Logo Passei Direto
Buscar
Material
páginas com resultados encontrados.
páginas com resultados encontrados.
left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

Prévia do material em texto

O livro das 
perguntas
JULIANA DAHER E FABÍOLA FARIAS
O livro das 
perguntas
JULIANA DAHER E FABÍOLA FARIAS
Coordenação geral: Juliana Daher
Coordenação editorial: Fabíola Farias e Juliana Daher
Consultoria para acessibilidade: Cleide Fernandes
Ilustração da capa: Marilda Castanha
Projeto gráfico: Samara Coutinho
Revisão: Fabíola Farias 
Audiodescrição: Cleide Fernandes (roteiro) e Gabriel 
Aquino (consultoria).
Projeto LEITURA E FORMAÇÃO DE LEITORES: QUEM PERGUNTA 
QUER SABER! (1942/2021) - Lei Municipal de Incentivo à Cultura de 
Belo Horizonte.
Catalogação na Publicação (CIP)
 
 Daher, Juliana
 D129l O livro das perguntas / Juliana Daher e Fabíola
 Farias. – Belo Horizonte : Ed. das Autoras, 2023. 
 116 p. 
 Inclui bibliografia.
 ISBN 978-65-00-70445-7
 1. Leitura 2. Mediação de leitura 3. Bibliotecas 4. 
 Literatura infantojuvenil I. Farias, Fabíola II. Título.
 
 CDD: 027 
Bibliotecária responsável: Cleide A. Fernandes CRB6/2334
O livro das 
perguntas
JULIANA DAHER E FABÍOLA FARIAS
Belo Horizonte | 2023
Um grande livrinho
Sobre este livro
Onde meus pés pisam
Eu “mexo” com livros
Por que ler com e para bebês e crianças pequenas?
Como escolher livros com e para as crianças?
Como e por quem são feitos os livros?
O que é mediação de leitura?
Que importância têm as famílias na formação leitora 
das crianças?
O que é preciso saber para ler e contar histórias para 
as crianças?
7
11
13
15
19
34
37
27
23
30
O que eu posso fazer para as crianças gostarem de ler?
Existem livros específicos para meninas e para meninos?
Os livros ajudam as crianças a lidar com temas dolorosos?
Os livros de literatura devem ensinar intencionalmente 
bons modos ou valores morais para as crianças?
Que contribuições os livros para crianças podem oferecer 
na construção de sociedades mais justas?
Como garantir o direito das crianças com deficiência
à leitura?
40
43
46
49
52
56
Por que as crianças deixam de ler quando chegam
à adolescência?
O que é biblioteca pública?
O que é biblioteca comunitária?
Quem trabalha na biblioteca?
O que são políticas públicas para a garantia do direito 
à leitura?
Os leitores e suas leituras por eles mesmos:
 Francisco Souza Daher
 Thereza da Silva Chagas Souza Santos
 Teresa Farias Santos
 Nino Cruz Castanha
 Tomás Farias
 Dandara Lessa
 Isabella Reis Rodrigues
Sugestões de leitura
Quem somos?
O que é biblioteca escolar?
77
80
84
89
89
91
92
94
96
98
102
107
115
63
73
69
8
Um grande livrinho
Cleide Fernandes
Bibliotecária e Coordenadora do Sistema 
Estadual de Bibliotecas Públicas de Minas Gerais
Ah, como eu gostaria de estar no início da minha 
atuação como bibliotecária só para ter esse “livri-
nho” como guia! Digo “livrinho” com carinho, porque 
ele está carregado de afeto. Fabíola Farias e Juliana 
Daher nos entregam um conteúdo que raramente 
se encontra nas estantes, seja nas bibliotecas aca-
dêmicas, seja nas bibliotecas públicas, comunitárias 
ou escolares. À primeira vista, o sumário revela uma 
lista de perguntas simples, que são feitas e ouvidas 
diariamente por quem trabalha na área de Educa-
ção e Cultura. Mas essas perguntas trazem respos-
tas com potencial de muitos deslocamentos, permi-
tindo repensar nossas crenças e hábitos, e buscar 
novas formas de compreender e lidar mais critica-
mente com questões com as quais nos deparamos 
com frequência. As respostas oferecidas pelas pes-
quisadoras fogem do senso comum que geralmente 
prevalece, e muitas vezes passa despercebido, nos 
espaços de formação de leitores.
Meu primeiro trabalho como bibliotecária foi na 
Escola da Serra, uma escola construtivista. Foram 
anos de intenso aprendizado e busca frenética 
por modelos que me ajudassem na formação das 
crianças que corriam pela biblioteca. A inexperi-
9
ência intensificava minha ânsia por receitas pron-
tas, que pudessem ser aplicadas imediatamente 
na rotina da escola. Claro que não obtive êxito 
nessa busca, porque a formação de leitores é um 
processo muito mais complexo, que lida com sub-
jetividades distintas e, naquele caso, com crianças 
curiosas para conhecer o mundo. Na Escola da 
Serra aprendi uma importante lição: as crianças 
existem agora, no presente, e não são apenas seres 
que “serão alguém no futuro”. Eu acredito que um 
papel importante que nós podemos desempenhar 
com as crianças, em qualquer espaço, é ampliar 
cada vez mais as suas fronteiras.
Nossa sociedade é bastante cruel com as crianças, 
que são tratadas como seres humanos incompletos. 
Nós que atuamos nos equipamentos públicos deve-
mos reconhecer bebês e crianças pequenas como 
cidadãos com direito à Cultura e aos bens cultu-
rais, como o livro e a literatura, criando, executando 
e promovendo políticas públicas para garantir o 
acesso à literatura de qualidade, principalmente nas 
bibliotecas públicas, comunitárias e escolares.
Para que possamos construir, efetivamente, o direito 
à leitura em nosso país precisamos lutar para que 
nossos espaços de leitura (escolas, creches, biblio-
tecas, centros culturais) sejam adequados e que 
as políticas públicas para a área alcancem TODAS 
as pessoas. Precisamos também estudar e trocar 
experiências, aprendendo coletivamente umas 
com as outras. Fabíola e Juliana, generosamente, 
compartilham conosco seus estudos, suas refle-
xões, algumas angústias e as experiências vividas 
ao longo dos anos, em projetos de ler para e com 
bebês e crianças de todas as idades. Do lado de 
cá, a melhor forma de seguir nessa tarefa de pro-
10
mover a leitura, os livros e a literatura na cultura da 
infância é lendo e compartilhando esses textos. Boa 
leitura a todos e todas!
12
Sobre este livro
Juliana Daher e 
Fabíola Farias
Este livro reúne perguntas que, ao longo de anos, 
temos ouvido em oficinas, seminários, cursos e 
encontros sobre leitura, literatura e educação literá-
ria na infância, em Belo Horizonte e em outras cida-
des brasileiras. Algumas das questões são comuns a 
professoras, bibliotecárias, agentes culturais, gestoras 
públicas, mães, pais, tias, avós e cuidadoras de crian-
ças, o que nos leva a acreditar que há nelas, em seu 
conjunto, algo que revela preocupações duradouras.
Desde que começamos a trabalhar na seleção das 
perguntas, muitas vezes juntando em uma as indaga-
ções que nos pareceram afins, e na escrita de “res-
postas”, sabíamos que a falta de alguns temas seria 
percebida. Mas mulheres, mães, pesquisadoras e pro-
fessoras que somos, nos confortamos nos lembrando 
uma à outra de nossa incompletude, do tanto que as 
coisas pequenas e poucas que conseguimos realizar 
em momentos e espaços distintos de nossas vidas se 
somam aos esforços de muitas como nós, comprome-
tidas com a construção, sempre em marcha, de vidas 
justas e promissoras para as crianças brasileiras.
Além de nossos textos, deste livro fazem parte depoi-
mentos que mostram como o que tentamos organizar 
em perguntas e respostas se realiza na experiência 
13
de jovens leitores. Convidamos Francisco, Thereza, 
Teresa, Nino, Tomás, Dandara e Isabella para conta-
rem suas histórias e memórias de leitura. Seus depoi-
mentos não devem ser tomados como verificação do 
que “funciona” ou não na tarefa de formar leitores, 
mas sim como relatos que ampliam, aprofundam e 
até mesmo contestam nossas pesquisas. 
Da publicação também faz parte uma lista de obras 
que nos ajudam a refletir sobre as crianças e sua 
relação com livros, leitura, literatura e a cultura da 
infância. Sabemos que logo sentiremos falta de 
alguns títulos, mas toda seleção está, invariavel-
mente, marcada por lacunas.  
Desejamos que este livro, que tem distribuição gra-
tuita e também está disponívelimportante que sigamos atuando em distin-
tos espaços de participação social para a garantia 
de direitos e ao mesmo tempo criando condições 
para ações imediatas em escolas, bibliotecas e cen-
tros culturais, dentre outras instituições que se dedi-
cam às crianças.
Isso significa que precisamos nos dispor ao encon-
tro com as pessoas, compreendendo suas necessi-
dades específicas e aprendendo a encontrar meios 
que reduzam os obstáculos existentes para que elas 
63
possam ler. O primeiro deles são as barreiras atitudi-
nais, aquelas que nos impedem de considerar sujei-
tos com direito aos mesmos bens que as pessoas 
aparentemente sem deficiência quem é diferente de 
um padrão arbitrariamente construído. 
Obviamente, o desenvolvimento de tecnologias 
assistivas amplia as possibilidades de acesso a livros 
e de leitura por crianças com deficiência. Assim, é 
fundamental que os recursos tecnológicos e os equi-
pamentos necessários para sua utilização estejam 
disponíveis em escolas, bibliotecas e instituições cul-
turais. Para que isso aconteça, é muito importante a 
visibilidade da causa das pessoas com deficiência 
e a pressão social para que os direitos desse grupo 
sejam efetivos. 
E, passadas mais de duas décadas da lei que esta-
belece normas para a promoção da acessibilidade 
das pessoas com deficiência ou com mobilidade 
reduzida, ainda precisamos cobrar portas largas, 
banheiros adaptados, rampas, pisos táteis, elevado-
res e sinalização que permitam a presença digna de 
todas as pessoas nos espaços públicos. 
Garantir o direito à leitura para crianças com defi-
ciência, com condições que permitam uma potente 
experiência com os livros, é um compromisso a ser 
assumido coletivamente. Conhecer as limitações e 
as possibilidades existentes nos ajuda a construir 
caminhos e orienta a caminhada.
64
Por que as crianças deixam 
de ler quando chegam 
à adolescência?
Existem muitas respostas a essa pergunta que, com 
variações, é frequente em cursos, oficinas e seminá-
rios sobre leitura e formação de leitores. De imediato, 
as explicações se apresentam na ordem do senso 
comum: os adolescentes não leem ou leem pouco 
porque são capturados por telefones celulares, jogos 
eletrônicos e séries de TV. Ou não leem porque não 
tiveram o exemplo dos pais em casa.
Essas afirmações não deixam de ser verdadeiras, 
mas são limitadas para dar conta da questão que 
se coloca. Para tentar responder a essa angústia – 
sim, uma angústia –, apresentada reiteradamente 
por professoras, bibliotecárias, mães e pais de ado-
lescentes e jovens, precisamos primeiro compreen-
der o que está contido nesse aligeirado e abran-
gente prognóstico.
Quando reproduzimos o discurso de que as crianças 
que adoravam ouvir e ler histórias abandonam com-
pletamente e, às vezes, até mesmo ostensivamente, 
as práticas de leitura a partir da pré-adolescência, 
alguns entendimentos implícitos nessa afirmação 
podem ser iluminados e tomados como objeto de 
reflexão. O primeiro deles é nossa concepção de lei-
tura, essa coisa que parece não agradar e não atrair 
65
adolescentes que na infância gostavam de ouvir 
as histórias contadas e lidas pela professora, pela 
bibliotecária e pela família. Dito de outra maneira, 
do que falamos quando falamos de leitura?
Não cabe aqui uma ampla e aprofundada discus-
são teórica sobre leitura, que conta com vasta e 
diversa produção sobre o tema, como apresentam 
as sugestões de livros e artigos que fecham este livro. 
Mas ressaltamos que o termo assume muitos signi-
ficados em nossa sociedade. A reclamação de falta 
de interesse pela leitura se refere, na grande maioria 
das vezes, à leitura de livros, revistas, jornais e textos 
considerados importantes por instituições, intelectu-
ais, críticos, educadores e especialistas na área. 
Nós, os adultos, desejamos legitimamente que os 
adolescentes leiam romances, contos, peças de 
teatro, poemas e narrativas visuais que elege-
mos como importantes para sua formação, que os 
ajudem a indagar o mundo, o tempo e as relações 
humanas. Queremos que conheçam a cultura escrita 
e que dela participem de maneira menos ingênua 
e mais potente. E isso, acreditamos, é mais possível 
com a leitura de obras consideradas de qualidade.
Mas precisamos considerar as singularidades desse 
momento da vida, observando anseios que, de 
maneira geral, parecem marcar a adolescência. É 
essencial desconstruirmos a ideia de etapa de pas-
sagem, em que o sujeito não é mais criança porém 
não chegou à vida adulta, trazendo o entendimento 
de não-lugar para vidas que se realizam, como 
todas as demais, concretamente, no presente. Mais 
que um tempo de superação da infância e de pre-
paração para a vida adulta, a adolescência deve ser 
compreendida e tratada em sua existência concreta, 
66
que contempla mudanças no corpo, na sexualidade, 
nas maneiras de relacionamento com pessoas e 
espaços, na experimentação de limites e contesta-
ção de autoridades, nas emoções e sentimentos e, 
também, em expectativas de futuro. 
As descobertas e as tentativas de descolamento da 
família e de outras instituições, como escola e igreja, 
tumultuadas e desestabilizadoras em função da 
contestação da ordem estabelecida, causam incô-
modo e insegurança nos adolescentes e adultos. Os 
primeiros tentam, à sua maneira e nas condições 
existentes, reinterpretar e organizar o mundo e suas 
relações – com a família, a escola, os amigos -, dados 
o desejo e a necessidade de alargamento de limites, 
de afirmação da não-infância, da construção de um 
lugar para si. Os segundos tentam garantir controles, 
sob a sensação de que têm a responsabilidade de 
cuidado com o adolescente, a partir de idealizações 
e expectativas para os filhos e alunos. 
É nesse contexto que precisamos localizar a reflexão 
que propomos. Os livros e a leitura, especialmente os 
que julgamos relevantes, tornam-se também objeto 
de tensionamento. O exercício de crescer implica 
a construção de autonomia, mesmo que de forma 
ingênua em muitos casos. Muito do que é conside-
rado importante e inadiável pelos adultos – estudar, 
ler determinados livros, assistir a filmes consagrados, 
ver peças de teatro elogiadas pela crítica – torna-se 
ponto de inflexão. 
Ao mesmo tempo que contestam autoridades consti-
tuídas – família, escola, igreja, dentre outras –, os ado-
lescentes se mostram alvos fáceis da indústria cultural. 
Produtos, pessoas, equipamentos e tecnologias, sob o 
signo de uma desejada rebeldia e da crítica ao status 
67
quo, tornam-se referência para muitos. Como em um 
passe de mágica, canais no Youtube substituem pro-
fessores, livros didáticos e veículos de imprensa, ensi-
nando conteúdos disciplinares e divulgando notícias. 
Influencers, muitos deles remunerados por selos edi-
toriais, alcançam leitores sequer sonhados pela crítica 
tradicional e raramente tocados pelas análises literá-
rias de professores e bibliotecários.
Em tudo isso há perdas e ganhos. Muitos estudos 
defendem a ampliação dos espaços para a circu-
lação de informações, incluindo seu protagonismo 
– quem se coloca contra a ideia de um jovem que 
consegue dialogar com adolescentes, estimulando 
seu interesse por livros? Livros que inspiraram séries 
televisivas ou jogos eletrônicos movimentam signifi-
cativamente o mercado editorial, figurando em listas 
de “mais vendidos” e se consolidando na preferência 
de muitos adolescentes e jovens. O mesmo acontece 
com narrativas de fantasia ou de terror, em diversas 
experimentações formais e estéticas. 
Os números divulgados por editoras e instituições de 
classe mostram grande crescimento na publicação 
e na comercialização de livros para este público, 
fora do ambiente escolar. Ao mesmo tempo, surgem 
clubes do livro, clubes de leitura, páginas em redes 
sociais, canais no Youtube e muitas outras iniciativas 
que se reinventam todos os dias em torno dos livros 
e dos adolescentes, atingindo considerável interação 
com o segmento buscado. Diante disso, a afirmação 
de que os adolescentesnão leem e não se interes-
sam por livros parece questionável. 
É preciso destacar que todo esse movimento se 
refere, majoritariamente, a adolescentes e jovens de 
classes média e alta, pois aos oriundos de famílias 
68
muito pobres faltam condições objetivas de acesso 
aos livros e às leituras que escapam à escola. 
Mas existem também as vozes dissonantes, que 
problematizam os horizontes desse movimento de 
massa dos adolescentes e suas leituras. A crítica está 
ancorada no questionamento do potencial forma-
tivo dessas leituras e mediações, uma vez que tais 
livros, em sua maioria, apresentam narrativas des-
dobradas de fórmulas de sucesso, que reproduzem 
modelos e estereótipos. E as mediações apenas 
confirmam a ordem estabelecida. As perdas esta-
riam na experiência superficial com a cultura escrita, 
uma vez que tais livros costumam ter linguagem 
pobre e pouco exigente; na conformação de visões 
de mundo em função das repetições de enredos, 
personagens e formas; na restrição a temas e auto-
res de um mesmo nicho. 
Obviamente, os leitores cumprem percursos singu-
lares, marcados por suas experiências e práticas 
culturais. As tendências e os modismos também são 
constituídos por desvios que levam a caminhos não 
previstos. Alguns seguirão lendo e tendo nos livros 
um instrumento de compreensão e de indagação 
da vida, como na infância, mesmo que com alguns 
intervalos. Outros lerão esporadicamente, sem tanta 
paixão. E há os que buscarão outras formas de 
conhecer o mundo, sem passar pelas leituras. Não 
há como prever, nem como controlar as trajetórias 
de nossos filhos, sobrinhos, netos e alunos. Podemos 
insistir na oferta de livros e nos convites à leitura, sem 
fazer disso instrumento de pressão, nem moeda de 
troca, junto aos adolescentes. 
Ler junto, conversar sobre livros, trocar impressões 
sobre leituras, buscar aproximações da literatura 
69
com outras artes e frequentar bibliotecas e livrarias é 
algo a ser feito. Também é preciso controlar a angús-
tia e a ânsia competitiva e produtiva (“você tem que 
ler para escrever melhor”, “seu primo lê muito mais 
que você”, “na minha época os livros eram valoriza-
dos”), respeitando e considerando as escolhas dos 
adolescentes – não podemos nos esquecer de que 
nesse momento da vida as leituras são também 
exercícios de socialização, de trocas entre colegas e 
amigos, de formação de turmas.
Os convites aos adolescentes para ler uma obra que 
admiramos ou conhecer um autor que consideramos 
importante tem que ser apenas um convite, não uma 
pressão insistente. É claro que na formação escolar 
as coisas são diferentes, pois há propostas curricula-
res e objetivos a serem cumpridos, mas os professo-
res sempre podem encontrar caminhos para que os 
livros considerados chatos ou difíceis sejam interes-
santes e façam sentido para os estudantes. 
E, claro, é fundamental a criação e a consolidação de 
políticas estruturais, que garantam escolas, bibliote-
cas e profissionais com infraestruturas adequadas e 
boas condições de trabalho, para que todas as pes-
soas – crianças, jovens e adultos – compreendam a 
leitura como bem e possam ter acesso a livros. 
70
O que é biblioteca pública?
As bibliotecas públicas podem ser definidas de várias 
maneiras e encontram, na bibliografia sobre o tema 
e no entendimento do senso comum sobre suas fun-
ções, pontos de consenso. Independentemente de 
sua ênfase, distintas concepções estão ancoradas 
em aspectos que podem ser considerados eixos de 
suas formas de realização no Brasil: organização, 
guarda e disponibilização de materiais bibliográfi-
cos e documentais; preservação da memória local; 
prestação de serviços de informação à comunidade 
na qual está inserida; realização de atividades de 
promoção da leitura e de inclusão digital; oferta de 
programação cultural; apoio a pesquisas escolares 
e de interesse geral. Com algumas variações, estes 
são os eixos mais comuns de atuação de bibliotecas 
públicas no Brasil. 
As bibliotecas públicas são criadas e geridas pelo 
poder público municipal, estadual ou federal. A 
manutenção de seu espaço e o pagamento dos pro-
fissionais que nelas trabalham são de responsabi-
lidade da prefeitura, do governo do Estado ou da 
União. De maneira geral, elas estão vinculadas às 
secretarias de Educação e de Cultura, mas acontece, 
em função da organização das esferas de poder, de 
71
estarem também em pastas de Assistência Social, 
Lazer e Turismo. 
Seus serviços são gratuitos e direcionados a toda a 
comunidade, devendo, por isso, ser abrangentes e 
diversos. Os mais comuns são o apoio à pesquisa 
e o empréstimo domiciliar, além, é claro, do aten-
dimento e das orientações oferecidos pelos profis-
sionais aos usuários (os frequentadores de bibliote-
cas também são chamados de usuários) a partir de 
suas demandas.
O acervo bibliográfico das bibliotecas públicas deve 
atender a demandas de crianças, jovens e adultos, 
garantindo recursos de acessibilidade para pessoas 
com deficiências, além de oferecer ao seu público 
sugestões de leituras que ampliem e aprofundem 
seus interesses, ainda que estas não tenham sido 
explicitamente solicitadas – muitas vezes, as pessoas 
não se sentem à vontade para perguntar, para con-
versar. É importante que em suas coleções de livros e 
de outros materiais de leitura estejam títulos de litera-
tura e de não ficção, obras de referência, periódicos. 
E que eles contemplem a multiplicidade de forma-
tos, incluindo os acessíveis, a pluralidade de autorias, 
de sistemas de pensamento e de experimentações 
estéticas que representam a diversidade da pro-
dução cultural e científica humana. A depender de 
especificidades locais ou conceituais, as bibliotecas 
públicas podem formar coleções especiais. A Biblio-
teca Pública Infantil e Juvenil de Belo Horizonte, por 
exemplo, conta com uma coleção especial de livros 
sobre a infância e a juventude, reunindo publicações 
de várias áreas do conhecimento sobre o tema. Já 
a Biblioteca Pública Estadual de Minas Gerais, de 
cujas funções faz parte a guarda da memória, da 
cultura e da história mineiras, desenvolve perma-
72
nentemente a Coleção Mineiriana, com obras sobre 
Minas Gerais e escritas por autores mineiros. 
As atividades propostas pela biblioteca pública refle-
tem seus objetivos e seus horizontes, pois servem 
para promover experiências culturais, principal-
mente as vinculadas à cultura escrita, e para dar visi-
bilidade a práticas e temas considerados importan-
tes. Atualmente, um dos principais compromissos das 
bibliotecas públicas no Brasil tem sido a formação 
de leitores, especialmente crianças e adolescentes. 
Para isso, elas oferecem atividades as mais diversas 
– oficinas de sensibilização e de formação, rodas e 
clubes de leitura, narrações de histórias, encontros 
com escritores e ilustradores, saraus – para crianças, 
jovens e adultos. 
Seus espaços devem ser acolhedores e refletir o 
caráter aberto e democrático da instituição. Ainda 
que simples e resultado de muitas adaptações 
(lamentavelmente, são poucos os prédios original-
mente projetados e construídos para abrigar biblio-
tecas no Brasil), o imóvel precisa permitir a circulação 
das pessoas, considerando o conforto e a segurança 
das crianças e as necessidades específicas das pes-
soas com deficiência. A disposição do mobiliário, a 
sinalização de informações e toda a lógica espa-
cial devem ser pensadas em favor dos leitores, dos 
já frequentes e dos que vêm pela primeira vez. E, 
claro, o ideal é que nas grandes cidades a biblioteca 
pública esteja localizada em espaço de grande cir-
culação de pessoas e com fácil acesso, considerado 
o transporte público. Nas pequenas, em local que 
seja acessível para a população.
O adequado é que todas as bibliotecas públicas 
contem com bibliotecárias em sua equipe, dispondo 
73
de conhecimentos técnicos específicos para sua 
gestão, organização, desenvolvimento de acervos, 
oferta de serviços e promoção de atividades. É muito 
importantetambém a presença de profissionais de 
outras áreas, ampliando os repertórios e as experi-
ências para a construção diária de uma biblioteca 
aberta, democrática, inclusiva e acessível, de todas 
as pessoas e para todas as pessoas. 
74
O que é biblioteca escolar?
Como o próprio nome indica, biblioteca escolar é 
aquela que está na escola. Todas as pessoas, espe-
cialmente as crianças e os adolescentes e suas famí-
lias, deveriam conhecê-la, uma vez que o direito à 
educação formal, que compreende o período da 
Educação Básica no Brasil, deve ser obrigatoria-
mente cumprido nas escolas. 
O entendimento mais comum sobre a função das 
bibliotecas escolares está marcado pela oferta de 
uma coleção de livros e serviços em torno do cur-
rículo e do projeto pedagógico da escola, com foco 
no ensino-aprendizagem, incluindo também pers-
pectivas que contemplam a formação de leitores e 
o acesso a novas tecnologias.
Não há dúvidas de que as bibliotecas escolares 
devem estar a serviço do que se pretende ensinar 
e aprender nas escolas. Essa concepção pode ser 
tomada de maneira objetiva e restrita, com a oferta 
pela biblioteca dos conteúdos previstos nas grades 
curriculares de diferentes disciplinas – língua portu-
guesa, literatura, geografia, história, filosofia, artes, 
matemática, física, química... –, aprofundando o 
conhecimento das matérias estudadas nas salas de 
aula. Isso inclui, claro, as leituras de livros de literatura 
75
e atividades delas derivadas, como leituras públicas 
de textos, reescrita das histórias, apresentações para 
famílias e outras turmas, dentre outras. 
Mas as bibliotecas escolares podem mais, muito 
mais que incrementar as atividades pedagógicas da 
escola. Sem desconsiderar seu compromisso institu-
cional, elas podem convidar os estudantes de todas 
as idades, da Educação Infantil ao Ensino Médio, a 
olhar para o mundo e para o espaço em que vive-
mos de maneira mais ampla e elaborada, menos 
marcada pelas tarefas escolares, ainda que indubi-
tavelmente produtiva em sua formação acadêmica. 
O trabalho educativo, cerne da educação escolar, 
deve ter no horizonte a formação dos estudantes 
como um todo, tanto para a compreensão de sua 
vida social, política, cultural e econômica, como 
para a preparação para o mercado de trabalho. E a 
biblioteca deve estar comprometida com esse pro-
cesso. Mas como?
Em primeiro lugar, é preciso que ela seja compre-
endida pela comunidade escolar (estudantes, edu-
cadores, famílias) como espaço de formação, e 
não apenas como lugar para empréstimo de livros 
e realização de pesquisas. Em suas estantes, à dis-
posição dos estudantes, e também dos professores, 
devem estar livros e materiais de leitura que permi-
tam o aprofundamento dos conteúdos disciplinares, 
ampliando e diversificando as vozes e pontos de 
vista sobre um mesmo tema, ainda que de maneira 
conflitante. Esse é um aspecto importante: para 
que os estudantes possam efetivamente pesquisar 
e estudar um tema (e isso é diferente de apenas 
buscar respostas para perguntas previamente esta-
belecidas), é necessário que lidem com distintas 
fontes de informação sobre o mesmo, incluindo con-
76
tradições. Essa diversidade deve estar contemplada 
nas abordagens teóricas (autores que pensam um 
mesmo assunto por perspectivas distintas, por exem-
plo) e nos gêneros textuais: manuais, enciclopédias, 
almanaques, atlas, ensaios, biografias, histórias... 
O conhecimento humano é formado por manei-
ras diferentes de explicação e de compreensão da 
natureza, da vida social e da história e isso deve ser 
um convite ao pensamento. 
A educação literária também deve fazer parte desse 
compromisso da biblioteca escolar com o traba-
lho educativo. Para além dos discursos de prazer 
e encantamento que cercam as iniciativas para a 
promoção da leitura de livros de literatura, a leitura 
literária deve ser tomada como uma forma de com-
preensão do tempo, do mundo e do espaço em que 
vivemos. Saber como outras pessoas pensam, expe-
rimentar o que elas sentem, entender formas de vida 
distintas da nossa, construir narrativas com palavras 
e imagens, tomar os livros como objetos de cultura 
que nos ajudam a saber quem somos e como vive-
mos são experiências indispensáveis na formação 
humana. Criar condições para que os estudan-
tes conheçam e se disponham às narrativas literá-
rias faz parte das tarefas das bibliotecas escolares. 
Para isso, elas devem primar pela diversidade de 
gêneros textuais em seu acervo – romances, nove-
las, poemas, crônicas, textos dramáticos, narrativas 
ilustradas, histórias em quadrinhos –, assim como 
de autorias e experimentações estéticas. Além disso, 
devem realizar atividades, em parceria com profes-
sores ou autonomamente, para ler com os estudan-
tes: rodas e clubes de leitura, encontros com escrito-
res, oficinas, narrações de histórias...
A construção de bibliotecas escolares comprometi-
77
das com o trabalho educativo não é tarefa fácil, mas 
constitui uma exigência para quem compreende a 
educação formal como direito de todas as pessoas 
a acesso ao conhecimento artístico e científico pro-
duzido pela humanidade ao longo do tempo e no 
espaço. Nas bibliotecas, e especialmente nas esco-
lares, isso se materializa em práticas lentas mas 
perenes de oferecer aos estudantes muitos jeitos de 
conhecer o mundo, seja através de respostas a per-
guntas que outros, em momentos distintos, fizeram, 
seja nas indagações que nos parecem, individual e 
coletivamente, necessárias hoje. 
Cada um dos livros que compõe o acervo, a orga-
nização dos serviços (dias, horários e regras de fun-
cionamento, formas de empréstimo, orientações 
para a pesquisa, dentre outros aspectos) e a oferta 
de atividades devem funcionar organicamente em 
torno da concepção de biblioteca escolar que se 
deseja. E o que se deseja, neste caso, está indis-
sociavelmente atrelado ao que pensamos sobre 
escola e formação. 
Importante: a Lei 12.244/10 estabeleceu que no 
prazo máximo de dez anos, isto é, em 2020, todas 
as instituições de ensino do país, públicas e privadas, 
deveriam contar, obrigatoriamente, com bibliote-
cas escolares. O prazo para cumprimento desta Lei 
foi ampliado por outra, a 9.484/18, para 2024, mas 
ainda são pouco perceptíveis os movimentos das 
instituições para seu cumprimento. É importante que 
haja um documento como esse, que cria instrumen-
tos legais para a garantia de bibliotecas nas escolas, 
mas tão importante quanto sua existência é a refle-
xão sobre a pertinência e a relevância das bibliote-
cas no ambiente escolar.
78
O que é biblioteca 
comunitária?
Há muitas formas de definir uma biblioteca comuni-
tária. Podemos tratar de seu público, trabalhadores, 
espaço, acervo e serviços para fazer uma apresenta-
ção inicial. Mas optamos por começar por uma ideia 
que parece central nas iniciativas dessa natureza em 
todo o país: o compromisso com a democratização 
do acesso aos livros e à leitura em espaços, em sua 
maioria urbanos, onde o poder público é ausente. 
Criadas, mantidas e geridas por pessoas ou insti-
tuições da sociedade civil, as bibliotecas comunitá-
rias surgem da compreensão de que a leitura é um 
direito de todas as pessoas, que deve ser garantido 
de forma descentralizada e gratuita. E porque o 
poder público – prefeituras, estados e governo fede-
ral – não cumpre suas obrigações, principal e con-
traditoriamente em regiões periféricas e de grande 
vulnerabilidade social, outros caminhos precisam 
ser construídos.
Esses caminhos não costumam ser fáceis e exigem 
o trabalho de muitas pessoas, mesmo em iniciativas 
individuais, muitas vezes em espaços domésticos, em 
salas e tempo cedidos pela dona da casa. Há biblio-
tecas comunitárias que são resultado de pequenos 
projetos de promoção da leitura, que em função da 
79
mobilização da comunidade ganham visibilidade e 
conseguem apoio local – um espaço para funcionar, 
doação de livros e pessoas que se oferecem para 
trabalhar voluntariamente. Algumas delas surgem 
em,ou posteriormente se vinculam a instituições já 
existentes, como igrejas, creches, associações de 
bairro e centros culturais. 
Os acervos bibliográficos são, de maneira geral, for-
mados por doações, tanto de pessoas que querem 
contribuir para a manutenção da biblioteca, quanto 
de instituições públicas e privadas, por meio de pro-
gramas específicos de apoio a bibliotecas comunitá-
rias e a projetos de promoção da leitura desenvolvi-
dos pela sociedade civil. 
As trabalhadoras e os trabalhadores das bibliote-
cas comunitárias, autointitulados “mediadores de 
leitura”, são, sem dúvida, o coração da ação. Enga-
jados e comprometidos com a garantia do direito 
à leitura, criam as condições materiais e simbóli-
cas para a existência das bibliotecas comunitárias. 
Voluntariamente ou com remuneração viabilizada 
por projetos apoiados via leis de incentivo à Cultura 
e por ações de responsabilidade social de empre-
sas, os mediadores de leitura escrevem projetos, 
cuidam da gestão da biblioteca, promovem ativi-
dades, atendem os leitores, realizam seminários e 
eventos de formação e ainda participam da elabo-
ração, do acompanhamento e do controle de polí-
ticas públicas, marcando presença em espaços de 
participação social, como conselhos, grupos de tra-
balho setoriais e audiências públicas. 
A articulação em redes tem se mostrado funda-
mental para a organização e o fortalecimento das 
bibliotecas comunitárias brasileiras. Reunindo insti-
80
tuições e pessoas de várias regiões em seminários, 
grupos de trabalho e movimentos de reivindicação 
por políticas públicas, as redes divulgam as biblio-
tecas, a ação comunitária, o trabalho dos mediado-
res de leitura e sua relevância sociocultural, dando 
visibilidade à causa e à mobilização em seu favor. 
Além disso, se colocam como objeto de atenção das 
universidades, que são convocadas a considerá-las 
em suas pesquisas. 
Muitas vezes, são as bibliotecas comunitárias e suas 
redes que provocam o poder público para a reflexão 
sobre e a criação de políticas setoriais. 
No que toca a serviços e atividades, as ofertas das 
bibliotecas comunitárias são semelhantes às das 
escolares e públicas, uma vez que são instadas a 
ocupar as lacunas deixadas, muitas vezes como 
projeto, pelo poder público. Aos seus leitores são 
oferecidos empréstimos de livros, orientações para 
a realização de pesquisas escolares, atividades de 
convite à leitura e à escrita (rodas de leitura, nar-
ração de histórias, oficinas, saraus...), programação 
cultural envolvendo distintas linguagens artísticas. 
Não restam dúvidas sobre a relevância social, cul-
tural e educacional das bibliotecas comunitárias no 
Brasil. Com caminhos e métodos diversos, compar-
tilhando um horizonte comum, elas criam e viabili-
zam, perene e coletivamente, modos de ampliar o 
direito à leitura no país. E, claro, alteram as formas 
de pensar as bibliotecas e a ação cultural brasileiras.
81
Quem trabalha na biblioteca?
Muitas pessoas, com formações e experiências distin-
tas, trabalham nas bibliotecas comunitárias, escolares 
e públicas. Juntas, se esforçam para oferecer às suas 
comunidades uma ação bibliotecária que garanta 
acesso a livros e a materiais de leitura e mediações 
que ampliem seus horizontes para a compreensão 
de suas existências, individual e coletivamente.
Para muita gente, são “bibliotecárias” todas as pes-
soas que trabalham em bibliotecas, organizando o 
acervo e atendendo os leitores. Apesar de generoso, 
porque cria uma identidade afetiva e certa organi-
cidade junto às trabalhadoras da instituição, nesse 
entendimento há algumas especificidades que pre-
cisam ser ressaltadas para que as singularidades de 
cada atuação sejam valorizadas.
A bibliotecária é uma profissional de nível supe-
rior, graduada em Biblioteconomia, um campo de 
conhecimento que se dedica aos estudos sobre 
bibliotecas, à reflexão sobre a informação e também 
à organização e à gestão de documentos. Esses 
dados são breves e resumidos sobre a área, mas 
suficientes para localizar a formação da bibliotecá-
ria no campo que nos interessa: bibliotecas comu-
82
nitárias, escolares e públicas, promoção da cultura 
escrita, formação de leitores e ação cultural.
São muitas as tarefas desenvolvidas por bibliotecá-
rias: planejamento e gestão dos serviços e ativida-
des de bibliotecas, desenvolvimento e tratamento 
de seu acervo bibliográfico, elaboração e execução 
de projetos para a promoção da leitura, pesquisa e 
escrita de textos sobre a área e, claro, atendimento 
aos leitores. Em resumo, as bibliotecárias são pro-
fissionais com formação específica para participar, 
coordenando, em muitos casos, de todo o processo 
de planejamento, de funcionamento e de gestão de 
uma biblioteca.
Lamentavelmente, nem todas as bibliotecas comu-
nitárias, escolares e públicas brasileiras contam com 
os serviços de bibliotecárias, por motivos os mais 
diversos – pequeno número de profissionais dis-
poníveis no mercado, poucos cursos de graduação 
em Biblioteconomia, recursos públicos limitados ou 
inexistentes para investimento em bibliotecas... Isso 
faz com que muitas se organizem a partir conheci-
mento que pessoas que nela trabalham têm sobre a 
instituição, com muitas experiências exitosas nessas 
formas de realização.
O desejo e a necessidade de professoras, educa-
doras, agentes comunitárias e culturais de traba-
lhar com leitores, livros e leituras (o primeiro muitas 
vezes descoberto quando uma professora, por 
motivos diversos, é deslocada da sala de aula para 
esse espaço, por exemplo) criaram as condições 
para que muitas profissionais desenvolvessem com 
excelência seu trabalho em bibliotecas. Em todo 
o país temos bons exemplos disso. Quanto mais 
diversa e multidisciplinar a equipe que trabalha na 
83
biblioteca, mais referências culturais estarão dispo-
níveis para os leitores.
O essencial é que toda a equipe da biblioteca 
esteja comprometida com um projeto democrático 
e inclusivo, que acolha as demandas dos leitores 
e contribua para a ampliação de seu repertório 
para compreender o mundo, o tempo e o espaço 
em que vivemos, incluindo as relações de que par-
ticipamos. Nesse sentido, perguntas, olhares e con-
versas devem ser tomados como oportunidades 
de diálogo, de interações que permitam sugestões 
mútuas de leituras e trocas de impressões sobre 
livros, autorias, sistemas de pensamento e expe-
rimentações estéticas. Nessa visada, as pessoas 
fazem da biblioteca um espaço para encontros em 
torno de ideias e de questões, pontuais ou perenes, 
que nos tocam coletivamente. 
Além disso, para que a biblioteca seja efetivamente 
de todos e para todos, é necessário que seus ser-
viços, acervos, atividades e espaços estejam dis-
poníveis para pessoas com características distintas. 
Sabemos que existem muitas limitações objetivas, de 
ordem material, nas bibliotecas brasileiras – imóveis 
adaptados, muitas vezes precariamente; inexistên-
cia de recursos financeiros para aquisição de livros 
selecionados pela equipe; mobiliário inadequado, 
porque aproveitado de outras instituições; equi-
pamentos ultrapassados... – e algumas constituem 
obstáculos intransponíveis. No entanto, sem deixar 
em segundo plano as reivindicações de condições 
adequadas para o funcionamento das bibliotecas, 
a equipe pode encontrar soluções atitudinais que 
acolham da melhor maneira possível as demandas 
de seus usuários. Muitas vezes, a percepção sensí-
vel de situações específicas e o compromisso com 
84
cada leitor já são parte da solução do que poderia 
se tornar um problema. 
Em resumo: são as pessoas, com suas visões de 
mundo, atitudes e propostas, que constroem as 
bibliotecas e seus horizontes.
85
O que são políticas públicas 
para a garantia do 
direito à leitura?
A conquista e a manutenção de direitos são tarefas 
permanentes, de responsabilidade de toda a socie-
dade. Direitos básicos de que hoje dispomos, como 
o acesso gratuito à Educação e o atendimento no 
Sistema Único de Saúde, ouaté mesmo o direito de 
votar e de ser votado, que nos parecem naturais, são 
resultado de muitas e longas lutas de partidos políti-
cos, movimentos sociais, servidores públicos, pesqui-
sadores, estudantes e profissionais de distintas áreas. 
No campo da leitura não é diferente. Coisas básicas 
como ter livros didáticos para todos os estudantes e 
acesso a livros de literatura nas escolas públicas, por 
meio de programas específicos para isso, são resul-
tado de construções coletivas feitas a muitas mãos e 
marcadas por muitos conflitos. 
As políticas públicas, que se realizam em programas, 
projetos e ações, existem para sanar problemas da 
população – garantir o direito de todas as crianças à 
Educação Infantil, por exemplo – e para promover o 
desenvolvimento humano, isto é, para criar condições 
de vidas dignas e justas para todas as pessoas, ainda 
que iniciativas dessa natureza não se apresentem, à 
primeira vista, como uma questão a ser resolvida. 
86
Um bom exemplo de política pública que não se apre-
senta como solução imediata aos muitos problemas 
existentes e visíveis em nossa sociedade é a lei que 
dispõe sobre a universalização de bibliotecas esco-
lares nas instituições de ensino brasileiras. Lamen-
tavelmente, ter bibliotecas nas escolas ainda não 
constitui uma reivindicação popular, nem mesmo de 
educadores, considerados de maneira ampla. Mas 
a legislação que obriga as escolas a terem bibliote-
cas contribui para a garantia do direito de crianças, 
adolescentes e jovens à leitura e para a melhoria de 
condições para a realização do trabalho educativo 
nas escolas. E isso, claro, concorre para que os estu-
dantes tenham ampliados seus instrumentos para o 
conhecimento e a indagação do mundo, ancoragem 
de uma Educação emancipadora. 
Em uma sociedade como a brasileira, em que tantos 
direitos são cotidianamente negados à população, 
especialmente a quem mais precisa ser assistido, a 
tendência é lidarmos com urgências, buscando solu-
ções para situações emergenciais. No entanto, as 
pessoas têm direito a viver dignamente, para além 
da sobrevivência comezinha, e outras construções 
se mostram necessárias. Assim, as políticas públicas 
precisam ser pensadas organicamente no enfrenta-
mento de carências existentes e na proposição de 
avanços sociais. 
As políticas públicas para a garantia do direito à lei-
tura estão localizadas, principalmente, nas pastas 
da Educação e da Cultura, embora ações de outras 
áreas sejam importantes para a criação de con-
dições para que as crianças, os adolescentes e os 
jovens acessem instituições educacionais e equi-
pamentos culturais. Estruturadas em leis, planos, 
programas e ações, elas têm como objetivo apon-
87
tar diretrizes, criar normativas e indicar/garantir os 
recursos simbólicos e materiais para sua realização. 
É fundamental que a legislação estabeleça respon-
sabilidades para Municípios, Estados e a União e 
oriente seu cumprimento, mostrando os caminhos a 
serem percorridos em cada instância. 
Porque vivemos em uma democracia representa-
tiva (elegemos os nossos representantes nos pode-
res executivo e legislativo) e participativa (conta-
mos com instâncias de participação social para a 
elaboração, implementação, acompanhamento e 
avaliação de políticas públicas), podemos nos apro-
priar, individual e coletivamente, de muitos proces-
sos de planejamento e de decisão públicos. Conse-
lhos, audiências e consultas públicas, instâncias de 
participação social conquistadas com a Constitui-
ção Federal de 1988, conhecida como Constituição 
Cidadã, são importantes instrumentos que devem 
ser fortalecidos pela sociedade civil, ainda que seu 
funcionamento pareça moroso e burocrático. Preci-
samos não perder de vista que todos os nossos direi-
tos são produto de construções, nem sempre consen-
suais, que não se deram do dia para a noite. Ainda 
que pareçam insatisfatórias frente às necessidades 
existentes e os horizontes almejados, as conquistas 
legais são importantes como ancoragem para uma 
tarefa que seguirá sempre em marcha, uma vez que 
os direitos precisam ser reafirmados e aprimorados 
todos os dias, sem pausas. 
Mesmo que ainda frágeis em sua execução, as 
políticas públicas devem orientar o cumprimento 
do direito constitucional à Educação e à Cultura 
para todas as pessoas, construindo caminhos para, 
por exemplo, a existência de bibliotecas escolares 
e públicas em todo o país e para que haja livros 
88
nas escolas, e estabelecendo especificidades para 
atuação na área, viabilizando, especialmente nas 
universidades públicas, a formação de profissio-
nais (professores, bibliotecários, educadores) e de 
pesquisadores. Também cabe às políticas públi-
cas reconhecer a ação da sociedade civil em favor 
da democratização do acesso à leitura, apoiando 
objetivamente iniciativas que concorrem para este 
fim, como a criação e a manutenção de bibliotecas 
comunitárias em todo o território nacional. 
São muitas as demandas e as proposições que 
devem ser contempladas pelas políticas públicas 
para a garantia das condições materiais e sub-
jetivas para a participação na cultura escrita em 
nossa sociedade, abarcadas na legislação atinente 
ao tema. Para que as diretrizes e recomendações 
sejam efetivamente cumpridas, é fundamental que 
nos organizemos e nos mobilizemos para, nas devi-
das instâncias de participação social, contribuir na 
construção do direito à leitura. 
90
Os leitores e suas leituras por 
eles mesmos - depoimentos
Francisco Souza Daher, 9 anos
A lembrança mais antiga que eu tenho de mim lendo 
é bem pequenininho com a minha mãe. Esses livros 
eram E você?, Ops!, a coleção do Pum, a coleção do 
Grúfalo.
Eu pedia pra ler muito o mesmo livro. O Ops! eu pedia 
muito. Gostava dos jeitos diferentes de falar "ops"!
Quando eu sentava pra ler junto com a minha mãe 
sentia uma alegria. E eu li tanto com a minha mãe 
que eu acabei aprendendo a ler sozinho! E depois 
que a gente aprende a ler sozinho, a gente pode ler 
até pra mãe! Pode ler pra irmãzinha, pra outra irmã, 
pro pai... Mas mesmo assim eu gosto muito de ler 
com a minha mãe. Porque quando eu leio com a 
minha mãe eu sinto um amor no coração. Eu amo ler 
com a minha mãe. É muito mais divertido porque a 
minha mãe entra na aventura também. O filho entra 
na aventura do livro, ele dá a mão e puxa a mãe 
e ela entra junto. É assim que acontece quando a 
minha mãe lê comigo.
Agora eu leio pra minha irmãzinha. Ela faz igual eu 
fazia, pede pra ler os mesmos livros!
E quando pego um livro pra ler eu acabo entrando 
dentro do livro, eu exploro dentro do livro as aventu-
91
ras. E eu gosto das imagens e de conhecer sobre os 
autores. Ler é muito legal! Não faz ficar entediado, 
faz o cérebro saber mais coisas.
Eu gosto de muitos autores e ilustradores. Gosto da 
J.K.Rowling, do Dav Pilkey, da Marilda Castanha. 
Tem alguns que eu conheço até pessoalmente! Eu 
fico muito feliz quando isso acontece. Por exem-
plo, quando eu fui conhecer a Marilda Castanha eu 
fiquei muito, muito feliz!
Eu gosto muito de pegar livros na biblioteca da 
escola. Pego alguns livros que aparecem no livro 
didático, alguns que não tem na minha casa. Não 
são todos os colegas que gostam de ler, sabe?
Eu comecei a ler com quatro anos. Mas antes de 
saber ler eu lia com a minha mãe. E a cada ano eu 
fui me acostumando mais e gostando mais e mais 
da leitura.  E hoje eu dou o exemplo pra minha irmã-
zinha, porque ela gosta muito de mim, então eu leio 
com ela, e vou passar meus livros favoritos pra ela. A 
Iolanda gosta muito quando eu leio pra ela.
E eu quero que todas as crianças do Brasil tenham 
direito a ter livros, assim como eu tenho livros, 
porque a gente quando lê aprende um montão de 
coisas. Pra mim a leitura é um coração gigante! 
Todos deveriam ler!
92
Thereza da Silva Chagas Souza Santos, 
12 anos
Meu nome é Thereza e tenho 12 anos. Comecei a ler 
sozinha, aos 5 anos, mas antes disso sempre li livros 
junto com a minha mãe. Meu pai e minha madrastatambém sempre me levavam quando iam fazer 
apresentações ou ouvir contações de histórias. Por 
isso, sempre gostei muito desse mundo de livros e 
pra mim é muito impressionante como eles podem 
levar a gente para muitos lugares, descobertas e 
fatos. É uma coisa totalmente mágica toda vez que 
você pega um livro e acompanha tudo que o perso-
nagem vive, sente aquela emoção de um jeito que 
faz você ficar tão imersa e fixada e ansiosa para 
saber tudo que pode acontecer. Na literatura que 
você aprende outras perspectivas do que está ao 
seu redor, sobre você e sobre sua visão das coisas. 
Eu sempre adorei ler livros em biblioteca, então 
acho muito importante ter bibliotecas nas escolas, 
com várias opções pra ler. Eu adoro passar parte do 
recreio conhecendo autores e universos, novas histó-
rias. É uma coisa tão boa de se fazer que realmente 
me encanto por saber que tem tanta coisa para des-
cobrir! Tem tanta coisa para ler, tantas histórias que 
podem mudar o meu jeito de ver o mundo e de pensar! 
Acho que quanto mais as pessoas se interessarem 
pela leitura e quanto mais a gente espalhar o poder 
da leitura, mais ela vai fazer parte de várias vidas e 
trazer o bem.
93
Teresa Farias Santos, 16 anos
Minha mãe me deu a ideia de começar esse texto 
com um caso de quando eu era menor, mas o pro-
blema é que não me lembro dele. Como vou escre-
ver sobre algo que não lembro? Por isso, decidi 
começar por uma memória. Parece mais uma 
memória sensorial e afetiva de uma biblioteca.  
As portas eram enormes, todas de vidro. Quando 
você entrava, conseguia ver a biblioteca. Ao lado 
da entrada tinha uma bancada gigante. Ali sempre 
tinha um sorriso junto das teclas de um computador 
e de uma antiga máquina de escrever que costu-
mávamos usar como brinquedo, meu irmão e eu. 
A biblioteca parecia que não ia acabar nunca, um 
corredor gigante (eu lembro até hoje do lugar dos 
gibis da Turma da Mônica), cheio de livros. Se você 
atravessasse ele, via mais e mais livros, e pufes. Essa 
foi uma das bibliotecas que nunca esqueci, das his-
tórias ali contadas e de cada sorriso dado.
Admito que quando era menor lia mais. Afinal tinha 
sempre alguém me empurrando um livro, sendo 
filha de quem sou. Nada para reclamar disso. Porém, 
quando fui crescendo perdi o hábito, mas não o 
gosto. Acho que não dá muito para perder o gosto 
se você cresce lendo, se cresce com várias referên-
cias bibliográficas. O livro que lembro que mais lia 
era sobre um suposto monstro que tinha um destino, 
o livro girava em torno disso. Não lembro de ter me 
divertido tanto lendo outro. Devia ser bom mesmo, 
levando em consideração a quantidade de vezes 
94
lido. Mas entendo que gostos mudam, bastante 
inclusive. Antes gostava de monstros imaginários, já 
hoje gosto de monstros reais. Aqueles que estão ali, 
esperando para dar o bote.
Hoje em dia a leitura me atrai mais. Mas quando 
falo isso não quer dizer que eu vá ler todo dia, afinal 
o maior mal do adolescente é a procrastinação. E, 
querendo ou não, nesse âmbito sou igual a todos os 
outros milhares. Pessoalmente, minhas leituras têm 
tempos. Tem mês que eu leio quatro livros de uma 
vez, porém muitas vezes por dois ou mais meses eu 
não quero nem olhar para um livro. A tal da res-
saca literária. Tenho que aprender a conciliar ainda. 
Gosto muito do que minha mãe chama de best-
-sellers, mas não acho que seja totalmente por seu 
conteúdo e sim por ser uma leitura fácil: na maio-
ria das vezes eu não preciso pensar muito e o livro 
não me faz refletir sobre o assunto. E essa é a tal 
da procrastinação, mas tudo bem. Eu vou parar de 
procrastinar um dia, quando a vontade de ler sobre 
os assuntos sobressair.
95
Nino Cruz Castanha, 19 anos 
Meu nome é Nino Cruz Castanha e tenho 19 anos. 
Quando era menor, por volta de 3 a 5 anos, meus 
pais liam muitos livros pra mim na hora de dormir. 
Alguns que me marcaram bastante foram Pinguim, 
de Polly Dunbar (nele eu aprendi a ler), Capitão 
Cueca, de Dav Pilkey, O livro da Nina para guardar 
pequenas coisas, de Keith Haring, Clifford, o cachor-
rão vermelho, de Norman Bridwell. Também fizeram 
parte muito importante da minha infância as revistas 
em quadrinhos do Maurício de Sousa. Eu lia desde 
a Turma da Mônica até as edições especiais da his-
tória (Turma da Mônica Jovem e Lendas Brasileiras, 
por exemplo). Praticamente a todo lugar que ia ou 
onde estava, eu levava uma “revistinha” (como eu 
chamava na época) para ler, mesmo que já tivesse 
terminado sua leitura. 
O meu acesso aos livros nunca foi muito difícil. Como 
os meus pais são ilustradores e autores de livros 
infantis, vivia em livrarias para seus lançamentos e 
em bibliotecas para encontros. Lá conhecia vários 
gêneros de livros, o que me ajudou a criar o meu 
gosto pessoal de hoje em dia. Durante essa minha 
criação do hábito leitor, sempre me afeiçoei mais 
aos estilos de histórias que abordavam um ambiente 
com mais suspense e drama mais tranquilos, como 
por exemplo a coleção do Chris Colfer, Terra de 
Histórias, Manuelzão e Miguilim, do grande escri-
tor Guimarães Rosa. Porém, desde os meus 16 anos 
comecei a ter um grande interesse por livros de 
96
contos de terror ficcionais, como por exemplo os do 
Edgar Allan Poe e do H. P. Lovecraft.
Com toda certeza os meus pais são fundamentais 
na minha formação, seja leitora ou de intelecto. 
Sempre estiveram “na minha cola” para estar lendo 
e hoje entendo que são muito importantes para tudo. 
Além disso, o ambiente escolar também colaborou 
muito nessa formação; quando entrei no Coleguium 
(onde estudo atualmente) tive acesso a livros de 
qualidade que não tive em outros colégios. Minha 
professora de literatura, Lilian Vaz, sempre colocava 
os alunos para ler literatura tradicional: Henriqueta 
Lisboa, Guimarães Rosa, Machado de Assis, Carlos 
Drummond de Andrade, Cecília Meireles, entre 
outros. Foi com ela, inclusive, que tive o prazer de 
ler Manuelzão e Miguilim. Entretanto, acho que não 
cheguei a ter autores e livros que foram importantes 
nesse processo, já que sempre estive lendo diversos 
livros e gêneros.
97
Tomás Farias, 19 anos
Eu não quero falar das minhas memórias de leitura 
na infância. Eu não quero falar de memórias de lei-
tura na infância se falar de memórias for reduzi-las 
à nostalgia intacta do que um dia já foi, se falar de 
infância significa indicar um processo de evolução 
até o que um dia será. Naturalmente eu não quero 
pensar nos livros como instrumentos de aprendi-
zado, se por aprendizado se atribui um valor utili-
tário a eles, para o que está fora deles. Olho para 
aquela criança com carinho e com o estranhamento 
de quem ama, de quem está aprendendo a amar 
a si mesmo. Então olho para mim mesmo, para a 
criança formadora do eu, para a criança formadora 
do mundo como o conheço. A criança que sentiu o 
mundo para que eu pudesse desconhecê-lo cada 
vez mais. A criança que abriu os caminhos mais tor-
tuosos para que eu pudesse me perder em encon-
tros. A criança rodeada de livros. A criança que nos 
livros se sentia. Viva. Conectada. E desconectada. Eu 
enxergo na minha infância o que na minha infância 
eu enxergava. Os desconfortos e os livros que envol-
vem meu corpo agora abraçam o mistério da infân-
cia. O mistério de forma alguma intacto, fruído como 
a literatura, o mistério da linguagem, da memória. 
Uma condição permanente, um mergulho no que 
nunca se tem dimensão, em todas as coisas. Nunca 
lembramos simultaneamente, agora, de todos os 
livros, todos os autores que amamos. Lembramos 
ou sentimos? A memória escorrega, nos assalta. Se 
98
dissolve e se concentra nela mesma, em sua força 
da magnitude da impenetrabilidade dos livros. 
Costumamos chamar de repertório um fragmento 
de nossas experiências. A distância que sentimos 
daquilo que sentimos. Da minha infância a distância 
alimenta o mistério em torno da presença que, sim, 
um dia já fui, e dessa presença a distância também 
escancara suas marcas no mundo, na presença que 
exerço agora. Na minhainfância a distância me 
força a enxergar, também, sim, um esboço. Pelas 
bibliotecas e pelas noites sozinho, pelos momentos 
de leitura com a minha família. Um esboço, porque 
a vida, a minha, a vida em qualquer fase e em qual-
quer lugar é vivida em rascunho mesmo. Que leia-
mos os rascunhos então.
99
Dandara Lessa, 19 anos
Minha relação com a leitura se inicia a partir de um 
desconforto profundo que sentia em relação a uma 
realidade que se apresentava tão dura. Naquela 
época, era difícil para mim conceber modos de lidar 
com tudo o que acontecia à minha volta, então os 
livros, principalmente os fantásticos, eram uma pos-
sibilidade de escape. Eram bons aqueles pequenos 
momentos em que me perdia em ilustrações cheias 
de vida e, no final, tudo ficava bem. Essas primeiras 
leituras se deram ainda nos primeiros anos do Ensino 
Fundamental, por meio de um projeto de incentivo à 
leitura. Lembro-me, ainda que de maneira um pouco 
vaga, de que na primeira vez que peguei um dos 
livros que esse projeto oferecia, pouco me impor-
tei com o conteúdo da obra, pois me encantei com 
cores, formas, cheiros e algumas palavras soltas. 
De início, lê-los me foi cansativo, pois a leitura era 
tida como uma tarefa obrigatória, mas, aos poucos, 
as histórias foram tomando um espaço especial na 
minha casa. Sendo a criança muito travessa que eu 
era, podiam saber que se estava quieta demais era 
porque estava lendo. 
Um questionamento pequenino, feito um bichinho-
-de-pé, crescia a cada leitura: cadê os corpos como 
o meu? A quantidade irrisória de livros que mostra-
vam outras crianças pretas me deixava uma sen-
sação de que aquele mundo fantástico, onde tudo 
era possível e havia finais felizes, não me perten-
cia. Aliado a isso, também passei a perceber que 
100
as infâncias mostradas naquelas páginas não eram 
iguais à minha e daí veio uma outra inconformidade, 
o fato da minha infância não ser perfeita. O mito da 
"infância perfeita" acaba por formatar a própria e, 
deixando muitas outras em uma espécie de não-lu-
gar, não abarca a pluralidade do infantil. Se, num 
primeiro momento, essas leituras me ajudavam a 
fugir da minha realidade, com o passar do tempo 
passaram a escancará-la, mostrando suas tantas 
disparidades. Foi mais ou menos nessa época que, 
por causa de outros acontecimentos, decidi que 
"ser criança" me deixava vulnerável demais a vida 
e tudo nela machucava muito. Talvez fosse o corpo 
pequeno que não suportasse tanta coisa ou o peso 
era grande demais para qualquer um levar. Mas foi 
em um processo de desistir da minha infância que 
passei a ser compreendida como uma menina velha 
demais pra ser criança e minhas leituras cessaram 
por um tempo. 
Após alguns poucos anos, encontro um filósofo que 
me reintroduz a literatura e também me provoca a 
pensar mais sobre as coisas que aconteciam à minha 
volta. Acredito que foi um dos momentos em que 
mais me propus a tecer diversos porquês sobre tudo. 
Foi através dessas novas leituras que não só redes-
cobri minha paixão pela literatura, como também 
estabeleci uma relação mais profunda com o objeto 
de minhas leituras: o livro. Para além da sensação 
de contato físico, passei a firmar uma relação afe-
tiva com o livro e o ato da leitura. Essa minha nova 
perspectiva da literatura me dava ferramentas para 
pensar a vida em seus múltiplos aspectos, e, prin-
cipalmente, minha própria subjetividade. Esse não 
era o objetivo direto dos textos, mas essas novas lei-
turas serviram como propulsores para novos ques-
101
tionamentos e descobertas. Leio meu primeiro livro 
escrito por um autor negro, Memórias Póstumas de 
Brás Cubas, de Machado de Assis; só mais tarde me 
contaram que ele era negro. 
À medida que lia, mais se acumulavam meus porquês 
e minhas inconformidades, especialmente sobre qual 
era lugar do meu corpo nesse espaço. Era preciso 
externá-los de alguma forma e foi na escrita, em um 
pedaço de papel vazio e receptivo, que me encon-
trei confortável para dizê-los. Tomando gosto pelo 
ofício, passei a colecionar diversos outros pequenos 
textos que expressavam minha subjetividade e pen-
savam meu lugar no mundo. Não entendia o meu 
fazer como literário (o que, na época, era um título 
quase sagrado), já que não tinha sido apresentada 
a muitos textos de autores negros e também não 
podia ousar compará-los aos de Machado.
A literatura se apresenta mais uma vez como uma 
ferramenta poderosa de entendimento do mundo 
quando, no ensino médio, encontro corpos e vivên-
cias como a minha sendo apresentados e narrados 
por esses próprios corpos. Conceição Evaristo, Chi-
mamanda Ngozi Adichie, Carolina Maria de Jesus e 
outras tantas autoras que propõem novas narrati-
vas e experiências às quais não estava acostumada 
começam a enriquecer meu repertório e a me esti-
mular a refletir sobre a literatura. É nessas várias 
leituras e discussões dentro de sala de aula que 
também começo a acreditar na potência daquilo 
que posso dizer e criar através do meu próprio corpo 
e punho. A partir de diversas provocações, comecei 
a pensar nas possibilidades de uma literatura demo-
crática, no sentido de que literatura é um direito de 
todos de ocupação e/ou obtenção, o que me moveu 
a continuar lendo e escrevendo. 
102
Fico feliz de, hoje, poder descobrir vários autores 
comprometidos em trazer novas perspectivas, múl-
tiplas e plurais, sobre a infância e em mostrar as 
possibilidades de existência da criança. Acredito que 
quando crescemos, nossa criança permanece nos 
habitando e nada faz a minha mais risonha do que 
ver corpos como o seu compondo as mais interes-
santes e belas narrativas. Durante minha trajetória 
entendi que a literatura, propondo um olhar sensível, 
pode produzir e potencializar afetos. Ler - para uma 
criança - é um ato de afeto!
103
Isabella Reis Rodrigues, 24 anos
Livros como companheiros de jornada: meu 
percurso de formação leitora
Nascida e criada em Belo Horizonte/MG, venho de 
uma família que não possui intensos hábitos de lei-
tura. Me recordo de que em minha casa nunca fal-
tavam jornais: era algo de que meus pais gostavam 
e compravam todos os dias. Lembro do cheirinho de 
café pela manhã e do meu pai lendo jornal assen-
tado à mesa. Gostava de observar ele lendo, e não 
perdia a oportunidade de perguntar sobre o que 
tratava a leitura. Num futuro não tão distante dali, 
a leitura de jornais também se tornou um hábito 
meu. Minhas lembranças de vivências literárias na 
escola durante a Educação Infantil são pouquíssi-
mas, minhas experiências leitoras foram escassas 
nesse período. As recordações dessa época são de 
um processo intenso e sistemático de alfabetização. 
Considero que a minha relação com os livros 
começou por volta dos seis anos de idade, quando 
ingressei no Ensino Fundamental. Só frequentei 
escolas públicas e, como estudante dessa institui-
ção, reconheço e valorizo a sua enorme contribui-
ção para a minha formação como mulher, leitora 
e professora. Foi lá que minha paixão pela litera-
tura começou. Foi onde eu conheci minha primeira 
biblioteca, onde eu descobri novos mundos possí-
veis, onde tive acesso sem limites à imaginação, à 
criatividade e às artes.
Sou apaixonada pela Educação e, em especial,  
pela Educação Infantil. Sou uma defensora incansá-
104
vel dos direitos das crianças e considero o direito à 
literatura dos nossos pequenos inegociável. Sei que, 
assim como eu, muitas outras crianças tiveram ou 
têm acesso a livros e a espaços destinados à litera-
tura apenas quando estão na escola. Muitas dessas 
crianças sofrem, diariamente, violações e têm os 
seus direitos à infância, à brincadeira e à fantasia 
roubados. Lendo literatura podem encontrar novas 
possibilidades de viver o período da infância de uma 
forma que respeite seus tempos e singularidades. 
Me alegra saber que nossa sociedade tem avançado 
na promoção de políticas públicas que visam garan-
tir esses direitos a esses sujeitos. Eu sei, por experi-
ência própria, que políticas com esseobjetivo abrem 
portas na vida das crianças. Pensando nisso, não 
posso deixar de citar o Programa Nacional do Livro 
Didático Literário (PNLD Literário), que substituiu o 
Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE), que 
distribui obras literárias para as bibliotecas das esco-
las públicas do Brasil e  vem promovendo a demo-
cratização do acesso à literatura em nosso país. Na 
cidade de Belo Horizonte, temos a política dos kits 
literários, que desde 2004 distribui obras literárias 
aos estudantes da Rede Municipal de Educação e 
das creches conveniadas com a Secretaria Municipal 
de Educação. Foi através deste recurso que recebi as 
primeiras obras que compõem o meu acervo pessoal 
de livros de literatura. Elas me acompanham até os 
dias de hoje e são muito presentes em minha prática, 
seja atuando diretamente com as crianças ou como 
formadora de docentes da Educação Infantil.
Todo ano, a ansiedade para receber o kit literário era 
grande. Lembro da euforia das crianças da turma 
nos momentos que antecediam a entrega das caixas 
do kit. Com os livros em mãos, nos aventurávamos 
105
naquelas novidades. Os livros que ganhei são muito 
especiais para mim, mas um se destaca devido às 
recordações que tenho com ele. É um livro chamado 
"111 poemas para crianças", do Sérgio Capparelli. Ele 
me proporcionou boas risadas com minha família. 
Fui uma criança que brincava muito na rua e me 
lembro de levar esse livro para lá. Me juntava aos 
meus amigos para ler os poemas, alguns nós já sabí-
amos de cor, mas, mesmo assim, sempre parecia a 
primeira vez. Ainda consigo me lembrar das nossas 
altas gargalhadas. 
Em casa, os kits literários eram recebidos por mim e 
minha irmã e, com isso, nosso acervo foi crescendo 
a cada ano. Nós líamos muito juntas e me lembro da 
nossa felicidade quando nossos pais participavam 
conosco desses momentos. Devido à rotina pesada 
de trabalho, nem sempre era possível, mas quando 
acontecia, era pura alegria. Gostava e ainda gosto 
muito de viver experiências literárias com a minha 
família. Me recordo de esperar ansiosa pela festa da 
família na escola, pois era um dia em que nós podía-
mos participar da contação de histórias que aconte-
cia na biblioteca. Era a minha oportunidade de viver 
esse momento tão especial com minha família ao 
meu lado. Como era bom! Lembro de procurar pelos 
olhos dos meus pais e da minha irmã, para garan-
tir que estávamos compartilhando do mesmo senti-
mento -  e eu tinha certeza que sim. Nós ouvíamos 
histórias, dançávamos, cantávamos. Nos conectáva-
mos através daquelas narrativas, que eram media-
das de forma tão potente, qualificada e cuidadosa.
Na adolescência, fui uma frequentadora assídua da 
biblioteca da escola. Os gostos mudaram. Lembro 
que era um ambiente pequeno, mas bem aconche-
gante. Conversava muito com a bibliotecária, que 
106
sempre me fazia ótimas indicações. Já no Ensino 
Médio as leituras como fruição foram substituídas 
por leituras técnicas e sistematizadas. Minhas visi-
tas à biblioteca diminuíram, mas vez ou outra eu 
fazia empréstimos de livros que me interessavam 
para ler nos meus momentos livres. Aos dezessete 
anos comecei a trabalhar e, com isso, as aquisições 
de livros se tornaram mais frequentes. Confesso que 
sou uma incansável compradora de livros, gosto de 
tê-los comigo. Em 2018, iniciei a graduação em Peda-
gogia na Universidade Federal de Minas Gerais e lá 
meu amor pela literatura só cresceu, principalmente 
pela literatura infantil. Como uma boa e curiosa lei-
tora, visitei e explorei muitas bibliotecas no campus.
Ao recordar meu percurso leitor, fica ainda mais evi-
dente para mim o quanto as minhas vivências refle-
tem e têm um importante papel em minha prática 
docente. Minha relação com os livros me permitiu 
viver as delícias e as descobertas proporcionadas 
pela literatura e eu desejo muito que as crianças e 
professoras com as quais eu atuo também vivam 
essa experiência. Uma experiência que seja inteira, 
carregada de afeto, fantasia e possibilidades. Sei 
que os livros não conseguem dar conta de solucio-
nar todos os conflitos sociais da nossa cidade ou do 
nosso país, mas acredito fortemente que eles são, 
sim, um caminho viável, uma possibilidade que nos 
direciona ao novo, uma ferramenta que nos permite 
reconquistar direitos perdidos e lutar contra desi-
gualdades que ainda persistem em nossa realidade.
Faço desse relato uma oportunidade para reafir-
mar o meu compromisso, como professora e estu-
dante de escola e universidade públicas, de conti-
nuar lutando e defendendo os direitos das crianças 
e contribuindo para a democratização do acesso à 
107
literatura de qualidade. Que os livros e os pequenos 
tomem conta da nossa cidade! Tenho certeza de que 
dessa forma o nosso horizonte ficará ainda muito 
mais belo!
108
Sugestões de leitura
ADORNO, Theodor W. Educação e emancipação. Rio 
de Janeiro: Paz e Terra, 2020.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Literatura infantil. 
In: Confissões de Minas. São Paulo: Cosac Naify, 2011.
ANDRUETTO, MarÍa Teresa. Por uma literatura sem 
adjetivos. São Paulo: Pulo do Gato, 2012.
ANDRUETTO, María Teresa. A leitura, outra revolu-
ção. São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2017.
ARROYO, Leonardo. Literatura infantil brasileira. São 
Paulo: Editora Unesp, 2011.
BAJOUR, Cecilia. Ouvir nas entrelinhas: o valor da 
escuta nas práticas de leitura. São Paulo: Pulo do 
Gato, 2012.
BARBIERI, Stela. Territórios em transformação. São 
Paulo: Jujuba, 2022.
BARTHES, Roland. Aula. São Paulo: Cultrix, 1980.
BERTOLO, Constantino. O banquete dos notáveis: 
sobre leitura e crítica. São Paulo: Livros da Matriz, 
2014.
BERTRAND, Sara. Patos e lobos-marinhos: conversas 
sobre literatura e juventude. Lauro de Freitas: Solis-
luna Editora; São Paulo: Selo Emília, 2021.
BOJUNGA, Lygia. Livro - um encontro. Rio de Janeiro: 
Casa Lygia Bojunga, 2004.
109
BRITTO, Luiz Percival Leme. Inquietudes e desacor-
dos: a leitura além do óbvio. Campinas, SP: Mercado 
de Letras, 2012. 
BRITTO, Luiz Percival Leme. Ao revés do avesso: lei-
tura e formação. São Paulo: Pulo do Gato, 2015.
CADEMARTORI, Ligia. O professor e a literatura: 
para pequenos, médios e grandes. Belo Horizonte: 
Autêntica, 2009.
CALVINO, Ítalo. Seis propostas para o próximo milê-
nio. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
CANDIDO, Antonio. O direito à literatura. In: Vários 
escritos. 5ª ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2011.
CASTRILLÓN, Silvia. O direito de ler e de escrever. 
Tradução de Marcos Bagno. São Paulo: Pulo do 
Gato, 2011.
CHAPELA, Luz María. Quem conta um conto... Os 
menores de sete anos como leitores e autores. São 
Paulo: Edições SM, 2015.
COELHO, Isabel Lopes. A representação da criança na 
literatura infantojuvenil. São Paulo: Perspectiva, 2020.
COELHO, Nelly Novaes. Panorama histórico da lite-
ratura infantil/juvenil. Barueri, SP: Manole, 2010.
COELHO, Nelly Novaes. Dicionário crítico da literatura 
infantil e juvenil brasileira. São Paulo: Edusp, 1995.
COLASANTI, Marina. Fragatas para terras distantes. 
Rio de Janeiro: Record, 2004.
COLASANTI, Marina. Como se fizesse um cavalo. 
São Paulo: Pulo do Gato, 2012.
COLEÇÃO LEITURA E ESCRITA NA EDUCAÇÃO INFAN-
110
TIL. Ministérios da Educação / Secretaria de Educa-
ção Básica. Brasília: MEC/SEB, 2016. Disponível em: 
https://lepi.fae.ufmg.br/publicacoes/colecao/
COLOMER, Teresa. A formação do leitor literário. 
São Paulo: Global, 2003.
COLOMER, Teresa. Andar entre livros: a leitura lite-
rária na escola. São Paulo: Global, 2007.
COLOMER, Teresa. Introdução à literatura infantil e 
juvenil atual. São Paulo: Global, 2017.
COMPAGNON, Antoine. Literatura para quê? Belo 
Horizonte: Editora UFMG, 2009.
CORSINO, Patrícia (org.). Travessias da literatura na 
escola. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2014.
COUTINHO. Samara; CASTRO, Cecília; RIBEIRO, Ana 
Elisa (orgs.). Edição, s.f.: um verbete expandido. Belo 
Horizonte: Entretantas, 2023.
CUNHA, Leo (org.). Poesia para crianças: conceitos, 
tendências e práticas. Curitiba:Positivo, 2014.
FEDATTO, Carolina P.; FARIAS, Fabíola; DAHER, Juliana 
(orgs.). Primeiras leituras: arte e cultura na primeira 
infância. Belo Horizonte: Edição das Autoras, 2022.
FERNANDEZ, Cida; MACHADO, Elisa; ROSA, Ester 
(orgs.). O Brasil que lê: bibliotecas comunitárias e 
resistência cultural na formação de leitores. Olinda: 
CCLF; Brasil: RNBC, 2018. 
FISCHER, Steven Roger. História da leitura. São 
Paulo: Editora Unesp, 2006.
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler em três 
artigos que se completam. São Paulo: Cortez, 2021.
111
FUNDAÇÃO NACIONAL DO LIVRO INFANTIL E JUVE-
NIL. A arte de ilustrar livros para crianças e jovens no 
Brasil. Rio de Janeiro: FNLIJ, 2013.
FUNDAÇÃO NACIONAL DO LIVRO INFANTIL E JUVE-
NIL. Um imaginário de livros e leituras: 40 anos da 
Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil. Rio de 
Janeiro: FNLIJ, 2008.
FUNDAÇÃO NACIONAL DO LIVRO INFANTIL E JUVE-
NIL; Instituto C&A. Nos caminhos da literatura. São 
Paulo: Peirópolis, 2008.
GARDOU, Charles. A sociedade inclusiva: falemos 
dela!: não há vida minúscula. Belo Horizonte: Fino 
Traço, Ed. UFMG 2018. 
GARRALÓN, Ana. Ler e saber: os livros informativos 
para crianças. São Paulo: Pulo do Gato, 2015.
GOLDIN, Daniel. Os dias e os livros: divagações 
sobre a hospitalidade da leitura. São Paulo: Pulo do 
Gato, 2012.
GRAZIOLI, Fabiano Tadeu (org.). Teatro infantil: his-
tória, leitura e propostas. Curitiba: Positivo, 2015.
HANSEN, João Adolfo. O que é um livro? Coleção 
Bibliofilia. São Paulo: Ateliê editorial e Sesi-SP, 2019.
HUNT, Peter. Crítica, teoria e literatura infantil. São 
Paulo: Cosac Naify, 2010.
LACERDA, Nilma; MATTOS, Margareth (orgs.). Esses 
livros sem idade. São Paulo: Sesi-SP Editora, 2018.
LACERDA, Nilma Gonçalves. Cartas do São Fran-
cisco. São Paulo: Global, 2003.
LAJOLO, Marisa; ZILBERMAN, Regina. Literatura 
infantil brasileira: história e histórias. São Paulo: Edi-
tora Unesp, 2022.
112
LAJOLO, Marisa; ZILBERMAN, Regina. Literatura 
infantil brasileira: uma nova outra história. Curitiba: 
PUCPress, 2017.
LARTITEGUI, Ana G. Páginas mudas, livros eloquen-
tes. São Paulo: Livros da Matriz, 2023. (Cadernos 
Hexágono; 2)
LINDEN, Sophie Van der. Para ler o livro ilustrado. 
São Paulo: Sesi-SP, 2017.
LÓPEZ, María Emilia. Um mundo aberto: cultura e 
primeira infância. São Paulo: Selo Emília, 2018.
MACHADO, Ana Maria. Ponto de fuga: conversas 
sobre livros. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.
MACHADO, Ana Maria. Silenciosa algazarra: refle-
xões sobre livros e práticas de leitura. São Paulo: 
Companhia das Letras, 2011.
MACHADO, Ana Maria. Como e por que ler os clássi-
cos universais desde cedo. São Paulo: Objetiva, 2002.
MACHADO, Silvia de Ambrosis Pinheiro. Canção de 
ninar brasileira: aproximações. São Paulo: Edusp, 2017.
MANGUEL, Alberto. Uma história da leitura. São 
Paulo: Companhia de Bolso, 2021.
MAYER, Bel Santos. Parelheiros, idas e vindas. Ler, 
viajar e mover-se com uma biblioteca comunitária. 
Lauro de Freitas, BA: Solisluna, 2022.
MAUCH, Carla S. da S. (org.). Cadernos do Laborató-
rio Mais Diferenças de arte, cultura e educação inclu-
sivas. O público e o comum: experiências em acessi-
bilidade cultural. São Paulo: Mais Diferenças, 2017.
MELOT, Michel. A sabedoria do bibliotecário. Trad. 
Geraldo Gerson de Souza. Coleção Bibliofilia. São 
Paulo: Ateliê / SESC, 2019.
113
MONTES, Graciela. Buscar indícios, construir senti-
dos. Tradução: Cícero Oliveira. Salvador: Selo Emília 
e Solisluna Editora, 2020.
MORAES, Odilon; HANNING, Rona; PARAGUASSU, 
Maurício. Traço e prosa: entrevistas com ilustradores 
de livros infantojuvenis. São Paulo: Cosac Naify, 2012.
NICOLAJEVA, Maria; SCOTT, Carole. Livro ilustrado: 
palavras e imagens. São Paulo: CosacNaify, 2011.
NODELMAN, Perry. Somos mesmo todos censores? 
São Paulo: Instituto Emília; Solisluna, 2020.
OLIVEIRA, Rui de. Pelos Jardins Boboli: reflexões 
sobre a arte de ilustrar livros para crianças e jovens. 
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008.
PARLATO-OLIVEIRA, Érika. Saberes do bebê. 1ª Ed. 
São Paulo: Instituto Langage, 2019.
PARREIRAS, Ninfa. Do ventre ao colo, do som à lite-
ratura: livros para bebês e crianças. Belo Horizonte: 
RHJ, 2012.
PATTE, Geneviève. Deixem que leiam. Rio de Janeiro: 
Rocco, 2012.
PENNAC, Daniel. Como um romance. Porto Alegre: 
L&PM, 2008.
PENTEADO, José Roberto Whitaker. Os filhos de 
Lobato: o imaginário infantil na ideologia do adulto. 
Porto Alegre: Globo, 2011.
PERES, Ana Maria Clark. O infantil na literatura. Belo 
Horizonte: Miguilim, 1999.
PETIT, Michèle. A arte de ler ou como resistir à adver-
sidade. São Paulo: Editora 34, 2010.
114
PETIT, Michèle. Leituras: do espaço íntimo ao espaço 
público. São Paulo: Editora 34, 2013.
PETIT, Michèle. Ler o mundo - Experiências de trans-
missão cultural nos dias de hoje. São Paulo: Editora 
34, 2019.
PINHEIRO, Marta Passos; TOLENTINO, Jéssica M. 
Andrade. Literatura infantil e juvenil: campo, mate-
rialidade e produção. Belo Horizonte: Moinhos; Con-
tafios, 2019.
PIVETTI, Michaella. A fantasia, o design e a literatura 
para a infância: uma gramática da fantasia para os 
livros ilustrados. São Paulo: Limiar, 2019.
PRADES, Dolores; LEITE, Patrícia Pereira. Crianças e 
jovens no século XXI - leitores e leituras. São Paulo: 
Livros da Matriz, 2013.
PROUST, Marcel. Sobre a leitura. Porto Alegre: 
L&PM, 2016.
QUEIRÓS, Bartolomeu Campos de. Sobre ler, escre-
ver e outros diálogos. São Paulo: Global, 2019.
RANZ, Olalla Hernández. Isto não é uma novela grá-
fica, é um cachimbo. São Paulo: Livros da Matriz, 
2023. (Cadernos Hexágono; 3)
REYES, Yolanda. A casa imaginária: leitura e litera-
tura na primeira infância. São Paulo: Global, 2010.
REYES, Yolanda. Ler e brincar, tecer e cantar: literatura, 
escrita e educação. São Paulo: Pulo do Gato, 2012.
REYES, Yolanda. A substância oculta dos contos: 
as vozes que nos constituem. São Paulo: Pulo do 
Gato, 2021.
115
RIBEIRO, Ana Elisa. Como nasce uma editora. Belo 
Horizonte: Entretantas, 2023.
ROMEU, Gabriela; PERET, Marlene. Lá no meu quin-
tal: o brincar de meninas e meninos de norte a sul. 
São Paulo: Peirópolis, 2019.
SALISBURY, Martin; STYLES, Morag. Livro infan-
til ilustrado: a arte da narrativa visual. São Paulo: 
Rosari, 2013.
SANDRONI, Laura. De Lobato a Bojunga: as reina-
ções renovadas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011.
SANJUÁN, Beatriz. Era uma voz. O primeiro livro do 
bebê. São Paulo: Livros da Matriz, 2023. (Cadernos 
Hexágono; 4)
SOARES, Gabriela Pellegrino; RAFFAINI, Patricia 
Tavares (orgs.). Livros infantis velhos e esquecidos. 
São Paulo: Publicações BBM, 2022.
SQUILLONI, Arianna. No labirinto da palavra. Guia de 
viagem. São Paulo: Livros da Matriz, 2023. (Cader-
nos Hexágono; 1)
TAVARES, Cristiane; WEISZ, Telma (orgs.). Literatura e 
educação. Porto Alegre: Zouk, 2021.
TODOROV, Tzvetan. A literatura em perigo. Rio de 
Janeiro: Difel, 2009.
TURIÓN, Celia. O contrato fantástico. São Paulo: 
Livros da Matriz, 2023. (Cadernos Hexágono; 5)
ZILBERMAN, Regina. Como e por que ler a literatura 
infantil brasileira. São Paulo: Objetiva, 2005.
116
Quem somos?
Juliana Daher é bacharel em Terapia Ocupacio-
nal pela FCMMG e graduanda em Pedagogia pela 
Liberdade pela UniBF. É mestre em Estudos de Lin-
guagens pelo Posling/CEFET-MG. Artista da Cia. 
Pé de Moleque e produtora cultural. Integrante do 
grupo de pesquisa da Bebeteca- FAE/UFMG e da 
equipe do Curso Leitura e Escrita na Educação Infan-
til-LEEI-FAE/UFMG.
Fabíola Farias é graduada em Letras, mestre e dou-
tora em Ciência da Informação pela Universidade 
Federal de Minas Gerais, com pós-doutorado em 
Educação pela Universidade Federal do Oeste do 
Pará. Foi Diretora de Ações de Incentivo à Leitura da 
Superintendência de Bibliotecas Públicas / Secretaria 
de Estado de Cultura de Minas Gerais (2007-2010) e 
Gerente de Coordenação de Bibliotecas e Promoção 
da Leitura da Fundação Municipal de Cultura de Belo 
Horizonte (2010-2018). Desde 2010 é leitora-votante 
da Fundação Nacionaldo Livro Infantil e Juvenil. Atual-
mente desenvolve pesquisa de pós-doutorado sobre 
a história da leitura das crianças em Belo Horizonte 
no CEFET-MG.
Livro composto nas fontes Larken e Sofia. Impresso 
em junho de 2023 na Gráfica Formato em papel 
Avena 80g/m2.
Este livro (projeto 1942/2021) foi realizado com recursos 
da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte / 
Edital Descentra.
Versão acessívelem formato eletrônico 
com recursos de acessibilidade para pessoas com 
deficiência visual, chegue às mãos de muitas pessoas 
e que possa se tornar convite para novas perguntas, 
inclusive para respostas que já parecem dadas. 
Agradecemos pelas sugestões temáticas e bibliográ-
ficas que nos chegaram pelas redes sociais e aju-
daram na estruturação do livro: Betzaida Mata, Bia 
Mom, Biblioteca Pública Infantil e Juvenil de Belo Hori-
zonte, Clecio Bunzen Júnior, Cris Abreu, Dilaine Pereira, 
Eliane Lopes, Guilherme Lentz, Jéssica Rodrigues, 
Luana Alves Ferreira, Malu Carvalho, Marilda Casta-
nha, Marilia Pirillo, Rosa Walcacer, Sarah Lima, Sônia 
Travassos e Val Armanelli. E pelas leituras preciosas 
feitas por Ana Amélia Lage Martins, Cleide Fernandes, 
Daniela Figueiredo, Isaac Luís e Sérgio Abritta.
E, claro, reconhecemos a importância da Lei Municipal 
de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte / Edital Des-
centra na vida cultural da cidade, viabilizando projetos 
que só são possíveis na ordem do interesse público.
14
Onde meus pés pisam
Juliana Daher
Território dos afetos. É o que são os livros de litera-
tura para mim.
Neles, quando criança, encontrei espaço para a 
imaginação criar enredos, em sua maioria protago-
nizados por mim. Porque eu me misturava com os 
personagens (eu era eles), ficção e realidade cami-
nhavam de mãos dadas.
À medida que fui crescendo, os livros para as infân-
cias seguiram como companheiros. Neles encontrei 
espaço para sempre voltar às lembranças que me 
faziam reconhecer que num vasto mundo, repleto 
de gente, aquelas narrativas me uniam ao coração 
mais precioso para mim: o do meu irmão Rodrigo, 
que, assim como eu, também amava a chamada 
literatura infantil.
Quando me tornei mãe, os livros foram o espaço 
para o encontro com meu filho, cujo olhar se encon-
trava com o meu, quando juntos olhávamos aquele 
objeto. Construímos, nos incontáveis momentos de 
leitura compartilhada, o amor delicado, tecido com 
imagens, palavras e silêncios.
De pouco menos de uma década pra cá, os livros 
se tornaram espaço de fazer junto, de sonhar com 
15
uma sociedade mais justa e menos desigual. Nesses 
espaços tenho caminhado com minha querida 
Fabíola Farias, que generosamente me acolhe, me 
ensina e me convida a realizar feitos como este livro, 
que não tem a pretensão de ser fechado nas respos-
tas apresentadas, e sim de despertar mais e mais 
perguntas a partir delas.
Esses são os territórios aos quais pertenço e onde 
meus pés pisam.
16
Eu “mexo” com livros
Fabíola Farias
Este livro, com suas perguntas e tentativas de res-
postas, começou a ser gestado há muito tempo. 
À primeira vista, quando eu ainda era uma jovem 
livreira e tentava encontrar bons livros para crian-
ças, no início dos anos 2000. Encantada com a 
beleza das histórias que o mercado editorial pro-
duzia para os pequenos e guiada pelas aulas da 
professora Ana Maria Clark Peres no curso de Letras 
na UFMG, eu olhava com jeito de primeira vez para 
o que então chamávamos de literatura infantil. Foi 
na disciplina Criança e suas leituras, com vinte e 
poucos anos, que compreendi que os livros escritos 
e publicados para crianças poderiam ser mais que 
distração pedagógica, com transmissão de valores 
morais, e instrumento para o ensino da leitura e da 
escrita. Foi ainda nessas aulas que ouvi falar pela 
primeira vez do escritor, de quem depois me tornei 
leitora, admiradora e amiga, nessa ordem, Bartolo-
meu Campos de Queirós. 
Em 2003, quando nasceu meu filho Tomás, os livros 
para crianças se tornaram muito importantes em 
minha vida. Desde a gravidez eu escolhia nossas 
leituras, guardando para quando ele chegasse os 
livros que considerava imperdíveis. Lemos muitos 
17
e muitos livros juntos – como eu, ele se encantou 
pelas histórias – e, aos poucos, Tomás compôs sua 
própria coleção de livros amados: Macaquinho, de 
Ronaldo Simões Coelho e Eva Furnari, Bruxa, bruxa, 
venha à minha festa, de Arden Druce e Pat Ludlow, 
Joaquim, o rei pinguim, de Armelle Boy, Amigos, de 
Helme Heine... Teresa nasceu em 2006 e nossas lei-
turas continuaram, noite a noite. Quando Tomás e 
Teresa ainda eram pequenos, Sérgio se juntou a nós 
e às nossas leituras, e como nós se rendeu às obras 
criadas e publicadas para crianças, apaixonantes 
também para os adultos. 
Em 2010, Elizabeth Serra me convidou para compor 
o grupo de leitoras votantes da Fundação Nacional 
do Livro Infantil e Juvenil – FNLIJ. Nos primeiros anos, 
eu ficava perdida entre centenas de livros que che-
gavam todos os anos à minha casa – que alegria 
abrir as caixas, ver os livros, escolher os que leríamos 
primeiro! Não tenho dúvidas de que a FNLIJ foi cen-
tral em minha formação como leitora e como pes-
quisadora. Inicialmente de maneira errante e meio 
à deriva, descobri um mundo de beleza e poesia 
nesses livros. Aprendi a ver as ilustrações, o livro 
como objeto, e a entender o que Marilda Castanha e 
Nelson Cruz, autores e amigos queridos que conheci 
nos primeiros anos de livraria, me diziam em muitas 
conversas e faziam tão lindamente em suas obras.
O que aprendi nas livrarias – na Siciliano, na Travessa 
e na minha pequena Capitu – levei comigo quando 
fui trabalhar com bibliotecas. Hoje considero impos-
sível separar minha experiência acadêmica, livreira, 
docente e como trabalhadora de bibliotecas, além, 
é claro, da militância pelo direito à leitura no Brasil, 
da presença dos livros para crianças em minha vida. 
Ciente das muitas limitações existentes, eu me junto 
18
às pessoas e às instituições que consideram os livros 
e a leitura uma experiência bonita e potente de ler, 
ver, ouvir e contar histórias com as crianças. Não vou 
me alongar no discurso sobre o direito à leitura, já 
feito em muitos espaços. 
Esta publicação é mais uma celebração dos livros 
em minha vida e, especialmente, do meu encontro e 
da minha amizade com Juliana, ancorada no amor 
pelas crianças e no compromisso com a cultura 
da infância, no exercício cotidiano de construir, na 
pequenez das nossas possibilidades, um horizonte 
de vidas mais justas em nosso maltratado país. 
Talvez este livro tenha sua origem na minha infância, 
quando na garagem de casa, na pequena Carlos 
Chagas, brincava de escolinha escrevendo com giz 
nas paredes e sonhava com o dia de comprar o 
material escolar – lápis de cor, canetinhas, tesoura, 
cola, uma tabuada e alguns cadernos, já que os 
livros didáticos recebíamos gratuitamente e os de 
literatura eram, para mim, coisa da biblioteca. 
Teresa, minha filha, sempre me conta que não sabe 
dizer qual é minha profissão quando alguém a per-
gunta sobre isso. Mas ela não se aperta e fala que 
eu “mexo com livros”. Talvez seja só isso mesmo.
20
Por que ler com e para bebês 
e crianças pequenas?
Os bebês e as crianças pequenas têm direito a bens 
culturais, como estabelece o Estatuto da Criança e do 
Adolescente, com especificidades positivadas por sua 
alteração pela Lei 13.257/2016, que dispõe sobre as 
políticas públicas para a primeira infância. Mas para 
que esses direitos sejam efetivados, é necessário que a 
sociedade compreenda sua importância e se mobilize, 
em segmentos e atuações diversas, para garanti-los.
Alguns direitos, como à Educação e à Saúde, pare-
cem simbolicamente consolidados, pois figuram 
entre as principais e mais imediatas demandas da 
população brasileira. Mas outros, como o direito à 
Cultura, ainda não são vistos como prioridade em 
nosso país. Isso porque suas ofertas parecem secun-
dárias frente às muitas faltas enfrentadas pelas 
crianças e suas famílias. No entanto, todas as crian-
ças devem ser assistidas integralmente, com o aten-
dimento a todas as suas necessidades e a promoção 
de seus direitos, mesmo aqueles que podem parecer 
secundários sob determinados pontos de vista, con-
correndo para seu pleno desenvolvimento.
Quando falamos em livro e leitura, os questionamen-
tos se avolumam. Perguntas que soam ultrapassa-
21
das para pesquisadoras, educadoras e profissionaisque atuam especificamente na área se apresentam 
de forma recorrente em muitos espaços e precisam 
ser respondidas. Não podemos perder de vista que 
a construção de direitos, que é mais complexa que a 
formulação de leis, requer envolvimento e mobiliza-
ção social e tem como primeira exigência a compre-
ensão da pauta em questão. Dito de outra maneira, 
as pessoas precisam entender por que o direito ao 
livro e à leitura é importante para bebês e crianças 
pequenas para que possam contribuir, cada uma à 
sua maneira, na efetivação do direito.
Constantemente somos indagadas sobre a raciona-
lidade existente na oferta de livros para crianças que 
ainda não sabem ler e para bebês que sequer con-
seguem prestar a devida atenção ao que falamos 
com eles. Embora a questão pareça simples, não 
podemos desconsiderá-la. Ao contrário, devemos 
tomar sua simplicidade e recorrência como oportu-
nidade para tratar do tema de forma clara, convi-
dando as pessoas a se aproximarem da questão. 
Como as brincadeiras, as parlendas, as narrati-
vas orais da tradição popular, os trava-línguas, as 
canções, o teatro, as artes visuais e tantas outras 
expressões culturais, os livros oferecem aos peque-
nos elementos simbólicos para a compreensão do 
mundo. Seus personagens, produzidos com pala-
vras e ilustrações no espaço das páginas, compõem 
narrativas que apresentam experiências de criação 
que extrapolam o uso pragmático da linguagem. 
Ao ver e ouvir as histórias guardadas pelos livros, 
os bebês e as crianças pequenas compreendem 
que as palavras escritas e as imagens, trabalha-
das pela invenção humana, podem muitas coisas: 
além de comunicar, de orientar e de organizar o 
22
cotidiano, elas criam histórias, sons, silêncios, ritmos 
e melodias, inventam o que ainda não existe, dila-
tam e comprimem o tempo e o espaço. 
Esses são poderosos convites aos pequenos, em 
muitos sentidos. O primeiro deles é, sem dúvidas, a 
usos mais sofisticados da língua, à apropriação de 
mais elementos para perceber suas sutilezas e possi-
bilidades e, claro, para expressar pensamentos, sen-
timentos e impressões sobre experiências distintas. 
O segundo diz respeito à partilha dos imaginários 
de uma sociedade, isto é, das histórias que, desde o 
nosso nascimento, ouvimos e contamos para saber 
quem somos, para reconhecer nossos medos, para 
estruturar nossos desejos, para lidar com conflitos 
e para sustentar a vida comunitária. O terceiro é a 
compreensão da escrita e do livro como construções 
sociais e culturais importantes na formação intelec-
tual, acadêmica e profissional ao longo da vida.
Tudo isso nos faz acreditar que desde muito cedo 
podemos oferecer livros aos bebês e às crianças 
pequenas. Não há idade previamente determinada 
para isso, cabendo a cada adulto – mãe, pai, avós, 
tios... –, no ambiente familiar, a iniciativa de come-
çar a ler e a oferecer livros para os seus pequenos. 
Inicialmente, é provável que não compreendam, 
tomando como referência as nossas expectativas, o 
que lemos para eles, mas, a princípio, isso é o menos 
importante. À sua maneira e a seu tempo, cada um 
vai se relacionar com histórias, palavras, objetos e 
com as experiências de manuseio dos livros, de 
escuta de suas leituras, de exposição das imagens e, 
principalmente, da presença do outro, mais comu-
mente um adulto, que com ele forma o que Yolanda 
Reyes chama de “triângulo amoroso” (um bebê ou 
criança pequena, um leitor adulto e o livro), desta-
23
cando que o mais relevante nesse encontro é a afe-
tividade vivenciada.
É importante, muito importante, ressaltar que, na pri-
meira infância, os livros e a literatura não devem ser 
utilizados como instrumentos para o ensino de letras 
ou para a preparação para o processo de alfabeti-
zação. Muitas pesquisas nos campos da Pedagogia, 
da Psicologia e da Sociologia da Educação consta-
tam que o acesso a bens culturais na primeira infân-
cia, dentre eles os livros e suas histórias, favorecem 
a alfabetização das crianças, mas que este processo 
só deve ser intencional e sistematicamente iniciado 
na educação escolar após a etapa da Educação 
Infantil, isto é, no Ensino Fundamental. 
Na primeira infância, os livros e a leitura não são 
para ensinar, embora as crianças aprendam com 
eles. Aprendem que o livro, como objeto de cultura, 
é produto do trabalho humano. Que as histórias ali 
guardadas, feitas de textos e ilustrações, foram cria-
das por pessoas. Que a literatura, mesmo que ainda 
não nomeada, pode criar fissuras na ordem das 
coisas. Que bebês e crianças podem ser autores de 
suas próprias narrativas, incluindo impressões sobre 
o que veem e ouvem. Que existe o tempo de ver e 
de ouvir, e também o de falar, de perguntar. E isso é 
muita coisa.
24
Que importância têm as 
famílias na formação 
leitora das crianças? 
As relações mais afetivas e significativas das crian-
ças acontecem no ambiente familiar, com as pes-
soas que delas cuidam e com elas convivem, que dia 
a dia se tornam suas referências. Hábitos, costumes, 
valores e tradições vivenciados na família ganham 
contornos de maior relevância para as crianças do 
que em outros contextos.
As histórias, cantigas, brincadeiras, memórias e diá-
logos familiares são narrativas que nos constituem 
e nos acolhem desde o nascimento, criando o sen-
timento de pertencimento a um grupo no qual con-
fiamos. Tudo o que os adultos – mães, pais, irmãos, 
tios, avós, cuidadoras – dizem, contam e fazem é 
muito importante na construção da identidade das 
crianças, em sua compreensão sobre o que sentem 
e como percebem o mundo e a si mesmas.
No cotidiano, os pequenos aprendem, inclusive, 
usos mais sofisticados da língua, para além de suas 
propriedades comunicativas e pragmáticas. Eles 
percebem que as mesmas palavras e os mesmos 
gestos que orientam e comunicam a hora de 
comer, de tomar banho e de dormir, que apontam 
coisas que não devem ser feitas e comportamentos 
indesejados, também brincam e contam histórias, 
25
indagam sobre pensamentos e sentimentos, pro-
põem silêncios.
O adulto empresta sua voz às narrativas guardadas 
pelos livros e convida as crianças a experimenta-
rem a imaginação, explorando palavras e imagens, 
fazendo descobertas e elaborando hipóteses e senti-
mentos vivenciados e muitas vezes não expressados. 
Pequenos e grandes partilham todas as experiências 
de ler, contar, ver e ouvir histórias juntos.
As narrativas, incluindo as imagens, que estão nos 
livros e as histórias da tradição oral, assim como as 
cantigas populares, ampliam o repertório simbólico 
dos bebês e das crianças e, por este motivo, sua pre-
sença ou ausência no ambiente familiar pode fazer 
diferença na formação dos pequenos. Mais que 
enredos e personagens, ler e contar histórias para as 
crianças no ambiente familiar, independentemente 
de sua composição, diz a elas que essas são coisas 
importantes, pois ocupam parte do tempo que os 
adultos e crianças passam juntos.
Sempre que falamos em crianças e livros no espaço 
doméstico, algumas imagens nos vêm à cabeça, 
sendo as mais comuns as do quarto na hora de 
dormir. Não há dúvidas de que esse momento é 
especial, pois costuma estar envolto em tentativas 
de calmaria na preparação para um sono tranquilo. 
As histórias antes de dormir, especialmente se lidas 
ou contadas com e por alguém que tenha ligação 
afetiva com as crianças, tornam-se companhia noite 
adentro, com personagens, episódios e imagens 
embalando o sono.
A escolha do livro pode ser feita pelos pequenos 
ou sugerida pelos adultos. Não há regras sobre 
o tipo de livro a ser lido: há crianças que gostam 
26
de contos de fadas, outras apreciam os de terror e 
assombração, algumas preferem humor, poemas, 
narrativas de imagem... O importante é que a leitura 
constitua um momento de prazer e de acolhimento 
para os pequenos.
Podemos ler de diferentes maneiras com e para as 
crianças, em horários e espaços distintos. E, muitas 
vezes, infelizmente, não podemos parar para fazer 
isso, em função do trabalhoe das pressões que inú-
meras famílias experimentam cotidianamente para 
garantir seu sustento. Não temos como nos esquecer 
de que vivemos em um país brutalmente desigual e 
que as famílias dispõem de condições diversas de 
existência. Sabemos que viver em uma casa em que 
as pessoas têm acesso a bens culturais, frequentam 
teatros, salas de cinema e museus, assistem a con-
certos musicais e têm tempo para conversar, descan-
sar e estar juntas favorece a formação das crianças. 
Por outro lado, não é justo com mães, pais, irmãos, 
avós, tios e demais adultos cuidadores que não dis-
põem das mesmas condições o discurso inclemente, 
e muitas vezes esvaziado, sobre como a família deve 
dar exemplo para os seus pequenos, comportando-
-se assim ou assado, fazendo isto ou aquilo.
Obviamente, todas nós que nos dedicamos à pro-
moção da cultura da infância e que temos a leitura 
e os livros como um bem desejamos que todas as 
crianças possam ler com as suas famílias. E é por 
isso mesmo que escrevemos e publicamos um livro 
como este. Mas para que possamos construir este 
que entendemos ser um direito de todas as pessoas, 
desde a primeira infância, precisamos saber que 
aspectos sociais, econômicos, culturais, históricos, 
raciais, de gênero e religiosos, assim como a esco-
laridade, dentre outros, nos fazem quem somos e 
27
como vivemos. Assim, a questão não se encerra em 
querer ou não dar exemplos, mas se abre à reflexão 
sobre as condições materiais e simbólicas que per-
mitem ou interditam a leitura em família.
Campanhas publicitárias, discursos escolares e 
recomendações de especialistas vão ao encontro 
do nosso desejo e, algumas vezes, nos criam arma-
dilhas. Muito comumente eles nos fazem acreditar 
que tudo depende de boa vontade e de compre-
ensão da importância que os livros podem ter na 
vida das crianças. Sabendo que as coisas não são 
exatamente assim, colocamo-nos em marcha de 
maneira mais potente no compromisso que assu-
mimos com a infância.
28
O que é mediação de leitura?
Nos últimos anos, um dos termos mais recorrentes em 
textos, cursos, seminários e debates sobre leitura e 
formação de leitores tem sido “mediação de leitura”. 
Agregando muitos sentidos e fazeres, diz de distin-
tas intenções, atividades e comportamentos que têm 
como horizonte a aproximação entre leitores e livros. 
A concepção que pode ser apreendida mais comu-
mente nessas ocasiões é a da mediação como uma 
ponte que liga dois pontos – leitores e livros –, criando 
condições e propondo caminhos para a leitura: apre-
sentação de autorias e de informações prévias sobre 
o livro, acompanhamento do enredo, observação 
das ilustrações, interpretações possíveis da história 
que está sendo contada, dentre outros aspectos.
No entanto, a ideia de mediação pode ser pensada 
de maneira mais complexa e potente que a sim-
ples ligação entre uma coisa e outra. Quando uma 
professora lê para crianças, junto com a história ela 
oferece sua visão de mundo e escolhas de trabalho 
com o livro, que vão além da leitura em si mesma. 
As mediações propostas definem, por exemplo, o 
tipo de experiência que as crianças podem ter com 
a escrita como instrumento de criação e de constru-
ção de sentido e com o livro como objeto de cultura.
29
Não existem receitas ou mediações corretas, mas sim 
modos de ler com e para crianças. Na perspectiva 
de “ponte”, as mediações podem apenas reproduzir 
comportamentos, induzindo as reações e interpre-
tações dos pequenos para uma leitura fechada – a 
do adulto –, independentemente de suas formas de 
realização. Dito de outra maneira, as crianças leem, 
ouvem, veem e compreendem um universo previa-
mente organizado, tendo sua agência até mesmo 
interditada, em muitos casos, se suas intervenções 
destoarem da ordem construída. Esse tipo de ação 
costuma ser marcado por perguntas e destaques 
que guiam a atenção das crianças, conduzindo-as 
por caminhos já trilhados, ainda que o livro seja novo 
e desconhecido da turma.
Uma abordagem emancipadora, que tem no hori-
zonte a leitura como instrumento de formação, 
constrói mediações menos regradas, apostando na 
experiência de ler junto (com e para crianças) como 
exercício de compreensão da narrativa em ques-
tão, sob vários aspectos. Tanto quanto a história que 
está sendo lida ou contada, importam a forma como 
ela foi criada e os diálogos que propõe com quem 
somos em um mundo grande e complexo, para 
sempre em descoberta. Isso pode se dar de distintas 
maneiras: na exploração dos sentidos criados com 
palavras e imagens no objeto livro; na escuta respei-
tosa sobre o que espontaneamente dizem as crian-
ças, mesmo que suas intervenções pareçam estra-
nhas ao que está sendo tratado; na lembrança e na 
partilha de outros livros e de bens culturais que por 
algum motivo se aproximam do que está sendo lido; 
nas relações entre o que vem à fala dos pequenos 
e a narrativa; na afirmação de que existem muitas 
e distintas percepções sobre uma mesma coisa ou 
30
um mesmo fato; e, principalmente, na acolhida do 
desejo de conhecer outras histórias, ideias e criações 
que apresentam, explicam e indagam a cultura, a 
história, a natureza, as artes, as ciências e as religi-
ões, marcadas por muitas contradições entre si.
Leituras e leitores se renovam e se descobrem a cada 
encontro. Na escola, na biblioteca, em casa ou em 
outros ambientes onde os livros se oferecem, o mais 
importante é que as mediações, quando necessá-
rias – muitas vezes as crianças desejam e precisam 
estar sozinhas com os livros, mesmo que ainda não 
saibam ler –, sejam tomadas como convite para o 
mediato, para a indagação e a ressignificação da 
vida cotidiana e do moto-contínuo que se realiza e 
se encerra em si mesmo, sem que sequer perceba-
mos, tão embalados estamos.
Entender e indagar a vida pode parecer algo dis-
tante das crianças, mas não é. Os livros de literatura, 
especialmente, convidam os pequenos a ampliar 
sua percepção da língua, mostrando a eles que as 
mesmas palavras que organizam e orientam o coti-
diano também criam melodias e histórias, sussurram 
sentimentos, subvertem ordens, silenciam segredos. 
O mesmo acontece com as ilustrações, que, em con-
certação com os textos, guardam sutilezas, gestam 
o não dito. Isso, sem dúvida, opera deslocamen-
tos e adensa o repertório simbólico das crianças, 
ampliando suas possibilidades de ver, interpretar, 
analisar e contemplar o mundo.
Por fim, mas não menos importante, é preciso apos-
tar nas crianças, em sua inteligência e sensibilidade. 
E também nos livros, nos convites que fazem aos lei-
tores. Isso significa que nem sempre as mediações 
são necessárias.
31
O que é preciso saber para 
ler e contar histórias 
para as crianças?
Contar ou ler histórias para as crianças é uma expe-
riência de partilha em que quem conta ou lê e quem 
ouve e vê estão juntos, mas em lugares diferentes. 
Nesse encontro, é fundamental que o adulto - mãe, 
pai, tio, irmão, professora, bibliotecária, agente cul-
tural - se reconheça como quem divide algo com 
as crianças (a narrativa a ser contada ou lida) e 
delas recebe suas impressões, opiniões, comentá-
rios. Não deve haver nessa relação qualquer tenta-
tiva de controle sobre o entendimento das crianças, 
que precisam ser ouvidas, mesmo se o que dizem 
parece desconectado da história que está sendo 
contada ou lida.
Em casa, a leitura pode se tornar uma experiência de 
encontro entre pequenos e grandes. Não há receitas 
e nem mesmo recomendações, com exceção da pre-
sença efetiva e da escuta atenta, pois nesse momento 
o que importa é o que crianças e adultos dividem 
ao ler um livro ou ao contar e ouvir histórias. Nesse 
ambiente, dos adultos não é exigido qualquer pre-
paro para ler com filhos, netos, sobrinhos e irmãos; 
basta que se disponham a oferecer seu tempo e sua 
atenção às crianças. Em qualquer lugar e momento 
em que adultos e crianças possam estar juntos, as 
32
histórias e os livros podem ser conhecidos, explora-
dos e descobertos sem exigênciasprévias.
Na escola e na biblioteca, algumas exigências se 
apresentam em função dos compromissos atribuídos 
a essas instituições. Nesses espaços são relevantes 
práticas que sustentem o livro como objeto de cultura, 
que guarda histórias, narrativas tradicionais, experiên-
cias artísticas, saberes científicos e crenças religiosas, 
produzidos pelo trabalho e pela invenção humana ao 
longo do tempo e no espaço. Assim, é importante que 
educadoras, professoras, bibliotecárias e agentes cul-
turais convidem as crianças, desde muito pequenas, 
a uma aproximação com a cultura escrita e com o 
universo editorial. Isso não significa que devam criar 
situações para que os pequenos aprendam letras ou 
para que reconheçam palavras. A participação na 
cultura escrita (compreender que a escrita é um ins-
trumento de criação e de registro, que as histórias 
podem ser lidas sempre da mesma maneira porque 
estão escritas e desenhadas, que as pessoas que 
escreveram e desenharam não precisam estar pre-
sentes no momento que lemos o livro…) é muito mais 
que aprender a ler e a escrever, o que deve ser feito 
no momento certo, sem antecipações ou ansiedades. 
Para isso, as crianças podem ser chamadas a manu-
sear o livro, observando texto, imagens, formato e 
outros elementos que compõem a publicação: quem 
escreveu, quem ilustrou, se o livro foi traduzido (e o 
que é tradução), quem publicou... E ser convidadas 
a conversar sobre a história que ouviram ou leram 
e o que veem nas páginas. É necessário que sejam 
ouvidas atentamente e sem pressa pelo adulto que 
lê para e com elas. Em uma turma, é importante 
que haja tempo para que todas falem sobre suas 
impressões e façam seus comentários, se assim 
33
desejarem, sendo ouvidas pelo grupo. Em leituras 
posteriores de um mesmo livro (os pequenos costu-
mam gostar muito de ouvir e ler a mesma história 
várias vezes), elementos não percebidos em um pri-
meiro momento podem ficar mais expostos, criando 
novas experiências para e com as crianças. 
Na contramão de um exercício de educação literária 
que reivindica a leitura das e com as crianças como 
experiências de construção de sentidos com pala-
vras e imagens, algumas práticas que consideramos 
equivocadas, mesmo que imbuídas de boas inten-
ções, podem ser facilmente observadas em salas de 
aula e bibliotecas. Precisamos estar atentas a situa-
ções que podem ocorrer quando lemos ou contamos 
histórias para os pequenos, esvaziando considera-
velmente sua potência de fruição artística e imagi-
nativa. Alguns exemplos:
- alteração da narrativa original para o atendimento 
de demandas específicas (abordagens temáticas e 
transmissão de valores, por exemplo);
- imposição de interpretações ou valores pessoais 
do adulto que conta ou lê a história;
- utilização de elementos ou emissão de comentários 
que reproduzem imagens prontas e estereótipos; 
- apresentação de objetos cênicos (adereços, figuri-
nos, cenários) que acabam aparecendo mais que a 
própria história.
Essas ações deixam evidentes as intenções de con-
trole sobre as crianças, tirando delas as possibi-
lidades de compreensão e invenção guardadas 
pela leitura ou escuta de narrativas, que na mesma 
história que contam a todos se tornam, para cada 
leitor, um território de liberdade.
34
É importante compreender que a boa literatura e a 
arte de narrar histórias não estão atreladas a fun-
ções utilitaristas, como muitas vezes demandam 
o mercado do entretenimento, escolar e pedagó-
gico, e muitos especialistas em comportamento e 
desenvolvimento infantil. As histórias humanizam e 
proporcionam às crianças possibilidades únicas de 
pertencimento ao grande coletivo humano do qual 
fazemos parte e nos singularizam a partir das vivên-
cias objetivas e subjetivas que cada uma de nós tem 
a partir delas.
Portanto, para se contar e ler histórias para as crian-
ças são fundamentais adultos disponíveis, boas nar-
rativas, orais e em livros, e respeito pelo tempo e 
desejo de cada uma.
35
Como escolher livros com e 
para as crianças?
Listas, listas e mais listas. Prêmios, muitos prêmios. Sem 
falar nos blogues, youtubers e clubes do livro, que ofe-
recem assinaturas em que os consumidores recebem 
um ou mais títulos por mês, escolhidos por uma cura-
doria e sempre acompanhados por brindes, muitas 
vezes mais destacados que os títulos em questão.
Não há dúvidas de que toda essa movimentação em 
torno dos livros para crianças tem sido importante 
para a valorização e para a economia do negócio 
editorial, na medida em que divulga e promove títu-
los e autores, estimula a crítica sobre essa produção 
e convida professoras, bibliotecárias, agentes cul-
turais e famílias a conhecerem obras que já foram 
apreciadas por especialistas.
No entanto, esse fenômeno, chamemos assim, pre-
cisa ser observado em perspectivas distintas. Se 
por um lado cria um ambiente fecundo e de visibi-
lidade para a produção editorial para crianças, por 
outro aponta um movimento de mercado que vem 
engolindo muitas boas intenções. E, principalmente, 
toca numa questão fundamental do processo de 
formação de leitores: a aprendizagem, sempre em 
marcha, da escolha.
36
Sabemos que nosso gosto e desejo são formados 
por condições objetivas e subjetivas e que o acesso 
a bens culturais, o poder econômico e os ambien-
tes familiar e escolar os determinam, em grande 
medida. Assim, escolher não é um gesto espontâneo 
e neutro, como muitos pensam.
As listas de livros premiados do ano, assim como os 
clubes do livro, oferecem conforto e segurança na 
aquisição de títulos para os pequenos e acabam 
escolhendo por nós. Assim como as seções temáticas 
publicadas diariamente em perfis nas redes sociais, 
funcionam como um guia pretensamente competente 
para as leituras com as crianças. Aparentemente sem 
riscos, as listas nos dizem o que ler com os pequenos 
e nos eximem do trabalho e da responsabilidade da 
escolha, além de economizar nosso tempo na livraria 
e na biblioteca, quando não optamos pela seleção 
que chega pelos correios por assinatura. 
É claro que há muito trabalho, compromisso e serie-
dade na elaboração de listas e que muitos desses 
processos contam com profissionais experientes e 
sensíveis. Também há serviços de qualidade em 
alguns dos muitos clubes do livro que surgiram no 
Brasil nos últimos anos. Mas queremos chamar a 
atenção para a importância da experiência de esco-
lher um livro para e com as crianças. 
Visitas a livrarias ou a bibliotecas de acesso público 
podem ser boas oportunidades para conhecer auto-
rias e experimentações estéticas distintas, gêneros 
textuais diversos, produções de momentos anterio-
res, que já não são novidades, e também os livros 
destacados pelas listas de melhores do ano. Em um 
ambiente acolhedor, com muitas opções disponíveis, 
as crianças podem expressar seus interesses e dese-
jos (que devem ser escutados!), experimentando cri-
37
térios para escolher os livros que querem ler e ver 
sozinhas ou com outras pessoas.
O encontro com um bom livreiro, uma professora, 
uma bibliotecária ou uma mediadora de leitura 
pode fazer muita diferença nessa experiência, trans-
formando a busca por um livro premiado em uma 
abertura para vozes, traços, rimas e ideias que, por 
motivos distintos, nunca estiveram em listas. Dito de 
outra maneira, aprender a escolher e saber por que 
escolhemos isto ou aquilo faz parte do processo de 
formação de todas nós. O tempo que investimos 
nisso com as crianças é um tempo de estar junto em 
torno de algo que importa a pequenos e grandes 
e que não pode ser terceirizado: as narrativas, as 
palavras e as imagens que nos ajudarão a compre-
ender e indagar o mundo. 
38
Como e por quem os 
livros são feitos?
Os livros não são objetos mágicos e sagrados, mas 
sim produto da invenção e do trabalho humano e, 
como tal, carregam suas marcas. Seus valores sociais 
e culturais muitas vezes deixam na sombra seus pro-
cessos de criação, produção e circulação, bem como 
os pesquisadores, artistas e profissionaisque deles 
participam. É importante que as crianças saibam 
que muito trabalho é necessário para que uma ideia 
ou uma história se transforme em um livro. 
Na origem de um livro está o desejo de contar uma 
história, de registrar pensamentos, de partilhar des-
cobertas, de difundir crenças ou de transmitir conhe-
cimentos. Qualquer pessoa pode escrever um livro e 
contribuir com a construção de saberes e narrativas 
sobre a humanidade, a natureza, as relações sociais, 
as ciências, as artes e as religiões. Quanto mais diver-
sas as autorias, mais potentes serão os livros como 
objeto de cultura. E maiores serão as possibilidades 
de organização, sistematização, registro e guarda 
de nossas histórias, memórias e conhecimentos. 
As pessoas que escrevem livros são chamadas de 
autoras. Entre elas estão escritores, artistas, cientistas, 
pesquisadores e pensadores. Do processo de criação 
dos livros também fazem parte os ilustradores, que 
39
podem criar imagens para textos previamente 
escritos por outras pessoas ou trabalhar sozinhos, 
produzindo textos e ilustrações (e, claro, o escritor 
também pode produzir suas próprias imagens).
Há os casos de livros que foram escritos em outras 
línguas e que para serem publicados no Brasil, 
alcançando grande número de leitores, precisam ser 
traduzidos para a língua portuguesa. Os profissio-
nais que se dedicam a esta tarefa são os tradutores.
Na produção de um livro, é muito importante o cui-
dado com a língua. Por isso, no processo de edição 
também trabalham os revisores, que cuidam do 
uso mais adequado da língua portuguesa, conside-
rando o tipo de publicação em questão. Há regras 
gramaticais que são exigência em determinados 
gêneros textuais, mas que se mostram mais flexíveis 
em outros. Os critérios de revisão de um texto literá-
rio não são os mesmos de um artigo acadêmico, por 
exemplo. O mais importante na revisão é oferecer 
aos leitores textos bem cuidados. 
Para que o livro fique bonito e seja atraente para 
os leitores (fonte e cores adequadas, bom espaça-
mento entre linhas, diagramação agradável à lei-
tura, formato favorável ao conteúdo, dentre outros 
aspectos), é necessário o trabalho do designer, que 
se dedica à criação do projeto gráfico, contem-
plando os vários elementos que o compõem. 
Na condução de todo o processo de publicação de 
um livro, desde o início, estão os editores, que são 
aqueles que trabalham como um maestro, avaliando 
ideias, discutindo textos, articulando imagens e for-
matos e até mesmo, em muitos casos, as estratégias 
de divulgação do livro. Apesar de terem pouca visi-
bilidade por atuarem nos bastidores, os editores são 
40
fundamentais em todo o processo de publicação 
de um livro. E porque são centrais nas escolhas das 
vozes, histórias e ideias que serão ou não publicadas 
em uma casa editorial, têm lugar importantíssimo na 
história cultural e científica do país, pois contribuem 
com a divulgação de sistemas de pensamento e 
de experimentações estéticas, criam espaços para 
novas autorias. 
E, pronto o livro, há mais pessoas envolvidas com 
sua história: os leitores, os educadores (professoras, 
bibliotecárias, mediadoras de leitura, divulgadores) 
que promovem sua circulação em escolas e biblio-
tecas, os livreiros que os comercializam em livrarias, 
os críticos que analisam e escrevem sobre os livros 
publicados, os pesquisadores que se dedicam a 
conhecer e a refletir sobre os processos de edição…
Mencionamos os principais profissionais que traba-
lham na produção de livros, mas há muitos outros 
envolvidos em cada uma de suas etapas. E, claro, 
há a parte de produção material mesmo, cuidada 
pelas empresas gráficas. 
Essas são as principais informações sobre o livro 
como objeto. Apesar de parecerem óbvias, nem 
sempre são apresentadas às crianças. 
41
O que eu posso fazer para as 
crianças gostarem de ler?
Uma das perguntas que ouvimos com mais 
frequência é “o que fazer para que o meu filho leia?”, 
com variações sobre o mesmo tema: “minha filha 
não gosta de ler”, “meus alunos não se interessam 
pelos livros”, “a leitura não atrai as crianças”. A 
questão também está presente no meio acadêmico 
e mobiliza muitos estudos e livros publicados, numa 
tentativa permanente e quase sempre angustiada 
de encontrar caminhos para a promoção da leitura 
com crianças e, especialmente, com adolescentes. 
Aparentemente validando o senso comum, 
afirmamos que receitas existem. Não aquelas com 
passo a passo e medidas exatas, com marcações de 
relógio, tempo aproximado de preparo e estimativa 
de rendimento, além da famigerada classificação 
de fácil, médio ou difícil de se fazer. 
Tomadas na perspectiva da experiência e no 
entendimento de que nascemos em um mundo 
velho, as receitas podem ser compreendidas como o 
relato de algo que já foi feito, experimentado e que 
merece ser compartilhado. Garantia de resultado 
(essa coisa que sequer sabemos se existe e o que 
é) não há, claro, especialmente se o horizonte for de 
produtividade. Mas algumas certezas, mesmo que 
42
permanentemente provisórias, como a vida, nos 
acompanham e pensamos que podem contribuir 
para pensar a leitura, especialmente a literária, com 
crianças, sejam elas nossas filhas, sobrinhas, netas, 
alunas ou leitoras nas bibliotecas.
A primeira delas é de que a leitura não pode ser 
pensada como um ato isolado, que depende 
exclusivamente do desejo de quem lê ou não lê 
e de quem deve oferecer livros - mãe, pai, avó, 
professora, bibliotecária, agentes culturais. A leitura 
exige condições materiais para sua realização: 
alimentação, saúde, segurança, tempo. Parece 
estranho mencionar itens tão básicos, porém, se 
pensarmos numa perspectiva ampla, eles precisam 
ser considerados. Muitas das crianças que temos 
como alunas e que gostaríamos que estivessem 
mais presentes em nossas bibliotecas estão inseridas 
em realidades de muitas privações, que funcionam 
como impedimento para a leitura e para tanto mais. 
Nossa segunda aposta é de que a leitura precisa 
ser, efetivamente, uma partilha em vários sentidos: 
do tempo que os adultos dedicam a estar junto às 
crianças e aos livros para ler, ouvir e falar sobre 
as leituras; da presença de outras referências que 
iluminam e são iluminadas por textos e ilustrações, 
como livros lidos anteriormente, filmes, canções, 
recordações, questões do cotidiano; da compreensão 
do que são e de como são formados nossos gostos 
e valores de leitura, que sintetizam os convites e as 
exigências que as letras nos fazem. 
Por fim, é preciso que crianças descubram, explorem 
e se apropriem dos livros, com suas narrativas, 
ilustrações, formatos, escolhas editoriais. É claro que 
as mediações são importantes em muitas situações, 
43
mas não devem ser maiores que o livro, que por si 
só, no que é, nas histórias que conta e nas palavras e 
imagens que apresenta, é uma promessa generosa 
aos leitores. Dito de outra maneira, é preciso 
acreditar que os livros falam direto aos leitores e que 
estes, aos poucos, educam sua escuta.
44
Existem livros específicos 
para meninas e 
para meninos?
É comum que alguns livros sejam classificados como 
“para meninas” ou “para meninos”. Isso acontece 
com mais frequência em função do tipo de histó-
ria que é contada e de seus protagonistas. As nar-
rativas de aventura, com personagens masculinos, 
por exemplo, são recorrentemente compreendidas 
como livros para meninos. Já as histórias que tratam 
de sentimentos e emoções, mais introspectivas, são 
destinadas às meninas. Que sentido há nessas orien-
tações, que muitas vezes sequer são percebidas por 
professoras, bibliotecárias, educadoras, mediadoras 
de leitura, mães, pais, avós, tias, mas que impactam 
na formação do repertório simbólico das crianças 
e, consequentemente, na construção de direitos no 
nosso país?
Nós vivemos em uma sociedade que, arbitrariamente, 
estabelece características e papéis sociais para 
meninas e meninos, atribuindo a sexo e gênero 
questões que nada têm a ver comessa condição. 
Somos seres biológicos, mas também históricos, 
sociais, culturais e econômicos, atravessados por 
experiências concretas de existência que nos fazem 
quem somos e quem podemos ser. 
45
Os bons livros e as melhores leituras são aqueles 
que nos ajudam a compreender nossa humanidade 
e a indagar o mundo e o tempo em que vivemos, 
as relações de que participamos. Nesse sentido, 
a princípio, todas as questões que estão presentes 
em qualquer narrativa podem interessar a meninas 
e a meninos, pois sentimentos de medo, angústia, 
tristeza e alegria, assim como sonhos e anseios, são 
comuns a todas as pessoas, bem como a fruição na 
leitura ou na escuta de uma história de aventura ou 
de terror, por exemplo. 
Uma das tarefas mais urgentes do nosso tempo é 
desconstruir estruturas simbólicas que limitam as 
condições de existência de meninas e meninos, 
tirando de todos oportunidades de vidas dignas e 
justas. Embora os livros de literatura não estejam 
a serviço de ensinar valores e regras sociais às 
crianças, as leituras são sempre um exercício 
de aprendizagem, uma vez que mobilizam 
pensamentos e deslocam verdades. Palavras e 
imagens confirmam visões de mundo, mas também 
subvertem a ordem estabelecida, criam novos e 
muitas vezes inusitados sentidos para questões que 
pareciam dadas e consolidadas. 
Assim, não existem livros específicos e exclusivos 
para meninas e para meninos. Em função de nossa 
formação cultural, alguns títulos podem parecer mais 
propícios para uns ou outras. Mas em um horizonte 
emancipador, que professa a construção de vidas 
justas para todas as pessoas, as crianças devem ter 
direito a livros e a leituras que narram e celebram 
o mundo em sua diversidade e complexidade, sem 
prescrições desprovidas de sentido, com a reprodução 
de preconceitos e a produção de discriminações. Aos 
adultos – professoras, bibliotecárias, educadoras, 
46
mediadoras de leitura, mães, pais, avós, tias – cabe o 
compromisso de promover a igualdade de direitos e 
de recusar qualquer tipo de interdição e de violência 
de gênero.
47
Os livros ajudam as crianças a 
lidar com temas dolorosos?
Com frequência somos indagadas por colegas e 
amigas com pedidos de sugestões de livros para 
crianças que perderam alguma pessoa querida, 
com quem tinham ligação muito forte. A busca por 
livros que tratem de temas relacionados a situações 
dolorosas ou delicadas é muito comum, acontece 
com frequência em livrarias e bibliotecas. Em um 
dia o bullying, no outro a pedofilia, depois a separa-
ção dos pais e sempre, de maneira bastante recor-
rente, a morte.
Diante da dor e do desamparo, buscamos nos pro-
teger, e especialmente às crianças, em um colo 
quente, macio e, de preferência, seguro. Espera-
mos que os livros consigam tratar de algo que nos 
escapa ou amedronta, quase sempre com expec-
tativa de ludicidade – parece haver necessidade de 
tornar a dor e o incômodo mais palatáveis, como se 
isso fosse possível. 
Não é necessária uma pesquisa muito complexa 
para descobrir que há livros, bons e ruins, sobre tudo 
e, por estranho que pareça, sob medida até mesmo 
para o que desconhecemos. Mas nos perguntamos 
se, por melhores que sejam, aplicados como remé-
dio “funcionam” como esperado por quem os busca. 
48
Não temos dúvidas de que narrativas – livros, filmes, 
canções – que tratam de algo que nos toca nos 
ajudam, muitas vezes, a compreender um pou-
quinho o que vivemos em momentos específicos. 
Nessas situações, entendemos que nosso sofrimento 
e nosso medo fazem parte da vida e são, em grande 
medida, o que nos liga às outras pessoas, que sofrem 
e temem como nós; ao saber do outro, sabemos 
um pouco mais de nós mesmos e isso nos permite 
voltar ao outro com menos fissuras. O importante é 
que, nesses casos, os livros se tornem uma abertura 
para a criança pensar, falar (se quiser) e elaborar a 
dor, a perda e, assim, viver a experiência da tristeza. 
Apesar de parecer pequena a oferta para quem, 
inconscientemente, busca uma solução imediata em 
um momento difícil, esse já é um grande convite. 
São muitos os caminhos que trilhamos na tentativa 
de aplacar a dor, especialmente a das crianças. Para 
elas, que nascem em um mundo velho e desigual e 
carregam o fardo de construir um futuro melhor, ten-
tamos, amorosa e inutilmente, construir atalhos. Mas 
se pensamos fora da lógica produtiva, aquela que 
nos obriga a ganhar tempo em tudo para competir 
e a estar sempre bem, talvez não seja bom encurtar 
as distâncias. E onde dizemos “talvez”, certamente 
por delicadeza de linguagem, cabe uma daque-
las poucas certezas que colocamos em marcha ao 
longo da vida: precisamos viver nossas experiências 
no tempo que elas exigem. 
Os livros nos oferecem e convidam a esse tempo 
dilatado, em que vivemos cem anos em algumas 
horas ou um único dia em quinhentas páginas, sub-
vertendo o tempo do tempo. Para além de livros 
sobre morte quando alguém querido morre ou sobre 
separação quando o casamento dos pais chega ao 
49
fim, a oferta mais generosa que podemos fazer às 
crianças e a nós mesmos são histórias, imagens e 
palavras que ampliem nosso repertório para com-
preender e organizar o mundo, num exercício de 
autoconhecimento e de encontro com o outro.
50
Os livros de literatura devem 
ensinar intencionalmente 
bons modos ou valores 
morais para as 
crianças?
A literatura é uma manifestação artística, assim como 
a música, a dança, o teatro, o cinema, a pintura e a 
escultura, entre outras. Sua fruição é um convite a 
experiências estéticas, a vivências envolvendo refle-
xão, sensações, sentimentos e emoções. 
A arte cria relações singulares entre nossos mundos 
exterior e interior. Diante de obras artísticas, somos 
convocados a interpretar, ressignificar e transformar 
as impressões sobre o que tomamos como reali-
dade, indagando nossa existência e a relação com 
o outro.
A sensibilidade é sempre subjetiva, variando de 
pessoa para pessoa. Diante de uma mesma reali-
dade, artistas criam obras diversas, que provocam 
reações também diversas em seus espectadores e, 
no caso da literatura, leitores. A partir de seu reper-
tório simbólico e de sua experiência, as pessoas se 
colocam diante das obras de arte, experimentando 
o encontro entre a criação artística e o que ela sus-
cita em cada um. 
Nos encontros e até mesmo nos desencontros com 
as artes podemos aprender muitas coisas, ainda que 
elas não estejam sendo objetivamente ensinadas. 
51
Isso vale também para os livros de literatura e para 
sua leitura pelas crianças.
Existe um entendimento, infelizmente naturalizado, 
de que as crianças, por estarem em formação (e 
todos, de todas as idades, estamos), devem ter 
maximizados, a todo instante e em tudo, seus pro-
cessos de aprendizagem. Assim sendo, o cotidiano 
dos pequenos e tudo o que o constitui, como brinca-
deiras, jogos, momentos de autocuidado, atividades 
culturais e de lazer, frequentemente são revestidos 
de caráter pedagógico. Ainda que de forma lúdica, 
as crianças devem estar sempre aprendendo, numa 
lógica de que sua existência é sempre uma expecta-
tiva de futuro, nessa perspectiva. 
Em uma sociedade em que as crianças ainda são 
desconsideradas em sua potência de pensar, dese-
jar e agir, em seus saberes, esse processo violento 
e invisível acontece com total controle dos adultos. 
Sob o pretexto de proteção e cuidado, a cultura da 
infância professada em muitos ambientes exclui as 
crianças de seus próprios processos, tomando-as 
como objeto, quase nunca como sujeitos. 
Os livros de literatura para crianças desde sempre 
são impactados por essa lógica. Mesmo quando 
nossas pesquisas e reflexões avançam na descons-
trução da ideia de que os pequenos precisam ser 
objetivamente ensinados em todas as situações e de 
que a literatura não deve estar a serviço da transmis-
são de conteúdos disciplinares e de valores morais, 
nossas práticas - em casa, na escola, na biblioteca 
- ainda revelam contradições. Isso é potencializado 
por produtoseditoriais de qualidade duvidosa, que 
desprezam a natureza artística da literatura e priori-
zam as demandas de mercado, em muitos momen-
52
tos intensamente pautadas por exigências de grupos 
específicos, que buscam nos livros boas histórias 
para a orientação moral das crianças.
Embora não se prestem a ensinar, com os bons 
livros de literatura as crianças, e também os adultos, 
aprendem. Neles não há respostas a perguntas pré-
vias, mas convites a novas questões, inclusive para 
respostas que já estão dadas. Com eles as crianças 
aprendem, ainda, formas mais complexas e sofisti-
cadas de uso da língua e das imagens, diferentes 
gêneros textuais, símbolos e referências culturais. 
Estabelecem relações entre as narrativas e suas 
próprias experiências, ampliando sua compreensão 
da vida e das relações com outras pessoas, com o 
espaço e com o tempo. 
Por isso, as crianças devem ter garantido seu direito 
à literatura e à experiência de fruição artística, sem 
definições e expectativas prévias de aprendizados. 
E nós, adultos, precisamos confiar em suas leituras, 
nos caminhos que constroem para si mesmas, equi-
librando cuidados, proteção e responsabilidades 
com respeito à infância. 
53
Que contribuições os livros 
para crianças podem 
oferecer na construção de 
sociedades mais justas?
São muito comuns na esfera pública os discursos de 
valorização da Educação, especialmente quando o 
que está na pauta é a construção de vidas mais justas 
e prósperas para a população brasileira. Em escala 
menor, mas significativa, também se atribui à leitura 
um caráter de salvação, que pode nos arrancar da 
ignorância e nos fazer cidadãos mais conscientes de 
nossos direitos e deveres. O que nem sempre é dito 
é que a Educação, que no senso comum equivale 
à escola, e os livros podem muito pouco em uma 
sociedade brutalmente desigual como a nossa. Mas, 
claro, podem alguma coisa.
Ainda que não altere significativamente, por si só, as 
estruturas sociais desiguais, a educação escolar, em 
seus distintos campos disciplinares, pode contribuir 
para expor suas causas, criando movimentos de luta 
por equidade e gerando oportunidades de mobili-
dade social para grupos até então limitados às tra-
jetórias de suas próprias famílias - as últimas déca-
das brasileiras mostram isso com clareza.
De maneira menos objetiva, mas bastante potente, 
os livros e as leituras criam fissuras no cotidiano, pos-
sibilitando que nossa atenção seja deslocada da vida 
imediata - trabalho, rotina - para algo que promova 
54
a suspensão do tempo produtivo. Desde a primeira 
infância, a leitura, como as artes, faz às crianças um 
convite para experiências sofisticadas com a língua, 
mostrando a elas que além de comunicar e orien-
tar o cotidiano também conta histórias, rima, brinca, 
cria sentidos inusitados e até mesmo silêncios. E usar 
a língua de maneira mais ampla e menos ingênua, 
sabendo, cada um à sua maneira e no seu tempo, 
de seus exercícios de poder, garante a cada um mais 
elementos para compreender e indagar a vida.
Por isso, entendemos que, em sua essência, a leitura 
pode contribuir para a construção de vidas mais 
justas em nosso país. Mas essa afirmativa não pode 
ser tomada de maneira ingênua e idealizada, pois 
as histórias que lemos e contamos para os pequenos 
são produto da criação humana e, assim, carregam 
crenças, valores e costumes de nossa sociedade, 
nem sempre justos e muitas vezes impregnados de 
ideias opressivas e discriminatórias.
Ainda que à primeira vista não percebamos, muitas 
das narrativas nos livros para crianças são mar-
cadas por discursos que reproduzem estereótipos 
e, com eles, preconceitos, tornando determinados 
grupos sociais simbolicamente mais vulneráveis e 
objetivamente expostos a riscos.
Feitas essas considerações, duas respostas amplas, 
que se desdobram em muitas outras, se oferecem 
à pergunta que dá título a este texto. Embora pare-
çam simples, ambas são complexas e marcadas 
por contradições.
Em primeiro lugar, precisamos recusar radicalmente 
os discursos que reproduzem ódio e preconceitos, 
que discriminam pessoas e grupos. Não se trata de 
eliminar dos textos literários características e compor-
55
tamentos humanos que não nos pareçam corretos 
ou desejáveis, pois a literatura trata da vida humana 
e, gostemos ou não, somos produto do tempo e do 
espaço em que vivemos, das relações sociais de que 
participamos. Personagens com atitudes e pensa-
mentos condenáveis de um ponto de vista democrá-
tico e justo vão sempre fazer parte das histórias que 
nos constituem, especialmente porque elas retratam 
nossa sociedade, nossos conflitos e modos de vida, 
nossas visões de mundo. Mas precisamos denun-
ciar e rejeitar discursos subliminares, tanto em textos 
quanto em imagens, que fazem parecer naturais 
discursos capacitistas, racistas, machistas, misógi-
nos, homofóbicos, transfóbicos, gordofóbicos e de 
aversão a pessoas pobres ou jeitos de viver distintos 
do que um grupo considera “normal”.
A segunda resposta é complementar à primeira: 
tão importante quanto combater a reprodução de 
estereótipos que violentam e discriminam pessoas, 
grupos e modos de vida é ampliar os espaços para 
a afirmação e a visibilidade do que escapa ao auto-
ritário e excludente discurso normativo que quer 
determinar o que é certo e errado, feio e bonito, 
bom e mau. Nessa tarefa, os livros para crianças são 
muito potentes, pois podem mostrar aos pequenos 
que o mundo é complexo, que as histórias são con-
tadas por muitas e contraditórias vozes e traços, que 
a construção e a disseminação do conhecimento 
serão sempre marcadas por disputas. 
Para além da diversidade de autorias e representa-
ções nos livros, é fundamental que a multiplicidade 
da produção editorial também esteja presente em 
escolas, bibliotecas e livrarias. Muitas vezes, são 
as pequenas casas editoriais que acolhem temas, 
experimentações estéticas, autoras e autores que 
56
escapam às demandas do mercado, que publicam 
narrativas e poemas que dificilmente encontrariam 
espaço em grandes selos. 
A diversidade nos livros oferece aos pequenos leitores 
elementos que favorecem a construção do pensa-
mento crítico-reflexivo que pode mobilizar transfor-
mações individuais e coletivas; amplia o repertório 
cultural e estético, contribuindo para que as crianças 
percebam espaços sociais e culturais distintos dos 
seus. A leitura de livros de literatura, especialmente, 
oferece às crianças histórias que as colocam diante 
de si mesmas, sensibilizando-as em relação ao outro 
e iluminando proximidades e distâncias.
Assim como a Educação, os livros não salvam nin-
guém, não mudam nada por sua simples presença 
na vida das pessoas. Mas podem contribuir, à sua 
maneira, para a construção de sociedades mais 
justas. 
57
Como garantir o direito 
das crianças com 
deficiência à leitura? 
A leitura é um direito de todas as crianças e todas 
significa exatamente isso: TODAS. Mas, lamenta-
velmente, ainda vivemos em uma sociedade, no 
mínimo, indiferente a demandas que não sejam 
individualmente suas e, por esse motivo, excludente. 
Poderíamos começar esse texto apresentando os 
marcos legais que garantem e promovem os direi-
tos das pessoas com deficiência no Brasil, em uma 
militância ainda necessária em nosso país. Também 
poderíamos seguir refletindo em uma perspectiva 
ética e política sobre o direito a direitos, tendo como 
horizonte a construção de vidas justas e com opor-
tunidades iguais para todas as pessoas. E, claro, 
haveria o legítimo e urgente caminho de denún-
cia de discursos e atitudes capacitistas que tentam 
impor um inexistente padrão de normalidade, con-
vocando os leitores deste texto à observação do que 
cotidianamente vemos e ouvimos, muitas vezes acri-
ticamente. 
Optamos, no entanto, por tratar especificamente do 
direito à leitura e a bens culturais das crianças, con-
siderando que há uma produção potente, embora 
ainda limitada, sobre aspectos históricos, sociais, 
políticos, culturais,econômicos e psicológicos dos 
58
direitos das pessoas com deficiência. Ressaltamos 
que nossa abordagem não é médica e não tem a 
pretensão de lidar com aspectos clínicos da questão. 
Partimos do princípio de que a leitura e os bens cultu-
rais são direitos de todas as pessoas e que a garan-
tia desses direitos é um exercício coletivo e sempre 
em marcha. Assim, destacamos alguns pontos que 
devem ancorar nossa reflexão sobre o tema e nossa 
atuação na garantia e na promoção dos direitos 
das pessoas com deficiência, especialmente das 
crianças, à leitura. E, é importante dizer, não existem 
coisas mais ou menos importantes nessa tarefa, mas 
sim interdependência entre elas.
Em primeiro lugar, precisamos refletir sobre os livros 
que são ou devem ser oferecidos para as crianças 
com deficiência, a partir das seguintes perguntas: 
existem temas previamente definidos nos livros para 
crianças com deficiência? Para cada deficiência 
– visual, auditiva, intelectual – deve haver um livro 
específico? Nós pensamos que não. 
Assim como todas as crianças sem deficiência apa-
rente, as crianças com deficiência têm interesses os 
mais diversos e devem ser convidadas e estimuladas 
a conhecer o mundo, a natureza, a história, as artes 
e tudo o que estiver disponível nos livros. Também 
é importante que elas se vejam representadas nas 
histórias que leem, mas de maneira que possam se 
sentir genuinamente parte dessas histórias, e não 
como estereótipos que têm como único propósito, 
muitas vezes bem intencionados, expor isolada-
mente as características da deficiência. 
Os livros criados, editados e publicados para as crian-
ças devem ser para todas. Para que elas possam ter 
o acesso mais ampliado possível a seu conteúdo, é 
necessário que distintos recursos de acessibilidade 
59
estejam disponíveis, pois assim como os sujeitos são 
diversos, os modos de ler também são. 
Orientadas por um compromisso ético, devemos 
pressupor que diante de nós temos uma criança que 
pode ler. Assim sendo, a partir da observação sen-
sível e de uma interação qualificada por respeito e 
empatia, estaremos mais abertas a apoiar a criança 
com deficiência em sua experiência leitora.
Como conhecer as demandas de uma criança que 
não consegue verbalizar suas necessidades? Per-
guntemos, pois! Sem receios do que escutaremos 
como resposta. Observemos! Que características 
físicas, motoras, cognitivas, sensoriais e psíquicas 
apresenta aquela criança que está diante de nós? 
Como podemos promover o encontro dessa criança 
com o livro, com a experiência da leitura?
Uma criança cega ou com baixa visão, por exemplo, 
deve contar com livros impressos em braille ou dis-
poníveis em gravação de áudio. Para que possam 
experimentar as ilustrações e aspectos visuais do 
projeto gráfico, é fundamental que o livro conte com 
audiodescrição (tradução de imagens em palavras). 
Para uma criança com deficiência auditiva não 
alfabetizada em língua portuguesa, será necessária 
a tradução em libras, que pode ser disponibilizada 
presencialmente ou em vídeos acessados por QR 
Codes ou endereços de páginas eletrônicas infor-
mados no livro. 
As crianças com deficiência intelectual podem preci-
sar de uma simplificação do texto verbal, o que pode 
ser feito com a fragmentação de parágrafos longos 
em frases curtas e diretas, a substituição de metáfo-
ras por termos de significação literal, a apresenta-
ção de glossários com palavras pouco usuais, dentre 
60
outros aspectos. Quando utilizados em conjunto com 
o objetivo de ampliar o acesso de pessoas com defi-
ciência intelectual aos livros, esses recursos recebem 
o nome de “leitura fácil”. 
Existem formatos que reúnem muitos recursos de 
acessibilidade em uma única iniciativa: o “dese-
nho universal”. Em experiências mais abrangentes e 
inclusivas, um mesmo suporte – no caso, um vídeo – 
pode disponibilizar o texto em áudio, exibir janela de 
libras, apresentar audiodescrição das imagens, ofe-
recer legendas de texto e explicar termos e imagens 
que possam dificultar a compreensão de pessoas 
com deficiência intelectual. 
É importante destacar que a criação de recursos de 
acessibilidade exige formação e técnicas específi-
cas e deve ser acompanhada e validada por uma 
pessoa ou um grupo de pessoas com deficiência. A 
audiodescrição de ilustrações, por exemplo, deve ser 
aprovada por uma pessoa cega ou com baixa visão 
com conhecimento do recurso, pois apenas alguém 
nessas condições pode dizer se as imagens criadas 
com palavras por um audiodescritor enxergante são 
potentes na criação de imagens por leitores com 
deficiência visual. 
Mas, infelizmente, ainda são poucos os profissionais 
dedicados à inclusão e à oferta de recursos de aces-
sibilidade no Brasil, mesmo em escolas e instituições 
culturais, onde os direitos das pessoas com deficiên-
cia deveriam ser intransigentemente defendidos. O 
que nos leva ao segundo ponto: a formação de pro-
fissionais para o adequado atendimento a pessoas 
com deficiência. 
Em uma situação ideal, todos os professores, biblio-
tecários, educadores e agentes culturais deveriam 
61
ter formação que os permitisse atender adequada-
mente as crianças com deficiência em instituições 
educacionais e culturais. Mas sabemos que isso está 
longe de ser uma realidade no Brasil. 
Quando tudo parece faltar, o que nos sobra? O 
desejo de educar e de incluir, marcado por peque-
nos, mas significativos - e, por isso, revolucionários 
- gestos. Podemos segurar ou aproximar o livro da 
criança para favorecer o contato visual com suas 
páginas e com quem lê com e para ela. Podemos 
ler em voz alta. Prestamos atenção à qualidade do 
timbre e volume da voz durante a leitura, visto que 
algumas crianças são sensíveis a determinados sons 
e ruídos. Podemos descrever as ilustrações para 
aquelas crianças que não enxergam ou têm baixa 
visão. Podemos ofertar livros com maior contraste 
entre as cores. Podemos, durante a leitura, substi-
tuir palavras de difícil compreensão por outras mais 
simples, se estivermos diante de uma criança com 
deficiência intelectual.
Intervenções relativamente simples são possíveis. 
Estamos falando de recursos de acessibilidade não 
onerosos, à disposição de muitas pessoas, que são 
efetivos na leitura com crianças com deficiência, 
obviamente considerando as necessidades especí-
ficas de cada uma.
O mais importante é considerar, sempre, que cada 
sujeito é único. Na relação que estabelecemos com 
cada criança construímos com ela um percurso leitor 
em que ela apontará do que precisa e como pode-
mos ajudá-la.
É comum que as limitações financeiras sejam utiliza-
das como argumento para justificar a violação dos 
direitos das crianças com deficiência na escola e em 
62
instituições de atendimento a este público, inclusive 
pelo Estado, que deveria prioritariamente garantir 
e promover o acesso à leitura e aos bens culturais 
para todos. O discurso pronto, que não deixa de 
ser verdadeiro (os equipamentos, as tecnologias e 
a formação das pessoas para a oferta de recursos 
de acessibilidade ainda são caros mesmo), é de que 
tudo é muito oneroso e de que não existe orçamento 
para isso. Mas outras ações, de naturezas as mais 
diversas, também são dispendiosas e não passam 
pelo constrangimento de tal alegação. 
Promover a inclusão de pessoas com deficiência e 
garantir os recursos materiais e simbólicos para tal é 
urgente no Brasil. Enquanto a Educação e a Cultura 
não forem tomadas como condição para a constru-
ção de uma sociedade justa e igualitária, em uma 
perspectiva emancipatória, os argumentos finan-
ceiros continuarão a interditar o acesso à leitura de 
crianças com deficiência. Este direito, como qualquer 
outro estabelecido pela Constituição Federal, não 
pode ser restrito às famílias que dispõem de recur-
sos financeiros para sua garantia - a maioria das 
famílias brasileiras não tem condições para adquirir 
equipamentos e dispor de tecnologias necessárias 
para muitas crianças com deficiência. 
Assim, é

Mais conteúdos dessa disciplina