Prévia do material em texto
TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM Unidade 1 Distúrbios e Transtornos Cognitivos e a Inclusão CEO DAVID LIRA STEPHEN BARROS Diretora Editorial ALESSANDRA FERREIRA Gerente Editorial LAURA KRISTINA FRANCO DOS SANTOS Projeto Gráfico TIAGO DA ROCHA Autoria VIRNA MAC CORD CATÃO CAMILA NOGUEIRA BONFIM DUARTE 4 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 A U TO RI A Virna Mac Cord Catão Olá. Sou pedagoga, especialista em Administração Escolar e EAD e mestra em Educação, com mais de 15 anos de experiên- cia técnico-profissional e docente. Passei por instituições educa- cionais públicas e privadas. Já atuei como docente na Educação Básica (Prefeitura do Rio de Janeiro, Colégio Pedro II etc.), prin- cipalmente em turmas de alfabetização e classes de progressão, inserindo-me em diversos contextos de aprendizagem, como tam- bém na Educação Superior (UNIABEU, UFRRJ etc.). Na área técnica, já fui pedagoga do CAP UERJ e do IFRJ e supervisora da UNIVESP. Sou apaixonada pelo que faço e adoro transmitir minha experiên- cia de vida àqueles que estão iniciando em suas profissões. Por isso, fui convidada pela Editora Telesapiens a integrar seu elenco de autores independentes. Estou muito feliz em poder ajudar você nesta fase de muito estudo e trabalho. Conte comigo! Camila Nogueira Bonfim Duarte Olá. Sou psicóloga, mestra e doutoranda em psicologia, pela Universidade Federal do Espírito Santo. Atualmente, sou psi- cóloga na Clínica Sophia de Neuropsicologia, conduzindo avalia- ções psicológicas. Minha atuação e experiência acadêmica cen- tram-se na psicologia social e da saúde, com ênfase em temas associados à violência contra a mulher, gênero, masculinidade, adoção e psicologia da gravidez. Minha atuação profissional tem como foco a Política Nacional de Assistência Social e a prática clí- nica de atendimentos e avaliações psicológicas. Sou apaixonado pelo que faço e adoro transmitir minha experiência de vida àque- les que estão iniciando em suas profissões. Por isso, fui convidado pela Editora Telesapiens a integrar seu elenco de autores inde- pendentes. Estou muito feliz em poder ajudar você nesta fase de muito estudo e trabalho. 5TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 ÍC O N ES Esses ícones aparecerão em sua trilha de aprendizagem nos seguintes casos: OBJETIVO No início do desenvolvimento de uma nova competência. DEFINIÇÃO Caso haja a necessidade de apresentar um novo conceito. NOTA Quando são necessárias observações ou complementações. IMPORTANTE Se as observações escritas tiverem que ser priorizadas. EXPLICANDO MELHOR Se algo precisar ser melhor explicado ou detalhado. VOCÊ SABIA? Se existirem curiosidades e indagações lúdicas sobre o tema em estudo. SAIBA MAIS Existência de textos, referências bibliográficas e links para aprofundar seu conhecimento. ACESSE Se for preciso acessar sites para fazer downloads, assistir vídeos, ler textos ou ouvir podcasts. REFLITA Se houver a necessidade de chamar a atenção sobre algo a ser refletido ou discutido. RESUMINDO Quando for preciso fazer um resumo cumulativo das últimas abordagens. ATIVIDADES Quando alguma atividade de autoaprendizagem for aplicada. TESTANDO Quando uma competência é concluída e questões são explicadas. 6 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 SU M Á RI O Distúrbios da aprendizagem .................................................... 9 Aprendizagem e erro ................................................................................ 9 Fracasso da aprendizagem .................................................................... 11 O erro na aprendizagem ........................................................................ 16 Transtorno, distúrbio e dificuldade de aprendizagem ........ 22 Problemas de aprendizagem ................................................................ 22 Dificuldade de aprendizagem ............................................................... 26 Transtorno específico de aprendizagem .............................................. 30 Características dos distúrbios cognitivos e comportamentais .. 37 Dificuldades x transtornos de aprendizagem ....................................... 37 Como identificar uma dificuldade de aprendizagem? ........................ 38 Como identificar um transtorno de aprendizagem? ........................... 41 Dislexia ....................................................................................... 44 Discalculia .................................................................................. 45 Disgrafia ..................................................................................... 46 Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) .. 46 Transtorno Opositor Desafiador (TOD) .................................... 47 Processo inclusivo de pessoas com dificuldades de aprendizagem .......................................................................... 49 Inclusão ................................................................................................... 49 Dificuldade de incluir .............................................................................. 52 Dificuldades e distúrbios de aprendizagem x educação especial ....... 55 Escola inclusiva ....................................................................................... 56 Educação inclusiva e legislação ............................................................. 58 7TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 A PR ES EN TA ÇÃ O Você sabia que os transtornos e distúrbios de aprendi- zagem tem sido uma área muito estudada por educadores, pro- fessores e psicólogos, além de profissionais de outras áreas das Ciências Humanas? Isso tem ocorrido devido às transformações e necessidades atuais. Transformações no que diz respeito ao en- tendimento de que as pessoas são diferentes umas das outras, implicando a necessidade de dar voz e vez às pessoas com trans- tornos e distúrbios. Todas as pessoas têm suas potencialidades de forma diferente, e essas diferenças devem ser respeitadas. Mas, para isso, precisamos entender como se processam a vida, o co- nhecimento, e as possibilidades de avanço que as pessoas têm. Precisamos entender, nesta perspectiva, o que é a aprendizagem, como se caracterizam esses transtornos/distúrbios e os princípios de inclusão dessas pessoas na sociedade. Percebeu a importância dessa temática? Ao longo desta unidade letiva, você vai mergulhar neste universo! 8 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 O BJ ET IV O S Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 1. Nosso objetivo é auxiliar você a atingir os seguintes objetivos de aprendizagem até o término desta etapa de estudos: 1. Identificar os processos fundamentais de aprendiza- gem, incluindo as bases neurobiológicas; 2. Diferenciar transtorno, distúrbio e dificuldade de apren - dizagem, com base nas mais recentes classificações e critérios diagnósticos; 3. Caracterizar os distúrbios cognitivos e comportamen- tais, compreendendo suas causas e manifestações; 4. Discernir sobre a importância e as estratégias do pro- cesso de inclusão de pessoas com dificuldades de aprendizagem, utilizando abordagens pedagógicas mo- dernas e tecnologias assistivas. Então? Preparado para uma viagem sem volta rumo ao co- nhecimento? Ao trabalho! 9TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Distúrbios da aprendizagem OBJETIVO Ao término deste capítulo, você será capaz de en- tender como ocorre a aprendizagem e as caracte- rísticas e diferenças entre dificuldades, distúrbios e transtornos da aprendizagem. Isso será fun- damental para o exercício de sua profissão, seja como professor ou em outra área que estuda a neuroeducação como possibilidade de intervir em processos de aprendizagem. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então, vamos lá. Avante!ou outro transtorno de aprendizagem, com vistas ao seu pleno de- senvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, com auxílio das redes de proteção social existentes no território, de natureza go- vernamental ou não governamental. (BRASIL, 2021, on-line, grifos das autoras) A legislação específica determina que a promoção do tratamento e acompanhamento de crianças com transtornos de aprendizagem devem ser realizados e garantidos não apenas pelo 59TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 poder público, mas também pela escola, pelas unidades da rede de saúde, professores e até pela própria família, que devem cami- nhar em conjunto para que a criança desenvolva o seu processo de aprendizagem de maneira satisfatória. O art. 3º da lei em estudo é fundamental para esclarecer a quem ela se dirige, assim como definir os seus principais direitos. Art. 3º Educandos com dislexia, TDAH ou ou- tro transtorno de aprendizagem que apresen- tam alterações no desenvolvimento da leitu- ra e da escrita, ou instabilidade na atenção, que repercutam na aprendizagem devem ter assegurado o acompanhamento específico direcionado à sua dificuldade, da forma mais precoce possível, pelos seus educadores no âmbito da escola na qual estão matriculados e podem contar com apoio e orientação da área de saúde, de assistência social e de ou- tras políticas públicas existentes no território. (BRASIL, 2021, on-line) Fica claro também que o apoio para esses alunos é garan- tido não apenas dentro da escola, mas também nas redes de saú- de e assistência social que estejam disponíveis, como forma de realmente abraçá-los e proporcionar o máximo de apoio possível ao seu desenvolvimento. Direito este que também se encontra ga- rantido no art. 4º, que determina que as “Necessidades específicas no desenvolvimento do educando serão atendidas pelos profissio- nais da rede de ensino em parceria com profissionais da rede de saúde” (Brasil, 2021, on-line). 60 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Imagem 1.24 – Criança com déficit de atenção Fonte: Freepik. VOCÊ SABIA? Em 2022, a Comissão de Direitos Humanos e Legis- lação Participativa (CDH) aprovou um projeto de lei oferecido pelo Senado Federal, o PL n.º 5.185/2019, que prevê e garante atendimento especializado e individual a alunos que possuam diagnóstico de transtorno de aprendizagem, de forma a se pro- mover o seu desenvolvimento neurológico ade- quado, além de garantir o atendimento integral desde a educação básica ao ensino superior, am- pliando a gama de direitos assegurados pela Lei n.º 14.254/2021. Outro ponto destacado pela Lei n.º 14.254/2021 é que esta trata diretamente da obrigação que as escolas têm de garantir que todos os professores tenham acesso à informação, capacitação e todos os recursos possíveis para auxiliar tanto na identificação dos distúrbios de aprendizagem quanto na promoção do acompa- nhamento adequado de aprendizado dos alunos. 61TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Art. 5º No âmbito do programa estabelecido no art. 1º desta Lei, os sistemas de ensino devem garantir aos professores da educação básica amplo acesso à informação, inclusive quanto aos encaminhamentos possíveis para atendimento multissetorial, e formação continuada para capacitá-los à identificação precoce dos sinais relacionados aos transtornos de aprendizagem ou ao TDAH, bem como para o atendimento educacional escolar dos educandos. (Brasil, 2021, on-line) Diante do exposto, o mencionado artigo da Lei n.º 14.254/2021 sublinha uma mudança significativa na educação bá- sica, enfatizando a responsabilidade das escolas em oferecer aos professores os recursos necessários para uma intervenção educa- cional mais eficaz. Ao garantir que os educadores tenham acesso a informações atualizadas e formação continuada, a legislação não apenas promove a detecção precoce de distúrbios de aprendiza- gem e TDAH, mas também reforça a importância de um ambiente de aprendizagem inclusivo e adaptativo. Este enfoque não apenas eleva o padrão educacional, mas também assegura que cada es- tudante, independentemente de suas dificuldades, possa alcançar seu potencial máximo, refletindo um compromisso claro com uma educação verdadeiramente inclusiva e equitativa. RESUMINDO E então? Gostou do que lhe mostramos? Agora, só para termos certeza de que você realmente enten- deu o tema de estudo deste capítulo, vamos resu- mir tudo o que vimos. Você deve ter aprendido que a aprendizagem é um processo inerente a todo ser humano, porém, nem todos têm as mesmas condi- ções de realizá-lo. Por sermos pessoas diferentes, aprendemos de formas diferentes e em tempos di- ferentes, e isso significa que o que aparenta ser uma não aprendizagem pode estar relacionado aos pa- drões estabelecidos de formas e tempos de ensinar. 62 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Também aprendemos que dificuldade de apren- dizagem não é a mesma coisa que distúrbios e transtornos de aprendizagem, e grande parcela da humanidade pode estar sujeita a isso em algum momento, devido ao fato de que essas dificulda- des muitas vezes estão associadas aos fatores ex- ternos. Já os distúrbios e transtornos de aprendiza- gem estão ligados a questões biológicas, indo além de dificuldades comuns e exigindo diagnósticos e intervenções específicas de uma equipe multidisci- plinar. Compreendendo essas questões, entende- mos que o processo de inclusão de pessoas com dificuldades, distúrbios e transtornos de aprendi- zagem é importante, pois a aprendizagem é um dever intrínseco ao direito à educação. 63TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 AZENHA, M. da G. Constitivismo de Piaget a Emilia Frerreiro. São Paulo: Atica, 1998. BRASIL. Lei n.º 14.254, de 30 de novembro de 2021. Dispõe sobre o acompanhamento integral para educandos com dislexia ou Transtorno do Deficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) ou outro transtorno de aprendizagem. Diário Oficial da União. Disponível em: https://www.planalto. gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14254.htm. Acesso em 27 dez. 2022 FREIRE, P. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1996. FURTADO, V. Q. Dificuldades na aprendizagem da escrita: uma intervenção psicopedagógica via jogos de regras. Petrópolis: Vozes, 2008. GLAT, R. (org.). Educação inclusiva: cultura e cotidiano escolar. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2007. SEABRA, A. G. et. all. Escrita em alunos com dificuldades de aprendizagem: Efeito Mateus. Rev. Psicopedagogia. [s.l.], v. 39, n. 120, 2020.p. 332-43. Disponível em: chrome-extension:// efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/http://pepsic.bvsalud.org/ pdf/psicoped/v39n120/04.pdf acesso em: 21 jul. 2024. TULESKI, S. C.; EIDT, N. M. Repensando os distúrbios de aprendizagem a partir da psicologia histórico-cultural. Psicologia em Estudo, v. 12, n. 3, p. 531–540, set. 2007. Disponível em: https://www.scielo.br/j/pe/a/DvMJPRVJ5TpjLcnzhMcBwvt/ abstract/?lang=pt# acesso em: 20 jul. 2024. RE FE RÊ N CI A S art2 Distúrbios da aprendizagem Aprendizagem e erro Fracasso da aprendizagem O erro na aprendizagem Transtorno, distúrbio e dificuldade de aprendizagem Problemas de aprendizagem Dificuldade de aprendizagem Transtorno específico de aprendizagem Características dos distúrbios cognitivos e comportamentais Dificuldades x transtornos de aprendizagem Como identificar uma dificuldade de aprendizagem? Como identificar um transtorno de aprendizagem? Dislexia Discalculia Disgrafia Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) Transtorno Opositor Desafiador (TOD) Processo inclusivo de pessoas com dificuldades de aprendizagem Inclusão Dificuldade de incluir Dificuldades e distúrbios de aprendizagem x educação especial Escola inclusiva Educação inclusiva e legislaçãoAprendizagem e erro Atualmente, o tema “distúrbios de aprendizagem” vem sen- do uma questão muito debatida e que gera preocupações. Perce- be-se que há uma generalização, por partes de algumas pessoas, de que toda dificuldade é um distúrbio. Porém, cumpre enfatizar que o erro faz parte do processo de construção do conhecimento e que nem sempre ele é uma fatalidade para a aprendizagem. Nessa direção, é necessário explicar, primeiramente, que a aprendizagem é o momento de construção, de interação, de me- diação etc. Além disso, o erro faz parte desse processo. Uma difi- culdade de aprendizagem não significa um distúrbio, tampouco um transtorno, sendo estas definições distintas e que precisamos compreender para sabermos como agir, pois é com base nessa distinção que encontraremos possibilidades de ação. Por vezes, apenas adaptações às necessidades da pessoa são suficientes para a promoção da aprendizagem e, caracterizan- do essas questões, abrimos portas para o processo de inclusão de pessoas que aprendem de formas diferentes. 10 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 DEFINIÇÃO Podemos definir a aprendizagem como uma mu- dança de comportamento oriunda de uma expe- riência que pode ocorrer tanto naturalmente, ao nos relacionarmos com o mundo e as pessoas, como intencionalmente, a exemplo do que ocorre no caso de instituições de ensino, cujo objetivo é a promoção da aprendizagem. Imagem 1.1 – Aprendizagem intencional na escola Fonte: Pixabay. Quando não conseguimos aprender na escola, dizemos que houve um “fracasso da aprendizagem”. Esse fracasso da aprendizagem tem diversas causas e uma delas pode ter origem associada aos próprios sistemas de ensino, por não conseguirem compreender nem atender os alunos, às suas alteridades e às suas culturas. Nesse caso, a escola deve estar atenta às diversas formas de manifestação das aprendizagens, uma vez que as pessoas são diferentes e oriundas de espaços e culturas também diferentes. 11TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Nesse processo, existe claramente a possibilidade de ocor- rerem falhas por parte da escola. No entanto, os demais contex- tos em que os alunos estão inseridos interferem em suas apren- dizagens, levando ao fracasso mútuo da absorção de conteúdo do aprendiz e de seu cumprimento enquanto agente educador. Esses fatores, aos quais os alunos estão expostos, podem não ser determinantes – e por muito tempo acreditou-se nisso –, mas são considerados interferências no processo de aprendiza- gem. Alguns exemplos são: o contexto familiar e cultural, as rela- ções sociais, as condições econômicas e políticas etc. Fracasso da aprendizagem O fracasso da aprendizagem não é um objeto de estudo isolado, posto que deve ser lido e compreendido num contexto que envolve pelo menos três dimensões. Imagem 1.2 – As dimensões do fracasso da aprendizagem Filosófica Psicológica Sociológica Dimensões Fonte: Elaborada pela autoria (2024). 12 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 O objetivo não é buscar culpados, isso seria “chover no molhado”. O que queremos é compreender melhor como a apren- dizagem é constituída e, desse modo, pensar em maneiras de in- tervenção para revertermos o quadro de falhas e fracassos em resultados de sucesso. IMPORTANTE Conforme observamos, temos a dimensão psico- lógica, que implica diretamente o entendimento do que é aprendizagem e a sua promoção. Mas o que é aprendizagem? Para melhor compreensão sobre o contexto, tomaremos como referencial as teorias interacionistas, ou melhor, o pensamento piagetiano. Para Piaget, o conhecimento é produzido por meio de uma interação do sujeito com seu meio, a partir de estruturas já exis- tentes. Seguindo esse pensamento, entendemos que a aquisição de conhecimentos depende tanto das estruturas cognitivas do su- jeito como de sua relação com os objetos/meio. Imagem 1.3 – Jean Piaget Fonte: Wikimedia Commons. 13TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 VOCÊ SABIA? Piaget nasceu na Suíça no ano de 1896 e faleceu em 1980. Vindo de uma família culta, Piaget, ain- da muito pequeno, precisamente aos 7 anos, tinha interesse por determinados estudos de ordem científica. Sua formação inicial foi em Biologia, mas também estudou Filosofia e, aos 22 anos, fina- lizou o doutorado em Ciências Naturais e lançou diversos livros, tendo muita influência no campo da Psicologia. Teve preocupações eminentemente epistemológicas, tendo-se dedicado ao estudo de como o ser humano constrói conhecimento. Na verdade, estudando as origens dos seres vivos, por meio dos estudos da ontogênese e filogênese, é que Piaget foi encaminhando suas pesquisas para as características essencialmente humanas. Em sua teoria, Piaget afirma que há dois processos fun- damentais para a organização do pensamento, a assimilação e a acomodação: Dois mecanismos são fundamentais nessa relação: a organização e a adaptação, que constituem as invariantes funcionais de todo ser vivo. Sem organização, não é possível ao ser vivo ter um comportamento finalista, vol- tado para a satisfação de suas necessidades biológicas fundamentais. É a organização que dota o ser vivo da capacidade de ter condutas seletivas, isto é, eficientes do ponto de vista do atendimento das demandas fundamentais à adaptação. A adaptação tem duas faces que estão indisso- luvelmente ligadas: assimilação e acomodação. Em tempo real, numa ação adaptativa, ambas são como faces da mesma moeda, continua- mente interligadas. Apensar desta inter-relação 14 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 no funcionamento, a assimilação e a acomoda- ção são conceitualmente distintas, opostas e complementares. (Azenha, 1998, p. 25) De acordo com Piaget, a inteligência é o mecanismo de adaptação do organismo a uma situação nova e, como tal, implica a construção contínua de novas estruturas. Essa adaptação refe- re-se ao meio exterior. Para ele, os indivíduos se desenvolvem in- telectualmente a partir de exercícios e estímulos oferecidos pelo meio em que vivem. O comportamento de cada um de nós é cons- truído numa interação entre o meio e o indivíduo. Essa teoria é ca- racterizada como interacionista, e afirma que, quanto mais com- plexa for essa interação, mais “inteligente” será o indivíduo. Para Piaget, a estrutura de maturação do indivíduo sofre um processo genético, e a gênese depende de uma estrutura de maturação. Dessa forma, a aprendizagem depende do desenvolvimento. Sua teoria nos mostra que o indivíduo só aprende determinada coisa se estiver preparado para recebê-la. Ou seja, se puder agir sobre o objeto de conhecimento para inseri-los num sistema de relações. Na teoria construtivista, o sujeito aprendente é ativo, ou seja, Piaget parte do fundamento de que há ações “inteligentes” perante o conhecimento. É no relevantamento de hipóteses e na alternância entre erro e acerto, que o sujeito operacionaliza o co- nhecimento. Para ocorrer esse processo, Piaget observou e ponderou a ideia de adaptação do sujeito ao meio, em que essa adaptação é promovida pelo processo de reequilibrações sucessivas. Isso sig- nifica que, ao se deparar com algo desconhecido ou com um novo objeto de conhecimento, tem-se um desordenamento dos esque- mas já internalizados. 15TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Imagem 1.4 – Processo de equilibração ASSIMILAÇÃO (Da experiência à mente) ACOMODAÇÃO (Da mente à experiência) EQUILIBRAÇÃO (Estado de adaptação cada vez mais estável) Fonte: Elaborada pela autoria (2024). É sendo desafiado e estimulado ou buscando preencher alguma lacuna, que o sujeito se “desequilibra” intelectualmente, fica curioso e, por meio de assimilações e acomodações, procura retornar ao equilíbrio. Imagem 1.5 – Escrita Fonte: Freepik. 16 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 No caso da aprendizagem da língua escrita, o pensamento piagetianomuito influenciou o processo de ensino-aprendizagem. Equivocadamente, a influência foi até confundida como método em algumas escolas. O erro na aprendizagem Apesar das ideias construtivistas não serem métodos, elas demonstram algumas questões sobre a aprendizagem da escrita, como o fato de que as manifestações escritas de crianças têm ori- gem na sua relação com o mundo e na estruturação de seu pen- samento. Então, um erro nem sempre é um erro como pensamos, mas, sim, uma hipótese de fato inteligente e elaborada a partir das experiências realizadas. VOCÊ SABIA? O erro muitas vezes é visto no processo de apren- dizagem como algo fatal e um fim em si mesmo. Muitas pessoas dizem que quem erra não sabe, mas será mesmo que não sabe? O erro é parte das ideias elaboradas para se tentar chegar ao acerto. Da mesma forme, o erro pode ser apenas uma difi- culdade que, com a intervenção correta, promove- rá a aprendizagem. Nessa direção, estamos contestando a ideia de que a aprendizagem é algo estático ou que só depende do sujeito apren- diz. Podemos entender que a aprendizagem depende de todos os fatores mencionados, inclusive do respeito a diferentes níveis e formas de aprender. EXEMPLO: Tratando-se da aprendizagem na escola, algo muito polêmico diz respeito à organização em ciclos. O ci- clo não indica aprovação automática, mas, sim, a progres- são continuada da aprendizagem, embora muitos siste- mas e escolas que o implantaram tenham difundido essa 17TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 questão de forma equivocada. Quando falamos em pro- gressão continuada, estamos observando, principalmente no que se refere ao processo de aprendizagem, a ideia de inacabamento, pois não podemos aprisionar a aprendi- zagem dos alunos no ano-calendário. Alguns aprendem a lógica da escrita e sua representação em dois meses, outros em dez meses. Portanto, o respeito aos diferentes ritmos também é um dos princípios fundamentais do ciclo na educação escolar. Imagem 1.6 – O tempo para a aprendizagem Fonte: Pixabay. A aprendizagem é um processo contínuo que ocorre cons- tantemente ao longo da vida, pois sempre estamos aprendendo alguma coisa. Não há um único ritmo de aprendizagem pelo fato de que as pessoas, inseridas em diversos contextos, são diferen- tes e possuem características que as distinguem das outras pes- soas que aprendem, portanto, de formas e em tempos e ritmos também diferentes. 18 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Imagem 1.7 – As pessoas são diferentes Fonte: Freepik. Para que o ato de aprender ocorra no âmbito fisiológico, são necessárias algumas integridades básicas, como as funções psicodinâmicas (ativadas ao internalizarmos as experiências que buscam a assimilação de forma hierárquica), as funções do sis- tema nervoso periférico (responsáveis pelos canais sensoriais da aprendizagem) e funções do sistema nervoso central (armazena- mento, elaboração e processamento). Porém, observaremos me- lhor essas funções mais à frente, quando abordarmos os distúr- bios e transtornos de forma mais específica. Nesse processo de aprender, primeiro ocorre o input, ou seja, a recepção das infor- mações pelos sentidos visual e auditivo em um processo no qual a cognição é ativada a partir dessas informações. Para entender melhor o processo fisiológico da aprendiza- gem, é crucial reconhecer o papel das funções psicodinâmicas, que nos ajudam a assimilar experiências de maneira organizada, das funções do sistema nervoso periférico, que captam informações sensoriais essenciais para o aprendizado, e das funções do siste- ma nervoso central, responsáveis por armazenar e processar es- 19TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 sas informações. Este complexo sistema permite que, inicialmente, ocorra o recebimento de informações (input) por meio dos sentidos, principalmente visual e auditivo. O resultado final deste processo é o output, que manifesta a capacidade de aplicar o conhecimento adquirido em atividades práticas como desenho, leitura, escrita e solução de problemas. Este fluxo integral entre recepção, processa- mento e resposta é fundamental para o ato de aprender. A cognição é responsável pela memorização, densida- de, simultaneidade e sequência das informações, e o output é a resposta devolvida, que é responsável pelos processos motores, como desenhar, ler, escrever e resolver problemas. Outro proces- so importante é a retroalimentação, responsável pela organização de todo o processo e que inclui tarefas como a capacidade de re- petição, o controle e a realização das atividades. Imagem 1.8 – O ciclo da aprendizagem Input Retroalimentação CogniçãoAprendizagem Output Fonte: Elaborada pela autoria (2024). 20 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Alguns elementos podem causar alterações na aprendiza- gem. Como exemplos, temos os fatores orgânicos, o baixo peso ao nascer, as más formações congênitas, a prematuridade, além do fator genético, que é outro elemento que também altera a apren- dizagem. SAIBA MAIS Para aprofundar seus conhecimentos leia o arti- go “Fatores que facilitam e dificultam a aprendi- zagem” de Manoel Messias Gomes que é funda- mental para entender a complexidade dos fatores que influenciam o processo de aprendizagem de alunos, destacando como elementos sociais, eco- nômicos, nutricionais e emocionais afetam tanto positiva quanto negativamente o desempenho es- colar. A leitura proporciona uma visão abrangente das interações entre alunos e professores e do im- pacto dessas dinâmicas na educação, ressaltando a importância de uma abordagem holística e bem informada para melhorar a qualidade do ensino e garantir que todos os alunos tenham igualdade de oportunidades para aprender e se desenvolver em ambientes educacionais. Clique no QR-Code. Enfim, de acordo com este pensamento, entendemos que a aprendizagem de um sujeito não pode ser analisada como um fato isolado, tampouco como incapacidade. Para a análise, é ne- cessária uma abordagem holística, com a finalidade de se com- preender como a aprendizagem ocorre em cada um e como pode ser potencializada. https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/18/14/fatores-que-facilitam-e-dificultam-a-aprendizagem 21TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 RESUMINDO E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos resumir tudo o que vimos. Como você deve perceber, os distúrbios de apren- dizagem estão bastante em pauta, principalmente no sentido de se buscarem formas de remediar tais dificuldades e garantir a aprendizagem real dos alunos. Assim, começamos nossos estudos falando sobre as três dimensões do fracasso de aprendizagem, que são a filosófica, psicológica e a sociológica. Identificando essas dimensões, é pos- sível começar a trabalhar sobre as necessidades do aluno e como agir sobre cada uma delas. Nesse sentido, exploramos um pouco sobre o conheci- mento de Jean Piaget acerca dos mecanismos fun- damentais nos processos de aprendizagem, bem como a sua teoria construtivista, que pode promo- ver um processo de reequilibração sucessiva do conhecimento, relacionada com a assimilação e a acomodação da mente no momento de receber o aprendizado. Assim, conhecendo um pouco sobre todo esse processo e as etapas de aprendizagem (input, cognição, output e retroalimentação), temos em mãos os conhecimentos básicos para seguir com os nossos estudos. Pronto para continuar? Vamos lá! 22 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Transtorno, distúrbio e dificuldade de aprendizagem OBJETIVO Ao fim deste capítulo, você será capaz de diferen- ciar os termos transtorno, distúrbio e dificuldade de aprendizagem, as suas principais características e formas de diferenciação entre cada um desses pontos. Espero que esteja pronto para conhecermais sobre o tema e se capacitar para diferenciar cada um deles, a depender das características bási- cas e do caso concreto. Pronto para começar mais um capítulo? Vamos lá! Problemas de aprendizagem Como vimos até o momento, as discussões sobre as difi- culdades de aprendizagem são bastante presentes em diversos ramos de pesquisa, uma vez que é necessário compreender cada uma dessas dificuldades e encontrar solução para elas, facilitando a aprendizagem de todos e tornando a educação mais acessível e inclusiva. No entanto, muitos mitos e mentiras acabaram se con- fundindo com a realidade sobre o tema de forma que a educação, muitas vezes, acaba sendo cheia de preconceitos e segregação contra os alunos que possuem ritmo de aprendizagem diferente dos demais. É importante termos em mente que a legislação brasilei- ra não classifica os alunos com ritmos de aprendizagem distintos como alunos destinados à Educação Especial, ou seja, tais alunos não possuem direito a ter um atendimento especializado, salas com recursos multifuncionais ou qualquer outra ferramenta des- tinada a alunos-alvo da Educação Especial. 23TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 No entanto, ainda assim, todos aqueles que possuem al- gum problema de aprendizagem precisam de algum tipo de ajuda ou auxílio. Mas, para que isso seja possível, é preciso que se com- preenda, primeiramente, quais as diferenças entre as dificuldades de aprendizagem, os transtornos e os distúrbios de aprendiza- gem. Só assim será possível atender às demandas desses alunos da melhor forma possível. Assim, podemos começar essa parte dos nossos estudos compreendendo que os problemas de apren- dizagem podem ser divididos em dois grupos, os quais podem ser observados na Imagem 1.9. Imagem 1.9 – Grupos de problemas de aprendizagem Distúrbios/Transtornos de Aprendizagem Dificuldades de Aprendizagem Fonte: Elaborada pela autoria (2024). Compreender a origem daquilo que pode ser um proble- ma para um aluno é um dos primeiros passos para entender as ca- racterísticas desse problema e como se pode contorná-lo, garan- tindo planejamento educacional relevante e aprendizado eficaz para todos. A expressão “dificuldade de aprendizagem” possibilita entender e explicar por qual motivo o processo de aprendizagem de uma pessoa não ocorreu devidamente (Seabra et al., 2020). No entanto, existe um problema conceitual anunciado no meio dessa questão, em que a dificuldade é confundida com o distúrbio ou transtorno. 24 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 VOCÊ SABIA? É importante esclarecer a distinção fundamental entre “dificuldades de aprendizagem” e “transtor- no específico de aprendizagem”, conceitos que, se- gundo o DSM-5, possuem definições e implicações distintas e são frequentemente confundidos na educação e na psicologia. Compreender essa dife- rença é essencial para diagnósticos precisos e para a implementação de estratégias de ensino adequa- das, garantindo que as necessidades individuais de cada aluno sejam atendidas de maneira eficaz e empática, evitando intervenções desnecessárias ou inadequadas. O transtorno específico de apren- dizagem, conforme definido no DSM-5, refere-se a dificuldades persistentes e significativas em áreas específicas do aprendizado, como leitura, escrita ou matemática, que não podem ser explicadas por fatores externos como qualidade de ensino, condi- ções sensoriais ou culturais. Imagem 1.10 – Dificuldade de aprendizagem Fonte: Freepik. 25TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 A revisão promovida pela DSM-5 optou por unificação dos termos “distúrbio” e “transtorno” de aprendizagem pelo termo “Transtorno específico de aprendizagem” para padronizar a ter- minologia e reduzir ambiguidades. Com essa unificação, o termo “transtorno” é usado exclusivamente, eliminando o uso de “dis- túrbio” para descrever essas dificuldades. Essa mudança foi feita para alinhar a terminologia com as práticas internacionais e com outros sistemas de classificação. A DSM-5 descreve o Transtorno Específico de Aprendizagem como uma condição neurodesenvol- vimental caracterizada por dificuldades específicas e persistentes em habilidades acadêmicas, englobando assim as dificuldades an- teriormente descritas como “distúrbios de aprendizagem”. Uma pergunta central que deve ser feita antes de definir se determinado caso se trata de uma dificuldade de aprendiza- gem ou de um transtorno específico de aprendizagem, conforme definido pela DSM-5, é: “Por que determinada pessoa não apren- de?”. Esse questionamento nos direciona para uma abordagem in- vestigativa. Precisamos, antes de tudo, observar e dialogar com o indivíduo para identificar pistas sobre sua aprendizagem. A DSM-5 reforça a importância de uma avaliação cuidadosa para distinguir entre dificuldades comuns e um transtorno específico de apren- dizagem, levando em conta fatores como ambiente, histórico de ensino e outras condições neurológicas ou sensoriais. A pesquisa faz parte do cotidiano de quem trabalha com educação e apren- dizagem. Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses que fazeres se encontram um no corpo do outro. Enquanto ensino conti- nuo buscando, reprocurando. Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar, constatan- do, intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não co- 26 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 nheço e comunicar ou anunciar a novidade. (Freire, 1996, p. 32) VOCÊ SABIA? Paulo Freire foi um educador brasileiro de referên- cia no mundo todo. Seu principal questionamento diz respeito ao posicionamento político da educa- ção e seu papel na vida dos alunos. Quando falava de posicionamento político, não se referia à poli- ticagem, mas à capacidade de fazer escolhas, ou melhor, de se posicionar perante o mundo. No li- vro “Pedagogia da Autonomia”, o educador aborda de forma crítica os saberes necessários à prática educativa, entre eles o fato de que “ensinar exige pesquisa”. VOCÊ SABIA? Em alguns casos, não encontraremos respostas, teremos apenas pistas que colaborarão para que encaminhamentos aos especialistas sejam realiza- dos. De qualquer forma, elementos de compreen- são serão incorporados e intervenções possíveis na aprendizagem, realizadas. Porém, nem sempre intervenção significa medicação. Isso ocorre quan- do as mudanças metodológicas por parte dos que ensinam conseguem colaborar para que o aluno chegue ao objetivo proposto, superando as dificul- dades de aprendizagem. Dificuldade de aprendizagem Quando tratamos sobre os problemas de aprendizagem, é comum começarmos falando das dificuldades de aprendiza- gem, já que são as primeiras a serem percebidas, pedagogica- mente falando. A primeira coisa que Seabra et al. (2020) ressaltam acerca das dificuldades de aprendizagem é que estas são dificul- dades pedagógicas por essência e não são uma questão ligada à neurobiologia. 27TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 DEFINIÇÃO A dificuldade de aprendizagem, etimologicamente falando, está associada ao vocábulo “difficultatem”, que significa não conseguir fazer algo, um obstácu- lo, uma barreira que impede que os sujeitos reali- zem e alcancem determinados objetivos. A barrei- ra à qual os indivíduos com déficit de aprendizado estão sujeitos precisa ser descoberta e revelada. Essa barreira ou obstáculo estaria associada às questões internas, como fatores biológicos, ou às questões externas, como fatores sociais. Obter a definição clara é de suma importância para saber se se trata de uma dificuldade, de um distúrbio ou de um transtorno de aprendizagem. Imagem 1.11 – Criança com dificuldade de se concentrar Fonte: Freepik. Todo o processo de inserção da criança dentro da escola, as relações sociais que são forjadas nesse período são novidades para as crianças, de forma que demanda umanova adaptação 28 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 social da criança, principalmente com a quantidade de estímulos que são requeridos. Assim, existe todo um processo de maturação e de desen- volvimento físico e mental pelo qual a criança deve passar (Seabra et al., 2020). Todavia, nem todas as crianças conseguem passar normalmente por essa etapa, ou, até mesmo, passar por tudo isso no mesmo ritmo em que a maioria. Todo esse ambiente, com novas regras, comportamentos e pessoas que estão fora de sua normalidade e rotina familiar, pode acabar fazendo que o aluno não se encaixe como esperado na escolarização, apresentando diversas dificuldades para apren- der e compreender a necessidade da aprendizagem em sua vida. SAIBA MAIS O texto “As dificuldades de aprendizagem e a vul- nerabilidade social” é essencial para entender a complexa relação entre vulnerabilidade social e dificuldades de aprendizagem, destacando como fatores como desigualdade social, condições pre- cárias de vida e fragilização de vínculos afetivos podem influenciar negativamente o rendimento escolar dos alunos. A leitura oferece uma pers- pectiva crítica sobre os desafios enfrentados por estudantes em contextos de vulnerabilidade, en- fatizando a necessidade de abordagens educacio- nais inclusivas e suportes adequados que possam mitigar esses impactos e promover uma educação mais equitativa e eficaz. Clique no QR-Code. https://ojs.brazilianjournals.com.br/ojs/index.php/BRJD/article/view/6243 29TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Além do que já vimos, Seabra et al. (2020) determinam que a dificuldade de aprendizagem está aliada com a multidisciplina- ridade, de forma a deixar claro que existem diversas maneiras de se aprender algo. Entretanto, obstáculos culturais, cognitivos ou mesmo emocionais podem acabar atravessando o caminho do aprendizado e, uma vez diagnosticada a dificuldade, é preciso que o tratamento seja realizado o mais rápido possível. O diagnóstico tardio de uma dificuldade de aprendizagem pode trazer inúmeras consequências a longo prazo. Ressalta-se ainda que, no caso das dificuldades de aprendizagem, é possível que estas sejam tratadas dentro da própria escola, aliando técni- cas de pedagogia e psicologia, naquilo que se entende como trata- mento psicopedagógico. Imagem 1.12 – Criança em tratamento psicopedagógico Fonte: Freepik. 30 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 No geral, as dificuldades de aprendizagem estão relacio- nadas com as chamadas deficiências sensoriais e deficiências in- telectuais, responsáveis por prejudicar e colocar obstáculos nos processos de aprendizagem, como já vimos. Essas dificuldades estão relacionadas com o modo dife- rente com que cada criança aprende, bem como com a necessi- dade constante de estímulos. Além disso, fatores como pressão, problemas familiares, sofrimentos, trocas constantes de escolas, entre outros também podem estar ligados diretamente às dificul- dades de aprendizagem. Uma vez que há o reconhecimento e a identificação do problema, é preciso que haja acompanhamento constante da criança, tanto por profissionais responsáveis quanto pela própria família, para se solucionar o problema. Transtorno específico de aprendizagem O Transtorno específico de aprendizagem é classificado na DSM-5 como uma condição neurodesenvolvimental que envolve dificuldades persistentes e significativas em áreas específicas do aprendizado, como leitura, escrita e matemática. Essas dificulda- des vão além dos problemas acadêmicos comuns e se caracteri- zam pela persistência dos sintomas, mesmo após intervenções apropriadas e suportes educativos. O transtorno é subdividido em três domínios principais: leitura, expressão escrita e matemática, com características que afetam diretamente o desempenho aca- dêmico e as atividades cotidianas. De acordo com a DSM-5, o Transtorno Específico de Apren- dizagem se caracteriza por dificuldades específicas que permane- 31TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 cem por pelo menos seis meses, apesar do uso de intervenções direcionadas. Entre os critérios diagnósticos, destacam-se: • Dificuldade em habilidades acadêmicas - inclui dificuldades significativas com precisão, fluência e compreensão de leitura, erros de ortografia e gramática, e problemas com cálculos matemáticos ou resolução de problemas matemáticos. • Impacto no desempenho acadêmico - o transtorno afeta o desempenho escolar e a execução de tarefas acadêmicas na vida cotidiana, além de estar abaixo do nível esperado para a idade e nível de escolaridade do indivíduo. • Início dos sintomas durante o período escolar - os sintomas podem se manifestar desde os primeiros anos de escolarização, porém, em alguns casos, podem se tornar mais evidentes em estágios avançados, quando a complexidade das demandas aumenta. • Distinção de outras condições - é necessário que as dificuldades observadas não sejam mais bem explicadas por fatores como deficiência intelectual, condições neurológicas, problemas visuais ou auditivos não corrigidos, ou falta de acesso à educação de qualidade. A DSM-5 classifica o TEA em três subtipos, de acordo com a área acadêmica afetada: • Transtorno específico de aprendizagem com prejuízo na leitura - frequentemente associado à dislexia, envolve dificuldades com precisão na leitura, compreensão e fluência. 32 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 • Transtorno específico de aprendizagem com prejuízo na expressão escrita - inclui dificuldades em gramática, ortografia, pontuação e organização de textos. • Transtorno específico de aprendizagem com prejuízo na matemática - associado à discalculia, compreende problemas com cálculos, raciocínio quantitativo e operações matemáticas. Imagem 1.13 – Exemplos de transtornos de aprendizagem Dislexia Discalculia Disortografia Disgrafia Transtorno do Processamento Auditivo Central Transtono de Déficit de Atenção e Hiperatividade Fonte: Elaborada pela autoria com base Seabra et al. (2020) A DSM-5 classifica o transtorno específico de aprendiza- gem em três níveis de severidade: leve, moderado e grave. Cada nível reflete o grau de apoio necessário para que o indivíduo tenha sucesso acadêmico e varia conforme a intensidade das dificulda- des apresentadas: 33TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 • Leve - algumas dificuldades em uma ou duas áreas acadêmicas que podem ser superadas com adaptações em sala de aula; • Moderado - necessidade de suporte especializado e intervenções intensivas para manter o progresso acadêmico; • Grave - dificuldades profundas que requerem suporte individualizado e contínuo ao longo de toda a jornada acadêmica. O diagnóstico do transtorno específico de aprendizagem é fundamental para evitar atrasos acadêmicos e oferecer apoio adequado, prevenindo frustrações e baixa autoestima que pos- sam impactar o desenvolvimento. A intervenção precisa incluir es- tratégias personalizadas, com base nas dificuldades específicas do indivíduo, buscando maximizar seu potencial de aprendizagem. Esse transtorno não implica uma falta de inteligên- cia ou capacidade, mas um padrão de dificuldades que pode ser contornado com suporte educativo e estratégias apropriadas. Quadro 1.1 – Variedades de Transtorno Específico de Aprendizagem Tipo de Transtorno Específico de Aprendizagem Características Principais Transtorno com Prejuízo na Leitura (Dislexia) Dificuldade de decodificação, leitura lenta e com erros, dificuldade de compreensão de texto. Transtorno com Prejuízo na Expressão Escrita (Disgrafia) Problemas de ortografia, dificuldade em gramática e pontuação, organização deficiente de textos. 34 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Transtorno com Prejuízo na Matemática (Discalculia) Dificuldade em operações básicas, problemas comconceitos numéricos e sequências, dificuldade no raciocínio matemático. Fonte: Elaborado pela autoria (2024). Curiosamente, muitas pessoas com transtorno es- pecífico de aprendizagem apresentam habilidades excepcionais em áreas como artes, esportes e pen- samento criativo. Existem muitos casos de figuras proeminentes, como o inventor Thomas Edison e o físico Albert Einstein, que tiveram dificuldades de aprendizagem na escola. Imagem 1.14 – Criança com dislexia, um dos transtornos de aprendizagem Fonte: Freepik. 35TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 A grande questão é que, infelizmente, os cursos e os programas de formação e capacitação de professores não estão adaptados corretamente para lidarem com as questões especiais associadas aos transtornos específicos de aprendizagem que podem se manifestar em sala de aula. Desse modo, torna-se cada vez necessário que outros profissionais também estejam atentos às rotinas das crianças, como uma maneira de melhor acompanhar e auxiliar no diagnóstico dos mais diversos problemas de aprendizagem. A atuação do professor é de extrema necessidade em to- das as fases do processo, já que o seu trabalho impacta direta- mente todo o processo de aprendizagem da criança, sendo ele capaz de facilitar esse processo e usar todas as ferramentas para lidar com as dificuldades dentro da sala de aula. Imagem 1.15 – Atenção especial do professor ao aluno com problemas de aprendizagem Fonte: Freepik. 36 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 RESUMINDO E então? Gostou do que lhe mostramos? Agora, só para termos certeza de que você realmente enten- deu o tema de estudo deste capítulo, vamos re- sumir tudo o que vimos. Você deve ter aprendido sobre transtornos específicos de aprendizagem. Esses conceitos vão ser essenciais para o prosse- guimento dos nossos estudos. Assim, começamos nosso capítulo 2 conhecendo um pouco sobre as dificuldades de aprendizagem, que são proble- mas advindos de forma externa, uma vez que são causados pela falta de amadurecimento físico e mental dentro da nova realidade escolar, na qual a criança não consegue se encaixar. A dificuldade de aprendizagem se diferencia totalmente dos trans- tornos específicos de aprendizagem, que estão li- gados a fatores neurobiológicos e que impactam diretamente o processo de aprendizagem da lei- tura, da escrita e da realização de cálculos. O que interessa sobre o tema é que, independentemente de sua origem, ambos os problemas de aprendiza- gem precisam ser acompanhados e reconhecidos por professores e profissionais especializados, a fim de facilitar a aprendizagem das crianças, assim como reduzir danos e consequências. Conseguiu compreender esses conceitos? Espero que sim, porque estamos prontos para continuar. Você vem comigo? Vamos lá! 37TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Características dos distúrbios cognitivos e comportamentais OBJETIVO Até o final deste capítulo, você será capaz de se aprofundar ainda mais nas diferenças entre as dificuldades de aprendizagem e os transtornos de aprendizagem, principalmente quanto às ca- racterísticas principais aliadas aos distúrbios de aprendizagem. Afinal, é preciso que você saiba identificá-los para, a partir daí, buscar as soluções adequadas para cada um deles. Pronto para come- çar? Então, vamos lá! Dificuldades x transtornos de aprendizagem Reconhecendo o fato de que muitas crianças, durante o período escolar, apresentam limitações em seu processo de aprendizagem, podemos concluir que os fatores internos e exter- nos podem estar diretamente ligados a essas limitações. As dificuldades de aprendizagem estão ligadas, exclusiva- mente, às implicações dos fatores externos. No entanto, quando se trata de casos de distúrbios ou transtornos de aprendizagem, os envolvimentos podem estar ligados a fatores internos, princi- palmente de origem neurológica. De modo geral, os distúrbios de aprendizagem alteram ca- pacidades mais específicas, como o recebimento, o processamen- to, a análise e/ou armazenamento de informações. Nesse caso, por exemplo, é possível relacionar os efeitos à linguagem ou até mesmo à aprendizagem de conhecimentos matemáticos. 38 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Assim, uma vez que temos em mente a diferença entre as dificuldades de aprendizagem e os transtornos ou distúrbios, não é mais possível confundi-los. Além disso, é preciso saber que os tratamentos para ambas as situações são distintos, precisam de atenções e cuidados particulares, de modo que o diagnóstico correto é capaz de trazer inúmeros benefícios à criança, além de garantir que problemas futuros sejam evitados. Como identificar uma dificuldade de aprendizagem? A identificação de uma dificuldade de aprendizagem é essencial para compreender outros problemas de uma criança, uma vez que pode estar ligada a problemas pessoais, familiares, dificuldades de adaptação cultural, social, econômica, entre tantas outros. Sendo assim, uma vez identificada a dificuldade de apren- dizagem, é possível auxiliar a criança na superação de tudo aquilo que está por trás dessa dificuldade. Imagem 1.16 – Características de uma criança com dificuldade de aprendizagem AGITAÇÃO CONSTANTE DIFICULDADE DE CONCENTRAÇÃO FALTA DE INTERESSE Fonte: Elaborada pela autoria com base em Furtado (2008). 39TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Logo, é importante que os pais e professores estejam sem- pre atentos ao comportamento da criança na escola e em sala de aula, a fim de identificar algumas características que se manifes- tam em crianças com dificuldades de aprendizagem. Uma das primeiras características a ser percebida em crianças com dificuldade de aprendizagem são as mudanças de comportamento, em geral relacionadas a um comportamento agitado da criança. Muitas vezes, qualquer problema na criança acaba se manifestando por meio do seu comportamento. Logo, qualquer alteração comportamental deve ser mais bem acompa- nhada, no sentido de auxiliar a criança em tudo o que for possível para superar seus problemas. SAIBA MAIS O artigo denominado “Aprendizagem e suas impli- cações no processo educativo” é fundamental para quem busca compreender as múltiplas dimensões que influenciam o processo de aprendizagem, incluindo aspectos emocionais, neurológicos, re- lacionais e ambientais. Ao destacar como esses fatores interagem com as estruturas mentais e o ambiente cultural, o texto oferece insights valiosos sobre como essas interações moldam a percepção e o comportamento do aprendiz, contribuindo pa- ra uma abordagem mais holística e efetiva no cam- po educativo. Clique no QR-Code. O emocional da criança pode acabar se manifestando por meio de agitação, já que esta não possui a maturidade adequada https://www.revista.ueg.br/index.php/icone/article/view/5100/3367 40 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 para compreender seus sentimentos e lidar com as implicações destes. Assim, as mudanças de comportamento da criança podem ser um dos primeiros sinais relacionados com uma dificuldade de aprendizagem. Além disso, as mudanças comportamentais po- dem se manifestar de diversas formas, por exemplo: • Negativa em realizar atividades que antes gostava de fazer; • Comportamento agressivo com os pais ou na escola; • Indisciplina; • Agitação frequente; • Problemas em se relacionar com amigos e colegas na escola; • Entre outros. A próxima característica de uma criança que enfrenta di- ficuldade de aprendizagem são os problemas de concentração. Uma vez que a criança está passando por outros problemas, inde- pendentemente da origem destes, é importante ter em mente que estes podem se manifestar por meio da dificuldade em se concen- trar durante as aulas ou a realização de suas atividades. A dificuldade de concentração está fortemente ligada ao comportamento agitado da criança. Alémdisso, quando a mente da criança está cheia de outros assuntos, é ainda mais complicado focar assuntos da escola e outras atividades cotidianas. Por fim, a manifestação constante de falta de interesse por seus estudos, é uma das principais características de uma criança com tais difi- culdades. Assim, é comum o desinteresse em frequentar a escola, participar das aulas e das atividades cotidianas, realizar suas tare- fas, entre muitas outras atividades. 41TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Imagem 1.17 – Criança com dificuldade de concentração Fonte: Freepik. Assim, há também a dificuldade em se encaixar entre seus colegas e professores, queixas frequentes sobre o ambiente es- colar, entre outros comportamentos que levam, inclusive, a crian- ça a inventar mentiras para se esquivar de suas obrigações. Há a ausência constante de motivação e uma constante repetição de erros e de comportamentos. Como identificar um transtorno de aprendizagem? Como estamos aprendendo desde o começo, os transtor- nos de aprendizagem são aqueles diretamente ligados a distúr- bios e problemas neurobiológicos, pouco tendo ligação com mo- tivações do ambiente externo, mas também se manifestando por meio deste e trazendo consequências para a vivência da criança com outros colegas e com o ambiente escolar. 42 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Em geral, os transtornos de aprendizagem estão ligados a três pilares básicos da educação acadêmica, os quais podemos verificar na Imagem 1.18. Imagem 1.18 – Pilares educacionais ligados aos transtornos de aprendizagem Escrita Leitura Matemática Fonte: Elaborada pela autoria com base em Seabra et al. (2020). Seabra et al. (2020) destacam que, comumente, esses pro- blemas se manifestam no início da educação escolar e podem tra- zer diversas complicações na trilha de aprendizagem, acarretando prejuízos no desempenho escolar e, até mesmo, deficiências com origens sensoriais e intelectuais. As intervenções nos casos de distúrbios de aprendizagem são de extrema importância, já que, quanto mais cedo forem des- cobertas, mais rápido haverá melhores resultados no desempe- nho acadêmico da criança. De acordo com Furtado (2008), uma criança com distúrbio de aprendizagem tem algumas características peculiares, como: • Discrepância manifestada entre o potencial intelectual esperado e o nível real de realização da aprendizagem na escola. 43TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 • Desordenamento básico do processo de aprendizagem, manifestado em situações como quando o indivíduo não consegue organizar fatos em sequência lógica. • Apresentação ou não de disfunção do sistema nervoso central, que é responsável pela linguagem, estruturação do pensamento etc. • Não apresentação de vestígios de debilidade mental, de privação cultural, de perturbação emocional ou de privação sensorial (visual ou auditiva). • Amostras de dificuldades de percepção, disparidades comportamentais e problemas no processamento da informação. Furtado (2008), fazendo menção ao National Joint Commit- tee of Learning Disabilities, resume o conceito de distúrbios de aprendizagem com a seguinte afirmação: Distúrbios de aprendizagem é um termo ge- ral que se refere a um grupo heterogêneo de desordens manifestadas por dificuldades significativas na aquisição e utilização da com- preensão auditiva, da fala, da leitura, da esco- la e do raciocínio matemático. Tais desordens, consideradas intrínsecas ao indivíduo, presu- mindo-se que sejam devidas a uma disfunção do sistema nervoso central, podem ocorrer durante toda a vida. (Furtado, 2008 p. 16) Os distúrbios ou transtornos, por terem origens biológicas e/ou fisiológicas, necessitam da avaliação de uma equipe multi- profissional constituída por médicos, pedagogos, psicopedagogos, fonoaudiólogos, psicólogos, entre outros profissionais, que, jun- tos, irão analisar as condições de aprendizagem dos sujeitos. 44 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Imagem 1.19 – Criança com dificuldade na leitura e escrita Fonte: Freepik. Para que possamos compreender efetivamente os trans- tornos de aprendizagem e suas principais características, iremos começar a explorar alguns dos principais distúrbios manifestados nas crianças. Assim, você será capaz de identificar corretamente esses tipos de transtornos e oferecer ajuda com real efetividade. Conheceremos um pouco sobre: • Dislexia; • Discalculia; • Disgrafia; • Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH); • Transtorno Opositor Desafiador (TOD). Dislexia A dislexia é a dificuldade que o aluno demonstra no apren- dizado da leitura e da escrita. Nesse caso específico, a criança pos- sui problemas na identificação e no relacionamento de sons que possuem fonética semelhante. Assim, tanto na escrita quanto na leitura, o aluno pode trocar letras que parecem ser semelhantes, por exemplo, as letras p, d, q e b (Seabra et al., 2020). 45TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 No caso da dislexia, esta pode se manifestar em três for- mas distintas, quais sejam: • Visual – demonstração de dificuldade em perceber e discriminar letras, podendo estar relacionada a proble- mas visuais, de maneira que é essencial o uso de recur- sos pedagógicos auditivos para auxiliar o aprendizado da criança. • Auditiva – dificuldade da criança em relacionar o som de uma palavra ou letra (fonema) à sua forma escrita (grafe- ma). Pode ser decorrente de problema auditivo, de modo que o seu auxílio pode ser realizado com recursos peda- gógicos visuais. • Mista – dificuldade que une tanto problemas visuais quan- to auditivos, de forma que o trabalho pedagógico deve se adequar à realidade da criança e buscar alternativas peda- gógicas efetivas no caso concreto, como o uso de leitura de lábios ou traçados utilizando os dedos da criança. Discalculia Em geral, a discalculia está ligada à dislexia, no entanto, nesse caso, diferentemente da dificuldade na escrita ou leitura, a criança manifesta dificuldade no desenvolvimento de habilidades matemáticas (Seabra et al., 2020). Aqui é possível observar uma criança com problemas em identificar números, sua ordem, que possuem valor maior ou me- nor em comparação a outros, assim como no sentido de realizar operações matemáticas, independentemente de sua dificuldade. Esse caso também traz como característica a ausência de com- preensão da criança quanto a questões com problemas matemá- ticos, de maneira que existe também um problema de interpreta- ção, confusão de símbolos e até mesmo problemas de memória. 46 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Disgrafia Seabra et al. (2020) falam que, comumente, esse a disgra- fia pode ser chamada de “letra feia”, ou seja, está relacionada à dificuldade da criança em escrever. As características básicas des- se tipo de distúrbio é o uso de força na hora da escrita, de forma a marcar ou rasgar o papel; utilização de grafias diferentes para uma mesma palavra ou mesma letra; realização de fragmentações incorretas de algumas palavras, entre outros. Nesses casos, a dis- grafia pode se manifestar de forma: • Espacial – ligada a recursos visuais e, em geral, mani- festa-se com problemas na compreensão de espaços, dificuldade na escrita em linha reta, problemas para realizar desenhos e pinturas. • Motora – ausência de controle muscular nas mãos e no punho, o que dificulta a escrita e a caligrafia adequadas. • Processamento/disléxica – ocorre quando a criança possui dificuldade para escrever algumas letras de ma- neira adequada ou possui uma caligrafia malformada. Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) Um dos mais comuns e mais discutidos distúrbios de aprendizagem é, sem dúvidas, o TDAH, ou Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade. Além disso, é um transtorno de difícil diagnóstico e bastante controverso, já que podeser confundido com diversos outros transtornos ou, até mesmo, com uma sim- ples dificuldade de aprendizagem. Suas principais características estão relacionadas a com- portamentos inadequados, problemas sociais, comportamentos impulsivos e personalidade hiperativa, além de, na maioria dos 47TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 casos, haver bastante dificuldade de concentração e de manter a atenção e o foco em uma única atividade. Seabra et al. (2020) afirmam que o TDAH é mais comumen- te identificado em meninos e, quando manifestado em meninas, apresenta características diferentes. Crianças do sexo masculino acabam se demonstrando mais agressivas e barulhentas, enquan- to as do sexo feminino se mostram mais silenciosas e retraídas. Transtorno Opositor Desafiador (TOD) Assim como acontece no TDAH, o TOD, Transtorno Opo- sitor Desafiador, é controverso e possui diagnóstico complicado, uma vez que também pode se assimilar a outros distúrbios ou di- ficuldades de aprendizagem, trazendo inúmeros problemas para a criança e para todo o seu processo de aprendizagem. Imagem 1.20 – TDAH Fonte: Freepik. As principais características de uma criança portadora de TOD são os seus comportamentos bastante desafiadores, geral- mente irresponsáveis e impensados. São alunos que demonstram agressividade e dificuldade para reconhecer seus erros, suas emo- 48 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 ções, são bastante oscilantes e possuem comportamento irritadi- ço e vingativo (Seabra et al., 2020). Outros pontos que merecem observação são comportamentos cruéis com outras crianças ou animais, destruição de pertences próprios ou de colegas da esco- la, constantes crises de desobediência e condutas relacionadas a roubos, por exemplo. RESUMINDO E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente entendeu o tema de estudo deste ca- pítulo, vamos resumir tudo o que vimos. Você deve ter aprendido as principais características atreladas aos transtornos de aprendizagem. Conhecer as principais características de cada um deles é fundamental para os profissionais que trabalham na área pedagógica, uma vez que a identificação precoce desses problemas, as- sim como o início do tratamento o mais rápido possível vão ser importantes para que as consequências desses problemas sejam revertidas, assim como seus efeitos sejam reduzidos ao máximo. Pudemos ver que, em ge- ral, as dificuldades de aprendizagem podem se revelar no comportamento agitado de uma criança, dificulda- des de concentração e falta de interesse do aluno. Por outro lado, as características atreladas a crianças porta- doras de distúrbios de aprendizagem vão depender de cada caso concreto e de cada um dos distúrbios. Assim, pudemos conhecer alguns deles, como dislexia, discal- culia, disgrafia e os transtornos de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) e o Opositor Desafiador (TOD). Lembrando que estes dois últimos são bastante con- troversos e podem ser confundidos com outros trans- tornos e dificuldades. Espero que você tenha acompa- nhado nossos estudos até o momento, pois, em breve, iremos conhecer mais sobre cada um desses transtor- nos e seus impactos na aprendizagem das crianças. Pronto para continuar? Vamos lá! 49TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Processo inclusivo de pessoas com dificuldades de aprendizagem OBJETIVO Ao final deste capítulo, você será capaz de com- preender como se dá, atualmente, o processo de inclusão de crianças com distúrbios e transtornos de aprendizagem dentro das salas de aula. Além disso, irá conhecer também as legislações atuais que versam sobre o tema e tratam do processo inclusivo e os direitos das crianças que possuem qualquer forma de distúrbio de aprendizagem. Pronto para os novos conhecimentos que vêm por aí? Espero que sim. Vamos lá! Inclusão A inclusão está diretamente ligada ao ato de trazer para dentro de um grupo aqueles que estão fora dele, mas não de qual- quer forma e sim de maneira que estes se sintam incluídos e parte real do grupo em questão. Quando falamos em inclusão de pessoas com distúrbios de aprendizagem, é preciso ter em mente que esse é um desafio para os educadores, para as instituições e para os próprios sujei- tos. Na verdade, todas as pessoas que são diferentes possuem o desafio de serem incluídas na sociedade e em suas instituições de modo que o acolhimento contemple suas necessidades. A educação é um direito de todos, e a nossa legislação atual afirma que todos devem estar matriculados regularmente no fluxo de ensino. De acordo com essa afirmação, 50 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 a política de educação inclusiva diz respeito à responsabilidade dos governos e dos siste- mas escolares de cada país com a qualificação de todas as crianças e jovens no que se refere aos conteúdos, conceitos, valores e experiên- cias materializados no processo de ensino- -aprendizagem, tendo como pressuposto o reconhecimento das diferenças individuais de qualquer origem. (Glat, 2007, p. 16) VOCÊ SABIA? Quando falamos em educação inclusiva, não pode- mos limitar o discurso e a prática à educação espe- cial, embora o modelo de educação inclusiva tam- bém a englobe. O processo de inclusão, em amplo sentido, simboliza ações para que as pessoas aces- sem ensino adequado, permaneçam em constante aprendizado e obtenham sucesso escolar. Falar de inclusão compreende o fato de que as pessoas são diferentes em diversos aspectos e que a escola deve criar es- tratégias para que o ensino chegue a todos os indivíduos, inde- pendentemente de etnia, cor, gênero, dificuldade, cultura, ritmos de aprendizagem, entre outros fatores. Nesse sentido, é necessário que haja respeito, por parte das escolas, a todos os sujeitos, suas particularidades e seus res- pectivos contextos, além de um olhar sempre atento a cada uma dessas singularidades, para que a proposta apresentada de ensi- nar a todos seja efetivamente cumprida. 51TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Imagem 1.21 – Sala de aula inclusiva Fonte: Freepik. SAIBA MAIS Quer se aprofundar neste tema? Recomendamos a leitura do artigo: “Repensando os distúrbios de aprendizagem a partir da psicologia histórico-cul- tural”, de Tuleski e Eidt (2007). Clique no QR-Code. Antes de adentrarmos no assunto, é preciso termos em mente que o direito de acesso à educação é dado a todo e qual- quer cidadão brasileiro e está previsto na Constituição Federal de 1988. No entanto, efetivar esse direito na prática é um desafio constante, principalmente quando falamos de alunos com dificul- dades e distúrbios de aprendizagem. http://www.scielo.br/pdf/pe/v12n3/v12n3a10 52 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Além dos desafios constantes que os professores enfren- tam no dia a dia da educação, a inclusão de crianças com distúr- bios tem sido um dos mais recorrentes, haja vista a antiga prática de segregação e punição à qual essas crianças são constantemen- te submetidas. Assim, afastar os preconceitos já existentes e adap- tar à realidade escolar para as necessidades individuais consiste em reais desafios para todos. Dificuldade de incluir Não é novidade que a educação brasileira possui padrões inferiores ao esperado, sendo constantemente sucateada pelo Es- tado, assim como colocada em segundo plano recorrentemente. Atualmente, é difícil encontrar escolas públicas com altos padrões, que possam realmente competir com a educação parti- cular. Sendo assim, essa discrepância é um dos primeiros proble- mas a serem considerados quando se trata de inclusão. Afinal, se as crianças típicas já encontram dificuldades de possuir um ensino adequado e regular, o que podemos dizer das crianças atípicas e que possuem qualquer transtorno de aprendizagem? Faltam recursos nas escolas, assim como faltam profissio- nais realmentecapacitados para lidarem com cada uma das difi- culdades e distúrbios de aprendizagem, uma vez que a universi- dade, no geral, falha nesse tipo de capacitação. Assim, tanto os novos professores quanto os mais antigos acabam precisando aprender apenas na prática a lidar com os desafios dos distúrbios de aprendizagem. 53TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 SAIBA MAIS Para aprofundar seus conhecimentos lei o artigo denominado como “Dificuldades no processo de inclusão escolar: percepções de professores e de alunos com deficiência visual em escolas públicas”, o qual é essencial para educadores, formuladores de políticas e demais interessados na inclusão edu- cacional, pois destaca os desafios enfrentados por alunos com deficiência visual e seus professores no contexto das escolas regulares. Ao apresentar dados concretos e experiências reais coletadas em um estudo de caso, o artigo oferece uma visão profunda das barreiras que impedem a efetivação das políticas públicas de inclusão, sugerindo a ne- cessidade de melhorias na infraestrutura física e curricular, no acesso a tecnologias assistivas e na formação docente, para assim promover um am- biente de aprendizagem mais acessível e inclusivo. Clique no QR-Code. Infelizmente, a realidade de muitos professores é bastan- te complicada, o que dificulta que estes procurem cursos extras e formações complementares para saber como identificar e lidar tanto com os distúrbios quanto com as dificuldades de aprendiza- gem. O cenário mais comum a ser observado é o de professores não capacitados lidando com crianças que realmente precisam de ajuda. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-711X2015000100010 54 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 IMPORTANTE Mais um problema que podemos destacar é o fato de que a identificação de um transtorno ou distúr- bio pode ser lenta. Logo, o seu acompanhamento e tratamento também acabam sendo prejudicados, uma vez que o diagnóstico tardio pode trazer con- sequências irreversíveis ao processo de aprendiza- gem da criança. Destacamos também que a falta de informação é outro fa- tor bastante relevante quando tratamos dos distúrbios de apren- dizagem, pois vivemos em uma população bastante preconceituo- sa e mal informada, de forma que muitos pais e responsáveis, ao serem alertados pelos professores e pedagogos que trabalham com seus filhos, acabam entrando em estado de negação, recu- sando-se a aceitarem que suas crianças possuam algum problema de aprendizagem. Imagem 1.22 – Recepção de diagnóstico pelos pais Fonte: Freepik. 55TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 A negação da família quanto ao diagnóstico da criança é realmente um obstáculo para a inclusão dessa criança, principal- mente de forma psicológica, já que será tratada de maneira igual às crianças típicas. Desse modo, o reconhecimento de suas difi- culdades e problemas de aprendizagem pode levar a criança a se cobrar ainda mais, a se comparar com os outros e se a desmotivar quanto ao processo de aprendizagem, achando que não é capaz de desenvolver uma habilidade que realmente não será desenvol- vida naturalmente, já que é preciso que haja tratamento e acom- panhamento adequado. Para as famílias, receber o diagnóstico de uma criança não é fácil. Porém, é preciso ter em mente que, quanto mais rápido o diagnóstico for realizado, mais rápido será possível iniciar o trata- mento e o acompanhamento profissional adequado, minimizando os problemas trazidos pelos distúrbios e proporcionando a real inclusão da criança no ambiente escolar. Dificuldades e distúrbios de aprendizagem x educação especial Antes de estudarmos as condutas adequadas para o trata- mento e a inclusão de crianças com distúrbios de aprendizagem, cumpre ressaltar que muito se cogitou incorporar essas crianças aos programas e serviços de educação especial. Todavia, as leis atuais que versam sobre a educação especial tratam da inclusão apenas de pessoas com deficiências físicas, sensoriais, motoras ou cognitivas, deixando de fora aquelas que não manifestam tais deficiências. Assim, fica claro que as autoridades brasileiras decidiram seguir com a ideia de desvincular as pessoas com deficiência da- quelas que possuem distúrbios de aprendizagem. Entretanto, não 56 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 foi considerado que este segundo grupo também possui dificulda- des e obstáculos em seu processo de aprendizagem, de modo que também necessitam de atenção especial e de recursos pedagógi- cos diferenciados dos alunos típicos. É preciso ter em mente que designar um aluno para a edu- cação especial não é limitá-lo ou rotulá-lo, mas, sim, dar a ele a chance de superar as barreiras e os obstáculos que o distúrbio de aprendizagem lhe impõe, de forma a observar suas necessidades e auxiliá-lo a aprender de acordo com o seu próprio ritmo. Escola inclusiva Ao adotar o título de “escola inclusiva”, é importante com- preender que os profissionais que nela atuam devem ter o trei- namento adequado para compreender e auxiliar o ritmo de cada aluno em seu processo de aprendizagem real, respeitando e tra- balhando cada uma de suas limitações e incentivando-o sempre que possível. A escola precisa oferecer os recursos pedagógicos e didá- ticos necessários para acompanhar o aluno, independentemente de sua dificuldade ou distúrbio de aprendizagem, não permitindo que este seja negligenciado por possuir um tempo de aprendiza- gem diferenciado dos alunos típicos. Assim, tais alunos não podem ser segregados dos demais, mas, sim, devem ser incluídos em todas as atividades, recebendo atenção especial sempre que necessário, para a realização do pro- cesso de aprendizado. 57TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Imagem 1.23 – Adoção de diversos recursos pedagógicos para a realização da aprendizagem Fonte: Freepik. Quando tratamos de dificuldades e transtornos de apren- dizagem, devemos entender que os professores, pedagogos, psicólogos e todos os envolvidos devem fornecer todas as con- dições, recursos e procedimentos pedagógicos necessários, além do atendimento psicológico individual e atenção diferenciada para se compreender a necessidade de cada criança e, assim, poder realmente auxiliá-la. O processo de diagnóstico e identificação de transtornos de aprendizagem deve ser realizado de maneira atenta e por uma equipe multidisciplinar, já que muitos distúrbios possuem caracte- rísticas semelhantes, e a identificação correta é de extrema impor- tância para que os cuidados adequados sejam realizados. Promover a educação especial é essencial para que o alu- no consiga se desenvolver em plenitude e sem quaisquer entraves decorrentes de suas limitações e, principalmente, das limitações impostas pelo sistema de ensino tradicional. 58 TRANSTORNOS E DISTÚRBIOS DA APRENDIZAGEM U ni da de 1 Educação inclusiva e legislação Atualmente, a Lei n.º 14.254/2021 é a lei específica que trata sobre o acompanhamento integral de alunos que possuam dislexia, transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), entre outros distúrbios de aprendizagem. Assim, destacamos que os arts. 1º e 2º da lei em questão determinam que (grifo nosso): Art. 1º O poder público deve desenvolver e manter programa de acompanhamento inte- gral para educandos com dislexia, Transtor- no do Deficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) ou outro transtorno de aprendizagem. Parágrafo único. O acompanhamento integral previsto no caput deste artigo compreende a identificação precoce do transtorno, o enca- minhamento do educando para diagnóstico, o apoio educacional na rede de ensino, bem como o apoio terapêutico especializado na rede de saúde. Art. 2º As escolas da educação básica das re- des pública e privada, com o apoio da família e dos serviços de saúde existentes, devem garantir o cuidado e a proteção ao educando com dislexia, TDAH