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* C o n s c i ê n c i a e A u t o c o n h e c i m e n t oo
i - i
~
Jú lio César Coelho de Rose ■ Marina Souto L. Bezerra • Tales Lazarin
“A ciência frequentemente fala sobre coisas que não 
pode ver ou medir” (Skinner, 1969).
“Uma ciência do comportamento não ignora, 
como se d iz frequentemente, a consciência. Pelo 
contrário, ela vai m uito além das psicologias 
mentalistas ao analisar o comportamento auto- 
descritivo. Ela tem sugerido maneiras melhores 
para ensinar o autoconhecimento e também o 
autocontrole, que depende do autoconhecimento” 
(Skinner, 1969).
O que é a consciência? Qual a sua natureza e como ela 
surge? Ela tem um papel relevante em nosso comportamento, 
não só no modo com que agimos, mas também como perce­
bemos e conhecemos o mundo e a nós mesmos? Podemos 
estudá-la cientificamente? Neste capítulo vamos explorar essas 
questões da perspectiva do Behaviorismo Radical, pontuando 
alguns dos argumentos mais importantes para a interpretação 
da consciência e passando também por alguns experimentos 
sugestivos presentes na literatura da Ciência do Comporta­
mento. Mais ao final, abordaremos a questão estreitamente 
relacionada com o autoconhecimento, que é essencial para 
que possamos nos autogerenciar e que, por esse motivo, 
também é um tema central para a psicoterapia.
A consciência é um assunto que tem algumas peculiari­
dades se a compararmos com outros tópicos na história das 
ciências. É, por certo, um assunto pendular, que foi igno­
rado em alguns momentos e muito estudado em outros, 
dependendo, em boa medida, do modo como a psicologia 
científica foi concebida em diversos momentos ao longo
de sua história;1 e, também, muitos autores que escrevem 
sobre o assunto questionam se a “consciência” que inves­
tigam é algo que existe de fato ou se não se trata de uma 
mera ficção ou especulação. Há uma impressionante quan­
tidade de material sobre o assunto nas neurociências e nas 
ciências cognitivas desde a década de 1990 (a “década do 
cérebro”), e o chamado “problema da consciência” é um 
dos mais discutidos na filosofia da mente (um ramo da 
filosofia analítica que se tornou muito próximo das ciên-
'Quando a psicologia se tornou científica’ nas duas últimas décadas do 
século 19, a consciência era seu objeto de estudo por excelência e ela era 
definida como “ciência da mente e da vida mental”, uma concepção em que 
se apoiaram as primeiras tradições dessa nova ciência (como o funcionalismo 
de William James e o estruturalismo psicológico de Edward Titchner). Nos 
primeiros laboratórios de psicologia, a introspecção era estudada de forma 
controlada e sistemática com a ajuda de aparato experimental e registrada 
em forma de relato pelos participantes. Porém, problemas internos a esse 
tipo de abordagem e inconsistências aparentemente inelimináveis nos dados 
(em especial com relação ao estruturalismo) precipitaram a chamada ‘revo­
lução behaviorista’ liderada por Watson a partir de 1913, com a proposta de 
que a psicologia devia estudar o comportamento manifesto (/’. e., reflexo)
- que é observado de forma imediata (i. e., sem recurso a relatos subjetivos) 
e que mostrou produzir dados confiáveis - , negando que a consciência 
pudesse ser estudada cientificamente uma vez que não é algo que possa 
satisfazer o critério de observação intersubjetiva. A situação não foi revertida 
de imediato com a chamada ‘revolução cognitiva’ ocorrida na década de 
1950 com a proposta do modelo computacional da mente, pois computa­
dores digitais são máquinas que executam instruções sequenciais (i. e., de 
forma ‘mecânica’), um passo por vez, e não podem sustentar algo como a 
experiência subjetiva. Assim, a consciência figura mais como uma anomalia 
com relação a tal abordagem, o que gerou um grande interesse recente em 
seu estudo (cf. Giizeldere, 1997, para mais informações históricas e para 
um guia de estudo com relação às pesquisas atuais sobre a consciência). 
Cabe ressaltar, por fim, que Skinner figura mais como uma exceção aos seus 
colegas behavioristas, pois sua proposta de ciência do comportamento abre 
a possibilidade do estudo científico ou da interpretação da consciência a 
partir das descobertas cientificas, assunto sobre o qual versa o presente texto.
Consciência e Autoconhecimento 189
cias cognitivas), sendo que muitas teorias cognitivistas da 
consciência têm sido propostas, embora, até o momento, 
estas sejam mais de natureza especulativa que científica 
propriamente.2
Além disso, a consciência é geralmente considerada, no 
mínimo, como difícil de ser submetida aos métodos de 
investigação empírica de que poderíamos dispor. Afinal, 
a ciência trabalha com aquilo que podemos observar, 
manipular e medir, e podemos fazê-lo, dentro de certos 
limites, com o comportamento e também com o corpo 
dos organismos (p. ex., estudando a sua anatomia e fisio­
logia). No entanto, como poderíamos aplicar tal método 
à consciência (ou a estados de consciência), cuja privaci­
dade parece desafiar o avanço da técnica de instrumen­
tação científica e que talvez nos leve, outra vez, a pensar 
se não há algum problema com nossas concepções sobre 
tal “objeto”?
Esse “mistério” presente na concepção e na investigação 
científica sobre a consciência parece envolvido em ares de 
paradoxo, pois talvez nada nos seja tão familiar; afinal, não 
vivemos todos em um m undo repleto de cores, cheiros 
e sons? É justam ente a existência dessa chamada “vida 
mental” - o modo como as coisas nos aparecem - que é 
intrigante e que permanece como um último desafio às 
tentativas de integrar a psicologia ao retrato do mundo que 
nos é apresentado pelas ciências naturais “duras” (p. ex., 
física, química e biologia). Para a física, a luz é entendida 
como ondas eletromagnéticas de certos comprimentos, 
mas as cores dos objetos que vemos não se parecem em 
nada (ou só de maneira remota) com as propriedades 
físicas da luz refletida por eles. Há, por certo, uma lacuna 
a ser explicada entre os eventos físicos que terminam por 
estimular nossos corpos e a experiência subjetiva corres­
pondente que temos, mas o que causa perplexidade é a
2William Seager (1999), um dos estudiosos da consciência, diz que essa 
coloca um problema que é daquele tipo peculiar que surge na filosofia em 
que uma boa parte dos estudiosos do assunto duvidam da própria existência 
dos ‘objetos’ que estão supostamente criando o problema. Seager (1999) 
também alude a várias teorias cognitivistas propostas para tentar resolver 
o ‘problema da consciência’ (teorias de que não trataremos aqui), mas se 
refere a elas como não científicas, embora tencionem ser compatíveis com 
a ciência futura, pois afirma não haver teorias científicas concebidas até 
agora que se reportem à natureza da consciência em oposição ao seu subs­
trato neural. Isto é, embora atualmente haja uma linha de pesquisa vigorosa 
nas neurociências que busca encontrar correlatos neurais da experiência 
consciente — dentre as quais a hipótese de Crick e Koch (cf. Crick, 1994) 
de que oscilações sincronizadas de pulsos neurais entre 30 e 70 Hz seriam 
uma condição neurobiológica essencial à consciência — não há uma expli­
cação de por que tais correlatos dariam origem à experiência consciente. 
As teorias cognitivistas propostas são tentativas de elucidar a ‘natureza’ da 
consciência, algo que as neurociências têm sido incapazes de suprir.
dificuldade em entender como o retrato físico do mundo 
pode sustentar algo como a experiência subjetiva sem se 
tornar inconsistente - isto é, sem que sejamos obrigados 
a postular a existência de algo que não seja físico para 
realizar essa tarefa.
Além disso, há mais algumas questões intrigantes sobre 
a natureza da consciência e que permanecem em aberto: 
por que, afinal, temos algo como a experiência subje­
tiva em vez de simplesmente nos comportarmos sem que 
nada do tipo ocorra (ou por que nossos comportamentos 
não ocorrem “no escuro”, por assim dizer)? Organismos 
não humanos têm esse tipo de experiência (seessas relações, 
facilitamos a intervenção sobre o que controla nosso
202 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento
comportamento. A partir dos autotatos, podemos cons­
truir regras, as quais podem ser utilizadas para controlar 
o nosso próprio comportamento.
Um a pessoa que tom ou consciência de si por meio 
de perguntas que lhe foram feitas pela comunidade está 
em m elhor posição para prever e controlar seu próprio 
comportamento (Skinner, 1974/1976, p. 35). Como na 
ciência, se conseguirmos descrever, poderemos prever e 
controlar. Se conheço, se tenho consciência de algumas das 
variáveis que controlam meu comportamento de fumar, 
por exemplo, tenho mais chances de modificar essas variá­
veis, estabelecendo o autocontrole. Com o autoconhe­
cimento, o sujeito pode construir autorregras que, por 
sua vez, promovem o autocontrole. No caso do fumante, 
ele pode se tornar consciente de que, sempre que toma 
café, acende um cigarro. A partir desse autoconhecimento, 
ele poderá criar a seguinte autorregra: deixar o maço de 
cigarros guardado quando for tomar café. Esse procedi­
mento diminui a quantidade de cigarros que ele fuma por 
dia, e dizemos, então, que ele adquiriu um certo autocon­
trole sobre seu comportamento de fumar.
Para Micheleto e Sério (1993), a discussão sobre se o 
homem é sujeito ou objeto na psicologia de Skinner9 leva 
à questão do autocontrole e, consequentemente, do auto­
conhecimento, que, segundo as autoras, é sinônimo de 
consciência (p. 19). O argumento é que o homem cons­
ciente seria capaz de planejamento e autogoverno, o que 
o torna sujeito. Nesse momento, ele encontra a possibi­
lidade de arbitrar sobre os seus determinantes, construir 
as próprias regras e segui-las. Skinner (1971, p. 194-195) 
afirma que o autocontrole é um tipo especial de solução 
de problemas. E, mesmo quando os problemas estão no 
m undo privado, é sempre o ambiente que seleciona o 
comportamento que os soluciona.
A partir disso, podemos analisar por que, em épocas 
de regimes políticos totalitários, como o de 1964 a 1984 
no Brasil, ocorrem situações em que certas autoridades 
impedem a divulgação de descrições de fatos sob controle 
dos próprios fatos. Isso prejudica a “consciência de mundo”. 
Um exemplo literário em que a consciência é prejudi­
cada por causa das contingências sociais está presente no 
livro 1984, de George Orwell. Ele conta a história de
9A possibilidade da defesa de um homem-sujeito em contraposição a um 
homem-objeto já havia sido inaugurada com a definição fundamental de 
comportamento operante, como aquele comportamento que age, que opera 
sobre o meio. Como afirma Skinner (1957) na primeira frase do Verbal 
Behavior: “Os homens agem sobre o mundo, e o modificam, e são, por sua 
vez, modificados pelas consequências de suas ações” (p. 1).
um povo que, entre outros acontecimentos, tem a sua 
própria história reinventada por agências governamentais 
de acordo com o benefício que essas alterações proporcio­
narão ao governo. Assim, os cidadãos nunca estão cons­
cientes do que de fato ocorreu no passado e, portanto, não 
podem agir sobre seus próprios determinantes. E preciso 
observar, porém, que a consciência é necessária, mas não 
suficiente para o autocontrole. Existe a possibilidade de 
as variáveis estarem inacessíveis ou de o indivíduo não ter 
repertório suficiente para, mesmo ciente da sua situação, 
gerenciar-se por meio da manipulação das variáveis das 
quais seu com portam ento é função. M uitas vezes, são 
necessárias regras externas, como a de um terapeuta, para 
se estabelecer o autocontrole.
COM PORTAM ENTO 
__________IN C O N SC IEN TE__________
Inicialmente, todos os nossos com portam entos são 
inconscientes. A descrição acontece a posteriori e é, como 
vimos, estabelecida pela comunidade. As contingências são 
efetivas a despeito de se o sujeito as observa e analisa. Por 
isso, todo o comportamento é basicamente inconsciente 
no sentido de que é modelado e m antido pelas contin­
gências. O que nos restaria, então, como problema não 
é o inconsciente, mas sim a consciência (Skinner, 1969). 
Então, esse inconsciente, primeiro, não seria problemático, 
se considerarmos que a comunidade cumprirá seu papel e 
estabelecerá a consciência.
O segundo tipo de comportamento inconsciente que 
pode ser descrito pela análise do comportamento é seme­
lhante ao inconsciente reprimido, conforme encontramos na 
obra de Freud (1888). Ele ocorre basicamente como produto 
de práticas coercitivas, pois o reforço social que estabelece e 
mantém a auto-observação e a descrição pode simplesmente 
não ocorrer ou pode, em alguns casos, ser substituído por 
práticas punitivas, condição que levaria ao seguinte quadro: o 
próprio relato passa a produzir autoestimulação aversiva, que 
é cancelada ou evitada por outros comportamentos. Conse­
quentemente, o relato pode retroceder ao nível privado e 
supomos que pode deixar de ser emitido até mesmo no nível 
privado, e mesmo as respostas de auto-observação podem 
não mais surgir, dependendo da gravidade, do tempo de 
início e da frequência da punição. Nesse caso, é lícito o para­
lelo com o inconsciente recalcado da teoria freudiana.
Conforme vimos, a consciência pode envolver a capa­
cidade de relatar a própria ação ou os sentimentos que a
Consciência e Autoconhecimento 203
antecedem e, em um nível bem mais elaborado e mais 
difícil de atingir, o dar-se conta das razões do próprio 
comportamento. Nesse último caso, Skinner sustentaria, 
como Freud, que os seres humanos frequentemente não 
têm consciência da razão de sua conduta e, comumente, 
admitem razões distorcidas em virtude da repressão ou 
outras formas de controle que têm origem no meio social. 
Skinner (1953, pp. 289- 291) descreve este processo em 
detalhes:
“Punição torna aversivos os estímulos gerados 
pelo próprio comportamento. Qualquer compor­
tamento que reduza tal estimulação é reforçado 
automaticamente. Entre os tipos de com porta­
mento que mais provavelmente geram estímulos 
aversivos condicionados como resultado de pu­
nição está o com portam ento de observar o ato 
punido ou de observar a ocasião para este ato ou 
qualquer tendência para executá-lo. Como resul­
tado de punição, não apenas nos engajamos em 
outro comportamento que exclui as formas pu­
nidas, nos engajamos em outro comportamento 
que exclui o conhecimento do comportamento 
punido ( ...) . Isto pode começar simplesmente 
como ‘não gostar de pensar’ no comportamento 
que levou às consequências aversivas. Pode, então, 
passar para o estágio de não pensar nele e, final­
mente, atingir o ponto no qual o indivíduo nega 
ter se comportado de determinada maneira diante 
de prova do contrário.”
Grande parte das práticas culturais se fundamenta no 
controle aversivo. Skinner (1969) explicita que algumas 
das contingências culturais mais poderosas para provocar 
consciência envolvem punição, como quando se culpa 
alguém por ter feito algo. Como resultado, comportamento 
similar ou que tenha consequências similares pode causar 
estímulos aversivos condicionados, possivelmente sentidos 
como culpa ou vergonha. Isso pode impedir que a pessoa 
“adquira” consciência, isto é, pode impedir que ela desenvolva 
repertório de auto-observação e de autodescrição, conforme 
esperamos ter elucidado ao longo deste capítulo.
A U T O C O N H E C IM E N T O E 
__________ PSICOTERAPIA__________
É possível que a comunidade não tenha estabelecido 
as contingências necessárias para produzir autoconheci­
mento. É possível também que práticas coercitivas tenham 
eliminado o autoconhecimento em alguns aspectos. Nos 
dois casos, por falta de repertório de autoconhecimento, o 
indivíduo não consegue criar autorregras em determinadas 
situações e, por isso, não consegue estabelecer o autocon­
trole. Nesses casos, ele poderá buscar ajuda na terapia.
Alguns clientes dizem ao terapeuta que não têm muitos 
problemas, mas que pretendem “se conhecer melhor”. Isso 
pode significar queo seu déficit em relação ao autoconhe­
cimento é de tal magnitude que ele nem mesmo discrimina 
por que procurou terapia, ou seja, mesmo as respostas de 
auto-observação foram suprimidas por práticas coercitivas 
ou nunca estabelecidas. Em geral, podemos supor que 
há algum sofrimento, alguma situação na vida do cliente 
que lhe é aversiva. Ir à terapia é um modo de fuga ou de 
esquiva. Também é possível que o cliente que afirma não 
ter problemas e que seu objetivo é se conhecer melhor pode 
ser capaz de dizer por que procurou terapia, mas não o 
faz ao terapeuta. Neste caso, existem as respostas de auto- 
observação, mas o autotato foi suprimido provavelmente 
tam bém por um histórico de controle aversivo, coerci­
tivo. Então, dizemos que o cliente pode estar inconsciente 
em dois sentidos: no primeiro, as contingências estabele­
cidas por sua comunidade verbal foram insuficientes para 
estabelecer repertório de autoconhecimento; no segundo, 
contingências aversivas estabeleceram a diminuição de 
repertórios autodescritivos e até mesmo de respostas de 
auto-observação (este seria o inconsciente reprimido).
E coerente supor que o objetivo da terapia é o auto­
conhecimento? Em parte, sim (de Rose, 2001). Conside­
rando que o autoconhecimento habilita o sujeito a analisar 
as relações funcionais dos próprios comportam entos e, 
a partir disso, construir autorregras que proporcionem 
maiores efetividade e contato com consequências reforça­
doras, é possível afirmar que um dos principais objetivos 
da psicoterapia é estabelecer um repertório de autoconhe­
cimento no cliente.
De acordo com Skinner (1989, p. 46), a psicoterapia é 
um espaço para aumentar a auto-observação, para “trazer 
à consciência” aquilo que é feito e suas razões. Isso ocorre 
porque, durante a terapia, o cliente é solicitado a falar 
sobre o que está fazendo e por que o faz. Com o indi­
cado, o reforço contingente a respostas de autodescrição 
aumenta, consequentemente, a probabilidade de emissão 
de respostas de auto-observação. Q uando o terapeuta 
reforça as descrições do cliente a respeito de seus compor­
tamentos, respostas de auto-observação, necessárias e ante­
riores à descrição, também são fortalecidas. Como resul-
204 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento
tado do processo terapêutico, o cliente pode se tornar cons­
ciente de determinados aspectos de sua vida por ter sido 
exposto a contingências que produziram discriminações 
em relação ao seu próprio repertório de comportamentos, 
aos seus eventos privados e à relação estabelecida entre esses 
comportamentos, sentimentos, sensações e o meio.
U m aspecto im portante a ser considerado na terapia 
é o fato de que, muitas vezes, diz-se que o cliente não 
está preparado para ter consciência de determinados 
eventos de sua vida. Isso quer dizer que, se o terapeuta 
“der consciência”, ou seja, descrever os comportamentos 
do cliente e suas relações funcionais, ou mesmo levar 
o cliente a se auto-observar, mas não selecionar outro 
repertório para o cliente lidar com isso, o cliente pode 
entrar em desamparo. Como exemplo simples, podemos 
imaginar um cliente inserido em um a comunidade que 
pune pessoas com determinada orientação afetiva e que o 
cliente é uma dessas pessoas. Podemos supor que ele pode 
não estar consciente de sua orientação afetiva por causa 
do histórico de punição, que teve como consequência que 
qualquer com portam ento em direção a essa orientação 
afetiva causava autoestimulação aversiva condicionada, 
cuja retirada reforçava negativamente comportamentos 
incompatíveis com essa orientação. O terapeuta pode ser 
capaz de descrever esses fatos e suas análises. Se o terapeuta 
apressadamente apresentasse, direta ou indiretam ente 
(neste caso, modelando repertório de auto-observação), 
ao cliente que sua orientação afetiva não está de acordo 
com a orientação valorizada na comunidade, poderíamos 
supor que: ou o cliente negaria veementemente o fato, 
caso não tivesse nenhum repertório de auto-observação 
em relação a isso; ou o cliente entraria em desamparo, 
pois ele não teria repertório adequado de esquiva de tal 
situação aversiva. Aliás, esse é um dos principais motivos 
de ele procurar terapia.
Nesse caso, o terapeuta pode, então, estabelecer regras 
para o cliente de modo que ele entre em contato com 
contingências que estabeleçam a auto-observação em 
determinadas situações e a autodescrição (mais próxima 
possível do tato puro). Além disso, o terapeuta pode agir 
como um a com unidade verbal não punitiva, de modo 
que os comportamentos de descrever do cliente, a partir 
daquelas auto-observações, possam surgir aos poucos. Os 
reforçadores fornecidos pelo terapeuta precisam ser os 
mais generalizados possível, para que o relato do cliente 
fique sob controle do Sd exclusivamente. De acordo com 
Skinner, a psicoterapia é um a agência de controle cuja 
prática principal é funcionar como audiência não punitiva,
fazendo com que os comportamentos do cliente punidos 
pela comunidade possam emergir (Skinner, 1953) e, não 
sendo punidos, que se estabeleçam as condições para que 
a análise funcional seja feita.
Assim, quando o cliente começar a descrever seus 
comportamentos e as relações funcionais que eles estabe­
lecem, ou seja, começar a ter consciência de que não está 
de acordo com a orientação afetiva mais valorizada social­
mente, o terapeuta precisa manter esses relatos por meio de 
reforçadores sociais generalizados. Podemos imaginar que 
o cliente evolui bastante na terapia e já consegue descrever 
grande parte daquilo que antes estava “reprimido”. Um 
passo adiante e bastante complexo seria: como estabelecer 
um novo repertório social fora da sessão? Como se esquivar 
das punições da com unidade verbal? Tal análise já está 
além do escopo do presente capítulo.
Resta ainda uma importante questão: e o autoconheci­
mento do terapeuta? O terapeuta precisa fazer terapia? O 
terapeuta consciente seria aquele que consegue identificar 
o que sente pelo cliente e pela sua problemática e por que 
o sente. Sabe ainda como se comporta e por que o faz, em 
função de sua história de contingências, estando, assim, 
mais bem preparado para conduzir a relação terapêutica 
do que outro com pouco autoconhecimento.
Considerando que a situação terapêutica é composta 
basicamente por episódios verbais, nos quais terapeuta e 
cliente alternam papéis de falante e ouvinte, no sentido 
de que um provê estímulos para o outro, os quais cons- 
troem a interação, a função desses estímulos pode variar 
enormemente de acordo com a história de contingências 
de cada um dos participantes dessa interação. Por isso, o 
autoconhecimento é importante enquanto repertório do 
próprio terapeuta, pois possibilita que ele analise essas 
funções na interação, por meio da auto-observação, mane­
jando os estímulos de modo mais eficiente.
O u seja, o terapeuta precisa estar consciente, precisa 
ser capaz de descrever as funções que os estímulos forne­
cidos por cliente e terapeuta apresentam na interação em 
situação terapêutica. Nesse sentido, parte desse repertório 
refere-se ao autoconhecimento: o terapeuta saber quais 
funções que determinados estímulos têm para ele próprio. 
De acordo com Vandenberghe (2008), os sentimentos e as 
reações do terapeuta na sessão podem conter importantes 
dicas a respeito das contingências que operam nessa relação 
com o cliente. E o terapeuta precisa comparar essas contin­
gências com aquelas que ocorrem na vida do cliente fora da 
sessão. Nesse sentido, o papel do terapeuta é realizar uma 
análise funcional e não necessariamente topográfica.
Consciência e Autoconhecimento 205
O terapeuta autoconsciente saberá discriminar entre 
as funções que determinadas ações do cliente têm em sua 
comunidade verbal de origem e na comunidade verbal 
que é o próprio terapeuta. Suponhamos outro exemplo: 
o cliente m antém um relacionamento afetivo extracon­
jugal e procurou a terapia por causa de desentendimentosconstantes com a pessoa com a qual mantém esse relacio­
namento. Suponhamos também que, na história de vida 
do terapeuta, o fato de alguém ter amante é severamente 
punido. Se o terapeuta não tem repertório de autoconheci­
mento em relação a isso, ele pode, por exemplo, trabalhar 
com a hipótese de que o cliente está infeliz por ter uma 
amante e não pelas características específicas do relacio­
namento com essa amante (considerando que com outra 
amante ele poderia não ter problemas).
CONCLUSÃO
Tradicionalmente, a consciência é entendida como a 
experiência subjetiva que temos a partir de nosso contato 
com o mundo, cuja ocorrência requer um mundo mental 
de dimensões não físicas e que pode ser acessada direta­
mente e estudada por meio da introspecção. No entanto, 
pela interpretação comportamental que apresentamos, o 
que é percebido em uma introspecção não é a mente ou 
um a coisa mental, mas o próprio corpo do observador 
(incluindo os estímulos produzidos de m aneira auto­
m ática por seu próprio com portam ento), e o conheci­
m ento obtido dessa m aneira talvez não seja confiável, 
pois os procedim entos de ensino de discriminação de 
eventos privados de que as comunidades dispõem não 
são tão precisos como se poderia desejar. O chamado 
“conteúdo consciente” também pode ser entendido em 
termos de controle de estímulo e estudado em labora­
tório por meio de experimentos de discriminação, muito 
embora o cientista só tenha acesso ao com portam ento 
do organismo e não às suas experiências subjetivas dire­
tam ente (i. e., o cientista do com portam ento não tem 
como saber que houve uma discriminação até que o orga­
nismo se comporte de maneira diferencial com relação 
ao estímulo discriminado).
O com portam ento é, em boa m edida, incons­
ciente, porque não podemos nos observar e descrever 
sem pre que nos com portam os, e tam bém porque as 
contingências de reforço a que estam os subm etidos 
continuam sendo efetivas mesmo quando não temos 
conhecim ento delas. N ão precisamos estar conscientes
das causas de nossas ações para que essas causas sejam 
efetivas (Skinner, 1971, p. 193). De acordo com o autor 
(Skinner, 1959/1972, p. 247):
“Começamos por atribuir os comportamentos do 
indivíduo a eventos na sua história genética e am­
biental. Então notamos que, por causa de certas 
práticas culturais, o indivíduo pode vir a descre­
ver alguns desses comportamentos e algumas de 
suas relações causais. Podemos dizer que ele está 
consciente das partes que ele consegue descrever 
e inconsciente do resto.”
Para que haja com portam ento consciente, porém, é 
preciso que exista uma comunidade verbal que estabeleça 
os repertórios especiais de auto-observação e de autodes- 
crição, porque as situações naturais em que esses compor­
tamentos são reforçados são raras. Uma pessoa geralmente 
aprende a se discriminar respondendo a perguntas que 
os membros da comunidade fazem sobre ela mesma, e o 
controle que a estimulação originada no corpo da própria 
pessoa exerce sobre seu comportamento descritivo torna­
se mais acurado conforme as consequências são aplicadas 
contingentemente (como em qualquer discriminação). A 
privacidade dos eventos relatados é uma dificuldade a ser 
contornada nesse processo e impõe limites para o conhe­
cimento obtido dessa maneira, tanto para a comunidade 
como para a própria pessoa. Assim, a comunidade ensina 
o indivíduo a falar de coisas às quais ele mesmo não tem 
acesso, o que diminui sobremaneira a precisão do relato.
Por fim, um outro tipo de autoconhecimento (distinto 
da autodiscriminação) surge quando a pessoa adquire 
repertório verbal, pois então o que ela faz pode ser descrito 
por ela mesma e pelos outros; e esses relatos podem ser 
facilmente transformados em regras que, empregadas 
como antecedentes, servem para dirigir seu com por­
tam ento em situações novas (em que o indivíduo tem 
pouca ou nenhum a exposição a contingências similares) e 
melhorar suas habilidades de autogerenciamento — o que 
tem grande campo de aplicação nos assuntos humanos. 
Afirmamos que a consciência é requisito para o autocon­
trole, fundam ental para a autodeterm inação em vários 
aspectos, conforme analisado neste capítulo: em relação à 
política, à ciência, à psicoterapia e a muitos outros. Logo, 
para termos uma política promissora, uma ciência eficaz 
e uma psicoterapia que se faça desnecessária o mais rápido 
possível (i. e., que leve seu cliente à independência do tera­
peuta), é preciso que se estabeleça um comportamento o 
qual denominamos “consciência”.
206 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento
Ressaltamos ao longo de todo o capítulo o papel da 
comunidade na seleção de repertórios de auto-observação 
e de descrição daquilo que se observa. Nesse sentido, a 
consciência tem origem social. Por isso, diferentes socie­
dades estabelecem consciências diferentes. Segundo 
Skinner (1974/1976, p. 186):
“Diferentes comunidades geram tipos e quantida­
des diferentes de autoconhecimento e diferentes 
maneiras de uma pessoa explicar-se a si mesma e 
aos outros. Algumas produzem a pessoa profunda­
mente introspectiva, introvertida ou voltada para 
dentro; outras produzem o extrovertido sociável. 
Umas produzem as pessoas que só agem após cui­
dadosa consideração das possíveis consequências; 
outras, os tipos imprudentes e impulsivos. Certas 
comunidades produzem pessoas particularmente 
conscientes de suas reações à arte, música ou lite­
ratura; outras, de suas relações com aqueles que as 
cercam. As perguntas feitas pelos psicólogos men- 
talistas e as feitas pelos behavioristas naturalmente 
produzem diferentes espécies de autoconhecimen­
to. As perguntas feitas pelos primeiros acentuam 
como uma pessoa se sente acerca das coisas.”
Considerando o que se discutiu neste capítulo, 
poderíamos então falar em dois tipos de comportamento 
inconsciente na análise do com portam ento. Temos um 
inconsciente inicial, um inconsciente primeiro, pois em 
princípio não descrevemos nada até que sejamos ensi­
nados pela comunidade verbal. Um segundo tipo seria 
o inconsciente reprimido, não descrito por causa de um 
histórico de coerção (controle aversivo: reforço negativo 
e/ou punição).
Além disso, é possível aproximar, de algum modo, 
consciência e liberdade. Vejamos: Skinner definiu 3 
circunstâncias em que dizemos que somos livres (Skinner, 
1968/2003). A primeira diz respeito ao controle por refor­
çamento positivo; quando agimos sob controle de reforça­
mento positivo, agimos com prazer e nos sentimos livres; 
acima de tudo, não nos revoltamos, nem fugimos do 
controle, nem estabelecemos um contra-ataque. O segundo 
tipo de liberdade refere-se à liberdade de consequências 
positivas imediatas que levariam a consequências aversivas 
atrasadas, como o uso de drogas, por exemplo. Um último 
tipo de liberdade analisado pelo autor provém da auto­
confiança. Isso ocorre quando o indivíduo age menos por 
regras estabelecidas por outras pessoas e mais por contin­
gências com relação às coisas. Talvez possamos supor a 
consciência, conforme analisada neste capítulo, sob a inter­
pretação do Behaviorismo Radical, como um quarto tipo 
de liberdade, pelo fato de possibilitar a ação do indivíduo 
sobre os determinantes de seu próprio comportamento.
Vimos como a história de exposição às contingências 
pode alterar o m odo como vemos as coisas e tam bém 
maneiras como o autoconhecim ento pode ser adqui­
rido. Porém, isso ainda não é o fim da discussão sobre a 
consciência, e levantamos algumas questões de início que 
ainda permanecem em aberto (o que é de se esperar, pois 
trata-se de um assunto controverso e bastante estudado 
atualmente). As neurociências certamente devem ter um 
papel im portante na explicação do assunto, até porque 
uma análise comportamental não é capaz de vencer a priva­
cidade da experiência subjetiva - mas tenta lidar com ela 
de maneira indireta tanto conceitualmente (em que regula- 
ridades observadas publicamente são extrapoladasao nível 
privado) como experimentalmente (por meio de experi­
mentos de discriminação como os citados) — e resta esperar 
que o avanço das técnicas de instrumentação neurofisioló- 
gica possam progredir e fornecer novas pistas sobre essas 
ocorrências privadas. A história ambiental também tem 
um papel nessa explicação, o que coloca a interpretação 
comportamental que apresentamos como uma proposta 
viável do estudo científico de ao menos alguns aspectos da 
consciência, e com perspectivas promissoras, com destaque 
para as aplicações práticas imediatas a assuntos relacio­
nados com a questão do autoconhecimento.
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poderíamos saber disso, e em que ponto da taxonomia os 
seres vivos tornaram-se conscientes)? E, por fim, a experi­
ência subjetiva tem algum papel funcional (ou causai) na 
determinação da conduta ou ela é um mero epifenômeno
- como a som bra que nos segue ou a fumaça emitida 
pela chaminé de uma locomotiva, que apenas acompanha 
nossas ações sem influenciá-las de fato?3
O que o Behaviorismo Radical tem a dizer sobre o 
assunto? Ao contrário do Behaviorismo Metodológico ou 
outras concepções de Behaviorismo (que aceitam o critério 
de intersubjetividade), o Behaviorismo Radical não nega 
que seja possível o estudo científico da consciência ou de 
outros fenômenos ditos “mentais” ou “subjetivos” porque 
é apenas a própria pessoa que os tem, mas propõe uma 
reinterpretação dos fenômenos psicológicos a partir das 
descobertas da ciência do comportamento. O que cuida­
remos de mostrar neste capítulo é como a consciência pode 
ser interpretada de maneira comportamental e, embora 
uma definição mais adequada deva esperar até que as ideias 
principais tenham sido apresentadas, podemos adiantar 
desde já que o com portam ento verbal tem um papel 
central nessa interpretação - algo que talvez fosse insus­
peito, haja vista nossa discussão até o momento.
No que se segue, tentaremos esclarecer, principalmente, 
a interpretação comportamental dada por Skinner (1969, 
1974 e em diversas passagens) à consciência, e que ainda 
hoje é aquela adotada por cientistas e analistas do compor­
tamento. Também vamos apresentar alguns relatos expe­
3William James (1890) deve ter sido o primeiro a argumentar que a 
consciência deve ter consequências benéficas, pois, se não fosse efetiva 
nesse sentido, ela não poderia ser submetida à seleção natural, uma vez que 
tê-la não seria uma vantagem evolutiva - e então podemos pensar que nossa 
espécie tornou-se (e permaneceu) consciente por um acidente fortuito no 
curso da sua evolução. Como veremos, Skinner (1969, 1974) entende a 
consciência como um tipo de comportamento que requer educação e que 
se reverte, em última análise, em melhores chances de sobrevivência para 
as comunidades que tornam seus membros conscientes.
190 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento
rimentais e discutir sobre a aplicação desse conhecimento 
à psicoterapia. Iniciaremos discorrendo brevemente a 
respeito da possibilidade do estudo dos eventos privados 
pela ciência do comportamento, já que a questão da priva­
cidade da experiência consciente é uma de suas caracterís­
ticas mais problemáticas.
_______ EVENTOS PRIVADOS_______
Podemos pensar, inicialmente, que os eventos privados, 
em geral, e a consciência, em particular, realmente são um 
grande desafio para o Behaviorismo Radical. Afinal, como 
poderia uma ciência cuja proposta é observar o compor­
tamento manifesto e as condições em que ele ocorre - e, 
a partir disso, encontrar regularidades que serão expressas 
como leis ou princípios do com portam ento dos orga­
nismos - lidar com esses eventos inacessíveis e que parecem 
pressupor um m undo mental? Para responder a essa inda­
gação, vamos discorrer, agora, a respeito do tratamento 
que Skinner (1969, 1974) dá aos eventos privados e, em 
seguida, sobre a natureza do “conteúdo consciente” (ou 
seja, sobre o modo como as coisas nos aparecem em nossa 
experiência subjetiva).
Primeiramente, é preciso considerar que Skinner 
(1945/1972; cf. Capítulo 1 deste livro para mais detalhes), 
ao formular o Behaviorismo Radical, abandona o critério 
de verdade por concordância adotado pelos behavioristas 
metodológicos, critério esse que tem como consequência 
a recusa do estudo científico da experiência subjetiva, uma 
vez que essa é inacessível a observadores independentes. 
Colocando de outra maneira, a classe de fenômenos natu­
rais que chamamos de “privados” ou “subjetivos” é excluída 
da investigação científica de maneira categórica porque 
conflita com tal concepção de ciência, e que Skinner 
termina por rejeitar, uma vez que essa consequência nao 
lhe parece razoável. Skinner afirma (1974, p. 21):
“Uma pequena parte do universo está encerrada 
dentro da pele de cada um de nós. Não há razão 
pela qual ela deveria ter um status físico especial 
porque ela está dentro dessa fronteira, e talvez 
possamos ter um tratamento completo dela pela 
anatomia e fisiologia (...). Nós a sentimos e em 
algum sentido observamos, e poderia parecer tolo 
negar essa fonte de informação só porque não mais 
que uma pessoa pode fazer contato com seu m un­
do interior. Entretanto, nosso comportamento, ao 
fazer esse contato, precisa ser examinado.”
O que Skinner (1969, 1974) pondera é que, por 
um lado, não há razão para excluir os eventos privados 
de consideração científica só porque eles são acessíveis 
apenas para a própria pessoa que os tem e não podem 
ser examinados por observadores independentes (afinal, é 
esse mesmo o significado de “privados”); por outro lado, 
admitir o estudo científico desses eventos não significa 
aceitar que eles tenham um status diferenciado e não sejam 
físicos. Por fim, aquilo que sentimos e que podemos relatar 
não pode ser simplesmente tomado pela ciência como um 
dado confiável, e faz-se necessário um exame conceituai 
rigoroso à luz das descobertas da ciência de m odo que 
possamos entender como esses eventos privados e físicos 
se relacionam com o comportamento.
Skinner, então, recorre à fisiologia para tentar esclarecer 
esse ponto e constata que os eventos que ocorrem no inte­
rior dos nossos corpos são percebidos por meio de sistemas 
perceptivos internos, bastante primitivos se comparados 
ao nosso sistema perceptivo orientado ao exterior (ou 
seja, exteroceptivo, composto pelos chamados “órgãos dos 
sentidos”), e que foram selecionados porque cumprem 
funções biológicas importantes na percepção dos órgãos 
internos, e do equilíbrio, da postura e do movimento (ou 
seja, sistemas interoceptivo e proprioceptivo, respectiva­
mente). Entretanto, com o aparecimento do comporta­
m ento verbal, esses sistemas perceptivos passaram a ser 
empregados com um a função distinta, isto é, as pessoas 
da comunidade passaram a fazer alguns tipos de ques­
tões umas às outras que requeriam um tipo de responder 
ao próprio corpo diferente daquele que acontece normal­
mente. Questões do tipo “você está com fome?” e “onde 
você vai amanhã?”, ou mesmo aquelas mais gerais, como 
“o que vai fazer?” ou “como você se sente?”, são úteis para 
as pessoas da comunidade porque possibilitam antecipar 
o comportamento da pessoa questionada, ou para se obter 
informações sobre algo que não está diretamente acessível 
(p. ex., suas necessidades ou sentim entos...). As pessoas 
a quem são feitas essas questões são levadas a discriminar 
seus estados internos, pois dessa maneira elas podem 
responder de maneira razoavelmente adequada e então 
ser reforçadas (ou corrigidas) pela comunidade de modo 
contingente.
Assim, embora as sensações corporais nos acompa­
nhem desde sempre, Skinner (1945/1972, 1969, 1974) 
observa que é somente com a ajuda da comunidade verbal 
que essas sensações tornam-se discriminativas para nós. 
Aqui, o autor inverte uma tese bastante difundida — de 
que temos conhecimento privilegiado e imediato daquilo
Consciência e Autoconhecimento 191
que ocorre em nossos corpos e em nossa consciência. De 
fato, temos um contato bastante íntimo com a estimulação 
privada, que nao é diretamente acessível às outras pessoas 
e que sempre nos acompanha (p. ex., podemos “fugir” do 
dentista, mas não da dor de dente ...). Mas, se não fosse 
por intermédio dos membros da comunidade verbal em 
que estamos inseridos, certamente seriam muito raras as 
ocasiões em que discriminaríamos nossos próprios estados 
corporais, pois é por intermédio da com unidade que 
nossos relatos a respeito de nossos estados corporais (ou 
seja, privados) podem ser reforçados de maneira contin­
gente. Esse tipo de autoconhecimento tem, pois, origem 
social— o que também ocorre com a consciência.4
No entanto, embora seja a comunidade verbal a respon­
sável por nos ensinar a discriminar e a nomear nossas 
sensações corporais — que passamos a chamar então de 
“sentimentos” (p. ex., medo, amor, raiva, angústia...), seus 
membros encontram na privacidade dos nossos estados 
corporais uma dificuldade considerável, uma vez que não 
têm acesso direto à “ocasião” em que nosso comportamento 
deve ser reforçado de contingentemente. Esse problema, 
não obstante, pode ser superado em uma medida razoável 
com a ajuda de certos indícios de que um evento privado 
ocorreu (p. ex., se uma criança cai, se machuca e começa 
a chorar, esses são indícios de que ela está sentindo dor, e 
a comunidade pode então modelar seu comportamento 
verbal de acordo).
Entretanto, a com unidade nunca consegue ser tão 
precisa nesse ensino como poderia ocorrer com o ensino 
dos eventos públicos, e isso resulta em uma imprecisão ou 
vagueza inerente aos relatos que emitimos sobre a ocor­
rência de eventos privados - o que é sempre um problema 
com relação à confiabilidade desses dados se tentarmos 
usá-los, por exemplo, para realizar investigações científicas. 
Ademais, os membros da comunidade geralmente recebem 
relatos de eventos privados com uma certa desconfiança, 
ainda mais quando tais relatos intermedeiam recompensas 
ou a suspensão de condições aversivas (p. ex., “estou com 
dor de cabeça e não posso continuar trabalhando ...”). 
Para o próprio indivíduo, a consequência é que seu auto­
conhecimento é incompleto ou inadequado e ele encontra 
limitações para se gerenciar de maneira eficiente.
4Sobre o autoconhecimento, Skinner diz: “O autoconhecimento tem 
origem social, e ele é útil primeiro à comunidade que faz as questões. 
Depois, ele se torna importante para a própria pessoa - por exemplo, em 
se gerenciar ou controlar...” (Skinner, 1974, p. 169).
De acordo com a interpretação comportamental, então, 
tomar os eventos privados como objeto de estudo científico 
não significa assumir um compromisso com um mundo 
não físico da vida mental; mas ainda é preciso esclarecer 
sobre o assunto do conteúdo consciente, cuja privacidade 
impõe questionamentos similares.
C O N TEÚ D O CO NSCIENTE
Tradicionalmente, quando se fala em conteúdo cons­
ciente, entende-se uma espécie de “recorte” em que algum 
aspecto momentâneo no correr de nossa experiência subje­
tiva é enfatizado ou examinado — como quando vemos o 
vermelho de uma maçã, temos uma dor de dente ou expe­
rimentamos um sentimento de angústia. Sobre as dificul­
dades impostas pelo assunto a uma interpretação compor­
tamental, Skinner (1974, p. 72) comenta:
“Talvez o problema mais difícil enfrentado pelo 
behaviorismo tenha sido o tratamento do conteú­
do consciente. Nós não somos todos familiares 
com cores, sons, gostos e cheiros que não têm 
contrapartes no mundo físico? Qual é o seu lugar 
em um tratamento behaviorista [radical]? Creio 
que a resposta deve ser encontrada no papel es­
pecial designado aos estímulos em um a análise 
operante.”
O problema do conteúdo consciente é difícil porque 
experiências como as citadas não têm contrapartes no 
m undo físico (p. ex., um comprimento de onda eletro­
magnética tem propriedades distintas das cores como essas 
nos aparecem) e, por serem privadas, não só tornam a 
investigação científica difícil, como parecem pressupor 
um mundo mental em que possam ocorrer. Entretanto, 
como nosso autor bem disse, uma interpretação compor­
tamental do assunto deve considerar o papel dos estímulos, 
ou melhor, do controle que esses estímulos exercem sobre 
o comportamento operante, e vamos iniciar a discussão 
com uma breve exposição do assunto (ver Capítulo 2 deste 
livro para maiores detalhes).
Estímulos adquirem certo controle sobre uma resposta 
quando esta é reforçada em sua presença, isto é, respostas 
desse tipo tornam-se mais prováveis de ocorrer quando 
esse estímulo está presente - ou quando o fazem outros 
estímulos que compartilham suas propriedades. Dizemos 
que esses estímulos estabelecem a ocasião ou que se tornam 
discriminativos para a resposta em questão, e tais estímulos 
também podem surgir em conjunto com outras condições
192 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento
motivacionais que influenciam de maneira momentânea a 
probabilidade de emissão, como a privação ou a presença 
de estimulação aversiva.
O controle assim estabelecido pode ser modificado de 
duas maneiras. H á uma generalização quando a resposta 
é emitida em uma condição algo similar àquela em que 
foi reforçada, mas em que apenas algumas das proprie­
dades da ocasião original estão presentes, outras podendo 
diferir. Porém, se a resposta for consistentemente reforçada 
quando apenas uma propriedade particular estiver presente, 
essa última termina por ganhar controle exclusivo por um 
processo chamado de discriminação, e o comportamento 
pode ficar sob controle de variações muito sutis da proprie­
dade envolvida por meio desse procedimento. Skinner 
(1974, p. 74) afirma que o papel do estímulo dá ao compor­
tamento operante um caráter especial, uma vez que:
“O comportamento não é dominado pela situação 
(.setting) atual, como parece ser na psicologia do 
tipo estímulo-resposta... Não obstante, a história 
ambiental ainda está no controle; a dotação gené­
tica da espécie juntamente com as contingências às 
quais o indivíduo foi exposto ainda determinam 
o que ele irá perceber.”
Assim, aquilo que percebemos depende do controle que os 
estímulos da situação exercem sobre nosso comportamento 
subsequente — e tal controle não determina completamente a 
ocorrência desse comportamento, mas torna sua ocorrência 
mais provável. O controle exercido pelos estímulos em uma 
situação atual depende das contingências de reforço a que 
fomos expostos em nossa história passada e isso só é possível, 
em última análise, porque nossa espécie tornou-se sensível a 
essas contingências no decorrer de sua evolução.
Até aqui temos uma explicação de como nosso compor­
tamento fica sob controle de estímulos que se encontram ao 
nosso redor e de como esse controle pode tornar-se muito 
preciso por intermédio de procedimentos de discriminação, 
mas ainda falta explicar o que ocorre com relação a compor­
tamentos como imaginação, alucinação, ou mesmo sonhos, 
casos em que temos percepções, mas aquilo que é percebido 
não está presente em nosso ambiente imediato. Ademais, 
não são justamente esses os casos mais problemáticos e que 
reforçam a ideia de que é necessário um mundo mental? 
Psicólogos e filósofos mentalistas certamente concordariam 
e também parecem ter uma resposta pronta para explicar os 
fenômenos em questão, e que é a seguinte.
A chamada “teoria da cópia”, concebida inicialmente 
pelos filósofos gregos, foi sendo reformulada ao longo da
história e chegou até nós, sendo aquela que é adotada, em 
linhas gerais, pelos psicólogos cognitivistas.5 De acordo 
com ela, quando percebemos o mundo, fazemos cópias 
internas que ficam guardadas e que depois podem ser vistas 
novamente quando queremos ver uma coisa percebida 
anteriormente, mas que, por conta das circunstâncias, está 
inacessível para observarmos no m omento. Essa teoria 
foi formulada para dar conta não somente das imagens 
lembradas, mas também da imaginação e da alucinação, 
de modo que características das cópias que temos podem 
ser recombinadas para formar algo novo. (Não é difícil 
perceber que uma teoria desse tipo se ajusta muito bem à 
linguagem da informática, em que termos como armaze­
namento e recuperação de informações são corriqueiros, 
e é um dos motivos pelos quais a analogia entre mentes e 
programas computacionais tornou-se popular.)
Algumas críticas podem ser feitas a essa teoria. Primei­
ramente, é preciso explicar como o m undo é copiado ou 
armazenado nos organismos e como essas cópias podem 
ser recuperadas depois para que possamos observá-las, e é 
para isso que as metáforas são empregadas.Porém, talvez 
não exista qualquer suporte empírico a essas metáforas 
ou talvez elas possam ser refutadas pelas evidências cien­
tíficas de que dispomos, devendo então ser substituídas 
por outras. A posição de Skinner (1974) em favor de 
um a análise operante é que, em bora sejamos estim u­
lados pelos objetos de nosso am biente próximo, esses 
não são absorvidos ou replicados pelo organismo, mas a 
estimulação passa a controlar o comportamento, como 
acabamos de ver.6
5No diálogo Teeteto, Platão (2001) emprega metáforas para ilustrar o 
processo de aquisição do conhecimento e sua lembrança ou esquecimento. 
Primeiramente, supõe que o funcionamento mental seja como um bloqueto 
de cera quente em que os objetos que percebemos são estampados. Assim, 
o filósofo podia explicar a nossa lembrança desses objetos como um novq 
exame das imagens criadas, e seu esquecimento quando a estampagem 
fosse defeituosa ou quando a imagem, posteriormente, se apagasse. Depois, 
postula que a mente seja como um aviário, em que as coisas que conhe­
cemos são como os pássaros aprisionados ali, disponíveis para que possamos 
apanhá-los e inspecioná-los novamente quando necessário. Platão emprega 
essas metáforas apenas para estudo e termina por considerá-las inadequadas 
e rejeitá-las, mas isso não impediu que a mesma ideia de “copiar (ou arma­
zenar) para lembrar” fosse reciclada com o passar do tempo, com o uso de 
novas metáforas para substituir as antigas quando estas acabaram caindo em 
descrédito ou passaram a conflitar com a evidência empírica disponível.
6Skinner (1974, p. 73) diz que “em uma análise operante, e no Beha­
viorismo Radical que é construído a partir dela, o ambiente fica onde 
está e onde sempre esteve — fora do corpo”. Entretanto, é preciso cuidado 
ao interpretar essa passagem, porque nosso autor está, aqui, argumen­
tando contra os psicólogos cognitivistas e a teoria da cópia, e, também, 
principalmente, por conta de que nosso corpo pode nos estimular, de 
modo que serve também de “ambiente”, isto é, essa estimulação pode vir 
a controlar nosso comportamento, o que deve ficar mais claro adiante.
Consciência e Autoconhecimento 193
Em segundo lugar, e mais importante, a teoria da cópia 
não dá conta, por fim, de explicar o comportamento de 
ver. Ora, se o mundo é copiado internamente, o que vemos 
quando olhamos para nossas cópias? Supor que uma nova 
cópia é criada é cair em um regresso infinito, pois cada 
tentativa de ver deveria criar uma cópia a partir de outra 
cópia e assim por diante. Em algum momento, devemos, 
pois, fazer algo além de criar cópias dos estímulos obser­
vados, e isso a teoria da cópia, por si mesma, deixa comple­
tamente sem explicação. Skinner (1974, p. 85-86) afirma 
o seguinte sobre essa discussão:
“Que uma pessoa possa ver coisas quando não há 
nada para ser visto deve ter sido uma forte razão 
por que o m undo da mente foi inventado. Era 
suficientemente difícil imaginar como uma cópia 
do ambiente atual poderia parar dentro da cabe­
ça onde ela poderia ser ‘conhecida’, mas havia ao 
menos um mundo exterior que podia dar conta 
disso. Porém, puras imagens parecem indicar uma 
pura coisa mental. É somente quando nos pergun­
tamos como o mundo ou uma cópia do mundo é 
vista que perdemos o interesse em cópias. Ver não 
requer uma coisa vista.”
Então, embora a teoria da cópia tenha sido concebida para 
explicar como podemos ver quando não há nada para ser 
visto (o que, a princípio, certamente deve ter causado perple­
xidade aos antigos), ela termina por deixar sem explicação 
o próprio comportamento de ver. A respeito desse último 
ponto, Skinner (1974, p. 85) indica uma solução ao afirmar 
que tal comportamento não requer uma coisa vista:
“H á muitas maneiras de fazer um a pessoa ver 
quando não há nada para ser visto, e elas podem 
ser todas analisadas como arranjos de contingên­
cias que fortalecem o comportamento perceptual. 
(...) não há imagens no sentido de cópias priva­
das, há comportamento perceptual.”
Podemos considerar então que, se não há cópias para 
serem vistas dentro dos organismos, aquilo que resta para 
ser visto quando o objeto está ausente é o próprio compor­
tamento de ver. Porém, como isso é possível? Muitas vezes 
o com portam ento de ver é, ele mesmo, reforçador, seja 
porque apreciamos o objeto visto, ou porque ver uma 
situação torna possível, por exemplo, resolvermos um 
problema. Assim, na ausência do objeto visto e com m oti­
vação para vê-lo (i. e., privação ou estimulação aversiva), 
podemos emitir comportamentos para produzir o próprio
objeto ou algo parecido (como ver uma fotografia). Mas, 
como sabemos, podemos ir além e ver o objeto na ausência 
de qualquer estimulação similar em nossas imediações. 
Tal com portam ento é m uito semelhante àquele de ver 
em circunstâncias normais. Ocorre que a privação a que 
estamos submetidos aumenta a probabilidade de emissão 
de um a resposta privada e que causa um a estimulação 
similar à que somos expostos quando vemos o objeto em 
nosso ambiente próximo.
Vamos explicar um pouco mais sobre o tipo de estimu­
lação envolvida. Qualquer comportamento produz estimu­
lação colateral que é produzida automaticamente quando 
emitimos respostas. Essa estimulação é proveniente da alte­
ração a que nossos corpos se submetem e é captada pelos 
sistemas perceptivos de que falamos; a estimulação provocada 
pode ser tanto pública como privada, dependendo da locali­
zação do estímulo (i. e., dentro ou fora da pele). A estimulação 
automática (ou autoestimulação) é importante na interpre­
tação comportamental de vários tipos de comportamentos, 
uma vez que são os estímulos — e não as respostas — que 
controlam o comportamento, isto é, respostas não podem 
controlar respostas subsequentes, a não ser que haja uma 
estimulação intermediária que estabeleça esse controle.
Dessa maneira, quando vemos, na ausência da coisa 
vista, emitimos, por conta da motivação estabelecida ante­
riormente, uma resposta privada que nos estimula auto­
maticamente; e é esse mesmo estímulo privado autopro- 
duzido e similar que observamos sem que a coisa figurada 
esteja presente em nossas imediações. De maneira mais 
técnica, trata-se de um encadeamento em que a resposta 
privada cria a ocasião para a observação por meio de uma 
estimulação produzida automaticamente quando houve a 
ocorrência da primeira.
Discorremos, até o m omento, sobre a interpretação 
comportamental do “conteúdo consciente”, que pode ser 
feita a partir do conceito de controle pelo estímulo. Entre­
tanto, Skinner (1969, 1974) sustenta, ainda, que não é 
a percepção somente — seja essa de eventos privados ou 
públicos — que causa o problema da consciência, mas um 
tipo especial de contingência que nos leva a “ver que estamos 
vendo”, o que é o mesmo que ter consciência de que vemos. 
Ele diz (Skinner, 1969, p. 233, grifos do autor):
“Não é, entretanto, ver (...) que levanta a questão 
da consciência, mas Ver que estamos vendo ( .. .) ’. 
Não há contingências naturais para esse comporta­
mento. Nós aprendemos aver que estamos vendo 
somente porque uma comunidade verbal arranja 
para que o façamos. Nós geralmente adquirimos o
194 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento
comportamento quando estamos sob estimulação 
visual apropriada, mas não segue que a coisa vista 
deva estar presente quando vemos que a estamos 
vendo. As contingências arranjadas pelo ambiente 
verbal podem estabelecer respostas autodescritivas 
que descrevem o comportamento de ver mesmo 
quando a coisa vista não está presente.”
Vamos tentar explicar essa passagem em algum detalhe. 
Percebemos, isto é, somos controlados por estímulos do 
nosso ambiente próximo porque as contingências a que 
fomos expostos em nossa história passada estabeleceram 
esse controle, porém a comunidade verbal faz perguntas 
sobre nós mesmos e que estabelecem a ocasião em que a 
auto-observação será reforçada, uma vez que assim essas 
questões poderão ser respondidas de modosatisfatório. 
Aprendemos, dessa maneira, a relatar eventos privados 
como sentimentos e sensações corporais, ou mesmo aquilo 
que imaginamos e com que sonhamos (nesses últimos 
casos, falamos sobre coisas que percebemos e que não estão 
presentes). No entanto, as contingências continuam a ser 
efetivas mesmo quando não temos conhecimento do que 
fazemos ou estamos impossibilitados de nos observar, e 
essas últimas condições terminam por fazer diferença no 
modo como nos comportamos. Skinner (1974, p. 220, 
grifos nossos) esclarece um pouco mais sobre o ponto ao 
discorrer sobre os sentidos do termo “consciência”:
“N o sentido em que dizemos que um a pessoa 
está consciente de suas circunvizinhanças, ela está 
consciente de estados ou eventos em seu corpo; ele 
está sob seu controle como estímulos. Um boxea­
dor que está ‘inconsciente’ não está respondendo a 
estímulos atuais de dentro ou fora da sua pele (...). 
Uma pessoa se torna consciente em um sentido 
diferente quando uma comunidade verbal arranja 
contingências sob as quais ele não apenas vê um 
objeto, mas vê que o está vendo. Nesse sentido es­
pecial, a consciência (...) é um produto social.”
Aqui, Skinner (1974) distingue dois “sentidos” em que 
poderíamos empregar a palavra “consciência”. O primeiro 
é aquele em que há controle de estímulo envolvido, com 
resultado de que a pessoa ou o organismo se comporta de 
maneira diferencial quando aquele estímulo está presente, 
como vimos. Esse é um sentido mais rudimentar, em que 
o termo é usado para verificar se o organismo comporta-se 
diferencialmente em relação aos estímulos de seu ambiente 
e que não provoca maiores problemas conceituais ou empí­
ricos, uma vez que podemos decidir sobre o estabeleci­
mento desse controle por meio da manipulação dos estí­
mulos em questão.
H á tam bém um segundo sentido, mais elaborado, 
aquele em que estamos interessados. Skinner (1974) 
afirma que uma pessoa está consciente quando “vê que 
está vendo” e, nesse caso, não é apenas o objeto visto que 
controla o comportamento subsequente — como no caso 
anterior —, mas também os estímulos produzidos auto­
maticamente pelo ato de ver. Assim, a pessoa observa e se 
observa ao mesmo tempo, podendo, então, descrever não 
só aquilo que vê, mas também o que ela faz e como se sente 
enquanto vê (daqui por em diante, usaremos a palavra 
“consciência” nesse sentido específico apenas). A diferença 
entre as duas situações fica mais evidente se considerarmos 
que, quando as contingências são efetivas, comportamo- 
nos sob controle dos estímulos da situação mesmo sem 
saber que o fazemos ou estarmos conscientes nesse último 
sentido. Por fim, a consciência é um produto social porque 
as contingências responsáveis pela aquisição e manutenção 
dos comportamentos requeridos de auto-observação e de 
descrição não estão disponíveis no ambiente não social, 
havendo a necessidade de uma comunidade verbal que as 
estabeleça.
Há, ainda, um últim o ponto que é preciso discutir 
antes de passarmos para o assunto seguinte. Tradicional­
mente, um exame mais detido ou sistemático do conteúdo 
consciente é chamado de introspecção, que poderíamos 
entender como um modo de auto-observação cuidadosa e 
dirigida, principalmente, aos nossos eventos privados (em 
uma introspecção, a maior preocupação é com a experi­
ência subjetiva em si e não precisa haver um questiona­
m ento sobre aquilo que a causou). Vimos, no entanto, 
que as questões sobre o conteúdo consciente podem ser 
interpretadas em uma análise comportamental em termos 
do controle que estímulos terminam por adquirir sobre o 
comportamento operante; e que uma pessoa consciente “vê 
que está vendo” - o que certamente ocorre em uma intros­
pecção, pois se trata de um exame cuidadoso da própria 
experiência subjetiva. Por fim, o comportamento descritivo 
também tem um papel importante no processo, uma vez 
que podemos empregar os relatos assim obtidos para guiar 
o processo de auto-observação e também para comparti­
lhar com os outros as experiências vividas (investigaremos 
o papel desse tipo de comportamento mais adiante).
Contudo, existe um problema com a introspecção que 
é algo típico dos eventos privados e sobre o qual já discor­
remos. As contingências de reforçamento arranjadas pela
Consciência e Autoconhecimento 195
com unidade verbal em que estamos inseridos não são 
suficientemente precisas para que possamos discriminar 
eventos privados de maneira acurada, e o resultado é que 
os relatos das experiências que temos quando nos intros- 
peccionamos provavelmente não serão dados confiáveis 
ou mesmo replicáveis (como aprenderam a duras penas 
os psicólogos introspeccionistas do início do século 20. 
Então, embora a introspecção seja, também, um modo 
de autoconhecim ento, devemos questionar a respeito 
da confiança que podemos ter no conhecimento assim 
adquirido ou mesmo ponderar sobre sua eficiência frente 
a outros tipos de autoconhecimento, como a descrição das 
contingências a que estamos submetidos.7
Dissemos que o comportamento consciente depende 
do desenvolvimento dos repertórios especiais de auto- 
observação e de autodescrição - que dão origem ao auto­
conhecimento e que são adquiridos por intermédio da 
comunidade verbal —, e que serão explorados em maior 
detalhe. Discorreremos agora sobre comportamentos de 
auto-observação e também sobre o processo de autodis- 
criminação.
AUTO-OBSERVAÇÃO E 
A U TO C O N SC IÊN C IA
Podemos perceber não somente aquilo que está à nossa 
volta, mas também nossos corpos e aquilo que fazemos. 
Assim, podemos considerar que nossos corpos também 
fazem parte do nosso ambiente, uma vez que produzem 
estímulos que podem, eventualmente, controlar nosso 
comportam ento se as contingências forem apropriadas; 
e o mesmo se dá com o com portam ento, que é outra 
fonte importante de estimulação, já que, como vimos, as 
respostas que emitimos nos estimulam automaticamente 
(e, igualmente, essa estimulação pode se tornar discrimi­
nativa, dependendo das contingências em vigor).
C om portam entos de auto-observação podem levar 
pessoas a discriminarem a si mesmas - um modo de auto­
conhecimento geralmente chamado de “autoconsciência”
7Skinner (1974, p. 16-17) diz: “O Behaviorismo Radical (...) não nega a
possibilidade da auto-observação ou do autoconhecimento ou a sua possível 
utilidade, mas ele questiona a natureza do que é sentido ou observado e, 
portanto, conhecido. Ele restaura a introspecção, mas não aquela que filó­
sofos e psicólogos introspeccionistas acreditaram estar espectando’ (...) 
[O Behaviorismo Radical] simplesmente questiona a natureza do objeto 
observado e a confiabilidade das observações. A posição pode ser expressa 
da seguinte maneira: o que é sentido ou observado introspectivamente não 
é um mundo não físico da consciência, da mente ou da vida mental, mas 
o próprio corpo do observador.”
(self-awareness) na literatura especializada.8 Então, podemos 
não só discriminar nossos corpos e nosso comportamento, 
mas também, mais ampliadamente, as consequências que 
se seguem às nossas ações e a relação entre elas (z. e., as 
contingências de reforçamento a que estamos subm e­
tidos).
Entretanto, as contingências em que comportamentos 
de auto-observação são reforçados de maneira contingente 
são raras na natureza e por isso devem ser ensinadas pela 
comunidade por meio de procedimentos que envolvem 
o com portam ento verbal. Ainda assim, a auto-obser­
vação não é algo que somente seres humanos podem ser 
ensinados a fazer; animais também podem se observar e 
discriminar se as contingências apropriadas forem estabe­
lecidas (apesar de não possuírem repertório verbal). Vamos 
discutir brevemente alguns experimentos que mostram 
como esse treinamento pode ser realizado, o que também 
contribuirá para esclarecer sobre o estabelecimento desses 
comportamentos em humanos.
Discriminação condicional 
do próprio comportamento
Há experimentos com animais na literatura da Ciência 
do Com portam entoque tentam estabelecer com porta­
mentos que ficam sob controle daquilo que esses orga­
nismos fizeram anteriormente (cf. Dymon; Barnes, 1997; 
Souza; Abreu-Rodrigues, 2007). Nesses experimentos, 
geralmente são estabelecidas tarefas de discriminação 
condicional em conjunto com certos esquemas de reforça­
mento, de modo que é o próprio comportamento anterior 
do organismo que será discriminado condicionalmente. 
A peculiaridade desse tipo de estudo é que o operante 
emitido de início não é sempre o mesmo; ele é variável, 
pois é controlado ora por um ora por outro esquema de 
reforçamento previamente estabelecidos, o que torna a 
discriminação do próprio comportamento necessária para 
a produção consistente de reforçadores.
Lattal (1975) realizou um experimento com pombos 
em que não apenas o comportamento anterior se tornava 
discriminativo, mas sim a própria contingência (z. e., 
esquema) de reforçamento em vigor anteriormente. O
sO termo “autoconsciência” (self-awareness) é concebido de maneira mais 
restrita e, em geral, aplica-se à experiência de condições que são privadas, 
em oposição à consciência (consciousness), que envolve também a experiência 
com eventos publicamente observáveis. Porém, há cientistas do comporta­
mento que preferem reservar o primeiro termo para discriminações que um 
organismo faz de seu próprio comportamento (Dymon, Barnes, 1997).
196 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento
experimento consistiu em uma tarefa de discriminação 
condicional (/. e., matching-to-sampleou escolha de acordo 
com o modelo) em uma caixa com três chaves que podiam 
ser iluminadas. Os resultados mostraram que os pombos 
passaram a discriminar consistentemente os esquemas de 
reforço a que responderam anteriormente. Há, também, 
outros estudos que empregam aspectos distintos do 
comportamento dos organismos estudados como eventos 
discriminativos. Por exemplo, Reynolds (1966) e Shimp 
(1983) empregaram o intervalo de tempo entre respostas 
(IRTs), e Pliskoff e Goldiam ond (1966) empregaram 
valores distintos de esquemas de razão fixa (FR).
Autorreconhecimento no espelho
Em um estudo pioneiro, Gallup (1970) investigou a 
capacidade de primatas se reconhecerem, formulando uma 
situação experimental que veio a ser chamada de “teste do 
espelho” (Gallup, 1977, 2002). Tal teste pode ser consi­
derado um segundo tipo de critério para constatar a auto- 
observação em animais, isto é, por meio de seu autorre­
conhecimento frente a um espelho. Gallup (1970) inves­
tigou chimpanzés primeiramente e sua hipótese era que o 
chimpanzé reagia a sua imagem como se fosse um outro 
inicialmente, mas, com a exposição ao espelho, aprendeu 
a se reconhecer nele e também a usá-lo para se observar.
Para dar mais suporte experimental direto a essa hipó­
tese, Gallup (1970) anestesiou completamente seus chim­
panzés e pintou alguns pontos de suas faces cuja obser­
vação direta não é possível (p. ex., a parte logo acima de 
um a de suas sobrancelhas e a parte superior da orelha 
oposta) com um a tinta sem cheiro e sem propriedades 
táteis, de modo que o chimpanzé não tinha como saber 
que estava marcado a não ser que utilizasse o espelho. 
Quando os chimpanzés se recuperaram e os espelhos foram 
reintroduzidos nas jaulas, o número de comportamentos 
dirigidos especificamente às marcas aum entou conside­
ravelmente, indicando o autorreconhecimento de modo 
bastante convincente. Gallup, então, tentou repetir todo o 
procedimento descrito com algumas espécies de macacos, 
que terminaram por não se reconhecerem no espelho; e 
novamente com outros chimpanzés, mas que, dessa vez, 
foram marcados sem que houvesse tempo prévio de expo­
sição, e estes também não mostraram o comportamento 
dirigido às marcas característico da situação anterior.
Tais resultados foram confirmados e estendidos por 
estudos posteriores (cf. Gallup, 1977, 2002) e levaram o 
autor a conjeturar que o comportamento de autorreconhe­
cimento é específico de certas espécies - talvez limitado a 
seres humanos e a alguns primatas superiores — e que este 
parece depender de “uma forma de intelecto algo avançada” 
(Gallup 1970, p. 87) ou que “o autorreconhecimento da 
imagem no espelho implica um conceito de self”; ou mesmo 
um “autoconceito suficientemente bem integrado” (Gallup, 
1977, p. 334), o que seria tornado evidente pela necessidade 
da exposição inicial ao espelho para que os comportamentos 
dirigidos às marcas ocorressem.
Essas conclusões, com tons cognitivistas, foram ques­
tionadas por outro estudo experimental realizado com 
pombos por Epstein, Lanza e Skinner ( 1981 ). Nele, os pom­
bos puderam ver um a marca azul em seus corpos cuja 
imagem era refletida no espelho e passaram a bicá-la, sendo 
então reforçados.
Esse experimento é bastante representativo das tenta­
tivas da análise do comportamento em analisar e inter­
pretar ocorrências a que são atribuídas explicações cogni­
tivas (autoconceito ou self bem integrado etc.) em termos 
da história ambiental passada. Porém, nesse caso espe­
cífico, há ressalvas que precisam ser feitas em relação às 
conclusões que podemos tirar a partir dos resultados expe­
rimentais obtidos. Inicialmente, é preciso considerar que, 
desde o experimento inicial de Epstein, Lanza e Skinner 
(1981), a evidência experimental com o teste do espelho 
realizada em primatas tem se acumulado de maneira sólida, 
com variações relevantes estendendo os resultados. Assim, 
a exposição ao espelho foi muito prolongada, sendo usadas 
nos testes as mais variadas espécies de primatas sob condi­
ções experimentais bem diversas como tentativas dos 
experimentadores de “ajudar” os primatas a se autorre- 
conhecerem. Esses resultados favorecem a tese de Gallup 
(1970) de que o comportamento de autorreconhecimento 
no espelho é específico de certas espécies, uma vez que só 
pôde ser constatado de modo confiável até o momento 
em alguns primatas superiores, como chimpanzés, orango­
tangos ou mesmo bonobos - mas não pôde ser observado, 
por exemplo, em gorilas (Gallup, 2002).
Em segundo lugar, é possível questionar se a necessi­
dade de ensinar os repertórios descritos previamente ao 
teste de observação nao compromete a analogia preten­
dida com o do teste do espelho realizado com primatas, 
em que há m uito menos ou mesmo nenhum treinamento 
envolvido. Por fim, houve problemas em replicar o expe­
rimento original de Epstein, Lanza e Skinner (1981) com 
pombos (Dymon; Barnes, 1997) e fica aberta aos cientistas 
do comportamento a oportunidade para tentar replicar e 
estender esses resultados.
Consciência e Autoconhecimento 197
Autodiscriminação de estímulos privados
Lubinsky e Thom pson (1987) realizaram um experi­
mento em que pombos discriminavam estados corporais 
provocados pela aplicação de certas drogas e “com uni­
cavam” aquilo que sentiam a pombos que compartilhavam 
suas gaiolas pressionando certas chaves. Os pombos rece­
biam treinamento individual de acordo com as tarefas a 
serem realizadas e depois “interagiam” em um a gaiola, 
separados por uma parede transparente. O delineamento 
desse experimento é complexo e composto de várias fases 
(visando responder a questões experimentais um tanto 
diversas), e que não descreveremos aqui em detalhes.
O experimento de Lubinsky e Thompson (1987) é uma 
replicação estendida do experimento de Epstein, Lanza e 
Skinner (1980), e este último experimento, por sua vez, 
foi baseado em outro, realizado com dois chimpanzés 
(Savage-Rumbaugh, Rumbaugh, Boysen, 1978), em que 
aprenderam a trocar informações sobre comidas que só 
um deles tinha visto com o emprego de símbolos geomé­
tricos (posteriormente, os chimpanzés foram observados 
pedindo comida um ao outro espontaneamente com o uso 
dos mesmos símbolos).
É m uito provável que os animais que figuraram nesses 
experimentos nunca aprendessem a se observar e a se discri­
minar se não tivessem sido expostos a essas situações expe­
rimentais e deixados ao sabor das contingências encon­tradas em seus ambientes naturais, mas isso ocorreu porque 
as contingências apropriadas foram estabelecidas. Foi 
constatado nesses experimentos que estímulos privados 
(Lubinski, Thompson, 1987) ou produzidos pelo compor­
tam ento dos animais em estudo (Lattal, 1975; Gallup, 
1970; Epstein, Lanza, Skinner, 1981), em que comporta­
mentos de auto-observação estavam envolvidos de alguma 
maneira, foram discriminados e passaram a controlar o 
comportamento dos sujeitos, de modo que esses adqui­
riram algum conhecimento sobre si mesmos.
Isso significa que a autodiscriminação (ou “autocons­
ciência”) não é um processo especial de discriminação, mas 
que há, sim, uma diferença com relação à localização dos 
estímulos discriminados (que podem ser produzidos pelo 
próprio corpo ou como decorrência do comportamento) 
ou pela requisição de que comportamentos específicos de 
auto-observação ocorram para que certas autodiscrimina- 
ções possam acontecer. Em última análise, são as contin­
gências que determinam quais estímulos serão discrimi­
nados: se os do ambiente próximo ou aqueles relacionados 
com o próprio organismo. Colocando de outra maneira,
isso ocorre ao sabor das consequências que acompanham 
esses estímulos e que talvez venham a torná-los discrimina­
tivos. O autoconhecimento, por sua vez, depende das auto- 
discriminações que um organismo realizou até o momento 
(mas cabe ressaltar que há, tam bém, outra maneira de 
autoconhecimento que surge quando as pessoas passam a 
fazer relatos sobre si mesmas).
O que foi dito já parece bastante esclarecedor, mas é 
preciso considerar, ainda, que as pessoas geralmente desen­
volvem repertórios de auto-observação com a ajuda da 
comunidade verbal, o que ocorre simultaneamente à aqui­
sição de repertórios de autodescrição (em procedimentos 
semelhantes àqueles empregados para o ensino de discri­
minação de eventos privados).
CO M PO RTA M EN TO 
DESCRITIVO
Até o momento, discutimos sobre a consciência apenas 
no sentido do responder discriminativo aos estímulos 
produzidos pelo próprio com portam ento, sem incluir 
necessariamente o comportamento verbal em nossa defi­
nição. O u seja, analisamos como respostas de auto-obser­
vação provocam a exposição do organismo a estímulos 
produzidos por seu próprio com portam ento, os quais 
passam a ser discriminativos para outras respostas. Como 
vimos, por exemplo, em Gallup (1970), existem alguns 
fenômenos que denominaríamos “autoconscientes”, mas 
que não incluem com portam ento verbal. A partir do 
presente tópico, analisaremos o papel do operante verbal 
tato na definição do que consideramos ser a consciência 
na interpretação da análise do com portam ento, isto é, 
veremos como esses estímulos produzidos pelo próprio 
comportamento do organismo na resposta de auto-obser­
vação podem se tornar discriminativos para respostas 
descritivas.
Nesse sentido, em grande parte da literatura da área que 
trata do tema (Micheletto, Sério, 1993), encontramos a 
defesa de que a descrição (o tato, o relato) é necessária para 
falarmos em consciência em humanos, ou seja, quando 
o indivíduo é capaz de emitir o operante verbal tato em 
relação a algo, dizemos que ele tem consciência desse algo. 
Mesmo em experimentos com animais, como aqueles já 
descritos, podemos questionar sobre o papel do compor­
tamento verbal na ocorrência dos comportamentos “auto­
conscientes” observados nos experimentos descritos, pois 
contingências em que comportam entos de auto-obser-
198 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento
vaçao são reforçados são raras (ou mesmo inexistentes) na 
natureza, e então é preciso que uma comunidade verbal as 
estabeleça. Assim, mesmo que tais comportamentos auto­
conscientes não sejam verbais, eles são estabelecidos por 
contingências arranjadas pela comunidade verbal e, então, 
podemos afirmar que estar consciente é um m odo de 
reagir ao próprio comportamento e também é um produto 
social (Skinner, 1959/1972).
Segundo Skinner (1957), o próprio termo tato carrega 
a sugestão de que o tato é o operante que possibilita o 
“con-tato” com o mundo físico. Operacionalmente, o tato 
é estabelecido quando reforçamos consistentemente deter­
minada reposta na presença de determinado estímulo não 
verbal (e não de outro), que se torna discriminativo, por 
meio de muitos reforçadores diferentes ou com reforçador 
generalizado. Duas características necessárias na instalação 
de um tato são: controle pelo estímulo discriminativo (Sd), 
que é não verbal, e reforço generalizado. A utilização do 
reforço generalizado estabelece o controle pelo Sd em detri­
mento, por exemplo, de estados de privação ou de outra 
estimulação aversiva, como no caso do operante chamado 
mando. No tato, uma dada resposta “especifica” determi­
nada propriedade do estímulo (Skinner, 1957).
Podemos pensar, por exemplo, que, se um repertório de 
tatos é bem estabelecido, uma testemunha pode relatar os 
fatos em um julgamento de acordo com o que ela presen­
ciou na situação do crime, mesmo se estiver sendo amea­
çada por contar a verdade. Quando a correspondência com 
a situação de estimulação é precisa, chamamos a resposta 
de “objetiva”, “válida”, “verdadeira” ou “correta” (Skinner, 
1957). Vejamos como Skinner (1957, p. 81-82, 85) define 
essa classe de respostas nesse mesmo texto:
“Um tato pode ser definido como um operante 
verbal no qual uma resposta de uma dada forma é 
evocada (ou ao menos fortalecida) por um objeto 
ou um evento particular ou por uma propriedade 
de um objeto ou evento (...) ele funciona em be­
nefício do ouvinte por estender seu contato com 
o ambiente e, por essa razão, tal comportamento 
é estabelecido pela comunidade verbal.”
O suposto relato “verdadeiro” da testemunha exemplifi­
cado é um “tato puro”. No entanto, esse tipo de tato acon­
tece m uito raramente, pois, em geral, há outros controles 
que modificam a resposta. No caso em que a testemunha 
fala a verdade, podemos supor que, se a ameaça fosse inten­
sificada, a probabilidade de ela emitir um “tato puro”, de 
falar a verdade, diminuiria. Segundo Skinner (1957), o
operante verbal chamado de tato estabelece uma ligação 
entre o comportamento do ouvinte e um relevante estado 
de coisas. No exemplo anterior, entre o juiz e a situação 
do crime. Entretanto, a correspondência entre o estado 
de coisas e o relato verbal pode não ser tão “pura”, já 
que outras variáveis (p. ex., privação) podem passar a 
controlar o comportamento causando uma distorção no 
relato. A sentença “meu copo está vazio” pode parecer 
apenas uma descrição desse estado de coisas, mas também 
pode funcionar como um pedido velado por água em 
uma situação em que realizar o pedido de maneira direta 
poderia ter consequências aversivas.
O controle exclusivo pelo Sd, que ocorre no “tato puro”, 
é de extrema importância para a ciência, pois os cientistas 
buscam descrever o mundo assim como ele é de fato, isto é, 
sob controle quase exclusivo dos Sds (esta afirmação pres­
supõe um realismo quase ingênuo, mas ao menos podemos 
supor que os diferentes organismos reagem de maneira 
semelhante aos mesmos eventos, ou seja, existe uma inter- 
subjetividade que possibilita afirmarmos que temos contato 
com o mesmo mundo físico). O tato é crucial na ciência, 
pois, a partir da descrição, é possível a previsão e o controle. 
Talvez por isso Skinner considere que o tato é o operante 
verbal mais importante (Skinner, 1957).
Nas ciências exatas, temos, grosso modo, tatos dos cien­
tistas a respeito de seus achados experimentais. Nas ciências 
humanas, temos dois níveis de relatos: além do relato do 
cientista sobre suas pesquisas, muitas vezes o relato verbal 
dos sujeitos é um dado de pesquisa para o próprio cientista
- pois muitos dos eventos estudados são inacessíveis a ele, 
como em pesquisas sobre comportamento de uso de drogas 
ilícitas. O pesquisador não pode reproduzir as condições 
que levam os sujeitos a usar drogas, por isso, faz perguntas 
a eles,sendo que as respostas a essas questões são tatos 
dos sujeitos a respeito de seu próprio com portam ento. 
Segundo de Rose (2001, p. 150): “O relato verbal é um 
tato, sob controle dos aspectos relevantes deste estado de 
coisas, que permite ao pesquisador fazer inferências sobre 
este estado de coisas ao qual ele não tem acesso direto”. 
De acordo com esse autor, os relatos podem não ter muita 
correspondência com o evento relatado por vários motivos: 
os relatos podem se referir a assuntos considerados tabus; 
podem também estar sujeitos limitações de acessibilidade, 
de memória, de atenção etc.; além disso, podem ser deli­
beradamente distorcidos pelo falante.
No sentido que queremos abordar no presente tópico, 
poderíamos dizer que a pessoa está “consciente de” algo 
quando ela emite um tato sob controle desse algo. Utili­
Consciência e Autoconhecimento 199
zamos “emitir um tato”, “tatear”, “descrever” e “relatar” 
como sinônimos. Dizemos que temos consciência da crise 
internacional do capitalismo financeiro quando a descre­
vemos; que temos consciência ambiental quando conse­
guimos descrever uma série de eventos e suas consequências 
para o meio ambiente; que temos consciência de nós 
mesmos quando conseguimos realizar a auto-observação 
e a descrição do que é observado, em relação ao próprio 
comportamento, suas condições e suas consequências.
Também afirmamos, por exemplo, que alguém tem 
consciência política quando é capaz de descrever, sob 
controle dos estímulos discriminativos estabelecidos pelo 
reforço generalizado, eventos chamados de “políticos”. 
Nesse caso, não poderíamos falar em consciência polí­
tica se o sujeito apenas repete a fala do apresentador de 
um telej ornai em relação a esses eventos políticos, pois tal 
comportamento não pode ser classificado como um tato 
e, portanto, não é um exemplo de “consciência política” 
de acordo com a análise do comportamento. Por outro 
lado, m uito do conhecimento que adquirimos é intra­
verbal (p. ex., Chaves é presidente da Venezuela); não é 
simplesmente ecoico. Por essa razão, talvez nao possamos 
falar em consciência nesse último caso (ecoico), mas no 
primeiro (intraverbal) é possível. Informações desse tipo 
possibilitam um controle razoável sobre o mundo, mesmo 
sem ter havido ainda contato com as contingências. É para 
obter esse tipo de conhecimento que vamos à escola.
Parte do nosso comportamento de descrever refere-se a 
nós mesmos. É o que Skinner (1957, p. 139) denominou 
auto ta tos:
“Estamos preocupados aqui com autotatos - com 
comportamento verbal controlado por outro com­
portam ento passado, presente ou futuro do fa­
lante. O estímulo pode ou não ser privado. O 
comportamento autodescritivo é de interesse por 
várias razões. Somente através da aquisição de 
tal comportamento o falante torna-se consciente 
[aware] do que e do porquê ele está fazendo ou 
dizendo.”
O papel da comunidade verbal é de extrema im por­
tância no estabelecimento desse repertório autodescritivo. 
Em geral, a comunidade está interessada no que o indi­
víduo faz, fez, planeja fazer e por quê. Apenas porque o 
comportamento do indivíduo é importante para a socie­
dade é que a sociedade o torna importante para o indi­
víduo (Skinner, 1945/1984, p. 551), ou seja, a comuni­
dade ensina o autotato ao indivíduo de modo que ela
própria possa conhecer, de algum modo, algo que antes 
era inacessível ou pouco acessível a ela. Ao mesmo tempo, 
essa aprendizagem poderá trazer vantagens para o indi­
víduo, conforme será discutido no tópico sobre autocon­
trole mais à frente.
Como um tipo de tato, o autotato também pode sofrer 
“distorções”. H á experimentos a respeito da correspon­
dência entre comportamento verbal descritivo e compor­
tamento não verbal que é descrito. Esses estudos buscam 
analisar as circunstâncias nas quais o indivíduo relata o 
comportamento sob controle do próprio comportamento. 
Esses experimentos esclarecem que a correspondência é 
estabelecida por meio das contingências de reforçamento. 
Ribeiro (1989) descreve um procedimento em que crianças 
pré-escolares brincavam com alguns brinquedos e poste­
riormente relatavam se haviam brincado ou não com os 
brinquedos cujas fotos lhes eram apresentadas. Na linha 
de base, houve correspondência precisa entre o compor­
tamento verbal e não verbal das crianças, ou seja, entre 
ter brincado ou não ter brincado com aquele brinquedo e 
relatar que brincou ou nao com aquele brinquedo. Todas as 
crianças inicialmente descreviam bem o próprio compor­
tam ento, falavam a verdade. Posteriormente, o experi­
m entador passou a reforçar as respostas afirmativas das 
crianças, independente da correspondência. Como resul­
tado, a frequência dos relatos afirmativos aumentou e a 
correspondência verbal-não verbal diminuiu. Esse experi­
mento demonstrou claramente como respostas que antes 
da intervenção podiam ser classificadas como autotato 
passaram a ter função de mando.
As contingências verbais estabelecidas pelos outros 
levam o indivíduo a se auto-observar e a descrever o que 
observa, mesmo quando o observado é inacessível aos 
outros. Segundo Skinner (1969), podemos aprender a 
relatar eventos que ocorrem sob a pele do falante. Imagi­
nemos perguntas feitas a uma criança de dois anos que 
começou a chorar: “O que você está sentindo?”, “Está 
doendo em algum lugar?”, “O que aconteceu?”, “Você 
se machucou?”, “É aqui na barriguinha?”, “Q uer ir ao 
banheiro?”, e assim por diante. A criança responde de 
alguma maneira, por exemplo, sinalizando afirmativa­
mente com a cabeça a algumas dessas questões e, a partir 
disso, o adulto toma alguma providência que tem como 
consequência, para a criança, a fuga dessa estimulação 
aversiva que é acessível apenas à própria criança. Esse é um 
exemplo simples de como a comunidade verbal estabelece 
contingências que constroem repertório de auto-obser- 
vação e modelam a descrição. Segundo Skinner (1978), o
200 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento
autoconhecimento apareceu muito tarde na evolução da 
espécie, pois apenas quando o indivíduo começou a ser 
questionado sobre seu comportamento e sobre as causas de 
seu comportamento é que ele começou a se tornar cons­
ciente de si nesse sentido.
A U T O C O N H E C IM E N T O
O autoconhecimento é a consciência a respeito de si 
mesmo. Dizemos que um indivíduo tem autoconheci­
mento quando é capaz de discriminar e descrever eventos 
que ocorrem no próprio organismo ou relações estabe­
lecidas entre esse organismo e o mundo. O autoconhe­
cimento não é especial em relação ao método. Ele difere 
apenas em relação ao seu objeto, conforme explicita Sério 
(2000, p. 170):
“O autoconhecimento é apenas o conhecimen­
to no qual o sujeito que produz conhecimento é 
também o objeto conhecido. A especificação auto’ 
refere-se ao objeto do conhecimento e não à for­
ma ou maneira que o conhecimento é produzido. 
Para o Behaviorismo Radical, o autoconhecimento 
nao é imediato; ao contrário, ele é sempre media­
do por outros.”
Esses “outros” são a comunidade verbal. A comunidade 
produz comportamentos autodescritivos ao perguntar: “O 
que você está fazendo?” ou “Por que você está fazendo 
isso?” e reforçar apropriadamente as respostas. De início, 
as respostas que damos às perguntas não devem ser muito 
acuradas, mas elas vão sendo modeladas conforme a comu­
nidade consiga usar correlatos de eventos privados para 
reforçar os relatos de maneira contingente. De acordo com 
Skinner (1969), o comportam ento com o qual respon­
demos a essas questões não pode ser confundido com 
aquele produzido pelas contingências originais. O compor­
tamento com o qual respondemos tem origem verbal, isto 
é, não haveria razão para emiti-lo se não fossem as contin­
gências arranjadas pela comunidade verbal.
O repertório de autoconhecimento estabelecido com 
perguntas como as citadas no parágrafo anterior inclui 
respostas de auto-observação e respostas autodescritivas 
(autotatos). A auto-observaçãoinclui observar: as condi­
ções em que o comportamento surge, o próprio compor­
tam ento e as suas consequências. O autotato é o relato 
sob controle daquilo que é auto-observado. Enunciando 
tecnicamente, a auto-observação é uma resposta encoberta 
que ocorre no mesmo instante em que o comportamento
está sendo observado (este comportamento pode ser público 
ou não). A consequência da auto-observação é a expo­
sição do indivíduo aos estímulos produzidos autom ati­
camente por seu próprio comportamento, como exposto 
anteriormente. Esses estímulos são os Sd para determinadas 
respostas, inclusive os autotatos, no caso dos humanos. 
Finalmente, os autotatos são reforçados pela comunidade. 
Quando a comunidade faz isso, ou seja, quando a comu­
nidade reforça o relato a respeito do próprio comporta­
m ento, de suas condições e consequências, ela mantém 
e fortalece respostas de auto-observação, tendo em vista, 
em outros termos, que a auto-observação é, ao menos 
em parte, precorrente para o autotato (de Rose, 2001). O 
seguinte esquema talvez esclareça um pouco mais:
Perguntas da comunidade são Sd para —> resposta de 
auto-observação que produz -> S do próprio comporta­
mento (e de suas condições e consequências) que são Sdpara 
—> resposta de autotato que produz —> S reforçador social.
No caso dos humanos, muitas vezes, os Sd automatica­
mente produzidos pelo próprio comportamento na resposta 
de auto-observação servem de Sd para respostas de autotato. 
As questões feitas pela comunidade são a ocasião na qual 
o sujeito emite respostas de auto-observação de modo a 
responder adequadamente às questões, isto é, as questões 
tornam a autoestimulação discriminativa porque ela passa 
a ser a ocasião em que o reforço ocorre (i. e., estabelece esse 
controle de estímulos). Tal discriminação não precisa ser 
imediatamente acurada, mas vai se refinando na medida 
em que o controle de estímulos se estabelece, essencial­
mente da mesma maneira como acontece uma discrimi­
nação sobre estímulos públicos. A única questão é que, por 
serem privadas, essas discriminações talvez não possam ser 
estabelecidas tão acuradamente, como comentamos.
Quando o Sd, que é consequência da auto-observação, 
tem correlato público, a descrição pode ser modelada 
de modo mais preciso. A sudorese e o rubor facial são 
observáveis tanto para o falante como para o ouvinte. Por 
outro lado, o “frio na barriga” não o é. Então, temos um 
problema (Skinner, 1978, p. 72): “A comunidade verbal 
que nos ensina a fazer distinções entre as coisas do mundo 
ao nosso redor não possui as informações que ela precisa 
para nos ensinar a distinguir entre eventos do nosso mundo 
privado”. Skinner (1971) observa que conhecer os eventos 
privados é mais do que responder a eles; é descrevê-los. 
Como a comunidade pode, então, construir um repertório 
de descrição de eventos privados se ela não tem acesso a 
esses eventos? Segundo Skinner (1957; 1959/1972), há, 
pelo menos, quatro maneiras de a comunidade, que não
Consciência e Autoconhecimento 201
tem acesso à estimulação privada do indivíduo, ensiná-lo 
a responder verbalmente a essa estimulação, e que vamos 
descrever brevemente.
A primeira delas é o reforçamento contingente a respostas 
verbais que acompanham eventos públicos vinculados a 
eventos privados. Exemplificando, quando uma criança se 
fere no joelho, tem o evento privado da dor e a resposta 
verbal pública: “Isso dói!” Logo, a comunidade não tem 
acesso aos eventos privados, mas pode ter acesso a seus 
correlatos públicos e, a partir deles, modelar o relato do 
indivíduo. Malerbi e Matos (1982) citam várias pesquisas 
arranjadas de modo que o relato verbal dos sujeitos a 
respeito de determinado evento privado fosse modelado 
pelo experimentador a partir de eventos públicos corre­
latos acessíveis inicialmente apenas ao experimentador. 
As autoras citam estudos a respeito do nível de álcool no 
sangue, da pressão arterial, da frequência cardíaca, entre 
outros. Em um a dessas pesquisas, pedia-se aos sujeitos 
que relatassem as alterações em seus batimentos cardíacos 
e a coincidência entre tais alterações e alguns estímulos 
apresentados na situação experimental. As experimenta­
doras registravam as alterações da frequência cardíaca em 
um eletrocardiograma. Com o resultado, obteve-se que, 
inicialmente, não havia correspondência entre as alterações 
medidas pelo eletrocardiograma e os relatos dos sujeitos. 
Posteriormente, o experimentador indicava aos sujeitos a 
correspondência entre os seus relatos sobre a frequência 
cardíaca e a própria frequência cardíaca. Esse procedimento 
pode ser entendido como um treino discriminativo. Esse 
treino levou os sujeitos a aumentarem a precisão do relato 
a respeito da sua frequência cardíaca. Podemos tomar esse 
experimento como exemplo de como a comunidade verbal, 
ao modelar o auto tato do sujeito a partir de correlatos 
públicos dos eventos privados, modela também as respostas 
de auto-observação que têm como consequência os estí­
mulos que são “tateados”, descritos, relatados.
Em um a segunda maneira descrita por Skinner, de 
acordo com a qual a comunidade ensina o indivíduo a falar 
sobre eventos privados, “a comunidade infere o estímulo 
privado, não a partir de estímulos públicos que o acom­
panham, mas de respostas colaterais, geralmente incon- 
dicionadas e, no mínimo, não verbais (mão no maxilar, 
expressões faciais, gemidos etc.)” (Skinner, 1959/1972, 
p. 375). O sujeito que permanece com a mão no maxilar 
pode ser questionado: “Você está com dor de dente?”, e 
sua resposta, por exemplo, “é o dente do ciso que está 
nascendo”, será reforçada.
Em uma terceira estratégia, a comunidade modela o indi­
víduo a falar sobre seus comportamentos públicos, abertos, 
observáveis. Desse modo, o indivíduo pode descrever os 
mesmos comportamentos quando eles ocorrerem no nível 
privado, por exemplo, em um sonho. Somos ensinados 
a retroceder muitos de nossos comportamentos ao nível 
privado, ao fazermos contas de cabeça ou deixarmos de 
1er em voz alta, por exemplo.
A última maneira seria aquela em que, por indução, 
uma resposta adquirida e mantida em conexão com estí­
mulos públicos pode ser emitida em resposta a eventos 
privados. Neste caso, os estímulos públicos e os privados 
têm propriedades em comum. Então, os eventos privados 
são descritos por meio de metáforas. A pessoa pode relatar 
eventos internos usando expressões como tristeza aguda, 
estômago embrulhado ou peso na consciência, por 
exemplo. Nesses casos, a comunidade reforça respostas 
a eventos privados que guardem alguma relação com os 
eventos públicos. Como todas essas 4 estratégias não esta­
belecem um grau acurado de precisão, Skinner afirma que 
o sujeito não consegue conhecer claramente a si mesmo 
(Skinner, 1959/1972).
Podemos afirmar, então, que o autoconhecim ento é 
constituído socialmente, pois o produto da auto-obser- 
vação torna-se, por meio de contingências estabelecidas 
pela comunidade, Sd para o relato. De acordo com Abib 
(2007, p. 64): “com o comportamento verbal, descreve- 
se um m undo e um sujeito constituído pela linguagem 
de uma cultura. Uma descrição dessa natureza não signi­
fica representação, significa constituição”. Portanto, sob 
a ótica da análise do comportamento, “embora estranho, 
é a comunidade que ensina o indivíduo a ‘conhecer a si 
mesmo’” (Skinner, 1957, p. 134), e podemos concluir 
que “a consciência é um produto social” (Skinner, 1971, 
p. 192), conforme analisado.
A U TO CO N TRO LE
Skinner (1969, p. 244) afirma que estamos conscientes 
do que estamos fazendo quando descrevemos a topografia 
de nosso comportamento. Mas só estamos conscientes das 
razões de nosso comportamento quando descrevemos as 
variáveis relevantes e os aspectos importantes da ocasião 
ou do reforçamento, isto é, sabemos por que agimos deste 
ou daquele modo quando conseguimos descrever funcio­
nalmente as relações que existem entre o comportamento 
em questão e o ambiente. Ao descrevermos

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