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Resumo Direito Civil CONTRATOS *Paulo Nader Cap. 14 PACTOS ADJETOS À COMPRA E VENDA A liberdade de contratar permite às partes uma ampla adaptação do Contrato de compra e venda à singularidade de seus interesses. Compra e venda pura se opera sem cláusulas especiais ou adjetivos, concorrendo apenas os requisitos básicos do instituto: coisa, preço e declaração de vontade. Cláusulas especiais de compra e venda: · RETROVENDA · DA VENDA A CONTENTO E DA VENDA SUJEITA A PROVA · PREEMPÇÃO OU PREFERÊNCIA · VENDA COM RESERVA DE DOMÍNIO Permitem aos contratantes a criação de seu próprio dever ser. RETROVENDA *art. 505 a 508 *Pacto de retrovenda *Direito de retrato e direito de resgate Essa cláusula garante ao vendedor o direito de reaver a propriedade em determinado prazo, mediante restituição da importância recebida e de certos gastos efetuados pelo comprador, durante o período de resgate. ** Pouco adotado na prática por não se encontrar, facilmente, quem queira adquirir alguma coisa em condições tão precárias. É aplicável apenas a IMÓVEL. A compra e venda realizada com esta cláusula subordina-se à condição resolutiva potestativa, desfazendo-se caso o vendedor, tempestivamente, exercite o seu direito, por si ou sucessores. Ocorrendo o resgate Partes retornam ao statu quo ante como se Obs: a reintegração da propriedade ao patrimônio do vendedor não constitui, juridicamente, uma segunda compra e venda, mas efeito do contrato celebrado entre as partes. **Não haverá novo fato gerador inocorre incidência do imposto de transmissão. Obs2: Se um novo negócio realizar-se após o prazo de resgate, volvendo o imóvel ao domínio de seu primitivo proprietário, ter-se-à uma segunda venda Tributos incidirão. Diferenciando conceitos... Pacto de Retrovenda ≠ Pactum de Retrovenendo (vendedor recomprará) O segundo não previsto em nosso ordenamento. Por ele, o vendedor assume a obrigação de comprar a coisa, cabendo então ao comprador exercer a pretensão. ** Situação inversa à da retrovenda. Na retrovenda, quem assume a obrigação é o comprador. **Críticas Alguns doutrinadores criticam o instituto e o classificam como um disfarce para o pacto de usura. Também é acusado de ser usado para dissimular a hipoteca ou penhor. Para dificultar tal uso, um recurso adotado foi o de não se alongar o prazo de resgate. Segundo Louis Cremieu, um dos sinais que permitem desmascarar a fraude é o valor bem maior do preço estipulado para o resgate em relação ao negócio originário. Retrovenda se aplica a coisa móvel? ** O entendimento predominante em nosso País limita a aplicação da cláusula de retrovenda, exclusivamente, aos contratos de compra e venda de imóvel. Art. 505 da Lei Civil não dá margem a interpretação diversa: “O vendedor de coisa imóvel pode reservar-se o direito de recobrá-la...” *Para o jurista Pontes de Miranda, todavia, o instituto se presta ainda aos contratos de compra e venda de coisa móvel. Entre as razões que induzem o legislador a não estender o pacto acessório à compra e venda de coisa móvel, a doutrina aponta as seguintes: a) aplicado indistintamente à coisa móvel e imóvel, o pacto facilitaria a prática da usura; b) tendo em vista a informalidade da compra e venda de coisa móvel, que tem a transferência de domínio pela tradição, a possibilidade do pacto criaria, para os adquirentes em geral, a insegurança jurídica, já que poderiam ser colhidos de surpresa com a reivindicação da coisa. Características da Retrovenda O Código Civil brasileiro concebe a retrovenda como pacto acessório, adjeto à compra e venda, necessariamente firmado na oportunidade do contrato. Se posterior caracteriza um distrato ou nova venda. Obs: Não é indispensável que seja firmado no próprio instrumento da compra e venda. · Configura direito pessoal, embora gere efeitos erga omnes e alguns o identifiquem como direito real. · O vendedor, com o pacto, assume apenas um direito de crédito, um jus ad rem e não jus in re. ** O exercício do direito depende apenas do vendedor, que para isto deverá expressar a sua vontade dentro do prazo de resgate, que é decadencial. A declaração do vendedor é unilateral e receptícia. · Não obstante o pacto, o comprador pode exercer todos os atos inerentes ao domínio. · É aplicável tão somente aos contratos de compra e venda. · Destina-se exclusivamente à coisa imóvel. · A compra e venda celebrada com este pacto constitui negócio jurídico sob condição resolutiva potestativa. · Prazo decadencial A Lei Civil fixou apenas o limite máximo, que é de três anos. *Caso a convenção o extrapole, considerar-se-á naquele limite. Se as partes não definiram o prazo este deverá ser o máximo legal. Fixado por tempo inferior ao máximo, as partes poderão prorrogar o prazo, até completar aquele limite, na opinião de Aubry et Rau, mas sem eficácia perante terceiros. ** O prazo deve ser contado a partir da conclusão do contrato e não do registro da escritura. Obs: As partes podem fixar um prazo mínimo, ou seja, condicionando o exercício do direito ao transcurso de determinado tempo. *** Transcorrido o prazo sem a prática do direito potestativo, o pacto perde o seu efeito. Tal prazo não corre contra o incapaz. Pretendendo o vendedor exercitar o seu direito, deverá comunicar a sua intenção ao comprador, não se exigindo para tanto um ato formal. Não basta ao vendedor a declaração tempestiva. Deverá, ainda, dentro no prazo, atender às obrigações financeiras impostas pelo art. 505 do Código Civil: · Restituição do preço; · Reembolso de despesas relativas à compra e a benfeitorias necessárias ou de qualquer outra efetuada com a sua autorização por escrito. Obs: Não incide correção monetária, à vista da sistemática adotada pela Lei Civil, salvo se prevista contratualmente. Embora a nossa Lei não cogite da hipótese, a doutrina considera incabível a fixação de preço maior do que o de venda, para o resgate. Exercido o direito de resgate ocorre a resolução da propriedade, nos termos dos artigos 1.359 e 1.360 do Código Civil, devendo o vendedor reaver a coisa com os seus acréscimos e benfeitorias. O comprador se responsabiliza por eventuais deteriorações da coisa, ocorridas durante o prazo de retrato, ressalvado o seu desgaste natural. O comprador pode gravar a coisa, oferecendo-a em garantia, mas esta deve ser entregue livre e desembaraçada. *Restituição e reembolso O depósito tempestivo das obrigações financeiras, pelo vendedor, é fundamental para que o pacto de retrovenda opere efeitos práticos, devolvendo o domínio ao seu titular primitivo. Obs: O pagamento não deve, necessariamente, passar pelo judiciário, apenas se houver impasse entre os interessados. **Neste caso o vendedor deverá depositar o montante de suas obrigações em Juízo e pleitear a adjudicação compulsória. ***Apenas se dará com o depósito integral. Se o valor consignado for inferior ao devido o requerente poderá complementá-lo. Ao vendedor não caberá o direito de compensação por eventuais frutos auferidos pelo comprador. *Direito de sequela A publicidade dada ao pacto de retrovenda, mediante o registro público da escritura, justifica a possibilidade de o vendedor exercer o direito de resgate contra terceiro. Ao realizar a compra de bem imóvel, cuja propriedade é resolúvel, o contratante possui a consciência da precariedade do domínio adquirido, sujeitando-se, destarte, ao direito de resgate pelo primitivo proprietário. Na observação de Louis Cremieu, enquanto não se esgota o prazo, a situação do terceiro é deincerteza e de insegurança. Art. 507 Esse artigo prevê que o direito de retrato pode ser objeto de cessão por ato inter vivos ou transmissão mortis causa, seja para herdeiros ou legatários. *Titularidade múltipla do direito de resgate *art. 508 Tal situação ocorre na prática, quando a propriedade encontrava-se em condomínio ou o direito de resgate foi transmitido, por ato inter vivos ou mortis causa, a diversas pessoas. · Se os cotitulares acordarem entre si, efetuando-se integralmente o depósito, reassumirãoo elemento subjetivo da doação. A anuência do donatário pode ser expressa ou tácita. A anuência TÁCITA Apenas nas doações puras em que o doador, expressando o seu animus donandi, fixa um prazo para a aceitação e o donatário não emite declaração. **Neste caso, o silêncio é interpretado como aceitação tácita, consoante previsão do art. 539 da Lei Civil. Quem doa, doa alguma coisa a alguém. O elemento objetivo consiste no objeto da liberalidade e sem o qual não se tem doação. A transferência entre os patrimônios opera-se com bens ou vantagens que apresentem valor econômico. Obs: Para que determinado benefício de natureza econômica configure objeto do contrato é necessário que parte do patrimônio do benfeitor se transfira para o do beneficiário. Ou seja, ocorre a diminuição no acervo de bens do doador e o consequente acréscimo no do donatário. CUIDADO!!! Destarte, se um profissional presta serviços em favor de outrem, gratuitamente, ter-se-á um ato de benemerência, não uma doação, embora o fato seja suscetível de avaliação econômica. É que não haverá decréscimo no patrimônio do profissional. A doação pode consistir na transferência de móveis, imóveis ou direitos. As coisas alienáveis podem ser doadas. É possível doação de coisa futura? Divergem os autores quanto à doação de coisa futura. Para o civilista Caio Mário da Silva Pereira, nada impede que a doação se faça nesta circunstância, caso em que haverá uma condição suspensiva. Nada impede, em nosso entendimento que, a exemplo da venda de coisa futura, se admita a doação de coisa inexistente ainda no patrimônio do benfeitor. **Caracteres A doação se caracteriza como contrato unilateral, gratuito e consensual. UNILATERAL Independentemente da espécie – pura ou modal – o contrato de doação é sempre unilateral, pois apenas o doador efetiva a prestação de dar. Obs: O encargo que a doação modal apresenta não constitui contraprestação ou correspectivo do ato de liberalidade, mas obrigação simples e de natureza simbólica em comparação com o objeto da doação. GRATUITO O contrato é sempre gratuito, pois apenas uma das partes se beneficia com o acréscimo em seu patrimônio. Tanto a doação modal quanto a remuneratória, que é motivada por um benefício proporcionado pelo donatário ao doador, possuem a característica de gratuidade. CONSENSUAL O contrato é consensual. Basta o consentimento das partes para que a doação se aperfeiçoe. *Art. 538 do Código Civil, ao referir-se à transferência de bens do patrimônio do benfeitor, para o do beneficiado, induz ao equívoco de se entender que o contrato é de natureza real, perfazendo-se com a entrega do objeto doado. A preocupação do legislador foi esclarecer quanto ao objeto, pois nem toda liberalidade configura ato de doação, mas apenas a que implica a diminuição no acervo patrimonial do benfeitor e o consequente acréscimo no do beneficiado. ** A transferência de domínio se faz segundo as regras gerais previstas no Código Civil: · Para os imóveis, com o registro do título no Registro de Imóveis (art. 1.245, CC); · Para os móveis, mediante a tradição (art. 1.267, CC). Na hipótese em que é permitida a celebração verbal da doação – bem móvel e de pequeno valor – tem-se uma exceção à consensualidade, pois o contrato se aperfeiçoa apenas com a tradição, conforme prevê. * §U do art. 541. FORMAL O contrato de doação é de natureza formal, uma vez que se exige a escritura pública ou particular, como regra geral. Obs: Admite-se a forma verbal para a hipótese destacada no * §U do art. 541. Necessariamente a forma deverá ser por escritura pública, quando o objeto da doação for imóvel de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo do país. Não sendo coisa móvel de pequeno valor, nem imóvel de valor excedente àquele limite, o contrato deverá ser formalizado por instrumento particular, podendo as partes optar por escritura pública. · É lógico que os contratantes poderão formalizar o contrato, ainda quando for livre a forma. **Natureza jurídica Entre os romanos a doação era considerada meio de aquisição da propriedade e não um contrato. *A fim de evitar especulações doutrinárias, o legislador de 2002, a exemplo do que o fizera o de 1916, além de situar a doação, topograficamente, no título que trata Das Várias Espécies de Contrato, referiu-se a ela expressamente como contrato: “Considera-se doação o contrato (...)” **PROMESSA DE DOAÇÃO A doutrina não se apresenta uniforme quanto à possibilidade jurídica da promessa de doação (pactum de donandi). Na opinião de alguns juristas, a obrigação de doar é incompatível com o caráter espontâneo da liberalidade. Se alguém doa porque se comprometeu, o ato de doação não seria exercício da liberdade, mas cumprimento de uma obrigação. Além disto, o contrato preliminar concederia ao promissário o direito de exigir a dádiva, fato este que afrontaria a essência da doação. ** Caio Mário da Silva Pereira se alinha a esta corrente. Na opinião de Washington de Barros Monteiro tal promessa “não contraria qualquer princípio de ordem pública e dispositivo algum a proíbe.” Em igual sentido, o magistério de Pontes de Miranda, que analisa os procedimentos judiciais aplicáveis para se obter a efetividade da doação. Obs: Segundo análise de Humberto Theodoro Jr., a jurisprudência predominante é no sentido de não reconhecer a validade do contrato preliminar de doação, embora se admita a da promessa efetuada em favor de filhos, quando do acordo de separação do casal. NADER Penso que a espontaneidade deve estar presente no pactum de contrahendo, qualquer que seja a modalidade contratual. É naquele momento que as partes se vinculam jurídica e moralmente. O contrato definitivo é mera decorrência do ajuste anterior e não importa se a declaração de vontade não coincida com a razão íntima das partes no momento e seja uma consequência da pressão do contrato anterior. ESPÉCIES Doação pura ou simples · Mais comum. · Não impõe qualquer encargo ao donatário, não visa a compensar serviços prestados, nem subordina os efeitos do contrato a algum acontecimento futuro e incerto. · Resulta do único propósito de beneficiar o donatário. · É uma doação que pode ser mencionada sem qualquer adjetivo. Doação modal ou por encargo *donatione sub modo · Ocorre quando o doador impõe ao donatário a prática de um determinado fato, que não chega a caracterizar-se como obrigação correspectiva do benefício recebido. · OBS: A gratuidade é característica também desta espécie, pois o encargo não possui a conotação de reciprocidade. **Impropriamente é chamada de onerosa pelo art. 562 do Código Civil, sendo certo que oneroso é o negócio jurídico que se contrapõe ao gratuito. · O beneficiário, aceitando a doação, pode ser compelido a cumprir o fato que lhe foi imposto, como prevê o art. 553 do Código Civil. Ao Ministério Público cabe a medida, após a morte do doador e quando o destinatário for a coletividade; se terceiro, este poderá tomar a iniciativa também após o óbito. · Na hipótese de encargo ilícito ou impossível, considerar-se-á inexistente a cláusula que o instituiu, prevalecendo, todavia, a doação. · Por iniciativa do benfeitor a doação poderá ser revogada por inexecução do encargo, à vista do permissivo do art. 555, mas para tanto o beneficiário deverá ser constituído em mora. **Não basta o atraso no cumprimento do dever, pois é essencial que a omissão seja culposa. · O contrato deve conter cláusula indicativa do prazo de cumprimento do dever, mas, caso seja omisso neste ponto, o doador haverá de notificar o donatário, concedendo-lhe tempo razoável para a execução do encargo, segundo prescreve o art. 562 do Código Civil. Doação remuneratória · Esta é a doação que visa a beneficiar alguém pela prática de atos de liberalidade, como serviços ou favores prestados ao doador ou a terceiro, suscetíveis de avaliação econômica, mas sem exigibilidade. · É um ato de reconhecimento. Neste caso, consoante disposição do art. 540 da Lei Civil, considera-se ato de liberalidade a parte excedente aos benefíciosrecebidos. **A parte correspondente a estes últimos considera-se pagamento. · A doação puramente remuneratória não é revogável por ingratidão (art. 564, CC). · Obs: Uma outra espécie de doação, e que se assemelha à remuneratória, é feita em contemplação do merecimento do donatário. Mérito é o valor individual, qualidade intrínseca da pessoa. **Art. 540 do Código Civil refere-se à doação em contemplação do merecimento do donatário, esclarecendo que esta motivação não retira do ato o seu caráter de liberalidade. Doação mista *negotium mixtum cum donatione · Na prática alguns contratos ensejam controvérsia quanto à sua tipicidade: se doação ou compra e venda. · Divergem os autores na classificação do contrato e sua consequente disciplina legal. · Quando se estipula pretium irrisório em contrato intitulado de compra e venda, tem-se caracterizada a ambiguidade: o negócio aparenta uma compra e venda, reunindo os elementos objetivos desta, mas dissimula a intenção de doar. *** Igualmente, quando o preço é muito superior ao valor venal, patenteando a intenção do comprador de beneficiar o vendedor, doando-lhe a substancial diferença. · Penso que o fundamental é certificar-se, em cada caso, da presença do animus donandi, que é o elemento subjetivo caracterizador das doações. Se ausente, ter-se-á contrato de compra e venda. Esta é a posição sustentada, também, por Caio Mário da Silva Pereira. Doação com cláusula de reversão · A fim de permitir a adaptação do contrato de doação aos interesses particulares do doador, o Código Civil brasileiro, pelo art. 547, permite a cláusula de reversão, pela qual os bens doados retornam ao patrimônio do benfeitor caso sobreviva ao beneficiado. · A cláusula não se presume, devendo ser escrita. · Alguém, por exemplo, quer contemplar o irmão mais velho, mas não deseja favorecer aos sobrinhos, que se encontram bem de vida. · Não são todas as legislações que oferecem a conciliação de tais interesses, pois algumas proíbem a cláusula de reversão. · Pelo parágrafo único do citado artigo, é vedada a instituição da cláusula em favor de terceiro. Doação condicional · Dá-se a modalidade quando a transferência do objeto, de um patrimônio para outro, subordina-se a um acontecimento futuro e incerto. · A condição tanto pode ser suspensiva como resolutiva. *Tratando-se de condição simplesmente potestativa ou de fato subordinante ilícito, a cláusula será inválida e a doação prevalecerá, mas incondicionalmente. · OBS: Por outro lado, a doação condicional não se confunde com o contrato preliminar de doação, pois neste a obrigação de celebrar o contrato definitivo não fica na dependência de algum fato incerto e futuro. · No pactum de contrahendo a estrutura lógica apresenta a seguinte composição: Se “A” é, “B” deve ser. Ou seja, se as partes firmaram a promessa (A), na época e condições definidas deverão celebrar o contrato definitivo (B). Na doação condicional suspensiva, a estrutura é diversa: Se “A” é, “B” deve ser, caso se realize “C”. · Na condicional resolutiva, a doação se aperfeiçoa com a declaração de vontade das partes, mas o objeto doado deverá reintegrar o patrimônio do doador, desfazendo-se a doação, caso o acontecimento futuro e incerto, indicado pelas partes, se verifique. · A doação modal e a celebrada com cláusula de reversão (art. 547, CC), pela qual os bens doados reintegram o patrimônio do doador caso sobreviva ao donatário, constituem hipóteses de condição resolutiva. **Doação com cláusula de inalienabilidade vitalícia · O contrato de doação pode conter uma cláusula que impeça o donatário de alienar a coisa recebida. Tal cláusula possui caráter vitalício, mas se extingue com a morte do donatário. *O objeto doado se transmite, portanto, aos herdeiros do donatário, sem o gravame. · Na sistemática do instituto não há qualquer norma a respeito. · Sob a vigência do Código Bevilaqua, Agostinho Alvim dizia: “A cláusula de inalienabilidade poderia figurar nas doações, ainda que a lei não o permitisse expressamente, uma vez que não é ilícita.” · Ora, se há possibilidade jurídica da imposição do gravame na destinação de bens mortis causa, possibilidade também haverá de existir para as doações, pois nenhuma razão especial está a ditar a dualidade de tratamento. *Não haveria coerência lógica se a cláusula pudesse, livremente, ser inserida em testamento, não se tratando de adiantamento de legítima, e não fosse válida inter vivos. · A dúvida pode surgir apenas quando a doação configurar adiantamento de legítima. Ainda aqui, entendo que será válida, podendo o gravame desaparecer com a abertura da sucessão e caso o doador não tenha, junto com o instrumento da doação ou a posteriori, como no testamento, declarado os motivos da cláusula, isto porque o caráter de adiantamento confere ao ato inter vivos a conotação de liberalidade, que deixa de existir com o falecimento do doador. Com o óbito, a liberalidade transmuta-se em direito. · A doação clausulada com o gravame de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade é pura ou simples, não devendo ser confundida com a modal ou com encargo. **DISPOSIÇÕES GERAIS Doação de ascendentes a descendentes ou entre cônjuges Tendo em vista as regras cogentes de sucessão mortis causa, a Lei Civil, pelo art. 544, considera adiantadamente de legítima a doação de ascendentes a descendentes, ou de um cônjuge a favor de outro. · O ascendente pode doar bens a descendente, sem a necessidade da outorga dos demais descendentes, mas no futuro, quando de seu inventário, as dádivas deverão ser levadas à colação – relacionadas e descontadas do quinhão de herança do descendente-donatário. Possuindo herdeiro necessário, o titular do patrimônio pode livremente dispor apenas da metade de seus bens, em vida ou por ato de última vontade, contemplando algum de seus herdeiros, sem que tais bens sejam, futuramente, colacionados. Assim, caso o doador queira realizar a liberalidade, valendo-se de sua quota disponível, haverá de expressar, mediante cláusula, a sua real intenção, pois, do contrário, a doação para descendente haverá de ser considerada adiantamento de legítima. A extensão da regra à doação entre os cônjuges justifica-se porque, pelo Código de 2002, à luz do disposto no art. 1.829, incisos I e II, o cônjuge concorre em igualdade de condições, respectiva e sucessivamente, com os descendentes e os ascendentes. ***Acrescente-se que a doação entre os cônjuges somente é possível quanto aos bens particulares existentes no regime de comunhão parcial de bens. Na comunhão universal o ato de liberalidade não faz sentido, pois todos os bens se comunicam e na separação legal, porque os patrimônios são individuais e incomunicáveis. **Subvenção periódica O art. 545 do Código Civil prevê a hipótese de subvenção periódica ou sucessiva, pela qual o doador institui uma contribuição em favor do donatário, a título gratuito. Geralmente o objeto é constituído por determinada quantia, mas nada impede que se estipule outra modalidade, como a cesta básica ou bolsa de estudos. O contrato pode estabelecer a extensão temporal do benefício, mas a liberalidade não deverá ultrapassar a vida do donatário. Caso não se tenha estipulado o contrário, cessará com a morte do doador. **Conforme preleciona Agostinho Alvim, a hipótese não é de pluralidade de doações “e sim uma só doação, com execução prolongada”. Em consequência, a alteração no estado das pessoas não influencia o ato negocial. Eventual interdição do doador, durante a execução do contrato, em nada compromete ou influencia a relação contratual, que deverá ter continuidade nos termos da convenção. Obs: Nem toda relação habitual, envolvendo doador e donatário, configura a subvenção periódica, podendo caracterizar-se como sucessivos atos de doação, facultada ao doador a desistência da liberalidade a qualquer momento. **Doação propter nuptias Em função de um casamento pode ser instituída uma doação, que tenha por donatário qualquer um dos futuros cônjuges, ambos ou a futura prole do casal. **Doadorpode ser um terceiro ou algum dos cônjuges. Observe-se que a modalidade não se refere a cônjuge, mas a futuro cônjuge (nubente). **Por expressa disposição do art. 546 do Código Civil, a doação só produzirá efeito se o casamento se realizar – si nuptiae fuerint secutae. *Doação condicional suspensiva. Antes do casamento não se terá a transmissão de domínio, não obstante a tradição ou a transcrição no registro imobiliário. Duas particularidades especiais em torno da doação propter nuptias: Não é necessária a aceitação formal no ato de instituição; A doação não é passível de revogação por ingratidão (isto para proteger o casamento contra eventual fator de desagregação). A doutrina revela que o ato de aceitação se acha incluso na celebração do casamento. **Ao externar a declaração de vontade, o cônjuge, ou o casal, estará dizendo sim também à doação. Tal modalidade se denomina doação feita em contemplação decasamento futuro. Questão jurídica complexa é a gerada pela doação à futura prole e em atenção ao matrimônio. Já casados, os futuros pais exercerão a posse do bem doado, mas in casu não haverá fideicomisso, pois este não foi instituído. Também não constitui usufruto, porque não houve desmembramento do direito de propriedade. · Na opinião de Agostinho Alvim, os cônjuges poderão usar e gozar da coisa. **Doação de todos os bens A doação possui, como fundamento moral, a intenção da prática do bem e este se manifesta por ato de solidariedade ao próximo. *Entre os deveres da pessoa humana consta o da implementação da própria sobrevivência e condições básicas de bem-estar. *Na tutela de tais valores, o CC/02 veda a doação de todos os bens, ressalvando a hipótese de o doador possuir rendimentos capazes de manter a sua vida e, naturalmente, a de seus dependentes. Muitas vezes, para que a doação de imóveis se viabilize, a solução que se apresenta é a reserva do direito de usufruto pelo doador. ** A preocupação da Lei Civil é garantir o futuro, mediante as cautelas devidas. OBS: Se, posteriormente às doações legalmente realizadas, determinados fatores, como o de prejuízos nos negócios ou doença, levarem o doador à miséria, os atos pretéritos de liberalidade não poderão ser abalados. Doação inoficiosa Os proprietários de bens, que tenham herdeiros necessários, encontram no art. 549 do Código Civil uma restrição à liberdade de doar, delimitada, no momento da liberalidade, ao que poderiam dispor em testamento. O art. 1.789 considera disponível, havendo herdeiros necessários, apenas a metade da herança. Importante a destacar-se é que o momento de definição da parte disponível é o da liberalidade, segundo o Código Civil de 2002. Contudo, o CPC 2015 determinou que o momento de definição da parte disponível é o momento da abertura da sucessão para a avaliação do acervo. Chama-se doação inoficiosa a parte excedente à disponibilidade do doador. A violação do limite legal não implica a nulidade do contrato de doação, mas apenas a da parte inoficiosa. O objetivo de tal regra é proteger a legítima dos herdeiros necessários. **Doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice Embora usufruindo da capacidade de fato, o cônjuge adúltero carece de legitimidade para fazer doações ao seu cúmplice. **O art. 550 do Código Civil (não distingue o regime de bens no casamento, nem se refere ao valor da coisa doada). O contrato realizado nestas condições é anulável, cabendo a iniciativa do pleito judicial ao cônjuge interessado e aos herdeiros necessários, que poderão fazê-lo até dois anos da dissolução da sociedade conjugal. Basta ao cônjuge inocente reunir a prova de que o seu consorte manteve relações sexuais com a pessoa beneficiada. *Sujeito passivo na ação processual não é apenas o donatário, mas também o cônjuge-doador. ** Doação conjuntiva A doação em comum, realizada ao mesmo tempo a diversas pessoas, denomina-se conjuntiva e está prevista na Lei Civil, art. 551. Quando mais de uma pessoa for destinatária do ato de liberalidade, não havendo indicação do quinhão de cada uma, presume-se que a intenção do benfeitor foi doar partes iguais. · Se os bens forem divisíveis, dificuldade não haverá para a transmissão da propriedade; · Se indivisíveis, instaura-se o condomínio, sendo certo que os donatários não gozarão do direito de acrescer, ou seja, o quinhão do donatário falecido não será distribuído aos demais donatários. Obs: Tal regra, porém, é dispositiva, podendo o doador estipular o direito de acrescer. ** Orientação diversa deve ser adotada quando os donatários forem marido e mulher, pois determina o parágrafo único do referido artigo, que o objeto da doação subsistirá na totalidade para o cônjuge sobrevivente. Se apenas um dos cônjuges for donatário e vier a falecer, incabível, ao sobrevivente, o direito de acrescer. **Juros moratórios, evicção e vícios redibitórios Como a doação é contrato consensual, o doador obriga-se a entregar o objeto ao donatário. · Eventual atraso no cumprimento da obrigação não lhe acarreta os efeitos ordinários da mora, consoante prescreve o art. 552 da Lei Civil, que exonera o doador do pagamento de juros moratórios. · Devido também à gratuidade do contrato, o doador não responde pela evicção e vícios redibitórios. OBS: Tais disposições se aplicam às doações puras, pois nas modais ou com encargo o doador não fica isento da responsabilidade. CUIDADO!! O doador responde pelos riscos da evicção, tratando-se de doação para casamento com certa e determinada pessoa. *Regra é supletiva, comportando destarte convenção em contrário. **Doação à entidade futura No exercício de sua liberdade de praticar atos de liberalidade, o doador pode contemplar pessoas físicas ou jurídicas já existentes, em formação ou de criação futura. Ex: O art. 542 faz menção expressa à doação ao nascituro. Para esta, todavia, a Lei Civil prevê a caducidade da doação caso não se organize regularmente em dois anos. Destinatário da liberalidade não é apenas a pessoa jurídica de Direito Privado ou Público, mas ainda os entes não personificados, como o espólio, a massa falida, o condomínio. **REVOGAÇÃO DA DOAÇÃO Tendo em vista o conteúdo moral que os atos de liberalidade encerram, permite o Código Civil que, em determinadas situações, caracterizadoras de ingratidão, a doação seja revogada. *Um outro motivo pode levar à revogação: o incumprimento da obrigação nas doações com encargo, matéria já examinada neste capítulo. **Em princípio, portanto, a doação é irrevogável. · Irrenunciabilidade antecipada do direito de revogação Norma de natureza cogente impede o doador de renunciar, antecipadamente, o direito de revogar o ato de liberalidade. Tal renúncia não teria apoio na moral, do mesmo modo que o ato de perdoar por uma infração ainda não cometida. A possibilidade da revogação constitui, também, elemento inibidor da prática de atos de ingratidão. A Lei Civil, pelo art. 556, veda apenas a renúncia antecipada. ***À vista de um ato concreto de ingratidão, não há impedimento à renúncia ao direito de revogar a doação. É indispensável que o doador tenha pleno conhecimento do fato e de seu autor. ***Observe-se que apenas o donatário pratica atos de ingratidão. Se uma ofensa física ou moral é praticada contra o doador, mas por terceiro e sem a participação do donatário, o ato não pode ser qualificado como ingratidão. A renúncia pode ser expressa ou tácita. A renúncia tácita deve se traduzir por demonstrações inequívocas, como seria a hipótese de se praticar nova liberalidade em favor do donatário, estando ciente do ato de ingratidão e de sua autoria. **Doações irrevogáveis por ingratidão Nem toda espécie de doação comporta revogação por atos de ingratidão, apenas as doações puras. Não são suscetíveis de revogação *art. 564: · As doações puramente remuneratórias; * não seria apropriado qualificar qualquer conduta do donatário como ingratidão, uma vez que o doador apenas compensou benefícios recebidos.** Donatário não possui dívida moral em face do doador. Obs: a parte da doação não correspondenteà remuneração poderá ser revogada. · As oneradas com encargo já cumprido; ** A revogação por ingratidão é cabível apenas quando o encargo não foi cumprido. · As que se fizerem em cumprimento de obrigação natural; * Os fundamentos da irrevogabilidade se assemelham aos da doação puramente remuneratória. Na obrigação natural a dívida existe, apenas não é exigível. ** Doação efetuada nestas condições não é reveladora de benemerência, mas de reconhecimento de uma obrigação · As feitas para determinado casamento. * Embora o donatário tenha o dever moral de gratidão, a lei visa a salvaguardar o casamento de um fato que possa comprometer a estabilidade conjugal. ** Hipóteses de ingratidão do donatário A ingratidão é sempre um ato contra aquele a quem se deve gratidão, mas a ação que a caracteriza pode atingir diretamente o doador ou a membro de sua família: cônjuge, ascendente, descendente, ainda que adotivo, ou irmão. As ofensas estão discriminadas no art. 557: · Se o donatário atentou contra a vida do doador ou cometeu crime de homicídio doloso contra ele; · Se cometeu contra ele ofensa física; · Se o injuriou gravemente ou o caluniou; · Se, podendo ministrá-los, recusou ao doador os alimentos de que este necessitava. A enumeração legal é taxativa, não comportando interpretação extensiva. **A difamação, não incluída no elenco, não constitui assim motivo de revogação. Obs: No elenco, que o legislador não se refere a lesões corporais, mas a ofensas físicas – expressão mais abrangente e compreensiva de agressões que não deixam marcas. **A iniciativa da revogação Parte legítima para propor a ação anulatória de doação é o doador, ainda que as ofensas tenham sido praticadas contra outros membros de sua família. A ação deverá ser ajuizada no prazo decadencial de um ano, contado da ciência do fato e de sua autoria. O direito de revogar não se transmite aos herdeiros, mas estes poderão dar continuidade à ação judicial, caso ocorra o falecimento do doador no curso do processo. Há uma hipótese, porém, em que os herdeiros poderão ajuizar o pedido revocatório caso o doador não tenha manifestado o seu perdão: homicídio doloso na pessoa do doador. **Por outro lado, contra os herdeiros do donatário a ação não pode ser interposta, apenas continuada. Se o donatário chegou a ser validamente citado, falecendo em seguida, o feito poderá ter prosseguimento contra os seus herdeiros. Efeitos da revogação Efetivada a revogação do ato de liberalidade, a relação entre doador e donatário deverá retornar ao statu quo ante, volvendo a coisa doada ao domínio e posse do benfeitor. Caso isto não seja possível, o donatário deverá indenizar ao doador segundo o meio termo do valor, ou seja, a média entre o valor à época da doação e à da revogação. Tendo em vista a boa-fé do beneficiado, este terá direito à indenização pelas benfeitorias necessárias e úteis, anteriormente feitas, podendo exercer o direito de retenção. Relativamente às voluptuárias, poderá removê-las, se isto for possível e caso o doador não queira por elas pagar. **Caso o donatário edifique benfeitorias, após a citação, terá direito de ressarcimento apenas das necessárias. Por expressa disposição do art. 563, a revogação não prejudica os direitos adquiridos por terceiros. Se a coisa foi alienada antes do ato de ingratidão, não se poderá negar a boa-fé do donatário e do adquirente no ato negocial. Quanto aos frutos, o donatário não será obrigado a restituir os percebidos antes da citação válida, mas deverá pagar pelos posteriores. LOCAÇÃO DAS COISAS *Art. 565 ao art. 578 CONSIDERAÇÕES PRÉVIAS Em nosso País, a relação ex locato possui três documentos legais básicos: · Código Civil, artigos 565 a 578; · Lei nº 8.245, de 18.10.1991 – Lei do Inquilinato; *índole de proteção ao locatário. · Lei nº 4.504, de 30.11.1964 – Estatuto da Terra, artigos 95 e 95-A. Além destes, há regras especiais, como as dos artigos 86 a 98, do Decreto-Lei nº 9.760, de 05.09.1946, que dispõem sobre a locação de imóveis urbanos da União. O Código Civil: Formula os princípios gerais da matéria, juntamente com leis especiais regula a locação de imóveis pertencentes à União, aos Estados, aos Municípios, e às suas autarquias e fundações públicas. É o estatuto aplicável, também, aos apart-hotéis, hotéis-residência ou equiparados, arrendamento mercantil (leasing) e à locação de vagas autônomas de garagem ou de espaços para estacionamento de veículos ou destinados à publicidade. O Código Civil é também o estatuto aplicável à locação de coisa móvel não fungível, de acordo com a prescrição do art. 565. Para a Teresa Ancona o sistema built-tosuit (construir para usar), contrato pelo qual o empreendedor-construtor se obriga a edificar, sob as suas expensas e de acordo com as especificações fornecidas pelo futuro locatário, o objeto da locação, em princípio se sujeitaria à Lei do Inquilinato, que rege a locação comercial, mas tendo em vista o princípio da revisão por onerosidade excessiva, consagrado pelo atual Código Civil (artigos 478 a 480), a relação deve subordinar-se a este diploma legal (Código Civil). As locações regidas pelo Código Civil poderão se subsumir aos princípios do Código de Defesa do Consumidor, desde que se caracterize uma relação entre fornecedor e consumidor. A Lei do Inquilinato regula a locação de imóvel urbano, com as exceções trazidas em seu art. 1º, parágrafo único e disciplinadas no Código Civil. Trata-se de instituto uno, que dispõe tanto sobre os direitos e deveres das partes, quanto sobre os procedimentos judiciais correspondentes, ou seja, apresenta normas materiais e formais. Quanto à locação rural, as normas são as do Estatuto da Terra, aplicando-se subsidiariamente as disposições do Código Civil. Imóvel Urbano ≠ Imóvel Rural Para efeito de incidência de tributo, o imóvel se classifica como urbano ou rural conforme a sua localização dentro ou fora, respectivamente, do perímetro da cidade. Do ponto de vista locatício, o critério é distinto, pois leva-se em consideração a finalidade da locação. · Imóvel rural é aquele que se destina às atividades de exploração da terra ou da pecuária, independentemente de sua localização. · Imóvel urbano é aquele que tem por objetivo da locação não for a plantação ou criação de animais. Há hipóteses em que a definição se torna difícil, pois a locação reúne elementos de uma e de outra natureza. Neste caso, a distinção se opera pelo quesito predominância: se o imóvel, além de conter casa edificada, onde o locatário reside com a família, possui terreno com plantações e criação de aves, há de se apurar a função principal da locação e esta indicará o estatuto aplicável. Quanto à locação, especificamente, a legislação não oferece regras hermenêuticas. Segundo Baudry-Lacantinerie e Albert Wahl, por tradição a jurisprudência francesa interpreta sempre contra o locador. ** Tal opção, todavia, se impõe apenas quando os recursos hermenêuticos não revelam, com segurança, a real intenção dos contratantes, restando ambígua a declaração de vontade. ** Conceito Dá-se o contrato de locação, quando uma parte (locador) se obriga a ceder o USO e o GOZO de coisa não fungível à outra (locatário), temporariamente, mediante promessa de certa prestação. Nas locações residenciais, quem entrega a coisa é também chamado por SENHORIO e nas locações urbanas quem a recebe é igualmente denominado por INQUILINO. Gozo haverá se a coisa produz frutos, mas nada impede que a locação se limite à cessão para uso. Fruto e produtos gerados pelo objeto de locação na vigência do contrato Há de se distinguir os ordinários dos extraordinários. ** O direito de gozo do locatário, na lição dos juristas, limita-se aos FRUTOS ORDINÁRIOS. ** As partes podem convencionar a respeito, pois a matéria é de ordem privada. Frutos ordinários São os produzidos regularmente pela coisa e que não afetam a sua substância, como os frutos naturais. Produtos ordinários São os extraídos da coisa, diminuindo-lhe a substância, comoa extração de minério. Ocorrendo, na vigência do contrato, o fato jurídico da acessão[footnoteRef:3], esta não integrará o objeto da locação, salvo previsão contratual. [3: É o direito do proprietário de acrescer aos seus bens tudo o que se incorpora, natural ou artificialmente, a eles . Trata-se de modo originário de aquisição de coisa que pertence a outrem, pelo fato de se considerar acessória da principal. A acessão pode se dar pela formação de ilhas, por aluvião, avulsão, por abandono de álveo, pela construção de obras ou plantações.] As servidões ativas, constituindo qualitates praediorum, fazem parte do objeto da locação, como as de trânsito e de aqueduto. A locação pode ser objeto de contrato preliminar e de acordo com a disciplina criada, genericamente, pelo Código Civil de 2002, artigos 462 a 466. O contrato de locação apresenta contornos fáticos e jurídicos bem definidos, que permitem a sua distinção de qualquer outro. Locação e Compra e Venda **A semelhança com a compra e venda é grande, pois em ambos contratos “entrega-se a coisa e paga-se um preço em dinheiro”. Distinguem-se por diversos aspectos: LOCAÇÃO COMPRA E VENDA Confere ao inquilino apenas o direito de uso e gozo da coisa; Confere a aquisição de domínio implica o poder de uso, gozo e disponibilidade; Efeitos do contrato locatício são transitórios, dada a temporariedade da relação; Resultados são perpétuos; As coisas fora do comércio podem ser locadas; As coisas fora do comércio não podem ser vendidas; O locador responde também pelos vícios redibitórios supervenientes à formação do contrato; O vendedor responsabiliza-se apenas pelos vícios redibitórios coetâneos à venda; Os riscos para o locador perduram, de acordo com o princípio res perit domino; Os riscos da coisa cessam com a entrega; O locatário só pode usar a coisa nos termos do destino convencionado; Quem recebe a coisa porque a comprou, pode usá-la livremente; Locação e Comodato Alguns autores consideram o contrato de comodato o mais semelhante ao de locação. Ambos são temporários e têm por objeto coisa infungível, que se entrega para uso, gozo e restituição. Locação Contrato oneroso. Comodato é gratuito em essência. Há semelhanças expressivas entre a locação e o direito de superfície, previsto nos artigos 1.369 a 1.377 do Código Civil. Por este instituto, o proprietário entrega um terreno para o superficiário construir ou plantar, por tempo determinado, volvendo o imóvel ao proprietário, com as acessões, findo o prazo contratual e sem direito de indenização, salvo ajuste em contrário. *A concessão do direito de superfície pode ser a título gratuito ou mediante pagamento único ou dividido. A parecença maior entre as duas figuras se destaca quando o superficiário se obriga a pagar parceladamente. **Enquanto a superfície gera um direito real, a locação gera direito pessoal. O locatário não tem o direito de ceder ou sublocar, salvo com anuência do locador, já o superficiário pode transferir onerosamente o seu direito pelo tempo restante. Enquanto o locatário possui o direito de retenção por benfeitorias necessárias e úteis, estas se autorizadas, no direito de superfície as acessões se incorporam ao imóvel e não geram aquele direito. Distinguem-se as duas figuras, ainda, quanto à forma, que é livre na locação, mas solene no direito de superfície, pois este se institui mediante escritura pública, registrada no Cartório do Registro de Imóveis. **Elementos O contrato de locação é integrado por quatro elementos essenciais: · · Consentimento; · Coisa; · Preço; · Prazo; Obs: Caio Mário da Silva Pereira inclui a forma. CONSENTIMENTO O vínculo se estabelece apenas quando, a par da presença dos demais elementos, locador e locatário manifestam a sua vontade na formação da relação ex locato. **Como em todo contrato, o consentimento pressupõe a capacidade do agente, tanto a de fato, quanto a jurídica. Para ceder a coisa em locação não é preciso a titularidade do domínio, bastando a posse, daí a legitimidade do usufrutuário, do locatário que se obriga a sublocar, do credor anticrético. Tratando-se de condomínio, os coproprietários decidem sobre a conveniência de alugar a coisa comum. **Em igualdade de condições, o condômino terá preferência na locação em relação a estranhos. COISA Objeto da locação é a coisa móvel ou imóvel, não fungível, cedida pelo locador, para fins de uso e gozo. Os móveis em geral podem ser alugados, como o automóvel, a roupa, a televisão, o livro. O objeto pode recair, também, em uma universalidade de coisas. Obs: Como a duração dos efeitos contratuais é temporária, as coisas consumíveis não podem figurar como objeto da locação. ***Desde que não se destine ao consumo, a coisa fungível pode ser alugada ad pompam vel ostentationem, como seria o caso de frutas e ingredientes cedidos para figuração ornamental. Neste caso as partes deram à coisa o caráter infungível e inconsumível. **Os imóveis em geral podem ser objetos da locação, inclusive os que se encontram fora do comércio, como os gravados com a cláusula de inalienabilidade. Indaga-se, doutrinariamente, se o objeto da locação pode recair sobre direitos, como o de caça e pesca ou concessões. Como os direitos não se enquadram na categoria de coisa Impõe-se a resposta negativa. **Desde, todavia, que não haja afronta a normas de ordem pública, os interessados poderão convencionar contratos atípicos, transferindo, temporariamente, o direito de exploração de direitos. PREÇO A contraprestação do locatário se faz com o pagamento do aluguel, também denominado por aluguer ou renda, feito geralmente em dinheiro. Nada impede que seja integrado por frutos, produtos ou representado por benfeitorias, simples trabalhos de conservação, mediante convenção das partes, descontando-se dos aluguéis devidos as despesas efetuadas. Obs: O valor do aluguel deve ser determinado ou determinável mediante critérios objetivos, como o de percentual sobre os lucros ou mensalidades pagas em estabelecimentos de ensino. **Na generalidade dos contratos estipula-se o pagamento mensal, mas nada impede a opção por outra periodicidade. PRAZO O prazo figura no conceito de locação como um de seus elementos essenciais. É a coordenada tempo, durante a qual o contrato permanece vigente. A temporariedade significa que a relação não é definitiva ou perpétua, mas transitória. Neste ponto, como em outros, a locação se distingue do contrato de compra e venda, pois neste os efeitos são permanentes. **O prazo contratual pode ser por tempo determinado ou indeterminado, estando livres as partes para a sua estipulação. **O Direito pátrio não definiu o tempo máximo de duração. A inconveniência de não se fixar um prazo máximo é permitir-se à locação um efeito praticamente perpétuo, uma verdadeira compra e venda a prazo. **Caracteres O contrato de locação é bilateral, consensual, oneroso, comutativo, detrato sucessivo, temporário e não personalíssimo. BILATERALIDADE Locador e locatário assumem, na relação, direitos e obrigações correspectivos, daí a bilateralidade do vínculo. CONSENSUAL Perfaz-se com a simples declaração de vontade das partes. O locador apenas se compromete a ceder a coisa para uso e gozo, enquanto o locatário se obriga ao pagamento dos aluguéis. A entrega não é elemento contratual, mas obrigação assumida pelo locador. DE FORMA LIVRE Não se trata de contrato formal ou solene, pois a forma é livre. As partes podem optar por instrumento público ou privado ou então pela oralidade. A superioridade do contrato por escrito prende-se: a) à prova do vínculo e de suas cláusulas; b) ao fato de ser condição para o exercício do direito de preferência em caso de venda, na locação predial urbana, quando então o contrato deverá ser averbado junto à matrícula do imóvel e com antecedência de um mês da alienação; c) à hipótese de a coisa alugada ser objeto de venda e o locatário pretender neutralizar o princípio a venda rompe a locação. **Para tanto, o contratonecessariamente deverá ser por escrito e apresentar cláusula de vigência em caso de venda, além de registrado em Cartório de Títulos e Documentos ou de Registro de Imóveis, segundo se trate de coisa móvel ou imóvel. ONEROSIDADE A onerosidade decorre do fato de que ambas as partes obtêm vantagens no contrato: o locador, mediante os aluguéis; o locatário, com o direito de uso e gozo da coisa. COMUTATIVO Além do equilíbrio entre a prestação e a contraprestação, estas são obrigações certas e previamente definidas. DE TRATO SUCESSIVO É contrato de trato sucessivo, pois as obrigações das partes não cessam com o seu cumprimento, prolongando-se durante a vigência da locação. ** Trata-se de contrato temporário, pois não comporta cláusula de vigência perpétua. NÃO PERSONALÍSSIMO O contrato é não personalíssimo ou impessoal, pois a relação jurídica pode apresentar modificação subjetiva, seja por ato inter vivos, como na cessão e na sublocação, seja por mortis causa. ** No exercício de sua liberdade de contratar, as partes podem dar ao contrato um caráter intuitu personae. · O contrato de locação não gera para o locatário um direito real sobre a coisa alheia, mas um direito pessoal, ainda quando exista cláusula de vigência para a hipótese de venda. ** REGRAS BÁSICAS DO CÓDIGO CIVIL ** Primeiro é preciso definir o regime que será aplicado. *Obrigações do locador A obrigação fundamental do locador é a entrega da coisa e suas pertenças ou componentes básicos, de acordo com a forma e prazo estabelecidos. ** Geralmente a entrega se faz no momento em que se forma o laço contratual, mas as partes podem fixar dies a quo. **Pode ser material ou simbólica, como no ato em que o locatário recebe as chaves do imóvel. A entrega pode até não ocorrer, como se dá quando a coisa se encontrava em mãos do locatário ao se formar o contrato. Não basta a entrega da coisa. Ela deve chegar ao poder do locatário em condições de ser usada de acordo com a finalidade prevista. É do locador, ainda, o encargo de manter a coisa nesse estado, durante a locação. Ex: Se a chuva de granizo, por exemplo, destrói vidraças, cabe ao locador os reparos devidos. Na prática, às vezes o locatário assume o ônus de efetuar os reparos, compensando-se as despesas com os aluguéis vindouros. Na hipótese de ocorrer a deterioração da coisa sem culpa do locatário, a este assiste o direito à redução proporcional do aluguel ou a resolução do contrato. ** Pela interpretação sistemática, o locatário terá uma terceira opção: exigir os reparos devidos, pois tal preceito impõe ao locador a obrigação de manter a coisa, durante o tempo do contrato, em “estado de servir ao uso a que se destina”. Obs: Se o locador não efetiva a entrega da coisa nos termos da convenção, haverá infração contratual, pois não se cumpriu o que se prometeu, assistindo ao locatário o direito de pleitear a resolução e o ressarcimento por perdas e danos. Ao locador cumpre, ainda, garantir ao locatário, durante o tempo da locação, o uso pacífico da coisa. **A obrigação do locador não se limita à abstenção de atos provocadores de turbação ou esbulho, mas inclui as providências necessárias à eliminação de eventuais defeitos ou vícios da coisa, bem como a defesa da posse contra os que se intitulam com direitos ao objeto da locação. Obs: Saliente-se que o locatário possui legitimidade para ajuizar interditos possessórios, inclusive em face do locador, sempre que necessários à proteção de sua posse. É obrigação conjunta das partes o respeito ao prazo contratual. O art. 571, em sua primeira parte, prevê a hipótese de o locador, unilateralmente, dar por finda a locação antes de esgotado o prazo. Tal possibilidade constitui, no dizer de Clóvis Beviláqua, “uma atenuação ao efeito da estipulação do prazo no contrato de locação.” Com esta iniciativa o locador assume a responsabilidade por perdas e danos impostos ao locatário, que poderá exercer o jus retentionis, enquanto não ressarcido. Em face do princípio da autonomia da vontade, os contratantes podem excluir o direito de arrependimento. Na prática a extinção do vínculo locatício antes do dies ad quem é de configuração difícil, pois, ressalvada a hipótese de longos prazos contratuais, a questão tende a não ser solucionada judicialmente antes de findo o prazo da locação. Se as partes optaram por cláusula penal, que é a prefixação do quantum devido em caso de indenização, diverso será o encaminhamento do pleito perante o judiciário, podendo o arrependimento tornar-se eficaz para o locador. Obs: A entrega do imóvel requer a sua prévia desocupação. Se o locatário pretende entregá-lo, mas conservando alguns móveis no local, a título de abandono ou não, o locador não estará obrigado a recebê-lo, pois o seu poder de uso do bem não estará restituído (v. acórdão do STJ, AR/3720, de 15.12.2008). **Obrigações do locatário Dado o caráter sinalagmático e oneroso do contrato, o locatário assume obrigações em favor do locador, figurando, em primeiro plano, a de utilizar a coisa de acordo com a finalidade convencionada ou presumida. ** Se a coisa for usada diversamente do modo devido, poderá o locador pleitear perdas e danos, devendo, naturalmente, comprovar os prejuízos sofridos. Este mesmo ressarcimento é cabível, ocorrendo a deterioração ou perda total do objeto por culpa do locatário (art. 570). Na falta de estipulação e de elementos formadores da presunção, a modalidade de uso deverá resultar da natureza da coisa e das circunstâncias da locação. Tal orientação dimana do art. 569, I, que impõe ainda ao locatário a obrigação de cuidar da coisa como se dono fosse. O aluguel é a contraprestação devida pelo locatário. ** Geralmente a periodicidade é mensal, mas nada impede que se estipule diversamente, inclusive o pagamento antecipado. As partes possuem liberdade para fixar o quantum do aluguel e dispor sobre a sua revisão. **Ordinariamente o pagamento se faz em dinheiro, nada obstando que seja, em parte ou não, in natura. Não basta o pagamento, pois é preciso que este seja pontual e compreensivo de todas as obrigações financeiras: aluguel, taxas diversas, como a condominial, as de consumo de gás, água, luz, além da parcela do imposto predial, se convencionada. Caso terceiros pratiquem atos de turbação ou de esbulho, alegando direito de propriedade, o locatário deverá dar ciência imediata do fato ao locador, a fim de que este pratique os atos judiciais devidos, pois é de seu dever garantir ao locatário, durante todo o tempo da locação, o uso pacífico da coisa, e de praticar a tutela de seus próprios direitos. *Finda a locação, deverá o locatário entregar a coisa no estado em que a recebeu, relevando-se os desgastes naturais de uso e os devidos pela ação do tempo. O prazo contratual deve ser cumprido, mas a Lei Civil faculta às partes o rompimento do vínculo antes do dies ad quem. O locatário ficará sujeito ao pagamento da multa contratual proporcional ao período de cumprimento do contrato, caso entregue a coisa antes de findo o prazo do contrato. A orientação é no sentido de que o juiz fixe a indenização em bases razoáveis, caso reconheça que a aplicação da fórmula legal tornaria excessivo o valor da indenização. A relação ex locato vencido o prazo contratual Tratando-se de locação por tempo determinado, a relação locatícia se extingue ao término do prazo, independentemente de notificação ou aviso. Caso o locatário não entregue a coisa o silêncio do locador acarretará a presunção de prorrogação do contrato, que se tornará por prazo indeterminado, mantido o valor do aluguel. **Presunção juris tantum (relativa) da prorrogação, pois o silêncio do locador pode ser meramente fortuito e não intencional, quando então a presunção deixa de prevalecer. ** O Código Civil não estipula prazo para a oposição à continuidade da locação, mas a Lei do Inquilinato, para hipótese semelhante, prevê trinta dias (art. 46, § 1º), regra que deverá ser observada por analogia. Se o locatário permanecer na posse da coisa alugada, depois da oposiçãodo locador, a sua posse se tornará injusta e caracterizará esbulho possessório. Ao locador caberá o ajuizamento da ação de reintegração de posse, nos termos dos artigos 560 a 566 do novo Código de Processo Civil. Embora não haja norma expressa, deve-se entender que o contrato se prorroga em sua totalidade e não apenas quanto ao vínculo locatício, persistindo assim as regras convencionadas. Caso o locador pretenda reaver o imóvel, nas locações por tempo indeterminado, deverá notificar o locatário de sua intenção. O Código Civil não define o prazo para a restituição, mas a doutrina entende que deva ser de trinta dias. Não atendendo à notificação, o locatário se sujeitará: a) ao valor do aluguel arbitrado pelo locador, enquanto não entregar o objeto da locação; b) assumirá os riscos da coisa, decorrentes de caso fortuito (art. 575). Caso o valor arbitrado em causa própria seja excessivo, diz a Lei Civil, no parágrafo único do artigo, que “poderá o juiz reduzi-lo, mas tendo sempre em conta o seu caráter de penalidade.” ******* Ou seja, o quantum deverá corresponder ao valor real da locação, acrescido de parcela razoável a título de penalidade, daí ser chamado por aluguel-pena. **Venda rompe locação Na hipótese de a coisa alugada ser alienada no curso do contrato, a regra geral é que a venda rompe a locação. **O adquirente não é obrigado a respeitar os termos do contrato vigente, seja este por tempo determinado ou não. Tal regra é dispositiva, podendo as partes prever que a relação ex locato será mantida para o locatário em caso de alienação. Quando o adquirente não for obrigado a respeitar o contrato de locação, haverá de conceder o prazo de noventa dias para a entrega da coisa, sendo esta imóvel. **Morte de uma das partes Haverá a substituição do de cujus por seus herdeiros. O legislador civil não considera o contrato locatício uma relação intuitu personae, mas as partes podem afastar tal disposição, convencionando a extinção do vínculo em caso de morte, uma vez que a matéria não envolve princípios de ordem pública. **Direito de retenção por benfeitorias Também assiste ao locatário, quando edificar benfeitorias necessárias ou úteis. Quanto a estas, desde que tenham sido feitas com autorização expressa do locador. **Locação de abrigos de garagens em condomínio horizontal Excetuados os edifícios-garagens, as vagas para veículos em condomínio horizontal somente podem ser alugadas a pessoas estranhas ao condomínio quando a convenção assim autorizar, à vista da atual redação do art. 1.331, § 1º, do Código Civil, trazida pela Lei nº 12.607/2012. ** Em condições iguais, dá preferência aos condôminos em relação aos estranhos e, entre todos, aos possuidores. COMODATO *art. 579 a 585 Dá-se o contrato de empréstimo quando alguém coloca à disposição de outrem a coisa móvel ou imóvel, para uso, gozo e restituição, em espécie ou gênero. O empréstimo possui dois tipos contratuais: · Comodato (prestito ad uso) *Coisa infungível · Mútuo (prestito di consumazione) *Coisa fungível A característica essencial do contrato de empréstimo consiste no fato de alguém entregar a outrem uma coisa para dela se servir. * Ambos são contratos reais, que se perfazem pela entrega da coisa. Enquanto no comodato a coisa é infungível, gerando para o comodatário a obrigação de devolver um corpo certo, no mútuo o empréstimo é de coisa fungível, consumível, pelo que a restituição se faz de acordo com o gênero. O comodato é contrato essencialmente gratuito, enquanto o mútuo pode não o ser. A distinção entre as duas modalidades apresenta efeitos jurídicos práticos, pois enquanto o comodante continua proprietário da coisa e por isto responde pelos riscos, o mutuante perde o domínio ao emprestar a coisa, ficando os riscos por conta do mutuário – res perit domino (a coisa perece por conta do dono). CONCEITO Espécie do gênero empréstimo, comodato é o contrato pelo qual o comodante entrega uma coisa móvel ou imóvel, infungível, ao comodatário, gratuita e temporariamente, para a finalidade de uso e gozo. **Não se opera a transmissão da propriedade, apenas a posse. A prática do commodatum é generalizada, especialmente no âmbito familiar e nos círculos de amizade, onde é comum o empréstimo gratuito de livros, veículos, peças de vestuário, imóveis residenciais, sobretudo para fins-desemana ou férias. * Mas as partes convencionam o empréstimo e a devolução da coisa com fundamento nos convencionalismos sociais e não em princípios jurídicos. Como o fator econômico é uma das molas da sociedade, senão a maior, entre estranhos não há motivação para o exercício desse contrato, dado o seu caráter gratuito, salvo a presença de outras modalidades de interesse, como a do empregador que cede em comodato um imóvel para o seu funcionário. É comum, também, a formação de comodato, após a separação judicial de casais. Não apenas o proprietário pode ceder a coisa em comodato, mas também o usufrutuário. ** Penso que o locatário, quando autorizado contratualmente, pode figurar na relação contratual na qualidade de comodante. Trata-se de comodato inexistente quando a coisa cedida, para uso e gozo, já pertence ao comodatário. Por outro lado, extingue-se o comodato quando o comodatário adquire o domínio do objeto. Como todo contrato, o commodatum requer o consentimento das partes. Há de haver, entre ambas, igual intenção. Se houver, por qualquer motivo, desencontro de vontades, contrato não haverá. A capacidade exigida das partes contratantes é a civil em geral e a validade do contrato requer a observância do disposto no art. 104 do Código Civil. **Tendo em vista a gratuidade do contrato, os administradores em geral estão impedidos de dar em comodato os bens que lhes foram confiados, salvo autorização especial, segundo prescreve o art. 580 do Códex, que faz menção especial aos tutores e curadores. Doutrinariamente discute-se a validade da promessa de comodato, a exemplo do questionamento em torno da validade da promessa de doação. Com apoio nas razões apresentadas na análise deste último instituto, entendemos ser o commodatum juridicamente válido e exigível a sua execução. Não vislumbramos contradição entre o caráter gratuito do comodato e a possibilidade de sua concreção coercitiva. A espontaneidade do comodante deve estar presente, necessariamente, no ato da promessa, como em geral em todos os pré-contratos e não, necessariamente, no contrato definitivo. Contrária aos princípios morais seria a promessa não cumprida e não a exigência do que se prometeu. Objeto contratual a coisa móvel ou imóvel, infungível (O comodatário assume a obrigação de restituir a porção física recebida). Admite-se que a coisa fungível seja objeto, desde que o empréstimo não se destine a consumo, mas para exibição – ad pompam vel ostentationem. Não é a natureza física da coisa, adverte Laurent, que decide se ela pode ser ou não objeto de comodato, mas a vontade das partes. Quanto aos bens fora do comércio, nada impede que figurem na relação como objeto de comodato, pois a vedação que lhes pesa é apenas de alienação. Na lição de Cunha Gonçalves, é válido o comodato que tem por objeto a coisa alheia, inclusive a usurpada ou furtada, mas o contrato não produzirá efeito em relação ao proprietário. A tradição é elemento essencial do contrato, sem a qual este não se perfaz. Pode efetivar-se materialmente ou de modo simbólico, quando, por exemplo, entrega-se a chave de um apartamento ao contratante. Pode-se cogitar, também, de uma entrega implícita ou subentendida, que se dá quando, ao formar-se o comodato, a coisa se encontra em poder do comodatário. *** Seria a hipótese de alguém, que deixou um veículo no conserto, combinar com o técnico, posteriormente, o empréstimo gratuito da coisa. CARACTERES O contrato de comodato é real, unilateral, gratuito, informal, temporário. REAL Não basta o consensus para a sua formação; é imprescindível a entrega da coisa ao comodatário. *Sem a traditio, possível é apenas a promessa de comodato. UNILATERALApenas o comodatário assume obrigações, daí dizer-se que o contrato é unilateral. A ele cabe restituir a coisa no estado em que a recebeu, observado o lugar e o prazo ajustados. Obs: A tradição do objeto pelo comodante não significa cumprimento de obrigação, pois é elemento constitutivo do comodato. Na vigência do contrato podem surgir, eventualmente, obrigações para o comodante, como a de ressarcir o comodatário por despesas extraordinárias e urgentes ou por prejuízos sofridos em razão de defeitos da coisa, daí alguns autores entenderem que o contrato é bilateral imperfeito, conclusão rejeitada por Sílvio Rodrigues “porque as obrigações aludidas não são peculiares ao comodato, mas a qualquer contrato.” O contrato de comodato é feito apenas para a utilidade do comodatário. GRATUIDADE É o selo que o distingue da locação – gratuitum enim debet esse commodatum (O comodato deve ser gratuito). Se, em dado momento, o comodatário passa a pagar, já não se terá comodato, mas locação. ** Nada impede, porém, que o comodatário assuma pequenos encargos, relativos ao recebimento da coisa, além de arcar com outras despesas, como a da taxa de condomínio e o imposto predial. Neste caso a doutrina denomina o contrato por comodato modal. ** Se o comodatário assume responsabilidades financeiras de maior vulto, há de se questionar a gratuidade do contrato. INFORMAL O contrato é informal ou não solene, de vez que a Lei Civil não impõe aos contratantes uma forma especial. Para efeito de prova, todavia, convém às partes a celebração por escrito, a fim de espancar qualquer dúvida quanto à prática de ilícito. *** Na prática, tendo em vista a relação de amizade que predomina nos contratos, raramente estes são celebrados por escrito. TEMPORIEDADE É característica do contrato de comodato, que pode ser firmado por prazo determinado ou determinável, segundo o tempo necessário ao seu uso. A exemplo da locação, a Lei Civil não fixou o prazo máximo de duração, que pode ser longo, sem todavia ser perpétuo, sob pena de caracterizar-se doação e não comodato. Durante o tempo de vigência, seja o contrato por prazo determinado ou pelo tempo necessário ao uso devido, cumpre ao comodante respeitar o uso, mas, sobrevindo-lhe necessidade imprevista e urgente, poderá requerer em juízo a restituição da coisa, cumprindo-lhe deduzir a prova correspondente. Tratando-se de prazo apenas determinável, a duração do contrato há de ser pelo tempo indicado pelas circunstâncias. Se “A” solicita a “B” o empréstimo de seu automóvel, a fim de conduzir a noiva à Igreja, subentende-se que, encerrada a cerimônia, haverá a restituição. **O comodato por prazo indeterminado com ele se confunde, desde que não haja um fim específico a ser cumprido, pois a coisa pode ser retomada a qualquer momento e imotivadamente pelo comodante, bastando-lhe a notificação. A eventual morte do comodatário, na opinião de Orlando Gomes, não é motivo de extinção do vínculo, salvo se houver cláusula atribuindo ao contrato um caráter personalíssimo. Ainda que inexistente tal ajuste, o sentido intuitu personae pode ser presumido pelas circunstâncias, como seria o caso de alguém ceder em comodato a um amigo, por um ano, um aparelho musical a ser utilizado em suas apresentações artísticas. ** OBRIGAÇÕES DO COMODATÁRIO Em relação à coisa, o comodatário deve usar a diligência do bom pai de família, cumprindo-lhe conservá-la, com zelo, a fim de restituí-la, findo o comodato, nas condições em que a recebeu. * A coisa deverá ser utilizada de acordo com a convenção ou conforme a sua natureza. · Se o objeto do contrato sofrer deterioração, parcial ou total, por falta de cuidados ou inobservância do fim a que se destinava, o comodatário responderá por perdas e danos. Como a relação existente é apenas entre comodante e comodatário, as obrigações de uma parte constituem direitos da outra. O comodatário, ordinariamente, não responde pelos riscos oriundos de caso fortuito ou força maior, pois res perit domino. Obs: O art. 583, na hipótese de a coisa dada em comodato correr riscos, juntamente com outras de propriedade do comodatário, impõe a este a obrigação de tentar salvar aquela em primeiro lugar, sob pena de responder por perdas e danos, ainda que sem culpa pelo evento. Findo o prazo contratual e não se seguindo a restituição da coisa, o comodatário incidirá em mora, independentemente de aviso ou notificação. A recusa na entrega da coisa, cumprida a finalidade de uso, provocará igual efeito jurídico. ***A notificação apenas se impõe, quando se trata de contrato por prazo indeterminado e sem qualquer previsão para a devolução, como na hipótese de alguém ceder um apartamento gratuitamente para um irmão morar. Uma vez em mora, o comodatário passa a responsabilizar-se pelos danos à coisa, advindos de caso fortuito ou força maior, além, naturalmente, dos que provocar por simples culpa ou dolo. OBS: Sujeitar-se-á, ainda, ao pagamento de aluguel que o comodante estipular, que é obrigatório a partir da notificação. A Lei Civil não sinaliza qualquer parâmetro para o aluguel, mas este deverá corresponder ao valor da época e do lugar, não se justificando uma cifra elevada, embora haja autores que entendam diferente. ** O art. 582, ao permitir que o comodante arbitre o aluguel, não transforma o comodato em contrato de locação. Constituída a mora e recusando-se o comodatário a restituir o objeto da locação, caracteriza-se o esbulho possessório, que é fato jurídico a ensejar o ajuizamento de ação de reintegração de posse. · Relativamente às despesas ordinárias da coisa, estas são de responsabilidade exclusiva do comodatário, conforme a regra do art. 584, que incisiva e desnecessariamente recorre ao advérbio “jamais”, a fim de excluir o repasse dos gastos ao comodante. · Tratando-se de despesas extraordinárias, como a de troca de bateria do automóvel cedido gratuitamente, estas ficarão por conta do comodante, salvo em caso de mau uso do objeto pelo comodatário. Ao comodatário assiste o direito de indenização por benfeitorias necessárias, mas quanto às úteis e voluptuárias, apenas se houve convenção neste sentido. Se a coisa é entregue, ao mesmo tempo, a dois ou mais comodatários, todos se responsabilizam solidariamente perante o comodante. É a dicção do art. 585 do Código Civil. MÚTUO *Art. 586 ao 592 *CONCEITO O contrato de mútuo consiste no EMPRÉSTIMO DE COISA FUNGÍVEL, por tempo determinado ou determinável, findo o qual deve ocorrer a restituição, mediante coisa de igual gênero, quantidade e qualidade. Comodato É empréstimo de uso; Mútuo Destina-se ao consumo *daí a impossibilidade de retorno do mesmo corpo físico. Objeto do contrato pode ser, também, a coisa fungível que não seja consumível. Exemplo: um livreiro empresta exemplares de uma obra didática, não esgotada na editora, a um outro, para efeito de venda. *O objeto do mútuo, na opinião de Julliot de La Morandière, tanto pode ser a coisa fungível por natureza, quanto a convencionalmente fungível. Exemplo da última espécie os apartamentos de um edifício e as unidades de um loteamento de terras. A Lei Civil não prevê, especificamente, a promessa de mútuo, mas esta é possível, subordinando-se as partes aos princípios que regem os contratos preliminares em geral (arts. 462 a 466, CC). A recusa à celebração do contrato definitivo pode provocar a execução forçada, conforme destacam. O pactum contrahendo é praticado pelas instituições financeiras com a abertura de crédito, quando é colocada à disposição do cliente uma certa quantia em dinheiro, que pode ser sacada de uma ou mais vezes. A simples abertura não configura o mútuo, que é contrato real. Quanto ao arrependimento após a promessa, o art. 463 prevê a sua possibilidade, desde que exista cláusula contratual específica. Na prática negocial, são comuns as referências ao mútuo hipotecário e ao mútuo cambiário, para expressarem, respectivamente, o empréstimo garantido por hipoteca e o representado por título de crédito. *CARACTERES REAL Trata-sede contrato real, que se aperfeiçoa com a entrega da res ao mutuário. Como em toda convenção, o consensusé de fundamentalimportância, mas não é o bastante, porque a tradição é elemento constitutivo do contrato e não um de seus efeitos. Sem a entrega da coisa não se tem o mútuo, mas apenas promessa de contrato. UNILATERAL É unilateral, pois apenas o mutuário assume obrigações. Se fosse consensual, a característica do contrato seria bilateral, pois ao celebrá-lo o mutuante assumiria a obrigação de efetuar a tradição. Esta, todavia, não é uma obrigação, mas elemento integrante do tipo contratual. ** A obrigação principal do mutuário é a restituição do que recebeu, mediante coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade. Obs: Na opinião de Antônio Chaves, o contrato de mútuo não se desnatura, quando a restituição prevista contratualmente for com objetos em que “haja diferenças de pouca importância do ponto de vista mercantil.” **** Caso não seja faticamente possível a restituição, o mutuante terá direito a receber o equivalente em dinheiro, mas, em caso de culpa do mutuário, haverá também o direito a perdas e danos. TRANSLATIVO DE DOMÍNIO Pelo contrato de mútuo, o domínio é transferido ao mutuário, a fim de que possa efetivamente consumir a coisa. A transferência de domínio não é o objetivo do mútuo, mas decorrência deste. Na condição de proprietário, o mutuário poderá não apenas consumir a coisa, mas dar a ela o destino que lhe aprouver. Em razão deste caráter translativo de domínio, destacado no art. 587 da Lei Civil, somente o proprietário pode ser mutuante. **Eventuais despesas com a conservação da coisa, antes de seu consumo, correm por conta do mutuário, pois é dele a propriedade, mas o mutuante responde por vícios redibitórios. **É incabível o mútuo de coisa alheia, mas se este se efetiva, pode o proprietário exigir do mutuário a devolução ou, se isto não for possível e estando este de boa-fé, pleitear perdas e danos contra o mutuante. Como os riscos da coisa são de responsabilidade do proprietário, pois res perit domino, correm eles por conta do mutuário a partir da tradição, conforme prevê o citado artigo. **Na hipótese de promessa de mútuo, os riscos anteriores à tradição ficam por conta do promitente. GRATUITO OU ONEROSIDADE Quanto ao caráter gratuito ou oneroso do contrato, há distinções a serem feitas. Em se tratando de empréstimo de dinheiro, o mais comum é a cobrança de juros remuneratórios, mas quando o objeto é de outra natureza, via de regra o contrato é gratuito. *A retribuição, quando prevista, se faz predominantemente em dinheiro, juros, podendo ser em coisas. **** Não há, pois, como se apontar a gratuidade ou a onerosidade como característica do contrato. TEMPORÁRIO O vínculo é necessariamente temporário. A este respeito dispõe o art. 592 do Código Civil. **O contrato pode ser por prazo determinado ou determinável. Entre a formação do contrato e a restituição da coisa, deve haver um interregno. * O fundamental é que não seja permanente, pois do contrário não se terá mútuo, mas doação ou compra e venda, dependendo do caráter gratuito ou não do ato negocial. FORMA Quanto à forma, trata-se de contrato não formal, pois na regulamentação do instituto não há qualquer exigência a respeito. Na prática, as partes utilizam-se de instrumento particular para documentar o ato negocial e, dependendo do vulto do empréstimo, de escritura pública. ***Quando se trata de mútuo hipotecário, esta última é a forma adotada. *O MÚTUO FEITO A PESSOA MENOR A validade dos negócios jurídicos está condicionada, entre outros requisitos, à capacidade das partes. O art. 588 do Código Civil, de caráter geral, veda ao mutuante o direito de exigir a restituição da coisa, inclusive de eventuais fiadores, quando o mútuo se faz a menor sem a devida autorização de seu guardião. Havendo conveniência para o menor, o juiz poderá conceder a guarda para outra pessoa, da família ou não. A regra do art. 837, exclusiva para o fiador, permite-lhe formular a exceção cabível ao mutuário menor. Com este rigor, o Códex visa a impedir a exploração da inexperiência de menores por parte de usurários e de aproveitadores em geral. ** A fim de alcançar o fiel da balança, o art. 589 abre oportunas exceções. Em primeiro lugar, permite ao guardião do menor a ratificação do ato, pelo que, cessada a causa, poderá o mutuante exigir a restituição da coisa no momento oportuno (inciso I). · Deste inciso, infere-se que o mútuo feito a menor constitui negócio jurídico anulável, pois o nulo não é passível de confirmação, consoante a disposição do art. 169 da Lei Civil. · O empréstimo será válido se obtido para as despesas de alimentação do menor, estando ausente o guardião (inciso II). Na hipótese de o mutuário trabalhar e ter formado um patrimônio pessoal, a restituição poderá ser exigida, mas no limite das disponibilidades do menor. **In casu, há presunção de responsabilidade e experiência do mutuário (inciso III). · O mutuante poderá exigir a restituição caso logre provar que o mútuo proporcionou benefício ao menor (inciso IV) ou que este o obteve maliciosamente (inciso V). *A COBRANÇA DE JUROS O mútuo feneratício, que é EMPRÉSTIMO A JUROS, está previsto no art. 591 do Código Civil, que estabelece princípios de ordem pública, inarredáveis pelo consenso das partes. O nosso ordenamento não exige que a previsão de juros seja por cláusula expressa. **A cobrança de juros, desde que observados certos parâmetros, enquadra-se na esfera do justo, pois, além de conter um coeficiente maior ou menor de risco, implica a renúncia temporária da fruição de um capital. Quando o empréstimo se destina à produção, tem-se mais um argumento a justificar os rendimentos, porque a coisa colocada à disposição do mutuário lhe permitirá auferir lucros em sua atividade negocial. A cobrança de juros, se abusiva, atenta contra os princípios morais. A experiência já registrou casos em que usurários, com o objetivo de fraudarem a lei, simularam contrato de compra e venda com pacto de retrovenda, a fim de dissimular o de mútuo com taxas elevadas de juros. *** Tais negócios, à luz do disposto no caput do art. 167, combinado com o art. 591, ambos do Código Civil, devem ser considerados mútuos, reduzindo-se as taxas ao limite máximo permitido. À luz do novo Código Civil, as partes têm liberdade para estipular a onerosidade do empréstimo, mas, caso não haja cláusula a respeito, presumir-se-á a incidência de juros tratando-se de mútuo com fins econômicos; ** logo, se outra for a destinação, a presunção será de gratuidade. Empréstimo com fins econômicos É o que visa a aplicação do patrimônio; O que não possui tais fins é feito com a intenção de ajudar o próximo, por espírito de solidariedade. As presunções, in casu, são apenas relativas. Se as partes quiserem atribuir efeito diverso ao das presunções, necessariamente deverão dispor a respeito em cláusula contratual. ** Tenha o mútuo fins econômicos ou não, as partes possuem a liberdade de estipular a cobrança de juros, desde que respeitado o limite máximo estabelecido em lei. ** O limite máximo para a cobrança de juros é o definido no art. 591 do Código Civil, combinado com o art. 406, que indica “a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional”, ou seja, a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia – Taxa SELIC, instituída com a Lei nº 9.065, de 20.6.1995. **Se a convenção extrapolar o percentual da taxa-limite, o efeito jurídico não será a nulidade da cláusula de juros, mas a sua redução ao índice oficial. · A taxa SELIC, que é variável, não se aplica ao mútuo bancário, que se subordina à política econômica desenvolvida pelo Conselho Monetário Nacional. Quanto à capitalização dos juros, a sua prática atual está autorizada pelo art. 591 do Código Civil, que não é, todavia, de aplicação automática, mas pressupõe convenção entre as partes. *Dá-se a capitalização, in casu, quando os juros não pagos são agregados ao montante da dívida.Esta integralização provoca a condenável prática do anatocismo, que significa juros dos juros. · Relativamente ao mútuo feneratício, o Superior Tribunal de Justiça vem decidindo que o Código de Defesa do Consumidor é aplicável aos contratos de empréstimo bancário, culminando na edição da Súmula 297, de 12.05.04, que reconhece a aplicabilidade desse Códex, indistintamente às instituições financeiras. *PRAZO CONTRATUAL No exercício de sua liberdade contratual, as partes podem definir o prazo de duração do mútuo de acordo com o interesse comum, vedada, unicamente a perpetuidade do vínculo, pois do contrário não se teria mútuo, mas outra modalidade contratual (doação ou compra e venda, se gratuito ou oneroso o negócio). Para a hipótese de lacuna contratual, as disposições a serem observadas são as do art. 592 da Lei Civil. ** Sendo o mútuo de produtos agrícolas Presume-se que a restituição deva efetuar-se com os frutos da colheita seguinte, não importando se o empréstimo destinou-se ao consumo ou à semeadura. **Se colheita esperada pode não se efetivar em tempo razoável, quando então cabe ao mutuante a exigência da restituição. Se o empréstimo for de dinheiro O prazo mínimo será de trinta dias. **Não acordando as partes quanto à devolução, vencido esse tempo, o mutuante poderá pleitear judicialmente. Não se tratando de produtos agrícolas, nem de dinheiro, o prazo será o que for declarado pelo mutuante. *Para tanto, haverá de notificar o mutuário. *GARANTIA SUPERVENIENTE AO CONTRATO O disposto no art. 590 é uma das aplicações do princípio da eticidade, que orientou o legislador de 2002. Durante a vigência do contrato, o mutuante pode exigir da outra parte uma garantia da restituição, caso esta sofra abalo em seu patrimônio. Importante, para tanto, que a mudança na situação econômica do mutuário seja de tal porte, que venha a dificultar ou a colocar em risco o cumprimento da obrigação. A Lei Civil refere-se à notória mudança, como fato jurídico a ensejar o direito à garantia, mas basta que a mudança seja real, embora pouco conhecida. Onde consta notória mudança deve-se entender estado de pré-insolvência ou pré-falimentar. A norma jurídica considerada é uma adaptação, no contrato de mútuo, do princípio que inspirou o preceito do art. 477, pertinente à exceção de contrato não cumprido.23 PRESTAÇÃO DE SERVIÇO *Art. 593 a 609 A História do Direito registra o fenômeno da especialização do Jus Civile, que é um processo de desprendimento de matéria normativa que, por razões diversas, ganha autonomia, indo formar novos ramos jurídicos. O tema sub examine – contrato de prestação de serviço –, que se origina da locatio operarum, figurava de modo mais abrangente no Código Civil de 1916, pois abarcava também as relações de trabalho subordinado, hoje objeto de disciplina do Direito do Trabalho. ** Daí o atual Códex, no primeiro dispositivo dedicado à matéria (art. 593), haver excluído do seu campo de incidência a prestação de serviço sujeita às leis trabalhistas ou à lei especial. A terminologia locação de serviços, adotada pelo Código Civil de 1916, com oportunidade foi substituída por prestação de serviços, condizente com a natureza humana. **CONCEITO E CONTRATOS AFINS *Pelo contrato de prestação de serviço, as partes ajustam a execução de tarefas, sem subordinação hierárquica, mediante certa retribuição. Tomador É quem encomenda os serviços; Prestador o que assume a obrigação de fazer Objeto do contrato pode ser qualquer tipo de serviço, seja material ou imaterial (art. 594, CC) e podem figurar como tomador ou prestador tanto a pessoa física quanto a jurídica. ** Não há razões para se restringir a figura do prestador às pessoas físicas. **Na lição de Maria Helena Diniz as pessoas jurídicas podem ser prestadoras de serviços, como ocorre na prática com as empresas de conservação de elevadores, de administração de imóveis, entre outras. · A natureza dos serviços a serem prestados deve ser definida no contrato. E se a natureza não estiver definida? *Art. 601 **O tomador poderá exigir do prestador a execução de quaisquer serviços compatíveis com as suas forças e condições. Obs: Os serviços prestados pelos trabalhadores domésticos, embora não configurem contrato de emprego, não se identificam com os contratos de prestação de serviço, uma vez que possuem regras especiais, como a que garante o recebimento do salário mínimo. O contrato possui conteúdo residual, pois abrange todos os serviços não disciplinados por leis trabalhistas ou em lei especial. **Art. 593 do Código Civil Prestação de Serviços X Relação Trabalhista O contrato não se confunde com a relação de emprego trabalhista, pois nesta há uma hierarquia entre empregador e empregado, dependência econômica e os serviços prestados não são de natureza eventual. O que importa na classificação não é o nomen iuris atribuído ao contrato, mas as características concretas da relação. Estas é que dirão a espécie contratual. Prestação de Serviço X Empreitada O contrato de prestação de serviços distingue-se, também, da empreitada, que tem por objeto a execução de obra, com fornecimento ou não de material pelo executor (empreiteiro). Enquanto naquela o trabalho é realizado, geralmente, sob as ordens e fiscalização do tomador, no segundo, definida a obra a ser realizada e ajustado o preço, a responsabilidade é exclusiva do prestador, que atua com independência. *Na prestação de serviço o executor não assume risco algum de empresa. Obrigações: · Do prestador é de meio; · Do empreiteiro é de resultado. Prestação de Serviços X Mandato No âmbito doutrinário, muito se discute em torno da distinção entre os contratos de prestação de serviço e de mandato. ** Em ambos, o executor desenvolve atividades em favor do tomador ou do mandante. A distinção fundamental entre os dois contratos consiste na representação. Na prestação de serviços O executor age em seu próprio nome; No mandato O executor atua em nome do mandante; Há casos em que se verificam, conjuntamente, a representação e a prestação de serviços. ***Nesta hipótese, segundo Serpa Lopes, “qualifica-se o contrato como de mandato ou de locação de serviços, consoante o elemento preponderante...” Tratando-se de contrato de prestação de serviços advocatícios, o elemento preponderante, segundo o eminente civilista, é a prestação de serviço, “pois o mandato age como um meio para um fim; se, ao contrário, a prestação de serviços constitui um modo de exercitar o mandato, é este que prepondera na qualificação do que se pactuou.” Prestação de Serviço no CDC A prestação de serviços é objeto de disciplina, também, do Código de Defesa do Consumidor, que, pelo § 2º, do art. 3º, atribui um conceito abrangente ao termo serviço, dele excetuando apenas as atividades decorrentes das relações de caráter trabalhista. **Constitui serviço, desde que remunerado, a atividade fornecida no mercado de consumo, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária. ***************************************************************************** · A retribuição geralmente se faz em dinheiro, mas nada impede que seja in natura, isto é, em morada, alimentos, vestuário e condução. ** Se a retribuição for em serviço, entende Caio Mário da Silva Pereira que não se terá prestação de serviço, mas contrato atípico. A retribuição, qualquer que seja, deve constar da convenção, mas quando esta for omissa e não houver acordo a posteriori, o quantum será definido por arbitramento e de acordo com os valores habitualmente pagos no lugar, o tempo de serviço e sua qualidade. ** De acordo com o art. 460 da Consolidação das Leis do Trabalho, em caso de lacuna contratual o salário a ser pago deve ser igual ao de quem desenvolve serviço equivalente ou o habitualmente pago para serviço semelhante. ** É o princípio da paridade. O tomador deverá efetuar o pagamento na época e modo previstos contratualmente ou no costume do lugar, mas, na falta de previsão, o momento será o que se seguir à entregao direito de propriedade. · Se apenas uma pessoa o exercer, poderá o titular da propriedade resolúvel (comprador) intimar as demais, prevalecendo o direito de quem depositaro quantum debeatur integralmente. · Se mais de um titular efetuar o depósito pleno, a preferência será de quem o fez primeiramente. Obs: A Lei Civil não permite que o direito de resgate seja exercido parcialmente, estabelecendo-se condomínio entre o depositante e o comprador. DA VENDA A CONTENTO E DA SUJEITA A PROVA *art. 509 ao 512 *Venda a contento ** Pactum displicentiae Também chamada de ad gustum Esse pacto adjeto subordina o efeito do ato negocial à confirmação do comprador, a favor de quem é estipulado. Obs: Não se trata de promessa, mas de contrato definitivo e sua finalidade é permitir que o adquirente verifique se a coisa satisfaz o seu gosto. *Revela-se útil especialmente na aquisição de coisas que, de costume, são primeiramente experimentadas ou provadas, podendo estender-se a outras, conforme convenção das partes. Ex: o café, o azeite, o vinho, o perfume, o livro, os alimentos em geral. A coisa submetida à apreciação do comprador não precisa ser individuada, podendo ser genérica. Se a compra é de uma partida de café, a prova pode realizar-se em grãos da mesma qualidade e safra, não necessariamente da mercadoria a ser entregue. Justifica-se a espécie de compra e venda, notadamente, em relação aos negócios efetuados a distância, seja por correspondência ou via telefônica, quando o adquirente não entra em contato com o objeto. Deve ser firmado na conclusão da compra e venda e no instrumento contratual ou em documento à parte. Teoricamente o objeto da venda a contento pode ser a coisa móvel ou imóvel, embora a prática negocial se restrinja à primeira categoria. A apreciação da coisa por seu gosto é meramente subjetiva, irretorquível e dispensa fundamentação. Venda a contento ≠ Venda com direito a troca de objeto Há figuras jurídicas que se aproximam da venda a contento, mas dela se distinguem, como a venda com direito a troca de objeto. Esta modalidade, não prevista no Código Civil, é possível, desde que as partes expressamente a convencionem. Diferenças entre as vendas Contento Opera mediante cláusula condicional suspensiva. É modalidade contratual e não simples oferta. Comprador fica na qualidade de comodatário. *Ficará na posse enquanto não revelar o seu agrado. Troca de objeto Contrato aperfeiçoado. A eficácia não depende de um acontecimento futuro e incerto. Obs: O texto do art. 511 refere-se à coisa comprada e não à coisa ofertada. Assim, com a declaração de vontade de ambas as partes tem-se um contrato de compra e venda, que se aperfeiçoa a posteriori e com a confirmação do comprador. A venda a contento é condição suspensiva potestativa, que se apresenta mediante cláusula acessória nos contratos de compra e venda. A venda a contento (vendita con riserva di gradimento) configura, inegavelmente, uma condição puramente potestativa ou arbitrária, porque o fato futuro de que a eficácia do contrato depende é uma simples manifestação de vontade do comprador. ** Este, para não confirmar o negócio, sequer precisa oferecer alguma justificativa, bastando-lhe dizer um “não me interessa”. De nada adianta ao vendedor provar que a coisa reúne as propriedades inerentes ao gênero, pois o que deve prevalecer exclusivamente é a declaração do comprador. Enquanto o comprador não se manifesta, ainda que a coisa fique em seu poder, esta permanecerá integrando o patrimônio do vendedor, que se responsabiliza por eventual perda total ou deterioração por caso fortuito. Uma vez verificada a condição, o contrato produz o efeito jurídico previsto, consolidando-se a compra e venda. As partes podem, todavia, configurar o pacto com a cláusula resolutiva, uma vez que a prática não está vedada em lei, embora o texto do art. 509 do Código Civil possa sugerir o contrário. ** Adotada esta cláusula, a coisa passa ao patrimônio do comprador e por conta deste correm os riscos, retornando o domínio ao vendedor caso a condição não se verifique. Venda a contento ≠ Venda sob amostra O pactum ad gustum não se confunde com a venda sob amostra, pois é uma condição puramente potestativa, que se aperfeiçoa com a simples declaração do comprador, expressa ou tácita. Na venda sob amostra a condição não é potestativa, pois o contrato não depende da satisfação do comprador, para se tornar perfeito, mas da correspondência da coisa ao seu referencial, ou seja, à amostra. ** O direito do comprador é personalíssimo? O Código Bevilaqua, pelo art. 1.148, respondia afirmativamente, pelo que o direito não se transmitia inter vivos ou mortis causa. Contudo, o Código Civil de 2002 não reproduziu a disposição, gerando o entendimento de que o direito não é intuitu personae, podendo ser transferido. No plano de lege ferenda a matéria é discutível, mas de lege lata impõe-se a conclusão, especialmente à vista da norma de liberdade. DA VENDA SUJEITA A PROVA *art. 510 Enquanto na venda a contento a condição é puramente potestativa, na sujeita a prova a condição depende exclusivamente da adequação da coisa às qualidades definidas pelo vendedor ou imanentes ao gênero. Art. 510. Também a venda sujeita a prova presume-se feita sob a condição suspensiva de que a coisa tenha as qualidades asseguradas pelo vendedor e seja idônea para o fim a que se destina. **Abre-se um prazo para o comprador verificar se a coisa reúne as qualidades asseguradas pelo vendedor e encontra-se apta a realizar o fim a que se destina. *Também é condição suspensiva. Enquanto na venda ad gustum a eficácia do negócio depende do arbítrio exclusivo do comprador, na venda sujeita a prova a rejeição da coisa há de ser, necessariamente, motivada e sob a alegação de que não corresponde ao que dela o vendedor propalou ou ao que lhe é próprio. Na venda a contento não se recorre à perícia, uma vez que a apreciação do comprador é puramente subjetiva. Na venda sujeita a prova, discordando o vendedor das alegações do comprador, poderá ajuizar a ação própria e demonstrar a plena regularidade do objeto da compra e venda. Venda sujeita a prova ≠ Venda sob amostra Na venda sujeita a prova, o contrato se aperfeiçoa desde que a coisa corresponda às qualidades preconizadas pelo vendedor ou imanentes ao gênero. Na venda sob amostra, exige-se apenas que a coisa entregue corresponda ao referencial. RISCOS DA COISA Tratando-se de condição suspensiva, os riscos da coisa, decorrentes de caso fortuito, correm por conta do vendedor, respondendo o comprador pelas perdas ou deteriorações rovenientes de sua culpa. **No momento em que a condição se verifica, a situação se inverte, pois a coisa passa ao patrimônio do comprador, que assume, então, aqueles riscos. QUAL É A RELAÇÃO JURÍDICA ENTRE OS CONTRATANTES A PARTIR DO MOMENTO EM QUE HÁ A ENTREGA DA COISA E A DECLARAÇÃO DO COMPRADOR? As normas aplicáveis são as do contrato de comodato, instituto que tem a sua disciplina nos artigos 579 a 585, figurando o comprador como beneficiário de empréstimo gratuito. Estando a eficácia do contrato sujeita a uma condição suspensiva o domínio da coisa ainda é do vendedor. Obs: Se as partes optaram por dar à sua relação a natureza de uma condição resolutiva[footnoteRef:1], a situação é distinta, porque o comprador adquire a propriedade com a tradição. [1: A condição resolutiva subordina a ineficácia do negócio a um evento futuro e incerto. Enquanto a condição não se realizar, o negócio jurídico vigorará, podendo exercer-se desde a celebração deste o direito por ele estabelecido, mas, verificada acondição, para todos os efeitos extingue-se o direito a que ela se opõe. ] Sob a condição suspensiva o comprador é comodatário e sob a condição resolutiva, proprietário. Obs2: Na condição de comodatário o comprador deverá cuidar da coisa como se fosse sua, conservando-a, além de não poder usá-la senão de acordo com a sua natureza ou com os termos do contrato. Incidindo emdo serviço, consoante a disposição do art. 597 do Código Civil. **CARACTERES O contrato de prestação de serviços é consensual, bilateral, oneroso, não formal. Na celebração, as partes assumem obrigações: o prestador, de executar os serviços (obrigação de fazer) e o tomador, de retribuir (obrigação de dar). CONSENSUAL O contrato se perfaz com a simples declaração manifestada por agentes capazes, que anuem em torno de objeto lícito (o serviço e a retribuição). Não se exige, assim, a entrega do serviço para que o contrato se aperfeiçoe, uma vez que não é real, mas de natureza consensual. BILATERALIDADE A bilateralidade é uma das características da prestação de serviço, pois ambos contratantes assumem obrigações: a retribuição do tomador é correspectiva da entrega do serviço pelo prestador. **Se o serviço for prestado gratuitamente, não se terá o contrato sub examine, mas o de mandato, promessa de doação ou doação. ONEROSO Diz-se que é oneroso, uma vez que ambas as partes visam a obter vantagens. ONEROSO COMUTATIVO Tanto a obrigação do tomador quanto a do prestador são previamente estabelecidas e guardam em regra um equilíbrio entre o quinhão que se dá e o que se recebe. Obs: O Enunciado 541 do Conselho da Justiça Federal declara que “O contrato de prestação de serviço pode ser gratuito”. NÃO FORMAL As partes livremente declarar o seu consentimento, mas para efeito de prova estão condicionadas ao limite imposto no art. 227 do Código Civil. ** Pode ser celebrado por escrito ou verbalmente. Além da forma expressa, permite-se a tácita, a exemplo dos contratos de trabalho. **Se as partes optaram por celebrá-lo por escrito, admite a Lei Civil, pelo art. 595, que alguém assine a rogo, quando a parte não souber ler, nem escrever, hipótese em que necessariamente o instrumento deverá ser subscrito por duas testemunhas. **** Diz a Lei “quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever”, todavia entendo que o dispositivo legal deve ser interpretado extensivamente, para alcançar a hipótese em que a parte se encontre sem condições físicas, mas consciente, para assinar o documento, como seria o caso de um contratante com o braço ou a mão fraturada. Em princípio, o contrato é intuitu personae, uma vez que as partes não podem, unilateralmente, substituir o destinatário do serviço, nem o executor da atividade, conforme previsão do art. 605. ** Esta regra não é cogente, podendo as partes estipular diversamente, atribuindo caráter impessoal à relação. **REGRAS BÁSICAS DO CÓDIGO CIVIL *Duração do contrato Visando a impedir que o prestador de serviço aliene a sua liberdade ao tomador, reduzindo-se à condição análoga a de escravo o art. 598 Código Civil fixou em quatro anos o prazo máximo contratual. Nemo potest locare opus in perpetuum. ** Se a convenção é por tempo superior, o prazo não será sem efeito, apenas o excedente a quatro anos. O limite deve ser respeitado, ainda que o contrato se motive por dívida do prestador ou tenha por objeto a execução de obra certa. norma em questão é cogente e na prática o seu limite deve ser forçosamente observado, dando-se por findo o contrato, ainda que a obra se encontre em andamento. **Todavia, se por culpa do prestador, houve paralisação nas atividades, o tempo correspondente deverá ser descontado do prazo contratual (art. 600). Obs: A contrario sensu, caso as interrupções tenham sido por caso fortuito ou força maior, o prazo contratual não será alterado. Segundo Clóvis Beviláqua, concluído o prazo de quatro anos, o contrato poderá ser renovado por igual tempo e sem limite de vezes. Na hipótese de contrato por prazo indeterminado e quando o tempo de duração não for ditado pela natureza do negócio ou do costume do lugar O vínculo poderá ser dissolvido por qualquer um dos contratantes, mediante aviso prévio, que se destina a permitir, ao contratante, um tempo para conseguir substituto para quem emitiu o aviso. · Eis os prazos previstos no art. 599: · 08 dias, quando o salário for mensal ou por tempo superior; · 04 dias, se for semanal ou por quinzena; · De véspera, quando a periodização for inferior a sete dias. A obrigatoriedade do aviso se impõe, tanto ao tomador quanto ao prestador, e visa a permitir que a outra parte tome as providências necessárias.** As normas afetas ao aviso prévio são dispositivas, podendo os contratantes convencionar de acordo com o seu interesse concreto. Havendo prazo em andamento ou quando a prestação de serviço for por obra certa e esta não foi concluída, as partes não podem dar por findo o contrato, unilateralmente, salvo ocorrendo justa causa. Se o contrato for rompido sem justa causa O responsável responderá por perdas e danos, garantido ao prestador o direito à percepção da retribuição vencida. Se o prestador foi despedido sem justa causa Terá direito ainda a receber, pela metade, a retribuição a que faria jus até o término do contrato. Obs: A Lei Civil não define justa causa, mas esta deve ser entendida como a ocorrência de motivos de força maior, além de violação de qualquer obrigação contratual ou legal.22 *Mudanças subjetivas A execução do contrato deve tomar por paradigmas as cláusulas contratuais e as normas legais cogentes. **Se a possibilidade de terceirização não foi prevista contratualmente, nem se acha implícita na natureza dos serviços, o prestador não poderá transferir a execução para outrem, ainda que expert na atividade. O tomador, igualmente, estará impedido de exigir a prestação do serviço em favor de terceiro. O contrato configuração intuitu personae, mas as partes podem estipular o contrário, de acordo com o permissivo do art. 605 da Lei Civil. *Necessária habilitação do prestador O art. 606, genericamente, exige do prestador o título de habilitação ou o preenchimento de requisitos legais correspondentes ao setor de atividade que se propõe a executar serviços. ** É claro que o dispositivo não alcança, na prática, serviços de qualquer natureza, como, por exemplo, o de lavar automóveis. · Mas se o contrato tem por objeto a prestação de serviços médicos ou advocatícios, a prévia habilitação junto às respectivas corporações é essencial. Sem prejuízo de outros efeitos legais, o prestador que se enquadrar em uma das hipóteses do art. 606 do Código Civil não poderá exigir a retribuição pelos serviços executados, salvo se destes resultou benefício para o tomador. **Nesta hipótese, constatando o juiz que o prestador agiu de boa-fé deverá fixar uma compensação razoável. O dispositivo em questão confere ao julgador o poder de decidir com equidade, cabendo-lhe avaliar o grau de satisfação do tomador e a justa retribuição. Obs: Se ao assumir os encargos contratuais o prestador violou lei de ordem pública, por força do parágrafo único do art. 606 não fará jus a qualquer retribuição. *Extinção do contrato · Tendo em vista o caráter personalíssimo da prestação de serviço, a morte de qualquer das partes provoca o término do vínculo contratual. **Havendo interesse, os herdeiros e a outra parte poderão firmar um novo contrato, reproduzindo ou não as cláusulas do anterior. · Findo o prazo contratual, extingue-se automaticamente a relação, independentemente de qualquer formalidade. **Recorde-se que as interrupções na prestação de serviço, provocadas por culpa do prestador, são descontadas do prazo contratual. · Igualmente cessa a relação jurídica se o serviço contratado foi concluído. · Não sendo por prazo determinado, nem por obra certa, o contrato poderá ser dissolvido por qualquer das partes, mediante aviso prévio, consoante estabelece o art. 607, combinado com o art. 599. · Em caso de inadimplemento das obrigações contratuais ou legais, ou seja, se houver justa causa a parte interessada poderá rescindir o contrato, na forma do art. 607, combinado com a prescrição do art. 602. · A última hipótese da Lei Civil refere-se à extinção do vínculo em decorrência de um act of God. Se não for possível a continuidade da prestação de serviço em razão de força maior, a resolução é consequência lógica.Findo o contrato, poderá o prestador exigir do tomador uma declaração de que o vínculo se extinguiu, inclusive quando dispensado sem justa causa ou houver se desligado por justa causa. *Aliciamento de prestador de serviço O contrato de prestação de serviço, FORMALIZADO POR ESCRITO, gera para o tomador o direito de indenização, para a hipótese de aliciamento do prestador de serviço, durante a vigência do vínculo. **Aliciamento implica proposta de trabalho e aceitação. Isto ocorrendo, sujeita-se o aliciador a pagar ao tomador a importância equivalente à retribuição do prestador, durante dois anos e nas condições do contrato desfeito. Obs: A doutrina entende que não configura aliciamento o convite formulado no período do aviso prévio ou diante das causas de extinção do contrato, previstas no art. 607. **Quanto ao prestador que abandona o contrato, atraído pela nova proposta, aplica-se o disposto no parágrafo único do art. 602, ou seja, responsabiliza-se por perdas e danos. *Serviço em prédio agrícola alienado A Lei Civil abre uma alternativa para o prestador que desenvolve a atividade em prédio agrícola alienado: continuar trabalhando para o tomador ou para o adquirente da propriedade. ***A alienação não constitui, assim, justa causa para rescisão contratual. As opções que se abrem ao prestador são uma decorrência do caráter personalíssimo do contrato. ** Quanto ao adquirente, este não poderá alegar que o contrato lhe foi imposto, pois conhecia o vínculo preexistente. MANDATO *Art. 653 ao 666 No estudo afeto aos negócios jurídicos, tratamos amplamente do instituto da representação, cujo conceito é essencial à compreensão do contrato de mandato. REPRESENTAÇÃO É uma construção jurídica que permite a uma pessoa a prática de atos negociais em nome e por conta de outra. A representação torna mais ágil o tráfico jurídico, além de possibilitar a inserção dos incapazes no mundo dos negócios, seja por intermédio de quem lhe detém o poder familiar, seja pelos tutores ou curadores. ** A prática de negócios jurídicos em nome de outrem pressupõe uma investidura de poder, mediante outorga voluntária, legal ou judicial. *** Na formulação do Direito pátrio, só existe mandato havendo representação. Em algumas legislações, como a suíça e a italiana, há mandato com ou sem representação. Esta última se configura quando o mandatário pratica negócios jurídicos em seu próprio nome, mas de acordo com as instruções constantes em contrato firmado com o mandante. O mandatário pratica negócios separados com o mandante e com o terceiro. Entre este e o mandante, quando não há representação, não se instaura qualquer relação jurídica. *Em nosso País, tal modalidade, restrita aos negócios de aquisição ou venda de bens, configura o contrato de comissão, previsto nos artigos 693 a 709 do Código Civil. *CONCEITO E CARACTERES O vocábulo mandato provém de duas palavras latinas manus e data (mão dada). Ao ser investido nos poderes, o mandatário apertava a mão do mandante, em um gesto que simbolizava o compromisso de lealdade. Contrato de Mandato Quando alguém (mandatário) se obriga a praticar negócios jurídicos em nome e sob a responsabilidade de outrem (mandante). Objeto Não é a prática de qualquer ato, mas de ato negocial, que estabelece, modifica, conserva ou extingue uma relação jurídica. ** Henri de Page “O mandato implica essencialmente aconclusão de um ato jurídico, e não uma simples operação material.” Obs: Nem todo negócio jurídico pode ser praticado mediante representação, como os testamentos, alguns atos afetos ao poder familiar, à tutela e à curatela. Tais poderes são personalíssimos e indelegáveis. Como no Direito Romano, hodiernamente o objeto do mandato pode consistir na prática de determinado negócio jurídico, como o de inscrição em concurso público, ou na de atos gerais de administração de patrimônio, como os de alugar, comprar, alienar, contratar e demitir funcionários, contrair empréstimo e movimentar contas bancárias, entre outros. *Pode atender apenas ao interesse do mandante, do mandatário ou de um terceiro. O art. 653 do Código Civil consigna que a PROCURAÇÃO É O INSTRUMENTO DO MANDATO. A procuração É documento unilateral, particular ou lavrado em cartório, pelo qual o outorgante confere poderes de representação ao mandatário. As partes podem optar, todavia, pela formalização por escrito do contrato, onde não apenas constem objetivamente os poderes, mas ainda outras cláusulas definidoras dos direitos e obrigações das partes entre si. *** Geralmente o contrato é apenas verbal, figurando a procuração como a prova do mandato. MANDATO ≠ PROCURAÇÃO Não se confundem os conceitos de mandato e de procuração. MANDATO Contrato; PROCURAÇÃO Procuração é instrumento. O mandante confere poder de representação ao mandatário, que pratica atos como se fora aquele e sem integrar as relações jurídicas instauradas. Como em todo negócio jurídico, a validade do mandato requer o preenchimento dos requisitos do art. 104 do Código Civil: agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei. Quanto à capacidade, permite-se que o maior de dezesseis e menor de dezoito anos seja mandatário, mas nesta hipótese o mandante se submete ao tratamento especial previsto para as obrigações assumidas por menores (art. 666, CC). No mandato, o poder outorgado não pode consistir na prática de atos materiais, como o de conserto de um motor, pois tal fato é objeto da prestação de serviço. MANDATO VS PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS Ambos integram a classe dos contratos que visam à prática de serviços; Em ambos o titular de direito confere poder a outrem para a prática de determinados atos, mas enquanto na prestação de serviço o prestador age em nome próprio, no outro o mandatário atua em nome e por conta do mandante; Prestação de Serviço - comporta atos de natureza corpórea; Mandato o objeto é sempre a prática de atos negociais; Na prestação de serviço o interesse das partes não vai além do contrato; No mandato o que se tem por mira é a realização de negócios jurídicos futuros, como a venda, locação, o empréstimo. O contrato de mandato, portanto, é de natureza preparatória. **O mandato é um contrato consensual, unilateral, gratuito, personalíssimo, não formal. CONSENSUAL Para a sua formação basta o consentimento das partes. O mandatário se obriga a praticar os atos definidos no contrato. O mandato não constitui um simples ato unilateral, porque requer a concordância do mandatário. Outorgada a procuração, a anuência do mandatário se dá com o início de execução. UNILATERAL Diz-se que é unilateral, porque geralmente apenas o mandatário assume obrigação, mas, se prevista contraprestação, o contrato será bilateral. GRATUIDADE É apontada pela doutrina como da natureza do mandato, embora com a ressalva de que a remuneração não desnatura o contrato. Pothier a ele se referia como “um ofício de amizade”. O art. 658 estabelece duas presunções juris tantum: a) não prevista a remuneração, tem-se por gratuito o mandato; b) omisso o contrato, presume-se a onerosidade, quando os atos a serem praticados corresponderem ao ofício ou profissão lucrativa do mandatário, como é o caso dos advogados. **Se oneroso o contrato e este for omisso quanto à contraprestação, esta deverá ser definida pelos usos do lugar ou, na falta destes, por arbitramento. INTUITO PERSONAE O mandato tem por lastro a confiança que o mandante deposita no mandatário, daí dizer-se que o contrato é intuitu personae. Com o substabelecimento o contrato perde o caráter personalíssimo, salvo quando o nome do substabelecido é previamente definido. ****O substabelecimento, que é o ato pelo qual o mandatário transfere para terceiro, com ou sem reserva, os poderes recebidos, pode ser autorizado pelo mandante nos termos da procuração ou da cláusula contratual. A prévia permissão de substabelecimento visa a atender, notadamente, a imprevistos que dificultem ou impeçam o mandatário de cumprir o seu encargo. OBS: Se na procuração estiver prevista a proibiçãode substabelecimento e este se efetivar, o mandante não se obriga pelos atos praticados, salvo se os ratificar expressamente, caso em que a validade retroagirá à data dos atos negociais (art. 667, § 3º). FORMA LIVRE Em princípio a forma contratual do mandato é livre, à vista do disposto no art. 656 do Código Civil: “O mandato pode ser expresso ou tácito, verbal ou escrito.” O art. 657, porém, estabelece restrição ao modus faciendi, ao impor ao mandato a forma exigida à prática do negócio jurídico de que é preparatório. Se o mandato visar, por exemplo, “à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País” (art. 108, CC), a forma deverá ser, necessariamente, por escritura pública. **Ainda quanto à forma, o art. 657 veda o mandato verbal quando o ato a ser praticado deva ser instrumentalizado por escrito. **As pessoas capazes podem outorgar procuração por instrumento particular, desde que habilitadas à assinatura do nome. Assim, estão impedidos os relativamente incapazes, os analfabetos, os impossibilitados fisicamente de assinar o nome. Os absolutamente incapazes estão impedidos de constituir mandatários, pois os atos de seu interesse são praticados por seus representantes. Obs: A data a ser considerada, na aferição da capacidade, deve ser a da outorga da procuração e não a da prática do negócio jurídico pelo procurador. Se a incapacidade surgir no interregno, o ato praticado pelo procurador, por este motivo, não será inválido. **A interdição de qualquer uma das partes, como se verá, é uma das causas de extinção do mandato (art. 682, II, CC). A procuração por instrumento particular, segundo prevê o § 1º do art. 654, deve atender às seguintes exigências: a) o lugar e a data em que foi passada; b) a qualificação do outorgante e do outorgado (nome, nacionalidade, estado civil, profissão, carteira de identidade, domicílio); c) a finalidade da procuração, os poderes conferidos e sua extensão. Caso o terceiro interessado exija, o mandatário deverá reconhecer a firma do mandante no instrumento particular. Relativamente ao instrumento público tal exigência é incabível, pois o ato se reveste de fé pública. Forma do substabelecimento Esta poderá ser por escrita particular ainda quando a procuração for passada por instrumento público, consoante expressa previsão do art. 655. Diferentemente da generalidade dos contratos, o mandato pode ser revogado pelo mandante, imotivada e unilateralmente, ressalvada a existência de cláusula de irrevogabilidade e outras situações previstas entre os artigos 683 a 686 do Código Civil. O laço entre as partes pode, igualmente, ser desfeito por ato de renúncia do mandatário. **DISPOSIÇÕES GERAIS *Mandato especial e geral Especial Mandato conferido para a prática de um ato específico ou para vários, mas determinados. É especial, exemplificativamente, quando o condômino outorga poderes para o mandatário representá-lo em assembleia de condomínio ou para vender um veículo. Ao mandatário se estende a prática de atos conexos aos autorizados. Assim, o poder de receber implica o de dar quitação. Mandato geral É o que investe o mandatário com poderes libera administratio, ou seja, para a prática de atos inerentes à administração ordinária, como os de efetuar pagamentos, contratar e dispensar funcionários, contrair pequenos empréstimos para o adimplemento de obrigações. **Poderes de administração, na expressão de João Luiz Alves, “São todos os que têm por fim conservar as coisas e direitos do mandante e resguardar-lhe o patrimônio atual e futuro.” Os atos que não se enquadram nos limites da administração ordinária, para serem exercitados, dependem de poderes especiais, como os de alienação, hipoteca, transação, enumerados exemplificativamente pelo art. 661, § 1º, do Código Civil. **Também não se enquadram na esfera da administração ordinária: a novação, a renúncia, o casamento, a emancipação, o reconhecimento de filho, entre outros atos negociais. * Estes requerem poderes específicos. *Carência de representação O mandante se responsabiliza pelos negócios realizados em seu nome, mas não se obriga pelos atos praticados sem mandato ou que exorbitem os poderes conferidos. *Ocorrendo uma destas duas hipóteses, o mandatário será considerado mero gestor de negócios, enquanto os seus atos não forem ratificados. Este é um efeito do princípio da relatividade das obrigações. Tais atos podem, entretanto, ser ratificados pelo mandante, provocando, destarte, a sua vinculação aos negócios. A ratificação, que retroage à data do ato, pode ser expressa ou tácita (prática de ato inequívoco). Na hipótese de o mandatário agir em seu próprio nome, ainda que em proveito do mandante, assumirá os direitos e as obrigações perante o terceiro com quem praticou o negócio. *Jus retentionis O Código Civil de 2002, pelo art. 664, confere aquele direito ao mandatário por tudo a que tenha direito em consequência do mandato. Igual direito é garantido ao comissário (art. 708). À vista dos termos amplos e claros do art. 664, injustificável o art. 681, que reproduz o texto da codificação revogada. **OBRIGAÇÕES DO MANDATÁRIO O mandatário deve praticar os atos necessários ao cabal cumprimento do encargo assumido, agindo com diligência e exação. Eventuais prejuízos proporcionados ao mandante deverão ser ressarcidos pelo mandatário, caso os tenha provocado por culpa. ** A indenização não pressupõe conduta dolosa, pois basta que o mandatário atue de forma negligente ou sem a devida eficiência. Igualmente, se a culpa foi daquele a quem substabeleceu sem a devida autorização (art. 667, caput e § 4º). Neste caso terá direito de regresso contra o substabelecido. Se no contrato houver cláusula proibitiva de transferência do encargo e, não obstante, o mandatário substabelecer, ficará responsável por qualquer prejuízo advindo, inclusive os oriundos de caso fortuito ou força maior, salvo se provar que os danos ocorreriam ainda que não houvesse o substabelecimento. Quando este é autorizado e sobrevém danos causados pelo substabelecido, o mandatário somente responderá se agiu com culpa na escolha daquele ou nas instruções que lhe passou. *** Os prejuízos causados pelo mandatário não se compensam com as vantagens ou lucros obtidos para o mandante (art. 669), isto porque estes não integram o patrimônio do mandatário e não se compensam obrigações com direitos alheios. Caso o mandatário tenha utilizado, em proveito pessoal, de valores recebidos em função do mandato, deverá pagar ao mandante os juros correspondentes ao período (art. 670). O atual Códex não reproduziu o dispositivo que obriga o mandatário a exibir a procuração, quando solicitado pelo terceiro com quem estiver tratando em nome do mandante, previsto no art. 1.305 do Código Civil de 1916, mas com toda evidência tal solicitação deve ser atendida, pois o § 2º, do art. 654, do Código de 2002, o obriga a reconhecer a firma quando aquele o pedir. Ora, se o terceiro pode exigir o mais, poderá também o menos. Mais do que a simples exibição e reconhecimento de firma, entendemos que, em se tratando de procuração por instrumento particular, ao terceiro assiste o direito de obter, por princípio de segurança jurídica, cópia autenticada desse documento. Na época prevista pelas partes ou ao final do contrato, o mandatário deve prestar contas de seu trabalho, repassando ao mandante todos os proveitos oriundos do mandato (art. 668). Vale dizer, se houve lucro extra e lícito, este também pertencerá ao mandante. *Em caso de mora na prestação de contas, o mandatário, na forma do art. 399, responderá por eventuais prejuízos, inclusive os causados por caso fortuito ou força maior. A prestação de contas não é exigível nos casos de procuração em causa própria (art. 685) e quando o mandante dispensa o mandatário desta obrigação. O acerto final deve ser feito em particular, salvo se as partes não chegarem a um acordo, quando então a prestação de contas se fará judicialmente,mediante ação proposta pelo mandante ou pelo mandatário. A prestação de contas, para Cunha Gonçalves, pressupõe o desconhecimento do mandante quanto às operações realizadas. Se este, no dia a dia, acompanha todas as fases do negócio, “houve uma prestação de contas paulatina”, não se justificando, assim, a repetição do ato. ** Quanto ao recibo de quitação geral, o STJ já entendeu que este não exclui o dever de prestação de contas, relativamente aos valores movimentados em conta bancária. Quando o objeto do mandato for um ato de compra, para o qual o mandante entregou os recursos financeiros ao mandatário, este não poderá, em seu nome pessoal, adquirir a coisa para si, sob pena de o mandante, judicialmente, exigir a entrega da coisa comprada (art. 671, CC). **Não me parece essencial, in casu, que a coisa tenha sido adquirida com os recursos do mandante, pois o que o Código Civil objetiva é impedir atos de oportunismo do mandatário que, por força do mandato, toma ciência da possibilidade de algum bom negócio e o realiza para si, traindo a confiança do mandante e descumprindo uma obrigação. Na hipótese de o mandante constituir dois ou mais mandatários no mesmo instrumento, neste deverá constar se a atuação de ambos será conjunta ou separada. No primeiro caso, os negócios jurídicos praticados em nome do mandante não serão eficazes se apenas um dos mandatários praticar o ato, salvo se este vier a ser ratificado. Se conferidos poderes para atuação em separado, na procuração deverá constar se qualquer um poderá cumprir integralmente o objeto do mandato ou apenas exercer uma função específica, que poderá ficar condicionada a determinado fato. ** Se o mandato não esclarecer se a atuação deverá ser conjunta, nem dizer a função de cada mandatário, qualquer um poderá exercer os poderes outorgados. No cumprimento da obrigação assumida, o mandatário deve pautar os seus atos na medida dos poderes recebidos. **Quando, na prática de determinado negócio jurídico, exorbita dos poderes outorgados e o terceiro tem ciência de tal fato, este não terá ação contra o mandatário, salvo se este assumiu, pessoalmente, a responsabilidade do ato ou prometeu a ratificação do mandante (art. 673). Ao prometer a ratificação, o mandatário assume um risco, porque a confirmação não constitui dever do mandante, mas uma simples faculdade. · Em nenhuma hipótese o terceiro terá ação contra o mandante, pois tomou conhecimento, antes de praticar o negócio jurídico, dos poderes conferidos ao mandatário. A partir do art. 682, o Código Civil dispõe sobre a EXTINÇÃO DO MANDATO, apontando, entre outros motivos, a morte, interdição ou mudança de estado do mandante, que o inabilite a conferir os poderes outorgados. Obs: ** Ainda que ocorra uma destas causas extintivas e desde que o negócio tenha sido iniciado, diz o art. 674, o mandatário deverá concluí-lo, havendo perigo na protelação. Algumas observações se impõem: a) Não é qualquer mudança de estado, mas apenas a que normalmente obstaria a realização do negócio; * Em relação à ausência, enquanto não declarada em juízo, não constitui causa de extinção do mandato; b) Desde que realizados todos os supostos previstos no art. 674, o mandatário deverá concluir o ato negocial. *Vale dizer: se ocorreu o óbito do mandante, o negócio encontra-se iniciado e há evidências de que a demora representaria ameaça aos interesses dos herdeiros, o mandatário é obrigado a complementar as suas gestões ou então a tomar medidas acauteladoras; c) se o mandatário, por inércia, não concluir o negócio, poderá ser responsabilizado por eventuais prejuízos. **OBRIGAÇÕES DO MANDANTE O mandante se torna responsável por todas as obrigações assumidas em seu nome pelo mandatário, desde que no limite dos poderes concedidos ou tenham sido expressamente ratificadas. *A contrario sensu, os atos negociais que não tiverem por lastro poderes conferidos, ou que os extrapolarem, não vinculam o mandante. Se o mandatário, atuando de acordo com os poderes recebidos, desviar-se das instruções recebidas, ficará responsável perante o terceiro, mas terá direito à indenização contra o mandatário (art. 679). Como as orientações não são estipuladas na procuração, caberá ao mandante produzir a sua prova e a da inobservância por culpa. Caso o mandatário tenha praticado o negócio jurídico de forma dolosa, o mandante responderá solidariamente com ele por perdas e danos, consoante a previsão do art. 149, segunda parte, do Código Civil. Para a ação dolosa do representante legal, o efeito é outro: o representado responde apenas até o valor correspondente ao proveito obtido. Em relação ao mandatário, o mandante assume obrigações nos termos do contrato. A simples formação deste gera a obrigação, quando nada, de contribuir com o fornecimento de dados para a boa execução da tarefa cometida. Se o objeto do mandato implicar despesas, estas deverão ser custeadas pelo mandante, que haverá, inclusive, de adiantar os valores correspondentes caso o mandatário o solicite (art. 675). **Quando este fizer gastos de seu próprio bolso, terá direito à restituição com acréscimo de juros compensatórios, contados desde a data das despesas (art. 677). Estas, juntamente com a remuneração prevista, deverão ser pagas, ainda que do mandato não resultem os efeitos esperados pelo mandante, salvo se houve culpa do mandatário (art. 676). · Neste ponto o mandato difere radicalmente da gestão de negócios, porque nesta o dono só é obrigado pelas despesas, quando o ato de gestão lhe foi proveitoso (art. 869). Quanto ao montante dos gastos na execução do mandato, feita a sua comprovação, cabe ao mandante o devido reembolso, não podendo alegar que as despesas foram excessivas, salvo se o mandatário agiu de má-fé. *Este terá direito a ressarcimento por eventuais prejuízos no cumprimento do mandato, caso não os tenha provocado por culpa pessoal ou por excesso no cumprimento do mandato (art. 678). Neste caso deverão ser computados juros moratórios, atualização monetária, além de outras verbas previstas no art. 104 do Código Civil. ******A doutrina exemplifica, como eventuais prejuízos, o furto de que o mandatário tenha sido vítima ao cumprir determinada diligência, o acidente automobilístico, aéreo ou marítimo, sofrido durante viagem a serviço do mandante. Quando o mandato for conferido por duas ou mais pessoas, visando objetivo comum, haverá solidariedade passiva nas obrigações assumidas com o mandatário, sejam estas por despesas, remuneração, ressarcimento de prejuízos. ** A quem efetuar o pagamento assistirá o direito de regresso contra os demais coobrigados (art. 680). *Aplicando-se o argumento a contrario sensu, tem-se que, sendo individuais os interesses dos mandantes, inexistirá a solidariedade, respondendo cada qual em conformidade com a obrigação assumida. A norma que estabelece a solidariedade é de natureza dispositiva, podendo ser afastada pelo consenso de todos os interessados. Tal solidariedade não se estende à responsabilidade perante o terceiro, pois não há previsão legal neste sentido e, à vista do disposto no art. 265 do Código Civil, a solidariedade não se presume. Na lição de João Luiz Alves, a solidariedade não impede a revogação do mandato por qualquer dos mandantes, nem a renúncia do mandatário em relação a um ou a alguns dos outorgantes. Ocorrendo uma destas hipóteses, a responsabilidade solidária do mandante perdura até o momento em que se desvincula por iniciativa própria ou não. Consoante abordagem no item anterior, o mandatário dispõe do jus retentionis em face do mandante, relativamente aos seus haveres decorrentes do mandato, os quais não se limitam às despesas efetuadas, alcançando inclusive a remuneração ajustada, nos termos da inovadora disposição do art. 664. ** EXTINÇÃO DO MANDATO Causas diversas podem provocar o término do mandato. O mais comum é que seja pela realização da tarefa atribuída ao mandatário. Conforme a obrigação assumida pelo mandatário, embora extinto o contrato perdura a relação jurídica entre as partesaté que se ultime a prestação de contas com o acerto devido. Tratando-se de contrato por prazo determinado, findo este, sem prorrogação, extingue-se o mandato. ** A estas duas causas de extinção de mandato – cumprimento da obrigação e término do prazo – a doutrina denomina por CAUSAS NATURAIS. Ordinariamente, o mandante pode revogar ad nutum o mandato conferido. **Ainda que as partes tenham estipulado cláusula de irrevogabilidade, o mandante pode extinguir unilateralmente o contrato, hipótese em que responderá por perdas e danos (art. 683). O poder revogador do mandante contrasta com o princípio geral de que os contratos só podem ser dissolvidos por mútuo consenso. A exceção se justifica por três razões, que normalmente motivam o contrato: a) a confiança no mandatário (finita voluntate, finitum est mandatum); b) o contrato, via de regra, visa a atender interesse exclusivo do mandante; c) a gratuidade como caráter, em geral, do contrato. ** A cláusula de irrevogabilidade é considerada, por alguns autores, contrária à natureza do mandato. O mandante não é impedido de revogar o mandato conferido a seu funcionário. Pode-se acrescentar que a relação de emprego não impede o mandatário de renunciar os poderes recebidos. Obs: Há situações em que o ato de revogação é ineficaz: a) Se a irrevogabilidade for condição de um negócio bilateral (art. 684). ** Neste caso o mandato é um pacto acessório ao contrato principal e não é do interesse exclusivo do mandante. b) Quando o mandato reunir poderes de cumprimento ou confirmação de negócios iniciados, aos quais se ache vinculado (art. 686, parágrafo único). *A irrevogabilidade, in casu, é uma garantia do terceiro, com quem o mandante fechou negócio, mas sem formalizá-lo, e justifica-se em face do princípio da boa-fé; c) Se estipulada em benefício exclusivo do mandatário (art. 684). Obs: Tratando-se de mandato com a cláusula “em causa própria” (in rem propriam), o contrato não se extingue também pela morte de qualquer uma das partes, nem o mandatário fica obrigado a prestar contas ao mandante, podendo, inclusive, nos termos do mandato, transferir para si quaisquer bens. ** Para o adquirente, a procuração nesses termos significa uma garantia de efetivação do negócio. * A procuração em causa própria é irrevogável, porque encobre negócio jurídico no qual o mandante cede direitos ao mandatário. ** Ao revogar o mandato o seu autor deve notificar o mandatário, a fim de que este cesse as ações. Igualmente deve cientificar aqueles em relação aos quais o mandato deveria produzir efeitos. Obs: Se o mandante deixa de cientificar esses terceiros interessados, a revogação em relação a eles será ineficaz. O ato praticado pelo mandatário, após a ciência da revogação, será válido se o terceiro estiver de boa-fé, mas se sujeitará a eventuais perdas e danos e a quaisquer outras ações que o mandante contra ele tiver. A revogação pode ser expressa ou tácita. Aquela se opera pela notificação e esta, prevista no art. 687 do Código Civil, pela nomeação de outro procurador, para a realização do mesmo negócio. Segundo Clóvis Bevilaqua, ainda que o segundo nomeado rejeite o encargo, o mandato anterior estará revogado em face da manifestação de vontade do mandante. Em contrapartida o mandatário dispõe do direito de renúncia, mas por este ato poderá responder por perdas e danos, caso não substabeleça e, por falta de tempo hábil, o mandante fique impossibilitado de substituí-lo. ** O mandatário não ficará sujeito àqueles efeitos se renunciou para evitar um prejuízo seu considerável e encontrava-se impedido de substabelecer (art. 688). A Lei Civil não exige uma forma especial para a renúncia, que pode ser expressa ou tácita. Dá-se esta última quando o mandatário abandona o mandato ou pratica atos incompatíveis com a representação. A estas duas causas de extinção a doutrina denomina VOLUNTÁRIAS.(revogação e renúncia) O mandato se extingue, ainda, devido a CAUSAS LEGAIS: pela morte ou interdição de uma das partes e pela mudança de estado que iniba o mandante de conferir os poderes específicos ou o mandatário de exercitá-los. ** Em caso de morte do mandatário, estando por se concluir algum ato, seus herdeiros devem comunicar o fato ao mandante e, nessa fase de transição, colaborar com os interessados na realização do negócio jurídico (art. 690). A Lei Civil obriga os herdeiros à prática de medidas conservatórias ou a continuação dos contatos, dentro dos poderes outorgados ao falecido, a fim de evitar a inviabilidade do negócio pela demora. ** Tal regra, visando a proteger o mandante, excepciona o princípio romano“mandatum solvitur mortem”, estendendo-se extraordinariamente o mandato aos herdeiros do mandatário. O preceito do art. 689 contém outra exceção: será válido o negócio jurídico praticado em nome do mandante falecido, desconhecendo o mandatário e o terceiro este fato ou a extinção do mandato por qualquer outra razão. **MANDATO JUDICIAL A procuração outorgada pelo constituinte ao seu advogado, para a prática de atos judiciais ou extrajudiciais, está prevista no Código de Processo Civil de 2015 (art. 105), no Estatuto da Advocacia (art. 5º da Lei nº 8.906/94), na Lei de Assistência Judiciária (art. 16, Lei nº 1.060/50). As disposições do Código Civil são aplicáveis apenas supletivamente. O bacharel em Direito se torna apto a exercer a advocacia mediante a inscrição nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil. A partir deste ato habilita-se a receber procuração ad judicia. A exigência se estende aos defensores públicos e aos procuradores de órgãos públicos em geral. A representação por advogado devidamente habilitado, consoante o art. 103 do novo CPC, é pressuposto processual, sem o qual haverá nulidade do processo. Mas a falta de representação é defeito sanável, conforme o permissivo do art. 76 da Lei Processual Civil e do art. 569, do Código de Processo Penal. ** Em caso de urgência, em matéria cível, pode o advogado peticionar sem procuração, obrigando-se a juntá-la aos autos no prazo de quinze dias, prorrogável pelo mesmo período, mediante despacho do juiz (art. 104, CPC). *Não apresentado o instrumento do mandato, os atos serão considerados inexistentes. Como os mandatos em geral, o conferido ao advogado também é passível de renúncia, mas para tanto o constituinte deverá ser cientificado. *Durante os dez dias que se seguirem à notificação, o profissional estará obrigado à prática de todos os atos inerentes à representação. · A prática de atos privativos do advogado requer, em regra, a outorga de procuração. **Esta é desnecessária, quando o advogado atua em causa própria. Nos juizados especiais, previstos na Lei nº 9.099/95, a parte pode defender os seus interesses, quando o valor da causa não for superior a vinte salários mínimos. Admite-se, na Justiça Comum, que o leigo defenda a sua própria causa, quando não houver advogados no lugar ou, havendo estes, não queiram ou estejam impedidos de exercer o patrocínio. No Juízo Criminal e no Trabalhista, a procuração é dispensável, bastando que a parte indique ao juiz, em audiência, o nome de seu patrono. ** Os defensores públicos, pelo art. 16 da Lei nº 1.060/50, estão dispensados da apresentação de instrumento do mandato, bem como os procuradores dos Municípios e dos Estados, que estão investidos de poderes por leis especiais. *** O mandato conferido ao advogado deve ser por escrito, bastando o instrumento particular devidamente assinado pelo constituinte, dispensado o reconhecimento de firma. A procuração ad judicia (para o foro em geral) habilita o profissional para a prática da generalidade dos atos processuais. De acordo com o art. 105 do Código de Processo Civil de 2015, a procuração geral para o foro autoriza o advogado à prática de todos os atos processuais, excetuando-se “receber citação, confessar, reconhecer a procedência do pedido, transigir, desistir, renunciar ao direito sobre o qual se funda a ação, receber, dar quitação, firmar compromisso e assinardeclaração de hipossuficiência...”.· Para tais atos são indispensáveis poderes específicos, não bastando, pois, a procuração ad judicia. Obs: Tratando-se de sociedade formada por advogados, na procuração devem constar os nomes individuais e o da pessoa jurídica, consoante dispõe o art. 15, § 3º, da Lei nº 8.906/94. FIANÇA * Art. 818 a 826 Os contratos em geral são importantes ao tráfico jurídico, em maior ou menor grau, ao possibilitarem a composição de interesses. Alguns são valiosos em si mesmo, regulando diretamente a relação social. São chamados principais. Outros se revestem de significado na medida em que fornecem condições básicas à formação de outras convenções. São os acessórios. ** O contrato de fiança integra é classificado como ACESSÓRIO, pois a sua relevância deriva da importância do contrato principal. FIANÇA A sua finalidade é conceder, ao credor da relação principal, garantia de adimplemento da obrigação. Trata-se de caução adicional, pois os bens do devedor respondem por suas dívidas. Nem todo contrato bilateral carece de fiança para cercar o credor das garantias necessárias. O princípio da exceptio non adimpleti contractus protege quem deve adimplir em segundo lugar, dispensando-o de outras garantias. Tipos de caução: Caução Real Garantia recai sobre determinado bem; Pessoal ou Fidejussória Quando uma pessoa assume a responsabilidade de pagar solidária ou subsidiariamente. **A fiança faz parte desta categoria e sua prática maior está em função dos contratos de locações, para os quais se exigem fiadores que sejam proprietários de imóveis. A FIANÇA é espécie do gênero caução ou garantia. No âmbito do Direito Administrativo é comum, também, a prática da caução, exigida pela administração pública como garantia dos contratos celebrados com particulares, seja mediante fiança bancária, depósito em dinheiro ou em títulos. Modernamente, sobretudo para os contratos de maior expressão econômica, os devedores encontram dificuldades em obter a fiança entre parentes e amigos, daí recorrerem, muitas vezes, à garantia del credere, dada por instituições bancárias mediante remuneração. O vocábulo FIANÇA, TAMBÉM COM O SENTIDO DE GARANTIA, emprega-se em Direito Processual Penal. *** Distingue-se da fiança civil, pois não constitui garantia fidejussória. Quando autorizada, o preso em flagrante deposita uma quantia arbitrada e se compromete a comparecer em juízo, sempre que a sua presença for solicitada. A garantia da fiança pode originar-se de contrato, lei ou de decisão judicial. A fiança, dita convencional, acha-se regulada no Código Civil, artigos 818 usque 839. Fiança legal é a imposta por lei em determinadas hipóteses, como na do parágrafo único do art. 1.745, do Código Civil, que autoriza o juiz a condicionar o exercício da tutela à prestação de caução, caso o patrimônio do menor seja de valor considerável. Judicial é a fixada pelo juiz, ex officio ou a requerimento de parte, tanto em processos cíveis, trabalhistas, quanto em penais. CONCEITO Pelo contrato de fiança, alguém (fiador) se compromete, perante o credor, a responder, subsidiária ou solidariamente, pelas obrigações assumidas pelo devedor (afiançado). Embora este artigo se refira apenas ao caráter subsidiário da obrigação, dizendo “... obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra”, o inc. II, do art. 828, complementa a definição, permitindo que o fiador se obrigue como principal pagador ou devedor solidário. A fiança tanto pode ser objeto de contrato, quanto de promessa de contrato, embora a este respeito haja divergências doutrinárias. É possível, pelo contrato de fiança, assegurar-se o cumprimento de qualquer tipo de obrigação, seja de dar, fazer ou não fazer. O Código Civil de 2002 não reproduziu o disposto no art. 1.482 do Código Beviláqua, que previa a subfiança, ou seja, a fiança do fiador, sujeitando-a às regras gerais da fiança. *** Nada impede a celebração, atualmente, deste tipo de contrato entre credor e terceiro. Dependendo das cláusulas contratuais, a garantia poderá ser subsidiária ou solidária. ** Se omisso o contrato a respeito, dever-se-á considerar garantia subsidiária. · No contrato de fiança a relação jurídica se estabelece entre credor, que é o destinatário da garantia, e o fiador – garante da obrigação. · O devedor não é parte contratual, podendo a convenção de fiança realizar-se com o seu desconhecimento ou até mesmo contra a sua vontade. · O credor participa de dois contratos: do principal, com o devedor (e afiançado), e do acessório, com o fiador. · Como, por princípio geral, a responsabilidade do fiador é subsidiária, o credor somente pode exigir o adimplemento do garante quando o devedor não cumprir a obrigação. Obs: Embora o devedor afiançado não seja parte no contrato de fiança, nele figura como elemento necessário, pois a sua obrigação é objeto da garantia. ** A capacidade exigida do fiador é a básica, não podendo assumir tal responsabilidade quem não possa legalmente administrar seus bens. Obs: A pessoa casada, pelo disposto no art. 1.647, III, depende da autorização do cônjuge, salvo no regime da separação absoluta de bens. **A anuência deve ser expressa em termos específicos, não bastando a procuração com poderes amplos e gerais, à vista do disposto no § 1º do art. 661, também da Lei Civil. **A concordância do cônjuge pode ser suprida pelo juiz, desde que se convença da inexistência de motivos plausíveis para a denegação. **Em contrapartida, o cônjuge que discordar da fiança concedida pelo consorte, à sua revelia, desde que o regime não seja o de separação absoluta, poderá pleitear a rescisão contratual, de acordo com o disposto no art. 1.642, IV, do Código Civil. A jurisprudência de nossos tribunais superiores considera nula a fiança prestada sem a anuência do cônjuge, quando necessária, não admitindo a tese de que a garantia recai apenas sobre a meação de quem se comprometeu. Obs: Consoante julgamento da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, em 2014, a falta de anuência do companheiro em união estável não invalida a garantia da fiança. Relativamente à capacidade das pessoas jurídicas para prestarem caução, importante será a consulta aos respectivos estatutos ou regulamentos, que podem vedar a prática ou limitar o comprometimento em fianças. ** Há pessoas que estão impedidas de prestar fianças, por força de lei, em razão de funções públicas que ocupam, como é o caso de fiscais, tesoureiros, leiloeiros, entre outros. Quanto às obrigações nulas, o art. 824 é específico e ressalva as nulidades decorrentes de incapacidade do devedor. Pelo parágrafo único do artigo, a nulidade da fiança persiste quando o contrato principal for de mútuo feito a menor. A fiança pode ter por objeto tanto as obrigações atuais quanto as futuras. Sobre estas últimas, o art. 821 exige que a dívida se torne, primeiramente, certa e líquida, para depois ser cobrada do fiador.** A certeza diz respeito à existência da dívida, enquanto a liquidez refere-se à importância devida. ** No objeto da fiança incluem-se, além da principal, as obrigações acessórias. A garantia não pode exceder o valor da obrigação. CARACTERES Espécie do gênero caução ou garantia, a fiança é um contrato acessório, umbilicalmente vinculado a um principal. *** Assim, em caso de nulidade do contrato principal, ipso facto o de fiança será nulo. É a lei da gravitação jurídica (acessorium sequitur suum principale = o acessório segue o principal). ** Em caso de nulidade da fiança, a validade do contrato principal não será afetada. Poderá, sim, o devedor ser obrigado a prestar nova fiança, caso esta seja uma condição do contrato básico. Consoante Carvalho de Mendonça, a fiança não gera uma obrigação, pois esta existe no contrato principal; apenas estende ao fiador a responsabilidade pelo adimplemento e em caráter subsidiário. CONSENSUAL Trata-se de contrato consensual, pois o elo entre credor e fiador forma-se pelo encontro de vontades. O contrato não requer o consentimento do afiançado. A fiança, todavia, pode ser precedidapor uma convenção entre fiador e afiançado. Embora consensual, o contrato não depende apenas da voluntas, também de sua manifestação por escrito. Desnecessário dizer-se que o credor, para aceitar a fiança, deve estar de acordo com o nome indicado para fiador, pois, para haver contrato, é imprescindível a declaração convergente de vontades. A concordância com o nome é conditio sine qua non para a celebração do contrato principal, pois exige-se que o fiador seja pessoa idônea e com lastro econômico suficiente para atender a obrigação assumida pelo devedor-afiançado. BENÉFICO O contrato é benéfico, pois visa a favorecer tanto o afiançado quanto ao credor. Ao primeiro, porque dá viabilidade à sua pretensão de contrair vínculo obrigacional; ao segundo, porque cerca o seu negócio jurídico de garantia e segurança. E, em regra, para o fiador não há contraprestação. ** Dada a beneficência do contrato, a interpretação deve seguir o critério do art. 114 do Código Civil, que impõe a estrita observância das cláusulas convencionadas, vedada a exegese extensiva. Obs: Há fiança onerosa, todavia, pela qual o fiador é remunerado pelo afiançado. O seu grande exemplo são as garantias constituídas por agências bancárias. Neste caso, não se aplica o citado princípio hermenêutico. UNILATERAL Em sua generalidade, o contrato de fiança é unilateral, pois apenas o fiador assume obrigações perante o credor. Alguns autores questionam a respeito, considerando-o bilateral imperfeito, dado que ao fiador, em caso de pagamento, assiste o direito de regresso. FORMAL De acordo com o Código Civil, art. 819, o contrato de fiança exige a forma escrita, seja esta por instrumento particular ou público. As pessoas analfabetas, cegas, surdas-mudas, quanto capazes de externar a sua vontade, não estão impedidas de prestar fiança, devendo, todavia, ser representadas por mandatários, devidamente constituídos por instrumento Público. INTUITO PERSONAE Há jurisprudência neste sentido. A fiança é contrato intuitu personae, pois o credor, antes de celebrá-lo, avalia a idoneidade financeira da pessoa indicada para fiadora. O próprio étimo da palavra – fiar – indica o sentido da fiança, que significa confiar. Além disto, quando obrigado a dar fiança, o devedor não poderá impor qualquer nome, apenas o que reunir os predicados indicados no art. 825 da Lei Civil. O Superior Tribunal de Justiça decidiu que: “... A fiança é dada em caráter personalíssimo, de sorte que mesmo em caso de garantia dada a favor de pessoa jurídica, tal elemento sofre afetação quando há transferência de titularidade na empresa, fazendo desaparecer a razão essencial daquele ato...” GRATUITO Em geral os contratos de fiança são praticados gratuitamente e isto porque, entre fiadores e afiançados, sempre há laços de amizade ou vínculos de parentesco, razões que superam qualquer interesse econômico. O caráter gratuito, todavia, não impede que o fiador pleiteie regressivamente contra o afiançado, quando induzido a pagar em seu lugar. A gratuidade não chega a ser da essência do contrato, pois a Lei Civil não proíbe a remuneração, comum, aliás, na fiança bancária. **Neste caso, como observa José Augusto Delgado, o pagamento tem o sentido de compensar o risco assumido. **DISPOSIÇÕES GERAIS *A obrigação do fiador Se o garante não se comprometeu a responder solidariamente pela dívida, a sua obrigação fica subordinada à condição suspensiva, consubstanciada no não pagamento pelo afiançado-devedor. A fiança pode ser parcial ou total, de acordo com a possibilidade, conveniência ou interesse do fiador, que nem sempre possui condições econômicas para suportar encargos que superem determinado limite. Sendo parcial, ainda que o valor da dívida extrapole o limite da fiança, o garante responderá apenas até o valor estipulado. O art. 823 dispõe neste sentido. Se a caução fidejussória for total, a obrigação abrangerá os acessórios da dívida principal, como juros, multa e atualização monetária, além das despesas judiciais, sendo que o cômputo dos encargos se faz a partir da citação. Para que a fiança seja parcial, indispensável que no instrumento contratual conste expressa cláusula delimitadora. ** A fiança pode ser parcial pelo valor ou por itens da obrigação. No primeiro caso, a cláusula deverá indicar o quantum e no segundo, as verbas pelas quais o fiador responderá. Obs: Se a fiança diz respeito à locação, a cláusula contratual limitadora poderá excluir, por exemplo, a verba de indenização por perdas e danos. A responsabilidade também poderá ser limitada pelo tempo, permanecendo o fiador responsável pelas obrigações geradas durante certo lapso temporal. · O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em 2014, pela 12.ª Câmara Cível, julgou nula a cláusula contratual que prorroga automaticamente a fiança, à luz do disposto no art. 819 do Código Civil, que não admite a interpretação extensiva para a garantia. Se o valor da fiança superar o da obrigação devida pelo afiançado, o fiador responderá apenas sobre o quantum debeatur, ou seja, até o limite da obrigação afiançada. A responsabilidade do fiador não pode ir além da obrigação ou onerosidade do devedor principal. *Indicação de fiador Quando, por acordo entre as partes do contrato principal, ou por imposição legal, couber ao devedor a nomeação de fiador, certos parâmetros básicos deverão orientar a escolha, sob pena de legítima rejeição pelo credor. O art. 825 dispõe a respeito. A pessoa indicada há de ser: · Idônea; · Domiciliada no município onde a fiança deverá ser prestada; * A exigência quanto ao domicílio se explica pelas dificuldades que o credor teria para, eventualmente, ajuizar uma ação contra o fiador em município diverso. · Possuir lastro econômico suficiente para, na eventualidade de não pagamento pelo devedor, adimplir a obrigação. *Por idoneidade, devem-se entender os predicados de ordem moral, ou seja, honestidade. Obs: Entendo (Nader) que o credor não poderá recusar para fiador quem, embora domiciliado em município distinto ao do lugar onde deverá a fiança ser celebrada, se disponha a eleger o foro do contrato como o competente para dirimir quaisquer litígios. Pertinente à idoneidade financeira, imperioso que a pessoa indicada possua bens, móveis ou imóveis, livres e desembaraçados. Com evidência, os insolventes ou falidos não preenchem tal requisito. *Substituição do fiador A pessoa insolvente, falida ou incapaz, por força de lei fica impedida de administrar seus bens, daí a sua incompatibilidade para figurar como fiadora em contrato. *Caso uma dessas situações atinja o fiador na vigência de seu contrato, pelo art. 826 do Código Civil o credor fica autorizado a exigir a substituição do garante, seja convencional, legal ou judicial a fiança. Para exercitar o seu direito, deverá o credor comprovar a mutação alegada. Na lição de Carvalho Santos, a regra sub examine não é absoluta, pois o credor somente poderá impor a exigência, quando: a) o devedor for obrigado a apresentar fiador, pois “o credor que não tenha direito de exigir fiança não tem direito de exigir substituição dela”; b) o fiador que ficou insolvente, falido ou incapaz, não foi nomeado pelo próprio credor; c) a fiança tenha sido prestada com o conhecimento ou concordância do devedor. Qual a consequência prática da não substituição do fiador, sendo esta exigida nos termos da Lei Civil? – A resposta está no art. 333, inc. III, do Códex: · O credor poderá exigir do devedor-afiançado, antecipadamente, o pagamento da obrigação. **EFEITOS DA FIANÇA *Benefício de ordem Tratando-se de fiança subsidiária, o credor somente poderá exigir o pagamento pelo fiador, após pleitear judicialmente contra o devedor afiançado. Não observada esta ordem, o fiador poderá invocar o benefício de ordem ou de excussão,devendo fazê-lo até a contestação da lide, caso a ação proposta seja de cobrança; se ação executiva, mediante embargos do devedor – arts. 914 e seguintes do Código de Processo Civil. Não arguido tempestivamente o benefício, o direito dofiador fica precluso. O direito do fiador, contudo, não é incondicional; não basta a subsidiariedade da obrigação para se obter o benefício de ordem. ** Ao alegar, deverá indicar bens do devedor, livres e desembaraçados, localizados no mesmo município em que a ação foi ajuizada, suficientes para atender o débito. É a dicção do art. 827 do Código Civil. O critério legal é substancialmente justo e coerente pois, sendo a acessoriedade e a subsidiariedade dois caracteres da fiança e reunindo o devedor-afiançado condições necessárias à quitação do débito, injustificável que o patrimônio do fiador respondesse em primeiro lugar. O fiador não poderá valer-se do benefício de ordem ou de excussão, quando o renunciou expressamente. Não haverá o direito/privilégio, caso o fiador tenha se obrigado como principal pagador ou devedor solidário. Inexistirá o direito, também, quando o devedor-afiançado for insolvente ou falido. Se, por sub-rogação no polo passivo da obrigação principal, o fiador passa a ser devedor, cessa o benefício de ordem, pois as qualidades de fiador e devedor se reúnem em uma só pessoa. ** Finalmente, o fiador não poderá invocar o benefício de ordem quando a obrigação principal for declarada nula, devido a incapacidade pessoal do devedor-afiançado. Como a fiança subsiste (art. 824) sem a figura do devedor, o fiador não terá como invocar o benefício de ordem. *Pluralidade de fiadores No contrato de fiança e como garantia de uma única obrigação, pode haver cofiadores respondendo solidariamente pela dívida. *** Caso a garantia não seja solidária, mas por quotas, as partes devem instituir, no contrato, o benefício de divisão. Por este, cada fiador se obriga na proporção de sua quota ou de acordo com o número de coobrigados. A responsabilidade não se divide, necessariamente, em função da quantidade de fiadores, pois as partes podem estabelecer quotas diferenciadas. Não conseguindo receber a prestação do devedor, o credor aciona os fiadores e na proporção de seus quinhões diferenciados. *O art. 829 da Lei Civil dispõe a respeito. No contrato de fiança, credor e fiadores devem especificar a responsabilidade de cada um dos garantes, caso entre estes não haja solidariedade. Quando um fiador paga integralmente a dívida, adquire o direito de receber dos demais na proporção de suas cotas. Quem paga fica sub-rogado nos direitos do credor. Caso, entre os fiadores, haja algum insolvente, a sua parte na obrigação será dividida para os demais. *Direito de regresso Uma vez efetuado pagamento integral ao credor, extingue-se a relação entre este e o devedor, instaurando-se um outro vínculo jurídico entre fiador e afiançado. De acordo com a prescrição do art. 832, o afiançado responde perante o fiador por perdas e danos, tanto as que este pagar, quanto as que sofrer em razão da fiança. Ao fiador cabe, portanto, direito de regresso e indenização por perdas e danos sofridos em decorrência, por exemplo, de despesas de empréstimos ou prejuízos por venda de bens em função da dívida. Relativamente ao regresso, o fiador terá direito de cobrar juros pela importância desembolsada e pela taxa convencionada no contrato principal ou, na omissão deste, segundo os juros de mora legais, que são os fixados pela Fazenda Nacional para as dívidas de tributos federais. Os juros devem ser computados a partir do desembolso e não da citação do afiançado. *Fiança por prazo indeterminado Quando o contrato de fiança não apresenta cláusula de duração, pode o fiador desobrigar-se unilateralmente, bastando que notifique o credor de sua intenção. Após o ato, permanecerá ainda, pelo prazo de sessenta dias, como garante do devedor-afiançado, conforme prescreve o art. 835. Questão das mais relevantes diz respeito à possibilidade de o fiador, previamente, renunciar ao eventual direito de exoneração da fiança, previsto no supracitado artigo. O Superior Tribunal de Justiça reconhece a validade da renúncia: “A jurisprudência assentada nesta Corte construiu o pensamento de que é válida a renúncia expressa ao direito de exoneração da fiança, mesmo que o contrato de locação tenha sido prorrogado por tempo indeterminado, vez que a faculdade prevista no artigo 1.500 (art. 835 do novo Códex) do Código Civil trata-se de direito puramente privado.” *Ação do credor contra o devedor-afiançado A ação judicial proposta pelo credor contra o devedor-afiançado, visando a obter o cumprimento da obrigação, diz respeito também aos interesses do fiador, que pode ser constrangido a pagar, caso o devedor afiançado não o faça. Daí a regra do art. 834, que permite ao fiador a dar andamento em ação proposta pelo credor contra o devedor-afiançado, quando aquele favorecer a morosidade do feito. Conforme a situação concreta, os riscos do fiador crescem com a demora na execução, pois no meio tempo o devedor pode perder a sua capacidade financeira. *Morte do fiador A fiança se extingue com a morte do fiador, mas a responsabilidade por obrigações anteriores ao óbito transmite-se aos herdeiros e de acordo com a capacidade da herança. É a dicção do art. 836. A morte do devedor afiançado, por outro lado, não extingue a fiança, pois o de cujus sequer integrava a relação contratual. A obrigação, pela qual o fiador assumiu a garantia, passa a ser devida pelos herdeiros e dentro das forças da herança. *EXTINÇÃO DA FIANÇA Por vários modos extingue-se a fiança, mas o natural é pelo cumprimento da obrigação principal, seja pelo devedor-afiançado, seja pelo fiador. Igual efeito é obtido pela novação, compensação, confusão, remissão, entre outras causas. Conforme examinamos no item anterior, a morte do fiador provoca esse efeito, pois aos seus herdeiros transmite-se apenas a obrigação por dívidas existentes antes da sucessão e dentro das forças da herança. O art. 838 destaca três motivos que provocam a exoneração do fiador. Caso o credor renegocie a dívida com o devedor, concedendo-lhe prazo adicional para o adimplemento, sem a anuência do fiador, este ficará desobrigado por força de lei. * É a hipótese de moratória, que constitui novação contratual, conforme entendimento doutrinário. Se o fiador não anuiu no momento da novação, poderá fazê-lo a posteriori, quando então desaparecerá o motivo de extinção da fiança. Se o credor, de qualquer forma, torna impossível a sub-rogação nos seus direitos e preferências, o fiador fica desobrigado da fiança. Quando o credor, por exemplo, não registra a hipoteca e permite que o devedor afiançado aliene o imóvel sem o ônus real, provoca a exoneração do fiador. Igual efeito se impõe, quando o credor renuncia à hipoteca de imóvel pertencente ao devedor-afiançado. ** A regra se justifica, pois o patrimônio do devedor é também uma garantia para o fiador. Ora, se o credor, tendo a garantia da fiança, pratica gestos de liberalidade a favor do devedor afiançado, permitindo o enfraquecimento de seu patrimônio, atua prejudicialmente ao fiador. A conduta do credor, assim configurada, atenta contra os princípios da boa-fé, que as partes devem guardar em todas as fases dos contratos. Exonera-se o fiador, também, quando o credor aceita, em pagamento, objeto diverso do previsto em contrato, ainda que venha a perdê-lo por evicção. *A hipótese legal é de dação em pagamento, que tem o condão de extinguir a obrigação. Se esta foi extinta, ipso facto extinta restará a obrigação acessória. A exoneração do fiador se justifica, nesta última hipótese, porque o credor, sponte sua, assumiu o risco de vir a perdê-la. Obs: Se a dação é celebrada sob condição resolutiva, em que a evicção figura como acontecimento futuro e incerto, a superveniência desta torna a dação sem efeito, mantida a obrigação e a fiança anteriores. Quando o fiador responde subsidiariamente, o credor somente poderá acioná-lo quando não for possível receber o pagamento do devedor. Se, não obstante isto ocorre, poderá o fiador opor-lhe o benefício de excussão ou de ordem, devendo para tanto indicar os bens suficientes e disponíveis do devedor-afiançado, para efeitode penhora. Sobrevindo a insolvência deste, o fiador ficará exonerado da obrigação, caso logre comprovar que, à época da penhora, havia bens suficientes para o pagamento da dívida. *É a prescrição do art. 839, que se vincula, umbilicalmente, à disposição do art. 827. ** A fórmula legal é coerente, pois não seria justo se os maléficos efeitos da desídia do credor recaíssem sobre o fiador, que agiu em conformidade com a lei. EMPREITADA *Art. 610 ao 626 CONCEITO E FIGURAS AFINS No contrato de empreitada (marché à forfait, para os franceses) alguém, denominado empreiteiro, obriga-se a executar uma obra, com fornecimento próprio ou não de matéria-prima, sob encomenda do comitente (dono da obra ou proprietário), mediante pagamento. O vocábulo obra e a referência a materiais, empregados pelo Código Civil, sugerem que o objeto do contrato se restringe às coisas corpóreas. O texto legal, porém, não é incompatível com a extensão do objeto às coisas incorpóreas. * Em igual sentido a posição de Caio Mário da Silva Pereira, para quem o objeto da empreitada “é o mais amplo e variado, compreendendo toda espécie de produções, seja a clássica construção de uma obra material, seja a criação intelectual, artística ou artesanal.” O contrato é prático e favorece tanto a quem encomenda, quanto a quem executa. Ao comitente, porque define previamente o preço da mão de obra e, se for o caso, também do material, liberando-o dos encargos inerentes ao andamento dos serviços. Se a empreitada for mista (mão de obra e material), fica a coberto dos riscos com a matéria-prima, que correm neste caso por conta do empreiteiro. Para este, o contrato é um estímulo para trabalhar mais intensamente e economizar nas compras, além de evitar o desperdício. ** Em face das vantagens que oferece, o contrato é amplamente exercitado na construção ou reforma de imóveis, consertos em geral, confecção de móveis, plantações, serviços de demolição, entre outras obras. ** A administração pública se vale também do contrato de empreitada para a execução de seus serviços. Prestação de serviço · Retribuição é dimensionada pelo tempo gasto na atividade produtiva; · Naquela o serviço é prestado sob fiscalização; · A prestação de serviço é“um obrar”; · Contrato de meio * Riscos correm por conta do tomador; Empreitada · É medida pela extensão da obra; · O proprietário não tem qualquer ingerência sobre o andamento dos trabalhos; · É“uma obra”; · Contrato de resultado * Os risco são do executor da obra; A empreitada se assemelha à compra e venda quando envolve também o fornecimento de material, mas as duas espécies não chegam a se identificar. ** Carvalho de Mendonça faz distinções: se o comitente fornece o material, tem-se a empreitada, mas se este for encargo do executor, haverá uma venda condicional, salvo se o proprietário deu o terreno, quando então o contrato será também de empreitada. Para Clóvis Beviláqua, a empreitada “não tem por fim a alienação de coisa existente ou futura; o seu fim é a criação de uma coisa pelo trabalho de alguém: o empreiteiro ou os seus operários.” O contrato, como previsto na Lei Civil, apresenta duas espécies: a) Empreitada de mão de obra ou lavor: Obrigação de fazer. b) Empreitada mista, compreensiva de mão de obra e fornecimento de material: Obrigação de fazer e dar. *Riscos do material correm por conta do empreiteiro. c) Empreita sob administração: Riscos do material é do proprietário. Tendo em vista a duplicidade de espécies, na formação do contrato as partes devem explicitar a sua opção. A empreitada mista não se presume; deve resultar da lei ou da vontade dos contratantes, como dispõe o art. 610, § 1º, da Lei Civil. Isto não quer dizer, todavia, que a obrigação de fornecimento de material se caracteriza, tão somente, por cláusula expressa. ** O importante é que tenha havido manifestação objetiva da vontade. Além daquele parágrafo, o legislador houve por bem esclarecer que “o contrato para a elaboração de um projeto não implica a obrigação de executá-lo, ou de fiscalizar-lhe a execução” (art. 610, § 2º). *CARACTERES A locatio conductio operis se caracteriza como contrato consensual, bilateral, oneroso, comutativo, de resultado,impessoal e não formal. CONSENSUAL Forma-se pela simples declaração de vontade, daí dizer-se que é contrato consensual. A sua conclusão não requer a entrega de qualquer objeto, porque as partes apenas se obrigam: o empreiteiro, a entregar a obra nas condições estipuladas contratualmente e o proprietário, a pagar o preço pela forma ajustada. BILATERAL É bilateral, pois ambas as partes se obrigam. Há direitos e obrigações correspectivos. ONEROSO O contrato é oneroso, de vez que não é animado pelo espírito de liberalidade, antes, cada parte procura alcançar as melhores condições ou vantagens econômicas. Ambas assumem ônus. COMUTATIVO Há equilíbrio entre o quinhão que se dá e o que se recebe. Previamente, cada parte tem conhecimento da extensão dos ônus assumidos, embora o contrato possa assumir caráter aleatório, como seria o caso de, em pleno período das águas, firmar-se contrato de restauração de fachada de prédio, mediante preço fixo. O tempo gasto na execução da obra dependerá das condições atmosféricas. DE RESULTADO Empreitada é contrato de resultado, pelo que ao executor não basta um simples fazer; é imperioso que realize a obra de acordo com as especificações e segundo os padrões técnicos. Somente haverá adimplemento de sua parte se atendidos tais requisitos. ** O art. 615 do Códex autoriza o dono da obra a não recebê-la, caso não corresponda àquelas exigências e o art. 616 faculta-lhe aceitar a encomenda com abatimento no preço. INTUITO PERSONAE ou também poderá ser IMPESSOAL Dependendo da natureza do objeto contratado e dos termos do acordo, a empreitada poderá ser intuitu personae ouimpessoal. No âmbito das edificações em geral, trata-se de contrato impessoal, ou seja, a execução material pode ser feita por qualquer pessoa. O empreiteiro pode entregar a terceiros a realização da obra, responsabilizando-se, todavia, nos termos do contrato e da lei. ** Se o objeto da obra consiste na pintura de um painel artístico ou na elaboração de comentários a um novo instituto jurídico, ter-se-á inequivocamente um contrato personalíssimo, impedido o empreiteiro de transferir para outrem a execução do projeto. ** Como regra geral, a morte de qualquer das partes não extingue a empreitada, salvo se os contratantes deram ao vínculo caráter intuitu personae. INFORMAL A Lei Civil não exige forma especial para a celebração do contrato. Quando o objeto contratual é simples, como o reparo em uma rede elétrica, o ajuste se faz apenas na palavra; na hipótese, porém, de edificação, mormente na empreitada mista, torna-se necessária a formalização por escrito. As partes podem optar, portanto, pela forma escrita ou verbal do contrato. * SUBEMPREITADA E COEMPREITADA Subempreitada Contrato pelo qual o empreiteiro transfere para o subempreiteiro a execução, total ou parcial, da obra. *Em princípio é prática permitida, salvo se a empreitada for de natureza personalíssima ou o contrato expressamente vetá-la. Subempreitada ≠ Cessão de posição contratual Na cessão de posição contratual pelo empreiteiro persiste o vínculo entre o proprietário e o empreiteiro, enquanto o cedente se desvincula da relação contratual primitiva. Na subempreitada o empreiteiro continua responsável, perante o proprietário, pela correta execução da obra. *O empreiteiro responde, solidariamente, por dívidas previdenciárias do subempreiteiro. O Código Civil não dispõe sobre a subempreitada, que é contrato reconhecido pela doutrina e jurisprudência. Coempreitada Em edificações de grande porte é comum o comitente celebrar mais de um contrato de empreitada, ficando cada empreiteiro responsável pela execução de uma parte da obra. Tem-se, in casu, a coempreitada, que não se confunde com a subempreitada. Na coempreitada o dono da obra mantém relação jurídica com todos os executantes da obra. **Na coempreitada pode haver um empreiteiro que tenha por função, exclusivamente, a coordenação geral dos trabalhos executados pelos demais. Na subempreitada o dono da obra apenas mantém o vínculo com o empreiteiro. *PREÇO, VERIFICAÇÃO E PAGAMENTO O preço, determinado ou determinável, é um dos elementos essenciais do contrato. A contraprestação em dinheiro é necessária à caracterização da empreitada. ** Entendo que o contrato não se desnatura, caso uma parte do pagamento, a menor, se faça mediante prestação de serviço ou pela entrega de coisa distinta de dinheiro. As partes podem ajustar, livremente, a forma de pagamento, mas se o contrato for omisso a respeito, a retribuição deverá efetivar-se ao final da obra, no ato de sua entrega. **Esta deve ocorrer quando a encomenda estiver inteiramente acabada. OBS: Em se tratando, porém, de obra com unidades autônomas, independentes entre si, ou então, quando o objeto contratual for da classe que se determina por medida, o empreiteiro poderá entregar as partes concluídas e devidamente verificadas, salvo se o contrato dispuser diversamente. *A disposição em apreço é do art. 614 do Código Civil, que autoriza o empreiteiro a exigir o preço na proporção da obra executada e, naturalmente, entregue. Caso o proprietário se recuse a receber a obra, parcial ou total, injustamente, poderá o empreiteiro depositá-la em juízo, liberando-se dos riscos emergentes. Se um hotel contrata a edificação de dez chalés, a construtora poderá efetuar a entrega das unidades separadamente e na medida em que ficarem prontas, salvo convenção em contrário. *** Os pagamentos devem ser feitos em cada oportunidade e proporcionalmente ao preço total da obra. A favor do empreiteiro, o § 1º do art. 614 presume verificada a obra pela qual houve pagamento. Por verificação INSPEÇÃO e CONCORDÂNCIA do proprietário com a obra realizada. ** Portanto, se a obra foi verificada, entende-se que o seu dono encontra-se de acordo com a sua execução. *Se a parte recebe a obra e, sem qualquer ressalva, paga ao empreiteiro, a Lei Civil presume que a entrega foi a contento. Entretanto, não é qualquer pagamento que gera este efeito jurídico, apenas o decorrente da entrega total ou parcial da obra. OBS: ** Caso se tenha convencionado o parcelamento do preço, de acordo com o andamento da obra, os adimplementos não geram a aludida presunção. Assim, é comum a previsão de pagamento de acordo com as etapas de uma construção, como: no término da fundação, na colocação da laje, na conclusão dos revestimentos etc. Os pagamentos feitos em cada uma destas fases não implicam o recebimento parcelado da obra. Não apenas o que se pagou presume-se verificado, também as obras medidas, das quais não resultaram denúncia de vícios ou defeitos, seja diretamente do proprietário ou do responsável pela fiscalização. A falta de pagamento não obriga o empreiteiro a entregar a obra. ** Se este forneceu o material – empreitada mista –, poderá oferecer a exceptio non adimpleti contractus; tratando-se de empreitada simples, caberá o jus retentionis, de acordo com a lição de Arnoldo Medeiros da Fonseca. *REVISÃO DO PREÇO Celebrado o contrato, não é incomum a mudança no projeto original. ** Se as partes anuem neste sentido, podem manter, ampliar ou diminuir o preço anteriormente estipulado. As alterações devem constar de adendo ao contrato e no qual se consignem as modificações no projeto, o preço e o pagamento. Se o empreiteiro constrói mais do que consta no projeto, somente poderá exigir aumento no preço se ocorrer uma das seguintes hipóteses: a) Os acréscimos resultarem de instruções por escrito do proprietário; b) Sempre presente no local da obra, o proprietário não se opõe às inovações e acréscimos. *Se o dono da obra visita reiteradamente as instalações, presume-se o seu conhecimento das mudanças. ** Trata-se, apenas, de presunção relativa, que pode ser afastada pelo proprietário, mediante prova. Caracterizada a obrigação do dono da obra e não havendo acordo sobre a majoração do preço, este deverá ser arbitrado judicialmente. ** Caso ocorra uma queda no preço da matéria-prima ou da mão de obra, no curso da execução do plano e em índice superior a dez por cento, a Lei Civil (art. 620) assegura ao proprietário o direito de revisão no preço. ** A hipótese oposta, aumento nos custos, não gera direito de reajuste em favor do empreiteiro, à vista do disposto no art. 619. · Nada impede, porém, a inserção, no contrato, de cláusula de reajustamento no preço. *RISCOS DA OBRA A responsabilidade pelos riscos varia de acordo com a espécie de empreitada. Se a empreitada é simples, com o fornecimento de material pelo proprietário AO PROPRIETÁRIO CABERÃO OS RISCOS DA OBRA, salvo quando houver culpa do executor (art. 612). ** Caso a coisa pereça antes da entrega, sem mora do comitente ou culpa do empreiteiro: O empreiteiro não fará jus ao preço se não provar que houve defeito dos materiais e que em tempo avisou ao proprietário, seja quanto à sua qualidade ou quantidade (art. 613). Da disposição, infere-se que o empreiteiro não será penalizado caso: a) A perda tenha ocorrido após a entrega; b) O perecimento se efetivou antes da entrega, mas estando o dono da obra em mora de receber. Relativamente à perda total ou parcial dos materiais entregues pelo dono da obra, o empreiteiro se responsabilizará caso a inutilização decorra de sua imperícia ou negligência (art. 617). Empreitada mista os riscos serão do EXECUTOR até o momento da entrega da obra, excetuado o caso de mora do proprietário em receber (art. 611).20 *RESPONSABILIDADE TÉCNICA O empreiteiro, após a entrega, ficará responsável pela solidez e segurança da obra, seja quanto à qualidade dos materiais empregados, eficiência dos trabalhos ou adequação do solo, durante o PRAZO IRREDUTÍVEL DE CINCO ANOS. ** NORMA COGENTE. ** A responsabilidade é objetiva, dispensado o dono da obra de provar a culpa do empreiteiro. ** Esta garantia, definida no art. 618 do Código Civil, pressupõe dois requisitos cumulativos: a) O objeto da obra há de ser edifício ou construção considerável; ** Deve-se entender a que se destina a longa duração, b) Tratar-se de empreitada de mão de obra e de material. A norma em questão é cogente, podendo o prazo apenas ser ampliado pelas partes. A responsabilidade do empreiteiro é corolário lógico da natureza do contrato, que é de resultado. ** De uma obra que não apresenta segurança, infere-se o inadimplemento do empreiteiro. Se este concede, por exemplo, garantia de três anos, deve-se entender que os dois prazos se somam. Do aparecimento do vício, o dono da obra dispõe do prazo de 180 (cento e oitenta) dias para postular em juízo. ** Tratando-se de vício aparente, a contagem do tempo inicia-se a partir da entrega da obra. O prazo em questão é decadencial. Na Empreitada simples ou de mão de obra A responsabilidade por vícios ou defeitos é subjetiva, exigindo do proprietário a prova de culpa do empreiteiro. *A pretensão do proprietário sujeita-se ao prazo prescricional de três anos, nos termos do que dispõe o art. 206, § 3º, V, do Código Civil. Obs: Caso o contrato esteja sujeito ao Código de Defesa do Consumidor, a regra do parágrafo único do art. 618 não se aplicará à relação jurídica e em seu lugar incidirá a disposição do art. 27 daquele Estatuto – Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. *PROJETO DA OBRA O legislador houve por bem incluir, no art. 621 do Código Civil, no capítulo afeto à empreitada, uma norma atópica ou heterotópica, que não diz respeito àquela modalidade contratual, mas ao direito autoral, não obstante a permanência em vigor da Lei de Direitos Autorais (Lei nº 9.610/98). A norma referida veda ao proprietário a inserção de mudanças no projeto que aprovou, ainda que a execução da obra seja confiada a terceiro (empreiteiro, administrador ou subempreiteiro). O art. 621 admite duas exceções: a) quando as modificações forem “de pouca monta”, ou seja, pequenas em proporção ao tamanho do objeto e desdemora, o comprador ficará sujeito, até a entrega da coisa, ao pagamento do aluguel pelo valor fixado pelo vendedor. PRAZO da venda a contento e a venda sujeita a prova O legislador brasileiro optou por deixar esse prazo ao livre critério das partes, tanto em relação àquele pacto quanto ao de venda sujeita a prova. ** Também não estipulou o limite máximo, como o fizera na retrovenda, entendendo que tais pactos adjetos não possuem o potencialde atingir a ordem pública. Assim, os contratantes podem estabelecer o prazo de sua conveniência ou mesmo não fixá-lo. ** Caso não haja prazo estabelecido, o vendedor terá direito de intimá-lo, judicial ou extrajudicialmente, para que o faça em prazo improrrogável. · Não havendo manifestação, ter-se-á por não realizada a condição,efetivando-se a compra e venda em caráter definitivo. *Ambos os pactos devem ser estipulados expressamente. Quanto à venda a contento, Clóvis Bevilaqua foi taxativo, afirmando que o pacto não se subentende. A doutrina, por outro lado, admite a presunção de concordância do comprador, o que é fato distinto. Se este, em lugar de comunicar, efetua o pagamento dias após receber o objeto do contrato ou deixa escoar in albis o prazo, indubitavelmente aprovou a coisa, tornando a compra e venda perfeita. *Igualmente se vende a coisa para terceiro. Uma outra presunção que se faz, não no sentido de se admitir a existência do pacto, refere-se à natureza da condição. Se o instrumento contratual não é claro a respeito, havendo dúvida se a condição é suspensiva ou resolutiva, de acordo com o entendimento de Carvalho Santos, presume-se que seja suspensiva. 79.5.O consumidor e o prazo de reflexão As disposições do Código Civil, analisadas neste capítulo, aplicam-se às relações simplesmente civis e às de consumo, ressalvadas as hipóteses previstas no Código de Defesa do Consumidor. Para as previstas no CDC, e especificamente para as compras efetuadas fora do estabelecimento comercial, o art. 49 do diploma protetor oferece ao consumidor o prazo de reflexão, que é decadencial e de sete dias, contado a partir da entrega do produto. Durante esse período, o comprador poderá conferir ou testar o produto e exercer o direito de arrependimento, desfazendo-se o contrato. **A compra sujeita ao prazo de reflexão realiza-se sob a modalidade de condição suspensiva puramente potestativa. Ou seja, o comprador não é obrigado a motivar a sua desistência. Para evitar práticas abusivas, o legislador fixou um pequeno prazo para o exercício do direito de arrependimento. **São chamados de “negócios a domicílio” ou “à porta de casa”. O prazo de reflexão se justifica em razão de a venda operar-se fora do estabelecimento comercial e à vista de catálogos, prospectos ou publicidades diversas, sem que o consumidor tenha a oportunidade de conhecer, concretamente, o objeto da venda. Observe-se que, diferentemente do pactum ad gustum e da venda sujeita a prova, que derivam de uma convenção das partes, o prazo de reflexão origina-se de normas legais cogentes. DA PREEMPÇÃO OU PREFERÊNCIA *art. 513 a 520 No contrato de compra e venda de bem móvel ou imóvel, corpóreo ou não, podem as partes estipular o direito de preempção ou preferência do vendedor (beneficiário ou preferente), para a reaquisição da propriedade, em igualdade de condições com terceiro e em determinado prazo, caso o comprador (promitente) resolva vender ou dar em pagamento o objeto adquirido. Trata-se de pacto acessório, adjeto à compra e venda e possível em outros contratos, embora haja opiniões em contrário. O vocábulo preempção provém do latim: prae (antes) e emptio (compra), o que significa prioridade na compra. O contrato que se opera com o pacto não configura negócio jurídico condicional, pois a compra e venda não se deixa abalar por acontecimento futuro e incerto. *Caso o vendedor venha a readquirir a coisa por força do direito de preferência, haverá um segundo contrato de compra e venda, invertidos os polos da relação jurídica. A cláusula configura promessa unilateral de venda sob condição suspensiva do comprador, que se obriga a revender a coisa para quem lhe vendeu, caso se realize o fato futuro e incerto, ou seja, na hipótese de pretender a revenda. Note-se: a compra e venda é pura, sem qualquer condição; o pacto de preferência, sim, contém uma condição suspensiva puramente potestativa. A plena efetividade do pacto se dá pela recompra e não pordesfazimento do negócio anterior. **O direito de preferência não se subentende, devendo ser necessariamente expresso. Instituído em favor do vendedor, não gera para o comprador algum direito, mas a obrigação de oferecer a coisa a quem lhe vendeu, caso pretenda revendê-la. *O direito de prelação pode ser exercitado ou não, comportando a faculdade de renúncia, que se efetiva de modo expresso ou tácito. O direito do vendedor, pois, não configura uma promessa de compra. As partes podem fixar um prazo para a sua duração, findo o qual o comprador adquire a plena liberdade contratual, podendo vender a coisa para terceiros sem a obrigação de oferecê-la ao vendedor. A prelação (pactum praelationis), ora em estudo, é de natureza voluntária, não se confundindo com a compulsória, prevista em lei para algumas relações jurídicas, como a ex locato, a de condomínio sobre coisa indivisível, a resultante de desapropriação. O pacto gera para o promitente a obrigação de notificar o beneficiário em duas situações: quando se interessar na venda ou em sua pretensão de dar a coisa em pagamento. * Para que o beneficiário faça valer o seu direito, dando-lhe efetividade, é necessário que, pelo menos, iguale a proposta existente quanto ao preço e modalidade de pagamento e garantia. *O beneficiário poderá exercer, ainda, o seu direito de prelação, dando ciência ao promitente de seu interesse na reaquisição da coisa. Esta iniciativa justifica-se quando o beneficiário toma conhecimento, por qualquer meio idôneo, de que a revenda se encontra em fase de negociação. O exercício do direito de prelação, salvo acordo entre os interessados, não pode ser exercitado em parte, mas sobre a totalidade da coisa que está sendo posta à venda, salvo convenção em contrário. ** Se “A” vendeu, com cláusula de preferência, para “B”, dois lotes de terreno, colocados à venda em conjunto, “A” não terá direito de exercer o seu direito em relação a um deles apenas. Em contrapartida, cabível é o exercício do direito quando o objeto da preempção for oferecido a terceiro em conjunto com outros bens e por preço global. Neste caso o beneficiário se sujeita a pagar o valor proporcional da coisa a ser adquirida. Direito de prelação ≠ Retrovenda O direito de prelação não se confunde com o de retrovenda, embora os dois institutos se assemelhem. Retrovenda Cabe ao vendedor o direito de recompra sponte sua, pretendendo o comprador despojar-se ou não da coisa.*A coisa é sempre imóvel e o preço é o mesmo da venda, acrescido das despesas do comprador Preferência Só há reaquisição caso o comprador se disponha a alienar a res. Em outros pontos. * A coisa pode ser móvel ou imóvel e o preço é o que está previsto para o negócio com o terceiro. Direito de prelação ≠ Promessa de venda Promessa de venda A parte se compromete a vender Preferência Inexiste esta obrigação, mas apenas a de dar preferência à contraparte em igualdade de condições com terceiro. **O direito de preferência é personalíssimo, não podendo, em consequência, ser transmitido por ato inter vivos oumortis causa. Com o óbito do beneficiário, extingue-se o direito, ficando o promitente liberado para a venda a qualquer pessoa, independentemente de comunicação aos herdeiros do de cujus. Obs: Situação distinta é a que resulta de um direito de prelação já exercido. O direito decorrente pode ser transmitido inter vivos ou mortis causa. Não havendo terceiro, nem oferta aberta de venda, vindo o beneficiário a readquirir a coisa, ter-se-á exercício do direito de prelação? A resposta dependerá de cada caso. Se o beneficiário foi quem procurouque preservada a unidade estética da obra projetada; b) a superveniência de razões técnicas, que tornem inconveniente a execução do projeto original ou de motivos que levem à excessiva onerosidade da obra. Desde que executado o projeto, o seu autor responde perante o proprietário quanto à qualidade de seu trabalho (art. 622). Há duas situações a serem distinguidas: a) se a execução da obra ficou a cargo do próprio autor do projeto, este assume a cabal responsabilidade quanto a solidez, segurança, vícios e defeitos que a obra apresentar; b) caso a execução seja entregue a terceiros (empreiteiro, administrador ou subempreiteiro), o autor do projeto responderá apenas quanto a solidez e segurança da obra, nos termos do que dispõe o art. 618 da Lei Civil. *RESCISÃO UNILATERAL DO CONTRATO ** Por iniciativa do proprietário Pode o dono da obra, sem justa causa, rescindir unilateralmente o contrato, mas neste caso ficará sujeito: a) ao pagamento pela parte executada, nele incluindo-se as despesas e o ganho; b) indenização razoável, correspondente ao quantum a que o empreiteiro teria direito pelo seu trabalho, caso a obra fosse inteiramente realizada. *Ao fixar o quantum da indenização o juiz deverá decidir com equidade, pois a LeiCivil refere-se a “indenização razoável”. Embora o dispositivo legal refira-se a indenização, a hipótese é de penalidade, pois os lucros que seriam obtidos até o término da obra podem ser alcançados em outro serviço e do empreiteiro não se exige prova de perdas e danos. ** Se a rescisão operou-se por culpa do empreiteiro ou devido a força maior, ao proprietário cumpre apenas o pagamento pelos serviços executados. **Por iniciativa do empreiteiro Se a rescisão unilateral for provocada pelo empreiteiro, a este caberá a obrigação de indenizar o dono por perdas e danos, consoante dispõe o art. 624. Além desta hipótese, o Código Civil prevê causas de desistência justificada do empreiteiro (art. 625). ** Assim, haverá o direito de rescisão existindo motivo de força maior ou culpa do proprietário. · Esta se caracteriza, por exemplo, quando a parte deixa de fornecer as condições necessárias à execução do trabalho ou se descura dos princípios de probidade e boa-fé. Em se tratando de construção, às vezes as partes são surpreendidas, no curso dos trabalhos, com dificuldades imprevisíveis à época da formação do contrato, advindas de causas geológicas, hídricas ou semelhantes, que tornam excessivamente onerosa a realização da obra. ** Neste caso, não concordando o proprietário com a revisão do preço, ao empreiteiro assistirá o direito à rescisão unilateral do contrato. A execução dos trabalhos deve corresponder aos termos do contrato e este, ao projeto aprovado pelo proprietário.** Qualquer modificação de maior vulto, pretendida pelo dono da obra, deverá ter a anuência do empreiteiro. Este não é obrigado a aceitá-la, ainda que o proprietário se disponha a rever o preço da obra. Surgindo o impasse, o empreiteiro poderá denunciar o contrato.o promitente e o convenceu do negócio a resposta será negativa. Caso o promitente tenha deliberado a revenda e a ofereceu, em primeiro lugar, ao antigo Proprietário o negócio jurídico será um reflexo do pacto adjeto e a resposta será positiva. ** Embora não haja regra específica, subentende-se, da configuração geral do pacto, que o direito de prelação não prevalece havendo permuta ou doação, pois não há condições que possam ser igualadas pelo vendedor. ** Em relação às vendas efetuadas em hasta pública, decorrentes de execução forçada, o direito de prelação não poderá ser exercitado. O Código Civil não se posiciona a respeito, mas a orientação parte do Direito Comparado. PRAZOS O parágrafo único do art. 513: “O prazo para exercer o direito de preferência não poderá exceder a cento e oitenta dias, se a coisa for móvel, ou a dois anos, se imóvel.” Art.516 * inexistindo prazo estipulado, o beneficiário perderá o direito de prelação se não o exercer em três dias, se a coisa for móvel e, em sessenta dias, se imóvel, contados da notificação efetuada pelo comprador. A notificação do comprador somente produzirá efeitos jurídicos se completa e suficientemente esclarecedora. A comunicação deverá informar o preço, a modalidade de pagamento, entre outros dados relevantes. Os prazos do parágrafo único do art. 513 constituem apenas o limite máximo para as convenções, enquanto os do art. 516 são aplicáveis na falta de estipulação pelas partes. *O prazo, que é decadencial, deve ser contado a partir da notificação. **Estipulação em favor de uma ou mais pessoas Se mais de uma pessoa tiver o direito de prelação sobre um objeto, poderão exercitá-lo na proporção de suas antigas cotas. Se nem todas se interessarem, as demais estarão sujeitas à compra integral da coisa, caso desejem reaver a propriedade. O art. 517 assegura ao comprador primitivo o direito de rejeitar o exercício da prelação que não alcance a totalidade da res. Nem faria sentido se diversa fosse a determinação, pois a lei, em geral, favorece a extinção dos condomínios de coisas indivisíveis e não a sua formação. **Violação ao direito de preferência – consequências O descumprimento da obrigação de dar preferência não provoca, na ordem jurídica, sempre a mesma reação. Na hipótese genérica do Código Civil cabe apenas o direito de ressarcimento por perdas e danos. À obrigação do promitente, acresce a do adquirente de má-fé, que responde solidariamente perante o beneficiário. Age de má-fé o terceiro que, ciente do direito de preferência, aceita passivamente a omissão do promitente. A violação ao direito do beneficiário se efetiva com a venda da coisa para terceiro. Enquanto o promitente apenas oferece, discute condições com terceiro, não se caracteriza o descumprimento da obrigação. *** A violação se patenteia, ainda, quando o promitente vende a coisa por preço inferior ao oferecido ao beneficiário, caso em que este poderá ajuizar ação de perdas e danos. ***Observe-se que os efeitos legais da violação do direito de preferência não são de molde a intimidar o promitente, nem ao terceiro de má-fé, que não será despojado da coisa adquirida. A venda, irregularmente celebrada, impõe apenas a obrigação de ressarcimento, que muitas vezes é inócua, pois nem sempre o beneficiário logra êxito na comprovação de perdas e danos. Não há necessidade de o pacto constar do registro público, pois o direito que dele se origina é de natureza pessoal. **Não apresenta eficácia erga omnes Há quem entenda que o registro público confere caráter erga omnes ao beneficiário, o que é um equívoco à luz do Código Civil, pois, ainda que registrado o pacto, não haverá o direito de reaver a coisa de terceiro. A preferência nas desapropriações* art. 519 Espécie de preempção ou preferência, que não configura um pacto adjeto ao contrato de compra e venda, mas que nasce da própria lei. Cuida o dispositivo legal da eventualidade de o poder público não atribuir, à coisa expropriada para atender à necessidade ou utilidade pública, o destino previsto para ela ou não utilizá-la para obras ou serviços públicos. **Realizado o suposto, o antigo proprietário terá o direito de preferência na aquisição da coisa, não pelo valor da desapropriação, mas pelo seu preço atual. Obs: O simples retardamento na utilização da coisa, para os fins acima referidos, não caracteriza a violação ao direito de preferência. Ao titular do direito de preferência cabe o pedido judicial para reaver a coisa, uma vez extinta a causa que lhe deu origem e a sua não utilização em obras ou serviços públicos, ainda que se mantendo em silêncio. O legislador de 2002 impôs à retrocessão duas condições cumulativas: a) expropriada a coisa para fins de necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, não se der a ela tal destinação; b) a não utilização da coisa em obras ou serviços públicos. ** O direito de preferência em outros estatutos O direito de preferência na compra acha-se previsto, também, em outros estatutos. A Lei nº 8.245/91, que dispõe sobre as locações de imóveis urbanos, dedica uma seção sobre a matéria, arts. 27 a 34. * O locador, ao pretender dispor do imóvel, mediante venda ou cessão, promessa de venda ou de cessão de direitos, dação em pagamento, deverá notificar o locatário, por instrumento público ou particular, fornecendo-lhe a proposta com as informações necessárias. **O locatário dispõe do prazo decadencial de trinta dias para anuir. Obs: O exercício do direito de preferência em relação a terceiro, porém, pressupõe a averbação do contrato de locação junto à matrícula do imóvel, com antecedência de pelo menos trinta dias da alienação. Sem esta formalidade, o locatário ficará impedido de pleitear a adjudicação, mediante depósito prévio do preço, mas poderá requerer a indenização por perdas e danos, no prazo de seis meses da transcrição do ato no registro imobiliário. VENDA COM RESERVA DE DOMÍNIO * art. 521 a 528 O pactum reservati dominii constitui modalidade especial de compra e venda, celebrado por escrito e em operações a crédito, pelo qual o vendedor transfere a posse direta de coisa móvel, conservando o domínio até que se complete o pagamento do preço. O que há de peculiar na convenção é que o domínio não se transmite com o contrato e entrega da coisa, mas automaticamente com o pleno pagamento (donec pretium solvatur). Note-se que não há tradição, mas simples entrega da coisa. ** Tradição é entrega com o ânimo de transferir o domínio. O pagamento geralmente é parcelado, mas pode ser em apenas um ato e a prazo. Nascido na prática mercantil, especialmente para tornar possível a venda pelo crediário, pois de um lado assegura o vendedor e, de outro, geralmente dispensa o comprador de fornecer garantias adicionais, o pacto com reserva de domínio é, hoje, um instituto difundido no mundo dos negócios Nem sempre, todavia, a doutrina e as legislações admitiram o pactum reservati dominii, porque não se dissociava da compra e venda a ideia da imediata entrega da coisa. O pacto de reserva de domínio favorece o vendedor, que pode reaver a coisa na hipótese de inadimplência, operando-se a resolução contratual, ou cobrar as parcelas em atraso e as vincendas. A garantia que a venda com reserva de domínio proporciona, por outro lado, incentiva as vendas a crédito, muitas vezes com a mediação de instituições financeiras, aumentando destarte o custo dos produtos, mas permitindo às pessoas o acesso aos bens duráveis e ao mundo da técnica. **O domínio permanece em poder do vendedor, enquanto não se efetive o pagamento integral. Ao comprador, além da posse e uso, assiste o direito de ajuizar ações possessórias, inclusive contra o proprietário, além da prática de atos de conservação da coisa, que configura também uma obrigação. *** O comprador pode ceder a sua posição contratual, havendo anuência do vendedor. ** As partes podem convencionar que as parcelas da dívida sejam representadas por títulos executivos pro solvendo, ou seja, a liberação do devedor ocorrerá apenas com opagamento. Tais títulos são constituídos por duplicatas ou notas promissórias. Na execução dos títulos o objeto do pactum poderá ser oferecido à penhora? A resposta imediata é negativa e sob o fundamento de que a coisa não pertence ao executado. Não se estende o pacto às vendas imobiliárias. Pode-se afirmar, decisivamente, que a vedação aos imóveis é texto expresso, pois o art. 521 do Código Civil refere-se apenas à venda de coisa móvel. Entre os móveis, a doutrina admite apenas as coisas corpóreas. *** Nem toda coisa móvel, por outro lado, pode ser objeto do pactum reservati dominii, uma vez que deve ser individuada e infungível, pois, do contrário, inviável para o vendedor o exercício do direito de sequela. Entre os móveis que mais favorecem a adoção do pacto estão os aparelhos, automóveis, eletrodomésticos, que são, inclusive, numerados. As coisas, em geral, devem ser identificáveis por características próprias, como as do modelo, tamanho, cor. A finalidade da exigência é tornar possível o reconhecimento do objeto, estremando-o de congêneres, conforme a dicção do art. 523. **Havendo dúvida na identificação, a decisão deverá favorecer ao terceiro de boa-fé. O pacto, ora em estudo, se ajusta mais à índole dos sistemas jurídicos, como o brasileiro, que atribuem ao contrato de compra e venda efeitos meramente obrigacionais. Nos sistemas, como o francês, onde esse contrato possui o condão de transmitir o domínio, o pacto reservati dominii se contrapõe aos princípios embasadores da compra e venda. Natureza jurídica O instituto em apreço não induz os estudiosos a uma compreensão homogênea de sua natureza jurídica. Entre as diversas teorias, destaca-se a que identifica a modalidade de compra e venda com a condição suspensiva. **A transferência de domínio se efetiva apenas quando o pagamento se torna integral. Este, portanto, seria o acontecimento futuro e incerto de que a venda depende para transmitir o domínio. Obs: Entende Orlando Gomes o pagamento integral não pode ser considerado como um acontecimento incerto, pois se acha previsto como obrigação do comprador. Alguns autores rebatem a crítica sob o argumento de que o pagamento não é elemento integrante do contrato, mas o ajuste do preço. O pactum reservati dominii guarda semelhança com outros institutos jurídicos, como o da promessa de compra e venda, locação e o comodato. Promessa de compra e venda assemelha-se porque em ambos a transmissão do domínio se opera após o integral pagamento, mas distinguem-se, entre outros pontos, quanto ao modo como essa transmissão ocorre. No pacto, o comprador adquire o domínio quando efetua o pagamento da última parcela, sem formalidade adicional, enquanto na promessa depende ainda da celebração do contrato definitivo. Na promessa de compra e venda, constituído o devedor em mora, o promitente vendedor não tem o poder de exigir o pagamento das prestações vincendas, como ocorre no pacto adjeto. Locação O que há de comum é a posse direta por um dos contratantes e a sua obrigação de conservar a coisa. Distinguem-se em diversos aspectos: na reservati dominii os riscos são do comprador, enquanto na locação a responsabilidade é do proprietário; com o pagamento da última parcela o comprador adquire o domínio, mas a adimplência do locatário no curso de todo o contrato não provoca tal efeito. Comodato Em nenhuma hipótese o comodatário adquire o domínio, que é a consequência prevista para o pagamento integral na reserva de domínio. ** Formalização do pacto A venda com reserva de domínio é pacto que não se presume. Deve, necessariamente, ser escrito, podendo figurar como cláusula do contrato ou em documento à parte. Obs:Observe-se que a exigência de instrumento, particular ou público, refere-se apenas ao pacto adjeto e não ao contrato de compra e venda, que pode ser apenas verbal. Cuidado especial deve ser observado na individuação do objeto, a fim de que possa ser identificado, a posteriori, se necessário. Para que alcance validade erga omnes, tornando-se oponível a terceiro, deverá ser inscrito em cartório de títulos e documentos, situado no domicílio do comprador. ** A inscrição, depreende-se, não é necessária à validade do ato negocial entre as partes, mas é imprescindível para produzir efeito em relação a terceiro. ** Uma vez honrados os compromissos financeiros assumidos pelo comprador, este poderá requerer o cancelamento do registro, que terá efeito apenas declarativo. Os riscos da coisa Os riscos de deterioração ou perda da coisa por Act of God, como regra geral das obrigações, são sempre do proprietário (res perit domino), que sofre os prejuízos resultantes. ***Na venda com o pacto de reserva de domínio tem-se uma exceção, pois é o comprador quem se responsabiliza pelos danos causados ao objeto (res perit emptoris). O comprador, na forma do disposto no art. 524, responde pelos riscos a partir do momento em que o objeto lhe é entregue. Com a celebração do pacto e a posse direta, o comprador assume a obrigação de conservar a coisa, evitando a sua perda parcial ou total, impedindo a sua desvalorização. Inadimplência do comprador e seus efeitos Para que o vendedor possa requerer qualquer medida em juízo, decorrente do não pagamento de parcelas, deverá constituir o comprador em mora, mediante protesto do título ou interpelação judicial. ( Exceção à regra geral de que o inadimplemento constitui o devedor em mora de pleno direito) Abre-se uma alternativa para o comprador: a) cobrar as prestações vencidas e as vincendas; b) a resolução do contrato e a consequente recuperação da posse da coisa. Fica ao inteiro critério do vendedor a escolha do pedido a ser formulado, consoante o permissivo do art. 526, não podendo, todavia, cumular os dois pedidos, nem substituir um pelo outro. Obs: Para a cobrança isolada das prestações vencidas, desnecessária a constituição em mora, aplicando-se in casu os princípios gerais das obrigações. A doutrina registra entendimento de que o direito de receber as parcelas em atraso não abrange, em termos absolutos, o de exigir o pagamento das vincendas. Não seria justo ou razoável que o atraso das primeiras parcelas implicasse o vencimento de muitas outras. Se o vendedor optou pela resolução contratual, poderá exercer o direito de sequela, reavendo a coisa em mãos de terceiro, uma vez que a inscrição do pactum produz eficácia real. Com o desenlace da compra e venda, resta o acerto da contabilidade entre as partes. O vendedor, caso efetue despesas na recuperação da coisa por motivo de deterioração, não as decorrentes do seu desgaste natural, poderá descontá-las do valor a ser devolvido. Se o crédito do comprador for inferior às despesas, a diferença poderá ser recebida pela via judicial. ** A devolução das parcelas pagas, efetuado o devido desconto, impõe-se independentemente de requerimento do comprador, por princípio de justiça e para a não caracterização de enriquecimento sem causa ** Financiamento por instituição do mercado de capitais Muitas empresas comerciais mantêm o seu crediário com o apoio direto de instituições, que emprestam o valor do contrato ao comprador, pagando diretamente ao vendedor. Quando isto ocorre, a relação jurídica passa a ser entre o comprador e a instituição, assumindo esta, por força do disposto no art. 528 da Lei Civil, os direitos e ações decorrentes do contrato de compra e venda com reserva de domínio. **Ocorre, de acordo com Marco Aurélio Bezerra de Melo, uma cessão da posição contratual do vendedor para a instituição. Efetuada a cessão, seguir-se-á a notificação, judicial ou extrajudicial, pelo cedente ou cessionário, para que o devedor, inteirado da modificação, efetue os pagamentos seguintes ao novo credor. Com a norma do art. 528, ampliaram-se as semelhanças entre os institutos da venda com reserva de domínio e da alienação fiduciária em garantia. Enquanto o primeiro mantém equilíbrio entre os direitos e as obrigações das partes, o segundo favorece à instituição, pois situa o comprador como simples depositário da coisa.**Venda mediante poupança Na chamada venda mediante poupança, modalidade do pactum reservati dominii, não se opera a entrega da coisa no momento da celebração do contrato. O preço deve ser pago mediante parcelas, que vão amortizando o débito. · Apenas com o pagamento inteiramente efetuado é que se opera a tradição. É prática comercial que favorece o vendedor, pois recebe o pagamento antes da tradição. O nomen iuris atribuído à modalidade de venda gera a ilusão de poupança no comprador, que, na realidade, financia a produção do industrial ou aquisição pelo comerciante, dispensando o vendedor de operar com o seu próprio capital. O vendedor não assume qualquer risco com a operação. Por outro lado, gera insegurança para o comprador, diante da possibilidade de quebra do vendedor antes da entrega da coisa vendida. DA VENDA SOBRE DOCUMENTOS *art. 529 a 532 Na espécie em estudo, o domínio não se transmite pela tradição, mas pela entrega do título representativo da coisa móvel e de outros documentos pertinentes ao negócio, como o da apólice de seguro eventualmente feito. Para atender à exigência de agilidade inerente aos negócios, a revenda pode efetivar-se com o endosso da documentação que certifica a aquisição da coisa móvel. *** A particularidade deste pacto adjeto consiste na substituição da entrega da coisa, que é um dos efeitos do contrato de compra e venda, pelo título representativo. Embora o seu maior alcance prático esteja no comércio exterior, o pactum se aplica, também, nas vendas internas em que se recorre ao transporte da coisa por terceiro. O vendedor pode entregar a mercadoria ao transportador ou depositá-la em armazéns, emitindo o título warrant, pelo qual o comprador pode retirá-la. Este, com a documentação em mãos, pode levantá-la, também, junto à alfândega, quando transportada de um país para outro. A documentação configura elemento essencial à relação jurídica em pauta. Etimologicamente, documento provém do latim doceo (mostrar,indicar) e corresponde, em sentido amplo, ao objeto que informa algo que se encontra fora de si. Em sentido estrito, é peça escrita e indicadora de algum fato importante. Em relação ao pacto adjeto em análise, Alberto Trabucchi destaca dois tipos de documentos: a) os representativos de mercadorias, que são verdadeiros títulos causais de crédito, emitidos com a formação do contrato de transporte; b) os que apenas indicam a qualidade material do objeto da venda ou a situação em que se encontram do ponto de vista legal, em relação, por exemplo, às aduanas ou ao seguro. O vendedor se libera da entrega, mediante o título representativo da coisa, conforme prevê o caput do art. 529. Obs: A compra e venda tem por objeto mercadoria e não documentos, pois estes “são apenas o instrumento para a transferência da posse mediata da mercadoria (e para facilitar, portanto, a venda ulterior da mercadoria ainda em trânsito), mas não constituem o objeto da venda.” ***Esta opinião, todavia, não é absoluta na esfera doutrinária. A própria denominação do pacto adjeto – venda sobre documentos – é reveladora de que os documentos não configuram o objeto da compra e venda, mas um instrumento de execução do contrato. ** Obrigações do vendedor Quem aliena deve encaminhar ao comprador os documentos relacionados à venda e se responsabilizar pelos riscos da coisa, durante o transporte. Quanto aos documentos, hão de ser entregues no dia e lugar previstos no contrato. Por força do disposto no art. 734 da Lei Civil, o transportador não responde pela deterioração ou perda provocada por força maior. **Para se garantir contra os prejuízos em tal circunstância e se eximir da responsabilidade subsidiária a do transportador, o alienante costuma firmar contrato de seguro. Se, com os documentos da venda, o da apólice de seguro também for entregue ao comprador, por conta deste correrão os riscos da coisa, salvo se “ao ser concluído o contrato, tivesse o vendedor ciência da perda ou avaria da coisa”, Além destas obrigações específicas, quem vende possui as inerentes aos vendedores em geral, destacando-se a da entrega da coisa de acordo com as especificações do contrato, inclusive quanto ao tempo e lugar. Entre os documentos a serem entregues, devem constar os relativos às obrigações tributárias, ao certificado de garantia do produto, bem como ao manual de uso ou funcionamento. Os documentos são os especificados no instrumento contratual ou ditados pelos usos. ** Obrigações do comprador A quem adquire, cumpre efetuar o pagamento no dia e lugar do recebimento da documentação devidamente legalizada, a qual representa a coisa adquirida. É a disposição do art. 530, de natureza dispositiva, pelo que as partes poderão estabelecer critério diverso para a oportunidade do pagamento. Somente em uma hipótese o comprador poderá negar-se a pagar, alegando defeito de qualidade ou do estado da coisa adquirida: quando o defeito tiver sido previamente comprovado. O comprador responsabiliza-se pelos riscos da coisa, decorrentes da vis major, caso o vendedor tenha firmado contrato de seguro. Havendo sinistro, o beneficiário junto à companhia de seguro é o comprador. Intermediação de estabelecimento bancário As partes podem estipular a participação de estabelecimento bancário na execução do contrato. Para esse agente, na condição de simples intermediário, o contrato será res inter alios, não assumindo responsabilidade própria dos contratantes, salvo cláusula especial neste sentido e com a sua anuência. *** A função será apenas de efetuar o pagamento, mediante a entrega da documentação da coisa vendida. Não lhe compete verificar a coisa e o seu estado, mas tem o dever de examinar, com acuidade, a documentação que lhe é apresentada e efetuar o pagamento apenas se esta estiver em ordem. Na hipótese de o estabelecimento bancário negar-se a pagar, o vendedor poderá exigir o adimplemento diretamente do comprador, conforme prescreve o parágrafo único do art. 532. *Na prática, o banco pode efetuar o pagamento com valores depositados pelo comprador ou com recursos próprios, caso em que poderá reter os documentos até que seja ressarcido. Ao aceitar a representação, a instituição bancária assume o dever de cumprir, com exação, o encargo que lhe foi atribuído por ambas as partes. **Caso efetue o pagamento, não estando em ordem a documentação, deverá responder perante o comprador, embora este tenha ação contra quem lhe vendeu. De dois modos, portanto, a instituição bancária pode vincular-se ao negócio jurídico: a) obrigando-se a pagar ao vendedor, mediante a entrega da documentação regular, independente da provisão de fundos na conta do comprador. Neste caso o banco atua como verdadeiro fiador; b) obrigando-se a efetuar o pagamento, diante da entrega dos documentos devidos, desde que a conta do comprador registre saldo suficiente. TROCA OU PERMUTA *Art. 533 **CONCEITO Pelo contrato de troca ou permuta as partes se obrigam a transferir, uma para a outra, o domínio de coisa móvel ou imóvel, com ou sem complemento em dinheiro. **Historicamente, o pactum permutandi antecedeu ao de compra e venda, mas não teria sido, juridicamente, a primeira prática traslativa de domínio, uma vez que fontes históricas revelam a precedência do contrato de doação. Do ponto de vista econômico os contratos de Permuta e Compra e Venda constituem recíproca transferência de riqueza, mas enquanto o processo de troca, via de regra, não incentiva a produção, a compra e venda induz a multiplicação de coisas, excetuando-se, naturalmente, a que possui por objeto os terrenos ou espaços de terra. Sob o prisma jurídico, o diferencial se localiza nos objetos. Na compra e venda Um dos quinhões é formado por coisa e o outro, por dinheiro (rem pro pretio). ** O pretium figura como um dos elementos essenciais Na troca O que se dá e o que se recebe é sempre a coisa (rem pro re). Obs: Não desnatura a troca, porém, se na composição do negócio uma das partes entra com parcela em dinheiro, IGUAL OU INFERIOR AO VALOR DA COISA queirá complementar. Denomina-se saldo, torna, volta ou reposição a parcela em dinheiro que, eventualmente, integra um dos quinhões permutados. Enquanto a compra e venda implica sempre a participação de duas partes – vendedor e comprador –, a troca pode ser trilateral ou reunir número maior de partes. ** “A”, “B” e “C”, por exemplo, resolvem celebrar, entre si, um contrato, com os seguintes dados principais: “A” transfere para “B” um automóvel e recebe um terreno de “C”; “B” cede para “C” um pequeno apartamento. ** A convenção é válida, uma vez que a Lei Civil não limita o número de partes no contrato de troca. Troca X Substituição Na linguagem vulgar emprega-se o vocábulo troca também no sentido de substituição. Aquela requer que as coisas pertençam a donos diferentes, o que não ocorre com esta. No exemplo de Cunha Gonçalves, se alguém, insatisfeito com o produto adquirido, o devolve ao comerciante e dele recebe um outro, a hipótese será de substituição do objeto de um contrato de compra e venda e não de contrato de troca ou permuta. O contrato de troca comporta coisas de mais de uma natureza jurídica. Assim, podem ser trocadas: coisa corpórea por incorpórea, móvel por imóvel, móvel por móvel, imóvel por imóvel, direitos por direitos. **Basta que a coisa não esteja fora do comércio, para figurar como objeto da modalidade contratual. **Na hipótese de alienação de coisa por serviço ou na de coisa por obrigação de fazer NÃO HAVERÁ UMA TROCA OU PERMUTA, mas contrato inominado. Consoante Pontes de Miranda, além da propriedade, também a posse pode figurar como objeto de troca. As pessoas jurídicas de Direito Público também podem praticar os contratos de troca, quando então se submetem às regras comuns. O Código Civil dedica ao contrato de troca apenas o art. 533, determinando, pelo caput, a aplicação do regulamento da compra e venda, com as modificações constantes nos incisos I e II (permutatio vicina emptioni). *CARACTERES E NATUREZA JURÍDICA CONSENSUAL **No sistema jurídico brasileiro o pactum permutandi é consensual, pois a transmissão da propriedade não é um de seus elementos constitutivos, apenas um de seus efeitos. ***** O contrato se aperfeiçoa com a declaração de vontade e por esta as partes assumem a obrigação de transferir, mutuamente, o domínio dos objetos. EVENTUALMENTE FORMAL Eventualmente o contrato deve ser formal ou solene e isto quando se tratar de permuta de imóveis com valor, cada qual, superior a trinta vezes ao maior salário mínimo vigente no País, conforme exigência do art. 108 do Código Civil. BILATERAL O contrato é bilateral, pois ambas as partes assumem direitos e contraem obrigações. ONEROSO É oneroso, pois os contratantes possuem ônus, reciprocamente. Cada qual procura obter vantagem correspondente à sua prestação. TRANSLATIVO DE DOMÍNIO É contrato translativo de domínio, pois as partes se obrigam a transferir o domínio, uma para a outra. COMUTATIVO Trata-se, ainda, de contrato comutativo, uma vez que não se acha envolvido em álea. As prestações são previamente definidas e não dependem da sorte, como nos contratos aleatórios. A indagação mais relevante, do ponto de vista doutrinário, diz respeito à qualificação do contrato, quando uma das partes integraliza o seu quinhão com uma parcela substancial em dinheiro, sendo certo que, na grande maioria dos casos, os valores não são coincidentes. **A opinio doctorum manifesta-se uníssona quanto à possibilidade de a troca envolver um percentual pecuniário, mas as orientações não são uniformes quando a parcela é superior ao valor da coisa. O Código Civil brasileiro não se posiciona a respeito, nem se refere ao complemento em dinheiro. Parte da doutrina segue a chamada teoria do valor ou princípio da absorção, segundo a qual o critério distintivo situa-se na predominância dos componentes do objeto: Se a parcela em dinheiro for igual ou maior do que o valor da coisa O contrato será de compra e venda; Se inferior a parcela em dinheiro é inferior ao valor da coisa Será de troca. ** REGRAS BÁSICAS DO CÓDIGO CIVIL *Aplicação das normas referentes à compra e venda O Diploma Civil não definiu o contrato de permuta, deixando a matéria confiada à doutrina. Por força do art. 533 do Código Civil de 2002, ao contrato de troca ou permuta aplicam-se as regras relativas à compra e venda. **Subentende-se que essa disciplina se comunica à troca no que for adaptável. Esta modalidade contratual, por exemplo, não comporta os pactos adjetos em geral. Assim, não há como se aplicarem as normas da retrovenda ou da venda sobre documentos ao figurino em estudo. O direito de preferência é instituto ligado à compra e venda e não assimilado pela troca. O prazo para a entrega dos objetos da permuta deve ser estipulado em cláusula contratual, sendo certo que a parte interessada poderá invocar a exceção do contrato não cumprido (exceptio non adimpleti contractus). · As garantias em caso de evicção ou de vício redibitório, previstas para a compra e venda, se estendem à permuta. · Da mesma forma que a coisa alheia pode ser objeto de compra e venda é passível, também, de permuta.** É que ambos contratos não geram efeitos reais, mas obrigacionais. Quem permuta coisa alheia compromete-se a adquirir a coisa, a fim de entregá-la à contraparte. Esta, todavia, salvo convenção em contrário, não se compromete a cumprir a sua obrigação enquanto perdurar a pendência. · Admissível, também, a permuta de coisas futuras, envolvendo ambos os quinhões ou apenas um. ** À espécie, aplica-se o disposto no art. 483 da Lei Civil, que prevê a nulidade do negócio jurídico inexistindo a coisa. A extensão das regras da compra e venda ao contrato de troca justifica-se porque, na expressão de Henri de Page, os dois institutos são étroitement apparentés. A compra e venda é também uma troca, mas de uma coisa por dinheiro. *Regras particulares à troca Dada a inaplicabilidade, ao contrato de troca, do critério estabelecido para as despesas contratuais na compra e venda (art. 490) O legislador, mediante norma afastável por convenção, dispôs que o pagamento deverá ser efetuado em partes iguais pelos permutantes (art. 533, I, CC). Quanto ao imposto de transmissão Cada qual deverá arcar com o pagamento relativo à sua aquisição. Pertinente à mediação de corretor, já se decidiu que “Tratando-se de negócio complexo, de troca, em casos em que a intermediação é feita por uma só empresa, um só corretor, a comissão será devida pelos respectivos proprietários, sobre o valor de cada propriedade envolvida na transação, no percentual contratado de 3%.” O inciso II, do art. 533, apresenta duas normas: uma explícita e outra implícita. Expressamente dispõe ser anulável o contrato de troca entre ascendentes e descendentes, sem autorização dos demais descendentes e do cônjuge do alienante, quando os valores forem desiguais. ** Não se tratando de norma de ordem pública, natural que a invalidação do contrato dependa de iniciativa dos interessados. · Aplicando-se o argumento a contrario sensu à disposição, tem-se que, tratando-se de valores iguais é dispensável a outorga conjugal e a anuência dos demais descendentes. CONTRATO ESTIMATÓRIO *Art. 534 a 537 *NOÇÃO Tem-se o contrato estimatório, quando alguém (consignante) entrega coisas móveis a outrem (consignatário), para a venda, o qual se obriga, em determinado prazo, ao pagamento, sendo-lhe facultada a devolução total ou parcial da mercadoria. Consignante Entrega a coisa móvel a outrem para venda; * tradens Consignatário Se obriga, em determinado prazo, ao pagamento, podendo devolver total ou parcialmente a mercadoria; *accipiens **É contrato que se opera no âmbito mercantil e favorece as partes contratantes: · Ao produtor ou atacadista, porque amplia as suas possibilidades de vendas; · Ao comerciante, uma vez que lhe permite manter a atividade e obter lucros sem contar com o próprio capital, podendo restituir a coisa dentro do prazo convencionado e sem ônus, caso não consiga vendê-la. Apesar da tradição,o accipiens não adquire a propriedade, apenas o poder de aliená-la. O domínio permanece com o tradens, que perde a disponibilidade da coisa em caráter definitivo ou provisório. Se o accipiens exercitar o direito de restituição, o tradens recobrará o direito de alienar a coisa. Ao celebrar o contrato e efetuar a tradição, o tradens deposita também a sua confiança no accipiens, especialmente na solidez de seu patrimônio, que responderá por eventual inadimplemento. Embora a referência às figuras do produtor, atacadista, comerciante, o negócio jurídico pode ser celebrado entre particulares. Mais conhecido no tráfico comercial por venda em consignação, o nomen iuris consagrado na doutrina e pelos códigos é contrato estimatório, terminologia que destaca a avaliação ou estimação do preço pelo proprietário da coisa. A espécie é comum na relação entre editoras e livrarias e, ainda, no comércio de periódicos, obras de arte, máquinas e joias. *CARACTERES E NATUREZA JURÍDICA REAL O contrato estimatório é real, pois se aperfeiçoa apenas quando o tradens entrega a coisa ao accipiens. ** Nada impede, todavia, que este celebre venda para terceiro, contando com a coisa a lhe ser entregue. A hipótese será de venda de coisa futura. O efeito translativo ocorre apenas quando a coisa é efetivamente vendida para terceiro. Segundo Caio Mário da Silva Pereira, o consignatário deverá colocar a coisa à venda, expondo-a e oferecendo-a aos seus clientes. **Tal exigência se impõe apenas quando houver cláusula contratual específica, uma vez que essa obrigação não dimana, direta ou indiretamente, de dispositivo legal. SINALAGMÁTICO Considerando que tanto o consignante quanto o consignatário assumem direitos e obrigações, o contrato é sinalagmático. ONEROSIDADE A onerosidade é, também, uma de suas características, pois ambas as partes visam a obter vantagens. COMUTATIVO Seus efeitos, embora alternativos, não dependem de fator aleatório; são previamente estabelecidos, daí o seu caráter comutativo. NÃO NECESSARIAMENTE TRANSLATIVO DE DOMÍNIO Uma vez que este fica reservado ao consignante, podendo ser adquirido pelo consignatário ou por terceiro, caso não se registre a devolução em determinado prazo. A relação jurídica se forma entre o tradens e o accipiens. O primeiro entrega a coisa móvel, conservando a propriedade. O segundo adquire a posse direta e a disponibilidade da coisa, que implica a alternativa de devolvê-la ou não. *Neste último caso, poderá comprá-la ou vendê-la para terceiro. Ocorrendo a venda para terceiro O domínio é transferido do tradens para o terceiro, sem passar pelo accipiens. Não exercitado o direito de restituição, o accipiens deverá efetuar o pagamento do preço ao tradens, de acordo com o valor fixado no contrato estimatório, tenha vendido ou não a coisa. **RISCOS A partir da entrega da coisa, o accipiens assume os riscos por deterioração ou perda, inclusive os resultantes de vis major. **A faculdade de devolução, consequentemente, só pode ser exercitada se a coisa se mantiver incólume. · A posse e os riscos assumidos pela coisa, entendemos, não autorizam o consignatário a usá-la, embora haja entendimento contrário. Isto porque, se há coisas que não se desvalorizam pelo uso, como ocorre com um quadro de arte ou uma escultura, outras há que não permanecem absolutamente indenes. Esta seria a hipótese, por exemplo, de um veículo recém-saído da fábrica e usado pelo consignatário. O ressarcimento, in casu, não seria por deterioração, mas decorrente da desvalorização imposta à coisa, uma vez tenha sido usada de acordo com a própria destinação. **Convém às partes que a eventual permissão de uso da coisa consignada seja objeto de cláusula contratual. Hoje, em nosso ordenamento, o contrato estimatório é nominado, não se identificando ou se reduzindo a qualquer outro. Contrato Estimatório X Compra e Venda *Não constitui modalidade de compra e venda, pois o contrato se torna perfeito antes de eventual venda. ** Esta, se ocorrer, será mero efeito contratual, tanto quanto a devolução da res. Em decorrência, não há de se cogitar da incidência do imposto de circulação de mercadoria, uma vez que o contrato estimatório não induz, necessariamente, à circulação do domínio. **REGRAS BÁSICAS DO ORDENAMENTO BRASILEIRO *Elementos do contrato Art. 534 O consignante entrega ao consignatário BENS MÓVEIS, excluindo-se os que se encontram fora do comércio. **Para a doutrina, são suscetíveis de consignação todos os que podem ser vendidos, nada impedindo que as coisas fungíveis figurem como objeto. Obs: Pelo texto do art. 534 da Lei Civil, que se refere à coisa móvel, depreende-se que os bens incorpóreos, como os direitos autorais, não são passíveis de figurar como objeto do contrato. · A impossibilidade dos imóveis é uma decorrência de dificuldades técnicas do consignatário para efetuar a venda em nome próprio, conservando o consignante o domínio da res. **** No contrato estimatório, o accipiens vende para terceiro como se fora proprietário da coisa, o que não seria possível, relativamente ao imóvel, sem que este passasse antes para o seu nome no registro imobiliário. A entrega da coisa móvel ao consignatário é essencial à formação do contrato, que é de natureza real. O contrato confere ao accipiens o poder de dispor da coisa, em prazo convencionado, o qual fica autorizado a vender coisa alheia como se fora o proprietário. Ocorre neste ponto uma ficção jurídica. *O accipiens não é o titular do domínio, mas age perante terceiro como se fora. Se a disponibilidade da coisa foi confiada ao accipiens, impedido fica o tradens de aliená-la para terceiro sem a anuência daquele. **O consignatário possui liberdade para combinar com o terceiro o preço da coisa a lhe ser vendida, mas não desnatura o contrato estimatório a fixação prévia do preço, mediante acordo entre o consignante e consignatário. **Isto ocorre quando a coisa faz parte de um gênero produzido em série e vendido na praça com preço fixo. Pontes de Miranda entendeu que, em princípio, o accipiens é livre para vender a coisa para qualquer pessoa, mas o seu direito de alienar pode ficar delimitado a um círculo ou condicionado a uma só pessoa. PRAZO No contrato, as partes devem estipular um prazo dentro do qual o consignatário terá a disponibilidade da coisa. Com o dies ad quem, o consignante terá o direito de receber o preço previsto ou a restituição, cabendo ao consignatário a alternativa. Na opinião de Gastone Cottino, o consignatário somente poderá restituir a coisa até o termo final, após o que deverá ocorrer, forçosamente, o pagamento.* As partes, mediante cláusula contratual, poderão estabelecer critério diferente. O consignatário, caso pretenda devolver a coisa ou efetuar o pagamento antes do término do prazo, poderá fazê-lo, pois, como lembra Sílvio de Salvo Venosa, o prazo é estipulado a seu favor. Se por um lapso os contratantes não fixaram o prazo, este deverá ser o habitualmente praticado pelas partes em seus negócios ou, na falta destes, o indicado pelos usos da região. O consignante poderá valer-se da interpelação, fixando um prazo razoável, ajustado às peculiaridades do objeto, findo o qual a inércia do consignatário implicará a mora solvendi, de acordo com a regra do art. 397 do Código Civil. Os autores discutem quanto à essencialidade do prazo. Penso que este é essencial, enquanto a sua falta em cláusula contratual é suprível. Assim, caso as partes não o tenham estipulado, não se terá negócio jurídico inexistente. PREÇO O preço da coisa é o estimado pelos contratantes e previsto em cláusula contratual. Findo o prazo sem a restituição, caberá ao consignatário efetivar o pagamento de acordo com o pretium, que é líquido. *Para o acerto entre as partes, este deve ser o praticado, não importando o preço da venda realizada para terceiro. Outrossim, incabível qualquer desconto, seja a título de comissão ou desvalorização natural da coisa. **Enquanto o preço é elemento essencial, o pagamento ou a restituição da coisa,previstos na Lei Civil, constituem mero efeito do contrato estimatório. *Se, vencido o prazo, o consignatário não devolve a coisa, nem efetua o pagamento, a sua posse se caracteriza de má-fé, o que enseja o procedimento de reintegração de posse, consoante a disposição do art. 1.210 do Código Civil. *O consignatário e os riscos da coisa Com a entrega, o accipiens assume a responsabilidade por eventual deterioração ou perda da Coisa, independentemente da causa, salvo se por culpa do tradens. **O art. 535 define a obrigação do accipiens, acrescentando: “ainda que por fato a ele não imputável” – expressão equivalente a motivo de força maior, a qual compreende a ação de terceiro. *Corolário desta obrigação são os encargos do consignatário com a conservação da coisa. ** Penso que esta responsabilidade se estende aos gastos extraordinários e urgentes, decorrentes de força maior ou factum principis. *Impenhorabilidade da coisa Enquanto o domínio da coisa consignada pertencer ao tradens, os credores do accipiens não poderão penhorá-la ou sequestrá-la. E a Lei Civil, pelo art. 536, somente considera transferida a propriedade para o accipiens quando o preço for inteiramente pago. * Se a coisa valorizou após a tradição, aos credores poderá interessar o pagamento, valendo-se do permissivo do caput do art. 304, a fim de obterem posteriormente o ato de constrição. **Em contrapartida, os credores do consignante, antes da restituição da coisa ou do aviso do consignatário de que esta se efetivará, igualmente não poderão penhorá-la ou sequestrá-la. Nada impede, porém, qualquer destas medidas, estando a coisa em poder do consignatário e já expedido o aviso da restituição. *Impedimento de venda pelo consignante O objeto da consignação não pode ficar, ao mesmo tempo, disponível para ambos contratantes. Por expressa disposição do art. 537 do Código Civil, o tradens não poderá alienar a coisa antes da restituição ou do aviso de que esta se efetivará. DOAÇÃO *Art. 538 ao 564 CONSIDERAÇÕES PRÉVIAS A prática mais antiga de transmissão da propriedade, na opinião de alguns autores, anterior mesmo ao escambo, teria sido a doação, que é um reflexo do espírito de solidariedade existente nos seres humanos. Enquanto o hábito da venda se acha associado ao desejo de se obter vantagens econômicas, o ato de doar é manifestação de apoio ao próximo; é preocupação com o semelhante. **Entre o benfeitor e o beneficiário, quase sempre há um nexo de parentesco ou de amizade. Há, certamente, outras motivações que induzem as duas modalidades de translação do domínio. A traditio, na venda, é obrigação; no ato de doar, uma liberalidade. ** A motivação, todavia, não é elemento integrante da doação, do ponto de vista jurídico. O animus donandi[footnoteRef:2], sim, é essencial ao contrato e corresponde à intenção da liberalidade, não variando de conteúdo. Ainda que a razão profunda do benfeitor não seja nobre, como os impulsos de vaidade, basta o animus donandi como elemento subjetivo da doação. [2: Intenção de beneficiar ou favorecer o donatário por mera “liberalidade”. O animus donandi não pode ser confundido com a simples renúncia abdicativa, ato por meio do qual o declarante simplesmente se despoja de um bem do seu patrimônio, sem beneficiário certo ou determinado. O animus donandi não poder confundido com o animus solvendi, em que a parte pretende solver um débito, cumprir uma obrigação. (Doação X Dação em pagamento). ] **Na condição de contrato, a doação implica a anuência do beneficiário. Tanto quanto a venda, as doações provocam a circulação de riquezas, de vez que possuem por objeto parte do patrimônio do benfeitor, que se transfere para o acervo de bens do beneficiário. Na disciplina das doações há dois interesses que devem ser conciliados pelo legislador: · O de permitir a prática da liberalidade como legítima e espontânea manifestação da vontade; · Ao mesmo tempo, o de proteger o benfeitor quanto a repentinas deliberações de doar, nascidas mais da emoção momentânea e menos de um propósito amadurecido na consciência. *** O caráter irrevogável da doação justifica a preocupação do legislador *** A preocupação com o patrimônio do doador é antiga e remonta ao Direito Romano. **Conceito Pelo contrato de doação, alguém (doador ou benfeitor) se obriga a transferir bens ou vantagens do seu patrimônio para o de outrem (donatário ou beneficiário), movido pelo espírito de liberalidade. CUIDADO!!! Aparentemente, a definição supra contraria à do Código Civil, art. 538, pois o legislador não se refere à obrigação de transferência de bens ou vantagens, mas preceitua que o contrato os transfere. O contrato é realmente consensual, daí dizer-se obrigação de transferir, enquanto o texto legal, em outras palavras, reconhece por objeto de doação apenas aquele que sai do patrimônio do doador e entra no do donatário. ***Não é qualquer benefício que enseja a doação, apenas o que diminui o acervo de bens do benfeitor e aumenta o do beneficiário. A relação jurídica entre doador e donatário não se esgota inteiramente com o ato de liberalidade ou com o cumprimento do ônus, tratando-se de doação modal. Ela se prolonga no tempo, pois eventualmente o donatário poderá ser obrigado a prestar alimentos ao doador, conforme dispõe o art. 557, IV, do Código Civil, excluída a hipótese de doação remuneratória. **Elementos O selo que distingue a doação de qualquer outro contrato ato de liberalidade praticado pelo doador. É o animus donandi, elemento subjetivo da doação, ao lado da aceitação pelo donatário. O seu propósito é beneficiar o donatário. ** Não significa, todavia, que no recôndito da consciência o doador aja com desprendimento. O fundamental é que a vontade declarada seja reveladora da intenção de transferir parte do patrimônio para o acervo de bens do beneficiário. · O ato há de ser espontâneo, desprovido de obrigatoriedade. · O desejo de compensar o beneficiário por fatos pretéritos não exclui o animus donandi, nem desnatura a doação. Fundamental é não se confundir as motivações psicológicas com a declaração consciente da vontade. (Esta é que define o animus donandi). Embora haja outros tipos contratuais gratuitos, somente na doação a liberalidade se faz presente. **Há outros contratos, como ela, gratuitos, mas em nenhum outro se observa a intenção de praticar um ato de liberalidade, ou gratificação espontânea. Para que a declaração de vontade do doador surta os efeitos jurídicos desejados, indispensável que o agente, além da capacidade de fato, inerente aos negócios jurídicos em geral, tenha também capacidade jurídica ou legitimidade para a prática do ato. Obs: Nem sempre o sui juris pode doar, pois a ordem jurídica impõe algumas limitações, como é o caso da proibição ao cônjuge adúltero em favor do seu cúmplice, como prevê o art. 550 do Código Civil, ou a doação de um cônjuge ao outro, havendo a separação obrigatória de bens, pois a dádiva implicaria a ineficácia do regime patrimonial imposto em lei. Para que o contrato se aperfeiçoe, indispensável ainda que a pessoa tenha aptidão para receber a doação. Para tanto, basta a capacidade de fato. **A Lei Civil reconhece nos nascituros (art. 542) e incapazes (art. 543) a capacidade passiva para serem beneficiários na doação. **Os futuros nubentes possuem capacidade passiva para receber doações, um do outro ou de terceiro, à vista de seu futuro casamento. Obs: O ato de liberalidade é praticado sob condição resolutiva, segundo se depreende dos termos do art. 546, que diz “e só ficará sem efeito se o casamento não se realizar”. **Doações também poderão ser feitas a sua eventual prole. Cuidado!! Nada impede, todavia, que a doação se faça mediante condição suspensiva. Não basta o propósito de doar para que se concretize a liberalidade. A doação, sendo contrato, pressupõe a correlata declaração de vontade do beneficiário. A aceitação da oferta é conditio sine qua non para a celebração do contrato. Juntamente com o animus donandi, constitui