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Ametropias Oculares Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª Esp. Natalí Eve de Campos Pinto Revisão Textual: Aline Gonçalves Anisometropia Anisometropia • Compreender o significado e as causas da anisometropia, que está relacionada a um erro refrativo diferente entre os olhos; • Aprender que as anisometropias constituem um dos campos mais polêmicos da prática refratométrica. OBJETIVOS DE APRENDIZADO • Introdução; • Anisometropia. UNIDADE Anisometropia Introdução Antes de sabermos o que é anisometropia, precisamos entender que para uma boa visão é importante que o desenvolvimento da visão binocular esteja normal, que em ambos os olhos haja acuidade visual aproximadamente igual e que as imagens sejam semelhantes, para que assim haja: fusão, amplitude de fusão e estereopsia. Figura 1 – Anisometropia Fonte: Adaptada de Getty Images A visão binocular permite a fusão das sensações recebidas por cada uma das retinas. Em cada olho, uma imagem de parte da mesma cena e as duas imagens são transmitidas ao córtex cerebral. A percepção final é o resultado da fusão das duas representações visuais em níveis corticais superiores. Para ter uma boa visão binocular, alguns pontos são necessários: • Os campos visuais monoculares devem se sobrepor em todas as direções do olhar para obter um campo binocular útil e eficaz; • Os campos de fixação individuais se sobrepõem devido aos movimentos coordena- dos dos dois olhos; • As duas imagens devem ser mescladas a fim de obter representação visual única do ambiente, comparando ambas as imagens; • A transmissão neural dos dois olhos deve atingir a mesma área cerebral, para que a fusão das imagens aconteça e reconheça a coordenação da percepção visual. São responsáveis para que a visão binocular aconteça: • Motilidade ocular: responsável pelos movimentos oculares, esse sistema deve ga- rantir que os eixos visuais se cruzem no ponto de fixação e que as imagens desse ponto sejam formadas simultaneamente e correspondentemente nas duas retinas. 8 9 Os movimentos dos olhos permitem tanto o aumento do campo visual quanto a manutenção da fixação, mas também a centralização da imagem na fóvea, onde se obtém a mais alta qualidade visual ; • Fusão: a transmissão neural dos dois olhos deve atingir a mesma área cerebral para que a fusão das imagens aconteça. A fusão é necessária para ter percepção única das sensações recebidas por cada retina ; • Correspondência retiniana: os pontos correspondentes são definidos como os pontos nas duas retinas que dão origem a uma percepção visual comum. Ou seja, somente quando dois pontos determinados de cada uma das retinas são estimula- dos, teremos percepção única, que também estará relacionada com uma direção de espaço única ; • Estereopsia: a visão estereoscópica é o principal mecanismo da visão binocular, uma visão que resulta da habilidade de o sistema visual obter as informações sobre a posição de profundidade de objetos da assimetria binocular (visão tridimensional/ de profundidade). O sistema visual é capaz de obter uma impressão visual única de seu ambiente, através do processo da fusão binocular. Agora que entendemos os fatores para uma boa visão binocular, vamos descobrir o que é anisometropia? Artigo sobre a fisiologia da visão binocular. Disponível em: https://bit.ly/3sECw5z Anisometropia A anisometropia é um dos fatores que podem comprometer a visão binocular, pois ocorre uma alteração em que a refração do olho esquerdo se torna diferente da do olho direito, interferindo no mecanismo de fusão das imagens no cérebro. A maioria das pessoas tem erros de refração semelhantes, mas deve ser considerada relevante uma diferença igual ou superior à potência de 2 D entre os principais meridianos de ambos os olhos. Podemos classificar a anisometropia em: miópica, hipermetrópica e mista ou antime- trópica. Vamos entender as classificações no quadro a seguir: Quadro 1 – Classifi cação da anisometropia Miópica • Simples: um olho é emétrope e outro, míope ; • Composta: ambos os olhos são míopes. Hipermetrópica ou hiperópica • Simples: um olho é emetrope e o outro, hiperópico ; • Composta: ambos os olhos são hiperópicos. Mista ou antimetrópica • Um olho é míope e o outro, hiperópico. Fonte: Adaptad o de DOME, 2008, p. 208 9 UNIDADE Anisometropia Figura 2 – Representação de uma anisometropia miópica simples Fonte: Adaptada de HERRANZ; ANTOLÍNEZ, 2010, p. 195 Dependendo da magnitude da anisometropia, ela é classificada como: Quadro 2 – Grau de anisometropia Baixo <2,00D O paciente tolera a correção sem dificuldades. Média - De 2.00D a 6.00D O paciente pode ter problemas binoculares. Alta > 6,00D Possivelmente, é um paciente assintomático devido à supressão central (ambliopia) de um dos dois olhos. Fonte: Adaptado de MICÓ, 2011, p. 39 Quando a anisometropia não é corrigida, podem ocorrer outros fatores: • Supressão no olho com a visão mais turva; • Resultar em aumento significativo de ambliopia; • Afetar o tamanho da imagem retinal, causando aniseiconia; • Diminuição da função binocular que está associada à redução de desempenho em tarefas motoras e de direção. Se a anisometropia ocorrer em pacientes jovens, e particularmente antes de 6 anos, quando o sistema visual ainda não está firmemente estabelecido, possivelmente a ambliopia também estará presente. Muitas vezes, nesses casos, a visão é muito boa em um olho, de modo que a anisometropia e a visão reduzida no outro olho não são descobertos. Quanto mais velha a criança, mais difícil é tratar a ambliopia e restaurar a acuidade total. 10 11 Etimologicamente, anisometropia vem da soma dos seguintes termos gregos: anisas, que significa (desigual), metro, que significa (medida), e apía, que significa (visão), ou seja, me- dida desigual da visão. Causas As causas da anisometropia podem ser divididas em congênita, adquirida e pode ocorrer devido às características anatômicas. A anisometropia congênita geralmente é hereditária e pode ser induzida por glaucoma, catarata e outras alterações oculares congênitas devido ao aparecimen- to de diferentes erros de refração entre os dois olhos, como hipermetropia, miopia ou astigmatismo. Adquiridas são as anisometropias secundárias a trauma, afacia unilateral, cirurgias oculares, cirurgias refrativas e que se desenvolvem durante a evolução da ametropia, que pode causar uma mudança refrativa diferente em ambos os olhos. Algumas características anatômicas da córnea, do cristalino e do comprimento axial podem fazer a anisometropia ser desenvolvida. O comprimento axial é o fator que mais contribui para a anisometropia na população em geral, sendo mais significante em pa- cientes com mais de 5D de anisometropia; já o cristalino geralmente é observado em indivíduos com anisometropia entre 3 e 5D (dioptrias) e a córnea normalmente ajudará a reduzir a anisometropia devido ao seu comprimento axial. Dependendo do mecanismo pelo qual ocorre, a anisometropia pode ser classificada em categorias: Quadro 3 – Categorias de anisometropia Anisometropia axial Causada pela diferença entre o comprimento axial de cada olho. Anisometropia refrativa Causada pela diferença entre a posição ou a forma dos compo- nentes ópticos do olho, principalmente o cristalino. É tipicamente observado em indivíduos com anisometropias entre 3,00 e 5,00 D. Anisometropia mista Devido à presença conjunta de anisometropia axial e refrativa. Fonte: Adaptad o de HERRANZ; ANTOLÍNEZ, 2010, p. 196 O comprimento axial é a distância entre as costas e a frente do olho. Importante! A anisometropia axial representa a maioria dos casos, sendo em torno de 97% dos casos, principalmente em anisometropias maiores que 5,00 D. 11 UNIDADE Anisometropia Sinais e Sintomas O principal sinal clínico da anisometropia é a presença de refração diferente entre os dois olhos e alterações na visão binocular (fusão e estereopsia). Está, em geral, associada a estrabismose redução da visão. Na anisometropia, a Acuidade Visual (AV) com correção pode aparecer reduzida, a qual chamamos de ambliopia anisoametrópica, especialmente nos casos de anisometro- pia em crianças, nas quais o tratamento da ambliopia não foi realizado corretamente. Em grandes anisometropias miópicas, quando corrigidas com óculos, a acuidade visual também pode aparecer reduzida; nesse caso, irá melhorar ao ser corrigida com lentes de contato. A visão binocular também é frequentemente afetada, especialmente em casos congê- nitos ou com início muito precoce, havendo diminuição da estereopsia e, principalmente, supressão central. Os sintomas estão mais relacionados com o tipo de anisometropia do que com o seu valor dióptrico. Nas anisometropias miópicas, normalmente o paciente será assintomá- tico, devido à impossibilidade de corrigir a deficiência pelo esforço acomodativo, em que, em determinados momentos, cada olho pode estar focalizando para perto ou para longe, por isso, nesses casos, é mais raro haver ambliopia. No tipo hiperópico, o olho de valor dióptrico maior estará fora de foco tanto para longe quanto para perto, por isso esses casos estão sempre acompanhados de sintomas como: • Cefaleia; • Diplopia; • Desconforto visual (principalmente para perto); • Supressão; • Ambliopia. Na anisometropia antimetrópica (um olho míope e outro hipermetrope), a grande tendência é o olho míope ser estimulado para perto e o olho hipermetrope ser estimu- lado para longe (fenômeno chamado de Báscula). Em alguns casos, pacientes que são emétropes em um olho e míopes em outro olho, na presbiopia, podem utilizar um olho para compensar perto e outro para longe. A melhor forma de evitar os transtornos da anisometropia é a correção precoce do indivíduo, para que sejam estimuladas ambas as retinas, com mínimas diferenças. Correção Antes da correção óptica para anisometropia, é importante determinar o grau de vi- são binocular (pontos de valor, teste de estereopsia etc.), que informará sobre o nível de fusão e permitirá escolher entre uma ou outra alternativa de correção. São elas: 12 13 • Lentes de contato; • Óculos ou telessistemas ópticos (ex., lupas de apoio); • Terapia visual (exercícios ortópticos). Figura 3 – Correções Fonte: Adaptado de Getty Images O tratamento da anisometropia deve ser considerado a partir de dois pontos principais: Anisometropia em crianças Frequentemente associada à ambliopia e ao estrabismo. Deve-se prescrever a cor- reção óptica mais exata, corrigindo mesmo as menores dioptrias; iniciar a terapia oclusiva controlando a dominância ocular ou indicar terapia ortóptica com treinamen- to visual para treinar e melhorar fusão, evitando supressão visual em um dos olhos. A criança precisa ser acompanhada até os 12 anos de idade, devido à possibilidade de desenvolver microestrabismo. Anisometropia em adultos A correção de anisometropia deve fornecer o máximo AV com o maior conforto. Para compensar graus mais elevados de anisometropia, é indicada a correção com lentes de contato; como regra, geralmente é aceito não corrigir anisometropias maiores que 3,00 D com óculos. Além disso, dependendo do tipo de anisometropia, um olho pode ser corrigido para longe e outro para perto, de acordo com as características, profissão e necessidades de cada indivíduo. 13 UNIDADE Anisometropia A correção pode ser feita com óculos ou lentes de contato, dependendo do tipo de anisometropia e presença de aniseiconia. A grande vantagem de usar lentes de contato é que as diferenças nos efeitos prismáticos são evitadas com o movimento dos olhos sempre alinhados ao eixo óptico do olho com o eixo óptico da lente. Os óculos serão indicados nas anisometropias axiais, enquanto as lentes de contato, para anisometropia refrativa. No entanto, existe um número substancial de pessoas com anisometropia axial que não consegue usar óculos como compensação óptica. Dentre as razões, podem estar o aparecimento de diferentes efeitos prismáticos ou que a aniso- metropia se deve a outros fatores, seja na retina, seja no córtex visual. Na anisometropia refrativa, correção de erros refrativos com lentes de contato mi- nimizará as diferenças de tamanho das imagens da retina, especialmente quando a anisometropia não é muito alta (menos de 6,00 D) e a diferença na potência da córnea é semelhante à magnitude da anisometropia, além disso, os efeitos prismáticos podem ser minimizados pelos movimentos oculares. Quando corrigida a anisometropia, deve-se atentar-se para o efeito das lentes correto- ras sobre a visão binocular. Com pacientes de qualquer idade, a prescrição de óculos para corrigir a anisometropia pode apresentar dois outros problemas (dificuldades ópticas): • Efeitos prismáticos: quando o paciente não está olhando pelo centro das lentes, uma diferença no efeito prismático entre as duas lentes pode dificultar ou impos- sibilitar a visão binocular. Esses efeitos prismáticos apresentam mais dificuldades quando o paciente olha para cima ou para baixo dos centros, já que a tolerância vertical aos prismas é bem menor do que a horizontal. Para alguns pacientes, um efeito prismático vertical de 0,5Δ pode prejudicar a estereopsia; • Aniseiconia: quando as lentes são de diferentes poderes, haverá uma imagem retinal maior em um olho do que no outro por causa da diferença em ampliação de óculos. Importante! É importante que o diagnóstico e a correção das anisometropias sejam feitos precoce- mente, para que os estímulos visuais e cerebrais sejam preservados. 14 15 Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Vídeos Lentes de contato e anisometropia Vídeo traz breve explicação sobre o que é anisometropia e o uso de lentes de con- tato para seu tratamento. https://youtu.be/0T-WT0H_0mY Leitura Revisando as anisometropias Artigo apresenta uma revisão crítica das anisometropias. Discute a definição, classi- ficação e os prováveis mecanismos ópticos e fisiológicos da sintomatologia. https://bit.ly/3dpVR3Z Ambliopia anisoametrópica Artigo sobre ambliopia anisoametrópica; traz a explicação das causas e tratamentos. https://bit.ly/2QPNE1r Como avaliar anisometropia e aniseiconia? Artigo sobre como pode ser feita a avaliação em casos de anisometropia e aniseiconia. https://bit.ly/2PGszGi Ametropias e presbiopia O artigo traz breve explicação sobre anisometropia e o seu tratamento. https://bit.ly/2Q5h0Zi 15 UNIDADE Anisometropia Referências ALVES, A. de A. Refração. 6. ed. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2014. DOME, E. F. Estudo do olho humano aplicado à Optometria. 4. ed. São Paulo: Editora Senac, 2008. FRIEDMAN, N. J.; PETER, K. K.; TRATTER, W. B. Review of Ophthalmology. 3. ed. USA: Elsevier, 2018. GUYTON, A. C. Tratado da Fisiologia Médica. 9. ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan, 1997. GROSVENOR, T. Optometría de atención primaria. Barcelona, España: Masson, 2004. HERRANZ, R. M.; ANTOLÍNEZ, G. V. Manual de optometria. Madrid: Editorial Médica Panamericana, 2010. KANSKI, J. J. Oftalmologia clínica. 5. ed. Rio de Janeiro: Editora Revinter, 2004. MAIA, N. C. de F. Fundamentos básicos da oftalmologia e suas aplicações. 1. ed. Palmas: Editora EDUFT, 2018. MICÓ, R. M. Optometría: principios básicos y aplicación clínica. Espanha: Elsevier, 2011. ONDATEGUI, J. C. et al. Visión binocular: diagnóstico y tratamento. Espanha: Universitat Politecnica de Catalunya, 2004. VAUGHAN, D. et al. Oftalmologia geral. 4. ed. São Paulo: Atheneu, 1997. VON NOORDEN, G. Binocular vision and ocular motility. 4. ed. Saint Louis: Mosby, 1990. SCHEIMAN, M.; WICK, B. Clinical management of binocular vision: heterophoric, accommodative, and eye movement disorders. 4. ed. USA: Wolters Kluwer Health, 2014. 16