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Francisco Vieira Lima Neto Gilberto Fachetti Silvestre (organizadores) Direito Probatório questões materiais e processuais Alexandre Pezzin Passos Ana Beatriz Costa da Graça de Araujo Ana Julia Dias Batista André Soares de Azevedo Branco Anselmo Bacelar Beatriz Carvalho Clímaco Bernardo Dias Lopes Nunes Bruna Figueira Marchiori Caio da Silva Ávila Eduardo Figueiredo Simões Felipe Sardenberg Guimarães Trés Henriques Flávio Cheim Jorge Francisco Vieira Lima Neto Gabriel Pereira Garcia Gabriela Azeredo Gusella Gilberto Fachetti Silvestre Guilherme Santos Neves Abelha Rodrigues Igor Gava Mareto Calil Isabela Loss Lopes Iúri Barcellos Cardoso João Antonio Schmith Barcellos João Victor Pereira Castello João Vitor dos Santos de Souza Júlia D’Amato Nitz Lara Abreu Assef Mariana Fernandes Beliqui Mariany de Souza Manga Matheus Campos Pompermayer Vieira Pedro Lube Sperandio Sandro Bortoluzzi Madeira Lamêgo Rodrigues Tiago Loss Ferreira Edição dos Organizadores Vitória – ES, 2022 ISBN: 978-65-00-37529-9 Título: Direito Probatório: questões materiais e processuais Formato: Livro Digital Capa: Canva Veiculação: Digital Vitoria – ES – 2022 LIMA NETO, Francisco Vieira; SILVESTRE, Gilberto Fachetti (Orgs.). Direito probatório: questões materiais e processuais. Vitória: Edição dos Organizadores, 2022, 364 p. ISBN: 978-65-00-37529-9. 169 Prova neurocientífica Anselmo Bacelar Mestrando em Direito Processual pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES); Bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes); Pesquisador de Iniciação Científica do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); Pesquisador do Grupo de Pesquisa “Desafios do Processo” (PPGDIR/UFES); Advogado. E-mail: anselmo.bacelar@gmail.com. Lattes: http://lattes.cnpq.br/7723820625276085. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0002-7367-727X. Bruna Figueira Marchiori Mestranda em Direito Processual pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES); Bolsista de Iniciação Científica do Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq); Bolsista de iniciação à Docência na modalidade PAEPE I (UFES); Pesquisadora dos Grupos de Pesquisa “Desafios do Processo” e “Medicina Defensiva”; Advogada. E-mail: brunafigueiramarchiori@gmail.com. Lattes iD: http://lattes.cnpq.br/8474156424355190. Orcid iD: https://orcid.org/0000-0003-1869-0567. Sumário: 1. Neurociência e direito. 2. Possíveis campos de atuação probatória da prova neurocientífica. 3. Problemáticas e desafios a serem enfrentados. Referências. 1. Neurociência e direito. A neurociência é um campo de estudo que adentrou no campo de estudos do Direito destacadamente no início do século XXI, com mais ênfase no direito norte-americano, buscando solucionar questões desde a análise de problemas encontrados no aspecto probatório do direito processual penal e civil (SALAS; ARRIETA; SIMANCAS, 2019, p. 105-106). Por detrás desta aproximação, está o objetivo de se obter uma reconstrução convincente do fato do fato constitutivo da demanda judicial valendo-se da utilização de provas científicas (UBERTIS, 2007, p. 83), que, em tese, teriam o condão de garantir mais solidez nas provas a serem analisadas em juízo e, portanto, maiores seriam as condições de que o julgamento se aproximasse da verdade dos fatos. Resumindo bem esta pretensão, afirma Marcos José Porto Soares (2020, p. 1-2): Os custos sociais, morais e econômicos de uma decisão injusta justificam trazer ao raciocínio probatório novos conhecimentos científicos e tecnológicos que possam minimizá-los. Os juízes necessitam para comporem uma decisão justa terem acesso não 170 somente às normas e aos fatos a serem julgados, mas também visualizar o que acontece no interior do seu corpo; de forma mais específica no seu cérebro, órgão humano o qual desenvolve em grande medida a tarefa de formar as decisões. Ademais, a cientifização das provas seria um caminho pautado em uma tentativa de diminuir o que se considera uma subjetividade da atuação do magistrado no processo, tanto no campo da produção quanto da valoração das provas e, com uma prova alinhada às “hard sciences”, com maior possibilidade de valoração objetiva, tal qual se pressupõe a prova neurocientífica, seria possível mitigar os efeitos de uma subjetividade no momento da valoração em razão de uma prova científica (SOARES, 2020, p. 10-11). A partir dessas pretensões e do avanço do estudo neurocientífico observado nas últimas décadas, cada vez mais se reverberam promessas de que a neurolaw teria condições de desenvolver um melhor sistema judicial, oportunizando um total remodelamento das normas de direito material e processual (PETOFT, 2015). 2. Possíveis campos de atuação probatória da prova neurocientífica. Segundo Fernando Luna Salas (2019, p. 22), é possível observar um mundo de possibilidades no que tange às aplicação da neurociência no âmbito jurídico, especificamente no que diz respeito ao campo do direito probatório. Apenas para elencar alguns destes empregos apontados pela literatura jurídica tem- se: i) a análise da prova diabólica do sofrimento na avaliação do dano para fins de responsabilidade civil (SALAS; ARRIETA; SIMANCAS, 2019, p. 102-103), ii) análise de situações cerebrais que possam alterar o comportamento do sujeito, especificamente no que tange a ampliação de comportamentos perigosos, testes de detecção de mentiras em depoimentos (FENOLL, 2016, p. 123-127) iii) a análise do conceito de vontade e liberdade em um contexto neurocientífico/cerebral (LAGIER, 2018, p. 49-54). Para tanto, a neurociência no direito lança mão de técnicas como a Tomografia Computadorizada por Emissão de Pósitrons (PET-TC), a Tomografia axial computadorizada (TC ou TAC), a magnetoencefalografia (MEG), a ressonância magnética funcional (fMRI), a pletismografia peniana (PPG), dentre outras (SALAS, 2019, p. 147). Resumidamente, “as técnicas fundadas na eletroencefalografia e na neuroimagem monitorizam a atividade cerebral específica que se crê acompanhar certos estados mentais subjetivos” (SILVA, 2019, p. 483). Desta forma, seria - em tese - possível obter 171 relevantes insights no que se refere aos processos mentais que sustentam o comportamento humano (PETOFT, 2015). 3. Problemáticas e desafios a serem enfrentados. É necessário, contudo, uma análise mais cuidadosa sobre o tema das provas neurocientíficas. Apesar de serem utilizadas para conferir objetividade no processo, os procedimentos em si e os resultados obtidos na produção da prova científica estão em campos ainda pouco explorados pelo direito, podendo ofertar na realidade respostas mais incertas do que a precisão que se almeja com seu uso (SALAS; ARRIETA; SIMANCAS, 2019, p. 129-130). É possível detectar, ao menos, duas ordens de problemas relacionadas à aplicação da neurociência no campo do direito e, em especial, no campo do direito probatório, a saber: problemas de ordem técnica e problemas de ordem jurídica. No espectro de problemas técnicos, é possível apontar a própria imprecisão da aplicação de alguns destes métodos de neuroimagem. Como leciona Arian Petoft (2015), em decorrência da grande diferença existente entre os cérebros dos indivíduos, é difícil estabelecer o mapeamento específico da função mental para áreas específicas do cérebro. Talvez ainda mais importante que isto seja a impossibilidade, defendida por parte dos autores, de se estabelecer um determinismo a partir das constatações obtidas pelas técnicas de neurociência (SALAS, 2019, p. 149-150). Isto porque as ações e as decisões dos indivíduos não seriam pré-determinadas a partir de simples impulsos elétricos, mas também decorreriam de comportamentos aprendidos a partir do convívio social. Para enfrentaralguns destes problemas de cunho técnico, é necessário que haja uma forma de confirmação e análise dos procedimentos por terceiros fora do ambiente processual (comunidade científica), exigindo máxima transparência das técnicas adotadas, metodologia, e afins, para que assim a comunidade científica possa se debruçar sobre o procedimento e testá-lo. Só assim a natural sujeição ao erro de todo procedimento probatório neurocientífico pode passar por um aperfeiçoamento razoável para poder ser considerado uma fonte de prova confiável o suficiente para que a objetividade almejada seja uma vantagem interessante no tradeoff em relação às demais possíveis provas a serem produzidas/analisadas no processo. (SALAS, 2019, p. 151). Uma segunda ordem de problemas seria de caráter propriamente jurídico. É possível identificar certo conflito entre a utilização da neurolaw e garantias como o direito ao silêncio, o princípio nemo tenetur se detegere e o direito fundamental à intimidade, por exemplo (FENOLL, 2016, p. 136-142). 172 Em suma, é necessário identificar o como estas provas neurocientíficas são produzidas, como é possível as partes interferirem em termos de defesa e qual é o efetivo grau de certeza que cada uma dá em cada processo (certeza técnica), mantendo em mente que, malgrado haja esta vista de remoção do subjetivismo do magistrado, é ele que mantém o poder decisório com o bojo das provas, sejam científicas ou não. Conforme leciona Jordi Nieva Fenoll (2016, p. 143) até que se obtenham mais certezas acerca da confiabilidade e grau de precisão da utilização destas provas, seria pertinente a limitação da utilização das provas neurocientíficas no processo. Referências. FENOLL, Jordi Nieva. Neurociencia y juicio jurisdiccional: pasado y presente. ¿ Futuro?. Civil Procedure Review, v. 7, n. 3, p. 119-144, 2016. LAGIER, Daniel González. Tres retos de la neurociencia para el Derecho penal. Anuario de Filosofía del Derecho, p. 43-72, 2018. PETOFT, Arian. Neurolaw: A brief introduction. Iranian journal of neurology, v. 14, n. 1, p. 53-58, 2015. SALAS, Fernando Luna; ARRIETA, Virgilio Escamilla; SIMANCAS, Adriana Corena. La neurociencia como medio de suplir vacíos legales: análisis a la prueba del dolor. JURÍDICAS CUC, v. 15, n. 1, p. 96-134, 2019. SALAS, Fernando Luna. Técnicas neurocientíficas como medio de prueba pericial. Prolegómenos, v. 22, n. 44, p. 143-154. 2019. SILVA, Sandra Oliveira e. It’s all in your head? — A utilização probatória de métodos neurocientíficos no Processo Penal. Revista Eletrônica de Direito Processual, v. 20, n. 1, 2019. SOARES, Marcos José Porto. A neurociência e as provas judiciais. Revista de Processo. v. 300, n. 2020, p. 309-339, 2020. UBERTIS, Giulio. La prova scientifica e la nottola de minerva. In: NEUBURGER, Luisella de Cataldo (Org.). La prova scientifica nel processo penale. Padova: CEDAM, 2007.