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16 CENOZÓICO A partir do Cenozóico, a área primitivamente ocupada pela Bacia do Parnaíba permaneceu so- erguida. As pequenas áreas deposicionais são res- tritas a bacias terciárias de interior e de sedimenta- ção de litoral. As condições de deposição são pre- dominantemente continentais. 16.1 Plioceno Pequenos peixes de água doce e representan- tes da flora foram coletados em pequena bacia terciária, localizada no município de Nova Iorque, hoje coberta pelas águas da represa de Boa Espe- rança. Os sedimentos foram datados no Plioceno por palinomorfos. Foram assinaladas vinte duas espé- cies de pólens e esporos (Lima, 1991). Os peixes são os Characiformes Procharax e Tri- portheus, os Perciformes, Macracara e os Clupei- formes “Knightia”, e fragmentos de Arius (Wood- ward, 1939; Santos, 1946a; Santos & Travassos, 1956). Os fitofósseis são folhas estudadas por Cristalli & Mandarim de Lacerda (1997), que identificaram for- mas referidas a Fabacea, Malvaceae, Ebenaceae, Meliaceae, Smilacacea e outras formas com possí- vel afinidade com as famílias Melastomatacea, Myrtaceae, Rutacea e Guttiferae. A associação que foi depositada em ambiente lacustre é de floresta tropical úmida, pouco fecha- da, com dois estratos, um arbóreo e outro arbusti- vo. O estudo revelou que durante o Terciário a Flo- resta Atlântica ocupava esta área e mostra o con- traste com a vegetação atual (caatingas e cerra- dos). 16.2 Mamíferos do Pleistoceno Os mamíferos evoluíram rapidamente desde o início da Era Cenozóica, sofrendo sucessivas e pro- fundas mudanças, como documentado no Pleisto- ceno iniciado há 1,6 milhão de anos. Nesta idade, as faunas dos gigantes ancestrais dos mamíferos atuais percorriam os continentes. Após a elevação do istmo correspondente à América Central, os representantes de grupos ori- ginários dos hemisférios norte e sul haviam se mes- clado, no continente sul-americano. E assim, docu- mentando sua antiga presença, os ossos destes predadores e suas caças são encontrados, ampla- mente distribuídos na cobertura quaternária. Nos contrafortes do embasamento ao sul da Ba- cia do Parnaíba, ossadas foram preservadas em cavernas e cacimbas. As principais localidades são as tocas São Vito e Garrincha, no município de São Raimundo Nonato, Piauí. Cenozóico – 137 – Guerin (1991) identificou os seguintes mamíferos: preguiças gigantes - Catonix cuvieri, Eremotherium lundi; tatu comum - Dasipodinae; tatu gigante - Pampatherium humboldti, Hoplophorus euphactus, Panochtus greslebini, Glyptodon clavipes; coelho - Cuniculus sp.; cão gigante - Protocyon troglodytes; cão - Canidae; doninha - Mustelidae; urso - Arcto- dus brasiliensis; gato selvagem - Felis yagouaron- di; tigre dente de sabre - Smilodon populator; ungu- lado - Macrauchenia cf patagonica; notoungulado - Toxodon sp.; mastodonte - Haplomastodon warin- gi; cavalo - Hippidion bonaerensis e Equus neogae- us; porco do mato - Dicotyles tajacu e Tayassu pe- cari; lhama - Palaeolama major; veado catingueiro - Mazama sp.; répteis: jacaré Caiman crocodilus e a tartaruga Chelonio sp.; peixe: cascudo - Plectosto- mus auroguttatus. O estudo de Paleoecologia reali- zado por Guerin mostrou que havia elevada propor- ção de grandes animais, com predomínio de carní- voros e abundância de onívoros. O material (Figuras 16.1, 16.2, 16.3, 16.4 e 16.5) está depositado no Museu do Homem Americano, lo- calizado na cidade de São Raimundo Nonato, Piauí. As preguiças Catonix e Eremotherium, o tatu Glyptodon e a lhama Palaeolama comiam plantas herbáceas. O tatu Pampatherium era onívoro. Toxo- don e os cavalos Hippidion e Equus pastavam as gramíneas. A comunidade é característica de uma paisa- gem neotropical, de savanas com tufos de arbus- tos, recortada por zonas florestais, com um clima mais úmido do que o atual (Figuras. 16.6 e 16.7). 16.3 Ocupação Humana A contribuição da Bacia do Parnaíba para o estu- do da ocupação e evolução da cultura dos seres humanos é muito especial, pois o seu conhecimen- to tem permitido modificar antigos conceitos sobre a longevidade do homem nas Américas. A área arqueológica de São Raimundo Nonato, situada ao sul do Piauí, vem sendo estudada desde 1970, pela Drª. Niede Guidon e uma equipe de pes- quisadores. O acervo coletado está depositado no Museu do Homem Americano, situado na mesma cidade. Nas reentrâncias dos paredões silurianos que formam a Serra da Capivara, principalmente no mu- nicípio de São Raimundo Nonato, estão concentra- dos em numerosos sítios (acima de 300) uma varie- dade de manifestações de arte pré-histórica, que Guidon (1991) considera ser resultado de duas si- tuações ambientais favoráveis, as geológicas e os ecossistemas mais amenos do que os atuais. As pinturas rupestres são de arte narrativa, das atividades socioculturais de um povo pacífico e ale- gre, essencialmente compostas por figuras huma- nas, e com movimento. Os animais da fauna local são também figurados. Guidon (1991) apresentou a cronologia dos gru- pos que ocuparam a área, baseada nas característi- cas da arte rupestre e objetos e utensílios coletados nos sítios. A ocupação mais antiga está localizada na toca do Boqueirão no sítio da Pedra Furada. Por datação absoluta, a idade de um carvão en- contrado em um fogão circular foi estabelecida em cerca de 46.000 anos. Junto foram encontrados artefatos talhados em quartzo e quartzito. Estas populações que se sucederam até cerca de 7.000 anos atrás é classificada como de Tradição Nor- deste, e o seu grafismo é reconhecível pelas figu- ras humanas apresentando ações ligadas ao com- portamento cotidiano, com enfeites na cabeça, e ainda animais e plantas (Figuras 16.8, 16.9, 16.10, 16.11). A partir de 6.000 anos, o povo primitivo abando- nou a área e foi substituído por populações da Tra- dição Agreste, Itacoatiaras de Leste e Geométrica. As belas pinturas rupestres foram inscritas nos arenitos modelados pela erosão de uma geometria derivada das estruturas sedimentares, que foram originadas pelos caudalosos rios provenientes do degelo de um pólo glacial situado muito próximo do Nordeste do Brasil, há cerca de 400 milhões de anos (Figura 16.12). A utilização deste abrigo natural foi efetivada em ecossistemas mais amenos do que os atuais da área geográfica (Guidon, 1991). Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís – 138 – Cenozóico – 139 – Figura 16.1 – Crânio, vértebras e externo de Catonix sp. Sítio Antonião, São Raimundo Nonato. Piauí. Coleção do Museu do Homem Americano. Figura 16.2 – Pata dianteira direita de Catonix sp. Sítio Antonião, São Raimundo Nonato, Piauí. Coleção do Museu do Homem Americano. Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís – 140 – Figura 16.3 – Dentes e mandíbula de Smilodon sp. Toca do Pilão, São Raimundo Nonato Piauí. Coleção do Museu do Homem Americano. Figura 16.4 – Dentes de Toxodon sp. Sítio São Vito, São Raimundo Nonato, Piauí. Coleção do Museu do Homem Americano. Figura 16.5 – Dente molar de Haplomastodon sp. Sítio do Garrincha, São Raimundo Nonato, Piauí. Coleção do Museu do Homem Americano. – 1 4 1 – C e n o z ó ic o F ig u ra 1 6 .6 – R é p te is e m a m íf e ro s d o P le is to c e n o . 1 J a c a ré - C a im a m c ro c o d ilu s 2 T a rt a ru g a - C h e lo n io s p . 3 U n g u la d o - M a c ra u c h e n ia c f. p a ta g o n ic a 4 P o rc o d o m a to - T a y a s s u p e c a ri 5 T ig re d e n te d e s a b re - S m ilo d o n p o p u la to r 6 C a v a lo - E q u u s ne o g a e u s 7 C ã o g ig a n te - P ro to c y o n tr o g lo d y te s 8 P re q u iç a g ig a n te - C a to n ix s p . 9 P re g u iç a g ig a n te - E re m o th e ri u m s p . 1 0 G a to s e lv a g e m - F e lix s p . P a le o n to lo g ia d a s B a c ia s d o P a rn a íb a , G ra ja ú e S ã o L u ís – 1 4 2 – F ig u ra 1 6 .7 – M a m íf e ro s d o P le is to c e n o . 1 N o to u n g u la d o - T o x o d o n s p . 2 V e a d o c a tin g u e ir o - M a z a m a s p . 3 M a s to d o n te - H a p lo m a s to d o n w a ri n g i 4 L h a m a - P a le o la m a m a jo r 5 T a tu g ig a n te - G ly p to d o n s p . 6 T a tu g ig a n te - H o p lo p h o ru s s p . 7 T a tu c o m u m - D a s ip o d in a e 8 C o e lh o - C u n ic u lu s s p . Cenozóico – 143 – Figura 16.8 – Figuras com penachos na cabeça, em práticas rituais, com um elemento maior e destacado na frente. Na composição há animais de caça, em movimento. Sítio do Baixão da Vaca, Parque Nacional da Serra da Capivara, São Raimundo Nonato, Piauí. Figura 16.9 – Figuras masculina e feminina e as diferenças anatômicas simbolizadas por protusão exagerada no homem e um círculo vazado na mulher. Toca Boqueirão do Sítio Pedra Furada, Parque Nacional da Serra da Capivara, São Raimundo Nonato, Piauí. Paleontologia das Bacias do Parnaíba, Grajaú e São Luís – 144 – Figura 16.10 – Figuras humanas organizadas em atos rituais. Superposição de representações de animais, como cervídeos e jacarés destacados com pigmento branco e de jogos sexuais em pigmento azul. Toca do Boqueirão do Sítio Pedra Furada, Parque Nacional da Serra da Capivara, São Raimundo Nonato, Piauí. Figura 16.11 – Cena com várias figuras humanas em atividades lúdicas coletivas, com braços e pernas em movimento e órgãos sexuais eretos. Toca do Chico Coelho, no baixão do Perna, Parque Nacional da Serra da Capivara, São Raimundo Nonato, Piauí. – 1 4 5 – C e n o z ó ic o F ig u ra 1 6 .1 2 – R o c h a s d o G ru p o S e rr a G ra n d e , a b ri g o d e h o m e n s p ré -h is tó ri c o s .
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