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2 APLICAÇÃO DA PENA 3a EDIÇÃO/2024 1. NOÇÕES INICIAIS 3 2. FIXAÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE 3 2.1. PRIMEIRA FASE - CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS 3 2.2 SEGUNDA FASE - AGRAVANTES E ATENUANTES (CP, ARTS. 61 A 67) 4 2.3. TERCEIRA FASE - CAUSAS DE AUMENTO E DIMINUIÇÃO DE PENA 4 3. 1ª FASE: APLICAÇÃO DA PENA BASE 5 3.1. CULPABILIDADE DO AGENTE 6 3.2. ANTECEDENTES DO AGENTE 7 3.3. CONDUTA SOCIAL DO AGENTE 11 3.4. PERSONALIDADE DO AGENTE 11 3.5. MOTIVOS DO CRIME 13 3.6. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME 13 3.7. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME 14 3.8. COMPORTAMENTO DA VÍTIMA 15 4. 2ª FASE: APLICAÇÃO DA PENA INTERMEDIÁRIA 16 4.1. AGRAVANTES 20 4.1.1. REINCIDÊNCIA 20 4.1.1.1. CONDENAÇÕES QUE NÃO SE APLICAM A REINCIDÊNCIA 24 4.1.2.MOTIVOS DO CRIME 25 4.1.3. CONEXÃO DELITIVA 25 4.1.4. MODO DE EXECUÇÃO 25 4.1.5. MEIOS DE EXECUÇÃO 26 4.1.6. RELAÇÕES DE PARENTESCO 26 4.1.7. CONTRA CRIANÇA, MAIOR DE 60 ANOS, ENFERMO OUMULHER GRÁVIDA 27 4.2. ATENUANTES 27 4.2.1. MENORIDADE RELATIVA (ART. 65, I) 28 4.2.2. SENILIDADE (ART. 65, I) 28 4.2.3. CONFISSÃO ESPONTÂNEA (ART. 65, III, D) 29 4.2.3. COAÇÃO FÍSICA OU MORAL RESISTÍVEL (art. 65, III, c) 32 4.2.4. ATENUANTES INOMINADAS (ART. 66) 32 5. 3ª FASE: APLICAÇÃO DA PENA DEFINITIVA 33 6. REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA38 6.1. RECLUSÃO 38 6.2. DETENÇÃO 39 3 1. NOÇÕES INICIAIS Inicialmente, devemos lembrar do postulado “não há pena sem prévia cominação legal”. Ou seja, é necessário seguir o princípio da legalidade. Praticada a infração, surge para o Estado o poder-dever de punir o infrator com a aplicação da pena. Todavia, para poder aplicar a sanção é necessário que se observe o devido processo legal. O processo legal se encerra com a sentença condenatória transitada em julgado, sendo esta o ato judicial que impõe ao condenado a pena individualizada. A sentença fixará a pena seguindo justamente o que dispõe a lei sobre a aplicação da pena, conforme o critério adotado. Não é atoa lembrar que o Estado exerce seu poder punitivo de aplicação da pena através do Poder Judiciário. A transação penal e suspensão condicional do processo não são penas, mas medidas despenalizadoras. ⚠ ATENÇÃO No CP atual, vigora o critério trifásico de fixação da pena (Nelson Hungria), como veremos, mas já vigorou a sistemática bifásica, vejamos: Antes da reforma da Parte Geral do Código Penal, ocorrida em 1984, discutia-se qual o melhor sistema a ser adotado nessa matéria. Prevalecia o entendimento pelo qual o juiz deveria aplicar a pena percorrendo somente duas fases (sistema bifásico): num primeiro momento, avaliava as circunstâncias judiciais juntamente com as agravantes e atenuantes para, em seguida, considerar eventuais causas de aumento e diminuição de pena. Era o critério defendido por Roberto Lyra1 2. FIXAÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE O primeiro passo depois da condenação é calcular a pena a ser cumprida pelo sentenciado. O Brasil, nesse ponto, adotou o sistema trifásico de aplicação da pena privativa de liberdade, conforme o art. 68, CP. Art. 68 - SISTEMA TRIFÁSICO - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento. Pelo disposto no artigo, temos as seguintes fases: 1ª Fase: aplicação das circunstâncias judiciais 2ª Fase: aplicação de atenuantes e agravantes 3ª Fase: aplicação das causas de aumento e de diminuição da pena 2.1. PRIMEIRA FASE - CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS O juiz fixa a pena base, atentando para as oito circunstâncias judiciais presentes no art. 59 do CP, sobre a pena simples ou qualificada. Nesse primeiro momento, a pena será fixada entre os limites 1Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) 4 legais, de modo que não pode ficar aquém ou acima do máximo abstratamente cominado. Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção [TEORIA MISTA, ECLÉTICA OU UNIFICADORA] do crime: I - as penas aplicáveis dentre as cominadas; II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos; III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade; IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível. 📌 OBSERVAÇÃO Perceba que o magistrado já parte da pena qualificada (quando for o caso). 2.2 SEGUNDA FASE - AGRAVANTES E ATENUANTES (CP, ARTS. 61 A 67) Aqui o juiz fixará a pena intermediária, também chamada de pena provisória. Neste momento, o magistrado vai considerar as circunstâncias legais, quais sejam as agravantes (art. 61 e 62) e atenuantes (art. 65 e 66), respeitados os limites legais, assim como na primeira fase. Súmula 231-STJ: A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal. ⚠ ATENÇÃO O ponto de partida da segunda fase é a pena base (fixada na primeira fase). 2.3. TERCEIRA FASE - CAUSAS DE AUMENTO E DIMINUIÇÃO DE PENA O juiz fixará a pena definitiva, considerando as causas de aumento e diminuição da pena, podendo elevar a pena acima do máximo cominado ou deixá-la abaixo do mínimo. ⚠ ATENÇÃO O ponto de partida é justamente a pena intermediária. 📌 OBSERVAÇÕES ■ Rogério Sanches chama atenção para o fato de que esse método trifásico de cálculo da pena tem por objetivo viabilizar o exercício do direito de defesa, explicando para o réu os parâmetros que conduziram o juiz na determinação da reprimenda. ■ Caso não exista nenhuma circunstância agravante ou atenuante, bem como causa de aumento ou de diminuição, a pena base aplicada na primeira fase será a pena definitiva. ■ Calculada a pena privativa de liberdade, o magistrado, logo em seguida, deverá anunciar o Regime Inicial de cumprimento de pena. ■ Depois de fixado o regime, o juiz deve analisar a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por penas alternativas 5 (restritivas de direito) ou conceder o sursis (suspensão condicional da execução da pena). ■ A aplicação da pena em um procedimento único, ignorando o sistema trifásico, leva à nulidade da sentença, pois ofende o princípio constitucional da individualização da pena (art. 5º, XLVI, CF). Vamos a cada uma das fases... 3. 1ª FASE: APLICAÇÃO DA PENA BASE Nesta fase, o juiz objetiva fixar a pena base partindo do preceito secundário do tipo penal e considerando as circunstâncias judiciais constantes no art. 59 do CP. Conforme o art. 59: Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção [TEORIA MISTA, ECLÉTICA OU UNIFICADORA] do crime: Perceba, portanto, que temos 8 circunstâncias no total, sendo que 5 são subjetivas e 3 objetivas. A doutrina questiona se as circunstâncias de caráter subjetivo não poderiam configurar um verdadeiro direito penal do autor. Rogério Sanches aponta que para Paulo Queiroz, adotando a Constituição Federal um direito penal garantista compatível somente com o direito penal do fato, critica-se as circunstâncias judiciais subjetivas, pois seriam campo fértil para o direito penal do autor. Todavia, como bem lembra Sanches, não é a tese que prevalece. Para os tribunais superiores, o juiz deve considerar todas as circunstâncias do art. 59 para cumprir o dever de individualizar a pena. Sobre as circunstâncias judiciais, o professor André Estefam diz: “Recebem esse nome porque, com relação a elas, o magistrado tem amplo grau de discricionariedade. Com efeito, o legislador não estabeleceuPARENTESCO No art. 61, II, “e” o agente pratica o fato contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge. 📌 OBSERVAÇÃO37 ■ É preciso observar que, em alguns delitos, a relação de parentesco entre o sujeito ativo e o sujeito passivo figura como elementar (ex.: infanticídio – CP, art. 123). ■ Pode até ser que constitua fator benéfico, como ocorre em relação aos crimes contra o patrimônio cometidos sem violência ou grave ameaça contra a pessoa (nesses casos, incide uma escusa absolutória, impedindo o exercício da pretensão punitiva estatal, quando o fato é cometido contra cônjuge (na constância da sociedade conjugal) ou contra ascendente ou descendente (CP, art. 181); em tais delitos patrimoniais, ainda, o fato somente se procede mediante representação (vale dizer: o crime se torna de ação penal pública condicionada), se o delito é cometido em prejuízo de cônjuge desquitado 37Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) 27 ou judicialmente separado, de irmão ou de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita. ■ Registre-se, por fim, que a agravante relativa a delitos cometidos contra cônjuge não se aplica àqueles praticados contra companheiros, pois se trataria de analogia in malam partem. 4.1.7. CONTRA CRIANÇA, MAIOR DE 60 ANOS, ENFERMO OU MULHER GRÁVIDA Neste ponto devemos ter em mente que crianças, segundo o ECA, são os indivíduos até 12 anos de idade INCOMPLETOS. 📌 OBSERVAÇÃO38 ■ É preciso lembrar que mencionada agravante não se aplicará quando, por exemplo, cuidar-se de infração penal em que tal condição da vítima figure como elementar (p. ex., infanticídio – CP, art. 123), qualificadora ou causa de aumento (p. ex., homicídio doloso – CP, art. 121, § 4º, parte final). ■ A idade da vítima para efeito de se agravar a pena deve ser aferida no momento da conduta, isto é, da ação ou da omissão, a teor do que dispõe o art. 4º do CP (teoria da atividade). 🚨JÁ CAIU Na prova para Promotor de Justiça do Estado de Minas Gerais (FUNDEP - 2022) foi assinalado como CORRETA, a respeito das circunstâncias agravantes e atenuantes, a alternativa que trouxe: “A pena é aumentada se o agente praticar o delito em ocasião de desgraça particular do ofendido.” 38 Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) 4.2. ATENUANTES Em regra, sempre atenuam a pena. Art. 65 - São circunstâncias que sempre atenuam a pena: I - ser o agentemenor de 21, na data do fato, oumaior de 70 anos, na data da sentença; II - o desconhecimento da lei; III - ter o agente: a) cometido o crime pormotivo de relevante valor social ou moral; b) procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as consequências, ou ter, ANTES DO JULGAMENTO, reparado o dano; c) cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima; d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime; e) cometido o crime sob a influência de multidão em tumulto, se não o provocou. 🚨JÁ CAIU Na prova para Juiz Substituto do Estado de São Paulo (VUNESP - 2023), foi assinalado como CORRETA a afirmativa que trouxe: “É circunstância que sempre atenua a pena o desconhecimento da lei.” Art. 66 - A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei (ATENUANTE INOMINADA) Todavia, temos as seguintes exceções: 28 a) Quando a circunstância já constitui ou privilegia o crime; 📌 OBSERVAÇÃO Essa exceção é uma criação doutrinária. Todavia, temos uma corrente que critica essa ideia. Conforme Sanches, a razão de a agravante não incidir quando também qualifica ou constitui o crime é para evitar bis in idem. Em se tratando de atenuantes, não existe esse perigo. Logo, sem previsão legal (e que venha logo lei corrigindo essa lacuna), nos parece que esta exceção ofende o princípio da legalidade, configurando analogia in malam partem (CUNHA, 2020, p. 536). b) Não incide quando a pena base foi fixada no mínimo, pois conforme a súmula 231 do STJ, a incidência da atenuante não pode fixar a pena abaixo do mínimo legal. A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal. 📌 OBSERVAÇÃO Temos doutrina criticando fortemente essa súmula, sendo afirmado que ela viola a individualização da pena e o princípio da legalidade e, conforme alguns, também o princípio da isonomia. c) Não incide quando a agravante for preponderante (art. 67, CP). 📌 OBSERVAÇÃO As atenuantes incidem em todos os crimes dolosos, preterdolosos e culposos, diferentemente das agravantes. Vejamos agora algumas atenuantes importantes: 4.2.1. MENORIDADE RELATIVA (ART. 65, I) O agente é menor de 21 anos na data do fato. Tem por fundamento que o agente apresenta ainda personalidade em desenvolvimento. Lembre-se que mesmo com o Código Civil de 2002 a atenuante permanece, tendo em vista que a preocupação não é com a capacidade civil. Além disso, importante o teor da súmula 74 do STJ: “Para efeitos penais, o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil”. 4.2.2. SENILIDADE (ART. 65, I) O agente é maior de 70 anos na data da sentença. Perceba que não abrange todos os idosos! Tem por fundamento, conforme Sanches, que as alterações físicas e psíquicas que influem no ânimo do criminoso idoso. Menor capacidade de suportar integralmente a pena. 📌 OBSERVAÇÃO ■ “Data da sentença” quer dizer a decisão que primeiro o CONDENA, não abrangendo o acórdão meramente confirmatório. ■ Perceba o seguinte: no caso de o agente ser absolvido com 69 anos, o MP recorre e após 2 anos o 29 tribunal reforma a decisão de primeiro grau e condena o réu. Neste caso também temos a primeira condenação e por isso irá incidir a atenuante. 4.2.3. CONFISSÃO ESPONTÂNEA (ART. 65, III, D) Requisitos: a) A confissão deve ser espontânea, ou seja, não admite interferência externa, não pode ser convencido a confessar; b) Deve ser feita perante a autoridade; 📌 OBSERVAÇÕES ■ Confissão parcial: Réu confessa apenas parcialmente os fatos narrados na denúncia. Ex.: réu foi acusado de furto qualificado; confessa a prática do furto, mas nega a qualificadora do rompimento de obstáculo. Deverá incidir a atenuante da confissão espontânea (STJ HC 328.021-SC)39. ■ Confissão policial retratada em juízo. Conforme Sanches, essa confissão em regra não serve como atenuante, salvo se o juiz na condenação levou em conta também a confissão policial. É o que dispõe a súmula 545 do STJ: Súmula 545-STJ: Quando a confissão for utilizada para a formação do convencimento do julgador, o réu fará jus à atenuante prevista no art. 65, III, d, do Código Penal. O STJ possui entendimento de que se a confissão for utilizada pelo magistrado como 39 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Para ter direito à atenuante no caso do crime de tráfico de drogas, é necessário que o réu admita que traficava, não podendo dizer que era mero usuário (Súmula 630-STJ). Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 17/06/2022 fundamento para a condenação, deve-se aplicar a atenuante da confissão. In verbis: Se a confissão do agente é utilizada pelo magistrado como fundamento para embasar a condenação, a atenuante prevista no art. 65, inciso III, alínea “d”, do CP deve ser aplicada em favor do réu, não importando que, em juízo, este tenha se retratado (voltado atrás) e negado o crime (STJ. 5ª Turma. HC 176.405/RO, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 23/04/2013). Em recente decisão, o STJ pontuou que a aplicação da atenuante independe dea confissão ser utilizada pelo juiz como um dos fundamentos da sentença condenatória. O réu fará jus à atenuante do art. 65, III, 'd', do CP quando houver admitido a autoria do crime perante a autoridade, independentemente de a confissão ser utilizada pelo juiz como um dos fundamentos da sentença condenatória, e mesmo que seja ela parcial, qualificada, extrajudicial ou retratada. (STJ, REsp 1.972.098-SC, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 14/06/2022, DJe 20/06/2022.) Para o STJ: “O art. 65, III, "d", do CP não exige, para sua incidência, que a confissão do réu tenha sido empregada na sentença como uma das razões da condenação. Com efeito, o direito subjetivo à atenuação da pena surge quando o réu confessa (momento constitutivo), e não quando o juiz cita sua 30 confissão na fundamentação da sentença condenatória (momento meramente declaratório). Ademais, viola o princípio da legalidade condicionar a atenuação da pena à citação expressa da confissão na sentença como razão decisória, mormente porque o direito subjetivo e preexistente do réu não pode ficar disponível ao arbítrio do julgador. Afinal, se a lei condicionasse a atenuação da pena à menção da confissão na sentença condenatória, haveria um pressuposto adicional que mudaria o momento constitutivo do direito subjetivo do réu. Da mesma forma, caso o art. 65, III, "d", do CP impusesse à confissão pressupostos adicionais, não previstos para as demais atenuantes, ou exigisse que a confissão produzisse certos efeitos práticos sobre a investigação criminal, não haveria que se falar em legítima expectativa à redução da pena por parte do acusado que não cumprisse todos os requisitos legais. Essa restrição ofende também os princípios da isonomia e da individualização da pena, por permitir que réus em situações processuais idênticas recebam respostas divergentes do Judiciário, caso a sentença condenatória de um deles elenque a confissão como um dos pilares da condenação e a outra não o faça. (...) O sistema jurídico precisa proteger a confiança depositada de boa-fé pelo acusado na legislação penal, tutelando sua expectativa legítima e induzida pela própria lei quanto à atenuação da pena. A decisão pela confissão, afinal, é ponderada pelo réu considerando o trade-off entre a diminuição de suas chances de absolvição e a expectativa de redução da reprimenda. É contraditória e viola a boa-fé objetiva a postura do Estado em garantir a atenuação da pena pela confissão, na via legislativa, a fim de estimular que acusados confessem; para depois desconsiderá-la no processo judicial, valendo-se de requisitos não previstos em lei.” ■ Confissão qualificada: é aquela em que o réu confessa a autoria, mas alega uma causa excludente da ilicitude ou da culpabilidade. 2. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento firmado no Enunciado Sumular n. 545, de que a confissão espontânea do réu sempre atenua a pena, na segunda fase da dosimetria, ainda que tenha sido parcial, qualificada ou retratada em juízo, desde que utilizada para fundamentar a condenação (AgRg no REsp 1.643.268/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, Julgado em 7/3/2017, DJe 17/3/2017). O STF possui entendimento divergente: 5. A confissão qualificada, segundo consolidada jurisprudência desta Suprema Corte, não enseja a incidência da atenuante prevista no art. 65 ,III, “d” do CP. Precedentes. (STF, HC 206827 AgR, Relator(a): EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 28/03/2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-072 DIVULG 12-04-2022 PUBLIC 18-04-2022) ■ Confissão de crime diverso: Ex.: réu é acusado de tráfico de drogas (art. 33 da LD); ele confessa que a droga era sua, negando, porém, a traficância. Isso significa que ele confessou a prática de um outro crime, qual seja, o porte para consumo 31 pessoal (art. 28 da LD). Não deverá incidir a atenuante da confissão espontânea, considerando que o réu não reconheceu a autoria do fato típico imputado10. ■ Confissão espontânea e compensação. ▸ A confissão espontânea compensa a agravante da reincidência. A Terceira Seção desta Corte Superior, no julgamento do EREsp 1.154.752/RS, de relatoria do Ministro Sebastião Reis Júnior, firmou o entendimento segundo o qual a atenuante da confissão espontânea, uma vez que compreende a personalidade do agente, é circunstância preponderante, devendo ser compensada coma agravante da reincidência, igualmente preponderante (HC 527.285/SP – 2019) ▸ A atenuante da confissão espontânea pode ser compensada com a agravante da promessa de recompensa (STJ, HC 318.594/SP). ▸ A atenuante da confissão espontânea pode ser compensada com a agravante de violência contra a mulher (STJ, AgRg 689064). ▸ Em caso de multirreincidência, é vedada a compensação integral. A multirreincidência revela maior necessidade de repressão e rigor penal, a prevalecer sobre a atenuante da confissão, sendo vedada a compensação integral. Assim, em caso de multirreincidência, prevalecerá a agravante e haverá apenas a compensação parcial/proporcional (mas não integral). STJ. 5ª Turma. HC 620640, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 02/02/202140. Em recente julgado, o STJ reiterou a vedação da compensação integral, permitindo a compensação proporcional. In verbis: É possível, na segunda fase da dosimetria da pena, a compensação integral da atenuante da confissão espontânea com a agravante da reincidência, seja ela específica ou não. Todavia, nos casos de multirreincidência, deve ser reconhecida a preponderância da agravante prevista no art. 61, I, do Código Penal, sendo admissível a sua compensação proporcional com a atenuante da confissão espontânea, em estrito atendimento aos princípios da individualização da pena e da proporcionalidade. (REsp 1.931.145-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 22/06/2022, DJe 24/06/2022. (Tema 585)) 🚨JÁ CAIU Na prova para Juiz Substituto do Estado da Bahia (CESPE - 2019), foi assinalado como CORRETA, à luz da jurisprudência, a afirmativa que trouxe: “A confissão qualificada, na qual o réu alega em seu favor causa descriminante ou exculpante, não afasta a incidência da atenuante de confissão espontânea.” 40 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. A multirreincidência prevalece sobre a atenuante da confissão, sendo vedada a compensação integral.. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 17/06/2022 32 4.2.3. COAÇÃO FÍSICA OU MORAL RESISTÍVEL (art. 65, III, c)41 De acordo com o texto legal, deve-se atenuar a pena daquele que praticou o fato sob coação a que podia resistir. O Código não determina se a circunstância refere-se à coação física (vis absoluta) ou moral (vis relativa) resistíveis; bem por isso, entende-se que ambas estão compreendidas na disposição. Deve-se lembrar que o autor da coação sofrerá a incidência de uma agravante (CP, art. 62, II), ao passo que o coagido, a atenuante em estudo. É preciso recordar, ainda, que se a coação for irresistível, o coagido não responde pelo fato. Na hipótese de coação moral irresistível, dar-se-á a isenção de pena, por estar o agente desprovido de culpabilidade, já que lhe é inexigível outra conduta. Em se tratando de coação física irresistível, ocorrerá um fato penalmente atípico, por falta de conduta penalmente relevante. 4.2.4. ATENUANTES INOMINADAS (ART. 66) Art. 66 - A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei (ATENUANTE INOMINADA) Temos aqui, portanto, que as atenuantes estão em rol exemplificativo, ao contrário das agravantes. Inclusive, é possível aqui inserir a confissão VOLUNTÁRIA (difere da espontânea, pois a 41 Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. –São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) voluntária ocorre quando o agente tem alguma influência externa). Outro ponto relevante é que aqui também tem sido inserida a coculpabilidade. Segundo Márcio Cavalcante42, “por coculpabilidade entende-se a reprovação que deve recair sobre o Estado quando este não proporcionar ao autor do delito a oportunidade de escolher não se enveredar pela senda criminosa. Esclarece a doutrina que “há sujeitos que têm um menor âmbito de autodeterminação, condicionado desta maneira por causas sociais. Não será possível atribuir estas causas sociais ao sujeito e sobrecarregá-lo com elas no momento da reprovação de culpabilidade " (ZAFFARONI e PIERANGELI. Manual de direito penal brasileiro - Parte Geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 613). Ressalta, o referido autor, que “a Teoria da coculpabilidade é uma espécie de corresponsabilidade social (do Estado) quanto à criminalidade, na medida em que, estabelecidos determinados direitos e garantias pela Constituição Federal, deveriam estes ser concretizados na vida de todos os cidadãos. Não concretizados tais direitos, deve a reprovabilidade da conduta criminosa dos cidadãos aos quais não foram oferecidas condições plenas de desenvolvimento pessoal ser mitigada, pois a culpa pela formação desses agentes criminosos seria em parte do Estado, aplicando-se a atenuante genérica do art. 66 do CP”. É possível, a depender do caso concreto, que o juiz reconheça a teoria da COCULPABILIDADE como sendo uma atenuante genérica prevista no art. 66 do 42 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Possibilidade de reconhecimento da coculpabilidade como atenuante genérica. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 17/06/2022 33 Código Penal. STJ. 5ª Turma. HC 411.243/PE, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 07/12/2017. ⚠ ATENÇÃO O STJ, no AgRg no REsp 1770619 / PE, pontuou que 2. A teoria da coculpabilidade não pode ser erigida à condição de verdadeiro prêmio para agentes que não assumem a sua responsabilidade social e fazem da criminalidade ummeio de vida. 🚨JÁ CAIU Na prova para Defensor Público do Estado de Santa Catarina (Banca FCC - Ano 2021), foi assinalado como CORRETA a afirmativa a seguir: “A ideia de coculpabilidade pode ser exemplificada na legislação brasileira pela circunstância atenuante de pena de baixo grau de instrução ou escolaridade do agente nos crimes ambientais”. Na prova para Defensor Público do Estado de São Paulo (Banca FCC - Ano 2019), foi assinalado como CORRETA a afirmativa a seguir: “De acordo com a teoria da coculpabilidade, na forma como foi proposta por Eugenio Raúl Zaffaroni, o agente que não teve acesso às mesmas oportunidades e direitos conferidos a outros indivíduos da sociedade possui limitado âmbito de autodeterminação, o que enseja a redução do seu grau de culpabilidade.” Na prova para Promotor de Justiça do Estado de Goiás (Banca Própria - Ano 2019), foi considerada como CORRETA a afirmativa a seguir: “A coculpabilidade às avessas, segundo ensina a doutrina, pode envolver a reprovação penal mais severa quanto aos crimes praticados por pessoas dotadas de elevado poder econômico e que abusam dessa vantagem no cometimento de delitos em regra prevalecendo-se das facilidades proporcionadas pelo livre trânsito nos centros de controle político e econômico”. 5. 3ª FASE: APLICAÇÃO DA PENA DEFINITIVA Tem por finalidade anunciar a pena definitiva, utilizando as causas de aumento e diminuição de pena, partindo da pena intermediária. As causas de aumento e diminuição estão espalhadas pelo Código, bem como pela legislação especial extravagante. As causas de aumento e diminuição da pena podem ser genéricas ou específicas. Genéricas são as previstas na Parte Geral do CP e aplicáveis aos crimes em geral. Específicas são aquelas previstas na Parte Especial do CP e na legislação extravagante. São aplicáveis somente a determinados crimes. Na terceira fase (incidência de causas de aumento e de diminuição), a pena pode ultrapassar os limites legais. As causas de diminuição podem estabelecer uma pena abaixo do mínimo legal. As causas de aumento podem elevar a pena acima do máximo legal. 📌 OBSERVAÇÕES ■ O valor da majorante e da minorante está identificado na lei; ■ O juiz não está adstrito aos limites mínimo e máximo do preceito secundário. 34 O professor Rogério Sanches aponta a seguinte diferença entre as causas de diminuição e de aumento com as causas agravante e atenuantes: CAUSAS DE AUMENTO E DIMINUIÇÃO AGRAVANTES E ATENUANTES Terceira fase Segunda fase O quantum está na lei O quantum é judicial. O juiz não está adstrito aos limites. O juiz está adstrito aos limites mínimo e máximo do preceito secundário Havendo apenas uma causa de aumento ou uma de diminuição, o juiz com base no quantum previsto na lei deve aumentar ou diminuir a pena. Todavia, maior dificuldade reside quando tivermos concurso de causas de aumento e/ou diminuição: ■ Concurso homogêneo: concursos de causa de aumento ou concurso de causa de diminuição. ■ Concurso heterogêneo: Concurso de causa de aumento e diminuição. a) CONCURSO HOMOGÊNEO DE CAUSAS DE AUMENTO Aqui é possível termos o seguinte cenário: ⬥ Duas causas de aumento previstas na PARTE GERAL: O juiz, sem escolha, aplica as duas causas de aumento. Inclusive, deve-se observar o princípio da incidência isolada (o segundo aumento recai sobre a pena precedente/originária, e não sobre a pena já aumentada). Para ficar mais claro: Rogério Sanches dá o seguinte exemplo para entendermos o princípio da incidência isolada: Pena-intermediária de 6 anos. Sobre ela incidirão duas causas de aumento previstas na parte geral: uma majora de 1/3, a outra de 1/2. A operação se resume: 6 anos + 1/3 de 6 anos (2 anos) + 1/2 de 6 anos (3 anos) = 11 anos de prisão (6 + 2 + 3). Percebam que o juiz primeiro aumenta a pena de 1/3 (6 anos + 1/3 = 8 anos). O segundo aumento (1/2) recai também sobre a pena-intermediária de 6 anos, somando-se, em seguida, os dois resultados. Atenção: não se aplica, no caso, o princípio da incidência cumulativa (segundo aumento recai sobre a pena já aumentada), pois prejudicaria o réu, como se nota da operação: 6 anos + 1/3 de 6 anos (2 anos) = 8 anos. 8 anos + 1/2 de 8 anos (quatro anos) = 12 anos de prisão (6 + 2 + 4). (CUNHA, 2020, p. 547). ⬥ Duas causas de aumento previstas na PARTE ESPECIAL: Aplicamos aqui o art. 68, parágrafo único do CP. Assim, no concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua. Portanto, o juiz escolhe aplicar as 2 causas de aumento (observando o princípio da incidência isolada), ou ainda aplicar somente a que mais aumenta. ⚠ ATENÇÃO O juiz aqui decide com base no princípio da suficiência da pena. ⬥ Causas de aumento previstas na PARTE GERAL e outra na PARTE ESPECIAL: Nesse caso, o juiz não aplicará o art. 68, parágrafo único. Assim, o 35 juiz aplicará os dois aumentos. Observa-se também o princípio da incidência isolada. b) CONCURSO HOMOGÊNEO DE CAUSAS DE DIMINUIÇÃO ⬥ Duas causas de diminuição previstas na PARTE GERAL do CP: O juiz aplica as duas causas de diminuição. ⚠ ATENÇÃO Aqui o juiz não observa o princípio da incidência isolada, mas sim o PRINCÍPIO DA INCIDÊNCIA CUMULATIVA. Ou seja, a segunda diminuição recai sobre a pena já diminuída. ⬥ Duas causas de diminuição previstas na PARTE ESPECIAL DO CP: Neste caso, o magistrado irá aplicar o art. 68, §único. Ou seja, poderá escolher aplicar as 2 causas de diminuição (princípio da incidência cumulativa) ou aplicar somente que mais diminui. ⬥ Causa de diminuição prevista na PARTE GERAL E OUTRA NA PARTE ESPECIAL: O juiz terá que aplicar as duas causas, observandoo princípio da incidência cumulativa. c) CONCURSO HETEROGÊNEO DE CAUSAS DE AUMENTO E DIMINUIÇÃO Aqui o juiz deve aplicar as duas causas. A doutrina ainda sugere que o juiz primeiro aumente e depois diminui. 🚨JÁ CAIU Na prova para Juiz Substituto do Estado do Mato Grosso do Sul (FCC - 2020), foi assinalado como CORRETA, sobre aplicação da pena, a afirmativa que trouxe: “se concorrerem duas qualificadoras em um mesmo crime, aceita a jurisprudência que só uma delas incida como tal, podendo a outra servir como circunstância agravante, se cabível.” Na prova para Promotor de Justiça do Estado do Paraná (Banca Própria - 2019), foram consideradas CORRETAS as afirmativas: “I - Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito. II - O aumento na terceira fase de aplicação da pena no crime de roubo circunstanciado exige fundamentação concreta, não sendo suficiente para a sua exasperação a mera indicação do número de majorantes. III - É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base. IV - É admissível a adoção do regime prisional semiaberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a quatro anos se favoráveis as circunstâncias judiciais.” Imagine que uma pessoa foi condenada pela prática de roubo circunstanciado (art. 157, §2º, II, V e VII do CP), de modo que o juiz reconheceu a existência de três causas de aumento da pena. Nesse caso, aplica-se o seguinte entendimento sumulado: Súmula 443-STJ: O aumento na terceira fase da aplicação da pena no crime de roubo circunstanciado exige fundamentação concreta, não sendo suficiente para a sua exasperação a mera indicação do número de majorantes. 36 Diante dessa situação, cabe ao juiz utilizar uma das majorantes na terceira fase da dosimetria da pena, aumentando em 1/3 a pena, mas utilizar as demais na primeira fase, quando da aplicação da pena base (art. 59 do CP).43 Nesse sentido, é o entendimento jurisprudencial do STJ: 1. Diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, o STJ passou a acompanhar a orientação da Primeira Turma do STF, no sentido de ser inadmissível o emprego do writ como sucedâneo de recurso ou revisão criminal, a fim de que não se desvirtue a finalidade dessa garantia constitucional, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade. 2. A questão jurídica trazida nos presentes autos e submetida ao crivo da Terceira Seção diz respeito, em síntese, à valoração de majorantes sobejantes na primeira ou na segunda fase da dosimetria da pena, a depender se a causa de aumento traz patamar fixo ou variável. Contudo, não é possível dar tratamento diferenciado à causa de aumento que traz patamar fixo e à que traz patamar variável, porquanto, além de não se verificar utilidade na referida distinção, o mesmo instituto jurídico teria tratamento distinto a depender de critério que não integra sua natureza jurídica. 3. Quanto à possibilidade propriamente dita de deslocar a majorante sobejante para outra fase da dosimetria, considero que se trata de providência que, além de não contrariar o sistema trifásico, é a que melhor se coaduna com o princípio da 43 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Havendo pluralidade de causas de aumento de pena e sendo apenas uma delas empregada na terceira fase, as demais podem ser utilizadas nas demais etapas da dosimetria da pena. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 16/08/2023 individualização da pena. De fato, as causas de aumento (3ª fase), assim como algumas das agravantes, são, em regra, circunstâncias do crime (1ª fase) valoradas de forma mais gravosa pelo legislador. Assim, não sendo valoradas na terceira fase, nada impede sua valoração de forma residual na primeira ou na segunda fases. 4. A desconsideração das majorantes sobressalentes na dosimetria acabaria por subverter a própria individualização da pena realizada pelo legislador, uma vez que as circunstâncias consideradas mais gravosas, a ponto de serem tratadas como causas de aumento, acabariam sendo desprezadas. Lado outro, se não tivessem sido previstas como majorantes, poderiam ser integralmente valoradas na primeira e na segunda fases da dosimetria. 5. Escorreita a valoração das majorantes sobressalentes na primeira fase da dosimetria da pena, mantém-se a pena-base fixada pelo Tribunal de origem, em 4 anos e 7 meses de reclusão. Quanto à agravante da reincidência, deve ser observado o parâmetro de 1/6 utilizado por esta Corte Superior, motivo pelo qual se fixa a pena intermediária em 5 anos e 3 meses de reclusão. Por fim, fica mantida a causa de aumento em 1/3, totalizando uma pena de 7 anos de reclusão, em regime fechado. 6. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício apenas para redimensionar a agravante da reincidência para 1/6, resultando uma pena de 7 anos de reclusão. (HC n. 463.434/MT, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, julgado em 25/11/2020, DJe de 18/12/2020). 🚨JÁ CAIU Na prova para Defensor Público do Estado do Mato https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/47951a40efc0d2f7da8ff1ecbfde80f4 https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/47951a40efc0d2f7da8ff1ecbfde80f4 37 Grosso do Sul (Banca: FGV - 2022), foi assinalado como CORRETA a seguinte afirmativa: “No que concerne à exasperação da sanção básica do delito de roubo, é correto afirmar, quanto ao cálculo da pena, que é possível o deslocamento para a primeira fase da dosimetria, da causa de aumento sobejante”. Praticado o crime com mais de uma qualificadora, uma será utilizada para qualificar o crime e as demais sobressalentes serão valoradas na primeira ou segunda fase da dosimetria da pena. Esse é o entendimento do STJ: 1. O Superior Tribunal de Justiça, seguindo entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, passou a não admitir o conhecimento de habeas corpus substitutivo de revisão criminal. No entanto, deve-se analisar o pedido formulado na inicial, tendo em vista a possibilidade de se conceder a ordem de ofício, em razão da existência de eventual coação ilegal. 2. A nulidade apresentada pelos impetrantes relativa à falta de juntada do áudio dos debates ocorridos na sessão de julgamento, contendo supostas ameaças proferidas pelo filho da vítima contra o paciente, advogados e jurados não foi debatida pelo Tribunal de origem, de modo que fica inviabilizada a apreciação da matéria por esta Corte, sob pena de indevida supressão de instância. 3. É inviável a exclusão das qualificadoras reconhecidas pelo Conselho de Sentença, sob pena de ofensa à soberania dos veredictos. 4. Reconhecida a incidência de duas ou mais qualificadoras, uma delas poderá ser utilizada para tipificar a conduta como delito qualificado, promovendo a alteração do quantum de pena abstratamente previsto, sendo que as demais poderão ser valoradas na segunda fase da dosimetria, caso correspondam a uma das agravantes ou como circunstância judicial, na primeira fase da etapa do critério trifásico. Na espécie, ao exasperar a pena-base utilizando como fundamento a incidência de uma das qualificadoras do crime de homicídio, a Corte local alinhou-se à jurisprudência deste Sodalício, inexistindo, no ponto, coação ilegal a ser reconhecida ex officio. 5. A valoração negativa das consequências do crime apresenta fundamentação idônea, pois, ainda que a morte seja inerente ao tipo do homicídio, no caso, o que foi valorado negativamente foi o fato de a morte transbordar as consequências ordinárias do crime, em razão de a vítima deixar filhos menores privados do convívio paterno. 6. Habeas corpus não conhecido. (HC n.505.263/RJ, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 27/8/2019, DJe de 10/9/2019.) O mesmo raciocínio empregado para as qualificadoras é utilizado quando houver pluralidade de causas de aumento, de modo que, quando não forem utilizadas na terceira fase da dosimetria da pena, serão empregadas nas demais fases. 🚨JÁ CAIU Na prova para Defensor Público do Estado do Amapá (Banca: FCC - 2022), foi assinalado como CORRETA a seguinte afirmativa: “De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o deslocamento das majorantes sobressalentes para outras fases da dosimetria da pena é admissível na primeira ou na segunda fase”. 38 6. REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA Conforme o art. 68, CP, depois de calculada a pena definitiva, o juiz deve anunciar o regime inicial de cumprimento de pena (art. 33, CP). Art. 33 - A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado. § 1º - Considera-se: a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média; b) regime semi-aberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar; c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado. § 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: a) o condenado a pena superior a 8 anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado; b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 anos e não exceda a 8, poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto; c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto. § 3º - A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código (circunstâncias judiciais). § 4o O condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais. O regime prisional é também chamado de “regime penitenciário”. É o meio pelo qual se efetiva o cumprimento da pena privativa de liberdade. As espécies de regime prisional são: ▸ Regime fechado; ▸ Regime semiaberto; e ▸ Regime aberto Assim, perceba que o juiz deve observar o seguinte quando da fixação do regime inicial: ■ Espécie de Pena (reclusão ou detenção); ■ Quantidade da pena imposta na sentença (definitiva); ■ Eventual reincidência; ■ Circunstâncias judiciais. 6.1. RECLUSÃO Admite tanto o regime fechado, o semiaberto ou o aberto. Com o Pacote Anticrime, foi criado o regime fechado de segurança máxima. Sendo a pena superior a 8 anos, o regime será o fechado. Sendo superior a 4 e não superior a 8, o regime poderá ser o semiaberto, DESDE QUE NÃO REINCIDENTE, pois se for, o regime será o fechado. Por fim, se a pena não for superior a 4 anos, o regime pode ser o aberto, DESDE QUE NÃO REINCIDENTE. 39 🚨JÁ CAIU Na prova para Defensor Público do Estado de Roraima (Banca CESPE/CEBRASPE, Ano 2023), foi assinalada como correta a seguinte afirmativa: “A pena de reclusão pode ser cumprida em regime aberto”. ⚠ ATENÇÃO No último caso, se houver reincidência, o condenado começará a cumprir pena no regime fechado ou no semiaberto? De acordo com o STJ (súmula 269), o juiz decidirá se ele cumprirá no semiaberto ou no fechado observando as circunstâncias judiciais (art. 59, CP). É admissível a adoção do regime prisional semi-aberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a quatro anos se favoráveis as circunstâncias judiciais. Súmula 718 e 719 do STF A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada. A imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea. Assim, o juiz deve fundamentar com base na gravidade do caso concreto e não na gravidade em abstrato do crime. 🚨JÁ CAIU Na prova para juiz de Direito substituto do Distrito Federal e Territórios (Banca CESPE/CEBRASPE, Ano 2023), foi assinalada como correta a seguinte afirmativa, com base na jurisprudência: “Marcos, reincidente, foi preso em flagrante pelo crime de roubo e condenado a cumprir pena privativa de liberdade de quatro anos de reclusão. Em relação a essa situação hipotética, Marcos poderá iniciar o cumprimento da pena no regime semiaberto, uma vez presentes os requisitos para a concessão do benefício”. 6.2. DETENÇÃO Não admite inicial fechado. A pena de detenção se inicia no regime aberto ou semiaberto. A pena de detenção não pode começar em regime fechado e não há exceção a essa regra. Entretanto, nada impede que, após o início do cumprimento de pena, o juiz da execução determine a regressão para o regime fechado. Se a pena for superior a 4 anos, será semiaberto. Não suplantando 4 anos, o regime poderá ser o aberto, desde que não reincidente. 📌 OBSERVAÇÕES ■ O regime fechado é possível na detenção. O que não se admite é o regime INICIAL. Assim, é possível o regime fechado na detenção por meio da regressão. ■ No caso da prisão simples, nem mesmo por meio da regressão é possível o cumprimento em regime fechado. ■ Tratando-se de lideranças de organizações criminosas armadas, ou que tenham armas à disposição, o início do cumprimento da pena deve ser em estabelecimentos penais de segurança máxima (art. 2º, §8º da Lei 12. 850/13). 40 ■ Conforme o Estatuto do índio, as penas de reclusão e de detenção serão cumpridas, se possível, em regime especial de semiliberdade, no local de funcionamento do órgão federal de assistência aos índios mais próximos da habitação do condenado (Art. 56, §único). ■ Como fica a questão da DETRAÇÃO? Deve ser observada pelo juiz na fixação da pena? A detração é a contagem na execução da pena privativa de liberdade, do tempo em que o condenado teve a sua liberdade restringida por causa distinta da condenação, prevista no art. 42 do CP, o qual dispõe que: Art. 42 do CP. Computam-se, na pena privativa de liberdade e na medida de segurança, o tempo de prisão provisória, no Brasil ou no estrangeiro, o de prisão administrativa e o de internação em qualquer dos estabelecimentos referidos no artigo anterior. O art. 387, §2º do CPP, por sua vez, dispõe que: § 2º O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade. Assim, o juiz deve considerar o tempo de prisão provisória, ainda que isso altere o regime que seria imposta na sentença originariamente. Esse é o entendimento dos tribunais também. O professor Rogério Sanches discorda e critica tal dispositivo. Fixada pena privativa de liberdade e determinado o regime prisional, o juiz deve verificar a possibilidade de substituição da prisão por penas alternativas (penas restritivas de direito ou multa) ou ainda modificar a sua execução (sursis, por exemplo).ao juiz criminal qualquer critério para sua aferição, limitando-se a enunciar quais são os fatores a serem levados em consideração. O juiz é que dará a eles o devido peso e estabelecerá como devem influenciar no cálculo da pena-base”.2 📌 OBSERVAÇÕES ■ Observe que o CP não fixa o “quantum” para as circunstâncias judiciais. Assim, fica a critério do magistrado que deverá fundamentar sempre a sua decisão. ■ A jurisprudência faz uma exceção em relação ao comportamento da vítima, o qual poderá ser favorável ao réu ou será circunstância judicial neutra. Assim sendo, o comportamento da vítima, de acordo com a jurisprudência, nunca poderá prejudicar o réu. O professor Rogério Sanches lembra que a Lei do Pacote Anticrime (Lei 13.964/19) incorporou o art. 489, §1º do CPC para constar as situações nas quais não se considera fundamentada a decisão judicial. 2Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) 6 A doutrina, no caso da primeira fase da aplicação da pena privativa de liberdade, propõe que o juiz siga a fração de 1/8 para aumentar a pena prevista no preceito secundário do tipo. A jurisprudência tem sugerido a fração de 1/6. O fato é que o magistrado deve partir sempre da pena mínima e está atrelado ao limite máximo. Havendo circunstâncias desfavoráveis, esta pena deve caminhar no sentido da pena máxima. Se ficar constatado o concurso entre circunstâncias favoráveis e desfavoráveis, o magistrado deve invocar, por analogia, o artigo 67 do Código Penal (aplicando a preponderante) – (CUNHA, 2020, p. 510 – Grifo nosso). 📌 OBSERVAÇÕES ■ Na primeira fase, a pena não pode, em hipótese alguma, ultrapassar os limites legais. Assim, ainda que todas as circunstâncias judiciais sejam favoráveis ao réu, a pena não pode ser inferior ao mínimo. De outro lado, ainda que todas as circunstâncias judiciais sejam desfavoráveis ao réu, a pena não pode ultrapassar o máximo. ■ Nessa fase, as circunstâncias judiciais têm caráter residual/subsidiário. Isso ocorre porque um determinado fator só será considerado circunstância judicial se não caracterizar circunstância legal. Assim sendo, o magistrado somente poderá utilizar um determinado dado como circunstância judicial, se tal dado não caracterizar uma atenuante, agravantes, causa de diminuição ou causa de aumento de pena. ■ Nessa fase, é necessário ter cuidado com o bis in idem, ou seja, não é possível admitir a dupla punição pelo mesmo fato. Se um determinado fator já foi utilizado como agravante genérica, não será possível utilizar o mesmo fator como circunstância judicial desfavorável. ■ Toda e qualquer pena, ainda que aplicada no mínimo legal, deve ser fundamentada. Fundamentos: 1º) Art. 93, IX, CF. 2ª) O juiz é um servidor público como outro qualquer. Assim sendo, o magistrado deve prestar contas da sua atuação para toda a sociedade (e não apenas para o réu). Em suma: a necessidade de fundamentação judicial não se refere apenas ao direito do réu, mas também ao direito da sociedade de saber o porquê daquela decisão. Vejamos agora as principais circunstâncias judiciais: 3.1. CULPABILIDADE DO AGENTE A culpabilidade passou a ser expressamente mencionada como circunstância judicial somente em 1984 (Reforma da Parte Geral), substituindo as expressões “intensidade do dolo” e “grau de culpa”.3 Cabe dizer que não se confunde com a culpabilidade que é substrato do crime (do conceito analítico). Aqui, trata-se do maior ou menor grau de reprovabilidade da conduta do agente ou censurabilidade do ato; dessa forma, quanto mais reprovável a conduta do agente, maior será a pena-base. 3. No tocante à culpabilidade, para fins de individualização da pena, tal vetorial deve ser compreendida como o juízo de reprovabilidade da conduta, ou seja, o menor ou maior grau de censura do comportamento do réu, não se tratando de 3Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) 7 verificação da ocorrência dos elementos da culpabilidade, para que se possa concluir pela prática ou não de delito. Com efeito, a crueldade da prática delitiva e a extrema violência empregada exigem o incremento da básica a título de culpabilidade. (STJ,AgRg no HC n. 737.697/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 24/5/2022, DJe de 31/5/2022.) 🚨JÁ CAIU Na prova para Promotor de Justiça do Estado do Paraná (Banca Própria - 2021), foi assinalado como INCORRETA, sobre culpabilidade, a afirmativa que trouxe: “Não é admissível juridicamente o exercício da legítima defesa por parte de inimputável por doença mental contra agressões injustas, atuais ou iminentes, de terceiros, mas a legítima defesa exercida por outrem, contra agressão injusta, atual ou iminente, de inimputável por doença mental, sujeita-se a limitações ético-sociais, que definem a permissibilidade de defesa.” 3.2. ANTECEDENTES DO AGENTE Tal circunstância representa a vida pregressa. Para boa parte da doutrina, não se limitam à análise de eventuais antecedentes criminais. É de ver, contudo, que o debate sobre os antecedentes se limitarem ou não à existência de eventuais apontamentos na “folha de antecedentes” (isto é, serem ou não reduzidos às “passagens” criminais) tem, na verdade, pouca relevância. Isto porque, ainda que se conclua pela tese da exclusiva análise da ficha criminal do agente, os demais dados relevantes que integram o passado do condenado poderão ser tomados em consideração em outra das circunstâncias judiciais (a saber, a “conduta social”).4 Para o Professor André Estefam: “esta circunstância não se limita ao exame da ficha criminal (embora saiba-se que, na prática, são precários os dados contidos num processo criminal com respeito ao histórico do agente). Cremos ser possível, nesse sentido, que entrem em consideração eventuais passagens pela Vara da Infância e Juventude.” Os Tribunais Superiores, contudo, tendem a encarar a questão sob outra perspectiva, admitindo que os registros de condenações no âmbito da Justiça da Infância e Juventude sejam valorados no âmbito da personalidade do agente (seja para efeito de aplicação da pena, seja para, no curso do processo, fundamentar a decretação da prisão preventiva). Vejamos: (...) Embora os registros de atos infracionais não possam ser utilizados para fins de reincidência ou maus antecedentes, por não serem considerados crimes, podem ser sopesados na análise da personalidade do recorrente, reforçando os elementos já suficientes dos autos que o apontam como pessoa perigosa e cuja segregação é necessária. Precedentes. (...)” (STJ, RHC 123.836/AL, rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª T., j. 10-3-2020). Em sentido oposto: HC 338.936-SP, rel. Min. Nefi Cordeiro, 6ª T., j. 17-12-2015 Os tribunais superiores já se manifestaram sobre a valoração de condenações posteriores, vejamos: 4Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) 8 Na dosimetria da pena, as condenações por fatos posteriores ao crime em julgamento não podem ser utilizados como fundamento para valorar negativamente a culpabilidade, a personalidade e a conduta social do réu. STJ. 6ª Turma. HC 189385-RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 20/2/2014 (Info 535)5. Os antecedentes devem, necessariamente, constar na folha de antecedentes do réu. Assim sendo, somente podem ser utilizados como antecedentes criminais os registros contidos na folha de antecedentes do acusado. Súmula 636-STJ: A folha de antecedentes criminais é documento suficiente a comprovar os maus antecedentes e a reincidência. 📌 OBSERVAÇÃO ■ Os fatores desfavoráveis relativos ao passado do réu (que não constam na folha de antecedentes) podem ser utilizados como conduta social ou como personalidade do agente, mas nãocomo antecedente criminal. CONFIGURAÇÃO DOS MAUS ANTECEDENTES ✔ Inquérito policial arquivado ou em andamento não configura maus antecedentes. ✔ Ação penal com absolvição ou em curso também não configuram maus antecedentes, conforme súmula 444 do STJ: 5 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Condenação por fato posterior ao crime em julgamento não gera maus antecedentese. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 17/06/2022 É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base. Tem prevalecido que os atos infracionais não caracterizam maus antecedentes, mas podem servir no estudo da personalidade do agente. Atos infracionais não podem ser considerados maus antecedentes para a elevação da pena-base, tampouco podem ser utilizados para caracterizar personalidade voltada para a prática de crimes ou má conduta social. Há impropriedade na majoração da pena-base pela consideração negativa da personalidade do agente em razão da prévia prática de atos infracionais, pois é incompossível exacerbar a reprimenda criminal com base em passagens pela Vara da Infância. STJ. 5ª Turma. HC 499987/SP, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 30/05/2019. STJ. 6ª Turma. REsp 1702051/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 06/03/20186. Os inquéritos policiais e ações penais em curso não caracterizam “maus” antecedentes, pois, nestes casos, não há uma condenação com trânsito em julgado. Assim, somente as CONDENAÇÕES DEFINITIVAS que não caracterizam a agravante da reincidência. O STJ assim já manifestou: 3. O conceito de maus antecedentes, por ser mais amplo, abrange não apenas as condenações definitivas por fatos anteriores cujo trânsito em julgado 6 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Os atos infracionais não podem ser valorados negativamente na dosimetria da pena. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 17/06/2022 9 ocorreu antes da prática do delito em apuração, mas também aquelas transitadas em julgado no curso da respectiva ação penal, além das condenações transitadas em julgado há mais de cinco anos, as quais também não induzem reincidência, mas servem como maus antecedentes. (HC 185.894/MG). (...) O Pleno do STF, ao julgar o RE 591.054/SC, com repercussão geral, de relatoria do Ministro Marco Aurélio (DJe 26.2.2015), firmou orientação no sentido de que a existência de inquéritos policiais ou de ações penais sem trânsito em julgado não pode ser considerada como maus antecedentes para fins de dosimetria da pena. 8.2. Para efeito de aumento da pena, somente podem ser valoradas como maus antecedentes decisões condenatórias irrecorríveis, sendo impossível considerar para tanto investigações preliminares ou processos criminais em andamento, mesmo que estejam em fase recursal, sob pena de violação ao artigo 5º, inciso LIV (presunção de não culpabilidade), do texto constitucional. 9. Precedentes. (...)” (ARE 1.231.853 AgR, rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª T., j. 3-3-2020) Perceba que não existe prazo depurador para os maus antecedentes. Conforme Rogério Sanches, ultimamente, no entanto, tem ganhado força a tese de que a superação do quinquênio depurador deve afastar tanto a circunstância agravante (reincidência) quanto o aumento fundamentado na circunstância judicial (maus antecedentes), pois não se pode admitir que uma condenação anterior tenha efeitos perpétuos e contrarie o propósito, demonstrado pelo legislador nas regras da reincidência, de apagar da vida do indivíduo as faltas passadas. O STJ é francamente favorável à possibilidade de considerar como maus antecedentes as condenações que não mais caracterizam a reincidência7. Neste sentido: 2. De acordo com a jurisprudência desta Eg. Corte, condenações atingidas pelo período depurador de 5 anos, previsto no art. 64, inciso I, do Código Penal, embora afastem os efeitos da reincidência, não impedem a configuração dos maus antecedentes. 3. No caso, o agravante possui maus antecedentes, razão pela qual, acertadamente, a pena-base foi fixada acima do mínimo legal e afastada a incidência da causa de diminuição do art. 33, §4º, da Lei de Drogas” (AgRg no Ag no REsp 1.864.887/SP, Quinta Turma, j. 23/06/2020). “Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, condenações pretéritas com trânsito em julgado, alcançadas pelo prazo depurador de 5 (cinco) anos previsto no art. 64, inciso I, do Código Penal, embora afastem os efeitos da reincidência, não impedem a configuração de maus antecedentes” (AgRg no REsp 1.819.128/SP, Sexta Turma, j. 30/06/2020). 7Informações extraídas do blog “Meu site jurídico” e disponível em: ttps://meusitejuridico.editorajuspodivm.com.br/2020/08/26/stf-penas-exti ntas-ha-mais-de-cinco-anos-podem-ser-consideradas-como-maus-antece dentes/ 10 Em virtude da relevância do tema e da controvérsia que o cerca, o STF reconheceu a repercussão geral no RE 593.818 RG/SC, julgado pelo plenário em 17/08/2020. Por maioria, o tribunal firmou a seguinte tese: “Não se aplica para o reconhecimento dos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição da reincidência, previsto no art. 64, I, do Código Penal”. Portanto, há 2 sistemas: • SISTEMA DA PERPETUIDADE: a condenação definitiva, para fins de maus antecedentes, é válida para sempre. O STF e o STJ entendem que o sistema da perpetuidade da condenação definitiva para fins de maus antecedentes está em sintonia com os princípios da isonomia e da individualização da pena. • SISTEMA DA TEMPORALIDADE (deve ser utilizado em concursos da Defensoria Pública): uma condenação definitiva, para fins de maus antecedentes, é válida pelo prazo de 5 anos, pois este é o prazo de validade de uma condenação definitiva para fins de reincidência. 5. O tempo transcorrido após o cumprimento ou extinção da pena não opera efeitos quanto à validade da condenação anterior, para fins de valoração negativa dos antecedentes, como circunstância judicial desfavorável. Isso porque o Código Penal adotou o sistema da perpetuidade, haja vista que o legislador não limitou temporalmente a configuração dos maus antecedentes ao período depurador quinquenal, ao contrário do que se verifica na reincidência (CP, art. 64, I), hipótese em que vigora o sistema da temporariedade. Não houve, pois, ilegalidade na valoração dos antecedentes na pena-base. (STJ, AgRg no HC n. 668.427/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 7/6/2022, DJe de 14/6/2022.) INAPLICABILIDADE. ADOÇÃO DO SISTEMA DA PERPETUIDADE PELO CÓDIGO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. - A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que as condenações criminais alcançadas pelo período depurador de 5 anos, previsto no art. 64, inciso I, do Código Penal, afastam os efeitos da reincidência, contudo, não impedem a configuração de maus antecedentes. - O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE n. 593.818/SC (Rel. Ministro ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, DJe 31/8/2020), em regime de repercussão geral, firmou tese no sentido de que ‘não se aplica para o reconhecimento dos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição da reincidência, previsto no art. 64, inciso I, do Código Penal’. (STF, HC 215901) 🚨JÁ CAIU Na prova para Delegado da Polícia Federal (CESPE - 2018), foi apresentado o seguinte texto: “Valter, maior e capaz, foi preso preventivamente em uma das fases de uma operação policial. Ele já era réu em outras três ações penais e estava indiciado em mais dois outros IPs. Nessa situação, as ações penais em curso podem ser consideradas para eventual agravamento da pena-base referente ao crime que resultou na prisão preventiva de Valter, mas os IPs não podem ser considerados para essa mesma finalidade.” Na sistemáticade certo/errado o texto apresentado foi considerado ERRADO. 11 3.3. CONDUTA SOCIAL DO AGENTE Também conhecida como “antecedentes sociais”, é o estilo de vida do réu, correto ou inadequado, perante a sociedade, sua família, ambiente de trabalho, círculo de amizades e vizinhança etc. (...) É preciso cuidado para não confundir a conduta social com os maus antecedentes, os quais se limitam ao passado do réu no âmbito criminal. De fato, uma condenação penal definitiva não pode ser valorada negativamente, no momento da dosimetria da pena-base, como conduta social (ou então a título de personalidade). Mais do que isso, deve-se ter muita atenção para não se valorar duplamente um mesmo dado fático como conduta social e mau antecedente (MASSON, 2020, p. 580). É preciso frisar que não se trata de punir o agente por seu modo de vida (seja ele qual for), porquanto a pena não pode ser mensurada com base em tais elementos. Daí por que só devem ser tomadas como relevantes para a dosimetria da pena atitudes que tenham alguma relação com o ato praticado. Por exemplo: pode o juiz considerar má a conduta social de quem agride verbalmente seus colegas de trabalho, quando condenar o réu por delito de ameaça praticada no ambiente laborativo.8 Cabível reconhecer a conduta social como vetor negativo para a exasperação da pena-base, pois foi ressaltado, de forma idônea, que o réu era um pai e marido violento, tinha péssimo relacionamento com a família e com os vizinhos e gastava toda sua remuneração em álcool e drogas não contribuindo com o orçamento doméstico, demonstrando comportamento 8Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) incompatível com o cidadão comum perante a sociedade. Como se sabe, a circunstância judicial referente à conduta social retrata a avaliação do comportamento do agente no convívio social, familiar e laboral, perante a coletividade em que está inserido. STJ. 6ª Turma. HC 507.207/DF, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 19/05/20209. O fato de o réu ser usuário de drogas não pode ser considerado, por si só, como má-conduta social para o aumento da pena-base. A dependência toxicológica é, na verdade, um infortúnio. STJ. 6ª Turma. HC 201453-DF, julgado em 2/2/201210. 3.4. PERSONALIDADE DO AGENTE É o perfil subjetivo do réu, nos aspectos moral e psicológico, pelo qual se analisa se tem ou não o caráter voltado à prática de infrações penais. Levam-se em conta seu temperamento e sua formação ética e moral, aos quais se somam fatores hereditários e socioambientais, moldados pelas experiências por ele vividas. Tal como na conduta social, as condenações penais anteriores com trânsito em julgado não podem ser utilizadas para valoração negativa da personalidade, devendo restringir-se, na dosimetria da pena-base, à caracterização dos maus antecedentes (MASSON, 2020, p. 581). Interessante ter em mente que a personalidade do agente decorre de uma análise 10CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Conduta sociala. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 17/06/2022 9 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. A pena-base pode ser majorada no vetor da conduta social pelo fato de o réu ser um pai e marido violento e gastar toda a remuneração em álcool e drogas. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 17/06/2022 12 tecnico-cientifico, neste sentido Ney Moura Teles: “a personalidade não é um conceito jurídico, mas do âmbito de outras ciências – da psicologia, psiquiatria, antropologia – e deve ser entendida como um complexo de características individuais próprias, adquiridas, que determinam ou influenciam o comportamento do sujeito.”11 Neste contexto, o professor Rogério Greco sustenta que o julgador não possuiria, via de regra, capacidade técnica para valorar este quesito, vejamos: Acreditamos que o julgador não possui capacidade técnica necessária para a aferição de personalidade do agente, incapaz de ser por ele avaliada sem uma análise detida e apropriada de toda a sua vida, a começar pela infância. Somente os profissionais de saúde (psicólogos, psiquiatras, terapeutas etc.), é que, talvez, tenham condições de avaliar essa circunstância judicial. Dessa forma, entendemos que o juiz não deverá levá-la em consideração no momento da fixação da pena-base. Merece ser frisado, ainda, que a consideração da personalidade é ofensiva ao chamado direito penal do fato, pois prioriza a análise das características penais do seu autor.12 Sobre o assunto há alguns posicionamentos relevantes dos Tribunais: A simples menção à personalidade do infrator, desprovida de elementos concretos, não se presta à negativação da circunstância judicial a que se refere, impossibilitando o 12Curso de direito penal: volume 1: parte geral: arts. 1º a 120 do Código Penal / Rogério Greco. – 24. ed. – Barueri [SP]: Atlas, 2022. 11TELES, Ney Moura. Direito penal – Parte geral, v. II, p. 125-126 acréscimo da pena-base. STJ. 6ª Turma. HC 340007/RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 01/12/201513. A existência de condenações definitivas anteriores não se presta a fundamentar a exasperação da pena-base como personalidade voltada para o crime. Condenações transitadas em julgado não constituem fundamento idôneo para análise desfavorável da personalidade do agente. STJ. 5ª Turma. HC 466746/PE, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 11/12/2018. STJ. 6ª Turma. HC 472654-DF, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 21/02/2019 (Info 643)14. 🚩 NÃO CONFUNDA7 PERSONALIDADE Análise da insensibilidade, desonestidade e modo de agir do criminoso. ANTECEDENTES Histórico criminal do agente (aqui entram as condenações anteriores definitivas). CONDUTA SOCIAL Representa o comportamento do agente no meio familiar, no ambiente de trabalho e no relacionamento com outros indivíduos. 14 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. A existência de condenações definitivas anteriores não se presta a fundamentar o aumento da pena-base como personalidade voltada para o crime. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 17/06/2022 13CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Personalidadee. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 17/06/2022 13 3.5. MOTIVOS DO CRIME Nada mais são do que os motivos de ordem psicológica que levaram o agente a cometer o crime. Não podem ser confundidos com o dolo ou a culpa. Como bem lembra Masson, só terá cabimento essa circunstância judicial quando a motivação não caracterizar elementar do crime, qualificadora, causa de diminuição ou de aumento ou ainda atenuante ou agravante. Andre Estefam sustenta: “São os antecedentes psicológicos da conduta, ou o opróbrio motivador do ato. Um delito pode ser cometido por motivos nobres (p. ex., ameaçar um conhecido roubador para que ele não pratique crimes no bairro) ou reprováveis (p. ex., lesionar gravemente uma pessoa por inveja de seus atributos físicos). Na maioria das vezes, contudo, os motivos do crime não são analisados nessa fase da dosimetria, caso contrário o juiz incorreria em inaceitável bis in idem. Isto porque, em boa parte dos casos, os motivos (quando relevantes) são considerados agravantes ou atenuantes genéricas (p. ex., motivo fútil, torpe, de relevante valor social ou moral) ou mesmo causas de aumento, diminuição, privilégios ou qualificadoras (p. ex., o motivo egoístico qualifica o crime de dano – art. 163, parágrafo único, IV).”15 📌 OBSERVAÇÃO A simples falta de motivos para o delito não constitui fundamentoidôneo para o incremento da pena-base ante a consideração desfavorável da circunstância judicial, que exige a indicação concreta de motivação vil para a prática delituosa. STJ. 6ª 15Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) Turma. HC 289788/TO, Rel. Min. Ericson Maranho (Des. Conv. do TJ/SP), julgado em 24/11/201516. 3.6. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME São os dados acidentais, secundários, relativos à infração penal, mas que não integram sua estrutura, tais como o modo de execução do crime, os instrumentos empregados em sua prática, as condições de tempo e local em que ocorreu o ilícito penal, o relacionamento entre o agente e o ofendido etc. Nesse contexto, o Superior Tribunal de Justiça já admitiu a elevação da pena-base em estelionato no qual a vítima nutria plena confiança no agente (MASSON, 2020, p. 582). ⚠ ATENÇÃO “Note, porém, que muitas das “circunstâncias do crime” (meios ou modos de execução) não podem ser valoradas na primeira fase da dosimetria da pena, em razão do princípio do ne bis in idem. Assim, por exemplo, o emprego de veneno constitui qualificadora do homicídio, atuando na fase preliminar da aplicação da pena (fixação dos limites abstratos), sendo ao juiz vedado destacar este fator para a estipulação da pena-base. A destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa configura qualificadora do furto, valendo a mesma ressalva. Veja, ainda, o emprego de recurso que dificulta ou impossibilita a defesa da vítima, o qual é previsto em lei como agravante genérica (CP, art. 61, II, c).”17 17Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) 16 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Falta de motivos para o crime não é circunstância desfavorável. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 17/06/2022 14 3.7. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME São os efeitos, as marcas que ficaram do crime, sejam para a vítima, sejam para seus familiares. Como bem lembra Masson: Essa circunstância judicial deve ser aplicada com atenção: em um estupro, exemplificativamente, o medo provocado na pessoa (homem ou mulher) vitimada é consequência natural do delito, e não pode funcionar como fator de exasperação da pena, ao contrário do trauma certamente causado em seus filhos menores quando o crime é por eles presenciado. Como alerta o Superior Tribunal de Justiça: “Não é possível a utilização de argumentos genéricos ou circunstâncias elementares do próprio tipo penal para o aumento da pena-base com fundamento nas consequências do delito” (MASSON, 2020, p. 583). 4. Em relação às consequências do crime, que correspondem ao resultado da ação do agente, a avaliação negativa dessa circunstância judicial mostra-se escorreita se o dano material ou moral causado ao bem jurídico tutelado se revelar superior ao inerente ao tipo penal. In casu, o fato da vítima ter sofrido danos físicos duradouros e impotência sexual mesmo após três anos dos fatos, além de suportar trauma, demandam a elevação da pena-base, em atendimento aos princípios da proporcionalidade e da individualização da pena. (AgRg no HC n. 737.697/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 24/5/2022, DJe de 31/5/2022.) Define o professor André Estefam: “Significa a intensidade de lesão ou o nível de ameaça ao bem jurídico tutelado. Também diz respeito ao reflexo do delito com relação a terceiros, não somente no tocante à vítima.” O exaurimento (isto é, quando o agente, depois de consumar o delito e, portanto, encerrar o iter criminis, pratica nova conduta, provocando nova agressão ao bem jurídico penalmente tutelado), por importar em consequências mais graves ao fato, produz um aumento da pena-base, salvo se houver disposição expressa em sentido contrário (ex.: na corrupção passiva o exaurimento é causa de aumento de pena – CP, art. 317, § 1º).18 Para o mestre Rogério Greco: “Os crimes contra a Administração Pública, a nosso ver, encontram-se no rol daqueles cujas consequências são as mais nefastas para a sociedade. Os bandidos de colarinho branco, funcionários de alto escalão na Administração Pública, políticos inescrupulosos e tantos outros que detêm uma parcela do poder, quando efetuam subtrações dos cofres públicos, causam verdadeiras devastações no seio da sociedade. Escolas deixam de receber merendas, hospitais passam a funcionar em estado precário, obras deixam de ser realizadas, a população miserável perece de fome, enfim, são verdadeiros genocidas, uma vez que causam a morte de milhares de pessoas com suas condutas criminosas”.19 📌 OBSERVAÇÃO Cabe lembrar que, em virtude dessa circunstância judicial, a pena do crime tentado será tanto maior quanto mais próximo da consumação se chegar. 20 20Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) 19Curso de direito penal: volume 1: parte geral: arts. 1º a 120 do Código Penal / Rogério Greco. – 24. ed. – Barueri [SP]: Atlas, 2022. 18Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) 15 3.8. COMPORTAMENTO DA VÍTIMA É a atitude da vítima que tem o condão de provocar ou facilitar a prática do crime. Cuida-se de circunstância judicial ligada à vitimologia, isto é, ao estudo da participação da vítima e dos males a ela produzidos por uma infração penal (MASSON, 2020, p. 583). IV - O comportamento da vítima é circunstância judicial ligada à vitimologia, que deve ser necessariamente neutra ou favorável ao réu, sendo descabida sua utilização para incrementar a pena-base. Com efeito, se não restar evidente a interferência da vítima no desdobramento causal, como ocorreu na hipótese em análise, tal circunstância deve ser considerada neutra. (STJ, AgRg no HC n. 690.059/ES, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do Tjdft), Quinta Turma, julgado em 5/10/2021, DJe de 8/10/2021.) O professor Rogério Greco busca elucidar a presente circunstância. “Suponhamos que a vítima esteja se comportando de forma inconveniente e, por essa razão, o agente se irrite e a agrida. Descartando a possibilidade, por exemplo, de ter agido sob o manto da legítima defesa, pois a vítima não estava praticando qualquer agressão injusta, o agente somente cometeu o delito em virtude do comportamento da própria vítima. Também nos crimes culposos é muito comum que a vítima contribua para o acidente. Se conjugarmos, por exemplo, a velocidade excessiva daquele que estava na direção de seu veículo com o fato de ter a vítima atravessado a rodovia em local inadequado, tendo somente esta última sofrido lesões, podemos concluir que ambos, agente e vítima, contribuíram para o evento, razão pela qual o comportamento da vítima deverá ser considerado em benefício do agente quando da fixação da pena-base.”21 📌 OBSERVAÇÃO Deve ser frisado que se o comportamento da vítima já se encontra previsto em determinado tipo penal, diminuindo a reprimenda, a exemplo do mencionado § 1º do art. 121 do Código Penal, ele não poderá ser considerado, por mais uma vez, em benefício do agente.22 Art. 121, § 1º, CP. Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. ⚠ ATENÇÃO Consigne-se que, pela natureza dessa circunstância judicial, como resultado de seu exame não será possível reconhecer seu caráter desfavorável ao réu. Assim, por exemplo, quando se verificar que o ofendido em nada colaborou para o delito, como na situação em que o agente escolhe aleatória e indistintamente suavítima, o juiz deverá considerar neutra a circunstância em estudo.23 🚨JÁ CAIU Na prova para Promotor de Justiça do Estado de Goiás (FGV - 2022) foi apresentado o seguinte texto: “No que 23Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) 22Curso de direito penal: volume 1: parte geral: arts. 1º a 120 do Código Penal / Rogério Greco. – 24. ed. – Barueri [SP]: Atlas, 2022. 21Curso de direito penal: volume 1: parte geral: arts. 1º a 120 do Código Penal / Rogério Greco. – 24. ed. – Barueri [SP]: Atlas, 2022. 16 concerne à fixação da pena-base, é certo que o julgador deve, ao individualizar a pena, examinar com acuidade os elementos que dizem respeito ao fato delituoso e aspectos inerentes ao agente, obedecidos e sopesados todos os critérios legais para aplicar, de forma justa e fundamentada, a reprimenda que seja, proporcionalmente, necessária e suficiente para a reprovação do crime, sobrepujando as elementares comuns do próprio tipo legal. No Art. 59 do Código Penal, o legislador elencou oito circunstâncias judiciais para individualização da pena na primeira fase da dosimetria. Ao considerar desfavoráveis as circunstâncias judiciais, deve o julgador declinar, motivadamente, as suas razões, que devem corresponder objetivamente às características próprias do vetor desabonado.” Foi assinalado como CORRETA, considerando as condenações definitivas, por fato anterior ao delito, transitadas em julgado no curso da ação penal, somente podem ser valoradas, na primeira fase da dosimetria, a alternativa que trouxe: “a título de antecedentes”. Na prova para Promotor de Justiça do Estado de Goiás (FGV - 2022), foi considerada CORRETA a alternativa que trouxe, considerando o entendimento do STJ, tendo ocorrido a revogação do inciso I do §2º do art. 157 CP, o juiz da execução penal pode, como circunstância judicial desfavorável, valorar o emprego de arma na: “primeira fase da dosimetria e deslocar o concurso de pessoas para a terceira fase, desde que não seja modificado o quantum da pena fixado na sentença”. 4. 2ª FASE: APLICAÇÃO DA PENA INTERMEDIÁRIA Fixada a pena base (na primeira fase - art. 59 do CP), sobre ela é que incidirão eventuais atenuantes ou agravantes, caso haja omissão do Juízo a despeito da pena-base deve ser compreendida como no mínimo legal. ⚠ ATENÇÃO Há no STJ uma tendência atual (majoritária) em considerar razoável imputar, a cada circunstância judicial desfavorável, a fração de 1/6 (um sexto) sobre o piso punitivo. Há também decisões minoritárias no sentido de imputar 1/8 para as circunstâncias desfavoráveis, traduzindo-se em benefício ao réu, vejamos: “(...) 6. Há, portanto, três circunstâncias judiciais a serem valoradas na primeira fase da dosimetria: antecedentes, personalidade e a qualificadora remanescente. Estabelecido o consagrado parâmetro de aumento de 1/8 (um oitavo) para cada circunstância desfavorável, fazendo-as incidir sobre o intervalo de pena em abstrato do preceito secundário do crime de homicídio qualificado (18 anos), resultaria no acréscimo de 6 (seis) anos e 9 (nove) meses à pena mínima cominada pelo tipo penal, fixando-se, pois, a pena-base em 18 (dezoito) anos e 9 (nove) meses de reclusão. Percebe-se, pois, que a dosimetria da pena-base realizada pelas instâncias ordinárias mostrou-se benevolente com o réu, ao fixá-las em 18 (dezoito) anos. (...)” (STJ, HC 345.402/DF, rel. Min. Ribeiro Dantas, 5ª T., j. 13-12-2016) 17 “(...) 5. Há, portanto, duas circunstâncias judiciais a serem valoradas na primeira fase da dosimetria. Estabelecido o consagrado parâmetro de aumento de 1/8 (um oitavo) para cada circunstância desfavorável, fazendo-as incidir sobre o intervalo de pena em abstrato do preceito secundário do crime de estupro de vulnerável (7 anos), resultaria no acréscimo de 1 (um) ano e 9 (nove) meses à pena mínima cominada pelo tipo penal, fixando-se, pois, a pena-base em 9 (nove) anos e 9 (nove) meses de reclusão. Contudo, como as consequências do crime são extremamente desfavoráveis, mostra-se proporcional e consectário com a individualização da pena uma valoração mais acentuada nessa circunstância judicial, motivo pelo qual é de rigor a manutenção da pena-base fixada pelo Tribunal a quo em 10 (dez) anos de reclusão. (...)” (STJ, HC 305.505/RR, rel. Min. Ribeiro Dantas, 5ª T., j. 13-12- 2016). 🚨JÁ CAIU Na prova para Juiz Substituto do Estado do Amapá (FGV - 2022) de modo surpreendente, quando questionado a respeito da jurisprudência e doutrina, qual seria o critério adotado para individualização da reprimenda base o aumento, foi assinalado como CORRETA a alternativa que trouxe: “na fração de 1/8 por cada circunstância.” No que tange à segunda fase, será o momento em que o magistrado irá fixar a pena intermediária, partindo da pena-base e considerando agravantes (art. 61) e atenuantes (art. 65). Art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento. Parágrafo único - No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua. 🚨JÁ CAIU Na prova para Delegado de Polícia do Estado de Goiás (INSTITUTO AOCP - 2022), foi assinalada como CORRETA a alternativa que trouxe: “A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento. No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua.” Como visto, as agravantes estão previstas no art. 61 e 62 do CP e as atenuantes estão previstas no art. 65 e 66 do CP. Mas, é possível que a legislação extravagante crie outras agravantes e outras atenuantes, a exemplo do que faz o Código de Trânsito Brasileiro no art. 15. A Lei dos Crimes Ambientais prevê atenuantes e agravantes específicas, aplicáveis apenas aos crimes ambientais Conforme Rogério Sanches, as agravantes e atenuantes podem ser definidas como circunstâncias objetivas ou subjetivas que não 18 integram a estrutura do tipo penal, mas se vinculam ao crime, devendo ser consideradas pelo juiz no momento de aplicação da pena. Os artigos 61 e 62 do CP trazem rol taxativo das agravantes genéricas. O rol é taxativo porque as agravantes genéricas são prejudiciais ao réu e, portanto, devem estar expressamente previstas em lei. Não cabe o emprego de analogia. As agravantes são de incidência obrigatória, ou seja, elas sempre aumentam a pena, salvo quando elas já caracterizam qualificadora ou causa de aumento de pena. É também necessário ter cuidado para não permitir o bis in idem. As atenuantes genéricas estão previstas nos artigos 65 e 66 em rol exemplificativo. O rol é exemplificativo porque as atenuantes genéricas são benéficas ao réu e, portanto, o juiz pode criar atenuantes, por analogia (in bonam partem), no caso concreto. O artigo 66 do CP prevê que as atenuantes não precisam estar expressamente previstas em lei. O artigo 66 do CP prevê o reconhecimento de atenuantes inominadas ou atenuantes de clemência. 📌 OBSERVAÇÕES ■ O legislador não estipulou o quantum para as agravantes ou atenuantes, devendo o juiz fundamentar a sua decisão quando as fixar. ■ Como o Código Penal não diz a porcentagem de aumento ou diminuição da pena relativa à incidência de agravantes e atenuantes, a jurisprudência fixou um critério objetivo, no sentido de que agravantes e atenuantes devem incidir no patamar de 1/6 da pena-base. ■ Concurso de agravantes e atenuantes: É possível havero concurso entre agravantes e atenuantes. A regra geral, nesses casos, é a compensação. Essa compensação é chamada de TEORIA DA EQUIVALÊNCIA DAS CIRCUNSTÂNCIAS. Exceções: existem situações em que uma dessas circunstâncias vale mais do que a outra. Nessa situação, ter-se-á uma circunstância preponderante. Conforme o art. 67, CP: Art. 67 - No concurso de agravantes e atenuantes, a pena deve aproximar-se do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes, entendendo-se como tais as que resultam dosMOTIVOS determinantes do crime, da PERSONALIDADE do agente e da REINCIDÊNCIA. A jurisprudência estabeleceu uma ordem de preponderância: a) Atenuantes da menoridade ou senilidade (menor de 21 na data do fato ou maior de 70 na data da sentença); b) Agravante da reincidência; 📌 OBSERVAÇÃO O STJ e o STF têm entendido que essa agravante está no mesmo patamar que a atenuante da confissão espontânea, devendo o juiz compensar uma pela outra. Todavia, deve-se destacar que a multireincidência não entra nessa regra, devendo o juiz agravar a pena base. c) Atenuantes ou agravantes subjetivas; d) Atenuantes ou agravantes objetivas. 📌 OBSERVAÇÕES ■ É importante destacar que a jurisprudência tem entendido que, malgrado não haja previsão legal, 19 nesta fase o juiz também está adstrito aos limites mínimo e máximo estabelecidos pela lei. Na segunda fase, a pena também não pode ultrapassar os limites legais (mínimo e máximo). Em outras palavras: as atenuantes não podem trazer a pena abaixo do mínimo e as agravantes não podem elevá-la acima do máximo. As atenuantes e agravantes incidem sob a pena-base. Súmula 231-STJ: A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal. ■ Em regra, as agravantes sempre agravam a pena,mas temos exceções: ✔ Quando constituem ou qualificam o crime. Isso é assim para evitar bis in idem; ✔ Quando a pena base for fixada no máximo (pois extrapolaria o máximo); ✔ Quando a atenuante for preponderante; ■ Em regra, as agravantes incidem em crimes dolosos (consciência e vontade da agravante), mas temos uma exceção: a Reincidência também incide nos crimes culposos. Cuidado, pois no crime preterdoloso vamos aplicar todas as agravantes do CP. Isso porque é um crime doloso que é qualificado pela culpa. ■ Existe alguma situação em que uma atenuante ou uma agravante será ineficaz? Sim. A atenuante será ineficaz quando a pena-base foi aplicada no mínimo legal. De outro lado, em tese, a agravante será ineficaz quando a pena-base foi aplicada no máximo legal. Na segunda fase, a pena não pode romper os limites legais. A Súmula 231 do STJ versa sobre tal vedação. Súmula nº 231, STJ. A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal. ■ Conforme o art. 384 do CPP, o juiz poderá reconhecer agravantes ainda que não sejam veiculadas na inicial. Embora haja críticas, tem prevalecido que o dispositivo foi recepcionado pelo CF/88. No caso do Júri, o magistrado só pode reconhecer agravante que foi pleiteada no plenário. ■ Deve-se lembrar que uma agravante ou atenuante deixará de ser aplicada quando constituir o crime ou figurar como elementar, qualificadora, privilégio, causa de aumento ou redução de pena (sob pena de produzir-se bis in idem). Assim, exemplificativamente: a agravante do crime praticado contra cônjuge não se aplica à bigamia (pois é seu requisito – CP, art. 235); a agravante do crime praticado contra descendente não incide no infanticídio (já que é sua elementar – CP, art. 123); a agravante do crime praticado contra criança não abrange o homicídio contra menor de 14 anos (que caracteriza causa de aumento de pena – art. 121, § 4º, parte final).24 ■ Advirta-se que o elenco das agravantes encontra-se consubstanciado em rol taxativo (numerus clausus). Qualquer intento de ampliá-lo configuraria patente violação ao princípio da legalidade (CF, art. 5º, XXXIX, e CP, art. 1º). A lista das atenuantes, por outro lado, é exemplificativa, como expressamente enuncia o legislador (CP, art. 66); ainda que o Código não fosse explícito, poderia se 24Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) 20 cogitar de ampliar este rol por analogia, pois esta seria in bonam partem.25 Neste momento iremos destacar as agravantes e atenuantes mais relevantes. 4.1. AGRAVANTES 4.1.1. REINCIDÊNCIA Art. 61, I, CP e art. 63: Art. 61 - São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime: I - a reincidência; Art. 63 - Verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior. É a única agravante aplicável tanto a crimes dolosos quanto culposos. importante destacar o ensinamento do professor André Estefam sobre o assunto: Para a maioria da doutrina, ademais, seria a única aplicável a delitos culposos, isto é, segundo esse ponto de vista, as demais agravantes contidas no dispositivo legal, mencionadas no inciso II, seriam restritas aos crimes dolosos. Não pensamos dessa forma. Para nós, não há qualquer razão lógica ou jurídica para tal distinção. O simples fato de a reincidência vir disposta no inciso I e as demais do inciso II não é suficiente para permitir tal ilação. Significa dizer que as demais agravantes, em nosso sentir, também 25Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) podem ser aplicadas em crimes culposos, desde que se apresente compatibilidade fática no caso concreto.26 Perceba que a reincidência possui os seguintes pressupostos: ■ Condenação definitiva; ■ Prática de novo crime. O professor Rogério Sanches lembra que a lei das contravenções também tem a agravante da reincidência e nos apresenta a seguinte tabela (CUNHA, 2020, p. 524): SENTENÇA PENAL CONDENATÓRI A DEFINITIVA NOVA INFRAÇÃO PENAL CONSEQUÊNCI A CRIME (Brasil ou estrangeiro) CRIME REINCIDENTE (Art. 63, CP) CRIME (Brasil ou estrangeiro) CONTRAVENÇÃ O REINCIDENTE (Art. 7, LCP) CONTRAVENÇÃ O PENAL (Brasil) CONTRAVENÇÃ O REINCIDENTE (Art. 7, LCP) CONTRAVENÇÃ O (Brasil) CRIME MAUS ANTECEDENTES CONTRAVENÇÃ O PENAL (Estrangeiro) CONTRAVENÇÃ O MAUS ANTECEDENTES Percebam que a condenação por crime no estrangeiro pode gerar reincidência se o novo crime 26Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) 21 for cometido no Brasil. Inclusive, não há necessidade de homologação pelo STJ da sentença estrangeira para caracterizar reincidência. 🚨JÁ CAIU Na prova para Promotor de Justiça Substituto do Estado de São Paulo (VUNESP - 2023), foi assinalado como CORRETA, a seguinte afirmativa: “A condenação em definitivo por crime praticado no estrangeiro não precisará ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça para gerar os efeitos da reincidência”. Além disso, se o crime cometido no estrangeiro é atípico aqui, o agente não será considerado reincidente. ⚠ ATENÇÃO A pena privativa de liberdade e a pena restritiva de direitos induzem a reincidência. Mas não é só, pois a MULTA também induz reincidência. Assim, não importa o tipo ou o quantum da pena. E no caso de extinção da punibilidade do crime anterior? Rogério Sanches aponta que se o crime for alcançado por uma causa extintiva da punibilidade que impeça a condenação com o trânsito em julgado, não há falar em reincidência (a exemplo da prescrição da pretensão punitiva). Todavia, se a causa extintiva é posterior à formação da condenação, teremos ainda os efeitos da condenação e por isso continua gerando reincidência (a exemplo da prescrição da pretensão executória). Cuidado, entretanto, com a anistia e a abolitio criminis,pois nessas duas teremos a extinção de todos os efeitos penais da condenação, mesmo que depois do trânsito em julgado. Além disso, a sentença que concede o perdão judicial não será considerada para efeitos de reincidência. 📌 OBSERVAÇÃO ■ Sistema da temporariedade da reincidência. Conforme o art. 64, I do CP: I - NÃO PREVALECE a condenação anterior, se entre a DATA DO CUMPRIMENTO ou EXTINÇÃO da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação; Exemplo: No ano de 2000, JOÃO foi condenado definitivamente pelo crime de homicídio ao cumprimento de 6 anos de reclusão. Em 2006 a sanção foi integralmente executada. Em 2012, JOÃO pratica novo crime. Na sentença do novo crime, o magistrado não pode reconhecer a agravante da reincidência, porque superado o período depurador. A condenação anterior servirá, no entanto, como maus antecedentes (circunstância judicial norteadora da pena-base). (CUNHA, 2020, p. 526) 5. O tempo transcorrido após o cumprimento ou extinção da pena não opera efeitos quanto à validade da condenação anterior, para fins de valoração negativa dos antecedentes, como circunstância judicial desfavorável. Isso porque o Código Penal adotou o sistema da perpetuidade, haja vista que o legislador não limitou temporalmente a configuração dos 22 maus antecedentes ao período depurador quinquenal, ao contrário do que se verifica na reincidência (CP, art. 64, I), hipótese em que vigora o sistema da temporariedade. Não houve, pois, ilegalidade na valoração dos antecedentes na pena-base. (STJ, AgRg no HC n. 668.427/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 7/6/2022, DJe de 14/6/2022.) Além disso, dispõe o art. 64, II: II - não se consideram os crimes militares próprios e políticos. 📌 OBSERVAÇÕES ■ A reincidência é uma circunstância subjetiva incomunicável. ■ Conforme o STJ, na súmula 636, comprova-se a reincidência de forma suficiente com a folha de antecedentes criminais, não precisando necessariamente da certidão cartorária. “A folha de antecedentes criminais é documento suficiente a comprovar os maus antecedentes e a reincidência”. A doutrina ainda nos aponta a classificação da reincidência. Teremos: a) REINCIDÊNCIA REAL: O agente comete novo crime após ter efetivamente cumprido a totalidade da pena pelo crime anterior (e antes do prazo depurador de 5 anos). b) REINCIDÊNCIA FICTA: O agente comete novo crime após ter sido condenado definitivamente, mas antes de ter cumprido a totalidade da pena do crime anterior. c) REINCIDENTE GENÉRICO: Os crimes praticados pelo agente são de espécies distintas; d) REINCIDENTE ESPECÍFICO: Os crimes praticados são da mesma espécie. Súmula 241-STJ: A reincidência penal não pode ser considerada como circunstância agravante e, simultaneamente, como circunstância judicial. Nada obsta, entretanto, que tendo o agente diversas condenações pretéritas, uma delas seja utilizada na primeira fase de aplicação da pena, como maus antecedentes, e a outra na segunda, a título de reincidência (CUNHA, 2020, p. 528). Atenção ainda a uma recente orientação do STJ: A condenação por porte de drogas para consumo próprio (art. 28 da Lei de drogas), transitada em julgado, NÃO gera reincidência em caso de crime comum. Na verdade, o STJ entende que o art. 28 da Lei só gera reincidência se for reincidência específica. Viola o princípio da proporcionalidade a consideração de condenação anterior pelo delito do art. 28 da Lei nº 11.343/2006, “porte de droga para consumo pessoal”, para fins de reincidência. STF. 2ª Turma. RHC 178512 AgR/SP, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 22/3/2022 (Info 1048). 🚨JÁ CAIU Na prova para Juiz Substituto do Estado do Mato Grosso do Sul (FGV - 2023), foi assinalado como CORRETA, a afirmativa que trouxe: “Ao elaborar uma sentença condenatória em um processo pela prática de determinado crime, na dosimetria da pena, após haver fixado a pena-base, o juiz verifica que o acusado 23 possui uma condenação anterior transitada em julgado por porte ou posse de droga para consumo pessoal (art. 28 da Lei 11.343/06), cuja pena aplicada, prestação de serviços à comunidade, fora cumprida três anos antes da prática do delito objeto do processo em julgamento. Diante da situação narrada, deverá o magistrado manter a pena-base, pois a condenação anterior pelo fato previsto no art. 28 da Lei 11.343/06 não gera reincidência.” Por fim, o art. 310, §2º do CPP, incluído pela Lei 13.964/19: § 2º Se o juiz verificar que o agente é reincidente ou que integra organização criminosa armada ou milícia, ou que porta arma de fogo de uso restrito, deverá denegar a liberdade provisória, com ou sem medidas cautelares. A doutrina critica fortemente esse dispositivo. Rogério Sanches afirma que essa inovação parece que não passará pelo crivo de constitucionalidade do STF. Isso porque, atualmente, a orientação do STF é de que vedações em abstrato à concessão da liberdade provisória contrariam a Constituição Federal, devendo o juiz sempre fundamentar a proibição aquilatando as circunstâncias do caso concreto. 📌 OBSERVAÇÕES Devemos lembrar sobre a já apresentada súmula 636 do STJ: A folha de antecedentes criminais é documento suficiente a comprovar os maus antecedentes e a reincidência. CONSEQUÊNCIAS DA REINCIDÊNCIA27 Segundo Márcio Cavalcante, além de ser uma agravante, a reincidência produz inúmeras outras consequências negativas para o réu. Vejamos as principais: ▸ torna mais gravoso o regime inicial de cumprimento de pena (art. 33, § 2º do CP); ▸ o reincidente em crime doloso não tem direito à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos (art. 44, II); ▸ o reincidente em crime doloso não tem direito à suspensão condicional da pena – sursis (art. 77, I), salvo se condenado apenas a pena de multa (§ 1º do art. 77); ▸ o réu reincidente não poderá ser beneficiado com o privilégio no furto (art. 155, § 2º), na apropriação indébita (art. 170), no estelionato (art. 171, § 1º) e na receptação (art. 180, § 5º, do CP); ▸ a reincidência impede a concessão da transação penal e da suspensão condicional do processo (arts. 76, § 2º, I e 89, caput da Lei nº 9.099/95); ▸ no concurso de agravantes e atenuantes, a pena deve aproximar-se do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes, entendendo-se como tais as que resultam dos motivos determinantes do crime, da personalidade do agente e da reincidência (art. 67 do CP); ▸ influência no tempo necessário para a concessão do livramento condicional (art. 83); ▸ o prazo da prescrição executória aumenta em 1/3 se o condenado é reincidente (art. 110) (obs.: não influencia na prescrição da pretensão punitiva); 27 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Folha de antecedentes criminais é um documento válido para comprovar maus antecedentes ou reincidência. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 17/06/2022 24 ▸ é causa de interrupção da prescrição executória (art. 117, VI); ▸ é causa de revogação do sursis (art. 81, I e § 1º), do livramento condicional (art. 86, I e II, e art. 87) e da reabilitação, se a condenação for a pena que não seja de multa (art. 95). 🚨JÁ CAIU Na prova para Juiz de Direito Substituto do Estado de Alagoas (FCC - 2019), foi assinalado como CORRETA, sobre aplicação da pena, a afirmativa que trouxe: “a folha de antecedentes constitui documento suficiente para a comprovação de reincidência, não prevalecendo a condenação anterior, contudo, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a cinco anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação.” 4.1.1.1. CONDENAÇÕESQUE NÃO SE APLICAM A REINCIDÊNCIA De acordo com o art. 64, inc. II do Código Penal, não geram reincidência: ● Crime político; ● Crime militar próprio. Art. 64 - Para efeito de reincidência: II - não se consideram os crimes militares próprios e políticos. “O crime político pode ser classificado como próprio e impróprio, e ainda como objetivamente político ou subjetivamente político. Crime político próprio é aquele que só atenta contra a organização do Estado, enquanto impróprio é aquele que lesa também outro bem jurídico, como um sequestro de embaixador, que busca lesar a organização do Estado com a libertação de prisioneiros, mas também atinge a liberdade individual. Crime objetivamente político é aquele que desde logo lesa ou expõe a risco a organização do Estado, e subjetivamente político é aquele que é praticado com intenção política, ainda que mediata.28” ⚠ ATENÇÃO Vale lembrar que crime eleitoral não é sinônimo de crime político (TSE, REsp 16.048/SP, Rel. Min. Eduardo Alckmin, DJU 14-4-2000, p. 96). “Já o crime militar próprio é aquele fato apenas capitulado como crime perante o Código Penal Militar, sem correspondente no Código Penal, ou seja, é a infração prevista exclusivamente na legislação militar, como a deserção. Crime militar impróprio é aquele previsto tanto no Código Penal comum como no Código Penal Militar, como o furto. Importante ressalvar que na legislação militar na condenação anterior por crime militar próprio gera-se reincidência29.” 🚨 CUIDADO30 É importante, porém, atentar-se à seguinte ressalva: se a condenação definitiva anterior for por conta da prática de um crime militar próprio, apenas estará afastada a reincidência se houver o posterior cometimento de um crime comum ou militar impróprio. Isso, porque a prática posterior de um 30 Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) 29 Manual de direito penal: parte geral / Gustavo Junqueira, Patricia Vanzolini. – 7. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2021. 28 Manual de direito penal: parte geral / Gustavo Junqueira, Patricia Vanzolini. – 7. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2021. 25 novo crime militar próprio configurará a reincidência do agente, de acordo com o que dispõe o art. 71 do Decreto-lei nº 1.001/1969. 4.1.2.MOTIVOS DO CRIME Segundo o prof. André Estefam “constitui motivo o antecedente psicológico do crime, seu móvel, sua razão propulsora, o opróbrio motivador da ação. Os motivos que agravam a pena mencionados na disposição epigrafada são o motivo torpe (isto é, vil, abjeto, repugnante, p. ex., a inveja, a cupidez etc.) e o motivo fútil (insignificante, desproporcional, p. ex., ferir alguém por não gostar da cor da camisa da pessoa ou porque a vítima torce para time de futebol rival).31 ⚠ ATENÇÃO Registre-se que em se tratando de agravantes de cunho subjetivo, posto que relacionadas com o motivo da infração penal cometida, não se comunicam aos demais coautores ou partícipes do crime, obedecendo ao disposto no art. 30 do CP.32 4.1.3. CONEXÃO DELITIVA De acordo com o Código, a pena será agravada quando o delito houver sido praticado “para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime”. No dizer de Tourinho Filho, “há conexão existe quando duas ou mais infrações estiverem entrelaçadas por um vínculo, um nexo que aconselha a junção dos processos, propiciando assim ao julgador perfeita visão do quadro probatório e, de 32Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) 31 Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) consequência, melhor conhecimento dos fatos, de todos os fatos, de molde a poder entregar a prestação jurisdicional com firmeza e justiça”33 Muito embora a agravante refira-se ao instituto denominado, processualmente, de conexão objetiva, a circunstância em questão diz respeito à intenção do agente, isto é, ter cometido uma infração com o objetivo de garantir a execução, ocultação, impunidade ou vantagem de outra. Em outras palavras, o agravamento da pena se dá porque o motivo do segundo crime é viabilizar o cometimento, a ausência de punição ou o produto ou proveito de outro. Sua natureza, portanto, é subjetiva (refere-se à intenção do agente)34 4.1.4. MODO DE EXECUÇÃO De acordo com o Código, a pena será agravada quando o agente praticar o fato mediante traição, emboscada, dissimulação, ou outro recurso que dificulte ou impossibilite a defesa do ofendido. “O agente, nestes casos, age de modo a evitar a reação oportuna e eficaz da vítima, surpreendendo-a desprevenida ou enganada pela situação. A traição pode ser física (ataque súbito e sorrateiro, p. ex., violento golpe de bastão pelas costas, com o intuito de ferir a vítima) ou moral (quebra de confiança entre agente e vítima, da qual ele se aproveita para praticar o crime, p. ex., convidar conhecido para consumir droga visando, após, feri-lo com maior facilidade). Emboscada é sinônimo de tocaia; o sujeito passivo não percebe o ataque do ofensor, que se encontra escondido. Pressupõe premeditação. Dissimulação significa ocultação do 34Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) 33Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) 26 próprio desígnio. Pode ser moral (quando o agente dá falsas mostras de amizade para captar a atenção da vítima) oumaterial (utilização de disfarce). Traição moral não se confunde com dissimulação moral; na traição, pressupõe-se uma relação de amizade preexistente entre os sujeitos, que foi quebrada; na dissimulação, o agente, desde o começo, já pretendia ganhar a confiança do ofendido para cometer o delito.”35 4.1.5. MEIOS DE EXECUÇÃO36 Nesse caso, agrava-se a pena em face do emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que podia resultar perigo comum (art. 61, II, d). Os meios insidiosos são os que têm sua eficácia lesiva dissimulada, como o crime cometido por estratagema ou perfídia; por exemplo, armadilha. Os meios cruéis são aqueles que provocam sofrimento inútil e impiedoso na vítima ou revelam intensa brutalidade do agente; por exemplo, o ato de desferir repetidos golpes contra terceiro, ferindo-o. Por meios que possam resultar perigo comum entende-se aqueles que produzem risco a um número indeterminado de pessoas; nesse caso, não se exclui a possibilidade de surgir concurso formal entre o fato e algum crime contra a incolumidade pública (incêndio, explosão, desabamento, epidemia – arts. 251 e s. do CP), se o dolo do agente se dirigir aos dois resultados (se isso ocorrer, desaparece a agravante). A lei menciona, ainda: o veneno (substância química, animal ou vegetal que, uma vez ministrada no organismo, é apta a causar perigo à vida ou à 36Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) 35Direito Penal: Parte Geral – Arts. 1º a 120 – v. 1 / André Estefam. – 11. ed. – São Paulo : SaraivaJur, 2022. (Coleção Direito Penal) saúde da vítima), o qual pode servir como meio insidioso (se a vítima não souber que o ingere) ou cruel (se aplicado com emprego de força física); a tortura (inflição de intenso sofrimento físico ou psíquico). É de ver que a tortura deve figurar como meio executório do delito para incidir a agravante. Há casos, contudo, em que a tortura não figurará como mera agravante, mas como crime autônomo (Lei n. 9.455/97). A distinção leva em conta a eventual presença, no caso concreto, das elementares do art. 1º da citada lei especial; o fogo. 4.1.6. RELAÇÕES DE