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DOCUMENTO FALSO TEXTO

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DOCUMENTO FALSO
Este tema é corriqueiro em concurso público e no exame da Ordem, razão pela qual
achei oportuno escrever um pouco acerca deste assunto. Outro motivo é que muitos colegas
estudantes com quem converso têm certa dificuldade em assimilar a diferença entre falsidade
material e falsidade ideológica.
De início, relembro aos leitores que a falsidade ideológica e a falsidade material
encontram-se amparadas dentro do Título X da Parte Especial do Código Penal, que, por sua
vez, refere-se aos Crimes Contra a Fé Pública.
Crimes Contra a Fé Pública são aqueles que têm como vítima a coletividade e não
necessariamente uma vítima específica, como ocorre, por exemplo, nos crimes contra a vida
ou nos crimes contra o patrimônio. Daí dizer que estes crimes atuam diretamente contra o
Estado, uma vez que a prática desses delitos afeta sobremaneira a confiança das pessoas
(coletividade).
Por seu turno, a Fé Pública quer dizer a confiança que a pessoa deposita em certos
atos, símbolos ou formas em que a lei atribui valor jurídico. É o caso, por exemplo, de uma
testemunha que depõe em juízo, uma moeda de curso legal no país, um documento público
que comprove a propriedade do um bem imóvel, etc. Assim, reforçando o que foi dito no
parágrafo anterior, praticar um crime contra a Fé Pública é colocar em risco a confiança que
sociedade deposita no Estado.
Antes de entrar no mérito da falsidade material e falsidade ideológica, oportuno trazer
a baila a distinção entre as palavras papel público, documento público e documento particular.
Acrescenta-se ainda ao fato de que esta distinção se faz importante até porque a tutela do
papel público é mais severa que a do documento público.
Desse modo, de um lado temos o papel público que quer dizer papel emitido pelo
Poder Público que representa valor de circulação mas que não seja moeda. É o caso, por
exemplo do alvará judicial, selo tributário do cigarro ou da bebida alcoolica, talão da zona
azul para que os carros estacionem nas ruas da cidade de São Paulo e não sejam multados,
etc.
Do outro lado temos o documento público que quer dizer papel público, emitido por
funcionário público no exercício da sua função, escrito, assinado e com conteúdo jurídico.
Por exemplo: CNH, RG, CPF, etc. Há exceção, são os documentos emitidos por particulares
que são equiparados a documentos públicos, a saber: 1) testamento particular, 2) ações de
sociedades comerciais, 3) documentos emanados por entidades paraestatais, 4) livros
mercantis e título de crédito ao portador ou transmitido por endosso.
Por fim, para complementar a explicação o documento particular é aquele emitido
por particular, ou seja, é qualquer documento que não se enquadre na definição de público.
Nesta esteira, oportuno anotar que se for feito um contrato de compra e venda entre
particulares, a priori, trata-se de documento particular, entretanto, a partir do momento que
esse documento é levado em cartório para se reconhecer a firma do comprador e do vendedor,
ele se torna documento público, pois nele haverá a chancela do cartorário dando fé às
assinaturas das partes.
Agora que sabemos o conceito de papel público, documento público e documento
particular, passemos para a próxima etapa, qual seja: aprender sobre falsidade material e
falsidade ideológica.
Para entendermos sobre falsidade material e falsidade ideológica precisamos primeiro
ter em mente o binômio verdade / verdadeiro. Assim, lembrando deste binômio fica muito
fácil distinguir as falsidades.
A falsidade material, está prevista nos artigos 297 e 298 do Código Penal. Ela ocorre
quando alguémimita ou altera documento público ou documento particular verdadeiro.
Vejamos:
Art. 297 - Falsificar, no todo ou em parte, documento
público, ou alterar documento público verdadeiro: [...]
Art. 298 - Falsificar, no todo ou em parte, documento
particular ou alterar documento particular verdadeiro:
[…]
Neste diapasão, se alguém fizer imitação de uma CNH, estaremos diante da falsidade
material. Por quê? Porque a falsidade material ocorre quando alguém imita ou altera
documento verdadeiro. Então, o segredo para identificar a falsidade material é o fato da
imitação / alteração ocorrer em documento verdadeiro. Daí dizer que não importa se os dados
contidos naquele documento verdadeiro são verídicos ou falsos, o que importa é que foi feita
uma imitação / alteração em um documento verdadeiro.
Já a falsidade ideológica está prevista no artigo 299 do Código Penal. Ela ocorre
quando alguémaltera a verdade em documento público ou documento particular verdadeiro.
Vejamos:
Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular,
declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou
fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia
ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar
obrigação ou alterar a verdade sobre fato
juridicamente relevante:
Nesse sentido, está-se diante da falsidade ideológica toda vez que for inserido um
dado falso em documento verdadeiro, ou seja, alterando a verdade em um documento
verdadeiro, ocorre a falsidade ideológica. É o caso, por exemplo, em que Fulano, no
momento de fornecer os dados ao funcionário público para emitir a CNH, informa que tem 18
anos, mas na verdade tem apenas 15 anos. O mesmo ocorre se Fulano alega que não usa
óculos para dirigir, mas na verdade oculta o fato de ter 5 graus de miopia. Assim, em ambas
as hipóteses, o agente forneceu informação falsa de modo a fazer o funcionário público
inseri-las em documento verdadeiro.
Por outro lado, anota-se ainda que se for alterado a verdade em documento falso,
estamos diante da falsidade material, pois o documento falso, neste contexto, passa a ser uma
imitação do verdadeiro. Por fim, relembro uma vez mais que a falsidade ideológica ocorre
apenas quando se altera a verdade em documento público ou particular verdadeiro.
Nesse tocante, se fosse para um perito examinar o documento falsificado acima, a
falsidade ideológica não seria identificada por exame documentoscópio, uma vez que o que
foi alterado não foi o documento verdadeiro, mas a verdade (os dados).
Outro exemplo interessante acerca da falsidade ideológica é o caso em que o condutor
do veículo que cometeu uma infração no trânsito (p.ex.: dirigindo em alta velocidade), recebe
a multa em sua casa e ao invés de preencher com os seus dados nos campos descritos - dados
do infrator -, acaba por inserir os dados de sua esposa, irmão, pai, mãe, etc, em virtude de,
eventualmente, terem menos ponto em carteira. Nesse exemplo o infrator está alterando a
verdade em um documento verdadeiro, daí dizer que se trata de falsidade ideológica.
Insta dizer que há uma exceção a regra descrita sobre a fasidade ideológica. É o caso
da falsidade previdenciária. Ela está prevista no artigo 297, §3° do Código Penal, in verbis:
Nas mesmas penas incorre quem insere ou faz inserir:
I – na folha de pagamento ou em documento de
informações que seja destinado a fazer prova perante a
previdência social, pessoa que não possua a qualidade
de segurado obrigatório; II – na Carteira de Trabalho e
Previdência Social do empregado ou em documento que
deva produzir efeito perante a previdência social,
declaração falsa ou diversa da que deveria ter sido
escrita; III – em documento contábil ou em qualquer
outro documento relacionado com as obrigações da
empresa perante a previdência social, declaração falsa
ou diversa da que deveria ter constado.
Estas inserções do §3° do art. 297 descrevem a falsidade ideológica, ou seja, alteração
da verdade em documento verdadeiro, todavia, o legislador asequiparou a falsidade material
de documento público, tanto é que as deixou no artigo que fala sobre falsidade material.
Portanto, para esses casos de falsidade previdenciária, a falsificação será material em
documento público, embora o conceito seja da falsidade ideológica. Daí, embora seja
contraditório, está na lei e devemos seguí-la..
Por fim, outro exemplo interessante para fixarmos a ideia da falsidade ideológica e da
falsidade material é a falsificação de atestado médico. Se o atestado médico for falsificado
com base no crime previsto no artigo 302 do CP ("Dar o médico, no exercício da sua
profissão, atestado falso"), estamos diante da falsidade ideológica, pois o crime foi cometido
pelo próprio médico, ou seja, o médico inseriu informações falsas em documento verdadeiro
(atestado). Por outro lado, se a secretária dele preenche o atestado para outrem, assinando e
utilizando o carimbo do médico (que contém o CRM), estamos diante de falsidade material,
uma vez que o crime do artigo 302 do CP é um crime de mão própria, ou seja, somente o
médico é quem pode cometê-lo.

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