Prévia do material em texto
RELIGIÕES TRIBAIS AULA 6 Prof. Itamar Marques da Silva RELIGIÕES TRIBAIS: TRADIÇÕES LOCAIS E ESTRANGEIRAS CONVERSA INICIAL Caríssimo(a) discente, seja bem-vindo(a) ao nosso sexto e último tema das religiões indianas. A Índia é como uma grande esponja que mantém as primeiras águas, mas consegue absorver sempre mais sem perder as primeiras águas. Na nossa primeira aula, destacamos a capacidade cultural de manter a essência e ainda aderir outros elementos. Sem dúvidas essa pluralidade faz da Índia um caldeirão cultural e religioso. “Considerada o caldeirão das religiões, a Índia apresenta uma notável presença de tradição religiosa estrangeiras, que, ao longo dos séculos, entraram na região, assim como também se destacam as tradições tribais, que eram anteriores ao hinduísmo e ao budismo.” (ANDRADE, 2020, p. 134) Nesta aula, trataremos de dois tipos de religião na Índia. Como você já deve ter percebido, o pluralismo, que falávamos na primeira aula, é uma realidade muito forte na Índia. Diante de múltiplas faces, olhares e pensamentos, o sentido do divino também é plural, de modo que pequenos grupos mantenham espiritualidades muito antigas e outros não se encaixem com nada do local, percebendo nas religiões estrangeiras o sentido do divino. Portanto, queremos trazer essas duas peculiaridades que não se encaixam nos milhões de deuses hindus, nem no único Deus da religião Sikhs, e nem na inexistência de deus dos Jains. Abordaremos nessa aula as tradições tribais e também algumas religiões estrangeiras que, atravessaram os montes e chegaram no vale sagrado, encontrando na Índia um espaço de acolhida diante da pluralidade. Você lembra da nossa primeira aula, quando descobrimos, entre as mais variadas curiosidades sobre a Índia, que a tribo mais isolada do mundo, os sentinelenses, pertence a Índia. Pois é. Já se perguntou qual é a percepção do divino para eles? Infelizmente essa resposta não será possível, pois nem os indianos conseguem estabelecer um contato com eles. Mas isso é só para ilustrarmos e dizermos que além deles existem muitos povos tribais pela Índia. Diferente dos sentinelenses, existem outras tribos que possuem relações para além dos integrantes de modo que possamos entender as suas percepções do divino e estrutura religiosa. Quer entender sobre elas? Nessa aula abordaremos esse assunto. Andrade (2020) destaca que antes dos arianos chegarem ao subcontinente indiano, existiam as tradições primitivas, com suas cosmovisões mais frágeis, voltadas mais para o mundo agrícola. Ainda existem essas tradições em alguns locais, vivendo e desenvolvendo suas atividades religiosas. Uma boa parte dessas tribos aderiu às grandes tradições estrangeiras, como judaísmo, islamismo e cristianismo. Isso se deu devido, ao que já mencionamos em aulas passadas, as rotas comerciais e os domínios que a Índia viveu. Algumas regiões da Índia possuem características religiosas bem peculiares, o caso da Caxemira, que hoje vive em conflito, é um exemplo de como a religião estrangeira ocuparam espaços significativos. A região da Caxemira pertencente a Índia possui uma população majoritariamente mulçumana. Quer entender como isso aconteceu? Iremos explicar nessa aula. Certamente, você já tinha visto nas aulas passadas sobre o império Mongol e a influência mulçumana que deixou essa herança na Índia. Mas em relação ao cristianismo não demos tantas pistas. Talvez você esteja pensando nas navegações. De certa forma você está certo, mas há evidências que o cristianismo chegou bem antes. Quer saber como? Nessa aula você descobrirá. Ao longo dessa aula, queremos analisar as formas com que essas tradições encontram seu lugar. Desejamos-lhe uma ótima viajem nesse universo da pluralidade religiosa na Índia. Vamos lá? TEMA 1 – Religiões tribais da Índia central. Caro(a) discente, como mencionamos no tópico anterior, alguns povos tribais receberam fortes influências externas de modo que adaptaram ou mudaram completamente de religião. Outras tribos, principalmente as mais isoladas, se mantiveram intactas em seu modelo religioso. Andrade constata esse fato dizendo que: “Algumas tribos que permaneceram isoladas em regiões remotas conseguiram preservar crenças e práticas sem receber influência de religiões estrangeiras, ao passo que tribos localizadas nas regiões planas tiveram dificuldades em preservar as próprias tradições” (ANDRADE, 2020, p.135). Existem centenas de tribos na Índia, espalhadas em diversos cantos, mas, na atualidade, a concentração se dá na parte central e nordeste da Índia. Na parte central, encontramos duas tribos significantes: Gond e Bhil. Essas duas tribos carregam a característica do “deus do vale1”, a adoração aos elementos da natureza são características da presença do divino em tudo. De acordo com Andrade (2020), a tribo Gond tem a veneração à Terra- mãe e outras divindades da montanha do rio, dos lagos e espíritos ancestrais. A terra-mãe é responsável por trazer a fecundidade e desenvolver a vida. A tribo Gond preserva suas mais antigas tradições de adoração à natureza. O nome da religião nativa da tribo é Koyapunem, que foi fundada por Pari Kupar. Houve uma tentativa de aproximação com o hinduísmo, mas: “Os 'Gonds' não foram anexados ao hinduísmo, pelos hindus, pois eram diferentes dos povos hindus e dos intocáveis. O hinduísmo não os considerava intocáveis; nem tinham sido marginalizados em qualquer outra religião. No entanto, o pano de fundo do hinduísmo pode ter existido no início da vida religiosa dos 'Gonds'. Os ‘Gonds’ são principalmente animistas. O animismo está centrado na 1 Termo utilizado pelo Dr. Joachim Andrade para definir as percepções do divino a partir do contexto geográfico. crença de que entidades não humanas possuem algum tipo de princípio vital” (KORETI, 2015, p.87, tradução nossa). A tradição tribal Gond, possuem alguns deuses, mas como Andrade (2020) menciona, eles não possuem uma ordem hierárquica. São eles: Mata Kali Kankali que, de acordo com Patankar (2016),é a mãe ancestral dos antepassados da tribo. Ela está associada a Mahakali. Outro deus dos povos tribais Gond é Dulha-Pen, que de acordo com Koreti (2015), é o deus do noivo, sendo representado em uma pedra a imagem de um homem montado em um cavalo ou um machado de batalha. Existem alguns deuses que são incorporados a religião, como menciona Andrade (2020) a deusa Yama, como a deusa que provê na natureza as condições de subsistência. Koreti (2015) lembra que o deus Bhivsen ou Bhimal, é reconhecido como deus da força e da terra. Ele é associado aos elementos da natureza como as rochas, montanhas e rios. Além disso, existem colinas e rochas que são considerados locais de morada do deus Bhivsen. Além desses deuses mencionados, Koreti (2015) menciona: Nat Awal ou Dharti Mata, a deusa da fertilidade. Bhum, a terra e a mãe da humanidade. Nat Auwal, a deusa mãe da aldeia. Ela é invocada quando a aldeia participa de uma cerimônia, de rituais sazonais a orações contra desastres. Thakur Deo, o guardião masculino da aldeia. Hulera-Pen, a protetora do gado. Maitya-Pen, o demônio dos redemoinhos. Narayan-Pen, o deus do sol. Kodapen, o deus cavalo. Maswasi Pen, o deus da caça. Kanya, os espíritos da água. Existem poucos ritos na religião da tribo Gond, no entanto, como afirma Andrade (2020), os deuses são venerados constantemente. Koreti (2015) afirma que nos rituais, três pessoas são importantes, o baiga, (sacerdote da aldeia), o bhumka (sacerdote do clã) e o kaser-gaita (líder da aldeia). “Durante os festivais, sacerdotes vestem-se com penas de pavão e máscara para interpretar dramas sobre figuras míticas e, em seguida, entram em transe, atuando como oráculos e médiuns, para que os deuses possam comunicar- se diretamente com a comunidade” (ANDRADE, 2020, p.138). Assim comono Jainismo, existe um princípio de não violência na religião Gond, esse princípio é chamado de munjok , que, de acordo com Koreti (2015), significa não violência, cooperação e autodefesa. No entanto, diferente do jainismo, essa não violência não inibe a alimentação com proteínas animais. Aliás, os Gonds vão além da alimentação com proteínas, pois, de acordo com Andrade (2020), as cerimônias Gond contam com sacrifícios de animais. Por fim, há uma crença em uma substância da vida (Jiv), quando essa é tirada o ser humano morre para ir para junto dos deuses. A reverência à arvores, pedras e outros elementos da natureza podem indicar uma veneração ao ancestral que está junto com os deuses. Koreti (2015) explica essa relação com o sepultamento que era muito comum na tribo. Atualmente a prática da cremação tem permeado os costumes dos Gonds. Por sua vez, a tribo Bhil possui duas divindades mais importantes: Waghdeo, divindade do Tigre, e Nandeo, divindade da agricultura. Essa tribo possui suas origens nas florestas profundas, seus integrantes eram hábeis na arte da caça, atirando com precisão. Esse fato está atrelado ao nome Bhil, que significa atiradores com arco. Durante o domínio do império Mongol, esses povos tribais foram empregados em trabalhos que envolviam técnicas de plantio e colheitas, enquanto outros foram selecionados para guerreiros do exército. Essa relação com o império trouxe uma mescla religiosa com o islamismo que posteriormente foi complementada com o cristianismo. Atualmente a tribo Bhil possui uma dupla pertença religiosa. De acordo com Andrade: “O conteúdo religioso dessa tribo mescla animismo e hinduísmo, e muitos de seus integrantes são mulçumanos e cristãos” (ANDRADE, 2020, p.138). Antes do império mulçumano, essa tribo possuía uma infinidade de divindades relacionadas com a natureza, mas “com o passar do tempo, foi absorvido por deuses hindus” (ANDRADE, 2020), que receberam atualizações em suas compreensões. Em relação a morte, os Bhils, faziam como os Gonds, sepultando seus mortos, mas a prática da cremação tem substituído esse costume. Para esse povo há vida após a morte. Alguns tornan-se espíritos bons de proteção e outros tornam-se espíritos que causam maldades. Esses traços estão presentes nessa tribo que entrelaça com sua raiz os elementos do hinduísmo, cristianismo e islamismo. TEMA 2 – Religiões tribais do nordeste e sul da Índia. O nordeste da Índia foi o terreno fértil das tradições tribais. Vamos conhecer sobre as tradições mais importantes: Santal, espalhada na região de Kolkolta, a tribo Abor, na fronteira com Myanmar, e a tribo no sul - a Todar, que possui, também, suas especificidades nas práticas ritualísticas. A tribo Santal é mais estudada pelos antropólogos, pois desenvolve suas práticas religiosas animistas, que envolvem os ídolos malignos e benignos. Atualmente a Índia elegeu a sua segunda presidente, dessa vez, trata-se de uma mulher, Draupadi Murmu, líder da tribo Santal. A tribo possui uma população de 7 milhes2 de pessoas. A tribo Santal sofre bastante discriminação por suas crenças e prática nada comuns. A tribo pratica uma espécie de bruxaria trabalhando com espíritos (bongas) bons e maus simultaneamente. Andrade (2020) menciona que alguns rituais de curandeirismo são realizados com o próprio sangue do curandeiro. Thakurji é a divindade suprema da religião Santal, o principal espírito é Maran Buru que quer dizer a montanha alta3. Esse espírito é superior entre os demais que trazem a benevolência para a tribo. A determinação da tribo em manter as tradições, faz com que elementos se mantenham fortes sem interferências de outras tendências. A morte é vista pelos membros da tribo Santal como uma forma de tornar- se um bom espírito. Para isso existe um ritual pós morte bem longo. De acordo com Andrade: “Quando alguém morre, o falecido é enterrado, entretanto não há caixão. O morto é embrulhado em um pano e colocado diretamente na terra para possibilitar que ocorra uma rápida decomposição. Após um período, alguns dos ossos são recolhidos e mantidos por um tempo sob o teto da 2 O texto de Andrade em 2020 menciona 5 milhões. Os dados em 2022 apontam para 7 milhões. 3 Em Andrade (2020, p.136), o termo refere-se a montanha grande. casa dos familiares e são regularmente levados para serem “alimentados” ritualmente com leite, cerveja de arroz e água sagrada, além de receberem flores” (ANDRADE,2020, p.137). Esses ossos passam por esse ritual, mas não permanecem para sempre com a família. Existe uma segunda etapa que ocorre com esses ossos que é a imersão deles em águas para que o espírito se torne bom. Além da imersão em águas, geralmente de um rio, Andrade (2020) menciona o sacrifício de um bode, como expiação. Essa riqueza ritualística pode perder o sentido se a prática da cremação se tornar comum na tribo. A tribo Abor, por sua vez, é uma tribo que está, geograficamente, no extremo nordeste indiano, divisa da China e de Myanmar. Essa tribo também realiza rituais com sacrifícios de animais, tendo, também, a crença nos espíritos maléficos e bons. A divindade dessa tribo é os rios. Assim, seus integrantes temem os rios principais da região, Nippongs (sinônimo de espíritos das águas associado com as mulheres que morreram durante a gravidez), Epon – considerado o pai dos maus espíritos, e outros rios – associados com as almas de pessoas que morreram de forma não natural ou que não foram enterradas conforme os costumes ritualísticos. (ANDRADE, 2020, p. 140) A citação de Andrade evidencia que a prática ritualística do pós morte é, de alguma forma, parecido com costumes de outras tribos, pois na essência não está a prática da cremação. No entanto, também há indícios que, na atualidade, os elementos dessa tribo estão se enfraquecendo com o foco na industrialização (Andrade, 2020), perdendo muitos dos elementos voltados a conexão com a natureza e as práticas ritualística, inclusive a prática do sepultamento. Nessa tribo, também, existe a crença da vida após a morte, de modo que as duas vidas possuem semelhanças. Existem, de acordo com Andrade (2020) dois tipos de sacerdotes na tribo, os que curam e aqueles que adivinham as coisas. Isso é devido a conexão com o espírito de Benji Bama que é considerado o controlador do destino humano, ele é quem determina tudo no cotidiano e na hora da morte. Já a tribo Todar, está localizada na região montanhosa de Nilgiri ao sul do território indiano. A relação de vida e morte é algo muito forte entre eles. Os membros da tribo Todar, de acordo com Andrade (2020), acreditam em dois mundos, dos vivos e dos mortos. Esses dois mundos são regidos por deuses diferentes. Enquanto a deusa do mundo dos vivos, Tokisy4, habita nas montanhas, o seu irmão, governa o mundo dos mortos. O Buffalo é tido como um animal sagrado na tribo, aliás, ele é hierarquicamente o mais sagrado entre todos. Os rituais e o modo de vida dessa tribo estão relacionados diretamente com o búfalo. Isso se dá, pois, a subsistência nessa região dependia de alguns animais, além disso, a tribo Todar acredita que a deusa Teikirsy e seu irmão criaram primeiramente alguns animais, especialmente o búfalo sagrado, para depois criarem o ser humano. Na criação humana há um fato bem parecido com algumas narrativas cristãs, pois, de acordo com Chhabra (2001), a tribo Todar acredita que a primeira mulher foi criada a partir da costela direita do primeiro homem. As pessoas que cuidam dos búfalos são os sacerdotes da tribo. Essa pessoa possui o status mais alto, mas também segue algumas restrições, pois ele foi proibido de atravessar pontes enquanto estiver no cargo. Ele precisa atravessar rios a pé, ou nadando. Outra curiosidade é que as pessoas da tribo andam descalços. Essa tribo já possui como prática antiga o ato da cremação paraque o corpo se desintegre com a natureza. Durante a cerimônia fúnebre dois búfalos são abatidos e as mãos do defunto são colocadas agarrando o chifre do búfalo. Depois o corpo é cremado e essas cabeças de búfalos ficam em templos. De acordo com Andrade (2020, p.140): “No templo,[...] são penduradas imagens de corpos celestes, de cobras e de cabeças de búfalos”. TEMA 3 – Religiões estrangeiras: o cristianismo. O cristianismo encontrou seu terreno na Índia, principalmente na parte sul na costa ocidental. Andrade (2020) menciona três etapas distintas da chegada do cristianismo na Índia. Atualmente o cristianismo chega a 3% da população indiana, o que é visível devido à prática da religiosidade popular. 4 Ou Teikirsy O cristianismo é a maior religião monoteísta do mundo, sua expansão se deu após a morte, ressurreição e a Ascenção de Jesus Cristo ao céu. O evento que marcou a expansão foi um pedido feito pelo próprio Jesus aos discípulos. Segundo a narrativa cristã, Jesus pediu que seus discípulos percorressem o mundo e fizessem seguidores. Outro evento que marcou essa expansão, mencionada por Andrade (2020), foi o Pentecostes de Atos, pois a partir dali os apóstolos saíram para fundar comunidades. As comunidades fundadas pelos discípulos de Jesus são conhecidas em partes, pois nem todos os apóstolos possuem livros na bíblia, o livro sagrado dos cristãos. Sabemos que João fundou comunidades em regiões da Ásia por seus escritos endereçados para essas comunidades, Paulo e Pedro fundaram comunidades nas regiões do império romano. No entanto, as comunidades fundadas por Bartolomeu e Tomé estão ausentes dos textos bíblicos. De Acordo com Andrade (2020) Tomé foi quem esteve já no primeiro século no território indiano, inicialmente ele esteve exercendo sua função de escultor, mas posteriormente converteu milhares à fé cristã. Essa história não é confirmada por historiadores, mas há consenso entre eles que desde o século III já havia cristãos na Índia. Um outro momento de tentativa de cristianização na Índia se deu com as navegações portuguesas. Junto de Vasco da Gama, vários missionários chegaram ao território indiano. Esses missionários eram da Companhia de Jesus que, embora tivesse sede na Espanha, exercia um trabalho junto da coroa portuguesa. A investida portuguesa em cristianizar a Índia se deparava com alguns problemas, entre eles os mais relevantes eram a conflituosa relação com os mulçumanos quais haviam dominado alguns setores da Índia e a língua. Esse fato fez com que surgisse a necessidade de estabelecer um seminário local para formar nativos que espalhassem a cristianização e a cultura portuguesa. “Indubitavelmente, o objetivo português era impor sua cultura e sua religião. A fundação de um seminário exclusivo para formar nativos tinha como objetivo formar agentes de disseminação da cultura portuguesa. Parece-nos que o Seminário contribuiu efetivamente com tal objetivo. O ensino dos meninos nativos criava um grupo de elementos cristianizados a auxiliar os padres na catequese. Vários desses meninos foram enviados às localidades para ajudar os padres, como catequistas ou tradutores” (BORGES, MENEZES e COSTA, 2020, p.444). Essa chegada dos missionários causa uma experiencia conflitante entre os cristãos que já estavam na Índia. De Acordo com Andrade, “A colonização português gerou um conflito entre cristãos nativos, que se consideravam de “São Tomé”, e os aqueles, que foram convertidos durante a colonização portuguesa. A guerra entre os dois grupos, que aconteceu no século XVII, é conhecida como Coonsn Cross. Desde então, a igreja católica indiana foi dividida em três ramificações distintas: siro-malabárico, siro-malankara e latino” (ANDRADE, 2020, p.146). Ainda houve um terceiro momento de cristianização na Índia. Esse momento se deu quando a Índia esteve sob o domínio inglês. Houve um investimento na cristianização das comunidades tribais. Esse fato pode ser percebido em algumas tribos que possuem dupla pertença. Além desses momentos, paralelamente a essa última investida com foco nos povos tribais, houve uma missão por parte de denominações oriundas do movimento reformatório do século XVI. Em 1979, um sapateiro, batista, inglês, William Carey, iniciou um movimento de cristianização. Alguns anos depois em 1835, o reverendo, presbiteriano James R. Campbell chegou no território indiano acompanhado de alguns missionários presbiterianos, resultando em adesões a uma outra divisão do cristianismo. TEMA 4 – Islamismo. Caro(a) discente, algumas perguntas nortearão nossa apresentação sobre o islã na Índia. Como essa tradição encontrou seu lugar, chegando a quase 15%, atualmente, da população indiana? De que forma as práticas muçulmanas são realizadas? É o que vamos aprender. Assim como ocorreu com o cristianismo, o islamismo teve algumas etapas em sua entrada e expansão no território indiano. Não há dúvidas do sucesso que o processo de islamizar a Índia conseguiu. Atualmente continua se expandindo pelo território da Índia e enfrentando algumas barreiras que lhe são impostas, como a dificuldade que os mulçumanos passaram para ter reconhecimento de cidadania e os conflitos na região da Caxemira. O Islã é uma das tradições que mais cresceu no subcontinente indiano, devido à sua doutrina e também ao poder político nas mãos dos reis muçulmanos ao longo dos séculos. Andrade (2020) aponta a entrada da tradição como consequência dos comerciantes árabes e depois a outros fatores políticos. Os comerciantes mantinham relações com a Índia antes do islã surgir, de acordo com Andrade, (2020) o islã chegou nas terras indianas ainda na época do profeta Maomé. Andrade (2020) destaca que houve um segundo momento de islamização no território indiano. Essa segunda fase se deu por meio de várias invasões e saqueamentos de templos hindus. Mahammad bin Qasim com apenas 17 anos conquistou a região de Sindh em 672. O terceiro momento dessa islamização se deu de maneira muito forte quando a Índia esteve sob o império Mongol, que já mencionamos em outras aulas. Sem dúvidas o império mulçumano Mongol foi o epicentro da islamização na Índia. O resultado disso foi, de acordo com Andrade (2020), uma presença massiva de mulçumanos em todas as esferas da Índia. TEMA 5 – Judaísmo e Parsis5. Existem diversas teorias sobre a entrada do judaísmo na Índia. Alguns dizem que uma das tribos perdidas de Israel chegou à Índia logo após a morte do rei Salomão. Outros afirmam que, nos tempos de diáspora, os judeus migraram à Índia, ocupando a região de especiarias. O fato é que: “Havia em torno de 20 mil judeus na Índia até a independência do país em 1947, mas, com a criação do Estado de Israel, em 1948, muito deles migraram para esse novo local” (ANDRADE, 2020, p.151). 5 Ou Parses. Não há consenso entre os historiadores sobre a chegada dos judeus na Índia, isso pode se dar por serem os judeus a primeira religião estrangeira a chegar na Índia, mas sem a intenção de converter ninguém para sua fé. Há indícios que após a construção do templo de Salomão uma tribo tenha partido para a Índia, os chamados “Judeus de Cochim”. Atualmente o judaísmo está presente nas terras indianas com várias ramificações. Existem sinagogas por várias regiões, embora o judaísmo não exerça uma força como o islamismo e o cristianismo exercem nas terras indianas. Outra religião estrangeira é os Parsis, eles são da tradição zoroaster e migraram à Índia já no século VII, por conta da invasão dos muçulmanos ao Irã. O grupo era pequeno e ocupou a região de Mumbai, a parte ocidental da Índia. “Os parses (parsis) são seguidores da tradição de Zaratustra, ou Zoroastro, que fundou uma religião na antiga Pérsia e no atual oeste do Irã por volta de 600 a.C. A tradição de Zaratustra é popularmente conhecida como zoroastrismoe também chamada de masdeísmo, mas, na Índia, é conhecida como parsismo. Essa religião carrega o princípio do dualismo: uma guerra constante entre o bem e o mal” (ANDRADE, 2020, p.151). A instalação da religião na Índia se deu em um contexto de fuga do Irã quando os árabes invadiram a região nos tempos de Maomé. Essa fuga não foi aleatória, mas planejada, pois, os seguidores da religião, também, mantinham comércio com a Índia. A religião Parses é monoteísta e já contou com um significativo número de adeptos na Índia. Atualmente, de acordo com Andrade (2020), esse número vem diminuindo gradativamente. NA PRÁTICA Caríssimo(a) discente, que tal colocarmos em prática algumas coisas que descobrimos nessa aula? Nós o queremos ajudar com algumas sugestões, mas sinta-se livre para incrementar e/ou fazer algo diferente em sala de aula. Imagine que você tenha que explicar sobre as religiões tribais indianas e outras tradições. Nós sugerimos que você tenha como ponto de partida algo mais íntimo da cultura dos alunos. Por exemplo, podemos trabalhar a partir das religiões das nossas etnias indígenas, que possuíam uma relação com a natureza com aspectos parecidos com as religiões tribais indígenas. Parece fácil, não é? Podemos trabalhar a dupla pertença da tribo Bhil em analogia com fatos do Brasil. Já pensou se comparássemos essa tribo com os nossos povos originários que atuaram nas aldeias em torno da igreja onde Sepé Tiaraju era sacerdote, e chefe dos sete povos das missões? Parece estar nessa analogia uma dupla pertença, um “sacerdote feiticeiro”. Outra sugestão é para trabalhar o cristianismo na Índia. Veja só! Muitas vezes, as pessoas perguntam como é possível existir cristãos na Índia. Portanto, é necessário abordar, em um primeiro momento, as religiões tribais, anteriores a qualquer tradição indiana. Depois, é preciso apresentar as tradições que entraram posteriormente e que conseguiram preservar sua identidade até os tempos de hoje, como a tradição cristã e a tradição muçulmana. Além disso, é bom falar, também, sobre as religiões judaísmo e Parsis, devido à sua presença em algumas regiões. Esperamos que você realize uma excelente atividade em sala, motivando os alunos para conhecerem mais e compreenderem esse pluralismo religioso que, antes de tudo, é fruto de uma percepção humana do contexto em que está inserido. FINALIZANDO Caríssimo(a) discente, chegamos ao fim de mais uma aula. Foi um prazer fazer esse diálogo contigo e aprendermos juntos sobre as religiões tribais e estrangeiras nas terras indianas. Nesta aula aprendemos que as tradições tribais se encontram espalhadas por todo o território indiano, mas estão fortemente concentradas na região central e nordeste. Essas tradições elaboram suas práticas ritualísticas ao redor da crença nos espíritos e também no sacrifício dos animais. A relação, em intenções diferentes, com a natureza são marcas diferenciais nessas etnias que carregam vivas as heranças mais antigas de suas culturas. Um fato interessante é que a nova presidente da Índia pertence a uma dessas tribos, inclusive a tribo que sofre mais discriminação por suas práticas envolverem uma espécie daquilo que é chamado de bruxarias. Também aprendemos sobre as religiões estrangeiras que encontraram seu lugar na Índia, algumas encontraram refúgio em tempos de perseguição, outras encontraram um campo de possibilidades para expansão religiosa e ainda há o judaísmo que sem intenção de agregar membros, possui o título da religião estrangeira mais antiga da Índia e ainda viva. Apesar das peculiaridades, e alguns conflitos, o vale dos deuses abrigou o Deus único do cristianismo, judaísmo e do islã. A relação una e plural está por toda a Índia em busca da harmonia, mantendo suas peculiaridades. Gostaríamos de incentivá-lo(a) a ler a obra que orientou essa aula. Trata- se da obra: “Índia, lar dos deuses e terra das multidões”, do indiano Dr. Joachim Andrade, lançado pela editora InterSaberes. Ainda sugerimos a leitura de outros textos que abordam essa pluralidade religiosa na Índia. REFERÊNCIAS ANDRADE, Joachim. Deus do deserto, deus do vale: A Geografia como ponto de partida para a compreensão do fenômeno religioso. Uberlândia: INTERAÇÕES - Cultura e Comunidade / Uberlândia / v. 5 n. 7 / p. 13-38 / jan./jun. 2010. ANDRADE, Joachim. Índia, lar dos deuses e terra das multidões: uma aproximação às religiões indianas. Curitiba: InterSaberes, 2020. Bhil. In: Knowledge Encyclopedia. Disponível em: > Acesso em 17 de julho de 2022. BORGES, Felipe Augusto Fernandes; MENEZES, Sezinando Luiz; COSTA, Célio Juvenal. A Companhia de Jesus e o Seminário de Santa Fé em Goa (1541-1548). História Unisinos, v. 24, n. 3, p. 432-445, 2020. Disponível em:> Acesso em: 22 de julho de 2022. BOWKER, J. Para entender as religiões: as grandes religiões mundiais explicadas por meio de uma combinação perfeita de texto e imagens. São Paulo: Ática, 1997. CHHABRA, Tarun. "The Todar Landscape.” India International Centre Quarterly, vol. 27/28, 2001, pp. 53–69. JSTOR, Disponível em: > Acesso em 23 de julho de 2022. Índia elege à Presidência Draupadi Murmu, mulher de etnia marginalizada. In: Folha de São Paulo. 21.jul.2022. Disponível em: > Acesso em: 22 de julho de 2022. JANSEN, J. (Org.). O livro das imagens hinduístas. São Paulo: Totalidade, 1995. KORETI, Shamrao I. Religion of the ‘Gond’Tribes of Middle India. 2015. Disponível em:> Acesso em 17 de julho de 2022. PATANKAR, Mayuri. ‘Gondwana’/‘Gondwanaland’as a Homeland of the Gonds: Storytelling in the Paintings of Gond Pilgrims. 2016. Disponível em: > Acesso em 17 de julho de 2022. SMITH, George. The life of William Carey, DD: Shoemaker and missionary. Cambridge University Press, 2011.