: o estudo do jornalismo no século XX. In: TRAQUINA, N. O estudo do</p><p>jornalismo no século XX. São Leopoldo: Unisinos, 2001.</p><p>TRAQUINA, N. Teorias do jornalismo: a tribo jornalística – uma comunidade interpretativa</p><p>transnacional. São Leopoldo: Unisinos, 2004.</p><p>TRAQUINA, N. Teorias do jornalismo: porque as notícias são como são. 2. ed. Florianópolis: Insular, 2005.</p><p>VIZEU, A. O jornalismo e as “teorias intermediárias”: cultura profissional, rotinas de trabalho,</p><p>constrangimentos organizacionais e as perspectivas da análise do discurso (AD). In: CONGRESSO</p><p>BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO, 16., 2002. Disponível em: https://bit.ly/3ojMuZp.</p><p>Acesso em: 11 nov. 2021.</p><p>WOLF, M. Teorias da comunicação. Lisboa: Presença, 2003.</p><p>159</p><p>160</p><p>Informações:</p><p>www.sepi.unip.br ou 0800 010 9000</p><p>de forma tão complexa é que “não se pode cultuá-los como a expressão</p><p>absoluta da realidade” (PENA, 2005, p. 24).</p><p>116</p><p>Unidade III</p><p>Diante disso, seria necessário, portanto, adotar um maior rigor científico no momento de</p><p>transformar fatos em notícias. Pena (2005) cita o estudo do professor Michael Schudson, no livro</p><p>Discovering the news: a social history of american newspapers, de 1978, para explicar essa questão</p><p>da inevitabilidade. Vejamos:</p><p>Segundo Schudson, o conceito se desenvolve por três motivos principais:</p><p>1) a partir do ceticismo da sociedade americana no começo do século XX,</p><p>influenciada pelo crescimento da psicanálise, que faz duras críticas à razão;</p><p>2) pelo nascimento da profissão de relações públicas, capaz de produzir</p><p>fatos para beneficiar determinadas empresas; e, principalmente, 3) pela</p><p>influência da propaganda, cuja eficácia ficou provada ao levar a opinião</p><p>pública americana a ficar a favor da entrada dos Estados Unidos na Primeira</p><p>Guerra Mundial. Já Nelson Traquina, em sua obra sobre a teoria do jornalismo</p><p>publicada pela UFSC em 2004, cita a tese de doutorado do português Adriano</p><p>Rodrigues, que também critica “a insustentável dicotomia simplificadora</p><p>entre objetividade e subjetividade” (PENA, 2005, p. 24).</p><p>Sob essa perspectiva, podemos constatar que o desenvolvimento das novas técnicas jornalísticas</p><p>foi importante para ajudar o jornalismo a se diferenciar de outras formas de comunicação. Ainda</p><p>hoje, quando analisamos o conteúdo trabalhado nas disciplinas iniciais dos cursos de jornalismo, esse</p><p>argumento é validado. O lead, por exemplo, é uma das técnicas empregadas para que os estudantes</p><p>de jornalismo consigam diferenciar o tipo de texto que devem produzir, distanciando-se dos modelos</p><p>adotados em outros trabalhos, como as próprias redações escolares.</p><p>Voltando aos debates iniciais sobre o assunto, Pena (2005) também chama a atenção para o peso</p><p>que teve nessa história a cobertura realizada pelos jornais norte-americanos de eventos como a</p><p>Revolução Russa: “no geral, as notícias sobre a Rússia se convertiam num caso de ver as coisas não</p><p>como eram, mas como os homens queriam ver” (LIPPMANN apud PENA, 2005, p. 26).</p><p>O autor explica que, a partir de situações como essa, Lippmann defendia que os jornalistas deveriam</p><p>evitar seus próprios preconceitos e, para isso, teriam que adquirir o chamado espírito científico, ou seja,</p><p>o método de trabalho deveria ser objetivo, não o jornalista.</p><p>Ele próprio reconhece, no entanto, a confusão que persiste até hoje no que diz respeito ao conceito</p><p>de objetividade:</p><p>[...] ao longo dos anos o conceito foi perdendo esse significado original e</p><p>hoje causa muita confusão. A sociedade confunde a objetividade do método</p><p>com a do profissional, e este jamais deixará de ser subjetivo. E também</p><p>confunde texto com discurso, o que fica claro na separação dogmática</p><p>entre opinião e informação. A professora Sylvia Moretzsohn, autora do livro</p><p>Jornalismo em tempo real: o fetiche da velocidade, cita como exemplo o</p><p>site brasileiro de notícias no.com.br, em que o colunista Marcos Sá Corrêa</p><p>tinha como slogan “separando o N de notícia do O de opinião”. Mas o que se</p><p>117</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>observa no jornalismo atual é uma simbiose, não uma separação. A notícia</p><p>nunca esteve tão carregada de opiniões. E um dos motivos é justamente</p><p>atender ao critério de objetividade que obriga o jornalista a ouvir sempre</p><p>os dois lados da história. Os jornais valorizam mais as declarações do que</p><p>os próprios fatos. Ou seja, preocupam-se mais com os comentários sobre os</p><p>acontecimentos do que com os acontecimentos em si (PENA, 2005, p. 53).</p><p>Como se pode constatar a partir dessas observações, a questão da subjetividade está relacionada</p><p>também à forma como o jornalista obtém as informações para a sua matéria. Por isso são tão importantes</p><p>os estudos relacionados à cadeia produtiva do jornalismo.</p><p>Para exemplificar como é complexa a questão da precisão dos fatos no jornalismo, vamos analisar</p><p>um caso no exemplo a seguir.</p><p>Exemplo de aplicação</p><p>O repórter de TV foi atropelado</p><p>Sete horas da manhã do dia primeiro de janeiro de 2018. Um ônibus atropela uma jovem de 22 anos,</p><p>depois de receber uma fechada de um carro de luxo. Os paramédicos são chamados e não demoram</p><p>em chegar ao local. O estado da jovem é grave, mas ela ainda respira. A ambulância leva-a ao hospital</p><p>Souza Aguiar, onde é constatada a morte cerebral. Estamos no primeiro dia da nova lei de doação de</p><p>órgãos no Brasil, pela qual todos são doadores, a menos que manifestem seu desejo em contrário na</p><p>carteira de identidade. A assessora de imprensa do hospital liga para uma emissora de TV. Pode ser</p><p>um “fato histórico”: o primeiro transplante, sob a égide da nova lei. Nove horas da manhã. O pauteiro,</p><p>jornalista especializado em dizer o que os repórteres devem fazer, escreve um texto com um resumo</p><p>do fato e sugere que seja feita uma reportagem. Ele já é a quinta pessoa a fazer uma construção do</p><p>acontecimento. A primeira foi uma testemunha ocular, que fez o relato para o paramédico. Este ainda</p><p>contou para o cirurgião do hospital, que, por sua vez, avisou a assessora de imprensa. Mas o processo</p><p>não para por aí.</p><p>Fonte: PENA, F. O repórter de TV foi atropelado. In: Televisão e sociedade. Rio de Janeiro: Sette Letras, 2002.</p><p>A partir da leitura do texto anterior, como propõe Pena (2005), reflita sobre o trabalho do jornalista.</p><p>O “gancho jornalístico” para que o atropelamento se transformasse em notícia foi a nova lei de doação</p><p>de órgãos. Se não fosse isso, o suposto acidente não teria um lugar de destaque na imprensa, até porque,</p><p>numa cidade do porte do Rio de Janeiro, são registrados inúmeros casos semelhantes durante um dia.</p><p>Ao abordar o problema da qualidade da informação jornalística, Lage (2001) observa que se</p><p>trata de um quadro complexo e indica quatro pontos centrais que devem ser analisados, como</p><p>reproduzimos a seguir:</p><p>118</p><p>Unidade III</p><p>1. A informação deve reportar-se à realidade – isto é, aos fatos e ideias</p><p>situados em seu tempo e espaço; 2. Não há a menor possibilidade de se</p><p>codificar simplesmente a realidade objetiva porque o processo mental</p><p>envolve percepção, portanto seleção, avaliação, contextualização e lógica</p><p>modal ou probabilística – o que implica certa margem de erro: se vejo</p><p>um corpo caído no asfalto, coberto com plástico preto, cercado de velas</p><p>e um automóvel com o para-lama dianteiro amassado, concluo que houve</p><p>um atropelamento, embora tudo isso possa ser o ensaio de uma cena de</p><p>novela, a coincidência de alguém ter morrido de mal súbito perto de um</p><p>carro que se dirigia à funilaria para reparar a frente danificada etc.; 3. Não</p><p>há como desconsiderar, também, a informação disponível sobre o público a</p><p>que a mensagem se destina. Se escrevo para jovens, devo imaginar que um</p><p>acontecimento da década de 1970 é histórico – isto é, está numa categoria</p><p>próxima à Segunda Guerra Mundial, às guerras napoleônicas ou às cruzadas.</p><p>A cena (no seriado de TV New York Undercover) de um pai negro aconselhando</p><p>o filho adolescente a não namorar meninas brancas pode ser natural e até</p><p>progressista nos Estados Unidos – ou para os que macaqueiam o cotidiano</p><p>americano – mas é surpreendente e antipática para a maioria do povo</p><p>brasileiro; 4. Finalmente há a subjetividade do repórter. Ele é treinado para</p><p>suprimi-la sempre que possível, mas é fato que um mesmo incidente será</p><p>descrito com diferentes palavras – ou diferentes ordenações de sentenças –</p><p>por jornalistas de culturas diferentes, por mais honestos e bem preparados</p><p>que sejam, já que o percebem de maneira diferente (LAGE, 2001, p. 48).</p><p>Lembrete</p><p>Justamente pela constatação de que os fatos são construídos de forma</p><p>tão complexa é que “não se pode cultuá-los como a expressão absoluta da</p><p>realidade” (PENA, 2005, p. 24).</p><p>Observação</p><p>No jornalismo, a subjetividade não deve ser vista como uma oposição</p><p>à objetividade. O que está em jogo nesse caso é o reconhecimento da</p><p>inevitabilidade.</p><p>7.2 A comunicação</p><p>e o jornalismo como objeto de pesquisa</p><p>Em termos de trajetória, os primeiros estudos sobre jornalismo são situados na Alemanha, em 1690,</p><p>na Universidade de Leipzig. Conforme relata José Marques de Melo, em Jornalismo opinativo, foi nesse</p><p>período que Tobias Peucer defendeu a primeira tese de doutorado sobre “a natureza e a estrutura do</p><p>jornal diário” (MELO, 2003, p. 37).</p><p>119</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>Segundo Sousa (2006b), Peucer delimitou alguns dos filões de pesquisa posteriores no campo</p><p>dos estudos jornalísticos: o formato das notícias e a sua elaboração no seio de uma gramática</p><p>histórico-cultural; a objetividade; a ética como sinônimo de qualidade jornalística e as dificuldades</p><p>éticas e profissionais de narrar fatos em condições de incerteza; e o processo de seleção de notícias com</p><p>base em critérios de noticiabilidade (gatekeeping/newsmaking).</p><p>Como analisaremos no decorrer deste tópico, ao longo da trajetória do jornalismo, os pesquisadores</p><p>se aprofundariam nesses conceitos que, até hoje, são bastante atuais para a atividade, ainda que ela</p><p>tenha passado por tantas mudanças.</p><p>Apesar desse estudo inaugural em 1690, há poucas evidências de pesquisas sistemáticas sobre o</p><p>jornalismo durante o século XVIII. Acompanhando a evolução da atividade, a área de pesquisa e de</p><p>ensino do jornalismo se consolidaria apenas nos séculos XIX e XX.</p><p>Complementando essa análise sobre os estudos de jornalismo, é importante citar as considerações</p><p>de Sousa (2006a). O autor pondera que a investigação científica sobre o jornalismo pode abarcar várias</p><p>facetas, como pesquisas realizadas a partir do Modelo de Lasswell. Em sua proposta para estudar a</p><p>comunicação, deveríamos responder a cinco questões interligadas: “quem?”; “diz o quê?”; “a quem?”;</p><p>“por que meios?” e “com que efeitos?”. O estudioso é um dos teóricos oriundos da Escola de Chicago e</p><p>um dos expoentes da corrente de pensamento e de pesquisa conhecida por Funcionalismo.</p><p>O próprio Sousa (2006a) reconhece, contudo, que as perguntas equacionadas pelo Modelo de</p><p>Lasswell não esgotam os territórios da investigação sobre o jornalismo, até porque a pesquisa sobre</p><p>jornalismo não contempla apenas as circunstâncias peculiares da atividade, mas também a evolução</p><p>histórica dessas circunstâncias e do próprio conhecimento científico sobre o jornalismo.</p><p>[...] os autores que desenvolveram Estudos Jornalísticos recorreram e recorrem</p><p>a diversos métodos (empíricos, experimentais, reflexivos, macro-observações,</p><p>micro-observações etc.). As Ciências da Comunicação contemporâneas</p><p>caracterizam-se, precisamente, por possibilitarem a co-ocorrência e a</p><p>concorrência de vários métodos e técnicas de pesquisa. Há também</p><p>várias tendências para o estudo do jornalismo: umas privilegiam o caso;</p><p>outras privilegiam o geral. Umas sustentam-se numa única perspectiva</p><p>(a da linguística, a da psicologia, a da sociologia etc.); outras privilegiam</p><p>o cruzamento de várias perspectivas para o entendimento dos fenômenos</p><p>jornalísticos (por exemplo, cruzar a sociologia com a linguística). Alguns</p><p>autores procuram construir uma teoria unificada do jornalismo, enquanto</p><p>outros se empenham em mostrar que existem teorias do jornalismo,</p><p>visões alternativas supostamente irreconciliáveis. Em consequência, o</p><p>desenvolvimento de um campo científico como o dos Estudos Jornalísticos</p><p>tem de ser visto, conforme notou Thomas Khun (1962), como o resultado</p><p>de um processo social em que vários pesquisadores, isoladamente ou</p><p>em grupo, competem pela primazia das suas teorias e metodologias</p><p>(SOUSA, 2013, p. 6-7).</p><p>120</p><p>Unidade III</p><p>7.2.1 Brasil</p><p>Melo (2003) identifica que, no caso do Brasil, a despeito de as primeiras pesquisas terem sido</p><p>realizadas no fim do século XIX, é apenas a partir da década de 1960 que temos um aprofundamento da</p><p>produção intelectual nessa área. A razão para isso é que tivemos nesse momento a expansão das escolas</p><p>de comunicação, consequência do próprio crescimento da indústria cultural e do desenvolvimento da</p><p>nossa imprensa.</p><p>Considerado uma das principais referências do país nessa área, Melo (2009) indica como marco zero</p><p>da pesquisa jornalística nacional o trabalho de Barbosa Lima Sobrinho. Observe o detalhamento que ele</p><p>faz desse trabalho:</p><p>[...] fez um diagnóstico preciso e conciso sobre o “problema da imprensa” no</p><p>momento em que transitávamos em direção ao jornalismo industrial. Sem</p><p>adotar comportamento apocalíptico, ele discute os prós e contras das</p><p>tendências emergentes – no mundo capitalista, o jornal-empresa; no mundo</p><p>socialista, o monopólio midiático do partido. Essa reflexão tem como foco o</p><p>panorama brasileiro, mas sua argumentação está embasada no pensamento de</p><p>autores de outros países, como os ingleses Stuart Mill e James Bryce, o espanhol</p><p>Gonzalo Blanco, os italianos Bonasi e Natale, estabelecendo também diálogo</p><p>crítico com Lênin, cuja ditadura do proletariado acarretou o amordaçamento da</p><p>imprensa russa. Mas ele não hesita em proclamar sua fidelidade aos pensadores</p><p>nativos que o precederam na reflexão sobre o campo jornalístico, especialmente</p><p>Alfredo de Carvalho e José Veríssimo (MELO, 2009, p. 10).</p><p>Adotando o critério cronológico, Melo (2009) agrupa o pensamento jornalístico brasileiro em três</p><p>grupos: emancipação – século XIX; identificação – século XX; autonomia – século XXI. Segundo o autor,</p><p>“em cada período florescem correntes de ideias que se complementam ou se confrontam, sem produzir</p><p>rupturas substantivas” (MELO, 2009, p. 7).</p><p>Complementando essa análise, Pena (2005) sintetiza os caminhos que têm sido adotados:</p><p>[...] as pesquisas têm enveredado pelo estudo da circulação do produto, a</p><p>notícia, que, por sua vez, é resultado da interação histórica e da combinação</p><p>de uma série de vetores: pessoal, cultural, ideológico, social, tecnológico</p><p>e midiático. Já os efeitos podem ser divididos em afetivos, cognitivos e</p><p>comportamentais, incidindo sobre pessoas, sociedades, culturas e civilizações.</p><p>Mas também influenciam a própria produção da notícia, em um movimento</p><p>retroativo de repercussão. Em suma, os diversos modelos de análise</p><p>ocupam-se da produção e/ou da recepção da informação jornalística (p. 220).</p><p>Para entendermos melhor esse panorama sobre as pesquisas, é importante observar a análise feita por</p><p>Motta (2013). Ele faz considerações relevantes a respeito do caráter mais político e engajado assumido</p><p>pelos estudos na América Latina, principalmente até os anos 1980.</p><p>121</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>A título de provocação, arrisco afirmar aqui que a diferença epistemológica</p><p>mais significativa entre a pesquisa realizada no conturbado período anterior</p><p>e aquela em curso no atual momento é a opção contemporânea por uma</p><p>pesquisa mais neutra e imparcial, mais distante em relação à sociedade na</p><p>qual ela se desenvolve. Uma pesquisa “mais objetiva e mais científica”, para</p><p>resumir. Arrisco afirmar que a pesquisa atual fez uma opção relativamente</p><p>explícita em favor de uma isenção científica. Para levar isso a cabo, a meu</p><p>ver, ela se distanciou do seu objeto: as relações sociais concretas. Desse</p><p>modo, em nome de uma autoafirmação acadêmica, os pesquisadores</p><p>preferiram distanciar-se dos fatos políticos e sociais, deixando a “militância”</p><p>para os políticos profissionais, partidos e movimentos sociais engajados</p><p>(MOTTA, 2013, p. 24).</p><p>Ao analisar a situação das pesquisas no campo acadêmico, Melo (2003) observa que, neste início</p><p>do século XXI, o campo acadêmico do jornalismo vivencia uma conjuntura de fortalecimento do</p><p>espaço universitário. Como evidência dessa situação, ele cita o lançamento de livros escritos por</p><p>pesquisadores situados em diferentes partes do país, além das pesquisas concluídas e da publicação</p><p>de revistas científicas.</p><p>Outro fator que mostra a relevância da pesquisa sobre o jornalismo no Brasil é a existência de</p><p>fóruns específicos para a apresentação e o debate das pesquisas, como os da Sociedade Brasileira</p><p>de Pesquisadores do Jornalismo (SBPJor) e do Núcleo de Pesquisa em Jornalismo da</p><p>Sociedade Brasileira de</p><p>Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom) e o Grupo de Estudos em Jornalismo da Associação</p><p>Nacional dos Programas de Pós-graduação em Comunicação (Compós).</p><p>Lembrete</p><p>Foi apenas a partir da década de 1960 que tivemos um aprofundamento</p><p>da produção intelectual sobre o jornalismo.</p><p>Saiba mais</p><p>Para você entender melhor a natureza dos estudos realizados nos últimos</p><p>anos pelos pesquisadores brasileiros, recomendamos a consulta dos projetos</p><p>apresentados na conferência da SBPJor:</p><p>SBPJOR. Apresentações e autores. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISADORES</p><p>EM JORNALISMO, 18., 2020. Disponível em: https://bit.ly/3D1dpiP. Acesso em:</p><p>8 nov. 2021.</p><p>122</p><p>Unidade III</p><p>7.3 Tendências das pesquisas na área</p><p>Entre as estratégias mais comuns adotadas nos estudos de jornalismo, figura a localização do</p><p>objeto de estudo do jornalismo no seu chamado produto material, isto é, a abordagem dos meios de</p><p>comunicação, como jornais, revistas, sites etc. Nesse caso, do ponto de vista metodológico, podemos</p><p>dizer que “a manifestação empírica do objeto é tomada pelo próprio objeto” (SILVA; PONTES, 2009, p. 1).</p><p>Um dos resultados disso é que as pesquisas acabam por não pensar o jornalismo em si mesmo,</p><p>recorrendo ao apoio de outros campos de conhecimento, como sociologia, antropologia, psicologia,</p><p>linguística, história e política.</p><p>Um aspecto importante de ser observado é que o método descritivo é um dos mais empregados nas</p><p>investidas teóricas do jornalismo. Assim, são comuns os estudos de produtos jornalísticos, especificamente</p><p>de matérias jornalísticas.</p><p>Silva e Pontes (2009) nos ajudam a entender por que há uma concentração nesse tipo de abordagem:</p><p>• Fácil acesso ao objeto de trabalho: é mais viável gravar telejornais e radiojornais, guardar</p><p>exemplares de revistas, recortar jornais impressos ou arquivar páginas da internet do que conseguir</p><p>autorização das empresas para pesquisar dentro das redações ou mesmo a disponibilidade dos</p><p>profissionais para entrevista ou entrevistar leitores.</p><p>• Custos da pesquisa: é mais barato investigar produtos do que processo de produção ou modos</p><p>de recepção, posto que muitos dos resultados divulgados em congressos ou publicados são</p><p>fruto de trabalho individual, e não de equipes.</p><p>• Tempo de duração da pesquisa: é mais viável trabalhar produção ou recepção em dissertações</p><p>e teses.</p><p>Ao citarem os projetos que envolvem a Teoria da Notícia, os autores fazem uma boa síntese dos</p><p>estudos realizados nessa frente. Vejamos:</p><p>• Os conteúdos veiculados pela mídia noticiosa, incluída aqui a diversidade dos estudos que</p><p>prometem fazer análises de discursos.</p><p>• Os formatos, os gêneros e as linguagens que identificam características tecnológicas e estilísticas</p><p>do texto jornalístico.</p><p>• O processo e as rotinas de produção.</p><p>• Os estudos dos efeitos e das audiências.</p><p>Com uma visão crítica, Silva e Pontes (2009) concordam que esses trabalhos são necessários para</p><p>entender o fenômeno jornalístico, mas fazem ressalvas ao modo como as investigações são realizadas,</p><p>por nem sempre retomarem a reflexão sobre o jornalismo, focando muito nos conteúdos.</p><p>123</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>Para o propósito do nosso estudo, é importante compreendermos a natureza das investigações. Para</p><p>isso, sintetizamos a seguir alguns dos modelos mais comuns:</p><p>• Estudos sobre as temáticas presentes na mídia. Nesse caso, geralmente o objetivo é avaliar a</p><p>frequência com que aquele assunto é citado, as fontes que são utilizadas para compor a matéria,</p><p>que tipo de destaque é dado nos títulos, nas imagens etc. Os conteúdos são bastante diversificados,</p><p>envolvendo, por exemplo, questões ambientais, escândalos políticos, movimentos sociais, violência,</p><p>infância, situação da mulher, racismo etc.</p><p>• Em muitos casos, esse tipo de estudo é baseado na análise do discurso. A proposta para essas</p><p>abordagens é mostrar como a imprensa faz determinadas coberturas. Como enfatizam Silva e</p><p>Pontes (2009), geralmente as conclusões são usadas, nessa situação, para mostrar como esse tipo</p><p>de cobertura foi prejudicial para determinado ator social. Nos últimos anos, por exemplo, temos</p><p>visto a realização de análises desse tipo para denunciar a forma como a mulher é tratada na mídia</p><p>ou mesmo a questão do racismo.</p><p>• Em outra frente, temos ainda os estudos sobre formatos, gêneros e linguagem. Para os formatos,</p><p>as análises recorrem à explicação sobre os diferentes textos, a disposição deles, a divisão em</p><p>editorias, os gêneros, a posição das imagens (no espaço e/ou no tempo), os infográficos, as</p><p>complementações com som, cor, corte e enquadramento etc. (MOUILLAUD; PORTO, 1997, apud</p><p>SILVA; PONTES, 2009). Em gêneros, o interesse recai sobre investigações envolvendo a classificação</p><p>entre os textos opinativos e informativos.</p><p>• No caso dos trabalhos que tratam da linguagem do jornalismo, a proposta geralmente é avaliar a</p><p>estruturação dos textos informativos, os recursos narrativos mais utilizados. Ou seja, “são análises</p><p>gramaticais, semânticas ou com base na filosofia da linguagem para descrever como é e deve ser</p><p>o texto jornalístico” (SILVA; PONTES, 2009, p. 182).</p><p>• Temos ainda outra linha de investigação, mais voltada ao processo de produção da notícia,</p><p>contemplando a rotina e as investigações sobre comportamento das redações. A preocupação,</p><p>portanto, é caracterizar a atividade dos jornalistas, as pressões que sofrem nas redações, as</p><p>limitações que enfrentam no dia a dia em suas coberturas etc. A proposta, como veremos ao</p><p>estudar a Teoria do Newsmaking, é tentar explicar por que as notícias são como são, a partir da</p><p>análise do que acontece na rotina de produção, ou seja, são consideradas a pressão do tempo, a</p><p>hierarquia, o jogo de forças entre repórteres e editores, a dependência de releases, a influência da</p><p>publicidade sobre pautas etc.</p><p>• Também focadas nos emissores, são comuns investigações relacionadas às mudanças que têm</p><p>acontecido na distribuição das notícias envolvendo as novas tecnologias, procurando entender</p><p>como elas têm interferido na rotina de produção.</p><p>• Outro grupo importante é o que contempla as verificações sobre os efeitos causados pelos</p><p>produtos jornalísticos ou as particularidades de determinada audiência.</p><p>124</p><p>Unidade III</p><p>Como esclarecem Silva e Pontes (2009), muitos dos estudos relatados aqui combinam as modalidades,</p><p>numa tentativa de produzir análises mais globais dos processos jornalísticos.</p><p>Como já dissemos, os autores são críticos à forma como os estudos têm sido conduzidos,</p><p>justamente em razão dos problemas enfrentados pela atividade para se configurar como um campo de</p><p>conhecimento autônomo.</p><p>Vale registrar que esse tipo de debate não está relacionado apenas à natureza dos estudos; envolve</p><p>também o próprio ensino do jornalismo. Até 2013, a maioria dos cursos de jornalismo fazia parte do</p><p>curso de comunicação social. Assim, tínhamos o curso de comunicação social, com habilitação em</p><p>jornalismo. Foram revistas em 2013 as Diretrizes Nacionais dos Cursos de Jornalismo, e agora eles</p><p>são independentes.</p><p>Essa mudança tem relação com o papel que se espera que o jornalista exerça, no sentido de que ele</p><p>deve ter uma formação sólida e específica para assumir o papel de mediador.</p><p>Autores como Felipe Pena (2005), que vamos usar como uma de nossas principais referências para</p><p>entender as teorias do jornalismo, justificam a importância do aprendizado sobre o assunto justamente</p><p>no fato de que a reflexão acadêmica é fundamental para desenvolver o pensamento crítico. E, a partir</p><p>daí, o estudante pode, em suas práticas como jornalista, fazer também a sua contribuição para a</p><p>sistematização do pensamento sobre a produção jornalística.</p><p>A teoria é esta: encontrar sentido para os fatos do mundo. No caso, então, a proposta é que possamos</p><p>entender como o jornalismo tem sido pensado ao longo de sua trajetória.</p><p>Lembrete</p><p>As pesquisas sobre jornalismo muitas vezes recorrem ao apoio de outros</p><p>campos de conhecimento, como sociologia, antropologia, psicologia,</p><p>linguística,</p><p>história e política.</p><p>8 PRINCIPAIS ABORDAGENS TEÓRICAS DO JORNALISMO</p><p>8.1 A Teoria Crítica e a Teoria Funcionalista</p><p>Antes de abordarmos as teorias do jornalismo, é importante retomarmos, ainda que de forma breve,</p><p>as contribuições da Teoria Crítica e da Teoria Funcionalista. Essas correntes são tratadas de maneira mais</p><p>aprofundada em outra disciplina deste curso, mas vale a pena retomarmos alguns conceitos.</p><p>O chamado Paradigma de Lasswell, que ganha corpo nos Estados Unidos, por volta dos anos 1930,</p><p>tem como foco a análise de conteúdo, verificando as características das mensagens a partir de cinco</p><p>questões: quem, o quê, com que meio, a quem e com que efeitos.</p><p>125</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>Como detalha Wolf (2003), o Modelo de Lasswell propunha que essas variáveis poderiam organizar</p><p>setores específicos da pesquisa. Assim, a primeira (“quem”) permitiria caracterizar o estudo dos emissores,</p><p>possibilitando analisar o controle sobre o que é transmitido. O “o quê”, por sua vez, permitiria verificar</p><p>o conteúdo das mensagens. Para o estudo dos meios, usaríamos a pergunta sobre o canal. Com as</p><p>variáveis “a quem” e “com que efeitos”, teríamos a análise da audiência.</p><p>Esse esquema proposto se insere na chamada Communication Research, que tem como foco central</p><p>justamente a análise dos efeitos e dos conteúdos. Um aspecto importante em relação a esses estudos é</p><p>a ênfase dada às funções exercidas pelos meios de comunicação de massa. Nesse sentido:</p><p>Lasswell incorpora o ambiente cultural, particularmente o seu contexto</p><p>sociopolítico – efeitos –, e ao mesmo tempo deslocando a centralidade do</p><p>foco analítico para a tecnologia que dá suporte ao processo comunicativo –</p><p>os canais (MELO apud HOHLFELDT; VALLES, 2008, p. 37).</p><p>Outro nome importante da Escola Funcionalista é Paul Lazarsfeld, que conseguiu constatar a partir</p><p>de suas pesquisas que os meios de comunicação de massa não provocavam os mesmos efeitos em</p><p>todas as pessoas. Ou seja, havia outras variáveis que deveriam ser analisadas, como o próprio tempo de</p><p>exposição à mensagem e a existência de outras fontes de influência, como os formadores de opinião.</p><p>Entre as críticas a esse modelo, destaca-se o fato de ele não tratar o ato comunicativo em sua</p><p>totalidade. Mas, como observa Wolf, o Modelo de Lasswell foi mais do que uma fórmula, pois “ordenou</p><p>o objeto de estudo segundo variáveis definidas e, assim, transformou-se numa verdadeira teoria da</p><p>comunicação” (WOLF, 2003, p. 30).</p><p>Vale atentar ainda para o fato de que esses estudos foram importantes por se contrapor à ideia de</p><p>que os meios de comunicação teriam efeitos diretos, uniformes e imediatos nos indivíduos – é isso o que</p><p>diz a primeira teoria da comunicação, a Teoria das Balas Mágicas.</p><p>Ao abordar a aplicação desses estudos no Brasil, Hohlfeldt e Valles fazem a seguinte observação:</p><p>Os estudos deste período oscilam entre o deslumbramento diante dos novos</p><p>fenômenos (multiplicação dos comics, explosão das telenovelas, sucesso</p><p>das revistas especializadas) e o receio diante da sua explosão (massificação</p><p>cultural, destruição da cultura popular). Ocorre o que Melo chamou de</p><p>autolegitimação da indústria cultural, na medida em que os pesquisadores</p><p>tomam a indústria cultural como objeto de estudo (2008, p. 24).</p><p>Essa observação dos autores faz referência a um embate recorrente entre os pesquisadores, uma vez</p><p>que os funcionalistas norte-americanos são vistos como conservadores, diferentemente dos chamados</p><p>frankfurtianos. Ao analisar a realização dos estudos no país nos anos 1980, Hohlfeldt e Valles citam o</p><p>rompimento da barreira que havia circunscrito os pesquisadores dessa área aos padrões conservadores</p><p>do funcionalismo norte-americano ou à crítica radical da Escola de Frankfurt.</p><p>126</p><p>Unidade III</p><p>Para finalizar, vale o registro de que os estudos realizados nesse período inicial foram extremamente</p><p>importantes para nortear as pesquisas que seriam realizadas na área de comunicação e, mais</p><p>especificamente, no campo jornalístico.</p><p>8.2 A Teoria do Espelho</p><p>Figura 26 – Redação na era analógica</p><p>Disponível em: https://bit.ly/3FDmIX3. Acesso em: 5 nov. 2021.</p><p>Considerada a mais antiga das teorias do jornalismo, a Teoria do Espelho começou a ser adotada a</p><p>partir de 1850. Como explicitado na sua denominação, ela é baseada no pressuposto de que as notícias</p><p>são como são porque refletem a realidade.</p><p>Essa proposta está baseada, portanto, na ideia de que a imprensa descreve os fatos de forma objetiva,</p><p>sem nenhum tipo de interferência por parte do jornalista, que é tratado como um observador isento.</p><p>Vejamos a descrição feita por Pena:</p><p>A imprensa funciona como um espelho do real, apresentando um reflexo</p><p>claro dos acontecimentos do cotidiano. Por essa teoria, o jornalista é um</p><p>mediador desinteressado, cuja missão é observar a realidade e emitir um</p><p>relato equilibrado e honesto sobre suas observações, com o cuidado de não</p><p>apresentar opiniões pessoais. Seu dever é informar, e informar significa</p><p>buscar a verdade acima de qualquer outra coisa (2005, p. 128).</p><p>Para entendermos melhor o que está por trás dessa definição, é importante lembrar que essa visão</p><p>sobre o jornalismo está relacionada às mudanças que estavam acontecendo naquele momento na</p><p>imprensa dos Estados Unidos, com o desenvolvimento de uma rentável indústria noticiosa de massas.</p><p>127</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>Retomando o que vimos ao analisarmos a história do jornalismo, a segunda fase compreende</p><p>justamente o momento de profissionalização das atividades, quando prevalece a ideia de que o</p><p>jornalismo deve abandonar os aspectos mais ideológicos, partidários e panfletários presentes nas</p><p>primeiras publicações.</p><p>Para isso, o principal seria separar fatos e opiniões, priorizando a objetividade. E essa orientação está</p><p>expressa em observações como a do correspondente em Washington da agência noticiosa Associated</p><p>Press (READ, 1976, apud TRAQUINA, 2005, p. 147-148): “O meu trabalho é comunicar fatos: as minhas</p><p>instruções não permitem qualquer tipo de comentários sobre os fatos”.</p><p>É importante registrar que essa busca pela objetividade, que visava diferenciar a atividade do</p><p>jornalismo partidário da fase anterior, baseava-se também no entendimento de que o jornalismo deveria</p><p>usar métodos científicos, o que evitaria que seu trabalho fosse orientado pela subjetividade.</p><p>Seguindo essa linha de raciocínio, uma das premissas é a de que os jornalistas devem se manter</p><p>distantes dos acontecimentos, preocupando-se em fazer um relato neutro, isento de opinião, baseado</p><p>nas informações coletadas.</p><p>Faz parte ainda dessa visão o fato de que os veículos tentavam buscar o seu próprio financiamento,</p><p>afastando-se do modelo adotado até então, quando os jornais nasciam associados a partidos políticos</p><p>e dependiam deles para bancar os custos das publicações.</p><p>Entendido o contexto social do desenvolvimento da Teoria do Espelho, é importante enfatizar que</p><p>essas pesquisas iniciais se inspiram no Positivismo do filósofo francês Augusto Comte.</p><p>Para compreender melhor essa corrente, leia o texto reproduzido a seguir, no qual estão sintetizadas</p><p>as principais ideias.</p><p>Augusto Comte e a lei dos três estados</p><p>De maneira resumida podemos dizer que, para Comte, assim como nas ciências sociais, o</p><p>conhecimento deveria ser buscar as leis que regem a dinâmica da sociedade, o que só seria</p><p>possível por meio de uma postura científica e que viesse substituir as concepções teológicas</p><p>e filosóficas da realidade. Comte partia da premissa de que o homem é um ser naturalmente</p><p>social e portador de razão, que construía a sua inteligência e interferia sobre a formação de</p><p>seu pensamento.</p><p>Argumentava que a sociedade humana passava evolutivamente pelo que foi por</p><p>ele denominado lei dos três estados (ou estágios) do conhecimento e do pensamento</p><p>humano. O primeiro estado do conhecimento humano foi denominado por Comte como</p><p>estado teológico.</p><p>Neste estágio, o homem colocava Deus (ou forças sobrenaturais) como o regente de</p><p>tudo o que ocorre no cosmo e</p><p>na vida social, conferindo-lhe uma ordem e uma determinada</p><p>128</p><p>Unidade III</p><p>forma de lógica. Tratava-se, portanto, de uma concepção teocêntrica da vida social, calcada</p><p>numa crença ou na fé irracional, carregada de dogmas e predestinações, que colocava o</p><p>homem numa posição fatalista e submissa diante da realidade.</p><p>Num segundo momento, o homem evoluiu e atingiu o estado denominado metafísico.</p><p>Nessa fase, o homem já não vê mais a figura divina como a única presente, agindo sobre</p><p>os fenômenos do mundo e de sua existência. Ao lado da ação divina, percebida ainda</p><p>como uma essência fundamentalmente presente, já são notadas determinadas formas de</p><p>intervenção da parte do homem.</p><p>Trata-se de uma fase de questionamentos e levantamento de dúvidas, que já buscam</p><p>uma ação além do que poderia provir do divino, considerado pelos positivistas como um</p><p>momento de progresso e evolução do pensamento humano, mas ainda incompleto e</p><p>insuficiente para que houvesse uma mais racional intervenção humana sobre a realidade</p><p>abrangente. Isso só seria possível à medida que o homem evoluísse para um estado</p><p>considerado superior: o positivo.</p><p>Neste estágio do conhecimento, o homem é concebido como o articulador dos</p><p>acontecimentos da vida social. Numa formulação antropocêntrica da realidade, nesse</p><p>estado, considerado por Comte como fixo e definitivo, há a valorização da busca do saber,</p><p>da reflexão, com base na razão, nos métodos científicos também denominados positivos</p><p>e no uso da racionalidade. Tal só seria alcançado naquela nova sociedade industrial,</p><p>conduzida para o progresso. É nessa perspectiva que Comte, em 1839, propôs a criação de</p><p>uma nova ciência: a sociologia, originalmente denominada física social. Por meio dela seria</p><p>possível adquirir um conhecimento mais racional e cientificamente fundamentado sobre os</p><p>fenômenos sociais.</p><p>Ao analisar o que ele denominou de evolução do conhecimento humano, Comte propõe,</p><p>claramente, que no caso do estado positivo, sinônimo de científico, há a aplicação de</p><p>determinados procedimentos científicos para a compreensão da realidade social.</p><p>COSTA, F. P.; GUERRIERO, S. Augusto Comte e a lei dos três estados. In: AZEVEDO, J. E. (org.).</p><p>Introdução às Ciências Sociais. São Paulo: Évora Uni, 2017.</p><p>A compreensão dos principais aspectos do pensamento positivista é fundamental para entendermos</p><p>as bases da Teoria do Espelho. A busca pela verdade e a tentativa de deixar a subjetividade em</p><p>segundo plano tinham a intenção de conferir mais legitimidade ao jornalismo, aproximá-lo do</p><p>método científico.</p><p>No campo acadêmico, a Teoria do Espelho não é mais empregada, até porque o jornalismo passou a</p><p>ser visto como construção da realidade, considerando-se os inúmeros aspectos que interferem no dia</p><p>a dia de trabalho do jornalista.</p><p>129</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>Em sociedades mais complexas como a que vivemos hoje (bem diferente do ambiente de 1950), é</p><p>praticamente impossível considerar que o trabalho do jornalista é atuar como um reflexo da realidade,</p><p>até porque teríamos que nos perguntar, primeiramente, sobre a realidade de qual grupo social</p><p>estamos falando.</p><p>Nesse momento, é natural que haja a pergunta: se a Teoria do Espelho deixou de ser considerada</p><p>uma explicação plausível para indicar por que as notícias são como são, qual a razão de ainda fazemos</p><p>referência a ela em nossos estudos sobre jornalismo?</p><p>Em primeiro lugar, trata-se de uma abordagem que nos ajuda a entender o processo de</p><p>desenvolvimento do jornalismo, incentivando-nos a refletir sobre os dilemas que envolvem a</p><p>atividade. E há outra razão: em muitas situações, para evitar as acusações de manipulação dos fatos,</p><p>jornalistas e empresas jornalísticas usam um discurso de imparcialidade que nos remete às premissas</p><p>da Teoria do Espelho.</p><p>Dennis Oliveira (2020b) chama a atenção para esse aspecto em sua análise sobre imparcialidade e</p><p>neutralidade no jornalismo:</p><p>Embora esta ideia já esteja suficientemente contestada, é muito comum</p><p>ouvir de jornalistas este argumento como álibi contra críticas que são feitas</p><p>às produções jornalísticas: que eles apenas retratam a verdade e que não</p><p>têm compromisso com nenhum grupo (p. 45).</p><p>Para exemplificar essa situação, veja, a seguir, um trecho extraído das políticas editoriais do</p><p>Grupo Globo:</p><p>Pratica jornalismo todo veículo cujo propósito central seja conhecer,</p><p>produzir conhecimento, informar. O veículo cujo objetivo central seja</p><p>convencer, atrair adeptos, defender uma causa, faz propaganda. Um está́</p><p>na órbita do conhecimento; o outro, da luta político-ideológica. Um jornal</p><p>de um partido político, por exemplo, não deixa de ser um jornal, mas não</p><p>pratica jornalismo, não como aqui definido: noticia os fatos, analisa-os,</p><p>opina, mas sempre por um prisma, sempre com um viés, o viés do partido.</p><p>E sempre com um propósito: o de conquistar seguidores. Faz propaganda.</p><p>Algo bem diverso de um jornal generalista de informação: este noticia</p><p>os fatos, analisa-os, opina, mas com a intenção consciente de não ter</p><p>um viés, de tentar traduzir a realidade, no limite das possibilidades,</p><p>livre de prismas. Produz conhecimento. O Grupo Globo terá́ sempre e</p><p>apenas veículos cujo propósito seja conhecer, produzir conhecimento,</p><p>informar (GLOBO, 2011).</p><p>130</p><p>Unidade III</p><p>Exemplo de aplicação</p><p>Proposta de atividade: leia a matéria reproduzida a seguir e faça uma análise, procurando identificar</p><p>o método empregado pelo jornalista na sua elaboração. Quais foram as fontes? Como o jornalista</p><p>organizou a narrativa em questão? Ele expressa a sua opinião?</p><p>Eduardo Bolsonaro, ministra Tereza Cristina e Bruno Bianco, da AGU, recebem diagnóstico</p><p>de Covid</p><p>Deputado acompanhou comitiva do presidente na ONU, nos EUA, e está isolado após Queiroga</p><p>confirmar infecção</p><p>Mateus Vargas</p><p>BRASÍLIA</p><p>O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) recebeu diagnóstico de Covid-19 nesta sexta-feira (24).</p><p>A informação foi anunciada pelo filho do presidente Jair Bolsonaro em suas redes sociais.</p><p>A ministra da Agricultura, Tereza Cristina (DEM-MS), e o ministro da AGU (Advocacia-Geral da União),</p><p>Bruno Bianco, também confirmaram a infecção no mesmo dia.</p><p>Eduardo integrou a comitiva do presidente Bolsonaro que viajou a Nova York para participar da</p><p>Assembleia-Geral da ONU.</p><p>Todo o grupo que esteve nos Estados Unidos foi colocado em isolamento, por recomendação da</p><p>Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), após o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, receber</p><p>o diagnóstico de Covid na terça-feira (21).</p><p>Três membros da equipe levada aos Estados Unidos contraíram a doença. Além de Eduardo e</p><p>Queiroga, um funcionário do cerimonial da Presidência recebeu diagnóstico no sábado (18), véspera da</p><p>chegada do presidente.</p><p>O deputado disse no Twitter não acreditar que a vacina é “inútil” por causa da sua infecção. Mas</p><p>afirmou que é “mais um argumento contra o passaporte sanitário”. “Sabemos que as vacinas foram feitas</p><p>mais rápidas do que o padrão. Tomei a 1ª dose de Pfizer e contraí Covid”, afirmou ele na rede social.</p><p>Apesar da fala de Eduardo, a vacina da Pfizer, assim como outras, tem eficácia e segurança reconhecidas</p><p>pela Anvisa. São necessárias duas doses deste imunizante para alcançar a proteção medida nos estudos.</p><p>As chances de contaminação caem após a vacinação, mas não há como impedir o contágio. A própria</p><p>Anvisa afirma que entre os principais ativos dos imunizantes está a redução dos casos graves.</p><p>Os dados do SUS mostram queda de internações após o começo da campanha de vacinação.</p><p>131</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>Mais tarde, em uma live nas redes sociais, Eduardo repetiu os argumentos publicados em seu Twitter</p><p>e afirmou que está sentindo “sintomas apenas de um resfriado”.</p><p>“Hoje em dia muita gente já teve Covid, não é nada de excepcional”, afirmou, referindo-se à doença</p><p>que, até o momento, deixou mais de 593 mil mortos no Brasil.</p><p>Membros da comitiva de Bolsonaro não usaram máscaras e fizeram aglomerações em alguns</p><p>momentos da viagem aos Estados Unidos, aumentando as chances de contaminação.</p><p>Mesmo depois de</p><p>saber da infecção de Queiroga, o presidente cumprimentou apoiadores.</p><p>Eduardo também afirmou que recebeu resultado negativo no exame para Covid feito em Nova York.</p><p>“Aqui no Brasil, dois dias depois positivou”, disse o deputado em um comentário escrito por ele em página</p><p>bolsonarista do Youtube. “Sinto-me melhor do que ontem e nem te conto o que tomei...”, completou.</p><p>O deputado não detalhou o tratamento escolhido, mas ele defende o uso de medicações sem eficácia</p><p>contra a Covid, como a hidroxicloroquina.</p><p>Eduardo disse ao portal R7 que fez o teste na quinta (23) e recebeu o resultado nesta sexta. Já a</p><p>ministra da Agricultura afirmou em sua conta no Twitter que está bem, cancelou compromissos e ficará</p><p>isolada para cumprir quarentena.</p><p>Somando os diagnósticos desta sexta, 18 ministros de Bolsonaro já foram infectados pela Covid.</p><p>A conta considera autoridades que já deixaram o governo, como Ricardo Salles, mas que confirmaram o</p><p>contágio enquanto estavam no cargo de ministro.</p><p>O ministro da AGU esteve na cerimônia de recondução do procurador-geral da República, Augusto</p><p>Aras, na quinta-feira (23). O ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, também esteve no evento. Imagem</p><p>divulgada pelo Palácio do Planalto mostra Bianco cumprimentando Aras, que estava sem máscara.</p><p>Já a agenda de Tereza Cristina registra jantar com o embaixador do Reino Unido no Brasil, Peter</p><p>Wilson, na terça-feira (21). No dia seguinte, a ministra teve reuniões com a senadora Kátia Abreu (PP-TO)</p><p>e com o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas. Ela não viajou com Bolsonaro aos Estados Unidos.</p><p>A ministra publicou imagem da conversa com Tarcísio, que não usava máscara. Ela também recebeu</p><p>outras autoridades nesta semana, como o secretário-executivo de Mudanças Climáticas da cidade</p><p>São Paulo, Antonio Pinheiro Pedro.</p><p>O presidente Jair Bolsonaro deverá realizar um novo teste RT-PCR no fim de semana e sair do</p><p>isolamento se não for detectada a presença do vírus.</p><p>Uma autoridade da Anvisa disse que quem teve contato com Eduardo e os ministros com diagnóstico</p><p>da Covid também deve se isolar por pelo menos cinco dias.</p><p>132</p><p>Unidade III</p><p>Em transmissão nas redes sociais na quinta-feira (23), Bolsonaro disse que duas pessoas conhecidas</p><p>foram infectadas com Covid, mesmo vacinadas. Bolsonaro usou os diagnósticos para voltar a desacreditar</p><p>os imunizantes, mas não citou quem havia testado positivo para Covid.</p><p>“Vou amanhã ligar para elas, para elas divulgarem. Mostrar que vacinas tomaram, para a gente</p><p>realmente ter um protocolo que funcione”.</p><p>Bolsonaro levou uma comitiva de 18 pessoas a Nova York, mas os integrantes da equipe de apoio</p><p>também foram isolados.</p><p>Após o diagnóstico de Queiroga, que faz quarentena em Nova York, Bolsonaro decidiu fazer reunião</p><p>de trabalho online e cancelar a ida ao interior do Paraná nesta sexta.</p><p>O avião presidencial decolou na noite de terça dos Estados Unidos e pousou em Brasília no início da</p><p>manhã desta quarta (22). Bolsonaro seguiu para o Palácio da Alvorada, residência oficial.</p><p>A viagem de Bolsonaro foi marcada por um discurso negacionista na ONU, em que ele atacou medidas</p><p>de distanciamento social e defendeu medicamentos comprovadamente ineficazes para a doença.</p><p>Fonte: VARGAS, M. Eduardo Bolsonaro, ministra Tereza Cristina e Bruno Bianco, da AGU, recebem diagnóstico de Covid.</p><p>Folha de S.Paulo, 24 set. 2021. Disponível em: https://bit.ly/3qIm9qP. Acesso em: 8 nov. 2021.</p><p>Lembrete</p><p>Na Teoria do Espelho, as notícias são vistas como espelho da realidade e</p><p>o jornalista é visto como um comunicador desinteressado que tem o dever</p><p>de informar e buscar a verdade.</p><p>Saiba mais</p><p>Recomendamos a leitura das políticas editoriais da Folha e do</p><p>Grupo Globo:</p><p>FOLHA DE S.PAULO. Princípios editoriais. 12 mar. 2019. Disponível em:</p><p>https://bit.ly/3F3JJSE. Acesso em: 8 nov. 2021.</p><p>GLOBO. Princípios Editoriais do Grupo Globo. Rio de Janeiro, 6 ago. 2011.</p><p>Disponível em: https://glo.bo/3n3mpOL. Acesso em: 8 nov. 2021.</p><p>133</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>8.3 A Teoria do Gatekeeper</p><p>Diferenciando-se da Teoria do Espelho, a Teoria do Gatekeeper contraria a visão de que o jornalismo</p><p>seja um reflexo da realidade, na medida em que atribui ao jornalista a função de selecionar os</p><p>fatos/acontecimentos que serão noticiados nos veículos de comunicação.</p><p>Retomando à tentativa de responder à pergunta “por que as notícias são como são?”, os estudos</p><p>nesse campo vão conferir a responsabilidade aos profissionais que estão à frente das redações, afirmando</p><p>que as decisões são tomadas com base em seus critérios individuais.</p><p>Um dos nomes de referência dessa corrente teórica é David Manning White, responsável por realizar,</p><p>em 1950, uma das primeiras pesquisas empíricas sobre o conteúdo jornalístico. Para analisar os critérios</p><p>de publicação e exclusão de notícias, White acompanhou o dia a dia de um jornal norte-americano de</p><p>média tiragem, procurando identificar as razões da rejeição ou da aceitação de determinada notícia.</p><p>Vejamos o detalhamento feito por Pena:</p><p>Ele estudou o fluxo de notícias dentro dos canais de organização dos</p><p>jornais com o objetivo de individualizar os pontos que funcionam como</p><p>cancelas. Seu estudo de caso foi a observação da atividade de um jornalista</p><p>de meia-idade, com 25 anos de experiência profissional, morador de uma</p><p>cidade de cem mil habitantes, cuja função era determinar as notícias que</p><p>deveriam ser selecionadas entre as centenas de despachos de agências</p><p>que chegavam diariamente à redação. White chamou seu pesquisado de</p><p>Mr. Gates e, durante uma semana, anotou os motivos que o levaram</p><p>a rejeitar as notícias não utilizadas. White concluiu que as decisões de</p><p>Mr. Gates foram subjetivas e arbitrárias, dependentes de juízos de valor</p><p>baseados no conjunto de experiências, atitudes e expectativas do gatekeeper.</p><p>De cada dez despachos, nove foram rejeitados. Das 1.333 explicações para</p><p>a recusa de uma notícia, cerca de oitocentas referiam-se à falta de espaço,</p><p>trezentas foram consideradas repetidas (sobrepostas a outras histórias já</p><p>selecionadas) ou não tinham interesse jornalístico, e 76 não estavam dentro</p><p>da área de interesse do jornal (2005, p. 136).</p><p>Essa linha de pesquisa é influenciada pelos estudos relacionados à psicologia social, a partir do</p><p>trabalho de Kurt Lewin, que fez uma pesquisa sobre as modificações dos hábitos alimentares em</p><p>determinado grupo social.</p><p>Lewin percebeu que existem canais por onde flui a sequência de</p><p>comportamentos relativos a um determinado tema. Esses canais</p><p>desembocam em uma zona filtro (o gate), que é controlada por quem tem</p><p>o poder de decidir (o gatekeeper). No caso dessa pesquisa específica, era</p><p>a decisão doméstica sobre que alimentos deveriam ser adquiridos para o</p><p>consumo da família (PENA, 2005, p. 136).</p><p>134</p><p>Unidade III</p><p>Trazendo essa análise de Lewin para o jornalismo, a proposta, então, é que a notícia é transmitida de</p><p>um gatekeeper para outro na cadeia de comunicações, considerando os papéis de pauteiros, repórteres,</p><p>editores etc. Autores como Traquina (2005) indicam como limitação para esses estudos o fato de</p><p>que a análise da notícia é feita apenas a partir de quem produz, desconsiderando-se outras questões</p><p>importantes, como as normas profissionais que interferem no trabalho do jornalista, como a estrutura</p><p>burocrática e a organização.</p><p>A despeito das limitações, trata-se de uma abordagem relevante na medida em que possibilitou</p><p>a criação de modelos para avaliar a seleção e a razão empregadas na produção jornalística, além de</p><p>detalhar como o conteúdo é modelado e estruturado.</p><p>Como contribuição importante para a aplicação da Teoria do Gatekeeper, destaca-se o livro de</p><p>Pamela J. Shoemaker e Tim P. Vos, Teoria do gatekeeping: seleção e construção da notícia, lançado no</p><p>Brasil em 2011.</p><p>Ao adotar o conceito de gatekeeping, pressupõe-se uma leitura mais abrangente da atuação do</p><p>jornalismo, uma vez que ele passa a se referir a todas as formas de controle da informação, incluindo</p><p>aspectos ligados à formação</p><p>da mensagem, à difusão etc.</p><p>Marques (2018) explica que o fenômeno de seleção das informações pode ser verificado em</p><p>níveis que vão além do individual, como nas rotinas organizacionais. Por exemplo, quando um evento</p><p>requer muita despesa e/ou tecnologia para produzir a história, isso pode surtir um efeito contrário na</p><p>escolha da notícia.</p><p>Com base na pesquisa de Shoemaker, o pesquisador propõe cinco níveis para o estudo do gatekeeping</p><p>em contextos contemporâneos:</p><p>1) o dos profissionais da comunicação individuais (suas atitudes políticas,</p><p>por exemplo); 2) o das rotinas ou práticas do trabalho em comunicação</p><p>(a pirâmide invertida, por exemplo); 3) o nível organizacional (a análise de</p><p>variáveis como parâmetros de participação de propriedade na mídia, por</p><p>exemplo); 4) o nível de análise socioinstitucional, incluindo as influências do</p><p>governo e grupos de interesse; e, 5) o nível do sistema social, com a análise</p><p>de variáveis (ideologia e cultura, por exemplo) (MARQUES, 2018, p. 49).</p><p>Como indica o próprio Marques (2018) ao fazer uma análise detalhada da Teoria do Gatekeeper,</p><p>os pressupostos levantados nesses estudos foram importantes para delimitar os caminhos que seriam</p><p>seguidos pela Teoria do Newsmaking, focada nas rotinas de produção do trabalho jornalístico (ela será</p><p>analisada no próximo tópico).</p><p>Refletindo sobre a realidade atual do jornalismo, a preocupação em avançar nessa análise dos fatores</p><p>envolvidos na produção da notícia também reside no fato de que a difusão das plataformas digitais tem</p><p>colocado novos desafios para o trabalho do jornalista. No dia a dia, percebe-se que as possibilidades</p><p>135</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>de controle da informação que será divulgada são cada vez mais limitadas, uma vez que houve uma</p><p>multiplicação na quantidade de produtores de conteúdo.</p><p>Por conta das mudanças, os pesquisadores têm revisitado a Teoria do Gatekeeper, expandindo sua</p><p>aplicação para o campo do jornalismo online. Nesse caso, vale chamar a atenção para outro aspecto</p><p>do trabalho atual dos jornalistas: a produção do jornalismo com o emprego de dispositivos móveis</p><p>tem ajudado a reconfigurar também a própria autonomia do profissional. Quando está fazendo uma</p><p>cobertura na rua, direto do seu celular, o repórter muitas vezes é mesmo o responsável por decidir o que</p><p>será noticiado e de que forma isso será feito.</p><p>Para entender melhor como isso funciona na prática, leia a seguir o estudo de caso sobre o</p><p>Mídia Ninja.</p><p>Exemplo de aplicação</p><p>Mídias Ninja: smartphones na cobertura ao vivo das manifestações</p><p>O Mídia Ninja é um caso ilustrativo da apropriação e remixagem das tecnologias móveis. Apesar</p><p>de ter sido tratado com novidade e ineditismo, esse uso de tecnologias móveis já tinha sido citado e</p><p>contextualizado por Howard Rheingold, em 2002, no seu livro Smart mobs: the next social revolution,</p><p>na exploração do conceito de smart mobs (multidão inteligente) como uma revolução da multitude</p><p>organizada para protestar através de articulações via SMS, comunidades virtuais e com o uso de</p><p>tecnologias móveis.</p><p>Entretanto, o trabalho do Mídia Ninja repercutiu durante os protestos em junho de 2013 no Brasil,</p><p>no que ficou conhecido como “Jornada de Junho” contra o aumento de passagens, contra a Copa do</p><p>Mundo e outras reivindicações.</p><p>O Mídia Ninja exerceu o princípio da liberação do polo emissor ao transformar o smartphone com</p><p>tecnologia 3G e 4G em aplicativo de streaming transmissor para emissão ao vivo (figura 27). A narrativa</p><p>em tempo real explorada e o coletivo descentralizado fizeram com que a cobertura do protesto fosse</p><p>realizada de forma protagonista em relação aos meios de comunicação de massa, que demoraram para</p><p>compreender o fenômeno das manifestações e seu impacto sobre o processo de construção da notícia.</p><p>Outros veículos de comunicação, ao se confrontarem com a realidade (ou devido ao impedimento</p><p>pelos manifestantes), iniciaram a estratégia de atuar de forma similar ao Mídia Ninja, como ocorreu com</p><p>os repórteres da Globo News e da Folha de S.Paulo (com drones e Google Glass).</p><p>Podemos classificar essa articulação do Mídia Ninja dentro da noção de jornalismo participativo</p><p>móvel e que se beneficiou da proliferação de câmeras digitais e celulares com câmeras. Fatos de grandes</p><p>repercussões como os atentados em Madri (2004) e Londres (2005) foram registrados por cidadãos</p><p>comuns e reverberaram pela internet e pelos veículos de comunicação tradicionais, assumindo uma</p><p>função pós-massiva.</p><p>136</p><p>Unidade III</p><p>Figura 27 – Mídia Ninja fazendo transmissão ao vivo de smartphones</p><p>Fonte: Silva (2015, p. 34).</p><p>Observamos que essas situações ultrapassam a fronteira dos meios de comunicação de massa e</p><p>funcionam como insurgência à inoperância destes diante de fatos jornalísticos que não são cobertos por</p><p>falta de profissionais suficientes, por decisões editoriais ou por não atenderem aos critérios objetivos ou</p><p>subjetivos de noticiabilidade dessas organizações jornalísticas.</p><p>No contexto, temos o papel exercido pelas redes sociais móveis como aspecto expansivo e essencial</p><p>da prática do jornalismo móvel devido às possibilidades de emissão instantânea de diversos formatos</p><p>midiáticos diretamente de smartphones e tablets e utilizadas na chamada narrativa em tempo real, a</p><p>exemplo do Twitter, Facebook e Instagram, além da característica de compartilhamento.</p><p>Durante as manifestações de junho no Brasil, tivemos um exemplo prático da capilaridade das redes</p><p>sociais através do Mídia Ninja com a fusão entre redes sociais móveis, smartphones com conexão 3G e</p><p>4G e aplicativo de streaming TwitCasting na cobertura ao vivo direto de diversos lugares do país.</p><p>As redes sociais são reapropriadas para o jornalismo nas condições de narrativas construídas</p><p>diretamente dos lugares dos acontecimentos. A percepção do uso prático das redes sociais tem sido</p><p>vista em momentos como chuvas intensas nas metrópoles como Rio de Janeiro, São Paulo e Salvador,</p><p>por exemplo, em que os meios de comunicação de massa tradicionais falham na cobertura de utilidade</p><p>pública ou o fazem de forma limitada.</p><p>137</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>Nessas circunstâncias e pelas suas características, as redes sociais são mais ágeis e perfeitamente</p><p>aplicáveis à noção de jornalismo móvel na compreensão da relação jornalismo, mobilidade e lugar</p><p>através de tecnologias móveis conectadas e ubíquas.</p><p>Fonte: SILVA, F. F. Jornalismo móvel. Salvador: EDUFBA, 2015. Disponível em: https://bit.ly/3F89WPX. Acesso em: 22 set. 2021.</p><p>Lembrete</p><p>A Teoria do Gatekeeper pressupõe que as notícias são como são porque</p><p>os jornalistas assim as determinam.</p><p>Saiba mais</p><p>Para entender a aplicação da Teoria do Gatekeeper, leia a parte II do</p><p>livro a seguir:</p><p>SHOEMAKER, P. J.; VOS, T. P. Teoria do gatekeeping: seleção e construção</p><p>da notícia. Porto Alegre: Penso, 2011.</p><p>8.4 A Teoria do Newsmaking</p><p>Considerada ainda bastante atual para os estudos sobre jornalismo, a Teoria do Newsmaking propõe</p><p>uma abordagem sociológica para a atividade. Em linhas gerais, contempla as rotinas de produção das</p><p>matérias, concentrando o seu foco nas condições enfrentadas no dia a dia para que o trabalho possa ser</p><p>realizado, e os efeitos que essas rotinas terão sobre o fazer jornalístico.</p><p>Assim, a partir dessa perspectiva, essa teoria leva em consideração o fato de as notícias massivas</p><p>terem algumas características peculiares, uma vez que os veículos de comunicação têm necessidade</p><p>de audiência, dependem do financiamento direto da publicidade e exercem alguma forma de controle</p><p>editorial sobre o que será publicado.</p><p>Vamos entender melhor como foram fundamentados esses estudos, mas vale enfatizar que os</p><p>pressupostos da Teoria do Newsmaking são os balizadores dos cursos de jornalismo, que, em suas</p><p>disciplinas iniciais, abordam, por exemplo, os critérios de noticiabilidade consolidados a partir desse tipo</p><p>de pesquisa.</p><p>138</p><p>Unidade III</p><p>Trata-se de um aspecto relevante para a formação dos jornalistas, porque se apresentam como uma</p><p>forma de mostrar para</p><p>quem está iniciando a sua trajetória na área quais são os critérios empregados</p><p>no dia a dia para que um fato/acontecimento seja transformado em notícia.</p><p>Como observa Pena (2005), é na acepção dessa corrente teórica que o trabalho jornalístico passa a</p><p>ser visto não como espelho da realidade, e sim como construção da realidade. Para exemplificar, o autor</p><p>chama a atenção, por exemplo, para a produção noticiosa na televisão:</p><p>Organizada no tempo, e não no espaço, a notícia televisiva sofre com mais</p><p>intensidade os efeitos da velocidade. O “furo de reportagem” não espera</p><p>a edição do dia seguinte, deve ser veiculado na hora, ao vivo e em cores.</p><p>No interior dessa lógica, fica clara a pressão sofrida pelo repórter. Ao mesmo</p><p>tempo, entretanto, ele toma a notícia como um valor, ou seja, apropria-se</p><p>dos benefícios de ser o jornalista a dar o furo e entra no jogo da concorrência</p><p>comercial. É um dos aspectos classificados por Breed como constrangimento</p><p>organizacional, que influencia diretamente no trabalho jornalístico. O fato é</p><p>que os jornalistas se valem de uma cultura própria para decidir o que é ou</p><p>não é notícia. Ou seja, têm critérios próprios, que consideram óbvios, quase</p><p>instintivos (p. 73).</p><p>Warren Breed, citado no texto de Pena, foi um dos primeiros investigadores a sugerir que os</p><p>jornalistas eram influenciados por forças socializadoras na redação. Em sua análise, ele indica o processo</p><p>de recompensa e punição ao qual o jornalista está submetido, citando seis fatores como preponderantes:</p><p>• autoridade institucional e sanções;</p><p>• progressão na carreira profissional;</p><p>• sentimentos de obrigação e estima para com os seus superiores;</p><p>• ausência de conflitos de lealdade;</p><p>• prazer do exercício do jornalismo;</p><p>• jornalismo como valor.</p><p>Seguindo essa linha, como analisa Sousa (1999), a gratificação do jornalista socializado na redação</p><p>concretizava-se quando ele alcançava um estatuto entre os seus colegas e os seus superiores. Por essa</p><p>perspectiva, isso seria até mais importante do que sua capacidade de influenciar pessoas, a resposta do</p><p>público perante o seu trabalho ou mesmo na defesa de ideais pessoais ou profissionais.</p><p>Ainda tomando como referência a análise feita por Sousa (1999), em A notícia e seus efeitos,</p><p>é importante citar o trabalho realizado por Leon Sigal sobre as primeiras páginas dos jornais</p><p>The New York Times e Washington Post. Ele constatou que havia muita competição entre os editores</p><p>139</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>para conseguir espaço na primeira página. Nessa análise, ele também identificou que a lógica de</p><p>funcionamento das organizações jornalísticas, especificamente a rotina, era responsável por fazer</p><p>com que leads de notícias sobre o mesmo assunto, embora editadas por órgãos de comunicação social</p><p>diferentes, fossem semelhantes.</p><p>Uma das principais referências para a Teoria do Newsmarking é a socióloga Gaye Tuchman, que</p><p>sintetizou suas propostas no livro Making news: a study in the construction of reality.</p><p>De acordo com a análise feita por Pena (2005) sobre essa proposta, os órgãos de informação devem</p><p>cumprir três obrigações para produzir o noticiário:</p><p>• tornar possível o reconhecimento de um fato desconhecido como acontecimento notável;</p><p>• elaborar formas de relatar os acontecimentos que não tenham a pretensão de dar a cada fato</p><p>ocorrido um tratamento idiossincrático;</p><p>• organizar, temporal e espacialmente, o trabalho de modo que os acontecimentos noticiáveis</p><p>possam afluir e ser trabalhados de forma planificada.</p><p>Uma das questões centrais, nesse caso, é que o jornalista tem uma participação ativa nesse processo</p><p>de produção, apesar de sua autonomia estar vinculada à prática profissional – ou seja, depende do que</p><p>acontece no planejamento produtivo.</p><p>Como observa Pena (2005), essa situação diminui a pertinência de alguns enfoques conspiratórios na</p><p>teoria do jornalismo, como o paradigma da manipulação da notícia. Além disso, “uma suposta intenção</p><p>manipuladora por parte do jornalista seria superada pelas imposições da produção jornalística” (PENA,</p><p>2005, p. 130).</p><p>Uma das contribuições da Teoria do Newsmaking é a indicação dos chamados critérios de</p><p>noticiabilidade, importantes para definir por que determinados fatos ganharão o status de notícia e</p><p>outros não. Conforme afirma Traquina (2005, p. 47), “devido aos valores-notícia, os jornalistas formam</p><p>hábitos mentais, isto é, maneiras de ver”.</p><p>Listamos, a seguir, os principais critérios de noticiabilidade. O tema tem sido trabalhado por diversos</p><p>autores, com diferentes denominações, mas a relação a seguir traduz bem a essência do que está por</p><p>trás do valor-notícia:</p><p>• Proximidade: quanto mais próximo ocorrer um acontecimento, mais probabilidade ele tem de se</p><p>tornar notícia. A proximidade pode assumir várias formas: geográfica, afetiva, cultural etc.</p><p>• Momento do acontecimento: quanto mais recente for um acontecimento, mais probabilidade</p><p>tem de se tornar notícia.</p><p>140</p><p>Unidade III</p><p>• Relevância: quanto mais intenso ou relevante for um acontecimento, quanto maior o número</p><p>de pessoas impactadas, mais probabilidade tem de se tornar notícia; além disso, quanto menos</p><p>ambíguo for um acontecimento, mais probabilidade tem de se tornar notícia.</p><p>• Proeminência social dos sujeitos envolvidos: quanto mais proeminentes forem as pessoas</p><p>envolvidas num acontecimento, mais probabilidade ele tem de se tornar notícia.</p><p>• Proeminência das nações envolvidas nas notícias: quanto mais proeminentes forem as nações</p><p>envolvidas num acontecimento internacional, mais probabilidade ele tem de se tornar notícia.</p><p>• Consonância: quanto mais agendável for um acontecimento, quanto mais corresponder</p><p>às expectativas e quanto mais o seu relato se adaptar ao meio, mais probabilidade tem de se</p><p>tornar notícia.</p><p>• Imprevisibilidade: quanto mais surpreendente for um acontecimento, mais probabilidade terá</p><p>de se tornar notícia.</p><p>• Continuidade: os desenvolvimentos de acontecimentos já noticiados têm grande probabilidade</p><p>de se tornar notícia.</p><p>O que é importante enfatizar, para o objetivo do nosso estudo, é que a partir do conceito de</p><p>valor-notícia a Teoria do Newsmaking concentra-se no processo de organização do trabalho jornalístico,</p><p>sem a qual seria praticamente impossível desenvolver o trabalho.</p><p>A perspectiva da Teoria do Newsmaking é construtivista e rejeita claramente</p><p>a teoria do espelho. Mas isso não significa considerar as notícias ficcionais,</p><p>sem correspondência com a realidade exterior. Na verdade, o método</p><p>construtivista apenas enfatiza o caráter convencional das notícias, admitindo</p><p>que elas informam e têm referência na realidade. Entretanto, também</p><p>ajudam a construir essa mesma realidade e possuem uma lógica interna</p><p>de constituição que influencia todo o processo de construção. A socióloga</p><p>Gaye Tuchman é uma das mais respeitadas pesquisadoras do newsmaking.</p><p>Suas ideias são constantemente citadas no livro Teorias da comunicação,</p><p>de Mauro Wolf, para quem a teoria articula-se em três vertentes principais:</p><p>a cultura profissional dos jornalistas, a organização do trabalho e os processos</p><p>produtivos. Para o autor, Tuchman envereda com competência pela</p><p>análise da organização do ofício jornalístico, sem a qual seria impossível</p><p>produzir notícias, já que há uma superabundância de fatos no cotidiano</p><p>(PENA, 2005, p. 131).</p><p>Nelson Traquina, no livro Teorias do jornalismo, volume I, também cita o estudo de Gaye Tuchman</p><p>para explicar o conceito de perspicácia noticiosa, classificada pela socióloga como uma espécie de</p><p>conhecimento sagrado, uma capacidade secreta de diferenciar o jornalista de outras pessoas.</p><p>141</p><p>HISTÓRIA E TEORIA DO JORNALISMO</p><p>Contudo, como foi confirmado pela Teoria do Newsmaking, as notícias apresentam um padrão geral</p><p>estável e previsível. Vejamos a sua definição:</p><p>A previsibilidade do esquema geral das notícias deve-se à existência de</p><p>critérios de noticiabilidade, isto é, à existência de valores-notícia que os</p><p>membros da tribo jornalística partilham. Podemos definir o conceito</p>