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AULA 4 
MÍDIA, OPINIÃO PÚBLICA E 
OS GRUPOS DE INTERESSE 
Profª Rafaela Sinderski 
 
 
2 
OPINIÃO PÚBLICA: PROPRIEDADES E ASPECTOS 
Como já discutido anteriormente, a definição de opinião pública é ampla e 
plural. Ela envolve diferentes entendimentos construídos ao longo dos séculos 
(Silveirinha, 2004; Cervi, 2006), sendo, nesse percurso, encarada de maneira 
mais ou menos positiva por filósofos, comunicadores, psicólogos, cientistas 
políticos e outros estudiosos das ciências humanas e sociais. Nesta aula, é 
apresentada uma proposta conceitual ainda não discutida em nosso trajeto 
voltado para a compreensão do fenômeno. Uma proposta elaborada por 
Figueiredo e Cervellini (1995), pesquisadores brasileiros, sustentada por quatro 
aspectos: formação, forma, objeto e sujeito da opinião. 
Em seguida, são abordadas cinco propriedades para a definição de opinião 
pública, também encontradas no estudo de Figueiredo e Cervellini (1995). São 
elas: distribuição, direção, intensidade, coerência e latência. 
TEMA 1 – FORMAÇÃO, FORMA, OBJETO E SUJEITO: UMA PROPOSTA 
CONCEITUAL DE OPINIÃO PÚBLICA 
Diante da dificuldade de definir o significado de opinião pública com 
precisão, Figueiredo e Cervellini (1995) apresentam uma proposta conceitual que 
visa contornar tal obstáculo, dando significado à expressão a partir da reflexão 
acerca de quatro aspectos: formação, forma, objeto e sujeito da opinião pública. 
Essa proposta foi mencionada durante outra aula e será aprofundada neste tópico. 
Antes, contudo, de mergulhar no raciocínio dos autores, é importante recordar que 
ambos atentam para o fato de que “não existe uma, mas várias maneiras de 
identificar os fenômenos de opinião pública” (Figueiredo; Cervellini, 1995, p. 177). 
Ela seria, assim, um fenômeno marcado pela pluralidade. 
Além disso, os pesquisadores afirmam que tratar de opinião pública é 
dialogar com diferentes áreas do conhecimento, como a Ciência Política, a 
Comunicação, a Sociologia, a Antropologia, a Economia e a Psicologia Social. O 
fenômeno pode ser foco de estudiosos dessas e de outras áreas, ou pode 
tangenciar seus objetos de pesquisa, chamando, assim, sua atenção. Dessa 
forma, afirmam que qualquer definição que se pretenda dar à opinião pública deve 
ter em consideração seu aspecto multidisciplinar. “Qualquer conceituação que dê 
ênfase a um aspecto específico – a economia e suas expectativas racionais, por 
 
 
3 
exemplo –, certamente pecará pelo reducionismo” (Figueiredo; Cervellini, 1995, p. 
172). 
Voltando, então, à proposta conceitual, os autores elencam, como já dito, 
quatro aspectos que podem auxiliar na construção de um conceito mais bem 
delimitado de opinião pública. Os pontos são sumarizados a seguir. 
TEMA 2 – ORIGEM DE FORMAÇÃO E FORMA DA OPINIÃO 
Figueiredo e Cervellini (1995) pontuam que a origem da opinião pública 
deve ser o debate público, como um “processo de discussão coletiva, implícito ou 
explícito” (Figueiredo; Cervellini, 1995, p. 177). Ao apresentar essa ideia, os 
autores diferenciam seu entendimento sobre a questão daquele encontrado na 
obra do filósofo e sociólogo alemão, expoente dos estudos sobre democracia 
deliberativa, Jürgen Habermas. 
Eles apontam que, para Habermas, debate público está ligado à 
imposição prévia de racionalidade, a ser manifestada por aqueles envolvidos na 
discussão. De fato, ao tratar da esfera pública, o teórico afirma que ela é formada 
pelo debate público de razões, colocando como característica da deliberação a 
troca de argumentos embasados na racionalidade (Habermas, 1984). O que 
Figueiredo e Cervellini (1995, p. 177) fazem é distinguir seu pensamento do que 
é sustentado por Habermas, alegando que não exigem, em sua concepção de 
debate público, um tipo de racionalidade a priori, nem esquecem de que 
“concretamente falando, numa sociedade de massas as discussões podem se dar 
de maneiras difusas e muito complexas, sem que fiquem explicitadas”. 
Entretanto, a crítica à condição de racionalidade nas discussões públicas 
não é uma novidade trazida pelos dois pesquisadores. A filósofa norte-americana 
Nancy Fraser (1999), por exemplo, afirma que a esfera pública pensada por 
Habermas (1984) é formada por exclusões significativas, ligadas, especialmente, 
a gênero, raça e classe. Isso aconteceria porque restringir a discussão 
democrática à argumentação crítica e racional dificulta a participação, no debate, 
de determinados grupos mais frágeis a essa forma de interação, como os grupos 
historicamente oprimidos. A exigência do uso da razão privilegia, assim, 
características confrontacionais, favorecendo determinados discursos, os 
hegemônicos, em detrimento de outros, os minoritários (Mansbridge, 1999; 
Young, 2001). “Deliberação deveria basear-se na ‘troca de considerações’ mais 
que na ‘troca de razões’, porque construir o melhor sentido a respeito do que 
 
 
4 
coletivamente devemos fazer requer uma atenção fina às cognições e emoções” 
(Mansbridge, 1999, p. 228). 
Nosso foco, contudo, não é a deliberação e suas características, e sim a 
opinião pública. Por isso, tendo dito que a origem desse fenômeno é, para 
Figueiredo e Cervellini (1995), o debate público, retomaremos a proposta 
conceitual dos autores abordando o segundo aspecto para a definição da questão: 
a forma. 
Segundo os pesquisadores, a forma da opinião pública está ligada à 
necessidade de que haja expressão pública da opinião. Esse é um prerrequisito 
para que exista o debate, que é, para os autores, no qual se origina o fenômeno. 
Eles afirmam que, em tal contexto, as pesquisas de opinião assumem importância, 
já que “são capazes de expressar aspectos latentes do conjunto dos pensamentos 
individuais e, portanto, da própria sociedade” (Figueiredo; Cervellini, 1995, p. 177). 
Faz, inclusive, parte do raciocínio dos pesquisadores a ideia de que essas 
pesquisas seriam “formas em que a deliberação ocorre hoje em dia, funcionando 
como veículos de troca de informações sobre temas que já estão sendo discutidos 
e pensados por alguns grupos ou pessoas, mas que nem por isso são totalmente 
estranhos aos outros” (Figueiredo; Cervellini, 1995, p. 178). 
Porém, esse pensamento é passível de muitas críticas, afinal, para que 
haja deliberação de fato, não é suficiente a exposição de posicionamentos dos 
cidadãos sobre determinado assunto. É preciso que sejam cumpridos, segundo 
Stromer-Galley (2007), alguns critérios para a deliberação entre indivíduos, como 
manifestações de discordância, que podem gerar revisão de posicionamentos por 
parte dos integrantes do debate, e engajamento, ou reciprocidade, entre os 
participantes. Apesar de a dissonância poder ser mensurada com uma pesquisa, 
não há o engajamento das pessoas em um debate real, nem a troca de 
argumentos e contra-argumentos. 
TEMA 3 – DISCUTINDO SOBRE SEU OBJETO 
Neste ponto, há a exigência de que o objeto da opinião pública – o assunto 
em pauta – seja suficientemente relevante para gerar debate público. Sobre a 
questão, Figueiredo e Cervellini (1995, p. 178) discorrem: 
Isso significa dizer que o tema tem que ser, em alguma medida, público, 
ao menos para que os participantes do debate se ponham minimamente 
de acordo a respeito do que está sendo debatido. A opinião de um 
homem casado sobre sua sogra, por exemplo, não é um fenômeno de 
 
 
5 
opinião pública. No entanto, se de alguma forma essa opinião ganha 
relevância pública – se esse é o ponto principal da trama de uma novela 
de grande audiência ou uma questão que envolva o presidente da 
República –, a opinião daqueles que discutem o tema passa a ser uma 
manifestação de opinião pública. 
Vê-se que, além de temas de claro interesse público, como, digamos, a 
situação econômica do país, questões que se misturam com o privado também 
podem ser políticas e conquistar o debate entre cidadãos. A ideia de que “o 
pessoal é político” ganhou proeminência com Carol Hanisch,durante o século 
XIX, quando ela declarou que “problemas pessoais são problemas políticos” 
(Hanisch, 1970, p. 76, tradução nossa). Dizendo isso, a ativista norte-americana 
deu um novo significado a problemas como as agressões contra mulheres, pois 
sua frase não significa que todos os assuntos tratados dentro de casa devem ser 
levados à rua, mas sim que existem questões estruturais, como a violência 
doméstica, que ocorrem em espaços privados, mas que precisam de ação coletiva 
para serem superadas. 
Para Graham (2008, p. 18), é importante assumir um entendimento mais 
“poroso” do que qualifica um tema como político/público. Ele alega que tais 
assuntos costumam envolver menos discussões sobre política convencional – o 
que não quer dizer, de maneira alguma, que esse tópico não apareça em debates 
públicos – e mais articulações ligadas a questões presentes no dia a dia das 
pessoas. Sabendo disso, há um grande leque de conteúdos que podem servir de 
substrato para o debate entre cidadãos e, assim, para a opinião pública. 
TEMA 4 – OPINIÃO PÚBLICA: QUAL É SEU SUJEITO? 
Por fim, o último aspecto trazido por Figueiredo e Cervellini (1995) diz 
respeito ao sujeito da opinião pública, que, para os autores, não possui quaisquer 
limites além de seu aspecto coletivo. Ou seja, “a opinião pública tem que 
corresponder à opinião de um grupo de pessoas que tenham algumas 
características comuns, não importando se pertençam a elite ou a massa, se são 
informados ou não ou se formam a opinião de maneira racional ou emocional” 
(Figueiredo; Cervellini, 1995, p. 178). Diante disso, afirmam que os 
posicionamentos de grupos minoritários devem ser tão relevantes quanto as 
expressões advindas de parcelas majoritárias da população. 
Em suma, para os pesquisadores, opinião pública diz respeito a fenômenos 
que se originam de um processo de debate público e se referem a assuntos de 
 
 
6 
interesse coletivo. Esses posicionamentos devem ser expressados publicamente 
por grupos de cidadãos, grandes ou pequenos. Aqui, pode-se traçar um paralelo 
com o pensamento compartilhado por Matteucci (1998) e Cervi (2006) de que a 
opinião pública surge do debate público e tem, como objeto, questões de 
relevância pública, sendo, dessa maneira, pública em um duplo sentido. 
TEMA 5 – CINCO PROPRIEDADES PARA A DEFINIÇÃO DE OPINIÃO PÚBLICA 
Além de apresentarem uma proposta conceitual própria de opinião pública, 
Figueiredo e Cervellini (1995) também discutem sobre o trabalho de outro 
pesquisador, o cientista político norte-americano Valdimer Orlando Key Jr., que 
se ocupa da definição de certas propriedades do fenômeno. São elas: distribuição, 
direção, intensidade, coerência e latência. 
A ideia de propriedades e a sua utilização enquanto instrumento analítico 
é importante, pois cada propriedade relaciona-se a um aspecto que 
auxilia na previsão de futuros movimentos ou efeitos das manifestações 
de opinião na vida da sociedade. (Figueiredo; Cervellini, 1995, p. 182) 
Esses aspectos são reunidos em um quadro construído pelos autores e 
apresentado abaixo: 
Quadro 1 - Propriedades da opinião pública e seus aspectos relacionais 
Propriedades Aspectos com o qual se relacionam 
Distribuição Nível de conflito 
Direção Posicionamento assumido 
Intensidade Força de reação 
Coerência Estabilidade 
Latência Potência de atividade 
Fonte: com base em Figueiredo e Cervellini (1995). 
Nesta seção, será abordada cada uma dessas propriedades, a partir, 
principalmente, do que é articulado por Figueiredo e Cervellini (1995). Para dar 
início a essa discussão, é explanado o primeiro ponto do quadro: a distribuição 
enquanto nível de conflito presente na manifestação da opinião. 
 
 
7 
5.1 Distribuição 
Segundo Figueiredo e Cervellini (1995, p. 179), a “distribuição é a forma 
como as opiniões individuais sobre um tema estão agrupadas. Assim, podemos 
encontrar situações de consenso absoluto, onde todos têm a mesma opinião, até 
uma situação de total dissenso, onde cada um tem uma opinião diferente”. A 
propriedade de distribuição permitiria, dessa forma, compreender o nível de 
potencial conflito gerado por determinado assunto. Quanto mais dissenso, maior 
as chances de conflito. 
Apesar da colocação dos pesquisadores, deve-se dizer que é bastante 
incomum – e até mesmo improvável – a concordância absoluta a respeito de 
qualquer questão de interesse público, quando tal público é composto por um 
grande número de pessoas, como a população brasileira1. Da mesma forma, 
apostar em um dissenso completo também peca, tanto na questão da 
probabilidade quanto no problema relacionado à mensuração da opinião pública: 
para que o fenômeno possa ser medido – por pesquisas –, precisa ser agregado 
em conjuntos, presumindo, então, algum grau de consenso entre os cidadãos. Por 
isso, as opiniões costumam ser distribuídas em direções ou posicionamentos, 
como será explicado a seguir. 
5.2 Direção 
Ao tratarem da direção da opinião pública, os autores, a partir das 
proposições de Key Jr. (19612 citado por Figueiredo; Cervellini, 1995), falam sobre 
os posicionamentos que surgem a respeito de assuntos que chamam a atenção 
do público. “A análise da direção da opinião pública pressupõe que para cada 
tema de interesse público existem escolhas a serem feitas. A direção informa 
basicamente se determinado grupo está a favor ou contra alguma coisa” 
(Figueiredo; Cervellini, 1995, p. 180). 
Vamos a alguns exemplos: em pesquisa do instituto Datafolha sobre o grau 
de confiança dos brasileiros nas instituições3, realizada em 2017, os 
posicionamentos dos entrevistados poderiam variar entre confia muito, confia um 
 
1 Segundo o IBGE, a população do Brasil é de mais de 210 milhões de pessoas. Disponível em: 
. Acesso em: 2 dez. 2019 
2 KEY JR., V. O. Public opinion and american democracy. New York: Alfred A. Knopf, 1961. 
3 Para saber mais, acesse: 
. 
Acesso em: 2 dez. 2019. 
 
 
8 
pouco, não confia e não tem opinião a respeito de entidades como Forças 
Armadas, Congresso Nacional, imprensa, entre outras. As respostas precisavam 
ser aglutinadas em categorias simples para oferecer dados que pudessem 
mostrar a opinião do público a respeito do tema. Com isso, os resultados 
apontaram que, no caso da mídia, 22% tinham uma alta confiança na instituição, 
49% confiavam um pouco, 28% encaravam-na como nada confiável e 1% não 
opinou. Esse assunto, como se pode perceber, apresenta posicionamentos 
distribuídos de maneira mais equilibrada, mostrando que é um tema com mais 
dissenso entre os entrevistados. 
Já em outra pesquisa, feita em dezembro de 2018, o consenso prevalece: 
84% dos brasileiros se colocaram a favor da redução da maioridade penal, apenas 
14% foi contra, 1% se disse indiferente e 1% não opinou4. Olhando para a 
distribuição da opinião, vê-se que a direção dos posicionamentos é mais 
homogênea ao redor dessa questão, apesar de o tema, em si, ser bastante 
controverso e, usualmente, gerar considerável conflito entre debatedores. 
5.3 Intensidade 
A terceira propriedade diz respeito à intensidade da manifestação de 
opinião pública. Ela está ligada ao grau de adesão do público a cada 
posicionamento, mostrando a força das manifestações contra ou a favor de 
determinados assuntos (Figueiredo; Cervellini, 1995). 
Voltando às pesquisas do Datafolha para ilustrar a ideia apresentada: em 
abril de 2019, 38% das mulheres brasileiras com 16 anos ou mais se 
consideravam feministas, 56% rejeitavam se associar ao feminismo e 6% não 
possuíam opinião sobre o assunto5. Fica claro que o movimento, apesar de 
proeminente, não é majoritário entre as mulheres no país. Contudo, a intensidade 
do posicionamento daquelas que se designam como feministas costuma ser forte, 
irrompendo, por exemplo, emmanifestações políticas como a que ganhou espaço 
 
4 Para saber mais, acesse: 
http://media.folha.uol.com.br/datafolha/2019/01/14/15c9badb875e00d88c8408b49296bf94-
v.pdf>. Acesso em: 2 dez. 2019. 
5 Para saber mais, acesse: 
. Acesso em: 2 dez. 2019. 
 
 
9 
no pleito presidencial de 2018 contra o então candidato Jair Bolsonaro (PSL), 
conhecida por #EleNão6. 
5.4 Coerência 
Esta propriedade, afirmam Figueiredo e Cervellini (1995), relaciona-se com 
a coerência ou consistência interna da opinião pública em determinados grupos. 
Por exemplo, a pesquisa anteriormente mencionada sobre mulheres, violência e 
feminismo7 aponta que 90% dos brasileiros entrevistados concordam totalmente 
(81%) ou em parte (9%) que a violência contra a mulher aumentou entre 2018 e 
2019. Contudo, 43% concordam que o Brasil tem leis adequadas para proteger as 
mulheres, sendo que 26% concordam totalmente com a afirmação e 16% aceitam-
na em parte. A parcela é significativa, aproximando-se da metade da população. 
É claro que pode haver diferentes raciocínios que levaram as pessoas a 
apontar uma escalada de violência e, ao mesmo tempo, acreditar na efetividade 
da justiça em relação à questão – elas podem crer, por exemplo, que a violência 
contra a mulher tem suas bases em questões sociais e culturais, exigindo mais 
educação a respeito do tema, não o recrudescimento de leis. Entretanto, os dados 
apontam para certa inconsistência da população sobre o assunto, em especial 
quando se considera que uma grande parte dos cidadãos é favorável a medidas 
de endurecimento penal, como a redução da idade-limite de imputabilidade – 84% 
no ano de 2019, segundo o Datafolha8. Além disso, pesquisas de anos anteriores 
mostram que 75% dos brasileiros concordavam com a ideia de que penas mais 
rigorosas inibem atos criminosos (Confederação Nacional da Indústria, 2017). Isso 
leva a crer que existe um problema com a coerência da opinião pública a respeito 
do tópico. 
Figueiredo e Cervellini (1995. p. 181) apontam que também é possível 
observar a coerência da opinião individual cruzando “respostas de um mesmo 
 
6 Nascido nas redes sociais on-line, mais precisamente em um grupo de Facebook com milhões 
de integrantes, o #EleNão ganhou as ruas brasileiras em setembro de 2019, poucos dias antes do 
primeiro turno das eleições presidenciais. As manifestações ocorreram, segundo o portal de 
notícias G1, em cerca de 114 cidades do país. Disponível em: 
. Acesso em: 2 dez. 2019. 
7 Para saber mais, acesse: 
. Acesso em: 2 dez. 2019. 
8 Para saber mais, acesse: 
. Acesso em: 2 dez. 2019. 
 
 
10 
indivíduo a várias perguntas diferentes, mas ligadas ao mesmo assunto”. Quem 
traz essa abordagem, afirmam, é o cientista político Philip Converse. 
Baseado em um famoso experimento, Converse defendeu em 1964 a 
tese de que quando os temas de opinião pública não têm grande 
saliência para os indivíduos ou são difíceis para a maioria entender, a 
probabilidade de que as opiniões sejam artificiais e sem nenhuma 
estabilidade é muito grande. A partir disso ele criou o conceito de “não-
atitudes”. Uma não-atitude é a ausência de uma atitude real, ou seja, é 
uma opinião que a pessoa dá sobre certos assuntos sem qualquer 
consistência, vazia de conteúdo. (Figueiredo; Cervellini, 1995, p. 181) 
Esse pensamento se aproxima daquele sustentado por Campbell (1964) – 
apresentado na aula anterior – de que a opinião do eleitor, especificamente do 
norte-americano, não possui coerência. Na contramão dessa perspectiva, Page e 
Shapiro (1992), como já mencionado, fizeram uma pesquisa que mostrou que “a 
opinião coletiva é estável e faz bastante sentido, a despeito da fraqueza das 
opiniões individuais” (Figueiredo; Cervellini, 1995, p. 181). Tais resultados 
correspondem à opinião pública norte-americana, mas Cervi (2006) também 
encontra coerência e racionalidade na brasileira. 
5.5 Latência 
Por fim, a latência corresponde à última propriedade da opinião pública 
elencada por Key Jr. Figueiredo e Cervellini (1995, p. 181) explicam que “um 
fenômeno de opinião pública latente é aquele onde existe um potencial para uma 
manifestação, mas ainda não houve explicitação da opinião, ou seja, ela ainda 
não se tornou pública”. De acordo com os pesquisadores, a transição de uma 
opinião “adormecida”, ou latente, para uma opinião ativa depende de estímulos. 
Se algum acontecimento tem apelo aos valores, às crenças e às atitudes dos 
indivíduos, pode incitar uma onda de opinião pública a respeito de determinado 
tema. Um exemplo disso é a discussão sobre a redução da maioridade penal, já 
citada nesta seção. Para diversos autores (Silva; Gueresi, 2003; Pimentel, 2015; 
Silva; Oliveira, 2015; Dias, 2017; Budó et. al, 2018), é a exposição de atos 
violentos praticados por crianças e adolescentes que estimula debates sobre o 
assunto e, consequentemente, o aumento da posição favorável à redução. 
 
 
 
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