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1 2 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................... 4 2 ANTIMICROBIANOS ......................................................................... 5 2.1 Classificação dos antimicrobianos .............................................. 9 3 PRINCIPAIS CLASSES DE ANTIBIÓTICOS EM USO CLÍNICO ...... 9 4 ALGUNS DOS PRINCIPAIS ANTIFÚNGICOS UTILIZADOS NA CLÍNICA 20 4.1 Drogas Azólicas ........................................................................ 26 5 ANTIVIRAIS E APLICAÇÃO ............................................................ 31 5.1 Antivirais Análogos acíclicos da guanosina ............................... 31 5.2 Antivirais Análogos cíclicos de nucleosídeos ............................ 32 5.3 Antivirais Análogos de pirofosfato Foscarnet [Foscavir] ............ 32 5.4 Antivirais úteis na gripe ............................................................. 32 5.5 Antivirais Análogo de nucleosídeo purínico ............................... 33 6 RESISTÊNCIA ANTIMICROBIANA ................................................. 35 7 RACIONALIZAÇÃO DE ANTIMICROBIANO ................................... 37 8 O USO IRRACIONAL DE ANTIMICROBIANOS E SUAS CONSEQUÊNCIAS .......................................................................................... 39 9 ESTRATÉGIAS PARA A RACIONALIZAÇÃO DE ANTIMICROBIANOS ........................................................................................ 44 9.1 Descalonamento da terapia ....................................................... 45 9.2 Rotação de antibióticos ............................................................. 45 9.3 Terapia preemptiva ................................................................... 46 9.4 Restrição de medicamentos ...................................................... 46 9.5 Pré-autorização ......................................................................... 46 9.6 Uso de parâmetros farmacocinéticos e farmacodinâmicos para ajuste de dose .............................................................................................. 47 3 9.7 Educação .................................................................................. 47 10 RESISTÊNCIA BACTERIANA E O AMBIENTE HOSPITALAR .... 48 10.1 Controle de infecções hospitalar ............................................ 49 10.2 Resistência intrínseca ............................................................ 49 10.3 Resistência natural ................................................................. 50 11 O FARMACÊUTICO NO COMBATE AO USO INADEQUADO DE ANTIMICROBIANOS ........................................................................................ 52 11.1 Participação do farmacêutico em uma CCIH e suas funções 55 12 PANORAMA MUNDIAL ATUAL NA RESISTÊNCIA AOS ANTIMICROBIANOS ........................................................................................ 59 13 REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ............................................. 61 4 1 INTRODUÇÃO Prezado aluno! O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 5 2 ANTIMICROBIANOS Fonte: escoladelimpeza.com Os antimicrobianos são substâncias têm a capacidade de inibir o crescimento e/ou destruir microorganismos. Podem ser produzidos por bactérias ou por fungos ou podem ser total ou parcialmente sintéticos. O principal objetivo do uso de um antimicrobiano é o de prevenir ou tratar uma infecção, diminuindo ou eliminando os organismos patogênicos e, se possível, preservando os germes da microbiota normal. Para isso é necessário conhecer os germes responsáveis pelo tipo de infecção a ser tratada (MELO et al; 2012). O termo antimicrobiano é empregado de forma genérica e engloba, além das substâncias que atuam em bactérias, aquelas que interferirão no crescimento e/ou multiplicação de outros microrganismos, como vírus, fungos e parasitas. Antibióticos são substâncias que conseguem impedir a reprodução de bactérias ou causar sua destruição. (CHAMBERS, 2005, apud SAMPAIO, 2018). Dos tipos de antimicrobianos os antibióticos são as classes de medicamentos mais utilizados e mais prescritos tanto para uso intra-hospitalar quanto para a automedicação. Podem ser classificados como bactericidas, quando causam a morte da bactéria, ou bacteriostáticos, quando promovem a inibição do crescimento microbiano (WALSH, 2003). 6 Os antimicrobianos alteraram radicalmente a terapêutica, os cuidados e a expectativa de vida ao longo dos últimos 70 anos. A introdução destes agentes foi associada a um rápido declínio na mortalidade por doenças infecciosas e a uma melhoria na expectativa de vida. Além disso, os antimicrobianos não só favoreceram a eficácia do tratamento de doenças infecciosas, mas também serviram de base para tratamentos nas áreas de oncologia e transplante. Em nosso arsenal, os antimicrobianos são classifica dos como os únicos medicamentos que podem perder a eficácia com o aumento do uso indiscriminado (MELO et al; 2012). A terapia antimicrobiana é normalmente prescrita para tratar uma suspeita clínica de infecção. No entanto, apenas na minoria dos casos, os agentes infecciosos são isolados. Com base nisso, pode-se concluir que grande parte dos pacientes com prescrição de terapia antimicrobiana pode não estar sofrendo uma infecção. Obviamente, os métodos que predizem com mais precisão a presença ou a ausência de infecção são bem-vindos, no sentido de direcionar a investigação com marcadores específicos para processos infecciosos. Desde a década de 1940, o desenvolvimento de novas drogas antimicrobianas esteve em expansão e, mesmo quando havia resistência bacteriana, uma nova droga sempre estava disponível para tratar essas bactérias. Foram introduzidas 14 novas classes de antibióticos entre 1935 e 2003. No entanto, este rápido desenvolvimento, associado ao uso excessivo, veio com um custo: a resistência antimicrobiana em âmbito hospitalar (CABRAL et al, 2018). O consumo excessivo de antibióticos, como cefalosporinas e fluoroquinolonas, pode induzir a resistência nas bactérias pela produção de Betalactamases de Espectro Ampliado (ESBL, do inglês Extended-Spectrum Beta-Lactamase). Há poucos anos, os carbapenens apresentavam excelente atividade contra a maioria das bactérias Gram-negativas. Porém, nos últimos anos, tem sido relatado aumento da resistência a esta classe de antimicrobianos. Os agentes antimicrobianos devem ser utilizados de forma adequada, a fim de evitar o surgimento de resistência e garantir benefício clínico (MELO et al; 2012). Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) as infecções são responsáveis por 25% das mortes em todo o mundo e 45% em países menos desenvolvidos. De acordo com a mesma autora os antibióticos correspondem a 12% de todas as prescrições ambulatoriais, sendodo lançamento de novos antimicrobianos pela indústria farmacêutica nos últimos anos, nosso grande desafio é manter a eficácia dos antimicrobianos que temos disponíveis no mercado, usando-os da melhor maneira possível com relação às suas propriedades de farmacocinética e farmacodinâmica. Várias estratégias, incluindo a educação do prescritor, a restrição de uso com formulário, a aprovação prévia, a racionalização, a rotação de antibióticos e os programas assistidos por computador, têm sido propostas para melhorar o uso dos antibióticos (CABRAL et al, 2018). 8 O USO IRRACIONAL DE ANTIMICROBIANOS E SUAS CONSEQUÊNCIAS Fonte: pebmed.com.br Antes do século XXI a resistência bacteriana ocorria predominantemente em ambientes hospitalares. Atualmente, estudos comprovam que a resistência bacteriana está associada a diversos ambientes e pode até atingir indivíduos saudáveis (GUIMARÃES; MOMESSO; PUPO, 2010). Segundo o autor citado anteriormente, algumas estratégias podem ser adotadas para evitar o desenvolvimento de resistência bacteriana como: 40 prevenção de infecções bacterianas com o uso de vacinas, uso racional de antibióticos, controle e prevenção da disseminação de micro-organismos resistentes, descoberta e desenvolvimento de novos antibióticos. Além disso, a caracterização dos genes responsáveis pela resistência, assim como sua localização e diversidade são de grande importância para o entendimento dos fatores envolvidos no desenvolvimento da resistência. O elevado número de infecções hospitalares agrava a situação da resistência bacteriana. Quanto maior a ocorrência dessas infecções maior é o uso de medicamentos para tratá-las, aumentando a possibilidade das bactérias adquirirem resistência a esses fármacos. (ROSA, 2003, apud REGINATO, 2015). Além dos aspectos mencionados acima, fatores econômicos também são preocupantes. As indústrias farmacêuticas desejam receber o retorno financeiro investido ao longo do processo de desenvolvimento do medicamento e após terem um antibiótico lançado no mercado, querem que o mesmo tenha saída no mercado, forçando a sua venda em grande proporção e consequentemente induzindo o seu uso indiscriminado e em larga escala. Com isso, o aumento do uso de agentes antibióticos gera também o rápido aumento da resistência bacteriana, o que contribui para diminuir o tempo da patente, gerando a necessidade no mercado consumidor de um novo produto que seja mais potente e que atenda às necessidades dos consumidores. Por isso, o investimento na busca de agentes antibióticos fica mais complicado, pois a descoberta de um antibiótico pode levar cerca de sete dez anos e o desenvolvimento de resistência pode levar sete a oito anos (GUIMARÃES; MOMESSO; PUPO, 2010). A complexidade das terapias medicamentosas e as evidências dos resultados das intervenções farmacêuticas na melhoria dos regimes terapêuticos e na redução dos custos assistenciais reforçam a importância de uma assistência farmacêutica de qualidade. E o serviço de farmácia tem participação importante na elaboração de uma política de uso racional de medicamentos visando melhorar e garantir a qualidade da farmacoterapia e reduzir os custos para o estabelecimento, já que a politerapia além de onerar os custos com cuidado ao paciente, ocasiona elevação da morbimortalidade (CIPOLLE, 2002; BARR, 1995). 41 A seleção de medicamentos é definida como um processo contínuo, multidisciplinar e participativo, que determina e assegura os níveis de acesso aos medicamentos necessários ao sistema de saúde. O processo baseia-se em critérios científicos e econômicos e fornece elementos necessários ao uso racional de medicamentos. Levando em consideração todos os pressupostos da Atenção Farmacêutica que tem como um de seus objetivos ter um controle maior da venda de medicamentos, incluindo a forma como são vendidos e sua utilização correta, para que assim chegue ao objetivo desejado (CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA, 2008). Os antibióticos são rotineiramente utilizados para melhorar uma infecção estabelecida e possuem a finalidade de eliminar ou impedir o crescimento bacteriano, mais quando usados de maneiras erradas trazem sérios problemas ao ser humano (NICOLINE et al., 2008). As doenças infecciosas estão entre as principais causas de morte da população humana. Esse fato é devido, em grande parte, ao surgimento de micro-organismos multirresistentes aos antibióticos. Portanto, apesar da disponibilidade de um grande número de antibióticos de última geração, torna- se ainda fundamental buscar compostos que possam atuar como novas drogas a serem utilizadas no combate as doenças infecciosas (SAMPAIO, 2018). Em relação aos medicamentos antimicrobianos, considerando a CF/88 e normas posteriores e seguindo as tendências mundiais para o controle da utilização destes produtos, em 2010 a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 446 que dispõe sobre o controle desses medicamentos, e que foi posteriormente revogada pela RDC nº 20/20117, atualmente em vigor. Esta RDC refere-se ao controle da prescrição e dispensação de medicamentos classificados como antimicrobianos. (CAMARGO, 2005, apud SAMPAIO, 2018). A resistência antimicrobiana é um problema presente em todas as áreas da infectologia e inclui as infecções virais, bacterianas, fúngicas e parasitarias. Um fator importante associado a resistência antimicrobiana é o grande uso de antimicrobianos em pacientes que se encontram em internados, pois são pacientes que acabam sendo infectados com bactérias resistentes e acabam permanecendo no hospital por tempo mais prolongado tendo um pior prognóstico, além de aumentar os custos do seu tratamento para o setor público (CORREA, 2007). 42 Depois de detectada a infecção e o tipo de micro-organismo causador vem uma etapa muito desafiadora que é a escolha do fármaco mais apropriado. A escolha ideal recairia sobre o medicamento mais efetivo, menos tóxico e de menor custo. No tratamento de uma infecção com um antimicrobiano, a escolha, a dosagem, a via de administração e o tempo de tratamento podem ser responsáveis pela eficiência da terapêutica (OLIVEIRA et al, 2004). A prescrição do antibiótico é geralmente empírica e sem a identificação prévia do agente patogênico através de exames laboratoriais. Além disso, a sua venda sem exigência de uma prescrição médica em alguns países, associada ao suprimento irregular desse medicamento, à baixa qualidade da medicação e ao seu mal-uso pelos pacientes (que muitas vezes não completam o tratamento), contribuem para a seleção de novos micro-organismos multirresistentes (DAFREE, 2001). As consequências mais importantes relacionados ao seu uso são: reações adversas, resistência bacteriana e possíveis interações medicamentosas. Além das consequências médicas e ecológicas, o uso inadequado de antibióticos gera custos sociais e pessoais, envolvendo gastos diretos com tratamentos, internações, faltas escolares, invalidez e morte, o que justifica os esforços no objetivo de conhecer e racionalizar a utilização de antimicrobianos (ABRANTES et al., 2007). Para tentar minimizar todos esses problemas, que estão relacionados ao uso inadequado de antibióticos, uma das medidas é esclarecer as dúvidas do paciente e garantir que este tenha a total compreensão da administração adequada e segura (NICOLINI et. al., 2008). O que vemos na prática é muito diferente. Quase dois terços dos usuários de antibióticos desconhecem alguns dos itens básicos para a utilização correta destes medicamentos, incluindo dose, frequência da administração, efeitos adversos, duração do tratamento e incompatibilidade medicamentos. Um fato que contribui bastante para o desenvolvimento da resistência microbiana em humanos é a automedicação, que é uma prática muito comum emnosso meio. E o uso de medicamentos dispensados sem receita médica é hoje, geralmente, aceito como parte integrante do sistema de saúde tornando- se um forte aliado ao desenvolvimento da resistência a alguns tipos de medicamentos. Quando praticada corretamente, a automedicação pode também 43 contribuir para aliviar financeiramente os sistemas de saúde pública. Porém, com o incentivo à indústria da automedicação, o que ocorre é o uso indiscriminado dos medicamentos (SAMPAIO, 2018). Outro ponto importante a ser destacado entre os fatores que contribuem para uso indiscriminado e sem controle de antimicrobianos, o desenvolvimento da resistência é a dispensação dos mesmos que na maioria das vezes são feitas sem nenhum controle e na ausência de receitas. Este é um ato desprovido de responsabilidade ética que tem como consequência uma terapia ineficaz, gerando problemas como resistência bacteriana e potencialização dos efeitos adversos, decorrentes da falta de monitoramento e orientação quanto à dose, forma de uso e tempo de tratamento (SAMPAIO, 2018). Várias medidas sócio político-econômicas deveriam ser tomadas para a contenção do desenvolvimento e de transmissão de resistência antimicrobiana que cada dia que passa toma proporções alarmantes. A redução do uso inapropriado e excessivo dos antibióticos no tratamento de doenças em geral, tanto humanas quanto de animais domésticos e da própria agricultura, poderia ser uma dessas medidas. Ao mesmo tempo para que se consiga um efetivo controle das doenças infecciosas, torna-se vital investir em pesquisa e em pesquisadores que possam se dedicar à busca de substâncias naturais ou sintéticas que exibam atividades antimicrobianas específicas e, acima de tudo, que as exerçam através de mecanismos de ação alternativos daqueles dos antibióticos disponíveis. A Sociedade Americana de Infectologia e a Sociedade Americana de Epidemiologia Hospitalar, com o apoio de várias organizações, tais como a Academia Americana de Pediatria e a Sociedade Americana de Farmacêuticos, publicaram recentemente um guia para o desenvolvimento de um programa de racionalização do uso de antimicrobianos em hospitais. Porém, sabemos da necessidade de haver uma conscientização de seu uso não só em ambiente hospitalar, mais em todos os possíveis locais de consumo e de venda, protegendo assim os consumidores de seus efeitos maléficos quando usados de maneira incorreta (DELLIT et al., 2007). É importante destacar que o uso inadequado de antimicrobianos não ocorre apenas quando não há prescrição efetivada por profissional de saúde. Segundo a OMS, seu emprego é desnecessário em 50% dos casos. (OMS, 2012, apud SAMPAIO, 2018). 44 A Política Nacional de Medicamentos define o Uso Racional de Medicamentos (URM) como o processo que compreende a prescrição apropriada, a disponibilidade oportuna e a preços acessíveis, bem como a dispensação em condições adequadas e o consumo nas doses indicadas, nos intervalos definidos e no período de tempo indicado de medicamentos eficazes, seguros e de qualidade (BRASIL, 2001). Programas de controle de antimicrobianos têm como objetivo primeiramente proporcionar os melhores desfechos para o paciente em termos de cura de infecções e redução de mortalidade. Secundariamente estes programas visam estabilizar a resistência bacteriana, prevenir eventos adversos e reduzir os custos com o tratamento (DAVEY et al., 2006). A diretriz sobre o uso racional de medicamentos criado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1985, recomenda que os pacientes devem receber medicamentos apropriados para suas condições clínicas, em doses adequadas, por período suficiente e ao menor custo para si e para a comunidade (SANTOS et al., 2010). 9 ESTRATÉGIAS PARA A RACIONALIZAÇÃO DE ANTIMICROBIANOS Aspectos do uso racional de antimicrobianos. Fonte: traduzido e adaptado de Fishman apud CABRAL et al, 2018 45 9.1 Descalonamento da terapia O descalonamento consiste na administração inicial de tratamento empírico de amplo espectro, com objetivo de cobrir os patógenos mais frequentemente relacionados à infecção a ser tratada e, assim que o agente causador for identificado, ajustar o tratamento. O descalonamento também inclui alteração de terapia combinada por monoterapia, ou suspensão da antibioticoterapia, assim que o estado clínico do paciente permitir (CABRAL et al, 2018). De acordo com o autor o objetivo do descalonamento é reduzir mortalidade e morbidade com o início precoce de terapia empírica ampla, além de limitar o desenvolvimento de resistência bacteriana por meios da redução da pressão seletiva, com a suspensão do antimicrobiano ou a redução do espectro. Esta estratégia tem sido avaliada particularmente em casos de pneumonia associada à ventilação (PAV), nos quais as potenciais complicações por microrganismos multirresistentes são relativamente altas. Vários estudos mostram que o descalonamento nestes casos é seguro e está associado com redução de mortalidade (CABRAL et al, 2018). 9.2 Rotação de antibióticos O objetivo desta estratégia é reduzir a ocorrência de resistência, por meio da troca frequente de antibióticos, preservando sua atividade, para que possam ser reintroduzidos em um ciclo posterior (CABRAL et al, 2018). Segundo Fishman, em estudo conduzido no Centro de Ciências da Saúde da Universidade de Virgínia, 1 ano de tratamento sem protocolos de terapia dirigida foi comparado a 1 ano após a instituição do protocolo de rotação de antibióticos. Apesar de vários questionamentos metodológicos posteriores, os desfechos analisados mostraram redução significativa na incidência de infecções por cocos Gram-positivos resistentes (pfoi associado à redução significativa nas taxas de bacteremia por Enterococcus spp 47 (p=0,016). A pré-autorização pode ser realizada de várias formas: formulário de prescrição de antibióticos (com justificativa), contato telefônico e suspensão automática da prescrição, dentre outras (CABRAL et al, 2018). 9.6 Uso de parâmetros farmacocinéticos e farmacodinâmicos para ajuste de dose O regime posológico mais adequado deve ser estabelecido seguindo as características de farmacocinética e farmacodinâmica de cada antibiótico. O efeito do medicamento é o resultado da exposição das bactérias à fração do antibiótico livre, no sítio da infecção, de modo que a concentração sérica total não reflete a fração ativa da droga. Para os betalactâmicos, uma estratégia para melhorar a eficácia é maximizar o tempo em que a concentração de droga livre está acima da concentração inibitória mínima do microrganismo por meio da infusão prolongada (CABRAL et al, 2018). 9.7 Educação Um programa educacional, com objetivo de aumentar a compreensão dos médicos sobre o uso adequado dos agentes antimicrobianos, é relativamente barato e fácil de implementar. Esse tipo de conduta consiste em importante estratégia institucional, especialmente nos departamentos clínicos em que 50 a 75% dos pacientes recebem antibiótico profilático ou terapêutico, e estudos demonstram que até 50% desta utilização é inadequada. Ainda hoje a formação de futuros médicos em alguns fundamentos básicos muitas vezes não é feita de forma adequada, como evidenciado em estudo que mostrou que médicos no final da residência não são mais bem informados sobre o uso de antimicrobianos que no primeiro ano de residência (CABRAL et al, 2018). As diretrizes clínicas para manejo de infecções específicas podem ser extremamente úteis no processo de tomada de decisão e ajudam na implementação de estratégias para a racionalização no uso de antibióticos. No entanto, é necessário que sejam constantemente revisadas e atualizadas (CABRAL et al, 2018). 48 10 RESISTÊNCIA BACTERIANA E O AMBIENTE HOSPITALAR Fonte: vilhenasilva.com.br A resistência bacteriana é um sério problema de saúde pública e cresce verticalmente por todo o mundo. Algumas ações de combate à resistência devem ser tomadas e incluem: desenvolvimento de novas drogas, melhor controle sobre infecções hospitalares e, principalmente, conservação do atual arsenal terapêutico, através de educação continuada no uso de antimicrobianos (FIO et al, 2000). As bactérias têm sido classificadas como resistentes ou sensíveis de acordo com dados de CMI (Concentração Mínima Inibitória) CMB (Concentração Mínima Bactericida). São ditas resistentes quando são inibidas in vitro só em concentrações superiores àquelas atingidas in vivo. Essa relação concentração da droga-inibição de crescimento não deve ser encarada como completamente verdadeira, pois o sucesso terapêutico não depende exclusivamente dessa relação, mas, sim, passa por fatores que incluem a capacidade da droga em atingir o foco infeccioso (MIRANDA,2013). A resistência de dado microrganismo à determinada droga pode ser classificada inicialmente como intrínseca ou adquirida, natural ou adquirida, pode ser originária de uma mutação ou ainda transferível. Produtos derivados de plantas como agentes antimicrobianos são alvo de pesquisas visando utilizá-los para a conservação de alimentos e 49 controle de patógenos transmitidos por alimentos (HINTZ, 2015, apud, SILVA, 2018). 10.1 Controle de infecções hospitalar O controle de infecções hospitalares e o combate à resistência antimicrobiana, duas importantes prioridades da área da saúde no mundo, foram os temas centrais de um evento realizado pela Anvisa, em Brasília. O primeiro problema é relacionado à falta de higienização adequada em ambientes hospitalares, fator determinante para a ocorrência de contaminações de pacientes e profissionais de saúde. O descuido pode até levar ao óbito. Já o segundo afeta diretamente o controle de infecções e foi eleito pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como uma das 10 ameaças globais em 2019. 10.2 Resistência intrínseca A resistência intrínseca é aquela que faz parte das características naturais, fenotípicas do microrganismo, transmitida apenas verticalmente à prole. Faz parte da herança genética do microrganismo (FIO et al, 2000). Segundo o autor, o maior determinante de resistência intrínseca é a presença ou ausência do alvo para a ação da droga. Assim, antibióticos poliênicos, como a anfotericina B, atuam contra fungos devido à sua capacidade de ligação a esteróis componentes de sua membrana. Alteram sua permeabilidade, levando-o à morte. Como bactérias não possuem esteróis em sua membrana, sendo essa uma característica natural, são, portanto, insensíveis a essas drogas. Outro clássico exemplo é a relação entre inibidores da síntese da parede celular, tal como as penicilinas e micoplasmas. Esses microrganismos não apresentam essa estrutura celular, logo penicilinas não encontram alvo para sua ação nesses microrganismos. A resistência intrínseca ou natural não apresenta qualquer risco à terapêutica, pois é previsível, bastando-se conhecer o a ente etiológico da infecção e os mecanismos de ação dos fármacos disponíveis clinicamente. 50 10.3 Resistência natural Ocorre quando há o aparecimento de resistência em uma espécie bacteriana anteriormente sensível à droga em questão. É uma "nova" característica manifestada na espécie bacteriana, característica essa ausente nas células genitoras. Essa nova propriedade é resultado de alterações estruturais e/ou bioquímicas da célula bacteriana, determinada por alterações genéticas cromossômicas ou extra cromossômicas (plasmídeos). Uma simples alteração genética pode levar ao aparecimento de um exemplar muito resistente, que normalmente não perde viabilidade e patogenicidade (TEIXEIRA et al, 2019). Para uma melhor compreensão do fenômeno global de resistência bacteriana é preciso entender como microrganismos adquirem resistência, como passam a expressar essa nova característica, de onde vem essa informação. A aquisição de resistência pode aparecer originária de uma mutação ou ainda transferível. Como consequência do crescimento da resistência bacteriana, os gastos com tratamentos de saúde e internações elevam-se, bem como o aumento da mortalidade causada por infecções bacterianas hospitalares resistentes, que, na Europa, ultrapassa 25 mil mortes por ano. (OMS, 2012, apud SAMPAIO,2018). Mutação: A mutação é um fenômeno espontâneo, resultado de um erro na replicação do DNA, ocorre um mutante a cada 104 a 1010 divisões celulares. Normalmente envolve deleção, substituição ou adição de um ou mais pares de bases, levando a alterações na composição de aminoácidos de determinados peptídeos. Essa mutação ocorre na ausência ou presença de antibióticos, o único papel que pode caber à droga é selecionar os mutantes, favorecendo seu crescimento por sua atuação nas células normais sensíveis. Esse problema tem se mostrado mais alarmante com drogas destinadas a tratamentos prolongados, como as utilizadas contra a tuberculose e hanseníase. A mutação leva muitas vezes à alteração de permeabilidade da célula ou ainda à alteração de seu receptor. As células mutantes não têm qualquer vantagem biológica sobre as normais, ao contrário são defectivas, morrendo a qualquer alteração, seja de pH, temperatura, osmolaridade (TEIXEIRA et al, 2019). 51 Resistência transferível: A resistência transferível ocorre quando um dado microrganismo recebe material genético de outro microrganismo, passando a expressar a característica contida no gene recentemente adquirido. Esse material genético que contém a informação que expressa a resistência pode ser transferido de algumas formas: transformação, transdução, conjugaçãoe ainda transposição (TEIXEIRA et al, 2019). Transformação: A transformação é um processo no qual há lise de determinado microrganismo com liberação de seu material genético para o meio, dessa forma, outra bactéria é capaz de captar esse DNA incorporando-o ao seu genoma. Transdução: A transdução envolve a incorporação acidental de DNA bacteriano cromossômico ou plasmidial por um bacteriófago durante seu processo de infecção celular. Após a análise celular, esse bacteriófago atua então como um vetor e ao infectar nova célula pode introduzir o DNA contendo o gene de resistência, tornando-a resistente à determinada droga. Ocorre somente entre bactérias de uma mesma espécie e exerce papel importante na transferência de plasmídios R (resistência) entre S. aureus e Streptococcus pyogenes (TEIXEIRA et al, 2019). Os hospitais são os principais locais onde ocorrem infecções por bactérias resistentes ou multirresistentes, principalmente nas Unidades de Terapia Intensiva (UTI), onde existe uma população vulnerável devido à gravidade das doenças e utilização de múltiplos processos invasivos. Isso faz com que o sistema imunológico fique comprometido, tornando os pacientes mais vulneráveis à aquisição de infecções. (REIS, 2013, apud BORGIGNOM, 2017). Conjugação: A conjugação é um processo que requer contato físico, bactéria-bactéria, em que uma das células, a doadora, transfere através de fímbria ou pilo sexual o material genético a outra, chamada receptora. A habilidade de uma bactéria em conjugar normalmente é codificada em plasmídios, chamados plasmídios F, de fertilidade ou conjugativos (TEIXEIRA et al, 2019). A resistência extracromossômica pela transferência de fatores R constitui o mais frequente processo de resistência bacteriana aos antimicrobianos em hospitais, favorecido pela pressão seletiva do uso destas drogas neste ambiente. 52 Transposição: No fenômeno da transposição há a dependência da presença na bactéria de segmentos curtos de DNA denominados transpossons. Transpossons podem conter genes de resistência para um ou mais antibióticos. Por não terem capacidade de auto replicação, unem-se a replicons, ou seja, saltam dentro da célula entre plasmídeos, cromossomos e bacteriófagos, caracterizando uma promiscuidade gênica celular. Esses "genes saltadores", ao se unirem a segmentos de DNA para sua replicação, podem incorporar genes de resistência nesse DNA (TEIXEIRA et al, 2019). A partir desses mecanismos, bactérias podem adquirir e/ou transferir resistência a outras bactérias, passando a elas a propriedade de defesa contra determinada droga. É importante salientar que não há necessidade de patogenicidade do microrganismo para que carregue genes de resistência, ao contrário, bactérias de microbiota normalmente são as que carregam maior quantidade de genes de resistência a uma ou mais drogas (TEIXEIRA et al, 2019). 11 O FARMACÊUTICO NO COMBATE AO USO INADEQUADO DE ANTIMICROBIANOS Fonte: institutodefarmacologia.com O farmacêutico é o profissional capacitado para avaliar as prescrições, propor o URM (Uso Racional de Medicamentos) e praticar a atenção 53 farmacêutica, oferecendo informação e orientação sobre a utilização dos medicamentos. O farmacêutico moderno além de conhecimentos é fundamental ter atitudes e habilidades que permitam o mesmo agregar-se à equipe de saúde e interagir mais com o paciente e a comunidade, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida, em especial no que se refere à melhora da farmacoterapia e o uso racional de medicamentos (ANGONESI, 2010). O profissional farmacêutico tem um papel fundamental na utilização de medicamentos pelos usuários e nos resultados dos mesmos; pois é um profissional diretamente envolvido na política do uso racional de medicamentos e em outros aspectos sanitários. Portanto, para que o farmacêutico esteja preparado para suas funções, ele deve ser fonte de informações corretas e seguras sobre os medicamentos, de forma a educar outros profissionais de saúde envolvidos com o medicamento, como médico e enfermeiro, desenvolver adequadamente a atenção farmacêutica, participar da promoção e educação sanitária como, por exemplo, sobre o uso adequado de medicamento, vacinação, prevenção do uso de drogas e estar e manter-se atualizado e qualificado para as suas competências e responsabilidades. Para que isso aconteça, o farmacêutico deve adotar uma postura de aprendizado permanente, através de cursos, pois, dessa forma, ele será capaz de adaptar suas práticas de atenção farmacêutica com a evolução científica e as regulamentações sanitárias e profissionais (LUCCHETTA et al, 2010). A utilização de antimicrobianos sem prescrição acarreta o aumento de reações adversas e, consequentemente, a elevação dos gastos com hospitalizações e tratamentos de saúde. (AQUINO, 2008, apud SAMPAIO, 2018). Segundo o autor, o usuário deve ser alertado sobre os efeitos colaterais esperados, uma vez que alimentos, bebidas e/ou outros fármacos podem interferir na biodisponibilidade do medicamento e comprometer a eficiência da terapêutica. O autor ainda o papel dos profissionais de saúde, sobretudo do farmacêutico, que deverá fazer as devidas orientações para que o paciente faça um bom uso do medicamento e consequentemente tenha êxito em seu tratamento. 54 Para que seja posto em prática tudo que se preconiza em relação ao uso racional de medicamentos é necessário além de outras medidas também pôr em prática chamada Assistência farmacêutica que é definida como sendo um conjunto de ações executadas nos serviços de saúde para garantir a assistência terapêutica integral à população na proteção, prevenção e recuperação da saúde, em seus aspectos individuais e coletivos (ANGONESI, 2010). Dentre as diversas atribuições do farmacêutico que atuam em drogarias no Brasil, destacam-se: avaliar a prescrição médica; prestar assistência farmacêutica através de ações de educação sanitária e informação quanto ao modo de utilização dos medicamentos, sobretudo de medicamentos que tenham efeitos colaterais indesejáveis ou alterem as funções nervosas superiores; assegurar condições adequadas de conservação e dispensação de medicamentos, correlatos e alimentos para fins especiais; manter os livros de substâncias sujeitas a regime de controle especial em ordem e assinados, além de demais livros e documentos previstos na legislação vigente; assegurar condições para o cumprimento das atribuições gerais de todos envolvidos, visando, prioritariamente, a qualidade, eficácia e segurança do produto; gerenciar aspectos técnico-administrativos de todas as atividades; prestar a sua colaboração ao CFF, ao Conselho Regional de Farmácia (CRF) de sua jurisdição e às autoridades sanitárias; informar as autoridades sanitárias e o CRF sobre as irregularidades detectadas em medicamentos no estabelecimento sob sua direção técnica; participar de estudos de farmacovigilância com base em análise de reações adversas e interações medicamentosas, informando a autoridade sanitária local; manter os medicamentos e demais produtos sob sua guarda com controle de estoque que garanta, no mínimo, o reconhecimento do lote e do distribuidor; realizar treinamento inicial e contínuo dos funcionários em que constem, por escrito, suas atividades, direitos e deveres compatíveis com a hierarquia técnica para a adequação da execução de suas atividades; prestar serviço de aplicação de injeção (LUCCHETTA, 2010). Segundo o autor, para que isso seja posto em prática o farmacêutico deve estar presente em todo o período de funcionamento do estabelecimento, favorecendo a assistência direta ao paciente por meio da dispensação. Deve estar, portanto, apto a promove-lhe informação, tomar decisões com base nas informações adquiridas e na legislação vigente e orientá-lo quanto ao uso do 55 medicamento.O farmacêutico, além de atuar como fonte de informações pautadas no conhecimento técnico-científico, deve apresentar postura proativa na prática da dispensação e assumir responsabilidades, sem esperar do paciente os sinais de alerta quanto à compreensão, efetividade e segurança do tratamento. A eficácia do tratamento e do medicamento usado pelo paciente depende de todos os profissionais de saúde, sendo necessário treinamento a esses profissionais tanto para o conhecimento próprio quanto para atenção farmacêutica (NICOLINI et. al., 2008). Diante desse quadro, cabe ao profissional farmacêutico, exercer uma dispensação responsável e ética, para que a população tenha um atendimento adequado, principalmente as crianças, que ainda não têm o conhecimento necessário para opinar se querem ou não fazer uso de um medicamento. 11.1 Participação do farmacêutico em uma CCIH e suas funções Infecções nosocomiais, também chamadas infecções hospitalares, são aquelas adquiridas durante o internamento que não estavam presentes ou estavam no período de incubação à data da admissão, são infecções que ocorrem a mais de 48 horas após a admissão do paciente no ambiente hospitalar (NETO, 2010). A infecção hospitalar existe em todo o mundo, tanto nos países desenvolvidos como nos países pobres. Infecções adquiridas em instituições de saúde estão entre as mais importantes causas de morte e aumento da morbilidade nos doentes hospitalizados. Vale ressaltar que o controle das infecções hospitalares é multiprofissional, devendo ter interação entre as diferentes seções envolvidas e que cada uma delas cumpra as suas responsabilidades. (CAVALLINI, 2010, apud REGINATO, 2015). A prevenção das infecções hospitalares é responsabilidade de todos os indivíduos e serviços que prestam cuidados de saúde. Todos devem trabalhar em cooperação para reduzir o risco de infecção nos doentes e nos profissionais. Isto inclui os profissionais que prestam os cuidados direitos ao doente, a gestão, as instalações, o aprovisionamento de materiais, equipamentos e produtos. Os 56 programas de controle de infecção são eficazes desde que sejam abrangentes e incluam atividades de vigilância e prevenção, assim como a formação dos profissionais. É, também, essencial que haja um apoio eficaz aos níveis regional e nacional (CASTRO, 2008). De acordo com o autor, uma Comissão de Controle de Infecção proporciona um fórum para a cooperação e participação multidisciplinar e para a partilha de informação. Esta comissão deve incluir uma ampla representação de outras áreas relevantes: p. ex., Administração, Médicos, outros Profissionais de Saúde, Microbiologista Clínico, Farmácia, Aprovisionamento, Serviço de Instalação e Equipamentos, Serviços Hoteleiros, Departamento de Formação. A comissão deve reportar diretamente à Administração ou à Direção Médica, a fim de assegurar a visibilidade e a eficácia do programa. Numa emergência (caso de um surto), esta comissão deve poder reunir-se prontamente. A comissão tem as seguintes funções: Rever e aprovar um programa anual de atividades para a VE e prevenção; Rever dados de VE e identificar áreas de intervenção; Avaliar e promover a melhoria de práticas, a todos os níveis, de prestação de cuidados de saúde; Assegurar a formação adequada dos profissionais em controle de infecção e segurança; Rever os riscos associados a novas tecnologias e monitorizar o risco de infecção de novos dispositivos e produtos, antes da aprovação do seu uso; Rever e fornecer dados para a investigação de surtos; Comunicar e colaborar com outras comissões do hospital com objetivos comuns, tais como a Comissão de Farmácia e Terapêutica, Comissão de Antibióticos, Comissão de Higiene e Segurança (CASTRO, 2008). A equipe ou a pessoa responsável pelo controle de infecção é responsável tanto pelas tarefas quotidianas de controle de infecção, como pela preparação do plano de ação anual, que será revisto pela comissão de controle de infecção e pela Administração. Estes profissionais têm um papel de apoio científico e técnico: p. ex., investigação, desenvolvimento e auditoria de políticas e supervisão prática, avaliação de materiais e produtos, controle da esterilização e desinfecção, implementação de programas de formação. Deverão também participar e apoiar os programas de investigação e de avaliação, a nível nacional e internacional (CASTRO, 2008). O farmacêutico como componente da Comissão de Controle de Infecção hospitalar (CCIH) tem funções como: desenvolver guia de utilização de 57 antimicrobianos, manual de germicidas, indicadores de controle de infecção e sensibilidade dos antimicrobianos, consumo e taxa de letalidade; monitorização das prescrições de antimicrobianos; controle de utilização de resistência antimicrobiana e estabelecer rotina de dispensação de antimicrobianos; controle de custos; estímulo à terapia sequencial; elaboração de relatórios de consumo e educação permanente da equipe de saúde. O farmacêutico hospitalar como integrante da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar é responsável por ações como: Obter, armazenar e distribuir preparações farmacêuticas, utilizando práticas que limitem a potencial transmissão de agentes infecciosos aos doentes; Distribuir fármacos anti- infecciosos e manter registros relevantes (potencial) incompatibilidade, condições de armazenamento e deterioração); Obter e conservar vacinas ou soros, disponibilizando-as quando necessário; Manter registros dos antibióticos distribuídos aos departamentos médicos; Fornecer à Comissão de Antibióticos e à Comissão de Controle de Infecção, relatórios periódicos e tendências na utilização de antibióticos; Ter disponível as seguintes informações sobre desinfetantes, antissépticos e outros produtos anti-infecciosos: Propriedades ativas em relação à concentração, temperatura, tempo de ação, espectro antimicrobiano; propriedades tóxicas, incluindo a sensibilização ou irritação da pele e mucosas; Substâncias que sejam incompatíveis com os antibióticos ou que reduzam a sua potência; Condições físicas que afetem desfavoravelmente a potência durante o armazenamento: temperatura, luz, umidade; Efeitos nocivos sobre o material (CASTRO, 2008). O farmacêutico hospitalar pode e deve participar nas práticas de esterilização desinfecção hospitalares através de: Participação no desenvolvimento de recomendações para antissépticos, desinfetante e produtos utilizados para a lavagem e desinfecção das mãos; Participação no desenvolvimento de recomendações para a reutilização de equipamento e material; Participação no controle de qualidade das técnicas utilizadas no hospital par esterilizar o equipamento, incluindo a seleção de equipamento de esterilização e sua monitorização (BRASIL, 2012). A CCIH é uma peça fundamental na tentativa de quebra na cadeia da resistência bacteriana, pois é por meio dela que são criadas e desenvolvidas atividades com função de diminuir a infecção hospitalar e consequentemente a 58 diminuição da resistência bacteriana, já que são as bactérias as principais causas de infecção hospitalar e por aumentar a permanência dos pacientes internos nos hospitais. E o profissional farmacêutico têm fundamental papel na participação da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar, pois eles junto com os demais profissionais da área atuarão para diminuir ou até mesmo acabar com as infecções hospitalares e a resistência bacteriana (CASTRO, 2008). Para coordenar as atividades do time operacional é necessário definir um líder operacional que, preferencialmente, deve ser um infectologista / médico com expertise em doenças infecciosas ou um farmacêutico clínico com conhecimento em doenças infecciosas. Esse coordenador deve ter os seus 18 trabalhos alinhado com a CCIH e com a Comissão de Farmácia e Terapêutica (CFT) do hospital (BRASIL, 2017, apudDELLIT, 2007). A resistência microbiana constitui-se, neste milênio, a despeito dos avanços da Medicina, um dos maiores problemas de saúde pública. E conter a resistência, especialmente no ambiente hospitalar, tem sido preocupação constante da comunidade cientifica e dos órgãos governamentais de vários países (WEBER et al, 2005). Para que haja um maior controle sobre o desenvolvimento da resistência será necessária a implementação de dois processos fundamentais: as medidas de controle para limitar a disseminação dos microrganismos resistentes, isto e, impedir a transmissão cruzada destes microrganismos, e o desenvolvimento de uma política para promover o uso racional de antimicrobianos. Podemos perceber o fundamental papel do farmacêutico na quebra da cadeia formada entre o usuário e os medicamentos e o surgimento da resistência bacteriana que só aumenta a cada dia e traz sérios problemas à população. Verificamos a importância da atuação correta dos profissionais farmacêuticos para a conscientização da população em relação ao controle do uso de antimicrobianos e em especial a classe dos antibióticos, já que são eles os responsáveis pela dispensação de medicamentos em geral (PEREIRA et al, 2008). Surgindo a necessidade e importância de colocar em prática as políticas já existentes em relação ao uso racional de medicamentos, como também a necessidade de cumprir nosso código de ética e atender as diretrizes da Assistência Farmacêutica, tornando assim profissionais mais conscientes de 59 nossos papeis como militantes por uma Saúde melhor, garantindo eficiência e eficácia nos tratamentos medicamentosos (CASTRO, 2008). 12 PANORAMA MUNDIAL ATUAL NA RESISTÊNCIA AOS ANTIMICROBIANOS Fonte: guiadafarmacia.com A Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou os primeiros dados de vigilância sobre resistência aos antibióticos e revelou altos níveis de resistência a uma série de infecções bacterianas graves em países de alta e baixa renda. De acordo com o Global Antimicrobial Surveillance System (GLASS), há uma ocorrência generalizada de resistência aos antibióticos entre 500 mil pessoas com suspeita de infecção bacteriana em 22 países (OPAS, 2018). Entre as bactérias resistentes mais relatadas, podemos citar a Escherichia coli, Staphylococcus aureus e Streptococcus pneumoniae e Salmonella. Algumas das infecções mais comuns do mundo, e potencialmente as mais perigosas, estão provando ser resistentes aos medicamentos. Até o momento, 52 países (25 de alta renda, 20 de média renda e sete de baixa renda) estão inscritos no sistema global da OMS. Para a elaboração do primeiro relatório, 40 países forneceram informações sobre seus sistemas nacionais de vigilância e 22 países também proveram dados sobre os níveis de resistência aos antibióticos (OPAS, 2018). http://www.who.int/entity/glass/en/index.html 60 Segundo o autor, os dados apresentados no relatório variam amplamente em qualidade e completude. Alguns países enfrentam grandes desafios na construção de seus sistemas nacionais de vigilância, entre eles a falta de profissionais, de investimentos e de infraestrutura. Programas sólidos de vigilância da resistência às drogas em tuberculosos, HIV e malária têm funcionado há muitos anos e ajudaram a estimar a carga dessas doenças. Além disso, essas ferramentas orientam ações em serviços de diagnóstico e tratamento, monitoram a eficácia das intervenções de controle e subsidiam indicações de regimes de tratamento efetivos para abordar e prevenir futuras resistências. Espera-se que o relatório GLASS desempenhe uma função similar para agentes patogênicos bacterianos comuns (OPAS, 2018). 61 13 REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ABRANTES, P. M. et al. Avaliação da qualidade das prescrições de antimicrobianos dispensadas em unidades públicas de saúde de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, 2002. Cad. Saúde Pública, 2007. ANGONESI, D. SEVALHO, G. Atenção Farmacêutica: fundamentação conceitual e crítica para um modelo brasileiro. Ciênc. saúde coletiva vol.15 supl.3 Rio de Janeiro Nov. 2010 AQUINO DS. Por que o uso racional de medicamentos deve ser uma prioridade? 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A decisão de iniciar tratamento antimicrobiano deve ser tomada quando há evidências de infecção por meio de dados clínicos (picos febris, presença de secreção purulenta), laboratoriais (hemograma com leucocitose e desvio à esquerda) e/ou de imagem. A suspeita clinica pode ou não ser confirmada com cultura positiva para microrganismos, preferivelmente isolados de materiais considerados estéreis. Definido sinais e sintomas sugestivos de infecção, é necessária à procura de foco provável. A comprovação do sítio de infecção auxiliará na escolha do antimicrobiano empírico baseado na colonização habitual, patógenos mais comuns e penetração do antibiótico no sítio afetado (MOTA et al., 2010). Novas estratégias têm sido desenvolvidas na tentativa de otimizar processos de elucidação de mecanismos de ação de candidatos a fármacos antibióticos, como ensaios baseados em microarray e biomarcadores. (FREIBERG, 2006, apud GUIMARAES, 2010). De acordo com a Sociedade Brasileira de Vigilância de Medicamentos para se incluir um antimicrobiano no tratamento de qualquer patologia é um processo bastante complicado, pois é necessário além do diagnóstico clínico e laboratorial, conhecimento farmacológico dos agentes causadores da mesma. Devendo essa escolha ser feita por um profissional capacitado e qualificado, representando um grande desafio tanto para os médicos quanto para os farmacêuticos. Os antibióticos por produzirem efeitos benéficos e maléficos para os pacientes são medicamentos obrigados a ser vendidos com prescrição médica, mais ao contrário são vendidos sem restrições nas farmácias, ou seja, sem a apresentação da prescrição ou diagnóstico laboratorial, e o pior é que os atendentes geralmente ganham comissão com as vendas desses medicamentos. Sendo esses os principais fatores que contribuem para o uso 8 indiscriminado, e impróprio dos antibióticos, facilitando o desenvolvimento da resistência bacteriana e muitas vezes a ineficácia terapêutica (SOBRAVIME, 2001). Os antimicrobianos em muitos países são vendidos sem receita médica em até dois terços dos casos e de acordo com estudos realizados mesmo quando prescritos, sua indicação pode ser desnecessária em até 50% dos casos. Nessa perspectiva entra o importante papel da Assistência Farmacêutica que é conceituada como um sistema que envolve uma organização complexa exercitada por um grupo de atividades relacionadas com os medicamentos, destinada a apoiar as ações de saúde demandadas por uma comunidade, englobando intervenções logísticas relativas à seleção, à programação, à aquisição, ao armazenamento e à distribuição dos medicamentos, bem como ações assistenciais da farmácia clínica e de vigilância como o formulário terapêutico, a dispensação, a adesão ao tratamento, a conciliação de medicamentos e a farmacovigilância (ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DE SAÚDE, 2011). Antibióticos são compostos naturais ou sintéticos capazes de inibir o crescimento ou causar a morte de fungos ou bactérias. Podem ser classificados como bactericidas, quando causam a morte da bactéria, ou bacteriostáticos, quando promovem a inibição do crescimento microbiano (WALSH, 2003, apud GUIMARAES, 2010) O farmacêutico tem fundamental importância no combate ao uso irracional e indiscriminado de antibióticos, pois o mesmo faz parte da cadeia que liga o usuário ao medicamento. Daí a grande importância da conscientização da população em relação ao uso correto de medicamentos, e em especial a classe dos antibióticos que tem seu uso controlado, e possui como uma de suas consequências à resistência bacteriana, quando usado indevidamente. Sendo também obrigação dos farmacêuticos cumprir o código de ética que rege a profissão, minimizando assim os problemas causados pelo uso incorreto de medicamentos e suas consequências (SOBRAVIME, 2001). 9 2.1 Classificação dos antimicrobianos Fonte: MELO et al, 2012. 3 PRINCIPAIS CLASSES DE ANTIBIÓTICOS EM USO CLÍNICO Fonte: drogariasantoremedio.com 10 Os antibióticos de origem natural e seus derivados semi-sintéticos compreendem a maioria dos antibióticos em uso clínico e podem ser classificados em β-lactâmicos (penicilinas, cefalosporinas, carbapeninas, oxapeninas e monobactamas), tetraciclinas, aminoglicosídeos, macrolídeos, peptídicos cíclicos (glicopeptídeos, lipodepsipeptídeos), estreptograminas, entre outros (lincosamidas, cloranfenicol, rifamicinas etc). Os antibióticos de origem sintética são classificados em sulfonamidas, fluoroquinolonas e oxazolidinonas (GUIMARÃES et al, 2010). Antibióticos β-lactâmicos Os antibióticos β-lactâmicos corresponderam a 50% do total de vendas de antibióticos em 2004. São agentes antibacterianos que inibem irreversivelmente a enzima transpetidase, que catalisa a reação de transpeptidação entre as cadeias de peptideoglicana da parede celular bacteriana. A atividade desta enzima leva à formação de ligações cruzadas entre as cadeias peptídicas da estrutura peptideoglicana, que conferem à parede celular uma estrutura rígida importante para a proteção da célula bacteriana contra as variações osmóticas do meio. Constituem a primeira classe de derivados de produtos naturais utilizados no tratamento terapêutico de infecções bacterianas. Hoje, várias décadas após a descoberta da penicilina, este grupo ainda contém os agentes mais comumente utilizados. Possuem amplo espectro de atividade antibacteriana, eficácia clínica e excelente perfil de segurança, uma vez que atuam na enzima transpeptidase, única em bactérias (GUIMARÃES et al, 2010). Os antimicrobianos β-lactâmicos impedem a reação de transpeptidação e inibem o crescimento do peptídeoglicano, interferindo no funcionamento de várias enzimas que participam da sua síntese final. Já os glicopeptídeos impedem a transferência da subunidade usada na adição de nova molécula ligando-se ao acil-D- alanil-D-alanina do pentapeptídeo. E a fosfomicina inibi a enzima piruvil-transferase, responsável pela ligação do N-acetil-glicosamina ao N-acetil-murâmico (TORTORA, 2012, apud FRANCO, 2015). Todos os antibióticos β-lactâmicos têm um elemento estrutural farmacofórico em comum, o anel azetidinona de quatro membros, ou anel β- lactâmico. Na maioria dos antibióticos, o anel central β-lactâmico é fundido a outro anel de cinco (tiazolidínico) ou seis (di-hidrotiazínico) membros, formando 11 as penicilinas ou cefalosporinas, respectivamente. Em geral, o sistema bicíclico é fundamental para a atividade destes antibióticos, por mimetizar o resíduo dipeptídico terminal D-Ala-D-Ala da cadeia de peptideoglicana, substrato da enzima transpeptidase (GUIMARÃES et al, 2010). O sistema bicíclico tensionado destes antibióticos contribui para o aumento da instabilidade química do anel β-lactâmico, altamente suscetível ao ataque de nucleófilos que promovem a hidrólise do grupo farmacofórico. No caso das penicilinas, o oxigênio da cadeia lateral acílica participa como nucleófilo em reação intramolecular que promove a abertura do anel β-lactâmico em meio ácido, inativando o antibiótico e inviabilizando sua administração por via oral. As modificações estruturais possíveis ficam restritas às cadeias laterais, que podem modular: a estabilidade em meio ácido, fundamental para a atividade por via oral destes fármacos; a estabilidade frente às β-lactamases, enzimas bacterianas relacionadas à resistência, que hidrolisamo grupo farmacofórico destes antibióticos e, o espectro de ação frente a bactérias Gram negativo (GUIMARÃES et al, 2010). Segundo o autor, para aumentar a estabilidade em meio ácido foram adicionados grupos retiradores de elétrons no carbono α ao carbono carbonílico da cadeia lateral em penicilinas semi-sintéticas (ampicilina, amoxicilina, oxacilinas), que diminuem a nucleofilicidade do oxigênio carbonílico. O principal mecanismo de resistência bacteriana aos antibióticos β- lactâmicos é através da produção de enzimas que apresentam grupos nucleofílicos (em geral, resíduos de serina) capazes de promover a abertura do anel β-lactâmico. Neste caso, a modificação molecular responsável pelo aumento de resistência às β-lactamases foi a introdução de grupamentos volumosos no carbono α ao carbono carbonílico da cadeia lateral em penicilinas semi-sintéticas (meticilina, oxacilinas), que impedem o acesso dos antibióticos ao sítio ativo da enzima β-lactamase por impedimento estérico (GUIMARÃES et al, 2010). Devido à natureza mais complexa da parede celular, as bactérias Gram negativo são mais resistentes à ação de antibióticos, que não são capazes de cruzar efetivamente esta barreira lipídica. Para ter acesso à célula bacteriana, os antibióticos devem cruzar a parede celular através de canais proteicos de porina, embebidos na estrutura lipídica, que apresentam o interior com 12 características hidrofílicas. Assim, antibióticos com maior atividade frente a bactérias Gram negativo são aqueles que apresentam grupos ionizáveis em suas estruturas químicas (GUIMARÃES et al, 2010). De acordo com o autor, o maior número de antibióticos β-lactâmicos em uso clínico pertence à classe das cefalosporinas, que estão subdivididas em cefalosporinas de primeira, segunda, terceira e quarta gerações, em função do espectro de ação mais ampliado frente a bactérias Gram negativo. O sistema bicíclico das cefalosporinas é menos tensionado em comparação ao das penicilinas, o que contribui para a maior estabilidade frente à reação de abertura intramolecular do anel β-lactâmico pela cadeia lateral. As cefalosporinas de primeira geração são consideradas fármacos de menor atividade que as penicilinas, porém apresentam boa atividade frente a bactérias Gram positivo. Também podem ser utilizadas para tratamento de infecções por S. aureus e por Streptococcus quando as penicilinas têm que ser evitadas. As cefalosporinas de segunda geração são fármacos que, em geral, apresentam atividade variada frente a bactérias Gram positivo, porém atividade superior frente a bactérias Gram negativo. A terceira e a quarta geração das cefalosporinas também são representadas por fármacos da classe das oximinocefalosporinas. Essa classe de fármacos representa um considerável incremento na potência e no espectro de ação, particularmente frente a bactérias Gram negativo (GUIMARÃES et al, 2010). Durante o período de maior procura por novos antibióticos, compreendido entre as décadas de 1970 e 1980, muitos subgrupos de β-lactâmicos foram relatados, tais como as monobactamas, representadas pelas nocardicinas (naturais) e pelo aztreonam (sintético), e as clavamas ou oxapeninas, representadas pelo ácido clavulânico, fármaco inativador de β-lactamases. Os inibidores de β-lactamases apresentam fraca ação antibiótica, devido à ausência de cadeia lateral em C-6. Porém, reagem rápida e irreversivelmente com enzimas de resistência bacteriana, com mecanismo análogo ao da reação de penicilinas e cefalosporinas com a enzima transpeptidase. São geralmente usados em combinações com penicilinas de amplo espectro de ação (GUIMARÃES et al, 2010). As monobactamas são antibióticos β-lactâmicos monocíclicos e foram isoladas de fontes naturais. As nocardicinas apresentam atividade moderada in 13 vivo frente a um pequeno grupo de bactérias Gram negativo, incluindo Pseudomonas aeruginosa. O aztreonam é um fármaco sintético da classe das monobactamas com antividade antibiótica e administrado via intravenosa. Apresenta atividade frente a micro-organismos Gram positivo e bactérias anaeróbias. A tienamicina foi o primeiro exemplo da classe das carbapeninas naturais e serviu de protótipo para o desenvolvimento de análogos sintéticos como imipenem, meropenem e ertapenem. As carbapeninas atuam de maneira análoga às penicilinas e cefalosporinas, com elevada potência e extraordinário espectro de atividade frente a bactérias Gram positivo e Gram negativo, além de boa resistência a β-lactamases (GUIMARÃES et al, 2010). Aminoglicosídeos Os aminoglicosídeos são agentes que possuem um grupo amino básico e uma unidade de açúcar. A estreptomicina, principal representante da classe, foi isolada em 1944 de Streptomyces griseus, um micro-organismo de solo. Os aminoglicosídeos apresentam atividade melhorada em pH levemente alcalino, em torno de 7,4, onde estão positivamente carregados, facilitando a penetração em bactérias Gram negativo (GUIMARÃES et al, 2010). Os antibióticos aminoglicosídicos apresentam efeito bactericida por ligarem-se especificamente à subunidade 30S dos ribossomos bacterianos, impedindo o movimento do ribossomo ao longo do mRNA e, consequentemente, interrompendo a síntese de proteínas. O uso contínuo de antibióticos aminoglicosídeos deve ser cuidadosamente controlado, devido aos efeitos ototóxicos e nefrotóxicos. Esses agentes são efetivos contra bactérias Gram negativo aeróbicas, como P. aeruginosa, e apresentam efeito sinérgico com β- lactâmicos (GUIMARÃES et al, 2010). Devido à polaridade, os aminoglicosídeos devem ser administrados por via injetável. Eles também são incapazes de atravessar a barreira hematoencefálica eficientemente e, portanto, não podem ser usados para o tratamento de meningites, a menos que sejam injetados diretamente no sistema nervoso central (GUIMARÃES et al, 2010). 14 Macrolídeos Os macrolídeos representaram cerca de 18% do total de vendas de antibióticos em 2004. Os macrolídeos naturais caracterizam-se pela presença de lactonas macrocíclicas de origem policetídica de 14 ou 16 membros, ligadas a um açúcar e um amino-açúcar. Derivados semi-sintéticos podem apresentar anel macrocíclico de 15 membros (azitromicina). A eritromicina, isolada pela primeira vez em 1952 de Streptomyces erythreus, é um dos mais seguros antibióticos em uso clínico (GUIMARÃES et al, 2010). Segundo o autor, os macrolídeos são agentes bacteriostáticos, que atuam pela ligação com o RNA ribossomal 23S da subunidade 50S, interferindo na elongação da cadeia peptídica durante a translação e bloqueando a biossíntese de proteínas bacterianas. São usados em infecções respiratórias como pneumonia, exacerbação bacteriana aguda de bronquite crônica, sinusite aguda, otites médias, tonsilites e faringites. Streptococcus pneumoniae, Streptococcus pyogenes, Haemophilus influenzae e Moraxella catarrhalis são os patógenos predominantes envolvidos nestas doenças. Staphylococcus aureus, Salmonella e Escherichia coli são importantes patógenos alimentares e estão dentre os maiores causadores de surtos no Brasil (Ministério da Saúde, 2016, apud SILVA, 2018). A eritromicina age frente à maioria dos patógenos respiratórios, é considerada segura e amplamente prescrita a crianças. Entretanto, seu limitado espectro de ação e sua limitada estabilidade em meio ácido resultam em uma fraca biodisponibilidade e uma variedade de outros efeitos colaterais, tais como influência na motilidade gastrointestinal, ações pró-arrítmicas e inibição do metabolismo de fármacos. Porém, durante décadas, esforços têm sido realizados para se obter novos derivados da eritromicina, tanto de origem natural quanto sintética, com perfis mais favoráveis. Antibióticos macrolídeos de segunda geração, como roxitromicina, claritromicina e azitromicina, foram gradualmente substituindo a eritromicina,superando seu espectro de atividade, melhorando a atividade e os perfis físico-químico e farmacocinético, além de atenuar os efeitos colaterais (GUIMARÃES et al, 2010). 15 Cloranfenicol O cloranfenicol foi isolado a primeira vez do micro- organismo Streptomyces venezuela. Atualmente o cloranfenicol é sintetizado e somente o isômero R,R é ativo. O cloranfenicol liga-se à subunidade 30S do ribossomo e parece inibir o movimento dos ribossomos ao longo do mRNA, provavelmente pela inibição da peptidil transferase, responsável pela extensão da cadeia peptídica. Uma vez que o cloranfenicol se liga à mesma região que os macrolídeos e as lincosamidas, eles não podem ser administrados em associação. Os grupamentos nitro e ambos grupamentos álcool estão envolvidos nas interações. O grupo dicloroacetamida também é importante, porém pode ser substituído por outros grupos eletronegativos (GUIMARÃES et al, 2010). Tetraciclinas As tetraciclinas são antibióticas policetídicos bacteriostáticos de amplo espectro e bastante eficazes frente a diversas bactérias aeróbicas e anaeróbicas Gram positivo e Gram negativo. A clortetraciclina foi o primeiro derivado a ser descoberto. As tetraciclinas inibem a síntese de proteínas através da ligação com a subunidade 30S dos ribossomos, impedindo a ligação do aminoacil-tRNA. Como resultado, a adição de novos aminoácidos para o aumento da cadeia proteica é bloqueada. A liberação de proteínas também é inibida (GUIMARÃES et al, 2010). A seletividade frente aos ribossomos bacterianos em relação aos ribossomos de eucariotos deve-se a diferenças estruturais nos ribossomos e também à concentração seletiva do antibiótico nas células bacterianas.1 Devido ao aumento de resistência bacteriana às tetraciclinas, o seu uso como primeira escolha na terapia antibiótica tem diminuído. Entretanto, o desenvolvimento recente de um derivado semi-sintético desta classe, a tigeciclina, que inibe a bomba de efluxo, indica o interesse contínuo nesta classe de antibióticos. Devido à presença de formas de equilíbrio cetoenólico, as tetraciclinas apresentam a capacidade de quelar metais, especialmente cálcio. Portanto, seu uso não é recomendado em crianças e mulheres grávidas, uma vez que estes antibióticos podem se acumular em dentes e ossos em formação (GUIMARÃES et al, 2010). 16 Lincosamidas As lincosamidas têm propriedades antibacterianas similares aos macrolídeos e agem pelo mesmo mecanismo de ação. A lincomicina e seu derivado semi-sintético clindamicina foram introduzidos na prática clínica como antibióticos de uso oral em 1960 e 1969, respectivamente. A lincomicina foi isolada do micro-organismo de solo Streptomyces lincolnensis. A clindamicina é um antibiótico amplamente utilizado, que possui melhor atividade e maior absorção por via oral. A clindamicina é o fármaco de escolha para o tratamento de infecções periféricas causadas por Bacillus fragilis ou outras bactérias anaeróbicas penicilina resistentes. Este fármaco é também topicamente utilizado para o tratamento de acne (GUIMARÃES et al, 2010). Glicopeptídeos Os antibióticos glicopeptídicos, vancomicina e teicoplanina têm se tornado os fármacos de primeira linha no tratamento de infecções por bactérias Gram positivo com resistência a diversos antibióticos. A vancomicina, o primeiro antibiótico glicopeptídico introduzido na prática clínica em 1959, foi isolada de amostras de solo de Streptomyces orientalis (reclassificado como Amycolatopsis orientalis) (GUIMARÃES et al, 2010). A elucidação da estrutura desse antibiótico demorou vários anos, até ser completa e inequivocadamente proposta na década de 1980. A vancomicina apresenta uma conformação rígida importante para a atividade. Os glicopeptídeos inibem a biossíntese da parede celular bacteriana pela complexação com o resíduo dipeptídico terminal D-Ala-D-Ala das cadeias peptídicas que constituem a parede celular. Esta complexação impede que o substrato esteja disponível para a ação da transpeptidase inibindo, portanto, a reação de transpeptidação. O desenvolvimento de resistência bacteriana a estes antibióticos é mais lento, apesar de algumas linhagens de Staphylococcus aureus hospitalares já apresentarem resistência desde 1966. Eles são restritos para o tratamento de infecções causadas por bactérias Gram positivo por serem incapazes de penetrar nas membranas de bactérias Gram negativo. A vancomicina em geral 17 é o antibiótico de última escolha frente a patógenos Gram positivo resistentes, em particular contra espécies de Enterococcus (GUIMARÃES et al, 2010). Lipodepsipeptídeos A daptomicina é um lipodepsipeptídeo isolado de Streptomyces roseosporus e aprovado em 2003 para tratamento de infecções causadas por bactérias Gram positivo. Seu mecanismo de ação envolve desorganização de múltiplas funções da membrana celular bacteriana. É provável que todos os antibióticos lipopeptídicos apresentem alguma penetração na membrana devido às cadeias alquílicas, o que promove sua desorganização (GUIMARÃES et al, 2010). Rifamicinas A rifampicina é um fármaco semi-sintético derivado da rifamicina B, produto natural híbrido de policetídeos e peptídeos não ribossomais. A rifamicina B foi isolada de Streptomyces mediterranei, reclassificado como Nocardia mediterranei. A rifampicina é um inibidor da RNA polimerase, utilizada clinicamente como parte da combinação de fármacos para o tratamento da tuberculose. É o único fármaco em uso clínico que bloqueia a transcrição bacteriana (GUIMARÃES et al, 2010). Segundo relatório da OMS em 2014: “Antimicrobial resistance: global report on surveillance” – as principais bactérias resistentes são: Escherichia coli, Klebsiella pneumoniae, Salmonella não tifoide, Shigella. Outras bactérias como Pseudomonas aeru- ginosa e Acinetobacter baumannii são também multirresistentes. (WORLD, 2014, apud BORGIGNOM, 2017). Estreptograminas A pritinamicina é uma mistura de substâncias macrolactonas obtidas de Streptomyces pristinaespiralis, que podem ser utilizadas oralmente no tratamento de infecções por bactérias Gram positivo. Dois derivados semi- sintéticos desta classe, quinupristina e dalfopristina, têm sido utilizados por via intravenosa em combinação. A quinupristina é derivada da pristinamicina I, uma peptideolactona cíclica não ribossonal, enquanto a dalfopristina deriva da 18 pristinamicina IIA, um híbrido policetídico/peptídico contendo um anel macrolactônico. Esses agentes atuam de maneira sinergística para bloquear a translação do polipeptídeo, pela ligação na subunidade 50S dos ribossomos bacterianos, na região 23S do rRNA, sobrepondo parcialmente o sítio de ligação dos macrolídeos. Aparentemente, a ligação da dalfopristina aumenta a afinidade da ligação para a quinupristina, explicando o efeito sinérgico. A quinupristina inibe a elongação da cadeia peptídica, enquanto a dalfopristina interfere na transferência da cadeia peptídica de um tRNA para outro (GUIMARÃES et al, 2010). Antibióticos sintéticos Sulfonamidas e trimetoprim As sulfonamidas, também conhecidas como sulfas, foram testadas pela primeira vez nos anos 1930 como fármacos antibacterianos. Um exemplo de sulfa ainda utilizada na terapêutica é o sulfametoxazol, em associação com o trimetoprim, para o tratamento de pacientes com infecções no trato urinário e também para pacientes portadores do vírus HIV que apresentam infecções por Pneumocystis carinii. Cada um desses fármacos bloqueia uma etapa no metabolismo do ácido fólico. O sulfametoxazol bloqueia a enzima di- hidropteroato sintetase, presente apenas nas bactérias, enquanto o trimetoprim inibe a di-hidrofolato redutase (GUIMARÃES et al, 2010). Ambas as enzimas atuam na via de biossíntese do N5,N10-metileno-tetra- hidrofolato, importante cofator que fornece uma unidade de carbono na biossíntese de basespirimidínicas constituintes dos ácidos nucleicos. A atuação destes fármacos é sinérgica no bloqueio de dois diferentes passos na via bioquímica de formação deste cofator essencial. As sulfonamidas são, portanto, agentes bacteriostáticos que atuam como antimetabólitos do ácido p- aminobenzoico, substrato para a di-hidropteroato sintetase bacteriana, impedindo a formação do di-hidropteroato e, consequentemente, do N5,N10- metileno-tetra-hidrofolato (GUIMARÃES et al, 2010). 19 Quinolonas e fluoroquinolonas As quinolonas e fluoroquinolonas são fármacos bactericidas muito utilizados no tratamento de infecções do trato urinário e também no tratamento de infecções causadas por micro-organismos resistentes aos agentes antibacterianos mais usuais. Esta classe representou 19% das vendas de antibióticos em 2004 (GUIMARÃES et al, 2010). O ácido nalidíxico, sintetizado em 1962, foi o protótipo desta classe de antibióticos. É ativo frente a bactérias Gram negativo e utilizado no tratamento de infecções do trato urinário, porém, os micro-organismos podem adquirir rápida resistência a esse antibiótico. Vários outros análogos têm sido sintetizados, com propriedades similares ao ácido nalidíxico. A enoxacina, desenvolvida em 1980, é um fármaco que apresenta elevado espectro de atividade frente a bactérias Gram positivo e Gram negativo. É também ativo frente à Pseudomonas aeruginosa, bactéria altamente resistente a antibióticos. O desenvolvimento da enoxacina foi baseado na descoberta de que um átomo de flúor na posição 6 aumenta a atividade, bem como facilita a entrada na célula bacteriana. Um anel piperazínico básico na posição 7 levou ao aumento na absorção por via oral, distribuição tecidual e estabilidade metabólica. Foi observado também um aumento no nível e espectro de atividade, particularmente frente a bactérias Gram negativo como Pseudomonas aeruginosa. Muitos desses benefícios são devidos ao substituinte básico ligado à posição 7 formar um zwitterion com o ácido carboxílico da posição 3. A introdução de um substituinte ciclopropílico na posição 1 incrementou o amplo espectro de ação, enquanto a substituição do nitrogênio da posição 8 por um carbono reduziu as reações adversas e aumentou a atividade frente a S. aureus. Estas modificações originaram a ciprofloxacina, o antibiótico mais ativo da classe das fluoroquinolonas frente a bactérias Gram negativo. Esse fármaco é amplamente utilizado em infecções do trato urinário, respiratório e gastrointestinal, além de infecções de pele, ossos e articulações. As fluoroquinolonas agem inibindo a topoisomerase IV de bactérias Gram positivo e apresentam seletividade 1000 vezes maior para enzimas bacterianas em relação às enzimas correspondentes em células humanas. Em bactérias Gram negativo, o alvo das fluoroquinolonas é a topoisomerase II, também 20 conhecida por DNA-girase, que apresenta as mesmas funções da topoisomerase IV. As DNA-topoisomerases mudam o número de ligações no DNA superenrolado através de quebras transitórias no DNA, que se torna topologicamente relaxado devido à quebra temporária em uma fita (tipo I) ou em ambas as fitas ao mesmo tempo (tipo II). Topoisomerases são essenciais para a viabilidade celular em células procarióticas e eucarióticas. As quinolonas apresentam boa seletividade para células bacterianas (GUIMARÃES et al, 2010). Oxazolidinonas A linezolida é um agente bacteriostático da classe das oxazolidinonas que apresenta um amplo espectro de ação e atividade frente a bactérias resistentes a outros antibióticos que inibem a síntese de proteínas. A linezolida liga-se à subunidade 50S ribossomal, impedindo sua união com a subunidade 30S para formação do ribossomo 70S, essencial para o início da síntese proteica. Desta forma, a translação não pode ser iniciada. Os outros antibióticos que inibem a síntese proteica atuam no próprio processo de translação. A linezolida foi lançada em 2000 e apresenta boa atividade frente bactérias Gram positivo. Esse fármaco pode ser administrado por via oral, porém, apresenta um alto nível de efeitos colaterais (GUIMARÃES et al, 2010). 4 ALGUNS DOS PRINCIPAIS ANTIFÚNGICOS UTILIZADOS NA CLÍNICA Fonte: novanatural.com 21 Anfotericina B A anfotericina B agrupa-se, juntamente com a nistatina, aos antibióticos poliênicos, cuja estrutura é macrocíclica e caracterizada por átomos de carbono divalentes dispostos em série. Atua como fungicida ligando-se ao ergosterol, esteróide presente na membrana de fungos sensíveis, alterando a permeabilidade desta e causando a perda de constituintes citoplasmáticos. Adicionalmente, leva a uma lesão oxidativa que resulta em alterações metabólicas prejudiciais à sobrevida celular. Em menor escala, a anfotericina B liga-se também ao colesterol da membrana das células humanas, alterando-as e provocando efeitos adversos. Seu espectro de ação antifúngica abrange os agentes etiológicos das principais micoses endêmicas: Paracoccidioides brasiliensis, Histoplasma capsulatum, Coccidioides immitis, Blastomyces dermatitidis, Cryptococcus neoformans var. neoformans e var. gattii e Sporothrix schenckii. Tem boa atividade contra espécies de Candida, embora algumas poucas amostras de Candida não albicans possam ser resistentes (MARTINEZ, 2006). De acordo com o autor, atua contra Aspergillus fumigatus, mas a sensibilidade de outras espécies de Aspergillus é variável. Susceptibilidade variada também é observada para zigomicetos (Mucor, Rhizopus) e Fusarium spp. Certos microorganismos causadores de infecções fúngicas oportunistas são geralmente resistentes à anfotericina B, a exemplo de Trichosporon spp., Pseudallescheria boydii, Cladosporium spp. e Phialophora spp. A formulação convencional da anfotericina B, para uso médico, associa a esta droga o desoxicolato de sódio, cuja finalidade é solubilizá- la em água e estabilizar a suspensão na forma de micélios. A aplicação por via endovenosa, em infusão lenta, é necessária para se obter níveis úteis no sangue e tecidos. A dose diária única de 1 mg/kg de peso corporal resulta em concentrações séricas máximas aproximadas de 1 a 2 µg/ml na primeira hora após a infusão, e estima-se a sua meia-vida inicial em 24 a 48 horas. A anfotericina B convencional alcança maiores concentrações no fígado, baço, rins e pulmões. A fração circulante, cerca de 95% da qual se liga a proteínas, colesterol e hemácias, tem seu nível reduzido lentamente, possibilitando que o antibiótico seja ministrado, 22 na fase de consolidação do tratamento, em intervalos de 48 a 72 horas. A principal via de excreção é a renal, mas há também eliminação por via hepatobiliar, e presume-se que parte da droga seja metabolizada (MARTINEZ, 2006). A anfotericina B produz frequentes efeitos adversos, quer relacionados à infusão, quer tardios, por toxicidade celular e tecidual. As reações imediatas à infusão decorrem da liberação de interleucinas e prostaglandinas, manifestando- se como febre, calafrios, taquicardia, hipertensão arterial, náuseas, vômitos e taquipnéia. A intensidade dessas reações imediatas varia conforme o paciente e diminui com a progressão do tratamento. Os efeitos adversos tardios relacionam- se diretamente com a dose cumulativa recebida de anfotericina B e, também, com a sensibilidade e condições orgânicas do paciente. Mais comuns são a nefrotoxicidade e a anemia, que requerem correção de doses e de intervalos da administração e eventualmente obrigam a uma suspensão da terapia. Outras reações adversas incluem plaquetopenia, dispnéia, hipotensão arterial, arritmia cardíaca e toxicidade neurológica, além de tromboflebite no local de aplicação (MARTINEZ, 2006). O uso clínico da anfotericina B é limitado pelos efeitos adversos e necessidade de aplicação endovenosa. Portanto, o antibiótico é mais empregado em casos deinfecções fúngicas invasivas, particularmente em imunossuprimidos, na doença disseminada em imunocompetentes e em situações especiais, como neuromicoses ou na ausência de outra droga eficaz. Constituem indicações primárias de terapia com anfotericina B casos de criptococose, aspergilose, infecções disseminadas por Candida spp resistente a triazólicos e infecções por certos agentes de feohifomicose e de hialohifomicose (MARTINEZ, 2006). Formulações lipídicas de anfotericina B Lipossomos e outras estruturas lipídicas são utilizados para transportar e aumentar o índice terapêutico de fármacos. Três formulações lipídicas de anfotericina B estão disponíveis para uso médico: lipossomal, em dispersão coloidal e em complexo lipídico. A incorporação a partículas ou macromoléculas de lipídeos modifica sua farmacocinética e distribuição tecidual. Os compostos 23 são retirados da circulação pelo sistema monocítico-macrofágico, e a anfotericina B é liberada dos lipídeos no interior das células. Quando transportada por lipídeos, a anfotericina B atinge maiores concentrações no fígado e no baço do que a formulação desoxicolato, mas no rim seus níveis são menores. Isto explica a menor nefrotoxicidade das preparações lipídicas, que são, por outro lado, discretamente mais hepatotóxicas do que a medicação convencional (MARTINEZ, 2006). O autor afirma que mesmo pacientes com lesão renal ou com anemia induzida por anfotericina B desoxicolato podem completar o tratamento com as formulações lipídicas, em geral sem agravamento destes efeitos adversos. Assim, o principal benefício destas preparações é a maior segurança quanto à toxicidade celular no uso prolongado da anfotericina B. Em relação à medicação convencional, as formulações lipídicas apresentam menor atividade in vitro sobre leveduras e fungos filamentosos. Nas infecções experimentais com fungos, as três preparações lipídicas da anfotericina B lipídica em geral necessitam de doses maiores para igualar ou, eventualmente, superar a ação antifúngica da medicação convencional.(7-9) A maioria dos estudos clínicos, abertos ou controlados, mostraram eficácia comparável entre a anfotericina B desoxicolato - 0,6 a 1,5 mg/kg de peso corporal/dia - e formulações lipídicas administradas em doses três a seis vezes maiores (MARTINEZ, 2006). Em razão do alto custo destes fármacos, alguns serviços médicos tratam os pacientes com uma mistura de anfotericina B desoxicolato e uma solução de lipídeos para nutrição parenteral (Intralipid®, Lipofundin®). Trata-se de uma preparação lipídica improvisada, de igual eficácia e menos segura do que a anfotericina B convencional, mas que pode ser menos nefrotóxica. As características principais das três formulações lipídicas licenciadas para uso médico são apresentadas a seguir (MARTINEZ, 2006). Anfotericina B lipossomal (L-Amb) Comercializada com o nome de Ambisome, nesta formulação o antibiótico está incorporado em lipossomos, microesferas lipídicas com 55 a 75 nm de diâmetro, que são preparadas com lecitina de soja, colesterol e 24 diestearoilfosfatidilglicerol. Recomendam-se doses diárias de 3 mg de anfotericina B/kg de peso corporal, embora um estudo controlado não tenha mostrado superioridade da terapia com dosagem acima de 1 mg/kg de peso/dia. Doses elevadas, de até 10 mg/kg de peso/dia, associam-se com melhores respostas em infecções experimentais, sendo eventualmente empregadas em humanos. Em relação a outras formulações lipídicas e à convencional, a L-Amb alcança concentrações séricas máximas muito elevadas (10 a 35 g/ml, após 3 mg/kg), porém a maior parte da anfotericina permanece nos lipossomos e, provavelmente, não ativa. Os níveis encontrados nos pulmões de pacientes tratados com L-Amb e posteriormente autopsiados sugerem menor distribuição da L-Amb para esta víscera em relação à formulação convencional (MARTINEZ, 2006). A L-Amb tem baixa toxicidade, a menor dentre todas as formulações, tanto imediata como crônica, possibilitando infusão rápida e uso seguro de doses de até 5 mg/kg/dia. Quanto à eficácia, a L-Amb foi avaliada principalmente como terapia empírica para pacientes com neoplasias hematológicas. Em estudos controlados com pacientes neutropênicos febris, a L-Amb mostrou eficácia superior ou equivalente à anfotericina convencional (MARTINEZ, 2006). Pacientes com sorologia positiva para o vírus da imunodeficiência humana com meningite criptocócica mostraram resposta global semelhante para as duas formulações, mas tiveram líquido cefalorraquiano com cultura negativa mais rapidamente quando tratados com L -Amb do que com a anfotericina desoxicolato. Pacientes com câncer e aspergilose invasiva, a maioria com envolvimento pulmonar, mostraram 54% a 63% de resposta radiológica quando medicados com L-Amb. A mesma formulação avaliada em diversos tipos de imunossupressão proporcionou a cura de 59% a 77% de pacientes com aspergilose e de 56% a 79% de doentes com candidíase (MARTINEZ, 2006). Anfotericina B em dispersão coloidal (ABCD) Nesta formulação (Amphocil®), a anfotericina B está contida, juntamente com sulfato de colesterol, em microdiscos com diâmetro médio de 122 nm. Sugere-se o uso de doses diárias únicas de 3 a 4 mg/kg de peso corporal, mas a ABCD tem sido utilizada em doses entre 1 e 8 mg/kg de peso/dia. Os níveis 25 sanguíneos máximos são iguais ou inferiores aos da medicação convencional e um estudo farmacocinético em ratos também mostrou baixas concentrações no tecido pulmonar (MARTINEZ, 2006). Embora seja menos nefrotóxica, são comuns as reações imediatas à ABCD, que deve ser infundida lentamente. Avaliada como terapia empírica em neutropênicos febris, a ABCD mostrou eficácia comparável à da formulação convencional. Em um estudo controlado, mostrou-se igualmente eficiente no tratamento de pacientes com aspergilose invasiva. Em estudos abertos, a ABCD em imunossuprimidos resultou em resposta completa ou parcial em 57% a 58% de casos de candidíase e em 34% a 39% de aspergilose (MARTINEZ, 2006). Complexo lipídico de anfotericina B (ABLC) Segundo Martinez (2006) o ABLC é um complexo macromolecular de anfotericina B com dimiristoilfosfatidilcolina e dimiristoilfosfatidilglicerol, constituindo partículas em formato de roseta de fitas, com tamanhos entre 1,6 e 11m (Abelcet®). Adultos e crianças recebem o equivalente a 5 mg de anfotericina/kg de peso corporal/dia, dosagem que permite alcançar concentrações séricas máximas semelhantes às da anfotericina B desoxicolato. Os níveis no tecido pulmonar podem superar os da droga convencional com o uso de doses mais elevadas. O ABLC não apresenta vantagem quanto às reações relacionadas com a infusão, mas sua toxicidade renal é menor. Quando avaliado em pacientes com infecção pelo vírus da imunodeficiência humana 1 e meningite criptocócica, não foi observada diferença no percentual de respostas favoráveis entre anfotericina desoxicolato e ABLC, porém muitos pacientes deste último grupo mantinham cultura positiva para criptococo no final do tratamento. Em estudos não controlados em pacientes com infecções oportunistas, o ABLC mostrou eficácia de 42%, 67% e 100% em casos de aspergilose, de 66%, 67% e 100% na candidíase, de 71% na zigomicose e de 82% na fusariose (MARTINEZ, 2006). 26 4.1 Drogas Azólicas Os azólicos são quimioterápicos antifúngicos caracterizados por um anel pentagonal na estrutura molecular, o qual contém três átomos de carbono e dois de nitrogênio (imidazólicos), ou dois de carbono e três de nitrogênio (triazólicos). Considerando as drogas de uso sistêmico, o primeiro subgrupo compreende o miconazol e o cetoconazol e o último, o fluconazol, itraconazol, voriconazol, posaconazol e ravuconazol. Os azólicos atuam sobre enzimas do citocromo P450 dos fungos, bloqueando a demetilação do lanosterol e a síntese deergosterol, o que altera a permeabilidade da membrana e a viabilidade fúngica. Também agem modificando a síntese de lipídeos e inativando enzimas do processo oxidativo dos fungos. Os azólicos, principalmente os imidazólicos, exercem ação apenas fungistática. Alterações na enzima C-14-alfademetilase e aumento do efluxo das drogas são causas de resistência aos azólicos, a qual foi constatada particularmente em Candida não albicans (MARTINEZ, 2006). Todos os azólicos têm meia-vida sérica suficientemente longa para possibilitar a terapia com uma ou duas doses por dia. O fluconazol tem excelente biodisponibilidade, alcançando boas concentrações em diferentes fluídos orgânicos, inclusive no líquido cefalorraquiano, e 75% da dose oral é excretada por via urinária. O cetoconazol e o itraconazol apresentam menor biodisponibilidade por dependerem de pH gástrico inferior a 3 para sua solubilização e absorção, que é parcial. Não alcançam níveis úteis no líquido cefalorraquiano e na urina, e são metabolizados no fígado e excretados por via biliar. As concentrações de itraconazol no fígado, pulmão e osso superam o nível sérico. Os principais efeitos adversos das drogas azólicas relacionam-se com intolerância gastrintestinal, hepatotoxicidade, hipersensibilidade e, para o cetoconazol em doses elevadas, ginecomastia e irregularidades menstruais. São drogas teratogênicas e não devem ser administradas a gestantes. Várias classes de drogas interagem com os azólicos, quer reduzindo os níveis séricos do antifúngico (rifampicina, isoniazida, fenitoína, fenobarbital, carbamazepina), quer elevando os níveis de outros fármacos (ciclosporina, digoxina, terfenadina, warfarina, benzodiazepínicos e inibidores de protease do vírus da imunodeficiência humana 1) (MARTINEZ, 2006). 27 O espectro de ação dos imidazólicos e triazólicos abrange os agentes de paracoccidioidomicose, histoplasmose, coccidioidomicose, criptococose, blastomicose norte-americana e dermatomicoses. A maioria das espécies de Candida mostra susceptibilidade aos azólicos, notando-se que C. krusei e C. glabrata são menos susceptíveis. O itraconazol atua adicionalmente contra Aspergillus fumigatus e diversas outras espécies desse gênero, sendo uma alternativa à anfotericina no tratamento de pacientes com aspergilose, além de ser o principal recurso na terapia antifúngica de pacientes com micoses sistêmicas endêmicas. O cetoconazol também é empregado no controle destas últimas infecções, porém é limitado a casos não graves (MARTINEZ, 2006). De acordo com Martinez (2006) o fluconazol mostra boa atuação e é preferido no tratamento de pacientes com infecções por espécies sensíveis de Candida, além de ser utilizado na criptococose e nas infecções urinárias e do sistema nervoso central por fungos susceptíveis. O voriconazol, o posaconazol e o ravuconazol são triazólicos de segunda geração, resultantes de modificações na estrutura química de, respectivamente, fluconazol e itraconazol. Representam avanços na terapêutica das infecções fúngicas por terem o espectro de ação ampliado. O voriconazol, já disponibilizado para uso médico, (V Fend®) é apresentado a seguir. Voriconazol Esta droga mantém as propriedades gerais dos azólicos, porém bloqueia mais intensamente a síntese de ergosterol dos fungos filamentosos, para os quais chega a ser fungicida. Mostra ação in vitro sobre espécies de Aspergillus mais intensa do que o itraconazol, inclusive sobre o A. terreus, que comumente é resistente à anfotericina B. Tem atividade sobre muitas espécies de Fusarium, Paecilomyces, Alternaria, Bipolaris e sobre Scedosporium apiospermum/Pseudallescheria boydii. É fungistático para espécies de Candida, inclusive aquelas resistentes ao fluconazol, Cryptococcus spp. e Trichosporon spp., agindo também sobre fungos de micoses endêmicas (MARTINEZ, 2006). O voriconazol é usado por via oral ou endovenosa na dosagem de 6 mg/kg de peso a cada doze horas no primeiro dia, seguindo-se 4 mg/kg de peso a cada 28 doze horas. Adultos recebem por via oral um comprimido com 200 mg a cada doze horas (100 mg a cada doze horas, para pacientes com peso inferior a 40 kg), o que possibilita atingir concentração sérica máxima entre 4 a 6 µg/ml no estado de equilíbrio. A absorção não depende de acidez gástrica e a biodisponibilidade da droga oral é boa. O voriconazol alcança níveis inibitórios para fungos no encéfalo e no líquido cefalorraquiano. Por ser metabolizado e excretado pelo fígado, é necessário ajustar a dosagem ou evitá-lo quando há insuficiência hepática. Em casos de insuficiência renal moderada a grave é contra-indicada a administração endovenosa, pelo risco de acúmulo do veículo ciclodextrina (MARTINEZ, 2006). Efeitos adversos são freqüentes, mas geralmente benignos. Além daqueles comuns aos azólicos, cerca de 30% dos pacientes apresentam distúrbios visuais - discriminação de cores alterada, visão borrada, fotofobia - na primeira semana de terapia, sintomas que se atenuam e desaparecem a seguir. Reações de hipersensibilidade, desde exantemas discretos até reações graves, também foram relatadas. O uso clínico de voriconazol vem sendo feito principalmente em infecções por Aspergillus spp. e por outros fungos oportunistas. Um estudo randomizado em pacientes com aspergilose pulmonar invasiva mostrou a superioridade deste triazólico sobre a anfotericina B, tanto em relação a respostas favoráveis, como na sobrevida (MARTINEZ, 2006). Em estudos abertos com imunossuprimidos e aspergilose invasiva, verificou-se resposta completa ou parcial à terapia primária com voriconazol em 59% e 66% dos pacientes, resultados considerados melhores ou equivalentes aos controles históricos. Em casos de candidemia em pacientes não neutropênicos, um estudo randomizado mostrou eficácia comparável entre voriconazol e anfotericina B desoxicolato. Resultado semelhante foi observado entre as duas medicações no percentual de sucesso no tratamento empírico de pacientes com neutropenia e febre persistente. O voriconazol constitui um recurso terapêutico importante em certas infecções por fungos comumente resistentes à anfotericina B, a exemplo de Scedosporium spp. e Pseudallescheria boydii. Contudo, algumas espécies ou amostras de fungos oportunistas são resistentes (MARTINEZ, 2006). 29 Equinocandinas Equinocandinas são lipopeptídeos semi-sintéticos com estrutura química de hexapeptídeos cíclicos ligados a uma cadeia lateral de ácido graxo. Três drogas - caspofungina, micafungina e anidulafungina - chegaram à fase de investigação clínica, das quais a primeira está licenciada para uso clínico (Cancidas®). Diferentemente da anfotericina B e dos azólicos, as equinocandinas têm como alvo a parede celular, inibindo enzima ligada à síntese de beta. D glucana (MARTINEZ, 2006). A glucana na forma de microfibrilas é um dos principais componentes da parede celular fúngica. O bloqueio de sua síntese resulta em desequilíbrio osmótico, prejudicando a viabilidade do microorganismo. Equinocandinas agem in vitro sobre diversas leveduras e fungos filamentosos, porém em infecções experimentais é relevante somente a sua atividade sobre espécies de Candida e de Aspergillus. Para este último agente, ela é apenas fungistática. Os efeitos adversos são menos freqüentes do que com a anfotericina B e a interação com outros medicamentos é menor do que com as drogas azólicas. Contudo, a administração exclusivamente endovenosa e o restrito espectro de ação limitam o uso clínico das equinocandinas a infecções mais graves por Candida e Aspergillus (MARTINEZ, 2006). Caspofungina Esta droga é um derivado semi-sintético da pneumocandina B, produto natural de Glarea lozoyensis. Tem ação fungicida sobre diferentes espécies de Candida, incluindo as amostras resistentes a fluconazol e anfotericina B. C. guilliermondii émenos sensível e algumas amostras desta espécie sofrem ação apenas fungistática. A caspofungina em concentrações similares às alcançadas no plasma de pacientes inibiu a maioria das amostras de diferentes espécies de Aspergillus, inclusive as resistentes ao itraconazol. As concentrações mínimas inibitórias são maiores para A. terreus e A. nidulans (MARTINEZ, 2006). A caspofungina é administrada por via endovenosa, em períodos de uma hora. Por não ter sido suficientemente avaliada em crianças, é recomendada apenas para adultos, que recebem dose de 70 mg no primeiro dia e de 50 mg 30 nos dias seguintes. Com este esquema terapêutico, as concentrações séricas médias da droga são superiores a 1 µg/ml, suficientes para inibição de Candida e Aspergillus. Em pacientes com insuficiência hepática moderada, a dose deve ser reduzida a 35 mg/dia. Por outro lado, a dose diária deve ser mantida em 70 mg quando são administrados simultaneamente medicamentos indutores do metabolismo, como rifampicina, efavirenz, nevirapina, dexametasona, fenitoína e carbamazepina. Estudos em animais sugerem distribuição preferencial da caspofungina para o fígado e níveis reduzidos no encéfalo. A droga é excretada por via urinária e hepática após sofrer hidrólise e acetilação. Não deve ser administrada com ciclosporina, pois este medicamento inibe a captação hepática e eleva os níveis do antifúngico (MARTINEZ, 2006). A caspofungina pode eventualmente provocar reações durante a infusão, pois sua estrutura polipeptídica possibilita o surgimento de sintomas decorrentes da liberação de histamina. Outros efeitos adversos foram observados, como febre, cefaléia, náuseas, vômitos, eosinofilia, elevação de enzimas hepáticas e tromboflebite. No tratamento da candidíase orofaringiana ou esofágica, a caspofungina mostrou eficácia comparável à da anfotericina B convencional e do fluconazol. O sucesso terapêutico também foi comparável entre a anfotericina B convencional e a equinocandina em casos de candidemia e peritonite por diversas espécies de Candida. Na aspergilose invasiva, verificou-se resposta favorável à caspofungina em 45% dos pacientes, resultado superior aos 17% de eficácia obtidos em controle histórico. Um estudo randomizado em pacientes com neutropenia febril mostrou resposta favorável de 34% deles, tanto para caspofungina, como para anfotericina B lipossomal (MARTINEZ, 2006). 31 5 ANTIVIRAIS E APLICAÇÃO Fonte: revistagalileu.globo.com Família / vírus • Reoviridae: rotavírus. • Togaviridae: rubéola. • Flaviridae: dengue, hepatite C. • Coronaviridae: resfriado, SARS. • Paramyxoviridae: RSV. • Rhabdoviridae: raiva. • Filoviridae: ebola. • Orthomyxoviridae: influenza. 5.1 Antivirais Análogos acíclicos da guanosina • Aciclovir [Zovirax] • Valaciclovir (Æ aciclovir) [Valtrex]. • Fanciclovir (Æ penciclovir) [Famvir]. O penciclovir não é recomendado, mas o fanciclovir (sua pró-droga) pode ser utilizado sim. Essas drogas dirigem-se à célula infectada pelo vírus herpes. A 32 timidina fosfoquinase viral fosforila essas moléculas. Após a terceira fosforilação essas drogas ficam parecidas com o nucleotídeo derivado da guanina. São drogas que, por fim, são inibidoras da DNA polimerase (GUILHERME, 2007). • Ganciclovir Teoricamente poderia ser utilizado contra o herpes simplex e o herpes zoster, porém é muito mais tóxico. De outro modo: Aciclovir não é utilizado contra o Epstein-Barr porque não é eficiente. Ganciclovir não é utilizado contra os herpes simplex e zoster poque é mais tóxico (GUILHERME, 2007). 5.2 Antivirais Análogos cíclicos de nucleosídeos • Vidarabina Trifluridina [Virotic] Idoxuridina [IDU] Drogas com atividade antiviral muito inferior à do grupo I. São drogas pouco utilizadas dada sua menor eficácia. Existem aplicações tópicas: idoxuridina é utilizada para combater infecção ocular pelo herpes e principalmente pelo varicella. IIII (GUILHERME, 2007). 5.3 Antivirais Análogos de pirofosfato Foscarnet [Foscavir] A atividade antiviral é excelente. O problema, além do custo elevado, é que possui muito mais efeitos indesejados do que os análogos acíclicos da guanosina. Assim, fica reservado para quadros mais severos em que não houve bons resultados por motivos de resistência. Essa droga atinge inclusive um terceiro tipo de vírus da família herpesviridae (GUILHERME, 2007). 5.4 Antivirais úteis na gripe Amantadina e Rimantadina (Flumadina) Inibem o desencapsulamento viral e o processamento final dos vírus influenza-A. Não atuam contra vírus B (por isso são pouco utilizadas; é difícil saber qual o tipo do vírus causador da doença). Ativos por VO. Devem ser dados dentro de 48 horas após o início dos sintomas. Resistência = aproximadamente 33 30%. Efeitos adversos (rimantadina menos tóxica): edema, periférico, ansiedade, insônia, anorexia, náusea. Amantadina age em fase precoce (no desnudamento) e numa fase mais tardia (na formação de proteínas) (GUILHERME, 2007). Inibidores da neuramnidase Oseltamivir (Tamiflu): VO biodisponibilidade = aproximadamente 80%. Zanamivir Administrado por via inalatória. Agem na etapa quase final que antecedem a liberação dos vírus infectantes. Essas drogas podem e devem ser utilizadas em grandes aglomerações humanas (casas, quartéis e asilos) onde há infecção e possibilidade de disseminação. Proconiza-se que essa quimioprofilaxia seja feita nos não imunizados. Inibidores de neuraminidase A neuraminidase é uma enzima glicoprotéica da superfície do vírus da gripe, capaz de degradar o receptor para hemaglutinina viral localizado na célula do hospedeiro. Sua inibição reduz a liberação dos vírions pelas células infectadas, aumenta a formação de agregados virais e reduz a disseminação viral (GUILHERME, 2007). Os inibidores da neuraminidase atuam contra os vírus influenza A e B. Devem ser administrados até 30 horas do início dos sintomas. Úteis também na profilaxia. • Oseltamivir: 75-150 mg/d; Cmax=2,5-6h; t1/2=6-10 horas; efeitos adversos: naúsea, vômito, cefaléia. Rivavirina 5.5 Antivirais Análogo de nucleosídeo purínico Inibem a RNA-polimerase de diversos vírus. Espectro antiviral: VSR, vírus da hepatite C. Vias de administração: aerossol (via usual no tratamento das bronquiolites – principalmente em recém-nascidos e pneumonias por VSR), via oral (cápsulas 100 e 200 mg; via usual na hepatite C, associado com interferon alfa); também disponível para uso IV. 34 Efeitos adversos: mielotoxicidade, hemólise, neurotoxicidade, broncoespasmo (aerossol). Para gripe, os inibidores da neuroanimidase são mais seguros e mais efetivos. Contraindicação: gravidez (teratogênico e embriotóxico em animais). Se hoje surgir uma virose causar por um RNA-vírus-não-retrovírus a droga de escolha para tratá-la seria a Ribavirina (GUILHERME, 2007). Interferons-alfa São glicoproteínas imuno-moduladoras, com efeitos antiviral (RNA, DNA- vírus) e antineoplásico (linfoma cutâneo de células T – micose fungóide, leucemia mielóide crônica). Preparados: interferon alfa-2ª (Roferon A); interferon alfa-2b (Intron A); PEG-interferon alfa-2a (Pegasys); PEG-interferon alfa-2b (Pegintron). Vias de administração: SC, (IM). Na hepatite C: Ribavarina + Interferon alfa. Efeitos adversos (menos frequentes nos peguilados): síndrome gripal (primeira semana), mielotoxicidade, síndromes psiquiátricas, alopécia, aumento de transaminases, tireoidite, etc. Pleconaril (GUILHERME, 2007). Lançado em 2000 para tratamento de doenças causadas por enterovírus não-pólio (Coxsackie, ECHO). Depois, sugeriu-se seu uso no resfriado comum (rinovírus). Mecanismo de ação postulado: inibição do desenvelopamento de picornavírus. Via de administração: oral (com alimento). Efeitos adversos: aproximadamente 5% dos pacientes tiveram cefaléia, núasea,diarréia (GUILHERME, 2007). 35 6 RESISTÊNCIA ANTIMICROBIANA Fonte: saudebusiness.com Em 1945, Alexander Fleming alertou para o perigo da excessiva dependência de antibióticos e a ameaça de bactérias por conta do desenvolvimento de resistência. Depois de 68 anos, sua previsão foi concretizada. Laxminarayan et al. alertam que “estamos no alvorecer de uma era pós-antibiótica”, com “quase todas as bactérias causadoras de doenças, resistentes a vários antibióticos comumente usados para trata-las”. Os microrganismos resistentes são reconhecidos como uma razão para longos períodos de internação, custos mais elevados, e maior morbidade e mortalidade nos hospitais (CABRAL et al, 2018). Estudos têm sugerido que há uma associação causal entre o uso de antimicrobianos e a resistência antimicrobiana. Infecções hospitalares causadas por bactérias multirresistentes, como Acinetobacter spp. e Pseudomonas aeruginosa são um problema particularmente em unidades de terapia intensiva (UTI) de hospitais terciários. Assim, muitas organizações têm recomendado que a utilização de terapias combinadas de antimicrobianos devem ser monitorizadas a nível local e nacional, para compreender melhor a relação entre o uso de antimicrobianos e a emergente resistência antimicrobiana (CABRAL et al, 2018). 36 A exposição a antibióticos é um importante fator de risco para resistência bacteriana em pacientes hospitalizados. Estudo ecológico realizado no Brasil demonstrou correlação entre o aumento da utilização de fluoroquinolonas e o surgimento de Klebsiella spp. produtoras de ESBL e, também, aumento de Staphylococcus aureus resistentes à meticilina. Este mesmo estudo demonstrou ainda significativa correlação entre a utilização de cefalosporinas com a taxa crescente de Klebsiella spp. produtoras de ESBL. Observou-se também correlação significativa entre o uso de antimicrobianos e as maiores taxas de bactérias multirresistentes, quando o consumo de antibióticos foi considerado para todo o hospital (CABRAL et al, 2018). Segundo o autor as unidades de terapia intensiva (UTI) são uma área importante para o surgimento da resistência antimicrobiana, o que pode ser observado por conta de diversos fatores, como uso frequente de antimicrobianos de amplo espectro, aglomeração de pacientes com escores de gravidade elevados, presença de pacientes com internações prolongadas que podem estar abrigando bactérias multirresistentes e espaço físico relativamente pequeno, incrementando a probabilidade de transmissão de microrganismos de pessoa a pessoa. Outros fatores que ajudam a promover a resistência antimicrobiana incluem presença de dispositivos invasivos, como tubos endotraqueais e cateteres, possivelmente pela formação de biofilmes em suas superfícies. Em muitas circunstâncias, particularmente com S. aureus resistentes à meticilina, Enterococcus faecium resistentes à vancomicina e bactérias Gram-negativas produtoras de enzimas de amplo espectro com resistência a vários outros antibióticos, poucos agentes antimicrobianos permanecem como opção para um tratamento eficaz (CABRAL et al, 2018). Desse modo, estratégias que visam limitar ou modificar a administração desses agentes podem diminuir o aumento da resistência. As estratégias efetivas na prevenção da resistência a antimicrobianos estão disponíveis e devem ser implantadas. Elas podem ser divididas em estratégias de controle de infecção não farmacológicas, como, por exemplo, rotina de higienização das mãos e aplicação de protocolos específicos de prevenção de infecção, e estratégias de gestão de antibióticos, como, por exemplo, aulas de curta duração sobre o tratamento antimicrobiano adequado, tempo de tratamento adequado e 37 estreitamento do espectro antimicrobiano com base nos resultados da cultura (CABRAL et al, 2018). Testes diagnósticos microbiológicos ajudam a prevenir o uso desnecessário de antibióticos e a diminuir o espectro de cobertura necessária para tratar uma infecção. Porém, os resultados microbiológicos não são tão rápidos, e atrasos no tratamento inicial podem estar associados com aumento da mortalidade. Assim, o tratamento inicial é frequentemente utilizado com antibióticos de amplo espectro. O desenvolvimento de diagnósticos rápidos poderia eliminar esse atraso, permitindo o uso direcionado do antibiótico ou o tratamento sem antibiótico, desde o início. Tal fato e a educação aos prescritores sobre a importância da utilização dos resultados desses testes poderiam reduzir o uso excessivo de agentes de amplo espectro e, consequentemente, diminuir a velocidade com que a resistência se desenvolve (CABRAL et al, 2018). Estudos farmacodinâmicos empregados para evitar o surgimento de resistência são cada vez mais importantes, e dados apoiam a capacidade da otimização farmacodinâmica em prevenir o aparecimento de resistência durante a terapia. Em estudo realizado na Inglaterra utilizando diversos regimes de doses fracionadas de ciprofloxacino para tratar P. aeruginosa, demonstrou-se que o regime de 400mg a cada 8 horas foi associado à menor indução de resistência para esta bactéria (CABRAL et al, 2018). 7 RACIONALIZAÇÃO DE ANTIMICROBIANO Fonte: infectologista.net 38 A terapia empírica inadequada com antimicrobianos tem se tornado mais frequente em razão do aumento da resistência antimicrobiana, ficando a cada dia mais desafiador realizar a escolha do antimicrobiano adequado. Em estudo comparativo, foi demonstrado associação entre tratamento antimicrobiano inicial inadequado e mortalidade em pacientes internados em UTI com lúpus eritematoso sistêmico (LES). Pela análise de regressão logística, o risco de mortalidade na UTI foi 12 vezes maior entre os pacientes com LES que receberam tratamento antimicrobiano inadequado, quando comparados com aqueles que receberam o tratamento adequadamente (CABRAL et al, 2018). A probabilidade de sucesso terapêutico é uma questão multifatorial. Limitando nossas considerações com relação à resposta em terapias antimicrobianas, podemos deixar de analisar muitas variáveis críticas, que podem influenciar na resposta ao medicamento. Além de escolher o melhor antimicrobiano para tratar cada patógeno, é necessário avaliar as características individuais dos pacientes, a fim de adequar a dose do antimicrobiano. Roberts et al., em estudo multicêntrico com pacientes com lesão renal aguda em terapia de substituição renal contínua, verificaram que significativa proporção de pacientes corria risco de falha terapêutica por baixa exposição ao antibiótico e que, em outros casos, os pacientes podem ter sido expostos a uma excessiva concentração de antibióticos, colocando-os, assim, em maior risco de reações adversas (CABRAL et al, 2018). De acordo com o autor com esses resultados, foram sugeridas abordagens individualizadas quanto à dosagem terapêutica e à monitorização de antibióticos, para maximizar a eficácia e minimizar os possíveis riscos. Considerando a variabilidade farmacocinética existente entre indivíduos, uma abordagem mais personalizada para a administração de antibióticos deve ser adotada, para garantir que as drogas possam atingir seus alvos terapêuticos e tenham a exposição adequada assegurada. A racionalização de antimicrobianos é um componente essencial para uma abordagem multifacetada na prevenção da resistência antimicrobiana. A boa gestão de antimicrobianos envolve a seleção do medicamento apropriado, otimizando sempre sua dose e duração de tratamento, minimizando a toxicidade e as condições para a seleção de cepas bacterianas resistentes, garantindo sucesso terapêutico. 39 Estudos realizados nos últimos anos indicam que o uso de antibióticos é desnecessário ou impróprio em até 50% dos casos nos Estados Unidos, e isso favorece o surgimento de cepas resistentes. Ainda, com a redução