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<p>Recredenciamento</p><p>Portaria MEC 347, de 05.04.2012 - D.O.U. 10.04.2012.</p><p>Complexo de Ensino Superior de Cachoeirinha</p><p>Rua Silvério Manoel da Silva, 160 – Bairro Colinas – Cep.: 94940-243 | Cachoeirinha – RS | Tel/Fax. (51) 33961000 | e-mail: cesuca@cesuca.edu.br</p><p>FACULDADE</p><p>CESUCA</p><p>Relato de Experiência: o processo de luto em um paciente com a perna</p><p>amputada</p><p>Estágio Profissional I</p><p>André Wilke Franco</p><p>Cachoeirinha</p><p>2018/2</p><p>Recredenciamento</p><p>Portaria MEC 347, de 05.04.2012 - D.O.U. 10.04.2012.</p><p>Complexo de Ensino Superior de Cachoeirinha</p><p>Rua Silvério Manoel da Silva, 160 – Bairro Colinas – Cep.: 94940-243 | Cachoeirinha – RS | Tel/Fax. (51) 33961000 | e-mail: cesuca@cesuca.edu.br</p><p>PLANO DE ESTÁGIO</p><p>ESTÁGIO PROFISSIONAL I</p><p>Professora: Daniela Pereira Ribeiro</p><p>Orientadora acadêmica</p><p>CRP 12/02378</p><p>André Kraemer Betts</p><p>Orientador Local</p><p>CRP 07/21999</p><p>André Wilke Franco</p><p>Acadêmico de Psicologia</p><p>Matricula: 22218</p><p>Recredenciamento</p><p>Portaria MEC 347, de 05.04.2012 - D.O.U. 10.04.2012.</p><p>Complexo de Ensino Superior de Cachoeirinha</p><p>Rua Silvério Manoel da Silva, 160 – Bairro Colinas – Cep.: 94940-243 | Cachoeirinha – RS | Tel/Fax. (51) 33961000 | e-mail: cesuca@cesuca.edu.br</p><p>1. Dados de identificação</p><p>1.1. Nome completo: André Wilke Franco</p><p>1.2. Número de matrícula: 22218</p><p>1.3. Área de estágio: Saúde Mental Promoção e Prevenção - Psicanálise.</p><p>1.4. Local do estágio: Associação de pais e amigos dos excepcionais – APAE Cachoeirinha</p><p>Av. Mário Tavares Haussen., 370 - Bairro COHAB, Cachoeirinha - RS, CEP 94935-</p><p>797– Telefone: (51) 3470 1103</p><p>1.5. Nome do supervisor local e CRP: André Kraemer Betts. CRP 07/21999</p><p>1.6. Nome do professor orientador: Daniela Pereira Ribeiro</p><p>Recredenciamento</p><p>Portaria MEC 347, de 05.04.2012 - D.O.U. 10.04.2012.</p><p>Complexo de Ensino Superior de Cachoeirinha</p><p>Rua Silvério Manoel da Silva, 160 – Bairro Colinas – Cep.: 94940-243 | Cachoeirinha – RS | Tel/Fax. (51) 33961000 | e-mail: cesuca@cesuca.edu.br</p><p>Relato de Experiência: o processo de luto em um paciente com a perna</p><p>amputada</p><p>Resumo: O luto é um processo muito recorrente em pacientes que tiveram um membro ou parte</p><p>do corpo amputados. A psicoterapia breve de orientação psicanalítica apresenta um forte</p><p>potencial para o tratamento de indivíduos enlutados devido a amputação, visto que a mesma</p><p>atua com metas, objetivando o autodesenvolvimento e a resolução de conflitos externos e</p><p>internos. Este trabalho se constitui em um relato de experiência descritivo e qualitativo, e tem</p><p>como objetivo geral apresentar sete encontros de um atendimento psicoterápico breve com</p><p>enfoque na Abordagem Psicanalítica de um processo de luto de um indivíduo amputado devido</p><p>a diabetes efetuados em um serviço de reabilitação oferecido por uma APAE localizada na</p><p>região metropolitana de Porto Alegre. Os atendimentos ocorreram semanalmente, com duração</p><p>média de 45 minutos. Percebeu-se que inúmeros fatores, como sua aposentadoria por tempo de</p><p>contribuição, a reconstituição de sua imagem narcísica devido a lembrança de conquistas</p><p>fálicas, a convivência com outras pessoas amputadas, a criação de uma perspectiva de futuro e</p><p>o tempo decorrido desde a cirurgia de amputação, contribuíram para uma resolução do processo</p><p>de luto do paciente. Mesmo assim, considera-se importante que ele siga em tratamento</p><p>psicoterápico, objetivando o desenvolvimento psíquico e a melhora da qualidade emocional, de</p><p>acordo com suas limitações.</p><p>Palavras Chaves: Relato de experiência; luto; amputação; psicoterapia breve de orientação psicanalítica.</p><p>Introdução</p><p>Este trabalho trata-se de um relato de experiência de um estágio curricular do curso de</p><p>psicologia da faculdade CESUCA numa APAE da região metropolitana de porto alegre, onde</p><p>ocorre um serviço de reabilitação. O texto abordará sobre o processo psicoterápico breve com</p><p>enfoque na psicanálise de um paciente que teve a perna amputada devido a diabetes.</p><p>O centro de reabilitação trabalha com uma equipe interdisciplinar que tem a psicanálise</p><p>como viés, atribuindo a mesma visão de sujeito de desejo a todos os profissionais que trabalham</p><p>neste local. Nesta APAE funciona um serviço de reabilitação que se divide entre (1) reabilitação</p><p>física e (2) intelectual. Sendo que dentro da reabilitação intelectual há um projeto que fornece</p><p>atendimento psicoterápico a pacientes da reabilitação física. Esse projeto se caracteriza por</p><p>utilizar a psicoterapia breve, tendo como tempo estimado de atendimento 6 meses, podendo se</p><p>estender para no máximo 2 anos caso seja necessário.</p><p>De acordo com Braier (2008), a psicologia breve surgiu devido à grande demanda</p><p>assistencial da população. O autor relata que os hospitais e as instituições de saúde privadas e</p><p>públicas tiveram que adotar outras técnicas e ferramentas para conseguir atender o maior</p><p>número de indivíduos possíveis, já que os terapeutas não conseguiam dar conta da crescente</p><p>Recredenciamento</p><p>Portaria MEC 347, de 05.04.2012 - D.O.U. 10.04.2012.</p><p>Complexo de Ensino Superior de Cachoeirinha</p><p>Rua Silvério Manoel da Silva, 160 – Bairro Colinas – Cep.: 94940-243 | Cachoeirinha – RS | Tel/Fax. (51) 33961000 | e-mail: cesuca@cesuca.edu.br</p><p>quantidade de pessoas que necessitava de atendimentos. Dentre essas técnicas estavam o</p><p>atendimento breve e o atendimento em grupo. Outro fator que influenciou a criação de</p><p>atendimentos breves e rápidos, fora a falta de recursos econômicos, visto que as psicoterapias</p><p>breves eram mais acessíveis que as tradicionais.</p><p>A psicoterapia breve tem esse nome devido ela ser breve do ponto de vista terapêutico,</p><p>porém ela pode não parecer breve para o paciente, podendo ser de duração prolongada de 1 ou</p><p>mais anos (Braier, 2008). O que a torna breve são as metas limitadas e as características técnicas</p><p>próprias, como focalização e planejamento. Além de que ela apresenta uma determinação prévia</p><p>da duração do processo psicoterápico para o paciente, que normalmente corresponde a meses</p><p>de tratamento (Braier, 2008).</p><p>Braier (2008) defende uma psicoterapia breve de orientação psicanalítica que apresenta</p><p>como objetivo terapêutico a criação de metas com intuito de suprimir os sintomas e os</p><p>problemas atuais para que o paciente possa enfrentar de maneira mais consistente situações</p><p>conflitivas e se autodesenvolver, o que, de certa forma, corresponde ao princípio de insight.</p><p>Neste sentido, a psicoterapia breve de orientação psicanalítica apresenta um grande potencial</p><p>para o tratamento de indivíduos enlutados devido a amputação de membro do corpo. Visto que</p><p>a supressão dos sintomas do luto podem auxiliar no enfrentamento dos conflitos externos e</p><p>internos provindos da amputação e, também, na adaptação e no autodesenvolvimento frente as</p><p>mudanças ocasionadas pela incapacidade física.</p><p>A respeito da amputação, Seren & De Tilio (2014) a caracterizam como a retirada</p><p>parcial ou total de uma parte ou de um membro do corpo por meio de uma cirurgia. Os autores</p><p>relatam que os casos mais comuns em que a amputação se faz necessária são: tumores, diabetes,</p><p>infecções e acidentes. Segundo Carvalho (2003 em Seren e De Tilio, 2014), a principal causa</p><p>da amputação de membros superiores são traumas e tumores, já para os membros inferiores são</p><p>doenças vasculares.</p><p>A literatura aponta que o processo de luto é uma das principais consequências da</p><p>amputação. Segundo Oliveira (2000), é comum que, quando, o indivíduo amputado, confronta</p><p>sua nova imagem corporal e suas limitações físicas, gere sentimentos de angústia e se utilize de</p><p>mecanismos de defesa do ego, como a negação, para lidar com sua nova situação. Além disso,</p><p>a pessoas que passaram por uma cirurgia de amputação podem apresentar isolamento social,</p><p>comportamentos agressivos, perda da autoestima e</p><p>impacto na identidade da pessoa (Oliveira</p><p>2000). Todos esses comportamento e sentimentos destacados por Oliveira podem fazer parte</p><p>de um processo de luto.</p><p>De acordo com Seren & De Tilio (2014) “o luto pela amputação deve ser compreendido</p><p>Recredenciamento</p><p>Portaria MEC 347, de 05.04.2012 - D.O.U. 10.04.2012.</p><p>Complexo de Ensino Superior de Cachoeirinha</p><p>Rua Silvério Manoel da Silva, 160 – Bairro Colinas – Cep.: 94940-243 | Cachoeirinha – RS | Tel/Fax. (51) 33961000 | e-mail: cesuca@cesuca.edu.br</p><p>como um processo dinâmico, e não como um estágio, dependente das condições individuais e</p><p>sociais dos amputados e envolvendo consequências psicológicas complexas” (p.64). O processo</p><p>de luto por amputação está interligado com a confrontação do sujeito com sua incapacidade</p><p>física. Esse confronto acarreta, muitas vezes, em variações afetivas, isolamento social, perda da</p><p>autonomia, entre outros (Oliveira 2000). Para Freud (1917/1996), o luto se caracteriza por “um</p><p>desânimo profundamente penoso, a cessão de interesse pelo mundo externo, a perda da</p><p>capacidade de amar e a inibição de toda e qualquer atividade” (p. 250).</p><p>Kovács (2008) assinala, que é essencial para o processo de elaboração do luto a</p><p>expressão dos diversos sentimentos que o indivíduo em luto está sentindo, porém a autora</p><p>problematiza a respeito da dificuldade que é para qualquer indivíduo relatar sobre os seus</p><p>sentimentos nos dias de hoje em que as pessoas são ensinadas, culturalmente, a não</p><p>demonstrarem e a controlarem suas emoções e seus sentimentos. O que pode agravar o processo</p><p>de luto gerando uma cronificação e, assim, um luto patológico. Além disso, Seren & De Tilio</p><p>(2014) afirmam que outro agravante para o processo de luto devido a amputação é que ele “não</p><p>é aceito socialmente como o luto pela morte de um ente querido” (p. 65). Dessa forma, justifica-</p><p>se a necessidade de oferecer tratamento psicoterápico a pessoas que tiveram alguma parte do</p><p>corpo amputada, com o intuito de auxiliar no processo de aceitação do novo eu.</p><p>Este trabalho tem como objetivo relatar sobre uma experiência vivida em um centro</p><p>especializado de reabilitação num processo psicoterápico breve com enfoque na psicanálise de</p><p>uma pessoa amputada que foi encaminhado para terapia devido a presença de um processo de</p><p>luto. Assim, o presente trabalho trata-se de um relato de experiência de cunho qualitativo,</p><p>exploratório e descritivo, que abordará o tema do luto e aspectos encontrados durante o processo</p><p>psicoterapêutico.</p><p>Fundamentação teórica</p><p>A cirurgia de amputação de membros do corpo é um procedimento, embora necessário</p><p>para resguardar a vida de uma pessoa, muito invasivo e que causa impactos em diversas áreas</p><p>da vida do indivíduo (Friggi, Quintana, Reis, e Farias, 2018; Seren e De Tilio, 2014). Segundo</p><p>Oliveira (2004), um indivíduo que teve um membro amputado, isto é, um portador de uma</p><p>incapacidade física, precisa reaprender a lidar com diferentes contextos de sua vida, como o</p><p>subjetivo, o social e o profissional. Esse sujeito quando confronta sua incapacidade física tem</p><p>a tendência de apresentar perda da autoestima, isolamento social e mudanças afetivas, como</p><p>sentimentos de raiva e tristeza, que podem estar ligadas a um processo de luto.</p><p>Recredenciamento</p><p>Portaria MEC 347, de 05.04.2012 - D.O.U. 10.04.2012.</p><p>Complexo de Ensino Superior de Cachoeirinha</p><p>Rua Silvério Manoel da Silva, 160 – Bairro Colinas – Cep.: 94940-243 | Cachoeirinha – RS | Tel/Fax. (51) 33961000 | e-mail: cesuca@cesuca.edu.br</p><p>Freud (1917/1996) afirma que “O luto, de modo geral, é a reação à perda de um ente</p><p>querido, à perda de alguma abstração que ocupou o lugar de um ente querido, como o país, a</p><p>liberdade ou o ideal de alguém” (p. 249). Embora Freud não tenha se debruçado</p><p>especificamente sobre o luto provindo da perda de um membro do corpo, veremos que quando</p><p>se amputa um membro há, analogamente, a perda de um ente querido, isto é, a perda de uma</p><p>imagem corporal, a perda de um Eu.</p><p>Tavares (2003) afirma que “a imagem corporal é a maneira pela qual nosso corpo</p><p>aparece para nós mesmos. É a representação mental do nosso próprio corpo” (p. 27, em Seren</p><p>e De Tilio, 2014, p. 69). Dessa forma, Seren & De Tilio (2014) afirmam que o corpo é</p><p>constituído por aspectos ambientais, sociais, fisiológicos e psicológicos e que “a imagem</p><p>corporal representa o nosso eu e envolve aspectos conscientes e inconscientes sobre a</p><p>identidade e as relações do eu com o mundo” (p. 69). Assim, a imagem corporal é formada</p><p>pelas vivências e percepções do sujeito sobre ele mesmo, o que a caracteriza como um</p><p>fenômeno singular e único (Seren e De Tilio, 2014).</p><p>Falkenbach (2009) defende que o corpo é uma ferramenta de troca, do sujeito, com o</p><p>mundo exterior, e a imagem corporal está ligada as potencialidades e limitações desse sujeito.</p><p>Diante disso, a autora defende que o corpo é sinônimo de identidade. Para Seren & De Tilio</p><p>(2014), “Quando ocorre uma amputação há a perda não só do membro, mas também da função</p><p>e da sensação relacionadas a ele” (p. 66). Goellner e Paiva (2008) afirmam que “a perda real de</p><p>um membro do corpo é também a morte simbólica de um projeto de vida e de transformação</p><p>na identidade do sujeito” (em Seren e De Tilio, 2014, p. 66).</p><p>Dessa forma, entende-se que o processo do luto não se restringe a morte de uma pessoa</p><p>física, podendo estar ligado a diversas situações de perda, assim como a de membros e partes</p><p>do corpo e, por essa razão, as formulações de Freud sobre o luto e também as formulações de</p><p>Kübler-Ross a respeito dos estágios do luto podem ser atribuídas ao processo de luto</p><p>consequente de uma amputação. Segundo Kübler-Ross (1991), o luto apresenta cinco estágios:</p><p>(a) negação e isolamento, referindo-se a recusa em aceitar a perda; (b) raiva, como sinais de</p><p>agressão a si ou ao meio externo; (c) barganha ou negociação, sendo uma tentativa de retardar</p><p>a morte através de uma negociação (geralmente de cunho religioso); (d) depressão, referindo-</p><p>se ao sentimento de tristeza devido à perda do objeto, em geral a depressão é o sinal de que o</p><p>indivíduo está a caminho da aceitação; e (e) aceitação, como aceitação e compreensão da perda</p><p>ou das limitações. Vale ressaltar que “a transição entre essas fases não se dá necessariamente</p><p>de maneira linear e progressiva, mas sim de maneira dinâmica, permitindo recuos e avanços</p><p>dependendo de cada indivíduo” (Gabarra, 2010 em Seren e De Tilio, 2014, p. 67).</p><p>Recredenciamento</p><p>Portaria MEC 347, de 05.04.2012 - D.O.U. 10.04.2012.</p><p>Complexo de Ensino Superior de Cachoeirinha</p><p>Rua Silvério Manoel da Silva, 160 – Bairro Colinas – Cep.: 94940-243 | Cachoeirinha – RS | Tel/Fax. (51) 33961000 | e-mail: cesuca@cesuca.edu.br</p><p>Por essa razão, não se pode quantificar ou estimar temporalmente a duração do processo</p><p>de luto, pois as respostas ao luto são singulares e individuais. Sendo assim, o luto é um processo</p><p>de natureza qualitativa que não pode ser mensurado, ele pode ser considerado normal ou</p><p>patológico a partir do comportamento do indivíduo frente ao objeto perdido. No luto normal a</p><p>pessoa sente-se triste, porém ela preserva o princípio de realidade que governa o ego, o que</p><p>permite o autodesenvolvimento, a superação; enquanto no luto patológico o sujeito atribui uma</p><p>dependência em relação a perda sofrida e não consegue deligar-se do objeto perdido (Freud,</p><p>1917/1996).</p><p>De acordo com Seren & De Tilio (2014), as pessoas submetidas a amputação apresentam</p><p>sentimentos de temor perante a incapacidade física, o receio a nova imagem corporal e o medo</p><p>da não compreensão dos outros. Para os autores o sucesso e o insucesso em lidar com a perda</p><p>de um membro do corpo dependem de aspectos únicos e subjetivos que variam de pessoa para</p><p>pessoa, pois a amputação, além de apresentar fatores fisiológicas, apresenta fortes questões</p><p>psicológicas (Seren e De Tilio, 2014).</p><p>Dessa forma, a abordagem psicanalítica</p><p>leva em consideração que “a problemática da</p><p>cirurgia de amputação de membros é perpassada pela questão da construção subjetiva do corpo</p><p>e do quanto um procedimento invasivo como esse pode influenciar diretamente nesse aspecto”</p><p>(Friggi, Quintana, Reis, e Farias, 2018, p. 1).</p><p>Desse modo, o corpo é reconhecido como subjetivo do sujeito, representando</p><p>diferentemente do corpo estético ou biológico (Friggi, Quintana, Reis, e Farias, 2018). Sendo</p><p>um corpo que não é caracterizado apenas pelo conceito de organismo e que perpassa funções</p><p>somáticas, ele é “um todo em funcionamento perpassado pela história de cada sujeito” (Friggi,</p><p>Quintana, Reis, e Farias, 2018, p.2).</p><p>Dolto (1984) indica que a imagem corporal está diretamente relacionada à história</p><p>de cada um, ou seja, é particular e específica de um tipo de relação libidinal. A autora</p><p>também elucida que a imagem corporal é a memória inconsciente da relação com o outro</p><p>e uma síntese das experiências de caráter emocional vivenciadas pelo sujeito desde bebê</p><p>(em Friggi, Quintana, Reis, e Farias, 2018, p. 2).</p><p>Assim, entende-se que o corpo é subjetivamente construído, caracterizando-se como</p><p>sistema em funcionamento, transcendendo as questões fisiológicas. “De acordo com a teoria</p><p>Freudiana, o corpo é construído por percepções, investimentos libidinais, representações,</p><p>pulsões e fantasias” (Nasio, 2008, em Friggi, Quintana, Reis, e Farias, 2018, p. 4). Dessa forma,</p><p>para a psicanálise o corpo não se delimita ao conceito de organismo, porque é constituído pela</p><p>história de cada sujeito a partir de seus significantes e significados e também é construído na</p><p>Recredenciamento</p><p>Portaria MEC 347, de 05.04.2012 - D.O.U. 10.04.2012.</p><p>Complexo de Ensino Superior de Cachoeirinha</p><p>Rua Silvério Manoel da Silva, 160 – Bairro Colinas – Cep.: 94940-243 | Cachoeirinha – RS | Tel/Fax. (51) 33961000 | e-mail: cesuca@cesuca.edu.br</p><p>relação entre o psíquico e o somático (Friggi, Quintana, Reis, e Farias, 2018).</p><p>Por essa razão, a cirurgia de amputação de partes ou de membros do corpo é entendida</p><p>como um procedimento invasivo que estremece o corpo subjetivo, e não apenas uma</p><p>intervenção fisiológica que retira um membro do corpo (Friggi, Quintana, Reis, e Farias, 2018).</p><p>Diante disso, a amputação acarreta não somente em uma instabilidade emocional, mas também</p><p>em uma ameaça de morte. Compreende-se, assim, que a cirurgia de amputação tem um caráter</p><p>traumático, “provocando uma ruptura nos alicerces simbólicos constitutivos de cada um e</p><p>repercutindo diretamente na imagem corporal e em seu narcisismo” (Friggi, Quintana, Reis, e</p><p>Farias, 2018, p. 4).</p><p>Para Oliveira (2004) a nova realidade perante a perda de um membro por amputação</p><p>pode ser conflituosa e desintegradora para o sujeito, de modo que, para lidar com esses</p><p>conflitos, o indivíduo utilize de mecanismos de defesa do ego, como a projeção, a regressão, a</p><p>negação, a formação reativa, etc. Uma das possíveis consequências da tentativa de readaptação</p><p>da mente à ausência de uma parte do corpo é sensação do membro fantasma, que é a relação</p><p>entre o que é percebido no psiquismo e o que se vê e sente no corpo. Em outras palavras, há a</p><p>sensação corporal devido a existência de uma representação do membro perdido no encéfalo</p><p>(Seren e De Tilio, 2014).</p><p>De acordo com Oliveira (2000), a aceitação da perda de um membro por amputação</p><p>ocorrerá com o passar do tempo. Tal aceitação torna-se mais visível quando o indivíduo começa</p><p>o trabalho de reabilitação, pois o confronto com sua nova imagem corporal se torna necessário</p><p>para a realização de diversas atividades de cunho reabilitativo. Dessa forma, mostra-se</p><p>imprescindível a readaptação corporal a partir do trabalho de luto pelo membro amputado e</p><p>pelo corpo subjetivo (Friggi, Quintana, Reis, e Farias, 2018).</p><p>Para Seren & De Tilio, 2014 “Um indivíduo em processo de luto, com o tempo,</p><p>consegue elaborar a perda e tem a consciência da limitação, passando a organizar um novo</p><p>projeto de vida” (p. 68) Sendo que a capacidade do sujeito em investir em si próprio, aceitar a</p><p>mudança no projeto de vida original e adaptar-se às novas limitações são elementos essenciais</p><p>no processo de reabilitação (Seren e De Tilio, 2014). No caso da elaboração do luto por</p><p>amputação, existem as próteses que podem ajudar na reelaboração do projeto de vida, pois</p><p>trazem uma nova esperança para os indivíduos amputados por funcionarem como substitutos</p><p>do membro perdido e auxiliarem na adaptação de suas limitações, além de prometerem a</p><p>reintegração da imagem corporal (Seren e De Tilio, 2014).</p><p>Perante esse conteúdo exposto, o presente trabalho tem como objetivo, através de um</p><p>relato de experiência, relatar como um indivíduo que sofrera uma amputação lida com a perda</p><p>Recredenciamento</p><p>Portaria MEC 347, de 05.04.2012 - D.O.U. 10.04.2012.</p><p>Complexo de Ensino Superior de Cachoeirinha</p><p>Rua Silvério Manoel da Silva, 160 – Bairro Colinas – Cep.: 94940-243 | Cachoeirinha – RS | Tel/Fax. (51) 33961000 | e-mail: cesuca@cesuca.edu.br</p><p>e como ele vivencia o processo de luto.</p><p>Metodologia</p><p>Delineamento – Foi realizado um relato de experiência exploratório descritivo, a partir de uma</p><p>abordagem qualitativa. Esta demostrou-se ser mais apropriada ao trabalho, porque, segundo</p><p>Godoy (1995), é um tipo de abordagem que visa o entendimento e a interpretação dos</p><p>significados e dos significantes atribuídos a um fenômeno.</p><p>Com relação ao caráter exploratório e descritivo, Gil (2002) relata que é uma ferramenta</p><p>que se configura quanto ao objetivo do estudo, que se concentra em conhecer melhor o objeto</p><p>a ser estudado. O estudo descritivo focaliza na descrição de determinadas características do</p><p>objeto a ser estudado.</p><p>Participantes – O estudo foi constituído por trechos e informações de uma psicoterapia</p><p>individual de um paciente do sexo masculino com idade de 59 anos amputado da perna esquerda</p><p>devido a diabetes, atendido numa APAE da região metropolitana de Porto Alegre. Foi atribuído</p><p>um pseudônimo para o paciente afim de preservar o sigilo e sua identidade.</p><p>Instrumentos – Atendimento psicoterápico breve individual com base na psicanálise.</p><p>Procedimentos – O contato com os paciente deu-se através dos atendimentos, que ocorreram</p><p>entre setembro e novembro de 2018. Foram realizados sete atendimentos, sendo que o paciente</p><p>ainda encontra-se em processo psicoterápico. Os encontros ocorreram semanalmente com</p><p>duração média de 45 minutos.</p><p>Apresentação e discussão do caso</p><p>Felipe é um homem aposentado de 59 anos que teve parte da perna esquerda amputada</p><p>(logo abaixo do joelho) em decorrência da Diabetes. O mesmo é divorciado, mora com a mãe,</p><p>tem dois filhos, sendo que um destes mora na casa ao lado da sua com o neto de Felipe. Faz</p><p>dois anos que Felipe fez a cirurgia de remoção da perna esquerda. Iniciou o tratamento</p><p>psicoterápico através da indicação do serviço de reabilitação física, onde fazia o molde para a</p><p>sua futura prótese.</p><p>Felipe começou o atendimento psicoterápico em setembro e demonstrou certa</p><p>resistência ao iniciar a terapia, falando pouquíssimo sobre sua demanda de análise durante o</p><p>encontro. Quando ele fora indagado pelo motivo que o trouxera a fazer terapia, este ficou quieto</p><p>e falara “por causa disso, (apontando para o coto da perna esquerda, seguido de choro)”. Após</p><p>o acolhimento e a validação de seus sentimento, perguntou-se a ele sobre o que mais ele gostaria</p><p>de falar a respeito deste assunto, e o paciente disse “não quero mais falar sobre isso”.</p><p>Recredenciamento</p><p>Portaria MEC 347, de 05.04.2012 - D.O.U. 10.04.2012.</p><p>Complexo de Ensino Superior de Cachoeirinha</p><p>Rua Silvério Manoel da Silva, 160 – Bairro Colinas – Cep.: 94940-243 | Cachoeirinha – RS | Tel/Fax. (51) 33961000 | e-mail: cesuca@cesuca.edu.br</p><p>Entende-se que Felipe ficara com sua ferida narcísica bastante exposta nesse momento,</p><p>porém o próprio paciente consegue tratar de seu machucado</p><p>contando sobre como conseguira</p><p>parar de fumar. É interessante perceber que o fato de Felipe reconhecer em si mesmo conquistas</p><p>de cunho fálico (relacionadas ao seu empoderamento enquanto sujeito) fizeram com que ele</p><p>conseguisse, de certa forma, lidar com suas questões narcísicas de imagem do corporal (Friggi,</p><p>Quintana, Reis, e Farias, 2018). Ainda no primeiro encontro, o paciente também trouxe como</p><p>empoderamento o orgulho que tem de seu sobrenome relatando que conhece diversos graus de</p><p>parentesco e que todos eles são ótimas pessoas. Essa estratégia de revisitar conquistas fálicas</p><p>para suprimir as limitações de seu corpo subjetivo, é utilizada por Felipe em diversos momentos</p><p>durante seu tratamento psicoterápico, como veremos mais adiante, normalmente após o</p><p>paciente tratar de algum assunto que lhe abale.</p><p>No segundo encontro, Felipe contou um pouco de sua história profissional. Relatou que</p><p>trabalhou em 4 empresas, variando entre serviços com madeira fazendo móveis e moldes para</p><p>o corte de quebra-cabeças, sendo este o trabalho que mais gostou. Ao falar desse seu trabalho</p><p>em específico Felipe disse que gostava de criar os quebra-cabeças difíceis, porque gostava do</p><p>desafio, pois depois que se construía os moldes, quem o fez, tinha que testar e montar o quebra-</p><p>cabeça. Dessa forma, foi indagado a ele, com a intenção de saber sobre sua perspectiva de</p><p>futuro, se o mesmo iria gostar do desafio de voltar a trabalhar. Felipe disse que não tinha</p><p>interesse em voltar a trabalhar, que estava planejado trabalhar em casa fazendo alguns</p><p>artesanatos e construindo alguns móveis. Felipe apontou que dessa forma ele poderia ser seu</p><p>próprio chefe e, assim, decidir quando trabalhar e quando descansar, e que como ele é</p><p>aposentado por tempo de contribuição ele não estava preocupado em voltar a trabalhar</p><p>formalmente, ele apresentava mais uma preocupação de não ficar parado visto que sempre fora</p><p>um homem muito ativo. A literatura aponta para a importância de haver um perspectiva de</p><p>futuro para a reabilitação nos casos de luto por amputação, pois se torna necessário a criação</p><p>de um novo projeto de vida que se adapte às novas limitações (Seren e De Tilio, 2014), o que</p><p>Felipe demonstra ter.</p><p>No final do segundo encontro Felipe começou a contar a história de como sua perna fora</p><p>amputada, terminando de conta-la no terceiro encontro. Felipe contou que realizara diversos</p><p>procedimentos de raspagem e amputação em diferentes partes do corpo. Sua primeira cirurgia</p><p>devido a complicações da diabetes fora a raspagem de toda a nádega esquerda e parte da nádega</p><p>direita. Segundo Felipe essa raspagem fez com que alguns médicos não dessem importância</p><p>para seus primeiros sinais de dor no pé esquerdo, pois os especialistas diziam que era uma</p><p>consequência da cirurgia anterior. Apenas depois que apareceu uma mancha em seu pé é que</p><p>Recredenciamento</p><p>Portaria MEC 347, de 05.04.2012 - D.O.U. 10.04.2012.</p><p>Complexo de Ensino Superior de Cachoeirinha</p><p>Rua Silvério Manoel da Silva, 160 – Bairro Colinas – Cep.: 94940-243 | Cachoeirinha – RS | Tel/Fax. (51) 33961000 | e-mail: cesuca@cesuca.edu.br</p><p>começaram a trata-lo através de medicamentos. Como a mancha aumentou de tamanho, os</p><p>médicos resolveram fazer uma raspagem, porém esta não fora o suficiente para conter a</p><p>deterioração de sua perna o que acarretou na amputação do pé. Porém, após a cirurgia, ainda</p><p>havia sinais de putrefação, então seu médico lhe dera duas opções (1) a de tentar tratar com</p><p>remédios, explicando que se Felipe optasse por esse caminho era provável de que em 6 meses</p><p>ele retornasse e de que assim ele teria de retirara toda a perna, desde a virilha; ou (2) a de retirar</p><p>mais um pouco da perna. Felipe relatou que quem o ajudou a fazer a escolha fora seu colega de</p><p>quarto do hospital que havia amputado as duas pernas. Esse colega indicou para Felipe realizar</p><p>a cirurgia, pois quando deram essa opção para ele, ele decidira esperar e acabou se</p><p>arrependendo, porque se tivesse feito a cirurgia teria uma maior parte da perna o que</p><p>possibilitaria a utilização de uma prótese. Assim, Felipe optou por fazer a cirurgia. De acordo</p><p>com os relatos do paciente, essa segunda cirurgia fora realizada por um médico “jovem e</p><p>inexperiente” [sic] que fizera um corte “reto” em sua perna invés de corta-la de modo que</p><p>pudesse colocar uma prótese, o que fez com que Felipe tivesse que passar por uma terceira</p><p>cirurgia, cuja, segundo ele, fizera com que ele amputasse mais do que precisava. Assim, Felipe</p><p>atribui uma culpa perante o tamanho do restante da sua perna a esse médico intitulado como</p><p>inexperiente por ele. Ao terminar de contar sua história Felipe falou que sabe que é o culpado</p><p>de tudo o que acontecera, dizendo que ele estava focado em conseguir se aposentar o que</p><p>acarretou em uma demora, de sua parte, para investigar as dores que estava sentindo.</p><p>Embora Felipe atribua a si a culpabilidade da amputação de sua perna, o que pode</p><p>indicar uma aceitação de sua perda da qual está enlutado, ele utiliza, algumas vezes, assim como</p><p>Oliveira (2004; 2000) relata, de alguns mecanismos de defesa do ego, como a projeção. Quando</p><p>ele atribui a culpa de ter amputado mais do que devia ao médico do qual ele intitulou jovem e</p><p>inexperiente, porém ele afirma em sua história, que fora ele quem decidira cuidar da sua saúde</p><p>apenas depois que conseguisse se aposentar. Para Silva (2011) na projeção o sujeito atribui a</p><p>pessoas ou objetos externos semblantes psíquicos que lhe pertencem, mas que não os reconhece</p><p>como seus. A autora afirma que o mecanismo de negação é anterior ao de projeção, e que,</p><p>assim, a projeção “é uma forma de deslocamento que se dirige para fora e atribui a outras</p><p>pessoas seus traços de caráter, atitudes, motivos e desejos contra os quais existem objeções e</p><p>que se quer negar” (p. 4).</p><p>Outro exemplo teórico prático que vemos aqui é o de que as fases do luto de Kübler-</p><p>Ross (1991) não são estáticas e podem variar, assim como Felipe muda da aceitação para raiva</p><p>no decorrer de seu luto. Não podemos deixar de levar em conta o peso que o aporte social tem</p><p>nesse contexto. Uma vez que Felipe fizera a sua escolha devido a influência de seu colega de</p><p>Recredenciamento</p><p>Portaria MEC 347, de 05.04.2012 - D.O.U. 10.04.2012.</p><p>Complexo de Ensino Superior de Cachoeirinha</p><p>Rua Silvério Manoel da Silva, 160 – Bairro Colinas – Cep.: 94940-243 | Cachoeirinha – RS | Tel/Fax. (51) 33961000 | e-mail: cesuca@cesuca.edu.br</p><p>quarto, do qual compartilha da situação de Felipe.</p><p>No quarto atendimento, o paciente falou da diabetes, que está controlada, e que ele segue</p><p>a dieta como deve ser e que só durante a internação no hospital o nível de glicose dele ficara</p><p>alto, o que os médicos e enfermeiros atribuíram ao estresse. Quando questionado se ele sentia</p><p>muitas dores, ele disse que não, que quando sente dores ele consegue identificar que são dores</p><p>nas “juntas”, de cansaço, mas não referentes a amputação. Felipe também trouxe informações</p><p>sobre sua família e seus amigos que estão bastante presente em sua vida e estão sempre lhe</p><p>visitando. Relatou que seu neto passa bastante parte do tempo com ele e que eles brincam juntos.</p><p>De acordo com Seren & De Tilio (2014) “Amputação de membro físico envolve consequências</p><p>físicas, psicológicas e sociais que podem ser melhor enfrentadas pelos enlutados se tiverem o</p><p>apoio de familiares e cuidadores” (p. 76).</p><p>O paciente também contou que o seu avô por parte de pai teve a mesma perna amputada,</p><p>mas que o avô não conseguira lidar com a amputação e passou o resto de sua vida reclamando.</p><p>Felipe relatou que o avô dizia que não precisava ter amputado a perna, que isso ocorrera apenas</p><p>porque os médicos não sabiam mais o que fazer. Felipe também relatou que o marido de sua</p><p>prima teve o mesmo problema que o seu na perna esquerda, mas que esse rapaz fora tratado em</p><p>um lugar de referência e que conseguira salvar sua perna, apenas fazendo raspagens.</p><p>Porém</p><p>Felipe acha que esse sujeito está com muita dor, devido a raspagem ter deixado sua perna apenas</p><p>com “pele e osso”. Entende-se aqui, que Felipe utiliza da repressão de seus instintos agressivos</p><p>perante sua amputação, com a finalidade de evitar o desprazer, consequente da tomada de</p><p>consciência de sua fantasia de que talvez ele não precisasse amputar a sua perna, assim como</p><p>seu avô e o marido da prima (Freud, 1915/1996).</p><p>Após esses relatos que movimentaram seu instinto agressivo com relação à sua</p><p>amputação, Felipe resgatou outras conquistas fálicas, relembrando orgulhosamente de um</p><p>tempo em que ele jogava no time da empresa e que era um bom goleiro. Ele contou que chegou</p><p>a ganhar 3 prêmios em um único campeonato: 1º lugar, goleiro menos vazado e um prêmio de</p><p>disciplina por menos reclamações.</p><p>No quinto atendimento, Felipe falou que fica muito tempo em casa, e que depende de</p><p>outras pessoas para ir a algum lugar, porque ele cansa muito andando de muleta, o que o faz</p><p>optar pela cadeira de rodas. Dessa maneira, questionou-se Felipe quanto ao seu plano de fazer</p><p>artesanatos e ele disse que ainda quer faze-los, só não os faz, porque tem medo de mexer com</p><p>as ferramentas de corte, como a serra circular, que, segundo ele, já são perigosas de se manusear</p><p>tendo as duas pernas. O paciente relata ao final, que pretende colocar esse plano em prática</p><p>quando estiver com a prótese. Percebe-se que Felipe deposita uma esperança na promessa de</p><p>Recredenciamento</p><p>Portaria MEC 347, de 05.04.2012 - D.O.U. 10.04.2012.</p><p>Complexo de Ensino Superior de Cachoeirinha</p><p>Rua Silvério Manoel da Silva, 160 – Bairro Colinas – Cep.: 94940-243 | Cachoeirinha – RS | Tel/Fax. (51) 33961000 | e-mail: cesuca@cesuca.edu.br</p><p>que a prótese o subsidiará em suas tarefas do cotidiano. Para Seren & De Tilio (2014) as</p><p>próteses auxiliam na adaptação de suas limitações físicas e podem contribuir para reinvenção</p><p>de um novo projeto de vida, o que coincidis com que Felipe espera da chegada da prótese.</p><p>Durante o sexto atendimento, Felipe demonstrou certa angustia pela demora da chegada</p><p>da prótese, o que gerou nele uma ansiedade, em que ele chegou contar os dias que já esperou</p><p>pela perna mecânica, no dia em questão faziam 90 dias. O paciente então falou da possibilidade</p><p>de ele fazer uma perna de pau, mas relatou ficar com medo de se machucar e causar algo de</p><p>ruim a ele. Após os relatos de Felipe, trabalhou-se nessa sessão a questão do tempo ocioso que</p><p>ele tem, e que refere lhe fazer mal. Dessa forma, o paciente contou que alguns amigos sugeriram</p><p>que ele trabalhasse como Uber usando um carro automático para não ficar só em casa.</p><p>No sétimo encontro, Felipe disse que recebera a notícia de que sua prótese havia chego</p><p>e de que na próxima semana ele faria a primeira prova. Como Felipe estava demonstrando uma</p><p>grande excitação perante a prova da prótese, discutiu-se sobre a dificuldade, ou não, de se</p><p>adaptar a uma prótese. Assim, ele fez referência a sua dificuldade em utilizar sua primeira</p><p>muleta, que ele achava que iria cair a qualquer momento, mas que no final ele conseguiu se</p><p>adaptar. Por fim, Felipe contou que, quando ele era pequeno, ele e seu amigo faziam pernas de</p><p>pau “tipo as de circo” para brincar. E relatou que uma das brincadeiras era atravessar o rio com</p><p>elas, porém uma das vezes que eles estavam brincando eles perderam as pernas no meio do rio</p><p>e tiveram de aprender a nadar naquele momento. Novamente Felipe elucida sobre suas</p><p>conquistas de cunho fálico a fim de reconstruir sua imagem narcísica. Entende-se que o</p><p>paciente, com a ajuda da promessa de uma prótese e assim da reintegração de sua imagem</p><p>corporal, realiza o desligamento da libido de sua perna amputada. Freud (1917/1996) aponta</p><p>para a importância desse processo para a conclusão do processo de luto, tornando o ego livre</p><p>para se ligar a outro objeto de amor.</p><p>Considerações finais</p><p>O estágio curricular está sendo de grande aprendizado, proporcionando conhecimento</p><p>nas diversas áreas que abrange a psicologia da reabilitação. É um privilégio estagiar em um</p><p>local que permite uma ampla gama de experiências com diferentes públicos na área da</p><p>psicologia. Além disso, o trabalho em equipe interdisciplinar enriquece a formação do aluno.</p><p>Esse trabalho de relato de experiência proporcionou e fortaleceu a relação da teoria com a</p><p>prática.</p><p>Sobre o atendimento psicológico de pessoas que tiveram uma parte do corpo amputado,</p><p>percebe-se a complexidade que a retirada de um membro do corpo pode gerar. A perda devido</p><p>Recredenciamento</p><p>Portaria MEC 347, de 05.04.2012 - D.O.U. 10.04.2012.</p><p>Complexo de Ensino Superior de Cachoeirinha</p><p>Rua Silvério Manoel da Silva, 160 – Bairro Colinas – Cep.: 94940-243 | Cachoeirinha – RS | Tel/Fax. (51) 33961000 | e-mail: cesuca@cesuca.edu.br</p><p>a amputação está ligada a perda da imagem corporal, a perda do corpo subjetivo e a perda do</p><p>eu, contribuindo para um difícil processo de luto.</p><p>Com relação ao caso de Felipe, entende-se que existiram uma série de fatores protetivos</p><p>para que ele conseguisse lidar com as consequências e os empecilhos provindos da cirurgia de</p><p>amputação. O fato dele já ser aposentado por tempo de contribuição e não por invalides pode</p><p>tê-lo ajudado a não dificultar seu processo de luto, visto que a perda da perna não abalou sua</p><p>questão financeira e seu papel social de trabalhador.</p><p>Outras questões que parecem ter auxiliado Felipe a passar pelo processo de luto fora a</p><p>manutenção de sua imagem narcísica a partir de lembranças de conquistas fálicas que</p><p>suprimiram de certa forma a cicatriz que a retirada da perna causou em seu corpo subjetivo.</p><p>Sempre que ele se deparava com algo ruim que o remetia a perda de sua imagem corporal,</p><p>Felipe lembrava de suas conquistas, numa tentativa de enaltecer seu Eu. Podemos, também,</p><p>considerar que a convivência com outras pessoas que tiveram algum de seus membros</p><p>amputados contribuíram para uma recuperação de sua cirurgia e de seu estado. Além disso, o</p><p>fato de ter tido um avô que passou pelo mesmo procedimento pode ter contribuído com uma</p><p>identificação do momento de vida que ele estava passando, servindo como um modelo para</p><p>Felipe.</p><p>E por último o sucesso que Felipe teve em deslocar sua libido para a futura prótese pode</p><p>ter-lhe auxiliado no processo de aceitação do luto ajudando-o a criar planos futuros e assim,</p><p>contribuindo para a criação de uma perspectiva de vida. Também, não podemos deixar de</p><p>considerar que outro fator que possa ter influenciado na aceitação da perda do membro fora o</p><p>tempo, visto que já se passara 2 anos desde que Felipe fez a cirurgia de amputação da perna.</p><p>Por fim, considera-se importante que Felipe continue em atendimento psicoterápico</p><p>visto que o mesmo ainda tem questões a serem trabalhadas com relação a chegada da prótese,</p><p>como trabalhar as possíveis frustrações e ajudar nas futuras conquistas, além de que a chegada</p><p>da perna mecânica possa vir a relembrar, negativamente, a perna que fora perdida. Também</p><p>pensa-se que o paciente deva seguir em tratamento para trabalhar o seus aspectos psíquicos e</p><p>emocionais provindos de sua limitação física.</p><p>Referências</p><p>Braier, E. A. (2008) Psicoterapia Breve de Orientação Psicanalítica. São Paulo: Editora WMF</p><p>Martins Fontes.</p><p>Falkenbach, L. A. A. P. (2009). Imagem corporal em indivíduos amputados. Revista Digital,</p><p>Recredenciamento</p><p>Portaria MEC 347, de 05.04.2012 - D.O.U. 10.04.2012.</p><p>Complexo de Ensino Superior de Cachoeirinha</p><p>Rua Silvério Manoel da Silva, 160 – Bairro Colinas – Cep.: 94940-243 | Cachoeirinha – RS | Tel/Fax. (51) 33961000 | e-mail: cesuca@cesuca.edu.br</p><p>14(131). Recuperado de http://www.efdeportes.com/efd131/imagem-corporal-em</p><p>individuos-amputados.htm, acessado em 20/11/2018</p><p>Friggi, P.F., Quintana, A.M., Reis, C.G.C. & Farias, C.P. (2018). A reconstrução dos contornos</p><p>do eu: um olhar psicanalítico sobre a amputação. Psicol. Pesqui. Juiz</p><p>de Fora 12(1)1-10</p><p>Freud, S. (1996). Luto e melancolia. In: S. Freud, Edição Standard das Obras Completas de</p><p>Sigmund Freud (J.Salomão, trad., Vol. 14). Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original</p><p>publicado em 1917 [1915])</p><p>Freud, S. (1996). Repressão. In: S. Freud, Edição Standard das Obras Completas de Sigmund</p><p>Freud (J. Salomão, trad., Vol. 14). Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado</p><p>em 1915)</p><p>Gil, A. C. (2002). Como elaborar projetos de pesquisa. (4 ed.) São Paulo: Atlas</p><p>Godoy, A. S. (1995). Introdução à pesquisas qualitativas e suas possibilidades. Revista de</p><p>Administração de Empresas, 35(2), 57-63.</p><p>Kovács, M. J. (2008). Desenvolvimento da Tanatologia: Estudos sobre a morte e o morrer.</p><p>Paidéia (Ribeirão Preto), 18(41), 457-468.</p><p>Kübler-Ross, E. (1991). Sobre a morte e o morrer (P. Menezes, Trad.). São Paulo: Editora</p><p>WMF Martins Fontes.</p><p>Oliveira, R. A. (2000). Elementos psicoterapêuticos na reabilitação dos sujeitos com</p><p>incapacidades físicas adquiridas. Análise Psicológica, 4(18), 437-453</p><p>Oliveira, R. A. (2004). O sujeito e o corpo perante a incapacidade física. Revista Portuguesa de</p><p>Psicossomática, 6(1), 63-67</p><p>Seren, R. & De Tilio, R. (2014). As vivências do luto e seus estágios em pessoas amputadas.</p><p>Revista da SPAGESP, 15(1), 64-78</p><p>Silva, E. B. T. (2011). Mecanismos de defesa do Ego. [Trabalho de conclusão de Curso]. Ver</p><p>Psicologia. PT, 3, 1-5.</p>