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NEUROPSICOLOGIA: EXAMES E AVALIAÇÕES 1 1 Sumário NEUROPSICOLOGIA: EXAMES E AVALIAÇÕES .................................. 0 NOSSA HISTÓRIA .................................................................................. 2 Introdução ................................................................................................ 3 O exame neuropsicológico ...................................................................... 8 Avaliação Quantitativa ........................................................................ 12 Avaliação Qualitativa .......................................................................... 22 A avaliação neuropsicológica ................................................................ 33 Instrumentos de avaliação .............................................................. 36 Limitações e Vantagens da utilização dos instrumentos da avaliação neuropsicológica ....................................................................................... 37 Interpretação dos resultados .......................................................... 38 Protocolo Básico ............................................................................. 39 Avaliação Cognitiva ............................................................................ 40 A-Testes de eficiência intelectual ................................................... 41 B- Instrumentos de rastreio ............................................................ 42 C- Avaliação da memória ............................................................... 44 D-Avaliação da linguagem .............................................................. 46 E- Avaliação das habilidades vísuo- construtivas ........................... 47 F- Funções executivas .................................................................... 48 G- Avaliação dos distúrbios psicológicos e do comportamento ...... 50 Avaliação neuropsicológica na criança - indicações e contribuições . 51 Testes utilizados ............................................................................. 53 REFERÊNCIAS ..................................................................................... 64 file://192.168.0.2/E$/PostagemNova/PSICOLOGIA/NEUROPSICOLOGIA/NEUROPSICOLOGIA-%20EXAMES%20E%20AVALIAÇÕES/NEUROPSICOLOGIA-%20EXAMES%20E%20AVALIAÇÕES.docx%23_Toc72500942 2 2 NOSSA HISTÓRIA A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior. A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 3 3 Introdução A neuropsicologia é a ciência que estuda a relação entre o comportamento e o funcionamento cerebral em condições normais ou patológicas. Em outras palavras, ela busca compreender as funções mentais e sua relação com o funcionamento neurológico (Capovilla, 2007). Mais detalhadamente, a neuropsicologia entende os processos mentais como sistemas funcionais complexos, não localizáveis em estreitas e circunscritas áreas do cérebro e ocorrendo com a participação de grupos de estruturas cerebrais, cada uma das quais contribuindo de modo diferenciado para a organização do sistema funcional em questão (Luria, 1981). De acordo com Lezak, Howieson e Loring (2004), a avaliação neuropsicológica ocupa lugar central na neuropsicologia por auxiliar na investigação das funções mentais, particularmente as funções cognitivas. Em resumo, a avaliação neuropsicológica é uma estratégia investigativa destinada a 4 4 identificar, obter e proporcionar dados e informações sobre o funcionamento mental dos sujeitos. O Exame Neuropsicológico é uma análise detalhada e objetiva das principais funções mentais: atenção, raciocínio lógico, linguagem, memória, percepção visual, planejamento, raciocínio aritmético, através de testes, questionários e inventários aplicados por profissionais experientes nesta técnica. A avaliação neuropsicológica são testes que investigam as funções cognitivas (conhecimentos complexos) e práticas (atividade motora fina) das pessoas, para esclarecer os distúrbios de atenção, memória e sensopercepção, além de desalinhamentos cognitivos específicos como gnosias, abstração, capacidade de raciocínio, cálculo e planejamento, bem como seus diagnósticos diferenciais. Seu objetivo é apoiar médicos neurocirurgiões, psiquiatras, psicólogos ou fonoaudiólogos entender melhor as funções mentais “normais” comparados aos sintomas apresentados pelo paciente devidos a temas como desatenção, esquecimento ou problemas de cognição. Segundo Mäder (1996), os objetivos da avaliação neuropsicológica são basicamente auxiliar o diagnóstico diferencial, estabelecer a presença ou não de disfunção cognitiva e o nível de funcionamento em relação ao nível ocupacional e localizar alterações sutis a fim de detectar disfunções ainda em estágios iniciais. Fuentes, Malloy-Diniz, Camargo e Cosenza (2008) ressaltam que as principais razões para se solicitar uma avaliação neuropsicológica são: Auxílio diagnóstico: as questões diagnósticas geralmente buscam saber qual seria o problema do paciente e como ele se apresenta. Isso implica que seja feito um diagnóstico diferencial entre quadros que têm manifestações muito semelhantes ou passíveis de serem confundidas. 5 5 Prognóstico: com o diagnóstico feito, deseja-se estabelecer o curso da evolução e o impacto que a desordem terá à longo prazo. Este tipo de previsão tem a ver com a própria patologia ou condição de base da doença ou transtorno (quando há lesão, com o lugar, o tamanho e lado no qual se encontra e, nesse caso, devem ser considerados os efeitos à distância que elas provocam). Orientação para o tratamento: ao estabelecer a relação entre o comportamento e o substrato cerebral ou a patologia, a avaliação neuropsicológica não só delimita áreas de disfunção, mas também estabelece as hierarquias e a dinâmica das desordens em estudo. Tal delineamento pode contribuir para a escolha ou para mudanças nos tratamentos medicamentosos ou outros. Auxílio para planejamento da reabilitação: a avaliação neuropsicológica estabelece quais são as forças e as fraquezas cognitivas, provendo assim uma espécie de mapa para orientar quais funções devem ser reforçadas ou substituídas por outras. Seleção de pacientes para técnicas especiais: a análise detalhada de funções permite separar subgrupos de pacientes de mesma patologia, possibilitando uma triagem específica de pacientes para um procedimento ou tratamento medicamentoso. Perícia: auxiliar a tomada de decisão que os profissionais da área do direito precisam fazer em uma determinada questão legal. Lezak, Howieson e Loring (2004) apontam ainda a relevância da avaliação neuropsicológica para os cuidadoscobrindo uma gama de capacidades e habilidades. Mesmo tendo fornecido informações quantitativas valiosas a respeito do intelecto, Wechsler sempre considerou a complexidade da inteligência e chegou a afirmar que “a inteligência se manifesta de várias formas e nenhum dos sub- testes das escalas Wechsler pretende refletir toda inteligência” (1994). Essas baterias avaliam aspectos distintos da cognição e foram amplamente estudadas para verificar seu valor para localização cerebral. Os sub-testes são agrupados em domínios específicos que avaliam aspectos verbais (QI verbal) e os não verbais (QI de execução) da inteligência. 4 2 42 B- Instrumentos de rastreio O Mini–exame do estado mental (Folstein et al., 1975 e adaptado por Bertolucci et. Al, 1994 *6) é, de longe, o teste cognitivo mais utilizado no mundo, pois é rápido (em torno de 10 minutos), de fácil aplicação e não requer material específico. Deve ser utilizado, no entanto, como instrumento de rastreio e de forma alguma substitui uma avaliação mais detalhada, porque apesar de investigar vários domínios cognitivos (orientação temporal, espacial, memória imediata e de evocação, cálculo, linguagem - nomeação, repetição, compreensão, escrita e cópia de desenho), a avaliação é feita de maneira bastante superficial. Obviamente não serve para diagnóstico, mas serve para indicar as funções que devem ser melhores investigadas. Possui escores diferentes dependendo da escolaridade do sujeito testado (Ver Figuras 1 e 2). 4 3 43 4 4 44 C- Avaliação da memória Como definiu Iván Izquierdo “A memória é uma função do sistema nervoso encarregada de reter informações ou percepções, para que posteriormente possam ser utilizadas”. Há razoáveis evidências para se acreditar no envolvimento de diferentes regiões do sistema nervoso nos processos de aquisição e utilização de diferentes tipos de informação. A desconexão em diferentes áreas desses circuitos pode fazer emergir diferentes aspectos neuropsicológicos e diferentes manifestações clínicas. Basicamente, o processo de memorização inclui 3 etapas: - Registro da informação por uma modalidade sensorial; - Retenção ou armazenamento; - Evocação, que é a capacidade de resgatar a informação De acordo com o sistema em operação, a memória pode ser dividida em episódica, semântica e de procedimento. A memória episódica é autobiográfica e temporalmente relacionada. A memória semântica é a memória do conhecimento para fatos. A memória de procedimento ou procedural envolve habilidades motoras e perceptuais, como andar de patins. Os diferentes tipos de memórias devem ser avaliados nas modalidades verbais e não verbais. Os testes mais utilizados para a avaliação da memórias estão listados no Quadro 1. 4 5 45 Mais do que a análise quantitativa dos resultados, baseada nos escores, é imprescindível a análise qualitativa dos dados. É preciso capacidade para responder: o sujeito utiliza estratégias que facilitam a evocação? Ele é capaz de agrupar palavras ou desenhos por categoria semântica ou fonêmica ou utiliza outra estratégia mnêmica? Como reagiu às interferências? Quais os tipos de erros apresentados? Em quanto tempo se dá o esquecimento? Diferentes patologias parecem apresentar perfis diferentes nas tarefas que avaliam a memória. Pacientes com Doença de Alzheimer apresentam dificuldade de evocação porque os processos estratégicos de recuperação de informação são deficitários. Enquanto pacientes com quadros depressivos ou lesões mais anteriores apresentam dificuldade de registrar uma informação e de acessar o mecanismo de busca dessas informações armazenadas. É importante observar a presença de intrusões ou perseverações. A intrusão se refere à inclusão de palavras ou desenhos estranhos à lista previamente apresentada e a perseveração à repetição de algum (ns) dos itens apresentados. Todos os testes de memória devem incluir tarefas de reconhecimento junto a distratores. 4 6 46 D-Avaliação da linguagem As alterações de linguagem são manifestações freqüentes após lesões cerebrais. A família ou o próprio paciente relata o desinteresse por leitura, a dificuldade de escrita, além de dificuldade de encontrar palavras na hora de falar bem como a diminuição da fala espontânea. Durante a entrevista inicial, é importante observar se faltam palavras no discurso, se este é coerente e apropriado para o contexto, se há alteração do ritmo e da melodia (prosódia), se o paciente utiliza bordões, se fica em volta da palavra alvo. “Aquilo que escreve” para designar caneta, por exemplo. Devem ser avaliados: Os testes mais utilizados para se avaliar a linguagem são: - Teste de fluência verbal por categorias semânticas (dizer o maior número de animais em 1 minuto, Newcombe,1969); - F. A. S. de fluência por categoria fonêmica (maior número de palavras iniciadas com as letras F, A e S durante 1 minuto, Benton & Hamsher, 1976). Esse tipo de teste é muito sensível, para disfunção frontal, especialmente à esquerda (Lezak, 1995); - Teste de nomeação de Boston, para se verificar a capacidade nominativa (Kaplan et al., 1978); - Tolken Test, teste dos toquinhos para observação da compreensão oral (De Renzi & Ferrari, 1962); - Figura do roubo dos biscoitos, onde o paciente descreve por escrito uma cena complexa (Goodglass & Kaplan, 1972). 4 7 47 Esses testes são capazes de avaliar todos os aspectos da linguagem. No entanto, para uma investigação mais aprofundada, seria aconselhável o encaminhamento a um profissional especializado. Nos testes de nomeação, deve-se ficar atentos à presença de parafasias, circunlóquios, neologismos e à tendência a fazer gestos para tentar designar o objeto. Nos testes de escrita, observam-se os erros de ortografia não compatíveis com a escolaridade, tendência a duplicar letras, além de frases curtas e sem pontuação. E- Avaliação das habilidades vísuo- construtivas Os distúrbios visuoespaciais fazem parte de um conjunto de alterações associadas a lesões cerebrais. Os distúrbios visuoespaciais referem-se à percepção deficitária de formas, características, distância, cores, local, tamanho, comprimento, volume, angulação, luminosidade, movimento e profundidade. A percepção visual provê ao observador informações sobre “quais” objetos estão no meio, “onde” e “como” estão localizados. Segundo Anauate (Referencia) “a percepção visual abrange um número grande de funções e circuitos cerebrais que incluem: procura e pesquisa visual; plano e exploração visual; sustentação da fixação visual no estímulo por tempo programado; distinção das características do objeto ou figura; captação e comparação de detalhes; pesquisa por scanning em diferentes arranjos; localização da informação no espaço; monitoramento da velocidade de resposta para informação visual; observação do todo e divisão em partes; reconhecimento do estímulo em diferentes perspectivas; formação e uso de 4 8 48 imagens visuais para descrever objetos; figuras ou cenas que não estão presentes; estocagem de atributos visuais elementares num sistema de memória visual”. Tradicionalmente, o teste do desenho do relógio tem sido usado como tarefa visuoespacial e construtiva. Para sua execução é necessária também organização e planejamento. Devem ser investigadas: a distribuição espacial dos números dentro do círculo, a ocorrência de negligências visuais e de hemianopsias. A bateria do WAIS inclui tarefas de construção, envolvendo a reconstrução de desenhos com blocos e montagem de quebra –cabeça. Outros testes muito utilizadossão: - Cópia do cubo- desenho em terceira dimensão; - Desenho da casa, bicicleta- desenho em duas dimensões; - Figura Complexa de Rey. As lesões cerebrais à direita provocam deslocamento e distorções das partes, perda das relações espaciais, dificuldade de percepção e ausência de crítica dos erros. As lesões cerebrais à esquerda podem levar a dificuldades na execução da tarefa, como cópias simplificadas, tendência a deixar ângulos em aberto ou retificá-los, dificuldades motoras com cópias lentificadas. F- Funções executivas Segundo a definição de Lezak,(9) as funções executivas se relacionam a processos mentais que envolvem a formulação, a antecipação, o planejamento, 4 9 49 a monitorização e o desempenho com vistas a um objetivo. Compreendem funções complexas que capacitam e preparam um indivíduo para ações voluntárias dirigidas para metas específicas. O desempenho eficiente do funcionamento executivo torna possível focalizar, direcionar, gerenciar e integrar o funcionamento cerebral, as emoções e o comportamento, de modo a mantê-lo fluente, visando a realização de tarefas rotineiras e a solução de novos problemas. Ele possibilita a antecipação de ações futuras, muda as estratégias de modo flexível, se a situação assim o exige, direciona o comportamento para metas específicas, inibe estímulos competitivos e avalia os resultados parciais comparando com o plano original. Enfim, os sistemas frontais têm o caráter regulador das funções motivacionais, emocionais, afetivas, perceptivas, cognitivas e do comportamento em geral. As funções executivas, pela sua nobreza e importância são extensamente avaliadas durante o exame neuropsicológico, embora as dificuldades possam aparecer mais nas atividades da vida diária do indivíduo do que em situações de testagem formal. Existem diferentes testes para se avaliar as diferentes funções do lobo frontal. Os mais conhecidos são: - Análise de figuras temáticas (Escala de Stanford-Binet, por exemplo), para avaliar a capacidade de percepção temática e de construção de estória simples e objetiva; - Torre de Hanói: consiste em uma tarefa de planejamento que envolve desenvolvimento e realização de um plano; - Wisconsin Card Sorting Test (WCST), para observação da habilidade de abstração e capacidade de se mudar de uma linha de pensamento para outra, sendo considerado um dos mais sensíveis para disfunção frontal; 5 0 50 - Trail Making Test A e B, Stroop Test, Go-no-go que avaliam a inibição de respostas e a resistência à interferência. O teste de trilhas consiste em conectar números de 1 a 25 em ordem crescente na forma A, tarefa que deve ser realizada dentro de um determinado tempo, e números e letras em sua forma B; - Repetição de dígitos do WAIS, na ordem direta, que além da atenção avalia memória, e a ordem indireta, onde o sujeito tem que inverter a seqüência lida pelo examinador, teste que envolve além da estocagem, manipulação da informação e controle mental. G- Avaliação dos distúrbios psicológicos e do comportamento Em 13 de setembro de 1848, um contramestre de 25 anos de idade, chamado Phineas Gage, teve seu crânio perfurado por uma barra de ferro de 6 quilos e 1 metro de comprimento. Apesar de ter sobrevivido aos ferimentos e ter apresentado pouca perda cognitiva, sua personalidade apresentou uma mudança radical e ele se tornou irreverente, grosseiro e impaciente. Desde então, é sabido que lesões no lobo frontal são capazes de produzir mudanças emocionais e comportamentais. A avaliação neuropsicológica difere da avaliação cognitiva por incluir a avaliação de aspectos não cognitivos. Assim, são utilizados instrumentos de rastreio para detecção de distúrbios psicológicos tais como: depressão, ansiedade, delírios, alucinações, etc. e comportamentais tais como: agressividade, apatia, alterações do sono e apetite, etc. As causas para essas alterações são muitas, mas as alterações neuroquímicas e a presença de lesões em determinados circuitos geram quadros clínicos que simulam patologias psiquiátricas. Assim, lesões de regiões 5 1 51 dorso-laterais podem gerar comportamento de apatia, com empobrecimento cognitivo e déficit das habilidades executivas. Lesões órbito-frontais são normalmente associadas a comportamentos de desinibição e agressividade, sugerindo uma “pseudopsicopatia”, com imprudência, inquietude e inadequação social. Pacientes com lesões de áreas cingulares podem apresentar apatia e normalmente não se sentem mobilizados para nada, porém podem manter as funções executivas, sendo esse um quadro muito similar à depressão, enquanto lesões de pólos temporais anteriores cursam com hipersexualidade, hipermetamorfose (tendência a explorar o ambiente), agnosia visual e hiperoralidade (tendência a levar tudo a boca). Outros fatores também podem contribuir para essas alterações como estresse, mudanças na rotina e no ambiente do paciente, etc. Além disso, as perdas funcionais e cognitivas parecem influenciar a natureza desses distúrbios. É importante tratar também essas alterações porque elas sobrecarregam o cuidador e estão associadas a um número maior de institucionalizações, segundo estudos de Steele e Cols,. (1990). Atualmente existe uma enorme gama de instrumentos para se rastrear tais alterações. Existem escalas globais que abordam amplos aspectos do comportamento e da emoção e outras escalas onde se avalia um único aspecto emocional ou comportamental. Exemplificam os dois casos: o Inventário neuropsiquiátrico (NPI) e o inventário Beck de Depressão, respectivamente. Essas escalas são preenchidas com informações prestadas pelo examinador, colhidas junto a um familiar ou cuidador ou mesmo a partir de informações obtidas com o paciente. Avaliação neuropsicológica na criança - indicações e contribuições 5 2 52 A avaliação neuropsicológica é recomendada em qualquer caso onde exista suspeita de uma dificuldade cognitiva ou comportamental de origem neurológica. Ela pode auxiliar no diagnóstico e tratamento de diversas enfermidades neurológicas, problemas de desenvolvimento infantil, comprometimentos psiquiátricos, alterações de conduta, entre outros. A contribuição deste exame na criança é extensiva ao processo de ensino- aprendizagem, pois nos permite estabelecer algumas relações entre as funções corticais superiores, como a linguagem, a atenção e a memória, e a aprendizagem simbólica (conceitos, escrita, leitura, etc.). O modelo neuropsicológico das dificuldades da aprendizagem busca reunir uma amostra de funções mentais superiores envolvidas na aprendizagem simbólica, as quais estão, obviamente, correlacionadas com a organização funcional do cérebro. Sem essa condição, a aprendizagem não se processa normalmente, e, neste caso, podemos nos deparar com uma disfunção ou lesão cerebral. Ao fornecer subsídios para investigar a compreensão do funcionamento intelectual da criança, a neuropsicologia pode instrumentar diferentes profissionais, tais como médicos, psicólogos, fonoaudiólogos e psicopedagogos, promovendo uma intervenção terapêutica mais eficiente. O conjunto dos instrumentos utilizados nos possibilita uma avaliação global das capacidades da criança, bem como das dificuldades encontradas por ela em seu desempenho dia a dia. Não se trata de "rotular" ou "enquadrar" a criança como integrante de grupos problemáticos, e sim de evitar que tais dificuldades possam impedir o desenvolvimento saudável da criança. Ainda quanto à avaliação em crianças, torna-se importante salientar algumas questões, entre elas o fato de o desenvolvimento cerebral ter características próprias a cada faixa etária. Portanto, dentro desse padrão de funcionamento cerebral,é importante a elaboração de provas de acordo com o 5 3 53 processo maturacional do cérebro. Por exemplo, "quando se fala de imaturidade na infância, esta não deve ser entendida unicamente como deficiência", devido às peculiaridades do desenvolvimento cerebral na infância. Diferentemente do adulto, o cérebro da criança está ainda em desenvolvimento, tendo características próprias que garantem uma diferenciação e especificidade de funções. Segundo Antunha, as baterias de testes neuropsicológicos adaptados para crianças são em número bastante reduzido. Devem contemplar: _ a organização e o desenvolvimento do sistema nervoso da criança; _ a variabilidade dos parâmetros de desenvolvimento entre crianças da mesma idade; _ a estreita ligação entre o desenvolvimento físico, neurológico e a emergência progressiva de funções corticais superiores. Testes utilizados Estão relacionados a seguir alguns testes utilizados na avaliação neuropsicológica, descrevendo-se, de maneira sucinta, as potencialidades de cada teste ou bateria como instrumento de ajuda na investigação neuropsicológica. Inteligência 5 4 54 Os testes de inteligência para crianças medem primariamente habilidades essenciais ao desempenho acadêmico. Entre eles, o de Stanford-Binet foi o primeiro nos Estados Unidos. Adaptado das escalas originais de Binet-Simon, baseia-se maciçamente no desempenho verbal e cobre desde os 2 anos até a idade adulta (23 anos), fornecendo uma idade mental e um quociente de inteligência (QI). O padrão-ouro internacional para a quantificação das capacidades intelectuais são as escalas Wechsler de inteligência, subdivididas pela faixa de idade. Essas escalas consistem em uma série de perguntas e respostas padronizadas que medem o potencial do indivíduo em áreas intelectuais diferentes, como o nível de informação sobre assuntos gerais, a interação com o meio ambiente e a capacidade de solucionar problemas cotidianos. O teste WPPSI (do inglês Wechsler Preschool and Primary Scale of Intelligence - Escala de Inteligência Wechsler para Pré-Escolares e Primário) é uma versão para crianças menores das escalas Wechsler, permitindo avaliar a inteligência de crianças entre 4 e 6,5 anos. É constituída por seis subtestes verbais e cinco de natureza manipulativa. Normalmente, a aplicação de cinco subtestes de cada uma das subescalas (verbal e de execução) é suficiente para uma análise fidedigna. A escala também permite recolher algumas informações sobre a organização do comportamento da criança. O WISC-III (Wechsler Intelligence Scale for Children-III - Escala de Inteligência Wechsler para Crianças-III) é a escala mais usada para avaliar a inteligência de crianças cobrindo as idades de 6 anos a 16 anos, 11 meses e 30 dias. Fornece escores nas escalas verbal e de execução, bem como um QI de escala total. Inclui muitos tipos de tarefas, oportunizando a observação das dificuldades da criança e de suas habilidades. É importante salientar que crianças com dificuldades motoras em geral são penalizadas neste teste, que 5 5 55 não deve ser usado quando tal deficiência estiver presente. O subteste Cubos do WISC-III (Figura 1) visa averiguar a capacidade de análise, síntese e planejamento de coordenadas vísuo-espaciais e a praxia construtiva. Pede-se ao sujeito que reproduza, com cubos de faces coloridas, desenhos que lhe são mostrados. Para cada modelo é estipulado um prazo limite para execução. Embora o QI não seja uma medida para localizar disfunções cerebrais, o resultado de QI contribui para dar maiores informações sobre o nível geral de funcionamento do paciente e, assim, servir de referência para outras funções mais específicas, como memória, linguagem, etc. Tanto o Stanford-Binet como o WISC-III e o WIPPSI são administrados individualmente a cada sujeito. Quando o paciente não apresenta condições de expressar-se verbalmente, usam-se os testes Matrizes Progressivas de Raven e Escala de Maturidade Mental Colúmbia, que avaliam a inteligência geral e estimam a capacidade de raciocínio geral de crianças de uma forma não-verbal. O objetivo do teste Matrizes Progressivas de Raven (Figura 2) é descobrir as relações que existem entre as figuras e imaginar qual das oito figuras apresentadas completaria o sistema. https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0021-75572004000300014#fig01 https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0021-75572004000300014#fig02 5 6 56 Tradicionalmente, a inteligência está relacionada com as habilidades acadêmicas, porém existem outros tipos de inteligência (como, por exemplo, a caracterizada pela capacidade de relacionar ideias complexas, formar conceitos abstratos, derivar implicações lógicas através de regras gerais) que, muitas vezes, não é possível mensurar através dos testes convencionais. A este respeito, Primi salienta que, nas abordagens da inteligência, duas são tratadas como fundamentais: a inteligência cristalizada (que prioriza o conhecimento) e a inteligência fluida (que prioriza o raciocínio). A primeira se refere à profundidade das informações adquiridas via escolarização e geralmente é usada na resolução de problemas semelhantes ao que se aprendeu no passado (como nos testes tradicionais de inteligência). A segunda se refere à capacidade de processamento cognitivo, ou seja, a capacidade geral de processar informações ou as operações mentais realizadas quando se resolvem problemas relativamente novos. Com o propósito de avaliar a inteligência de uma forma global, foi padronizada para a população brasileira a bateria de provas de raciocínio (BPR- 5), a qual oferece estimativas do funcionamento cognitivo geral e das habilidades do indivíduo em cinco áreas específicas: raciocínio abstrato, verbal, espacial, 5 7 57 numérico e mecânico. Este instrumento auxilia os examinadores a tomarem decisões sustentadas na avaliação das aptidões e raciocínio geral, tais como, por exemplo, na avaliação das dificuldades de aprendizagem. É organizado em duas formas: A) para estudantes da 6ª à 8ª série do ensino fundamental; B) para alunos da 1ª à 3ª série do ensino médio. Memória Para esta função, são utilizados instrumentos que avaliam a capacidade de aprendizado de funções de memória, como, por exemplo, o Teste de Aprendizado Auditivo Verbal de Rey (Rey Auditory Verbal Learning Test - RAVLT) e o Teste de Aprendizado Visual de Desenhos de Rey (Rey Visual Design Learning Test - RVDLT). Os testes que envolvem aprendizado, isto é, a repetida exposição ao material a ser recordado, são mais sensíveis para detectar prejuízos de memória do que testes apresentados somente uma vez. No teste de Aprendizado Auditivo Verbal de Rey (Figura 3), lê-se a lista de palavras para o examinando, pausadamente, cinco vezes consecutivas. Após cada uma das vezes em que são apresentadas as 15 palavras, o sujeito deve fazer a evocação do material, sem precisar seguir a mesma ordem de apresentação. https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0021-75572004000300014#fig03 5 8 58 O WRAML (do inglês Wide Range Assessment of Memory and Learning _ Short Form) é um instrumento psicométrico destinado a avaliar a capacidade de aprender e memorizar ativamente vários tipos de informação em pacientes na faixa etária de 5 a 17 anos (memória visual, aprendizado verbal, memória para histórias). Linguagem Um dos testes mais utilizados para a avaliação da linguagem é o Boston Naming Test, que utiliza figuras de objetos para avaliar a capacidade de reconhecimento e nomeação. É empregado em crianças com dificuldades de5 9 59 compreensão ou produção de palavras ou material verbal escrito. Pode ser usado a partir dos 6 anos de idade. Também são utilizados o Teste de Fluência verbal (FAS, do inglês Verbal Fluency), testes de compreensão, como o Teste de Token, compreensão de textos, escrita e leitura. A avaliação inclui, ainda, os seguintes tópicos: órgãos fonoarticulatórios, hábitos orais e desenvolvimento da linguagem. Algumas particularidades precisam ser respeitadas e levadas em conta quando se avalia uma criança com lesão cerebral. Cabe ao profissional ter clareza dos propósitos, conhecimentos, habilidade e adequação das técnicas e instrumentos de investigação a serem utilizados, como também ter conhecimento das possíveis alterações e limitações decorrentes da lesão cerebral, para que não sejam cometidos equívocos ao concluir-se a avaliação neuropsicológica. Em muitas das crianças com lesão cerebral, encontram-se alterados os canais formais de expressão e comunicação com o meio. Sendo assim, o profissional por vezes precisa criar estratégias a fim de que a criança possa se comunicar e, então, interagir e melhor entender o que se passa com ela. Devemos auxiliar a criança a nos mostrar seu potencial e a comunicar-se utilizando recursos que lhe possibilitem compreender o que está sendo solicitado, a representar o que compreende e/ou quer realizar (através de gestos, mímicas, fala, expressão gráfica ou ação). Lobos frontais Nos últimos anos, cresceu muito o interesse pelas funções do lobo frontal. É nessa parte do cérebro que se encontram as maiores diferenças entre os seres humanos e seus antepassados na evolução. Os lobos frontais constituem uma das maiores regiões do encéfalo, com funções ainda pouco conhecidas, embora nos últimos anos tenham se acumulado importantes conhecimentos sobre suas 6 0 60 atividades. Agora se sabe que é no lobo frontal que se situam as habilidades humanas mais complexas, como o planejamento de ações sequenciais, a padronização de comportamentos sociais e motores, parte do comportamento automático emocional e da memória. Para a adequada avaliação das funções "frontais" (funções executivas), é necessário ter conhecimento das etapas evolutivas desta estrutura, isto é, do seu processo de maturação, o que é particularmente importante quando avaliamos uma criança. A avaliação do lobo frontal é, em geral, mais difícil de ser realizada, pois envolve funções mais complexas e pouco conhecidas. Entre as diversas funções dos lobos frontais estão a plasticidade do pensamento, a capacidade de julgamento, a habilidade de produzir ideias diferentes, a organização da informação, a capacidade de dar respostas adequadas aos estímulos, de estabelecer e trocar estratégias e de planejar uma ação. Essas habilidades podem ser avaliadas através do teste de fluência verbal, fluência para desenhos, Wisconsin Card Sort Test (WCST), Trail Making Test e Stroop Test, que avaliam a capacidade de manter a atenção concentrada e de não sofrer interferências de respostas não-exigidas no momento. No teste Trail, a tarefa do sujeito na parte A (Figura 4) é ligar, com o lápis, círculos consecutivamente numerados, distribuídos aleatoriamente em uma folha de papel; na parte B (Figura 5), existem, além dos números, também letras impressas na folha de resposta, e a sequência a ser ligada deve intercalar as duas séries, números e letras (1-A, 2-B, 3-C). A tarefa deve ser realizada o mais rapidamente possível. https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0021-75572004000300014#fig04 https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0021-75572004000300014#fig05 6 1 61 O WCST avalia a função executiva do lobo frontal. Mede a modulação de respostas impulsivas, a direção do comportamento, as habilidades em desenvolver e manter uma estratégia na solução de um problema, apesar das mudanças de contingência, a flexibilidade, o planejamento, a organização, a ineficiência de conceitualização inicial e a dificuldade em encontrar soluções para problemas cotidianos, bem como o nível de perseveração, que vem a ser o problema que muitas pessoas têm de ficar remoendo um mesmo assunto ou repetindo um mesmo comportamento motor. Pode ser aplicado a partir dos 6 anos de idade. Diversos subtestes da Escala de Inteligência Wechsler (WISC III e WPPSI) também auxiliam na investigação de disfunções frontais, tais como analogias, compreensão, códigos, etc. Lobos parieto-occipitais As funções relacionadas às habilidades vísuo-espaciais, organização vísuo-espacial (percepção) e planejamento são avaliados pelo teste de cópia da Figura Complexa de Rey-Osterrieth, enquanto que habilidades percepto-vísuo- espaciais são avaliadas pelo teste de Hooper Visual Organization. As figuras de Rey (Figura 6) objetivam avaliar a atividade perceptiva e a memória, verificando o modo como o sujeito apreende os dados perceptivos que lhe são apresentados https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0021-75572004000300014#fig06 6 2 62 e o que foi conservado espontaneamente pela memória. A testagem é composta de duas etapas: a primeira é a cópia da figura, e a segunda é a recordação da mesma após 30 minutos. A avaliação também pode ser realizada através do subteste Cubos das escalas Wechsler. O Bayley II é um teste destinado à avaliação do desenvolvimento de crianças nas idades de 1 a 42 meses. O teste é dividido em três escalas: motora, mental e de comportamento, com quociente de desempenho para cada área. As três escalas são consideradas complementares, tendo cada uma sua importância na avaliação da criança. A escala mental avalia aspectos relacionados com o desenvolvimento cognitivo e com a capacidade de comunicação (capacidade de discriminar formas, atenção, habilidade motora fina, compreensão de instruções, nomeação, resolução de problemas e habilidades sociais). A escala motora avalia o grau de coordenação corporal (aspectos como sentar, levantar, caminhar, subir e descer escadas) e motricidade fina das mãos e dedos. 6 3 63 A escala comportamental permite avaliar aspectos qualitativos do comportamento da criança durante o teste, tais como atenção, compreensão de orientações, engajamento frente às tarefas, regulação emocional, entre outros. O material do teste é atraente e de fácil utilização. Também existe o Bayley Infant Neurodevelopment Screener _ BINS, que é uma versão simplificada, usada para triagem de desenvolvimento em crianças de 3 a 24 meses, assim como o Denver II. 6 4 64 REFERÊNCIAS Andrade, V. M., Santos, F. H. (2004). Neuropsicologia Hoje. Em, V. M. Andrade, F. H. Dos Santos & O. F. A. Bueno. Neuropsicologia Hoje. São Paulo. Artes Médicas Baron, I. S. (2004). Neuropsychological evaluation of the child. Oxford: Oxford University. Bayley N. Bayley Scales of Infant Development. 2nd ed. San Antonio: Psychological Corporation; 1993. 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Essas informações incluem a capacidade de autocuidado, capacidade de seguir o tratamento proposto, reações às suas próprias limitações, adequação de sua avaliação de bens e dinheiro, dentre outras. Conhecer esses aspectos do 6 6 paciente é fundamental para estruturar o seu ambiente, promovendo alterações, se necessário, de forma que ele tenha condições ótimas de reabilitar-se e evitando possíveis problemas secundários, como atribuição exagerada de responsabilidade ou de atividades que não estejam ao seu alcance (Mäder, 1996). Sendo assim, é fundamental que a avaliação considere, não somente as áreas deficitárias, como também as habilidades preservadas que são potenciais para reabilitação (Capovilla, 2007). Nota-se que a avaliação das forças e fraquezas do indivíduo remete a um modelo avaliação neuropsicológica que transcende o objetivo primário de apenas detectar, localizar e caracterizar uma disfunção. De acordo com Lezak (1995), a avaliação neuropsicológica envolve o estudo de aspectos quantitativos (os testes normatizados permitem obter desempenhos relativamente precisos) e aspectos qualitativos, que incluem entrevistas, questionários, entre outros. Embora os resultados quantitativos dos testes neuropsicológicos reflitam a maturidade conceitual e o nível cognitivo, muitas variáveis interferem no desempenho dos indivíduos. Ou seja, os escores dos testes, isoladamente, fornecem apenas informações limitadas sobre o funcionamento mental do indivíduo. Desta forma, é fundamental a análise dos aspectos qualitativos durante a interpretação dos testes. Mais importante do que saber que o paciente falhou ao realizar um teste, deve-se investigar quais os motivos da sua falha, ressalta Lezak (1995). A verificação concomitante do modo como ele soluciona problemas também pode fornecer boas informações sobre o funcionamento cognitivo do paciente. O olhar minuncioso do profissional sobre a realização do teste oferece dados como a estratégia utilizada, a maneira e a orientação de como um traço é dado (da direita para esquerda ou da esquerda para direita ou uso excessivo de borracha) e os tipos de erros cometidos (Cho, Ryali, Geary & Menon, 2011; Woods, Herron, Yund, Hink, Kishiyama & Reed, 2011). 7 7 A avaliação neuropsicológica sendo um exame intensivo do comportamento, deve valorizar, não só as capacidades intelectuais em termos de desempenho individual, mas também os aspectos emocionais, funcionais e relacionais dos indivíduos (Marcelli, 1998). Em muitas situações, as observações da conduta do paciente fora da situação de teste e o emprego de entrevistas estruturadas ou semiestruturadas podem oferecer dados muito valiosos. Da mesma forma, o neuropsicólogo pode lançar mão de informações relatadas pelos responsáveis, cônjuges, cuidadores, bem como outros profissionais que também estejam acompanhando o indivíduo (Tharinger, Finn, Hersh, Wilkinson, Christopher & Tran, 2008). É importante salientar que os instrumentos de avaliação, em especial os testes, informam o desempenho do sujeito somente no exato momento da sua aplicação (Cronbach, 1996). Diante disso, o neuropsicólogo deve considerar que, se a avaliação envolve etapas variadas e é realizada em diferentes momentos, é imprescindível atentar para as mudanças qualitativas do indivíduo, tais como o uso de fármacos, a realização de tratamento psicológico e/ou fonoaudiológico e qualquer tipo de acontecimento desestruturante durante a semana vigente. Além dos instrumentos a serem utilizados, o setting de atendimento precisa de cuidados especiais. Jurado e Pueyo (2012), por exemplo, apontam que grande parte dos pacientes com danos cerebrais necessitam de salas contendo poucos distratores, um clima não ameaçador e procedimentos que minimizem a fadiga. Igualmente, o neuropsicólogo pode alternar a aplicação com testes verbais e não verbais, evitando uma sequência de testes desagradáveis ou com alto grau de dificuldade. A influência dos aspectos sócio-afetivos e comportamentais durante o processo de avaliação foi apontado por Thompson, Stopford, Snowden e Neary (2005). Em seu artigo, os autores destacam a desinibição, rigidez mental e 8 8 inflexibilidade, pensamento concreto, distratibilidade e comportamento perseverativo como alguns aspectos que afetam o desempenho nos testes e em vários domínios cognitivos na demência frontotemporal, por exemplo. Ainda, as observações comportamentais ao longo dos encontros podem fornecer dados relevantes para o neuropsicólogo. Lapsos ou pedido de repetição das instruções, nervosismo ou agitação psicomotora, desmotivação e falta de persistência na resolução das tarefas, apatia e falta de iniciativa, baixa frustração à tolerância, agressividade são atitudes que devem ser analisadas, pois podem fornecer informações mais ecológicas das alterações cognitivas e comportamentais do paciente (Salmon & Bondi, 2009; Spooner & Pachana, 2006). Assim, o acompanhamento dessas mudanças colabora na identificação de questões referentes aos aspectos positivos e negativos da evolução do problema e serve como referência para o planejamento da reabilitação neuropsicológica, se for o caso. Embora, atualmente, inúmeros estudos apontem as contribuições dos testes neuropsicológicos na investigação do funcionamento cognitivo e mental, parece haver uma carência de investigações sobre a análise qualitativa da avaliação neuropsicológica. O exame neuropsicológico 9 9 O exame neuropsicológico tem-se tornado cada vez mais popular na prática clínica e demandado por profissionais de áreas como saúde e educação. Um dos riscos dessa popularização é a proliferação de avaliações que não se fundamentam em preceitos básicos da neuropsicologia e não levam em consideração cuidados necessários para que se chegue a conclusões e orientações clínicas. A avaliação neuropsicológica difere das demais avaliações clínicas por ser fundamentada em um raciocínio monista e materialista. Mesmo não sendo mais papel do neuropsicólgo localizar centros lesionais ou detectar organicidade, o raciocínio clínico em neuropsicologia envolve considerações sobre as funções examinadas e os sistemas neurais subjacentes. O exame neuropsicológico é um dos mais importantes exames complementares na prática clínica do profissional que lida com comportamento e cognição. Seus resultados devem ser considerados à luz de outras informações clínicas para potencializar não apenas questões de diagnóstico, mas para fundamentar rotinas de intervenção eficientes. O exame neuropsicológico é um procedimento de investigação clínica cujo objetivo é esclarecer questões sobre os funcionamentos cognitivo, comportamental e – em menor grau – emocional de um paciente. Diferentemente 1 0 10 de outras modalidades de avaliação cognitiva, o exame neuropsicológico parte necessariamente de um pressuposto monista materialista segundo o qual todo comportamento, processo cognitivo ou reação emocional tem como base a atividade de sistemas neurais específicos. De acordo com Baron (2004), a especialidade da neuropsicologia inclui profissionais que apresentam background teórico e de formações diversas. Essa diversidade teórico-conceitual é uma das forças da neuropsicologia e impulsiona não apenas a produção de conhecimento como também a eficiência de suas aplicações. A despeito da existência de diferentes concepções sobre a prática clínica da neuropsicologia, Lamberty (2005) propõe que o principal objetivode um neuropsicólgo clínico é sempre o mesmo: compreender como determinada condição patológica afeta o comportamento observável do paciente (entendido aqui como cognição, comportamento propriamente dito e emoção). De acordo com Benton (1994), o exame neuropsicológico permite traçar inferências sobre a estrutura e a função do sistema nervoso a partir da avaliação do comportamento do paciente em uma situação bem controlada de estímulo- resposta. Nela, tarefas cuidadosamente desenvolvidas para acessar diferentes domínios cognitivos são usadas para eliciar comportamentos de um paciente. Tais respostas são, então, interpretadas como normais ou patológicas pelo expert. Este, por sua vez, usará não apenas a interpretação de parâmetros quantitativos (comparação com parâmetros populacionais de desempenho), mas, principalmente, a análise dos fenômenos observados e sua relação com a queixa principal, a história clínica, a evolução de sintomas, os modelos neuropsicológicos sobre o funcionamento mental e o conhecimento de psicopatologia. 1 1 11 Embora os neuropsicólogos usem com grande frequência os testes cognitivos, estes são apenas um dos quatro pilares da avaliação neuropsicológica. Os demais são a entrevista, a observação comportamental e as escalas de avaliação de sintomas. Os testes geralmente são supervalorizados em diversos programas de formação em neuropsicologia e por profissionais em início de formação. Há também um apelo cartorial que clama pela reserva de mercado da neuropsicologia para psicólogos. Um dos pontos centrais desse argumento é a retificação de testes psicológicos como a pedra filosofal da neuropsicologia. A formação bem-sucedida de um neuropsicólogo certamente o levará a dar a devida dimensão aos testes cognitivos, encarando-os como meio, jamais como fim. Obviamente, os testes são indispensáveis na prática do neuropsicólogo, porém devem ser corretamente escolhidos de acordo com hipóteses aventadas na entrevista e coerentes com a observação comportamental. O conhecimento sobre a validade de construto, a validade de critério e a validade ecológica, bem como sobre parâmetros normativos e fidedignidade, é algo necessário na prática clínica do neuropsicólogo. Além disso, as informações geradas por testes são geralmente potencializadas pelas que são coletadas a partir do uso de escalas de avaliação de sintomas. Mas, novamente, eles sempre serão um meio de investigação, e jamais um fim em si mesmos. Mattos (2014) define o exame neuropsicológico como um exame clínico armado. Como qualquer exame clínico, compreende anamnese abrangente e observação clínica do paciente. Seu diferencial está na seleção das “armas” (geralmente, testes e escalas) que poderão auxiliar na investigação de hipóteses específicas e no esclarecimento de déficits sutis. De modo geral, o exame é realizado com baterias de testes neuropsicológicos que envolvem uma variedade de funções, tais como memória, atenção, velocidade de 1 2 12 processamento, raciocínio, julgamento, funções da linguagem e funções espaciais (Harvey, 2012). Para avaliação dessas funções, boas armas são aquelas capazes de reproduzir, no contexto do consultório, em situação controlada, vários dos processos presentes na rotina natural de quem está sendo avaliado. A análise fenomenológica e psicométrica do que se observa nessa etapa da avaliação ajuda a inferir não apenas sobre a funcionalidade do paciente em seu dia a dia como também sobre a integridade ou os danos em diferentes sistemas neurais, bem como sobre a presença de neuropatologias. Avaliação Quantitativa A psicometria (do grego psyche = alma e metrein = medir) é a ciência que pretende a tradução dos fenômenos psíquicos em números, através da 1 3 13 quantificação. Em outras palavras, a psicometria pode ser entendia como a medição das funções psíquicas através de testes normalizados destinados a estabelecer uma base quantificável das diferenças entre indivíduos. A testagem psicométrica resume o desempenho em números, neste caso, os números são uma forma de expressar os acontecimentos da mente humana. Diante disso, o estilo psicométrico é marcado pela qualidade definida da tarefa, objetividade dos registros, rigor na avaliação e nos dados combinantes, e ênfase na validação. A abordagem psicométrica surgiu a partir de discussões amplas acerca da inteligência e de sua medição. Datam do século XIX os primeiros trabalhos envolvendo a mensuração de comportamentos humanos, o interesse pela inteligência e pela testagem intelectual. Segundo Mäder (1996), nessa época os ingleses preocupavam-se com a análise estatística, os franceses com a experimentação clínica, os alemães focavam mais os estudos das psicopatologias e funções cognitivas mais complexas, e os americanos procuravam desenvolver escalas e métodos estatísticos para trabalhar com os dados. Em 1890, o americano James MacKeen Cattell (1860-1944) publicou um artigo onde, pela primeira vez, apareceu o termo teste mental, e descreveu 50 diferentes medidas, tais como: pressão dinamômetro, velocidade de movimentos dos braços, discriminação entre dois pontos, menor diferença perceptível entre dois pesos, tempo de reação para o som, tempo para denominar cores, números e letras lembradas após uma única exposição oral (Mäder, 1996). Em 1905, Alfred Binet propôs uma escala numérica precursora de todos os testes de avaliação posteriores. Essa escala, depois conhecida pelo nome de teste de Binet-Simon, introduziu: (1) a possibilidade de situar as crianças patológicas em uma hierarquia “cifrada” do déficit mental; e (2) a possibilidade de rastrear desde o começo da escolaridade certas deficiências intelectuais que, até a entrada para a escola, tinham passado despercebidas. Segundo Mäder (1996), esta foi a primeira escala que se preocupou com a idade mental e desenvolvimento 1 4 14 cognitivo em relação à idade, compondo-se de testes com graduação de dificuldades. Em 1936, David Wechsler publicou a Wechsler Bellevue Scale, marcando o início de uma série de baterias de avaliação de inteligência (Mäder, 1996). A partir disso, diversos testes foram elaborados com uma dupla preocupação: para uns, na mesma perspectiva de Binet-Simon, tratava-se de aperfeiçoar a avaliação, seja por faixa de idade, seja por aptidão especial; para outros, tratava- se de abordar a natureza dos processos intelectuais. Um teste pode ser definido como um procedimento sistemático para observar o comportamento e descrevê-lo com a ajuda de escalas numéricas ou categorias fixas. Os examinadores psicométricos confiam nas interpretações feitas através de uma regra derivada estatisticamente de grupos anteriores; eles desconfiam de interpretações mais subjetivas, individualizadas. Assim, para conduzir de modo apropriado a avaliação neuropsicológica e, especialmente, a avaliação estandardizada normativa, é necessário dispor de instrumentos precisos, válidos e normatizados para uma determinada população. Os testes têm como objetivo principal examinar as habilidades cognitivas em uma escala, que podem alternar desde os desempenhos decididamente superiores à média, até os gravemente comprometidos. É importante ressaltar que este trabalho não fará distinção entre os termos psicológicos e neuropsicológicos ao tratar-se de testes, visto que praticamente não existem testes neuropsicológicos, apenas o método de elaborar inferências sobre os testes é neuropsicológico. Isto significa que mais importante que avaliar é como avaliar (Mäder, 1996), ou seja, o profissional interpreta os resultados dos testes de acordo com sua formação. Por exemplo, um psicólogo que não possui conhecimentos de neuropsicologia nãoserá capaz de relacionar as funções psicológicas avaliadas com as teorias do funcionamento cerebral. 1 5 15 Segundo Capovilla (2007), para o estudo neuropsicológico podem ser usados procedimentos de comparação estandardizada ou não. Nos procedimentos estandardizados, a avaliação do distúrbio é feita em relação a um padrão que pode ser normativo (ou seja, derivado de uma população apropriada) ou individual (derivado da história prévia do paciente e de suas características). A avaliação neuropsicológica estandardizada tem sido grandemente influenciada pela psicometria. Uma abordagem psicométrica é mais proveitosa quando uma pergunta bem definida deve ser respondida, e quando o intérprete tem experiência suficiente para traduzir a mensuração numa estimativa do provável resultado de cada curso de ação disponível. É importante ressaltar que os passos no desenvolvimento de um instrumento de avaliação neuropsicológica devem seguir os critérios para desenvolvimento de instrumentos de avaliação psicológica em geral, envolvendo a definição do construto psicológico a ser examinado e a operacionalização desse construto, de forma a possibilitar a sua mensuração experimental e/ou psicométrica, e a verificação das características psicométricas do instrumento de avaliação neuropsicológica, que poderá envolver a análise dos itens, análise da precisão e da validade do instrumento. De uma forma geral, os instrumentos de medida em psicologia testam indícios de comportamento, o que deixa uma margem ampla quanto à sua confiabilidade. Para minimizá-la, é preciso que o instrumento seja fidedigno e válido. Diante disso, os profissionais que fazem uso de testes devem estar atentos a quatro parâmetros: validade, precisão ou fidedignidade, padronização e normatização. A validade pode ser compreendida como o grau com que as interpretações feitas a partir dos escores de um teste são sustentadas por evidências empíricas ou teóricas. Assim, um teste psicológico pode ser válido em circunstâncias específicas de uso, para as quais os dados teóricos ou empíricos encontraram sustentação para a interpretação dos seus resultados. Em outras palavras, um teste é válido quando mede o que se propõe a medir. 1 6 16 A fidedignidade ou precisão dos testes refere-se ao grau com que os resultados de um teste se mostram consistentes, quando medido em situações diferentes; sendo assim, quanto maior a correlação entre os escores dos dois momentos diferentes, maior será a precisão do teste. Já a padronização de um teste refere-se à uniformidade de procedimentos utilizados em sua aplicação. Quando as condições de aplicação não são asseguradas, mesmo um teste de boa qualidade pode tornar-se inválido, não como medida psicométrica, mas na proporção em que os dados obtidos sobre o sujeito não sejam confiáveis. Por fim, a normatização refere-se à uniformidade na interpretação dos resultados dos testes, ou seja, ao desenvolvimento de critérios ou parâmetros para a interpretação dos escores obtidos nos testes. A normatização permitirá situar o testando, levando-se em conta um padrão ou norma, atribuindo sentido aos escores obtidos no teste. Um teste é considerado padronizado quando as palavras e os atos do examinador, o aparelho e as regras de avaliação foram fixados, de modo que os resultados coletados em momentos e lugares diferentes sejam inteiramente comparáveis. Em outras palavras, os testes são padronizados quando eles são apresentados da mesma maneira para muitas pessoas, em muitos lugares. A padronização de testes, inventários e escalas possibilita o desenvolvimento de normas nacionais, deixando mais apropriada a interpretação dos escores resultantes em um determinado instrumento, na medida em que uniformiza o processo de aplicação, avaliação e interpretação. E, assim, permitindo que sejam aplicados e avaliados de forma idêntica por qualquer aplicador, o que diminui as variâncias de erro e amplia as possibilidades de pesquisas cientificas diante da possibilidade da reprodução de resultados. Para Lezak (1983), um instrumento eficiente deve ter idoneidade na adequação das necessidades do indivíduo ou propósito; praticabilidade, compondo-se de instrumental mínimo necessário adaptável e breve; utilidade, 1 7 17 cujos dados deverão ser importantes na análise para conferir um diagnóstico, plano de intervenção ou linha de base num determinado momento evolutivo de uma lesão/disfunção; previsibilidade, para possibilitar a identificação de dados patológicos. De acordo com Tabaquim (2003), quanto maior a capacidade de predição, melhor a qualidade do teste. Além disso, para maior fidedignidade das conclusões neuropsicológicas, Costa et. al. (2004) sugere a utilização de mais de um teste ao avaliar cada função cognitiva. Segundo Capovilla (2007), os testes neuropsicológicos podem ser agrupados em baterias fixas ou flexíveis. As baterias fixas são aplicáveis em pesquisas, em protocolos específicos para investigação de uma população particular. Já as baterias flexíveis são mais apropriadas para a investigação clínica, pois estão mais voltadas para as dificuldades específicas do paciente (Mäder, 1996). Na medida em que a avaliação neuropsicológica se processa com testes quantificáveis específicos e que investigam amplamente o funcionamento cognitivo, ela permite estabelecer se há distúrbio ou déficit, se eles têm relação com a doença presente e se é sugestiva de uma desordem não diagnosticada no presente. Ela estabelece que funções, áreas ou sistemas cerebrais podem estar envolvidos e quais hipóteses diagnósticas podem ser feitas a partir do exame. Como vimos, Mäder (1996) propõe como protocolo básico, para avaliação neuropsicológica clínica, uma composição de testes de orientação, atenção, percepção, inteligência geral, raciocínio, memória verbal, visual, de curto e longo prazo, flexibilidade mental, linguagem e organização visuoespacial. O protocolo básico deve permitir ao examinador um panorama geral do funcionamento cognitivo do paciente, para posteriormente aprofundar sua avaliação com testes complementares. O resultado final deve fornecer um perfil neuropsicológico do paciente que, combinado a avaliação dos aspectos neurológicos, psicológicos e sociais, permitirá a orientação do paciente ou da família sobre o melhor aproveitamento de suas potencialidades. Mäder (1996) entende por “perfil”, 1 8 18 quando os resultados dos testes são computados lado a lado em escalas comparáveis. São diversos os instrumentos à disposição da comunidade internacional. Lezak (1983) aponta como recursos, na última edição de seu livro, 435 técnicas e/ou instrumentos destinados à avaliação neuropsicológica. No entanto, de nem sempre os instrumentos usados são normatizados, ou adaptados para a população brasileira. A maioria dos instrumentos então disponíveis são adaptações de outras culturas (Mäder, 1996) e a correta interpretação exige o exercício de raciocínio clínico do avaliador. Nesse sentido, vale ressaltar que alguns testes de inteligência para adultos são normatizados para uma população com cerca de oito anos de escolaridade (Mäder, 1996). No entanto, a média de anos de estudo das pessoas de 10 anos ou mais de idade, no Brasil, segundo dados do IBGE (2007), é de sete anos de escolaridade. Sendo assim, o desempenho inferior nesses testes, para uma amostragem brasileira, poderia ser interpretado como rebaixamento intelectual, efeito da diferença de escolaridade ou ainda como interação entre ambos os fatores. A elaboração de um material próprio para a nossa realidade pode ser bastante útil para a compreensão dos problemas específicos da população brasileira. Embora as pesquisas em neuropsicologiatenham crescido e resultado em trabalhos valiosos, no Brasil, pesquisadores e clínicos que trabalham com avaliação neuropsicológica ainda se deparam com um problema bastante grave: a escassez de instrumentos precisos, validados e normatizados, disponíveis para pesquisa e diagnóstico (Capovilla, 2007). Portanto, o profissional deve estar atento às particularidades de cada teste, sua sensibilidade e especificidade, além de considerar os aspectos culturais e limitações do método utilizado (Mäder, 1996). No que se refere a essas dificuldades encontradas na prática, Cunha (1993) afirma que, quando o objetivo é o diagnóstico na clínica, é mais adequado utilizar técnicas bem respaldadas na literatura, mesmo que estrangeira, até que estejam disponíveis padronizações mais apropriadas. 1 9 19 Para Lezak (1983), a necessidade de planejamento na avaliação neuropsicológica é fundamental, na medida em que é de importância indiscutível a relação que deve existir entre os instrumentos utilizados e as hipóteses levantadas a partir do diagnóstico geral, feito no início do processo. Contudo, cabe ao avaliador não se fechar em uma única bateria, pois, de acordo com as evidências surgidas no processo de avaliação, ele poderá incluir novos critérios de análise. Uma bateria que esteja voltada para a avaliação de indivíduos com lesões ou distúrbios neuropsicológicos deve apresentar as seguintes características, de acordo com Lezak (1983): fundamento teórico sólido; possibilidades de exploração das funções básicas; possível aplicação sem intermediações do avaliador ou pessoas próximas ao paciente; critérios de avaliação mais objetivos e capazes de possibilitar quantificação dos dados; recursos mínimos, essenciais à aplicação. Embora seja simples obter dados teóricos sobre como elaborar uma bateria neuropsicológica e até mesmo como utilizar um teste específico, nas mãos de pessoas com treinamento inadequado os testes podem causar danos, como, por exemplo, classificar crianças em uma categoria de deficiência cognitiva à qual elas não pertencem. Usuários sem treinamento podem administrar erradamente um teste. Eles podem confiar demais em medidas inexatas e podem entender mal o que o teste está medindo, chegando a conclusões errôneas. Sendo assim, os profissionais devem limitar-se aos testes que são capazes de manejar adequadamente e que são reconhecidamente relevantes para seus propósitos. Nesse sentido, Cronbach (1996) afirma que os usuários de testes devem: 1) Primeiro, definir o propósito da testagem e a população a ser testada. Depois, selecionar um teste para esse propósito e essa população, baseados num cuidadoso exame das informações disponíveis. 2 0 20 2) Investigar fontes de informação potencialmente úteis, além dos resultados de teste, e corroborar as informações fornecidas pelos testes. 3) Ler os materiais fornecidos pelos criadores de testes e evitar usar testes sobre os quais existam apenas informações confusas ou incompletas. 4) Ficar a par de como e quando o teste foi desenvolvido e experimentado. 5) Ler avaliações independentes de um teste e de possíveis medidas alternativas. Procurar as evidências necessárias para confirmar as afirmações dos criadores do teste. 6) Examinar um conjunto de amostra, testes divulgados ou amostras de questões, orientações, folhas de resposta, manuais e os relatórios de resultados, antes de selecionar um teste. 7) Determinar se o conteúdo do teste e o(s) grupo(s) de comparação são adequados para os examinandos. 8) Selecionar e utilizar apenas aqueles testes para os quais estejam disponíveis as habilidades para aplicar e interpretar corretamente os resultados. Diante de tantas recomendações, não é difícil utilizar um teste de forma errônea. De acordo com Marcelli (1998), os principais usos errôneos dos testes incluem a escolha inadequada de testes, aplicação falha, interpretações insensíveis às limitações dos resultados e má comunicação dos achados do teste. Sendo assim, Marcelli (1998) cita cinco princípios do uso efetivo dos testes, nos quais os profissionais devem: 1) manter a segurança dos materiais de testagem antes e depois da testagem; 2) evitar rotular o indivíduo com base num único resultado de teste; 3) aderir estritamente à lei de direitos autorais e, em nenhuma circunstância, tirar cópias ou reproduzir de alguma maneira os formulários de resposta, os livros ou manuais de teste; 4) administrar e avaliar os testes, exatamente como especificado no manual; e 5) liberar os resultados 2 1 21 somente para pessoas autorizadas e de acordo com os princípios de interpretação de testes. Como vimos até agora, a testagem resume o desempenho dos avaliados em números e seu ideal. Nesse sentido, a mensuração torna-se essencial e, a partir dela, os testes podem dar mais fidedignidade a vários tipos de avaliação (Cronbach, 1996). Em outras palavras, os testes proporcionam uma base mais objetiva e confiável para avaliar hipóteses (Cronbach, 1996). Porém medir significa atribuir valores a características ou atributos de um objeto segundo regras que assegurem a validade e a confiabilidade dos resultados da medida. Sendo assim, a testagem psicométrica busca reduzir a mensuração a um procedimento técnico (Cronbach, 1996). Independente do instrumento utilizado na obtenção dos dados para a posterior avaliação, o tratamento dos dados ocorre sempre através da quantificação, com representação numérica ou estatística. Por outro lado, para que a quantificação seja possível, a testagem psicométrica parece preocupar-se mais com o produto do que com o processo (Cronbach, 1996). O produto é claramente observável – a resposta dada, a torre de cubos construída, ou a redação escrita (Cronbach, 1996). Já o processo é investigar as origens de um padrão de resposta, ou seja, buscar as circunstâncias atuais que desencadeiam a resposta de um indivíduo. Ainda que a testagem tenha deixado de lado a avaliação do processo, a avaliação do produto também não é tão simples quanto parece. O que é claramente observável e comum a todas as pessoas são os comportamentos humanos; e estes, de acordo com Campos (2008), são amplos e variados, sendo muitas vezes tecnicamente inviável ou até mesmo impossível a avaliação de todas as possibilidades de comportamento. Quanto ao problema da avaliação do comportamento, Miranda (2006) também faz uma crítica muito apropriada, ao relatar que a análise quantitativa consiste na obtenção de escores que não são 2 2 22 observações diretas do comportamento, mas sim um sumário do comportamento observado. Outro ponto importante a ser discutido é que, como já mencionado, os testes, ou até mesmo a avaliação fornecem dados do indivíduo em um determinado momento, no entanto, algumas características do sujeito são razoavelmente constantes ao longo do tempo, enquanto que outras são extremamente instáveis (Campos, 2008). O humor, por exemplo, dificilmente será estável ao longo de dias, ou até mesmo entre uma hora e outra. Dessa forma, torna-se difícil, talvez impossível, traduzir a qualidade do humor em quantidade. Além disso, mesmo que os dados fornecidos pelos testes sejam vinculados a uma questão momentânea, não valeria a pena obter essa informação, se não pudéssemos predizer alguma coisa sobre um desempenho posterior. Sobre isso, Cronbach (1996) levanta a seguinte questão que, aqui, vale como reflexão: Com que intensidade o desempenho anterior de alguém deve determinar suas perspectivas futuras? Conforme vimos, embora a abordagem psicométrica seja fundamental, existem questões que não se enquadram no critério de quantidade e, por isso, exigem um tratamento diferenciado para obtenção de dados sobre o sujeito.Em razão disto, da alta complexidade das funções cognitivas – já descritas no tópico anterior – e do fato de que o psicólogo que avalia com base na neuropsicologia cognitiva não poder ater-se somente ao que está quantificado, é que a abordagem qualitativa torna-se essencial. O que é a avaliação qualitativa e a necessidade de realizá-la serão discutidos adiante. Avaliação Qualitativa 2 3 23 Ferreira (1975) define “qualidade” como propriedade, atributo ou condição das coisas ou das pessoas capaz de distingui-las das outras e de lhes determinar a natureza. Sendo assim, a qualidade é algo que permite reconhecer diferenças e, portanto, tem a capacidade de determinar a natureza daquilo que está sendo qualificado. Em se tratando da avaliação neuropsicológica, a qualidade está relacionada aos vários aspectos do ser humano, em especial sua peculiaridade como sujeito. Eis o que a quantificação negligencia, ao tentar quantificar o indivíduo. De acordo com Cronbach (1996), a “avaliação” é um processo mais amplo do que a “testagem”, quando significa integrar e valorar informações. Segundo o autor, o termo “avaliação” sugere apropriadamente uma combinação de informações com julgamentos de valor que vão muito além da testagem. De modo muito mais sofisticado do que havia proposto a psicologia cognitiva, a avaliação realizada nos moldes da teoria de Luria (1981) privilegiou a influência dos fatores socioculturais sobre o desempenho e análise dos erros. Dessa maneira, favoreceu o estudo e a compreensão dos mecanismos e estratégias envolvidos nas execuções da resposta (Santos e Andrade, 2004). Uma avaliação neuropsicológica pode ser resumida como uma estratégia investigativa destinada a identificar, obter e proporcionar, de maneira válida e confiável, dados e informações suficientes e relevantes sobre o funcionamento do sujeito. Conforme já citado, o protocolo básico de qualquer avaliação neuropsicológica consiste na utilização de testes específicos, porém estes, isoladamente, não abrangem todos os aspectos da cognição e do comportamento do sujeito. Em outras palavras, um resultado de testes, por si mesmo, quase nunca deve determinar o que será feito por uma pessoa ou para ela (Cronbach, 1996), pois as condições do trabalho clínico não permitem a aplicação controlada de muitos métodos experimentais. E, lidando com pacientes, nunca devemos esquecer que o que está em jogo é a individualidade, e não uma abstração estatística que, em sua média, comprova uma teoria (Luria, 2 4 24 1992). Sendo assim, tendo em vista que uma boa avaliação deve reduzir incertezas, é fundamental que o profissional em questão faça uma integração entre a psicometria e o sujeito. Considerada como método de investigação das relações entre as funções psicológicas e a atividade cerebral (Dalgalarondo, 2008), a avaliação neuropsicológica diferencia-se dos demais tipos de avaliação por não ser uma simples descrição de distúrbios e sim uma interpretação dos mesmos dentro de um contexto que colabora na explicação dos mecanismos subjacentes ao comportamento (Capovilla, 1998). Por exemplo, em certas ocasiões, precisa-se de uma avaliação que indique ou apoie um diagnóstico. Porém, em outras, necessita- se saber se está havendo piora ou melhora no quadro do sujeito e até na sua própria qualidade de vida. Nesse sentido, os resultados – qualitativos – expressam as forças e fraquezas do indivíduo, podendo expressar também os seus principais ganhos e potencialidades. No entanto, conforme já mencionado neste trabalho, a avaliação e interpretação do comportamento humano não é simples, uma vez que este é consequência de três grandes sistemas (Lezak, 1995) que, por serem funcionais, são interdependentes, na medida em que, mesmo exercendo funções separadamente, elas se encontram ligadas como conceitos que geram o comportamento individual. O primeiro desses sistemas engloba as funções cognitivas, que, como já vimos, são responsáveis pelo processamento das informações. Sendo que tal funcionamento faz com que o sistema se divida em quatro classes, que são nomeadas com base nas operações computacionais – input, estocagem, processamento e output – correspondentes, por sua vez, às funções de recepção, memória, pensamento e às chamadas funções expressivas. Também estão envolvidas nessa categoria as variáveis de atividade mental, como, por exemplo, nível de alerta, atenção, taxa de atividade ou velocidade. 2 5 25 O segundo sistema estudado por Lezak (1995) refere-se aos aspectos emocionais que incluem as variáveis de personalidade e emoção. Este é o campo sistêmico do comportamento humano decorrente de arranjos que se apresentam de forma complexa, visto que esse aspecto está diretamente envolvido com demandas sociais, ou seja, com um conjunto de ações e reações provenientes do ambiente social. Em se tratando de aspectos emocionais, Marcelli (1998) afirma que a experiência clínica mostra o quanto é artificial separar o que se chama de estado afetivo e as funções cognitivas, pois perturbações em um desses domínios acabam habitualmente por repercutir no outro. Assim, graves perturbações afetivas são acompanhadas, com o tempo, de distúrbios cognitivos. Neste ponto, não há como desconsiderar o estado emocional do sujeito, no momento da avaliação. Ainda de acordo com Marcelli (1998), quanto mais profunda a deficiência intelectual, mais grave será a dificuldade afetiva. O terceiro sistema funcional que completa a concepção comportamental de Lezak (1995) compreende as funções executivas ligadas às ações individuais independentes, cujo propósito vem da decisão do agente e se traduz como ação auto-regulada. Pessoas indecisas, que apresentam dificuldades de iniciar atividades e conduzi-las dentro de uma sequência lógica, ou que apresentam dificuldade de planejamento ao estabelecer um objetivo, por mais simples que seja, revelam dificuldades nesse sistema funcional. Apesar de os três aspectos serem partes integrantes de todo comportamento, eles podem ser conceitualizados e tratados separadamente. Na neuropsicologia, as funções cognitivas têm recebido mais atenção que as demais (Capovilla, 2007). Porém, raramente uma lesão cerebral afeta apenas um sistema. Ao contrário, a maior parte das lesões afeta os três sistemas, apesar de os distúrbios cognitivos tenderem a ser os mais proeminentes em termos de sintomatologia (Lezak, 1995). Por isso, é extremamente necessário avaliar os sintomas com base nos três processos e na interação que estabelecem entre si. 2 6 26 A avaliação neuropsicológica normalmente se estrutura em uma série de testes e subtestes. E, conforme vimos no tópico anterior, existe uma preocupação permanente com: objetividade, precisão, validade e interpretação dos dados. Essa preocupação ocorre em razão das questões de ordem emocional que afetam a avaliação, e que podem alterar os resultados. Essa constatação também aponta para a questão central do presente estudo, ou seja, que a análise qualitativa na avaliação neuropsicológica envolve categorias que a quantificação não engloba e nem dá conta. Sendo assim, durante a avaliação neuropsicológica e ao analisar os resultados, o profissional deve se respaldar numa teoria psicológica que ofereça recursos para lidar com fatores emocionais e ambientais que afetam o comportamento. Tais fatores devem ser constantemente ponderados diante da necessidade de uma atividade avaliativa, sob pena de reduzir o processo a uma ótica limitada, apresentando apenas os resultados dos testes. Cronbach (1996) afirma que os métodos de coleta de informações devem variar de um extremo psicométrico a um extremo impressionista. Os impressionistas consideramo observador, no caso o psicólogo, como um instrumento sensível e inclusive indispensável (Cronbach, 1996). Conforme já mencionado, a avaliação neuropsicológica não é apenas a aplicação de testes e sim a interpretação cuidadosa dos resultados somada à análise da situação atual do sujeito e ao contexto em que vive (Mäder, 1996). A complexidade intrínseca às funções cerebrais, à investigação e ao diagnóstico das disfunções mentais requer um enfoque integrado de avaliação, que implica o somatório de todos os dados do indivíduo, desde a história clínica e as observações de conduta, até dados levantados pelos testes padronizados, incluindo os dados neurológicos ou médicos gerais. Um estilo impressionista de avaliação busca a descrição individualizada. O psicólogo tenta ser um observador sensível que percebe as deixas através de todos os meios possíveis e cria uma interpretação integrada. Para este 2 7 27 examinador, até um teste focalizado é uma oportunidade de estudar a pessoa como um todo. O impressionista não se satisfaz com uma estimativa numérica do nível de capacidade (Cronbach, 1996). Ele quer saber como a pessoa expressa sua capacidade, que tipos de erros comete e por que. Enquanto o examinador psicométrico prefere um método uniforme, impessoal, o impressionista prefere a flexibilidade (Cronbach, 1996). Para tanto, paralelamente ao registro quantitativo das respostas, o neuropsicólogo deve fazer registros qualitativos da responsividade do paciente, reconhecimento de seus próprios erros, respostas emocionais e características de execução das tarefas (Capovilla, 2007). O impressionista observa aquilo que a pessoa considera importante relatar e também seu tom emocional (Cronbach, 1996). Dessa forma, ele permanece atento às reações do indivíduo, ao fazer seu relato. Ele prefere procurar o que é significativo no comportamento e no discurso do sujeito, conforme o observa trabalhando. Quanto ao discurso, cabe aqui empregar o conceito de Chomsky de estrutura profunda, onde o profissional busca os significados implícitos nas sentenças do indivíduo. Portanto, listar variáveis antecipadamente é uma restrição inaceitável para o psicólogo impressionista. A resposta livre fornece informações não sistemáticas, mas abrange questões que a lista de verificação ignora (Cronbach, 1996). Sendo assim, esta forma de avaliar pode ser relacionada como um importante aspecto nos processos de avaliação psicológica, sobretudo, porque foge das medidas dos testes psicométricos. Pode-se dizer, então, que o estilo impressionista considera uma descrição individual que passa a fazer parte da avaliação integrada. Além da importância de se levar em conta o estilo impressionista, o psicólogo deve ter cuidado com as inúmeras variáveis que influenciam o desempenho dos indivíduos avaliados. Quanto à avaliação das funções mentais, é importante ressaltar que a organização cerebral está muito além das simplificações e abstrações decorrentes na análise dos instrumentos 2 8 28 empregados, pois raramente um teste ou subteste é específico de uma função mental independente. Por exemplo, ao estudar a denominação de objetos representados em imagens, explora-se também a atenção seletiva, percepção e agnosia visual, recursos lexicais, memória de trabalho, etc. Outro exemplo são os processos de memória, que dependem de processos de percepção (Sternberg, 2008). O que lembramos depende em parte do que percebemos. Dessa forma, os processos de pensamento dependem em parte dos processos de memória, uma vez que não se pode refletir sobre aquilo que não é lembrado. Sternberg (2008) ainda ressalta que não são só os processos cognitivos que se relacionam entre si. Os processos não cognitivos, como a motivação, por exemplo, também interagem com os cognitivos. Essa é a razão pela qual aprendemos melhor quando estamos motivados para aprender. Em contrapartida, nossa aprendizagem talvez seja reduzida se estivermos chateados com alguma coisa e não conseguirmos nos concentrar na tarefa de aprendizagem em questão. Portanto, os neuropsicólogos não devem estudar os processos cognitivos apenas de forma isolada, mas também em suas interações uns com os outros e com os processos não cognitivos. Toda interpretação fora deste contexto funcional determinado pode conduzir a interpretações errôneas e distorcidas (Tabaquim, 2003). Thiers, Argimon e Nascimento (2005) apontam algumas variáveis que devem ser consideradas no momento de interpretação dos dados, tais como: fatores motivacionais, distúrbios afetivos e efeitos medicamentosos. Quanto aos fatores motivacionais, algumas questões são importantes, como o interesse do sujeito em mostrar-se pior do que realmente se encontra, simulando um déficit para obter dispensa remunerada do trabalho. Neste caso, é importante investigar a que se deve a avaliação e em que momento ela é realizada. No que se refere aos distúrbios afetivos, Thiers, Argimon e Nascimento (2005) compara pacientes depressivos com pacientes hiperativos. O primeiro 2 9 29 grupo pode mostrar-se menos interessado no ambiente externo em geral, produzindo poucas respostas, ou respostas qualitativamente empobrecidas, e o segundo grupo pode produzir muitas respostas, em ritmo acelerado, e apresentar talvez até o mesmo número de erros que o primeiro grupo. Enquanto os erros do primeiro grupo se caracterizariam pela ausência ou lentidão das respostas, no segundo grupo os erros poderiam estar relacionados à má interpretação das perguntas devido à pressa de responder logo, e passar para outras atividades. Sendo a avaliação neuropsicológica um exame intensivo do comportamento, deve valorizar não só as capacidades intelectuais em termos de desempenho individual, mas também o que se poderia chamar de uma “competência social” caracterizada pela capacidade de autonomia das principais condutas socializadas e pela qualidade dos fatores relacionais, espécie de maturidade social (Marcelli, 1998). Em muitas situações, as observações da conduta do paciente fora da situação de teste, o emprego de entrevistas estruturadas ou semiestruturadas são capazes de oferecer dados muito valiosos que não se poderiam obter de outra forma, e, portanto, não se devem menosprezar as informações da família, escola ou de profissionais ligados à condição do sujeito que está sendo avaliado. Portanto, a avaliação neuropsicológica deve preocupar-se com questões de vida diária do indivíduo (visão ecológica), uma vez que estas colaboram no entendimento do seu desempenho nos espaços em que vive e exercita sua rotina. Nesse sentido, o profissional obtém informações como: a capacidade do paciente de se cuidar, de reconhecer suas limitações, de interessar- se por atividades produtivas e/ou prazerosas, etc. Assim, muitas vezes faz-se necessária a informação de familiares, amigos, conhecidos e outros. Essas informações geralmente podem revelar dados mais confiáveis, claros e significativos. No entanto, os dados fornecidos 3 0 30 pelo “informante” também padecem de certo subjetivismo (Dalgalarrondo, 2008), que o psicólogo deve levar em consideração. Sendo assim, é importante verificar se esses dados não estão sendo subestimados ou superestimados (Dalgalarrondo, 2008) pelo informante. Ainda no que se referem às variáveis, estas podem ser definidas pelas características do paciente como também da lesão, especialmente da etiologia, fazendo com que a avaliação adquira determinadas particularidades. Por exemplo, uma lesão cerebral pode alterar profundamente a capacidade de um indivíduo para compreender e utilizar a linguagem. No entanto, os psicólogos muitas vezes testam os pacientes com listas de palavras e imagens, ignorandoos problemas contextuais, e concluem que a incapacidade de identificar palavras ou imagens isoladas é prova de uma perda de memória específica (Rosenfiel, 1994). Sendo assim, é importante o neuropsicólogo estar atento a algumas variáveis que podem interferir no desempenho de um indivíduo, como, por exemplo, as citadas por Lezak (1995): a natureza, a extensão e a localização da lesão; as características físicas, de gênero e de idade da pessoa; as individualizadas neuroanatômicas e fisiológicas; e a história psicossocial. Esta última refere-se às concepções, aos valores, às crenças referentes à cultura em que o indivíduo está inserido, e até mesmo às ações concretas do sujeito, ou seja, o seu comportamento. Tabaquim (2003) também citou alguns pontos importantes a serem considerados na avaliação neuropsicológica. Por parecem mais amplos, provavelmente englobam muitas, senão todas, as variáveis já mencionadas. 3 1 31 Vale destacar que o autor teve o cuidado de explicar brevemente cada item. São eles: a) Histórico de vida: No processo avaliativo é fundamental considerar o início do problema, os sintomas e a evolução da história, os dados de personalidade e as alterações subsequentes à lesão/disfunção. b) Histórico médico: Os dados do diagnóstico neurológico podem dar sentido a certas defasagens neuropsicológicas. As informações pelas técnicas de neuroimagem são muito importantes e devem ser valorizadas neste processo de análise neuropsicológica. c) Observação da conduta: Muitas vezes, os dados obtidos na anamnese e na observação do comportamento do sujeito têm mais significância do que as pontuações obtidas nos testes neuropsicológicos. d) Semiologia quantitativa do exame neuropsicológico: A pontuação de um subteste adquire valor quando correlacionada com outros achados, quanto à similaridade e complementaridade, mas também no contexto global dos dados obtidos em toda a investigação neuropsicológica. e) Semiologia qualitativa do exame neuropsicológico: As pontuações dos subtestes, que compõem uma bateria neuropsicológica ou uma seleção de testes, devem enriquecer com a maior e mais ampla valorização quantitativa possível. f) Testes complementares: No emprego de uma bateria neuropsicológica, o examinador deve conhecer as limitações dela e, partindo dos problemas específicos, eleger os testes complementares mais adequados ao núcleo patológico do indivíduo. g) Grupo-controle: As variáveis características das manifestações neuropsicológicas das lesões/disfunções cerebrais são de naturezas distintas, e 3 2 32 sua incidência pode determinar problemas diversos que requeiram normatização de grupos-controle. Segundo Dalgalarrondo (2008), é na entrevista inicial que se faz a anamnese, ou seja, são colhidos todos os dados necessários para um diagnóstico pluridimensional do paciente, o que inclui os dados sociodemográficos, a queixa ou o problema principal e a história dessa queixa, os antecedentes mórbidos somáticos e psíquicos pessoais, contendo os hábitos e o uso de substâncias químicas, os antecedentes mórbidos familiares, a história de vida do paciente, englobando as várias etapas do desenvolvimento somático, neurológico, psicológico e psicossocial e, finalmente, a avaliação das interações familiares e sociais do indivíduo. Alinda de acordo com Dalgalarrondo (2008), o primeiro relato deve ocorrer de forma predominantemente livre, para que o paciente expresse de forma espontânea seus sintomas e sinais. Os profissionais que realizam a avaliação neuropsicológica também devem estar atentos à diferença entre “traços” e “estados” do sujeito. Em relação à ansiedade, por exemplo, a intensidade dos sentimentos ansiosos (o presente estado da pessoa) muda dia a dia. Nesse caso, estado é o modo, ou melhor, a situação em que o sujeito está naquele determinado momento. Já o traço, segundo Cronbach (1996), normalmente é concebido como uma média ou estado típico; se é assim, ele reflete não apenas as suas características, mas também os estresses habitualmente presentes em seu ambiente. A capacidade é quase sempre considerada como um traço moderadamente estável, mas o nível de desempenho é transitório (Cronbach, 1996). Dessa forma, o objetivo da avaliação clínica na avaliação neuropsicológica não é determinar em que nível se situa um desempenho, mas que estratégia o sujeito utiliza para alcançá-lo (Marcelli, 1998). É importante salientar que os instrumentos de avaliação, em especial os testes, informam o desempenho do sujeito num dado momento (Cronbach, 3 3 33 1996), ou seja, no exato momento da sua aplicação. Diante disso, o psicólogo deve considerar que a avaliação envolve variadas etapas, em diferentes momentos. Portanto, ao longo da avaliação é importante verificar as mudanças qualitativas do indivíduo, tais como o uso de fármaco, a realização de tratamento psicológico e/ou fonoaudiológico, entre outros. O acompanhamento dessas mudanças colabora na identificação de questões referentes aos aspectos positivos e negativos da evolução do problema e serve como referência para o planejamento da reabilitação neuropsicológica. Além disso, é fundamental que a avaliação focalize não somente as áreas deficitárias, como também as habilidades preservadas, que são potenciais para reabilitação (Capovilla, 2007). A avaliação neuropsicológica encontra-se ligada a um estudo intensivo do comportamento, por isso, é fundamental associar a avaliação quantitativa com os dados qualitativos expressos – ou não – pelo sujeito. Somente dessa forma, a avaliação cumprirá com seu objetivo de traçar um perfil do funcionamento psicológico do indivíduo, com especial ênfase em aspectos cognitivos, e compreender a participação das variáveis emocionais, ambientais e neurológicas na configuração deste perfil, a fim de formular hipótese diagnóstica, que resultará na indicação terapêutica (Lezak, 1995). A avaliação neuropsicológica 3 4 34 O exame neuropsicológico consiste na avaliação das manifestações cognitivas e comportamentais de diferentes patologias cerebrais. As funções cognitivas se organizam como sistemas funcionais complexos ou como rede de conexões, as quais dependem, para sua realização, da ação conjunta de diversas regiões cerebrais conectadas entre si. Toda função mental complexa é efetuada mediante a atividade combinada de ambos os hemisférios, sendo que cada um deles oferece a contribuição que lhe é peculiar para a construção dos processos mentais. Os recursos utilizados na avaliação são diversos e baseados em material desenvolvido em laboratórios de neuropsicologia, neurologia e psicometria. O exame cognitivo tem sido amplamente utilizado para avaliar os distúrbios cognitivos na epilepsia, as alterações do raciocínio em quadros psiquiátricos, os 3 5 35 distúrbios de aprendizagem, da fala e da cognição após acidente vascular cerebral (AVC), os estudos sobre o envelhecimento normal e o patológico, etc. O exame é constituído de tarefas e de testes que examinam as funções cognitivas separadamente e estabelecem uma correlação entre a função avaliada e as áreas cerebrais envolvidas. Os resultados permitem um raciocínio associativo entre as habilidades preservadas e as alteradas. Entre elas estão: memória, capacidade de aprendizagem, atenção, linguagem, cálculo, raciocínio abstrato e juízo crítico, funções práxicas, habilidades visuo-construtivas e funções gnósicas. O processo diagnóstico envolve a eliminação sucessiva de possibilidades. Cabe ao neuropsicólogo formular as hipóteses a partir da queixa do paciente e das informações dos familiares, de sua impressão inicial a respeito do paciente e do conhecimentoprévio da afecção orgânica, e no decorrer do exame, corroborar ou não suas hipóteses. Está indicado para pacientes com supostas alterações cerebrais e fornece informações sobre a cognição, as características da personalidade, o comportamento social, o estado emocional e o ajustamento às limitações do sujeito. O potencial para o indivíduo viver de maneira autônoma e independente também pode ser aferido por essas avaliações. A informação sobre os pontos fortes e fracos do comportamento pode ser utilizada para determinação da competência e para o aconselhamento, tanto do paciente quanto dos familiares. Os objetivos da avaliação são: • Estabelecer ou não a presença de uma disfunção cognitiva; • Auxiliar no diagnóstico diferencial entre os vários quadros demenciais; • Acompanhar o curso da disfunção e /ou o(s) efeito(s) do tratamento medicamentoso, cirúrgico ou de reabilitação; 3 6 36 • Pesquisar e comparar os indivíduos com outros de igual escolaridade e faixa etária ou consigo mesmo; pesquisar populações definidas com o intuito de objetivar o desempenho cognitivo esperado; • Documentar o déficit com objetivo forense. Ao se empreender uma avaliação, o exame exige uma clara caracterização da faixa etária do indivíduo, do gênero e do nível sócio-econômico e cultural. Esses resultados serão comparados com uma amostra constituída pelo grupo controle, composta por sujeitos pareados para as mesmas variáveis citadas acima. Instrumentos de avaliação De forma geral, os testes neuropsicológicos são organizados em baterias fixas ou flexíveis. As baterias fixas são aplicáveis em pesquisa, em protocolos específicos para investigação de uma determinada população. Já as baterias flexíveis são mais apropriadas para a investigação clínica e são elaboradas no momento da consulta, com testes que se correlacionam com a queixa do paciente ou de um familiar ou para a avaliação de uma patologia específica. A escolha dos instrumentos de avaliação neuropsicológica obedece a alguns princípios básicos e possibilita uma investigação fidedigna e livre de distorções, fornecendo confiabilidade e objetividade na compreensão do quadro clínico apresentado. De modo geral, deve-se optar por testes que: - estejam validados e adaptados para uso na população brasileira; - utilizem material de fácil acesso aos profissionais; 3 7 37 - possam se adequar ao objetivo do estudo; - respeitem a formação profissional do aplicador, visto que alguns testes são de uso exclusivo de psicólogos, conforme resolução do Conselho Federal de Psicologia, dentre eles as Escalas Wechsler; - tenham alta sensibilidade e especificidade. A sensibilidade se refere à capacidade de um teste em classificar como positivo, indivíduos que realmente apresentam o distúrbio em questão. A especificidade se refere à capacidade de um teste em produzir resultados negativos confirmando que o paciente efetivamente não apresenta o distúrbio em questão. A sensibilidade mede a capacidade de reação do teste em um paciente doente, enquanto a especificidade mede a não reação do teste em não portadores da doença. Segundo Lezak, um bom teste deve obedecer a três princípios básicos: adaptabilidade, viabilidade e utilidade. Escolhidos os instrumentos, deve-se empreender a aplicação. Limitações e Vantagens da utilização dos instrumentos da avaliação neuropsicológica A avaliação pode ser muito útil na medida em que provê medidas padronizadas e comparáveis ao longo da evolução do quadro e que alguns testes claramente se correlacionam com determinadas estruturas cerebrais. No entanto, os testes do exame neuropsicológico possuem algumas limitações básicas que necessitam ser consideradas. Uma delas refere-se ao fato de que o que é testado não corresponde à queixa que o paciente trouxe inicialmente. O paciente pode se queixar de ao ler alguma coisa, não conseguir reter o que leu, enquanto no exame será pedido a 3 8 38 ele que memorize uma lista de palavras e que copie desenhos. Para aproximar o momento do exame da situação aonde usualmente aparece a dificuldade do paciente, existe uma tendência mundial a se utilizar testes ecológicos; isto é, testes que testam a queixa do paciente a partir da simulação de situações do dia-a-dia. Outra grande dificuldade se refere às limitações do próprio sujeito avaliado como, por exemplo, a presença de analfabetismo e/ou de perdas sensoriais. Da mesma forma, os escores quantitativos das tabelas utilizadas como referência não levam em consideração os aspectos qualitativos das incapacidades do indivíduo e, ao fornecerem apenas números, podem deixar de lados aspectos importantes observados nas dificuldades e nos erros cometidos. Interpretação dos resultados Na etapa de interpretação dos resultados obtidos na avaliação neuropsicológica, deverão ser levadas em consideração diversas variáveis intervenientes que podem impactar nos escores e nos resultados obtidos pelo paciente. Todos os estudos fazem referência à escolaridade. Quanto maior a escolaridade melhor o desempenho esperado nos testes. Além disso, a carência de instrumentos adaptados à nossa realidade torna muito difícil o estabelecimento de um padrão de normalidade para o nosso meio. A maioria dos testes neuropsicológicos é importada e validada para uma outra população (diga-se, de passagem, com escolaridade média superior à da população brasileira). Desta forma deve-se considerar a escolaridade e a possibilidade de resultados falso-negativos e falso-positivos, a motivação e o interesse do paciente, as interferências externas como excesso de barulho ou iluminação precária, o uso de medicamentos, bem como adaptações plausíveis dos testes. 3 9 39 Igualmente necessário é o estabelecimento do funcionamento pré-mórbido do paciente e de sua eficiência cognitiva anterior a uma patologia ou evento. Muitas vezes, essas respostas não são presumíveis à primeira avaliação e só por meio da avaliação seriada e do acompanhamento criterioso desses pacientes, a longo prazo, será possível obter dados mais fidedignos e tomar decisões mais acertadas. Protocolo Básico Um protocolo básico de investigação neuropsicológica deve conter testes de: - Orientação; - Atenção; 4 0 40 - Percepção; - Inteligência geral; - Raciocínio; - Memória visual e verbal de curto e longo prazo; - Flexibilidade mental; - Linguagem; e - Habilidades visuo-construtivas e práxicas. A partir dos resultados dessa investigação inicial, é possível incluir um ou outro teste, com o objetivo de se aprofundar no domínio cognitivo que se quer melhor investigar. Alguns testes cobrem ou pretendem avaliar vários domínios cognitivos, como o Mini exame do estado mental (Folstein, 1975)-(5) enquanto outros avaliam apenas uma única função cognitiva. O tempo necessário para o exame varia entre 2 a 4 horas, dependendo da habilidade do profissional e da disposição do paciente, em dias diferentes. Os testes atentivos devem vir no início das sessões, logo após devem ser aplicados os testes de memória, e os outros, lembrando sempre de intercalar tarefas verbais e não verbais. Avaliação Cognitiva 4 1 41 A-Testes de eficiência intelectual Um dos testes mais utilizados para avaliação de inteligência geral está contido em uma ou outra versão da Escala de Inteligência Wechsler em suas várias versões, algumas revisadas mais de uma vez e que contempla todas as idades (WAIS, WISC, WAIS-R, WISC-R, WISC III, WPPSI, WMS, WMS-R, WAIS-NI). Estas baterias são constituídas de breves sub-testes que fornecem escores de várias tarefas cognitivas,