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* C o n s c i ê n c i a e A u t o c o n h e c i m e n t oo i - i ~ Jú lio César Coelho de Rose ■ Marina Souto L. Bezerra • Tales Lazarin “A ciência frequentemente fala sobre coisas que não pode ver ou medir” (Skinner, 1969). “Uma ciência do comportamento não ignora, como se d iz frequentemente, a consciência. Pelo contrário, ela vai m uito além das psicologias mentalistas ao analisar o comportamento auto- descritivo. Ela tem sugerido maneiras melhores para ensinar o autoconhecimento e também o autocontrole, que depende do autoconhecimento” (Skinner, 1969). O que é a consciência? Qual a sua natureza e como ela surge? Ela tem um papel relevante em nosso comportamento, não só no modo com que agimos, mas também como perce bemos e conhecemos o mundo e a nós mesmos? Podemos estudá-la cientificamente? Neste capítulo vamos explorar essas questões da perspectiva do Behaviorismo Radical, pontuando alguns dos argumentos mais importantes para a interpretação da consciência e passando também por alguns experimentos sugestivos presentes na literatura da Ciência do Comporta mento. Mais ao final, abordaremos a questão estreitamente relacionada com o autoconhecimento, que é essencial para que possamos nos autogerenciar e que, por esse motivo, também é um tema central para a psicoterapia. A consciência é um assunto que tem algumas peculiari dades se a compararmos com outros tópicos na história das ciências. É, por certo, um assunto pendular, que foi igno rado em alguns momentos e muito estudado em outros, dependendo, em boa medida, do modo como a psicologia científica foi concebida em diversos momentos ao longo de sua história;1 e, também, muitos autores que escrevem sobre o assunto questionam se a “consciência” que inves tigam é algo que existe de fato ou se não se trata de uma mera ficção ou especulação. Há uma impressionante quan tidade de material sobre o assunto nas neurociências e nas ciências cognitivas desde a década de 1990 (a “década do cérebro”), e o chamado “problema da consciência” é um dos mais discutidos na filosofia da mente (um ramo da filosofia analítica que se tornou muito próximo das ciên- 'Quando a psicologia se tornou científica’ nas duas últimas décadas do século 19, a consciência era seu objeto de estudo por excelência e ela era definida como “ciência da mente e da vida mental”, uma concepção em que se apoiaram as primeiras tradições dessa nova ciência (como o funcionalismo de William James e o estruturalismo psicológico de Edward Titchner). Nos primeiros laboratórios de psicologia, a introspecção era estudada de forma controlada e sistemática com a ajuda de aparato experimental e registrada em forma de relato pelos participantes. Porém, problemas internos a esse tipo de abordagem e inconsistências aparentemente inelimináveis nos dados (em especial com relação ao estruturalismo) precipitaram a chamada ‘revo lução behaviorista’ liderada por Watson a partir de 1913, com a proposta de que a psicologia devia estudar o comportamento manifesto (/’. e., reflexo) - que é observado de forma imediata (i. e., sem recurso a relatos subjetivos) e que mostrou produzir dados confiáveis - , negando que a consciência pudesse ser estudada cientificamente uma vez que não é algo que possa satisfazer o critério de observação intersubjetiva. A situação não foi revertida de imediato com a chamada ‘revolução cognitiva’ ocorrida na década de 1950 com a proposta do modelo computacional da mente, pois computa dores digitais são máquinas que executam instruções sequenciais (i. e., de forma ‘mecânica’), um passo por vez, e não podem sustentar algo como a experiência subjetiva. Assim, a consciência figura mais como uma anomalia com relação a tal abordagem, o que gerou um grande interesse recente em seu estudo (cf. Giizeldere, 1997, para mais informações históricas e para um guia de estudo com relação às pesquisas atuais sobre a consciência). Cabe ressaltar, por fim, que Skinner figura mais como uma exceção aos seus colegas behavioristas, pois sua proposta de ciência do comportamento abre a possibilidade do estudo científico ou da interpretação da consciência a partir das descobertas cientificas, assunto sobre o qual versa o presente texto. Consciência e Autoconhecimento 189 cias cognitivas), sendo que muitas teorias cognitivistas da consciência têm sido propostas, embora, até o momento, estas sejam mais de natureza especulativa que científica propriamente.2 Além disso, a consciência é geralmente considerada, no mínimo, como difícil de ser submetida aos métodos de investigação empírica de que poderíamos dispor. Afinal, a ciência trabalha com aquilo que podemos observar, manipular e medir, e podemos fazê-lo, dentro de certos limites, com o comportamento e também com o corpo dos organismos (p. ex., estudando a sua anatomia e fisio logia). No entanto, como poderíamos aplicar tal método à consciência (ou a estados de consciência), cuja privaci dade parece desafiar o avanço da técnica de instrumen tação científica e que talvez nos leve, outra vez, a pensar se não há algum problema com nossas concepções sobre tal “objeto”? Esse “mistério” presente na concepção e na investigação científica sobre a consciência parece envolvido em ares de paradoxo, pois talvez nada nos seja tão familiar; afinal, não vivemos todos em um m undo repleto de cores, cheiros e sons? É justam ente a existência dessa chamada “vida mental” - o modo como as coisas nos aparecem - que é intrigante e que permanece como um último desafio às tentativas de integrar a psicologia ao retrato do mundo que nos é apresentado pelas ciências naturais “duras” (p. ex., física, química e biologia). Para a física, a luz é entendida como ondas eletromagnéticas de certos comprimentos, mas as cores dos objetos que vemos não se parecem em nada (ou só de maneira remota) com as propriedades físicas da luz refletida por eles. Há, por certo, uma lacuna a ser explicada entre os eventos físicos que terminam por estimular nossos corpos e a experiência subjetiva corres pondente que temos, mas o que causa perplexidade é a 2William Seager (1999), um dos estudiosos da consciência, diz que essa coloca um problema que é daquele tipo peculiar que surge na filosofia em que uma boa parte dos estudiosos do assunto duvidam da própria existência dos ‘objetos’ que estão supostamente criando o problema. Seager (1999) também alude a várias teorias cognitivistas propostas para tentar resolver o ‘problema da consciência’ (teorias de que não trataremos aqui), mas se refere a elas como não científicas, embora tencionem ser compatíveis com a ciência futura, pois afirma não haver teorias científicas concebidas até agora que se reportem à natureza da consciência em oposição ao seu subs trato neural. Isto é, embora atualmente haja uma linha de pesquisa vigorosa nas neurociências que busca encontrar correlatos neurais da experiência consciente — dentre as quais a hipótese de Crick e Koch (cf. Crick, 1994) de que oscilações sincronizadas de pulsos neurais entre 30 e 70 Hz seriam uma condição neurobiológica essencial à consciência — não há uma expli cação de por que tais correlatos dariam origem à experiência consciente. As teorias cognitivistas propostas são tentativas de elucidar a ‘natureza’ da consciência, algo que as neurociências têm sido incapazes de suprir. dificuldade em entender como o retrato físico do mundo pode sustentar algo como a experiência subjetiva sem se tornar inconsistente - isto é, sem que sejamos obrigados a postular a existência de algo que não seja físico para realizar essa tarefa. Além disso, há mais algumas questões intrigantes sobre a natureza da consciência e que permanecem em aberto: por que, afinal, temos algo como a experiência subje tiva em vez de simplesmente nos comportarmos sem que nada do tipo ocorra (ou por que nossos comportamentos não ocorrem “no escuro”, por assim dizer)? Organismos não humanos têm esse tipo de experiência (seessas relações, facilitamos a intervenção sobre o que controla nosso 202 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento comportamento. A partir dos autotatos, podemos cons truir regras, as quais podem ser utilizadas para controlar o nosso próprio comportamento. Um a pessoa que tom ou consciência de si por meio de perguntas que lhe foram feitas pela comunidade está em m elhor posição para prever e controlar seu próprio comportamento (Skinner, 1974/1976, p. 35). Como na ciência, se conseguirmos descrever, poderemos prever e controlar. Se conheço, se tenho consciência de algumas das variáveis que controlam meu comportamento de fumar, por exemplo, tenho mais chances de modificar essas variá veis, estabelecendo o autocontrole. Com o autoconhe cimento, o sujeito pode construir autorregras que, por sua vez, promovem o autocontrole. No caso do fumante, ele pode se tornar consciente de que, sempre que toma café, acende um cigarro. A partir desse autoconhecimento, ele poderá criar a seguinte autorregra: deixar o maço de cigarros guardado quando for tomar café. Esse procedi mento diminui a quantidade de cigarros que ele fuma por dia, e dizemos, então, que ele adquiriu um certo autocon trole sobre seu comportamento de fumar. Para Micheleto e Sério (1993), a discussão sobre se o homem é sujeito ou objeto na psicologia de Skinner9 leva à questão do autocontrole e, consequentemente, do auto conhecimento, que, segundo as autoras, é sinônimo de consciência (p. 19). O argumento é que o homem cons ciente seria capaz de planejamento e autogoverno, o que o torna sujeito. Nesse momento, ele encontra a possibi lidade de arbitrar sobre os seus determinantes, construir as próprias regras e segui-las. Skinner (1971, p. 194-195) afirma que o autocontrole é um tipo especial de solução de problemas. E, mesmo quando os problemas estão no m undo privado, é sempre o ambiente que seleciona o comportamento que os soluciona. A partir disso, podemos analisar por que, em épocas de regimes políticos totalitários, como o de 1964 a 1984 no Brasil, ocorrem situações em que certas autoridades impedem a divulgação de descrições de fatos sob controle dos próprios fatos. Isso prejudica a “consciência de mundo”. Um exemplo literário em que a consciência é prejudi cada por causa das contingências sociais está presente no livro 1984, de George Orwell. Ele conta a história de 9A possibilidade da defesa de um homem-sujeito em contraposição a um homem-objeto já havia sido inaugurada com a definição fundamental de comportamento operante, como aquele comportamento que age, que opera sobre o meio. Como afirma Skinner (1957) na primeira frase do Verbal Behavior: “Os homens agem sobre o mundo, e o modificam, e são, por sua vez, modificados pelas consequências de suas ações” (p. 1). um povo que, entre outros acontecimentos, tem a sua própria história reinventada por agências governamentais de acordo com o benefício que essas alterações proporcio narão ao governo. Assim, os cidadãos nunca estão cons cientes do que de fato ocorreu no passado e, portanto, não podem agir sobre seus próprios determinantes. E preciso observar, porém, que a consciência é necessária, mas não suficiente para o autocontrole. Existe a possibilidade de as variáveis estarem inacessíveis ou de o indivíduo não ter repertório suficiente para, mesmo ciente da sua situação, gerenciar-se por meio da manipulação das variáveis das quais seu com portam ento é função. M uitas vezes, são necessárias regras externas, como a de um terapeuta, para se estabelecer o autocontrole. COM PORTAM ENTO __________IN C O N SC IEN TE__________ Inicialmente, todos os nossos com portam entos são inconscientes. A descrição acontece a posteriori e é, como vimos, estabelecida pela comunidade. As contingências são efetivas a despeito de se o sujeito as observa e analisa. Por isso, todo o comportamento é basicamente inconsciente no sentido de que é modelado e m antido pelas contin gências. O que nos restaria, então, como problema não é o inconsciente, mas sim a consciência (Skinner, 1969). Então, esse inconsciente, primeiro, não seria problemático, se considerarmos que a comunidade cumprirá seu papel e estabelecerá a consciência. O segundo tipo de comportamento inconsciente que pode ser descrito pela análise do comportamento é seme lhante ao inconsciente reprimido, conforme encontramos na obra de Freud (1888). Ele ocorre basicamente como produto de práticas coercitivas, pois o reforço social que estabelece e mantém a auto-observação e a descrição pode simplesmente não ocorrer ou pode, em alguns casos, ser substituído por práticas punitivas, condição que levaria ao seguinte quadro: o próprio relato passa a produzir autoestimulação aversiva, que é cancelada ou evitada por outros comportamentos. Conse quentemente, o relato pode retroceder ao nível privado e supomos que pode deixar de ser emitido até mesmo no nível privado, e mesmo as respostas de auto-observação podem não mais surgir, dependendo da gravidade, do tempo de início e da frequência da punição. Nesse caso, é lícito o para lelo com o inconsciente recalcado da teoria freudiana. Conforme vimos, a consciência pode envolver a capa cidade de relatar a própria ação ou os sentimentos que a Consciência e Autoconhecimento 203 antecedem e, em um nível bem mais elaborado e mais difícil de atingir, o dar-se conta das razões do próprio comportamento. Nesse último caso, Skinner sustentaria, como Freud, que os seres humanos frequentemente não têm consciência da razão de sua conduta e, comumente, admitem razões distorcidas em virtude da repressão ou outras formas de controle que têm origem no meio social. Skinner (1953, pp. 289- 291) descreve este processo em detalhes: “Punição torna aversivos os estímulos gerados pelo próprio comportamento. Qualquer compor tamento que reduza tal estimulação é reforçado automaticamente. Entre os tipos de com porta mento que mais provavelmente geram estímulos aversivos condicionados como resultado de pu nição está o com portam ento de observar o ato punido ou de observar a ocasião para este ato ou qualquer tendência para executá-lo. Como resul tado de punição, não apenas nos engajamos em outro comportamento que exclui as formas pu nidas, nos engajamos em outro comportamento que exclui o conhecimento do comportamento punido ( ...) . Isto pode começar simplesmente como ‘não gostar de pensar’ no comportamento que levou às consequências aversivas. Pode, então, passar para o estágio de não pensar nele e, final mente, atingir o ponto no qual o indivíduo nega ter se comportado de determinada maneira diante de prova do contrário.” Grande parte das práticas culturais se fundamenta no controle aversivo. Skinner (1969) explicita que algumas das contingências culturais mais poderosas para provocar consciência envolvem punição, como quando se culpa alguém por ter feito algo. Como resultado, comportamento similar ou que tenha consequências similares pode causar estímulos aversivos condicionados, possivelmente sentidos como culpa ou vergonha. Isso pode impedir que a pessoa “adquira” consciência, isto é, pode impedir que ela desenvolva repertório de auto-observação e de autodescrição, conforme esperamos ter elucidado ao longo deste capítulo. A U T O C O N H E C IM E N T O E __________ PSICOTERAPIA__________ É possível que a comunidade não tenha estabelecido as contingências necessárias para produzir autoconheci mento. É possível também que práticas coercitivas tenham eliminado o autoconhecimento em alguns aspectos. Nos dois casos, por falta de repertório de autoconhecimento, o indivíduo não consegue criar autorregras em determinadas situações e, por isso, não consegue estabelecer o autocon trole. Nesses casos, ele poderá buscar ajuda na terapia. Alguns clientes dizem ao terapeuta que não têm muitos problemas, mas que pretendem “se conhecer melhor”. Isso pode significar queo seu déficit em relação ao autoconhe cimento é de tal magnitude que ele nem mesmo discrimina por que procurou terapia, ou seja, mesmo as respostas de auto-observação foram suprimidas por práticas coercitivas ou nunca estabelecidas. Em geral, podemos supor que há algum sofrimento, alguma situação na vida do cliente que lhe é aversiva. Ir à terapia é um modo de fuga ou de esquiva. Também é possível que o cliente que afirma não ter problemas e que seu objetivo é se conhecer melhor pode ser capaz de dizer por que procurou terapia, mas não o faz ao terapeuta. Neste caso, existem as respostas de auto- observação, mas o autotato foi suprimido provavelmente tam bém por um histórico de controle aversivo, coerci tivo. Então, dizemos que o cliente pode estar inconsciente em dois sentidos: no primeiro, as contingências estabele cidas por sua comunidade verbal foram insuficientes para estabelecer repertório de autoconhecimento; no segundo, contingências aversivas estabeleceram a diminuição de repertórios autodescritivos e até mesmo de respostas de auto-observação (este seria o inconsciente reprimido). E coerente supor que o objetivo da terapia é o auto conhecimento? Em parte, sim (de Rose, 2001). Conside rando que o autoconhecimento habilita o sujeito a analisar as relações funcionais dos próprios comportam entos e, a partir disso, construir autorregras que proporcionem maiores efetividade e contato com consequências reforça doras, é possível afirmar que um dos principais objetivos da psicoterapia é estabelecer um repertório de autoconhe cimento no cliente. De acordo com Skinner (1989, p. 46), a psicoterapia é um espaço para aumentar a auto-observação, para “trazer à consciência” aquilo que é feito e suas razões. Isso ocorre porque, durante a terapia, o cliente é solicitado a falar sobre o que está fazendo e por que o faz. Com o indi cado, o reforço contingente a respostas de autodescrição aumenta, consequentemente, a probabilidade de emissão de respostas de auto-observação. Q uando o terapeuta reforça as descrições do cliente a respeito de seus compor tamentos, respostas de auto-observação, necessárias e ante riores à descrição, também são fortalecidas. Como resul- 204 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento tado do processo terapêutico, o cliente pode se tornar cons ciente de determinados aspectos de sua vida por ter sido exposto a contingências que produziram discriminações em relação ao seu próprio repertório de comportamentos, aos seus eventos privados e à relação estabelecida entre esses comportamentos, sentimentos, sensações e o meio. U m aspecto im portante a ser considerado na terapia é o fato de que, muitas vezes, diz-se que o cliente não está preparado para ter consciência de determinados eventos de sua vida. Isso quer dizer que, se o terapeuta “der consciência”, ou seja, descrever os comportamentos do cliente e suas relações funcionais, ou mesmo levar o cliente a se auto-observar, mas não selecionar outro repertório para o cliente lidar com isso, o cliente pode entrar em desamparo. Como exemplo simples, podemos imaginar um cliente inserido em um a comunidade que pune pessoas com determinada orientação afetiva e que o cliente é uma dessas pessoas. Podemos supor que ele pode não estar consciente de sua orientação afetiva por causa do histórico de punição, que teve como consequência que qualquer com portam ento em direção a essa orientação afetiva causava autoestimulação aversiva condicionada, cuja retirada reforçava negativamente comportamentos incompatíveis com essa orientação. O terapeuta pode ser capaz de descrever esses fatos e suas análises. Se o terapeuta apressadamente apresentasse, direta ou indiretam ente (neste caso, modelando repertório de auto-observação), ao cliente que sua orientação afetiva não está de acordo com a orientação valorizada na comunidade, poderíamos supor que: ou o cliente negaria veementemente o fato, caso não tivesse nenhum repertório de auto-observação em relação a isso; ou o cliente entraria em desamparo, pois ele não teria repertório adequado de esquiva de tal situação aversiva. Aliás, esse é um dos principais motivos de ele procurar terapia. Nesse caso, o terapeuta pode, então, estabelecer regras para o cliente de modo que ele entre em contato com contingências que estabeleçam a auto-observação em determinadas situações e a autodescrição (mais próxima possível do tato puro). Além disso, o terapeuta pode agir como um a com unidade verbal não punitiva, de modo que os comportamentos de descrever do cliente, a partir daquelas auto-observações, possam surgir aos poucos. Os reforçadores fornecidos pelo terapeuta precisam ser os mais generalizados possível, para que o relato do cliente fique sob controle do Sd exclusivamente. De acordo com Skinner, a psicoterapia é um a agência de controle cuja prática principal é funcionar como audiência não punitiva, fazendo com que os comportamentos do cliente punidos pela comunidade possam emergir (Skinner, 1953) e, não sendo punidos, que se estabeleçam as condições para que a análise funcional seja feita. Assim, quando o cliente começar a descrever seus comportamentos e as relações funcionais que eles estabe lecem, ou seja, começar a ter consciência de que não está de acordo com a orientação afetiva mais valorizada social mente, o terapeuta precisa manter esses relatos por meio de reforçadores sociais generalizados. Podemos imaginar que o cliente evolui bastante na terapia e já consegue descrever grande parte daquilo que antes estava “reprimido”. Um passo adiante e bastante complexo seria: como estabelecer um novo repertório social fora da sessão? Como se esquivar das punições da com unidade verbal? Tal análise já está além do escopo do presente capítulo. Resta ainda uma importante questão: e o autoconheci mento do terapeuta? O terapeuta precisa fazer terapia? O terapeuta consciente seria aquele que consegue identificar o que sente pelo cliente e pela sua problemática e por que o sente. Sabe ainda como se comporta e por que o faz, em função de sua história de contingências, estando, assim, mais bem preparado para conduzir a relação terapêutica do que outro com pouco autoconhecimento. Considerando que a situação terapêutica é composta basicamente por episódios verbais, nos quais terapeuta e cliente alternam papéis de falante e ouvinte, no sentido de que um provê estímulos para o outro, os quais cons- troem a interação, a função desses estímulos pode variar enormemente de acordo com a história de contingências de cada um dos participantes dessa interação. Por isso, o autoconhecimento é importante enquanto repertório do próprio terapeuta, pois possibilita que ele analise essas funções na interação, por meio da auto-observação, mane jando os estímulos de modo mais eficiente. O u seja, o terapeuta precisa estar consciente, precisa ser capaz de descrever as funções que os estímulos forne cidos por cliente e terapeuta apresentam na interação em situação terapêutica. Nesse sentido, parte desse repertório refere-se ao autoconhecimento: o terapeuta saber quais funções que determinados estímulos têm para ele próprio. De acordo com Vandenberghe (2008), os sentimentos e as reações do terapeuta na sessão podem conter importantes dicas a respeito das contingências que operam nessa relação com o cliente. E o terapeuta precisa comparar essas contin gências com aquelas que ocorrem na vida do cliente fora da sessão. Nesse sentido, o papel do terapeuta é realizar uma análise funcional e não necessariamente topográfica. Consciência e Autoconhecimento 205 O terapeuta autoconsciente saberá discriminar entre as funções que determinadas ações do cliente têm em sua comunidade verbal de origem e na comunidade verbal que é o próprio terapeuta. Suponhamos outro exemplo: o cliente m antém um relacionamento afetivo extracon jugal e procurou a terapia por causa de desentendimentosconstantes com a pessoa com a qual mantém esse relacio namento. Suponhamos também que, na história de vida do terapeuta, o fato de alguém ter amante é severamente punido. Se o terapeuta não tem repertório de autoconheci mento em relação a isso, ele pode, por exemplo, trabalhar com a hipótese de que o cliente está infeliz por ter uma amante e não pelas características específicas do relacio namento com essa amante (considerando que com outra amante ele poderia não ter problemas). CONCLUSÃO Tradicionalmente, a consciência é entendida como a experiência subjetiva que temos a partir de nosso contato com o mundo, cuja ocorrência requer um mundo mental de dimensões não físicas e que pode ser acessada direta mente e estudada por meio da introspecção. No entanto, pela interpretação comportamental que apresentamos, o que é percebido em uma introspecção não é a mente ou um a coisa mental, mas o próprio corpo do observador (incluindo os estímulos produzidos de m aneira auto m ática por seu próprio com portam ento), e o conheci m ento obtido dessa m aneira talvez não seja confiável, pois os procedim entos de ensino de discriminação de eventos privados de que as comunidades dispõem não são tão precisos como se poderia desejar. O chamado “conteúdo consciente” também pode ser entendido em termos de controle de estímulo e estudado em labora tório por meio de experimentos de discriminação, muito embora o cientista só tenha acesso ao com portam ento do organismo e não às suas experiências subjetivas dire tam ente (i. e., o cientista do com portam ento não tem como saber que houve uma discriminação até que o orga nismo se comporte de maneira diferencial com relação ao estímulo discriminado). O com portam ento é, em boa m edida, incons ciente, porque não podemos nos observar e descrever sem pre que nos com portam os, e tam bém porque as contingências de reforço a que estam os subm etidos continuam sendo efetivas mesmo quando não temos conhecim ento delas. N ão precisamos estar conscientes das causas de nossas ações para que essas causas sejam efetivas (Skinner, 1971, p. 193). De acordo com o autor (Skinner, 1959/1972, p. 247): “Começamos por atribuir os comportamentos do indivíduo a eventos na sua história genética e am biental. Então notamos que, por causa de certas práticas culturais, o indivíduo pode vir a descre ver alguns desses comportamentos e algumas de suas relações causais. Podemos dizer que ele está consciente das partes que ele consegue descrever e inconsciente do resto.” Para que haja com portam ento consciente, porém, é preciso que exista uma comunidade verbal que estabeleça os repertórios especiais de auto-observação e de autodes- crição, porque as situações naturais em que esses compor tamentos são reforçados são raras. Uma pessoa geralmente aprende a se discriminar respondendo a perguntas que os membros da comunidade fazem sobre ela mesma, e o controle que a estimulação originada no corpo da própria pessoa exerce sobre seu comportamento descritivo torna se mais acurado conforme as consequências são aplicadas contingentemente (como em qualquer discriminação). A privacidade dos eventos relatados é uma dificuldade a ser contornada nesse processo e impõe limites para o conhe cimento obtido dessa maneira, tanto para a comunidade como para a própria pessoa. Assim, a comunidade ensina o indivíduo a falar de coisas às quais ele mesmo não tem acesso, o que diminui sobremaneira a precisão do relato. Por fim, um outro tipo de autoconhecimento (distinto da autodiscriminação) surge quando a pessoa adquire repertório verbal, pois então o que ela faz pode ser descrito por ela mesma e pelos outros; e esses relatos podem ser facilmente transformados em regras que, empregadas como antecedentes, servem para dirigir seu com por tam ento em situações novas (em que o indivíduo tem pouca ou nenhum a exposição a contingências similares) e melhorar suas habilidades de autogerenciamento — o que tem grande campo de aplicação nos assuntos humanos. Afirmamos que a consciência é requisito para o autocon trole, fundam ental para a autodeterm inação em vários aspectos, conforme analisado neste capítulo: em relação à política, à ciência, à psicoterapia e a muitos outros. Logo, para termos uma política promissora, uma ciência eficaz e uma psicoterapia que se faça desnecessária o mais rápido possível (i. e., que leve seu cliente à independência do tera peuta), é preciso que se estabeleça um comportamento o qual denominamos “consciência”. 206 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento Ressaltamos ao longo de todo o capítulo o papel da comunidade na seleção de repertórios de auto-observação e de descrição daquilo que se observa. Nesse sentido, a consciência tem origem social. Por isso, diferentes socie dades estabelecem consciências diferentes. Segundo Skinner (1974/1976, p. 186): “Diferentes comunidades geram tipos e quantida des diferentes de autoconhecimento e diferentes maneiras de uma pessoa explicar-se a si mesma e aos outros. Algumas produzem a pessoa profunda mente introspectiva, introvertida ou voltada para dentro; outras produzem o extrovertido sociável. Umas produzem as pessoas que só agem após cui dadosa consideração das possíveis consequências; outras, os tipos imprudentes e impulsivos. Certas comunidades produzem pessoas particularmente conscientes de suas reações à arte, música ou lite ratura; outras, de suas relações com aqueles que as cercam. As perguntas feitas pelos psicólogos men- talistas e as feitas pelos behavioristas naturalmente produzem diferentes espécies de autoconhecimen to. As perguntas feitas pelos primeiros acentuam como uma pessoa se sente acerca das coisas.” Considerando o que se discutiu neste capítulo, poderíamos então falar em dois tipos de comportamento inconsciente na análise do com portam ento. Temos um inconsciente inicial, um inconsciente primeiro, pois em princípio não descrevemos nada até que sejamos ensi nados pela comunidade verbal. Um segundo tipo seria o inconsciente reprimido, não descrito por causa de um histórico de coerção (controle aversivo: reforço negativo e/ou punição). Além disso, é possível aproximar, de algum modo, consciência e liberdade. Vejamos: Skinner definiu 3 circunstâncias em que dizemos que somos livres (Skinner, 1968/2003). A primeira diz respeito ao controle por refor çamento positivo; quando agimos sob controle de reforça mento positivo, agimos com prazer e nos sentimos livres; acima de tudo, não nos revoltamos, nem fugimos do controle, nem estabelecemos um contra-ataque. O segundo tipo de liberdade refere-se à liberdade de consequências positivas imediatas que levariam a consequências aversivas atrasadas, como o uso de drogas, por exemplo. Um último tipo de liberdade analisado pelo autor provém da auto confiança. Isso ocorre quando o indivíduo age menos por regras estabelecidas por outras pessoas e mais por contin gências com relação às coisas. Talvez possamos supor a consciência, conforme analisada neste capítulo, sob a inter pretação do Behaviorismo Radical, como um quarto tipo de liberdade, pelo fato de possibilitar a ação do indivíduo sobre os determinantes de seu próprio comportamento. Vimos como a história de exposição às contingências pode alterar o m odo como vemos as coisas e tam bém maneiras como o autoconhecim ento pode ser adqui rido. Porém, isso ainda não é o fim da discussão sobre a consciência, e levantamos algumas questões de início que ainda permanecem em aberto (o que é de se esperar, pois trata-se de um assunto controverso e bastante estudado atualmente). As neurociências certamente devem ter um papel im portante na explicação do assunto, até porque uma análise comportamental não é capaz de vencer a priva cidade da experiência subjetiva - mas tenta lidar com ela de maneira indireta tanto conceitualmente (em que regula- ridades observadas publicamente são extrapoladasao nível privado) como experimentalmente (por meio de experi mentos de discriminação como os citados) — e resta esperar que o avanço das técnicas de instrumentação neurofisioló- gica possam progredir e fornecer novas pistas sobre essas ocorrências privadas. A história ambiental também tem um papel nessa explicação, o que coloca a interpretação comportamental que apresentamos como uma proposta viável do estudo científico de ao menos alguns aspectos da consciência, e com perspectivas promissoras, com destaque para as aplicações práticas imediatas a assuntos relacio nados com a questão do autoconhecimento. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Crick FH. 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O que cuida remos de mostrar neste capítulo é como a consciência pode ser interpretada de maneira comportamental e, embora uma definição mais adequada deva esperar até que as ideias principais tenham sido apresentadas, podemos adiantar desde já que o com portam ento verbal tem um papel central nessa interpretação - algo que talvez fosse insus peito, haja vista nossa discussão até o momento. No que se segue, tentaremos esclarecer, principalmente, a interpretação comportamental dada por Skinner (1969, 1974 e em diversas passagens) à consciência, e que ainda hoje é aquela adotada por cientistas e analistas do compor tamento. Também vamos apresentar alguns relatos expe 3William James (1890) deve ter sido o primeiro a argumentar que a consciência deve ter consequências benéficas, pois, se não fosse efetiva nesse sentido, ela não poderia ser submetida à seleção natural, uma vez que tê-la não seria uma vantagem evolutiva - e então podemos pensar que nossa espécie tornou-se (e permaneceu) consciente por um acidente fortuito no curso da sua evolução. Como veremos, Skinner (1969, 1974) entende a consciência como um tipo de comportamento que requer educação e que se reverte, em última análise, em melhores chances de sobrevivência para as comunidades que tornam seus membros conscientes. 190 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento rimentais e discutir sobre a aplicação desse conhecimento à psicoterapia. Iniciaremos discorrendo brevemente a respeito da possibilidade do estudo dos eventos privados pela ciência do comportamento, já que a questão da priva cidade da experiência consciente é uma de suas caracterís ticas mais problemáticas. _______ EVENTOS PRIVADOS_______ Podemos pensar, inicialmente, que os eventos privados, em geral, e a consciência, em particular, realmente são um grande desafio para o Behaviorismo Radical. Afinal, como poderia uma ciência cuja proposta é observar o compor tamento manifesto e as condições em que ele ocorre - e, a partir disso, encontrar regularidades que serão expressas como leis ou princípios do com portam ento dos orga nismos - lidar com esses eventos inacessíveis e que parecem pressupor um m undo mental? Para responder a essa inda gação, vamos discorrer, agora, a respeito do tratamento que Skinner (1969, 1974) dá aos eventos privados e, em seguida, sobre a natureza do “conteúdo consciente” (ou seja, sobre o modo como as coisas nos aparecem em nossa experiência subjetiva). Primeiramente, é preciso considerar que Skinner (1945/1972; cf. Capítulo 1 deste livro para mais detalhes), ao formular o Behaviorismo Radical, abandona o critério de verdade por concordância adotado pelos behavioristas metodológicos, critério esse que tem como consequência a recusa do estudo científico da experiência subjetiva, uma vez que essa é inacessível a observadores independentes. Colocando de outra maneira, a classe de fenômenos natu rais que chamamos de “privados” ou “subjetivos” é excluída da investigação científica de maneira categórica porque conflita com tal concepção de ciência, e que Skinner termina por rejeitar, uma vez que essa consequência nao lhe parece razoável. Skinner afirma (1974, p. 21): “Uma pequena parte do universo está encerrada dentro da pele de cada um de nós. Não há razão pela qual ela deveria ter um status físico especial porque ela está dentro dessa fronteira, e talvez possamos ter um tratamento completo dela pela anatomia e fisiologia (...). Nós a sentimos e em algum sentido observamos, e poderia parecer tolo negar essa fonte de informação só porque não mais que uma pessoa pode fazer contato com seu m un do interior. Entretanto, nosso comportamento, ao fazer esse contato, precisa ser examinado.” O que Skinner (1969, 1974) pondera é que, por um lado, não há razão para excluir os eventos privados de consideração científica só porque eles são acessíveis apenas para a própria pessoa que os tem e não podem ser examinados por observadores independentes (afinal, é esse mesmo o significado de “privados”); por outro lado, admitir o estudo científico desses eventos não significa aceitar que eles tenham um status diferenciado e não sejam físicos. Por fim, aquilo que sentimos e que podemos relatar não pode ser simplesmente tomado pela ciência como um dado confiável, e faz-se necessário um exame conceituai rigoroso à luz das descobertas da ciência de m odo que possamos entender como esses eventos privados e físicos se relacionam com o comportamento. Skinner, então, recorre à fisiologia para tentar esclarecer esse ponto e constata que os eventos que ocorrem no inte rior dos nossos corpos são percebidos por meio de sistemas perceptivos internos, bastante primitivos se comparados ao nosso sistema perceptivo orientado ao exterior (ou seja, exteroceptivo, composto pelos chamados “órgãos dos sentidos”), e que foram selecionados porque cumprem funções biológicas importantes na percepção dos órgãos internos, e do equilíbrio, da postura e do movimento (ou seja, sistemas interoceptivo e proprioceptivo, respectiva mente). Entretanto, com o aparecimento do comporta m ento verbal, esses sistemas perceptivos passaram a ser empregados com um a função distinta, isto é, as pessoas da comunidade passaram a fazer alguns tipos de ques tões umas às outras que requeriam um tipo de responder ao próprio corpo diferente daquele que acontece normal mente. Questões do tipo “você está com fome?” e “onde você vai amanhã?”, ou mesmo aquelas mais gerais, como “o que vai fazer?” ou “como você se sente?”, são úteis para as pessoas da comunidade porque possibilitam antecipar o comportamento da pessoa questionada, ou para se obter informações sobre algo que não está diretamente acessível (p. ex., suas necessidades ou sentim entos...). As pessoas a quem são feitas essas questões são levadas a discriminar seus estados internos, pois dessa maneira elas podem responder de maneira razoavelmente adequada e então ser reforçadas (ou corrigidas) pela comunidade de modo contingente. Assim, embora as sensações corporais nos acompa nhem desde sempre, Skinner (1945/1972, 1969, 1974) observa que é somente com a ajuda da comunidade verbal que essas sensações tornam-se discriminativas para nós. Aqui, o autor inverte uma tese bastante difundida — de que temos conhecimento privilegiado e imediato daquilo Consciência e Autoconhecimento 191 que ocorre em nossos corpos e em nossa consciência. De fato, temos um contato bastante íntimo com a estimulação privada, que nao é diretamente acessível às outras pessoas e que sempre nos acompanha (p. ex., podemos “fugir” do dentista, mas não da dor de dente ...). Mas, se não fosse por intermédio dos membros da comunidade verbal em que estamos inseridos, certamente seriam muito raras as ocasiões em que discriminaríamos nossos próprios estados corporais, pois é por intermédio da com unidade que nossos relatos a respeito de nossos estados corporais (ou seja, privados) podem ser reforçados de maneira contin gente. Esse tipo de autoconhecimento tem, pois, origem social— o que também ocorre com a consciência.4 No entanto, embora seja a comunidade verbal a respon sável por nos ensinar a discriminar e a nomear nossas sensações corporais — que passamos a chamar então de “sentimentos” (p. ex., medo, amor, raiva, angústia...), seus membros encontram na privacidade dos nossos estados corporais uma dificuldade considerável, uma vez que não têm acesso direto à “ocasião” em que nosso comportamento deve ser reforçado de contingentemente. Esse problema, não obstante, pode ser superado em uma medida razoável com a ajuda de certos indícios de que um evento privado ocorreu (p. ex., se uma criança cai, se machuca e começa a chorar, esses são indícios de que ela está sentindo dor, e a comunidade pode então modelar seu comportamento verbal de acordo). Entretanto, a com unidade nunca consegue ser tão precisa nesse ensino como poderia ocorrer com o ensino dos eventos públicos, e isso resulta em uma imprecisão ou vagueza inerente aos relatos que emitimos sobre a ocor rência de eventos privados - o que é sempre um problema com relação à confiabilidade desses dados se tentarmos usá-los, por exemplo, para realizar investigações científicas. Ademais, os membros da comunidade geralmente recebem relatos de eventos privados com uma certa desconfiança, ainda mais quando tais relatos intermedeiam recompensas ou a suspensão de condições aversivas (p. ex., “estou com dor de cabeça e não posso continuar trabalhando ...”). Para o próprio indivíduo, a consequência é que seu auto conhecimento é incompleto ou inadequado e ele encontra limitações para se gerenciar de maneira eficiente. 4Sobre o autoconhecimento, Skinner diz: “O autoconhecimento tem origem social, e ele é útil primeiro à comunidade que faz as questões. Depois, ele se torna importante para a própria pessoa - por exemplo, em se gerenciar ou controlar...” (Skinner, 1974, p. 169). De acordo com a interpretação comportamental, então, tomar os eventos privados como objeto de estudo científico não significa assumir um compromisso com um mundo não físico da vida mental; mas ainda é preciso esclarecer sobre o assunto do conteúdo consciente, cuja privacidade impõe questionamentos similares. C O N TEÚ D O CO NSCIENTE Tradicionalmente, quando se fala em conteúdo cons ciente, entende-se uma espécie de “recorte” em que algum aspecto momentâneo no correr de nossa experiência subje tiva é enfatizado ou examinado — como quando vemos o vermelho de uma maçã, temos uma dor de dente ou expe rimentamos um sentimento de angústia. Sobre as dificul dades impostas pelo assunto a uma interpretação compor tamental, Skinner (1974, p. 72) comenta: “Talvez o problema mais difícil enfrentado pelo behaviorismo tenha sido o tratamento do conteú do consciente. Nós não somos todos familiares com cores, sons, gostos e cheiros que não têm contrapartes no mundo físico? Qual é o seu lugar em um tratamento behaviorista [radical]? Creio que a resposta deve ser encontrada no papel es pecial designado aos estímulos em um a análise operante.” O problema do conteúdo consciente é difícil porque experiências como as citadas não têm contrapartes no m undo físico (p. ex., um comprimento de onda eletro magnética tem propriedades distintas das cores como essas nos aparecem) e, por serem privadas, não só tornam a investigação científica difícil, como parecem pressupor um mundo mental em que possam ocorrer. Entretanto, como nosso autor bem disse, uma interpretação compor tamental do assunto deve considerar o papel dos estímulos, ou melhor, do controle que esses estímulos exercem sobre o comportamento operante, e vamos iniciar a discussão com uma breve exposição do assunto (ver Capítulo 2 deste livro para maiores detalhes). Estímulos adquirem certo controle sobre uma resposta quando esta é reforçada em sua presença, isto é, respostas desse tipo tornam-se mais prováveis de ocorrer quando esse estímulo está presente - ou quando o fazem outros estímulos que compartilham suas propriedades. Dizemos que esses estímulos estabelecem a ocasião ou que se tornam discriminativos para a resposta em questão, e tais estímulos também podem surgir em conjunto com outras condições 192 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento motivacionais que influenciam de maneira momentânea a probabilidade de emissão, como a privação ou a presença de estimulação aversiva. O controle assim estabelecido pode ser modificado de duas maneiras. H á uma generalização quando a resposta é emitida em uma condição algo similar àquela em que foi reforçada, mas em que apenas algumas das proprie dades da ocasião original estão presentes, outras podendo diferir. Porém, se a resposta for consistentemente reforçada quando apenas uma propriedade particular estiver presente, essa última termina por ganhar controle exclusivo por um processo chamado de discriminação, e o comportamento pode ficar sob controle de variações muito sutis da proprie dade envolvida por meio desse procedimento. Skinner (1974, p. 74) afirma que o papel do estímulo dá ao compor tamento operante um caráter especial, uma vez que: “O comportamento não é dominado pela situação (.setting) atual, como parece ser na psicologia do tipo estímulo-resposta... Não obstante, a história ambiental ainda está no controle; a dotação gené tica da espécie juntamente com as contingências às quais o indivíduo foi exposto ainda determinam o que ele irá perceber.” Assim, aquilo que percebemos depende do controle que os estímulos da situação exercem sobre nosso comportamento subsequente — e tal controle não determina completamente a ocorrência desse comportamento, mas torna sua ocorrência mais provável. O controle exercido pelos estímulos em uma situação atual depende das contingências de reforço a que fomos expostos em nossa história passada e isso só é possível, em última análise, porque nossa espécie tornou-se sensível a essas contingências no decorrer de sua evolução. Até aqui temos uma explicação de como nosso compor tamento fica sob controle de estímulos que se encontram ao nosso redor e de como esse controle pode tornar-se muito preciso por intermédio de procedimentos de discriminação, mas ainda falta explicar o que ocorre com relação a compor tamentos como imaginação, alucinação, ou mesmo sonhos, casos em que temos percepções, mas aquilo que é percebido não está presente em nosso ambiente imediato. Ademais, não são justamente esses os casos mais problemáticos e que reforçam a ideia de que é necessário um mundo mental? Psicólogos e filósofos mentalistas certamente concordariam e também parecem ter uma resposta pronta para explicar os fenômenos em questão, e que é a seguinte. A chamada “teoria da cópia”, concebida inicialmente pelos filósofos gregos, foi sendo reformulada ao longo da história e chegou até nós, sendo aquela que é adotada, em linhas gerais, pelos psicólogos cognitivistas.5 De acordo com ela, quando percebemos o mundo, fazemos cópias internas que ficam guardadas e que depois podem ser vistas novamente quando queremos ver uma coisa percebida anteriormente, mas que, por conta das circunstâncias, está inacessível para observarmos no m omento. Essa teoria foi formulada para dar conta não somente das imagens lembradas, mas também da imaginação e da alucinação, de modo que características das cópias que temos podem ser recombinadas para formar algo novo. (Não é difícil perceber que uma teoria desse tipo se ajusta muito bem à linguagem da informática, em que termos como armaze namento e recuperação de informações são corriqueiros, e é um dos motivos pelos quais a analogia entre mentes e programas computacionais tornou-se popular.) Algumas críticas podem ser feitas a essa teoria. Primei ramente, é preciso explicar como o m undo é copiado ou armazenado nos organismos e como essas cópias podem ser recuperadas depois para que possamos observá-las, e é para isso que as metáforas são empregadas.Porém, talvez não exista qualquer suporte empírico a essas metáforas ou talvez elas possam ser refutadas pelas evidências cien tíficas de que dispomos, devendo então ser substituídas por outras. A posição de Skinner (1974) em favor de um a análise operante é que, em bora sejamos estim u lados pelos objetos de nosso am biente próximo, esses não são absorvidos ou replicados pelo organismo, mas a estimulação passa a controlar o comportamento, como acabamos de ver.6 5No diálogo Teeteto, Platão (2001) emprega metáforas para ilustrar o processo de aquisição do conhecimento e sua lembrança ou esquecimento. Primeiramente, supõe que o funcionamento mental seja como um bloqueto de cera quente em que os objetos que percebemos são estampados. Assim, o filósofo podia explicar a nossa lembrança desses objetos como um novq exame das imagens criadas, e seu esquecimento quando a estampagem fosse defeituosa ou quando a imagem, posteriormente, se apagasse. Depois, postula que a mente seja como um aviário, em que as coisas que conhe cemos são como os pássaros aprisionados ali, disponíveis para que possamos apanhá-los e inspecioná-los novamente quando necessário. Platão emprega essas metáforas apenas para estudo e termina por considerá-las inadequadas e rejeitá-las, mas isso não impediu que a mesma ideia de “copiar (ou arma zenar) para lembrar” fosse reciclada com o passar do tempo, com o uso de novas metáforas para substituir as antigas quando estas acabaram caindo em descrédito ou passaram a conflitar com a evidência empírica disponível. 6Skinner (1974, p. 73) diz que “em uma análise operante, e no Beha viorismo Radical que é construído a partir dela, o ambiente fica onde está e onde sempre esteve — fora do corpo”. Entretanto, é preciso cuidado ao interpretar essa passagem, porque nosso autor está, aqui, argumen tando contra os psicólogos cognitivistas e a teoria da cópia, e, também, principalmente, por conta de que nosso corpo pode nos estimular, de modo que serve também de “ambiente”, isto é, essa estimulação pode vir a controlar nosso comportamento, o que deve ficar mais claro adiante. Consciência e Autoconhecimento 193 Em segundo lugar, e mais importante, a teoria da cópia não dá conta, por fim, de explicar o comportamento de ver. Ora, se o mundo é copiado internamente, o que vemos quando olhamos para nossas cópias? Supor que uma nova cópia é criada é cair em um regresso infinito, pois cada tentativa de ver deveria criar uma cópia a partir de outra cópia e assim por diante. Em algum momento, devemos, pois, fazer algo além de criar cópias dos estímulos obser vados, e isso a teoria da cópia, por si mesma, deixa comple tamente sem explicação. Skinner (1974, p. 85-86) afirma o seguinte sobre essa discussão: “Que uma pessoa possa ver coisas quando não há nada para ser visto deve ter sido uma forte razão por que o m undo da mente foi inventado. Era suficientemente difícil imaginar como uma cópia do ambiente atual poderia parar dentro da cabe ça onde ela poderia ser ‘conhecida’, mas havia ao menos um mundo exterior que podia dar conta disso. Porém, puras imagens parecem indicar uma pura coisa mental. É somente quando nos pergun tamos como o mundo ou uma cópia do mundo é vista que perdemos o interesse em cópias. Ver não requer uma coisa vista.” Então, embora a teoria da cópia tenha sido concebida para explicar como podemos ver quando não há nada para ser visto (o que, a princípio, certamente deve ter causado perple xidade aos antigos), ela termina por deixar sem explicação o próprio comportamento de ver. A respeito desse último ponto, Skinner (1974, p. 85) indica uma solução ao afirmar que tal comportamento não requer uma coisa vista: “H á muitas maneiras de fazer um a pessoa ver quando não há nada para ser visto, e elas podem ser todas analisadas como arranjos de contingên cias que fortalecem o comportamento perceptual. (...) não há imagens no sentido de cópias priva das, há comportamento perceptual.” Podemos considerar então que, se não há cópias para serem vistas dentro dos organismos, aquilo que resta para ser visto quando o objeto está ausente é o próprio compor tamento de ver. Porém, como isso é possível? Muitas vezes o com portam ento de ver é, ele mesmo, reforçador, seja porque apreciamos o objeto visto, ou porque ver uma situação torna possível, por exemplo, resolvermos um problema. Assim, na ausência do objeto visto e com m oti vação para vê-lo (i. e., privação ou estimulação aversiva), podemos emitir comportamentos para produzir o próprio objeto ou algo parecido (como ver uma fotografia). Mas, como sabemos, podemos ir além e ver o objeto na ausência de qualquer estimulação similar em nossas imediações. Tal com portam ento é m uito semelhante àquele de ver em circunstâncias normais. Ocorre que a privação a que estamos submetidos aumenta a probabilidade de emissão de um a resposta privada e que causa um a estimulação similar à que somos expostos quando vemos o objeto em nosso ambiente próximo. Vamos explicar um pouco mais sobre o tipo de estimu lação envolvida. Qualquer comportamento produz estimu lação colateral que é produzida automaticamente quando emitimos respostas. Essa estimulação é proveniente da alte ração a que nossos corpos se submetem e é captada pelos sistemas perceptivos de que falamos; a estimulação provocada pode ser tanto pública como privada, dependendo da locali zação do estímulo (i. e., dentro ou fora da pele). A estimulação automática (ou autoestimulação) é importante na interpre tação comportamental de vários tipos de comportamentos, uma vez que são os estímulos — e não as respostas — que controlam o comportamento, isto é, respostas não podem controlar respostas subsequentes, a não ser que haja uma estimulação intermediária que estabeleça esse controle. Dessa maneira, quando vemos, na ausência da coisa vista, emitimos, por conta da motivação estabelecida ante riormente, uma resposta privada que nos estimula auto maticamente; e é esse mesmo estímulo privado autopro- duzido e similar que observamos sem que a coisa figurada esteja presente em nossas imediações. De maneira mais técnica, trata-se de um encadeamento em que a resposta privada cria a ocasião para a observação por meio de uma estimulação produzida automaticamente quando houve a ocorrência da primeira. Discorremos, até o m omento, sobre a interpretação comportamental do “conteúdo consciente”, que pode ser feita a partir do conceito de controle pelo estímulo. Entre tanto, Skinner (1969, 1974) sustenta, ainda, que não é a percepção somente — seja essa de eventos privados ou públicos — que causa o problema da consciência, mas um tipo especial de contingência que nos leva a “ver que estamos vendo”, o que é o mesmo que ter consciência de que vemos. Ele diz (Skinner, 1969, p. 233, grifos do autor): “Não é, entretanto, ver (...) que levanta a questão da consciência, mas Ver que estamos vendo ( .. .) ’. Não há contingências naturais para esse comporta mento. Nós aprendemos aver que estamos vendo somente porque uma comunidade verbal arranja para que o façamos. Nós geralmente adquirimos o 194 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento comportamento quando estamos sob estimulação visual apropriada, mas não segue que a coisa vista deva estar presente quando vemos que a estamos vendo. As contingências arranjadas pelo ambiente verbal podem estabelecer respostas autodescritivas que descrevem o comportamento de ver mesmo quando a coisa vista não está presente.” Vamos tentar explicar essa passagem em algum detalhe. Percebemos, isto é, somos controlados por estímulos do nosso ambiente próximo porque as contingências a que fomos expostos em nossa história passada estabeleceram esse controle, porém a comunidade verbal faz perguntas sobre nós mesmos e que estabelecem a ocasião em que a auto-observação será reforçada, uma vez que assim essas questões poderão ser respondidas de modosatisfatório. Aprendemos, dessa maneira, a relatar eventos privados como sentimentos e sensações corporais, ou mesmo aquilo que imaginamos e com que sonhamos (nesses últimos casos, falamos sobre coisas que percebemos e que não estão presentes). No entanto, as contingências continuam a ser efetivas mesmo quando não temos conhecimento do que fazemos ou estamos impossibilitados de nos observar, e essas últimas condições terminam por fazer diferença no modo como nos comportamos. Skinner (1974, p. 220, grifos nossos) esclarece um pouco mais sobre o ponto ao discorrer sobre os sentidos do termo “consciência”: “N o sentido em que dizemos que um a pessoa está consciente de suas circunvizinhanças, ela está consciente de estados ou eventos em seu corpo; ele está sob seu controle como estímulos. Um boxea dor que está ‘inconsciente’ não está respondendo a estímulos atuais de dentro ou fora da sua pele (...). Uma pessoa se torna consciente em um sentido diferente quando uma comunidade verbal arranja contingências sob as quais ele não apenas vê um objeto, mas vê que o está vendo. Nesse sentido es pecial, a consciência (...) é um produto social.” Aqui, Skinner (1974) distingue dois “sentidos” em que poderíamos empregar a palavra “consciência”. O primeiro é aquele em que há controle de estímulo envolvido, com resultado de que a pessoa ou o organismo se comporta de maneira diferencial quando aquele estímulo está presente, como vimos. Esse é um sentido mais rudimentar, em que o termo é usado para verificar se o organismo comporta-se diferencialmente em relação aos estímulos de seu ambiente e que não provoca maiores problemas conceituais ou empí ricos, uma vez que podemos decidir sobre o estabeleci mento desse controle por meio da manipulação dos estí mulos em questão. H á tam bém um segundo sentido, mais elaborado, aquele em que estamos interessados. Skinner (1974) afirma que uma pessoa está consciente quando “vê que está vendo” e, nesse caso, não é apenas o objeto visto que controla o comportamento subsequente — como no caso anterior —, mas também os estímulos produzidos auto maticamente pelo ato de ver. Assim, a pessoa observa e se observa ao mesmo tempo, podendo, então, descrever não só aquilo que vê, mas também o que ela faz e como se sente enquanto vê (daqui por em diante, usaremos a palavra “consciência” nesse sentido específico apenas). A diferença entre as duas situações fica mais evidente se considerarmos que, quando as contingências são efetivas, comportamo- nos sob controle dos estímulos da situação mesmo sem saber que o fazemos ou estarmos conscientes nesse último sentido. Por fim, a consciência é um produto social porque as contingências responsáveis pela aquisição e manutenção dos comportamentos requeridos de auto-observação e de descrição não estão disponíveis no ambiente não social, havendo a necessidade de uma comunidade verbal que as estabeleça. Há, ainda, um últim o ponto que é preciso discutir antes de passarmos para o assunto seguinte. Tradicional mente, um exame mais detido ou sistemático do conteúdo consciente é chamado de introspecção, que poderíamos entender como um modo de auto-observação cuidadosa e dirigida, principalmente, aos nossos eventos privados (em uma introspecção, a maior preocupação é com a experi ência subjetiva em si e não precisa haver um questiona m ento sobre aquilo que a causou). Vimos, no entanto, que as questões sobre o conteúdo consciente podem ser interpretadas em uma análise comportamental em termos do controle que estímulos terminam por adquirir sobre o comportamento operante; e que uma pessoa consciente “vê que está vendo” - o que certamente ocorre em uma intros pecção, pois se trata de um exame cuidadoso da própria experiência subjetiva. Por fim, o comportamento descritivo também tem um papel importante no processo, uma vez que podemos empregar os relatos assim obtidos para guiar o processo de auto-observação e também para comparti lhar com os outros as experiências vividas (investigaremos o papel desse tipo de comportamento mais adiante). Contudo, existe um problema com a introspecção que é algo típico dos eventos privados e sobre o qual já discor remos. As contingências de reforçamento arranjadas pela Consciência e Autoconhecimento 195 com unidade verbal em que estamos inseridos não são suficientemente precisas para que possamos discriminar eventos privados de maneira acurada, e o resultado é que os relatos das experiências que temos quando nos intros- peccionamos provavelmente não serão dados confiáveis ou mesmo replicáveis (como aprenderam a duras penas os psicólogos introspeccionistas do início do século 20. Então, embora a introspecção seja, também, um modo de autoconhecim ento, devemos questionar a respeito da confiança que podemos ter no conhecimento assim adquirido ou mesmo ponderar sobre sua eficiência frente a outros tipos de autoconhecimento, como a descrição das contingências a que estamos submetidos.7 Dissemos que o comportamento consciente depende do desenvolvimento dos repertórios especiais de auto- observação e de autodescrição - que dão origem ao auto conhecimento e que são adquiridos por intermédio da comunidade verbal —, e que serão explorados em maior detalhe. Discorreremos agora sobre comportamentos de auto-observação e também sobre o processo de autodis- criminação. AUTO-OBSERVAÇÃO E A U TO C O N SC IÊN C IA Podemos perceber não somente aquilo que está à nossa volta, mas também nossos corpos e aquilo que fazemos. Assim, podemos considerar que nossos corpos também fazem parte do nosso ambiente, uma vez que produzem estímulos que podem, eventualmente, controlar nosso comportam ento se as contingências forem apropriadas; e o mesmo se dá com o com portam ento, que é outra fonte importante de estimulação, já que, como vimos, as respostas que emitimos nos estimulam automaticamente (e, igualmente, essa estimulação pode se tornar discrimi nativa, dependendo das contingências em vigor). C om portam entos de auto-observação podem levar pessoas a discriminarem a si mesmas - um modo de auto conhecimento geralmente chamado de “autoconsciência” 7Skinner (1974, p. 16-17) diz: “O Behaviorismo Radical (...) não nega a possibilidade da auto-observação ou do autoconhecimento ou a sua possível utilidade, mas ele questiona a natureza do que é sentido ou observado e, portanto, conhecido. Ele restaura a introspecção, mas não aquela que filó sofos e psicólogos introspeccionistas acreditaram estar espectando’ (...) [O Behaviorismo Radical] simplesmente questiona a natureza do objeto observado e a confiabilidade das observações. A posição pode ser expressa da seguinte maneira: o que é sentido ou observado introspectivamente não é um mundo não físico da consciência, da mente ou da vida mental, mas o próprio corpo do observador.” (self-awareness) na literatura especializada.8 Então, podemos não só discriminar nossos corpos e nosso comportamento, mas também, mais ampliadamente, as consequências que se seguem às nossas ações e a relação entre elas (z. e., as contingências de reforçamento a que estamos subm e tidos). Entretanto, as contingências em que comportamentos de auto-observação são reforçados de maneira contingente são raras na natureza e por isso devem ser ensinadas pela comunidade por meio de procedimentos que envolvem o com portam ento verbal. Ainda assim, a auto-obser vação não é algo que somente seres humanos podem ser ensinados a fazer; animais também podem se observar e discriminar se as contingências apropriadas forem estabe lecidas (apesar de não possuírem repertório verbal). Vamos discutir brevemente alguns experimentos que mostram como esse treinamento pode ser realizado, o que também contribuirá para esclarecer sobre o estabelecimento desses comportamentos em humanos. Discriminação condicional do próprio comportamento Há experimentos com animais na literatura da Ciência do Com portam entoque tentam estabelecer com porta mentos que ficam sob controle daquilo que esses orga nismos fizeram anteriormente (cf. Dymon; Barnes, 1997; Souza; Abreu-Rodrigues, 2007). Nesses experimentos, geralmente são estabelecidas tarefas de discriminação condicional em conjunto com certos esquemas de reforça mento, de modo que é o próprio comportamento anterior do organismo que será discriminado condicionalmente. A peculiaridade desse tipo de estudo é que o operante emitido de início não é sempre o mesmo; ele é variável, pois é controlado ora por um ora por outro esquema de reforçamento previamente estabelecidos, o que torna a discriminação do próprio comportamento necessária para a produção consistente de reforçadores. Lattal (1975) realizou um experimento com pombos em que não apenas o comportamento anterior se tornava discriminativo, mas sim a própria contingência (z. e., esquema) de reforçamento em vigor anteriormente. O sO termo “autoconsciência” (self-awareness) é concebido de maneira mais restrita e, em geral, aplica-se à experiência de condições que são privadas, em oposição à consciência (consciousness), que envolve também a experiência com eventos publicamente observáveis. Porém, há cientistas do comporta mento que preferem reservar o primeiro termo para discriminações que um organismo faz de seu próprio comportamento (Dymon, Barnes, 1997). 196 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento experimento consistiu em uma tarefa de discriminação condicional (/. e., matching-to-sampleou escolha de acordo com o modelo) em uma caixa com três chaves que podiam ser iluminadas. Os resultados mostraram que os pombos passaram a discriminar consistentemente os esquemas de reforço a que responderam anteriormente. Há, também, outros estudos que empregam aspectos distintos do comportamento dos organismos estudados como eventos discriminativos. Por exemplo, Reynolds (1966) e Shimp (1983) empregaram o intervalo de tempo entre respostas (IRTs), e Pliskoff e Goldiam ond (1966) empregaram valores distintos de esquemas de razão fixa (FR). Autorreconhecimento no espelho Em um estudo pioneiro, Gallup (1970) investigou a capacidade de primatas se reconhecerem, formulando uma situação experimental que veio a ser chamada de “teste do espelho” (Gallup, 1977, 2002). Tal teste pode ser consi derado um segundo tipo de critério para constatar a auto- observação em animais, isto é, por meio de seu autorre conhecimento frente a um espelho. Gallup (1970) inves tigou chimpanzés primeiramente e sua hipótese era que o chimpanzé reagia a sua imagem como se fosse um outro inicialmente, mas, com a exposição ao espelho, aprendeu a se reconhecer nele e também a usá-lo para se observar. Para dar mais suporte experimental direto a essa hipó tese, Gallup (1970) anestesiou completamente seus chim panzés e pintou alguns pontos de suas faces cuja obser vação direta não é possível (p. ex., a parte logo acima de um a de suas sobrancelhas e a parte superior da orelha oposta) com um a tinta sem cheiro e sem propriedades táteis, de modo que o chimpanzé não tinha como saber que estava marcado a não ser que utilizasse o espelho. Quando os chimpanzés se recuperaram e os espelhos foram reintroduzidos nas jaulas, o número de comportamentos dirigidos especificamente às marcas aum entou conside ravelmente, indicando o autorreconhecimento de modo bastante convincente. Gallup, então, tentou repetir todo o procedimento descrito com algumas espécies de macacos, que terminaram por não se reconhecerem no espelho; e novamente com outros chimpanzés, mas que, dessa vez, foram marcados sem que houvesse tempo prévio de expo sição, e estes também não mostraram o comportamento dirigido às marcas característico da situação anterior. Tais resultados foram confirmados e estendidos por estudos posteriores (cf. Gallup, 1977, 2002) e levaram o autor a conjeturar que o comportamento de autorreconhe cimento é específico de certas espécies - talvez limitado a seres humanos e a alguns primatas superiores — e que este parece depender de “uma forma de intelecto algo avançada” (Gallup 1970, p. 87) ou que “o autorreconhecimento da imagem no espelho implica um conceito de self”; ou mesmo um “autoconceito suficientemente bem integrado” (Gallup, 1977, p. 334), o que seria tornado evidente pela necessidade da exposição inicial ao espelho para que os comportamentos dirigidos às marcas ocorressem. Essas conclusões, com tons cognitivistas, foram ques tionadas por outro estudo experimental realizado com pombos por Epstein, Lanza e Skinner ( 1981 ). Nele, os pom bos puderam ver um a marca azul em seus corpos cuja imagem era refletida no espelho e passaram a bicá-la, sendo então reforçados. Esse experimento é bastante representativo das tenta tivas da análise do comportamento em analisar e inter pretar ocorrências a que são atribuídas explicações cogni tivas (autoconceito ou self bem integrado etc.) em termos da história ambiental passada. Porém, nesse caso espe cífico, há ressalvas que precisam ser feitas em relação às conclusões que podemos tirar a partir dos resultados expe rimentais obtidos. Inicialmente, é preciso considerar que, desde o experimento inicial de Epstein, Lanza e Skinner (1981), a evidência experimental com o teste do espelho realizada em primatas tem se acumulado de maneira sólida, com variações relevantes estendendo os resultados. Assim, a exposição ao espelho foi muito prolongada, sendo usadas nos testes as mais variadas espécies de primatas sob condi ções experimentais bem diversas como tentativas dos experimentadores de “ajudar” os primatas a se autorre- conhecerem. Esses resultados favorecem a tese de Gallup (1970) de que o comportamento de autorreconhecimento no espelho é específico de certas espécies, uma vez que só pôde ser constatado de modo confiável até o momento em alguns primatas superiores, como chimpanzés, orango tangos ou mesmo bonobos - mas não pôde ser observado, por exemplo, em gorilas (Gallup, 2002). Em segundo lugar, é possível questionar se a necessi dade de ensinar os repertórios descritos previamente ao teste de observação nao compromete a analogia preten dida com o do teste do espelho realizado com primatas, em que há m uito menos ou mesmo nenhum treinamento envolvido. Por fim, houve problemas em replicar o expe rimento original de Epstein, Lanza e Skinner (1981) com pombos (Dymon; Barnes, 1997) e fica aberta aos cientistas do comportamento a oportunidade para tentar replicar e estender esses resultados. Consciência e Autoconhecimento 197 Autodiscriminação de estímulos privados Lubinsky e Thom pson (1987) realizaram um experi mento em que pombos discriminavam estados corporais provocados pela aplicação de certas drogas e “com uni cavam” aquilo que sentiam a pombos que compartilhavam suas gaiolas pressionando certas chaves. Os pombos rece biam treinamento individual de acordo com as tarefas a serem realizadas e depois “interagiam” em um a gaiola, separados por uma parede transparente. O delineamento desse experimento é complexo e composto de várias fases (visando responder a questões experimentais um tanto diversas), e que não descreveremos aqui em detalhes. O experimento de Lubinsky e Thompson (1987) é uma replicação estendida do experimento de Epstein, Lanza e Skinner (1980), e este último experimento, por sua vez, foi baseado em outro, realizado com dois chimpanzés (Savage-Rumbaugh, Rumbaugh, Boysen, 1978), em que aprenderam a trocar informações sobre comidas que só um deles tinha visto com o emprego de símbolos geomé tricos (posteriormente, os chimpanzés foram observados pedindo comida um ao outro espontaneamente com o uso dos mesmos símbolos). É m uito provável que os animais que figuraram nesses experimentos nunca aprendessem a se observar e a se discri minar se não tivessem sido expostos a essas situações expe rimentais e deixados ao sabor das contingências encontradas em seus ambientes naturais, mas isso ocorreu porque as contingências apropriadas foram estabelecidas. Foi constatado nesses experimentos que estímulos privados (Lubinski, Thompson, 1987) ou produzidos pelo compor tam ento dos animais em estudo (Lattal, 1975; Gallup, 1970; Epstein, Lanza, Skinner, 1981), em que comporta mentos de auto-observação estavam envolvidos de alguma maneira, foram discriminados e passaram a controlar o comportamento dos sujeitos, de modo que esses adqui riram algum conhecimento sobre si mesmos. Isso significa que a autodiscriminação (ou “autocons ciência”) não é um processo especial de discriminação, mas que há, sim, uma diferença com relação à localização dos estímulos discriminados (que podem ser produzidos pelo próprio corpo ou como decorrência do comportamento) ou pela requisição de que comportamentos específicos de auto-observação ocorram para que certas autodiscrimina- ções possam acontecer. Em última análise, são as contin gências que determinam quais estímulos serão discrimi nados: se os do ambiente próximo ou aqueles relacionados com o próprio organismo. Colocando de outra maneira, isso ocorre ao sabor das consequências que acompanham esses estímulos e que talvez venham a torná-los discrimina tivos. O autoconhecimento, por sua vez, depende das auto- discriminações que um organismo realizou até o momento (mas cabe ressaltar que há, tam bém, outra maneira de autoconhecimento que surge quando as pessoas passam a fazer relatos sobre si mesmas). O que foi dito já parece bastante esclarecedor, mas é preciso considerar, ainda, que as pessoas geralmente desen volvem repertórios de auto-observação com a ajuda da comunidade verbal, o que ocorre simultaneamente à aqui sição de repertórios de autodescrição (em procedimentos semelhantes àqueles empregados para o ensino de discri minação de eventos privados). CO M PO RTA M EN TO DESCRITIVO Até o momento, discutimos sobre a consciência apenas no sentido do responder discriminativo aos estímulos produzidos pelo próprio com portam ento, sem incluir necessariamente o comportamento verbal em nossa defi nição. O u seja, analisamos como respostas de auto-obser vação provocam a exposição do organismo a estímulos produzidos por seu próprio com portam ento, os quais passam a ser discriminativos para outras respostas. Como vimos, por exemplo, em Gallup (1970), existem alguns fenômenos que denominaríamos “autoconscientes”, mas que não incluem com portam ento verbal. A partir do presente tópico, analisaremos o papel do operante verbal tato na definição do que consideramos ser a consciência na interpretação da análise do com portam ento, isto é, veremos como esses estímulos produzidos pelo próprio comportamento do organismo na resposta de auto-obser vação podem se tornar discriminativos para respostas descritivas. Nesse sentido, em grande parte da literatura da área que trata do tema (Micheletto, Sério, 1993), encontramos a defesa de que a descrição (o tato, o relato) é necessária para falarmos em consciência em humanos, ou seja, quando o indivíduo é capaz de emitir o operante verbal tato em relação a algo, dizemos que ele tem consciência desse algo. Mesmo em experimentos com animais, como aqueles já descritos, podemos questionar sobre o papel do compor tamento verbal na ocorrência dos comportamentos “auto conscientes” observados nos experimentos descritos, pois contingências em que comportam entos de auto-obser- 198 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento vaçao são reforçados são raras (ou mesmo inexistentes) na natureza, e então é preciso que uma comunidade verbal as estabeleça. Assim, mesmo que tais comportamentos auto conscientes não sejam verbais, eles são estabelecidos por contingências arranjadas pela comunidade verbal e, então, podemos afirmar que estar consciente é um m odo de reagir ao próprio comportamento e também é um produto social (Skinner, 1959/1972). Segundo Skinner (1957), o próprio termo tato carrega a sugestão de que o tato é o operante que possibilita o “con-tato” com o mundo físico. Operacionalmente, o tato é estabelecido quando reforçamos consistentemente deter minada reposta na presença de determinado estímulo não verbal (e não de outro), que se torna discriminativo, por meio de muitos reforçadores diferentes ou com reforçador generalizado. Duas características necessárias na instalação de um tato são: controle pelo estímulo discriminativo (Sd), que é não verbal, e reforço generalizado. A utilização do reforço generalizado estabelece o controle pelo Sd em detri mento, por exemplo, de estados de privação ou de outra estimulação aversiva, como no caso do operante chamado mando. No tato, uma dada resposta “especifica” determi nada propriedade do estímulo (Skinner, 1957). Podemos pensar, por exemplo, que, se um repertório de tatos é bem estabelecido, uma testemunha pode relatar os fatos em um julgamento de acordo com o que ela presen ciou na situação do crime, mesmo se estiver sendo amea çada por contar a verdade. Quando a correspondência com a situação de estimulação é precisa, chamamos a resposta de “objetiva”, “válida”, “verdadeira” ou “correta” (Skinner, 1957). Vejamos como Skinner (1957, p. 81-82, 85) define essa classe de respostas nesse mesmo texto: “Um tato pode ser definido como um operante verbal no qual uma resposta de uma dada forma é evocada (ou ao menos fortalecida) por um objeto ou um evento particular ou por uma propriedade de um objeto ou evento (...) ele funciona em be nefício do ouvinte por estender seu contato com o ambiente e, por essa razão, tal comportamento é estabelecido pela comunidade verbal.” O suposto relato “verdadeiro” da testemunha exemplifi cado é um “tato puro”. No entanto, esse tipo de tato acon tece m uito raramente, pois, em geral, há outros controles que modificam a resposta. No caso em que a testemunha fala a verdade, podemos supor que, se a ameaça fosse inten sificada, a probabilidade de ela emitir um “tato puro”, de falar a verdade, diminuiria. Segundo Skinner (1957), o operante verbal chamado de tato estabelece uma ligação entre o comportamento do ouvinte e um relevante estado de coisas. No exemplo anterior, entre o juiz e a situação do crime. Entretanto, a correspondência entre o estado de coisas e o relato verbal pode não ser tão “pura”, já que outras variáveis (p. ex., privação) podem passar a controlar o comportamento causando uma distorção no relato. A sentença “meu copo está vazio” pode parecer apenas uma descrição desse estado de coisas, mas também pode funcionar como um pedido velado por água em uma situação em que realizar o pedido de maneira direta poderia ter consequências aversivas. O controle exclusivo pelo Sd, que ocorre no “tato puro”, é de extrema importância para a ciência, pois os cientistas buscam descrever o mundo assim como ele é de fato, isto é, sob controle quase exclusivo dos Sds (esta afirmação pres supõe um realismo quase ingênuo, mas ao menos podemos supor que os diferentes organismos reagem de maneira semelhante aos mesmos eventos, ou seja, existe uma inter- subjetividade que possibilita afirmarmos que temos contato com o mesmo mundo físico). O tato é crucial na ciência, pois, a partir da descrição, é possível a previsão e o controle. Talvez por isso Skinner considere que o tato é o operante verbal mais importante (Skinner, 1957). Nas ciências exatas, temos, grosso modo, tatos dos cien tistas a respeito de seus achados experimentais. Nas ciências humanas, temos dois níveis de relatos: além do relato do cientista sobre suas pesquisas, muitas vezes o relato verbal dos sujeitos é um dado de pesquisa para o próprio cientista - pois muitos dos eventos estudados são inacessíveis a ele, como em pesquisas sobre comportamento de uso de drogas ilícitas. O pesquisador não pode reproduzir as condições que levam os sujeitos a usar drogas, por isso, faz perguntas a eles,sendo que as respostas a essas questões são tatos dos sujeitos a respeito de seu próprio com portam ento. Segundo de Rose (2001, p. 150): “O relato verbal é um tato, sob controle dos aspectos relevantes deste estado de coisas, que permite ao pesquisador fazer inferências sobre este estado de coisas ao qual ele não tem acesso direto”. De acordo com esse autor, os relatos podem não ter muita correspondência com o evento relatado por vários motivos: os relatos podem se referir a assuntos considerados tabus; podem também estar sujeitos limitações de acessibilidade, de memória, de atenção etc.; além disso, podem ser deli beradamente distorcidos pelo falante. No sentido que queremos abordar no presente tópico, poderíamos dizer que a pessoa está “consciente de” algo quando ela emite um tato sob controle desse algo. Utili Consciência e Autoconhecimento 199 zamos “emitir um tato”, “tatear”, “descrever” e “relatar” como sinônimos. Dizemos que temos consciência da crise internacional do capitalismo financeiro quando a descre vemos; que temos consciência ambiental quando conse guimos descrever uma série de eventos e suas consequências para o meio ambiente; que temos consciência de nós mesmos quando conseguimos realizar a auto-observação e a descrição do que é observado, em relação ao próprio comportamento, suas condições e suas consequências. Também afirmamos, por exemplo, que alguém tem consciência política quando é capaz de descrever, sob controle dos estímulos discriminativos estabelecidos pelo reforço generalizado, eventos chamados de “políticos”. Nesse caso, não poderíamos falar em consciência polí tica se o sujeito apenas repete a fala do apresentador de um telej ornai em relação a esses eventos políticos, pois tal comportamento não pode ser classificado como um tato e, portanto, não é um exemplo de “consciência política” de acordo com a análise do comportamento. Por outro lado, m uito do conhecimento que adquirimos é intra verbal (p. ex., Chaves é presidente da Venezuela); não é simplesmente ecoico. Por essa razão, talvez nao possamos falar em consciência nesse último caso (ecoico), mas no primeiro (intraverbal) é possível. Informações desse tipo possibilitam um controle razoável sobre o mundo, mesmo sem ter havido ainda contato com as contingências. É para obter esse tipo de conhecimento que vamos à escola. Parte do nosso comportamento de descrever refere-se a nós mesmos. É o que Skinner (1957, p. 139) denominou auto ta tos: “Estamos preocupados aqui com autotatos - com comportamento verbal controlado por outro com portam ento passado, presente ou futuro do fa lante. O estímulo pode ou não ser privado. O comportamento autodescritivo é de interesse por várias razões. Somente através da aquisição de tal comportamento o falante torna-se consciente [aware] do que e do porquê ele está fazendo ou dizendo.” O papel da comunidade verbal é de extrema im por tância no estabelecimento desse repertório autodescritivo. Em geral, a comunidade está interessada no que o indi víduo faz, fez, planeja fazer e por quê. Apenas porque o comportamento do indivíduo é importante para a socie dade é que a sociedade o torna importante para o indi víduo (Skinner, 1945/1984, p. 551), ou seja, a comuni dade ensina o autotato ao indivíduo de modo que ela própria possa conhecer, de algum modo, algo que antes era inacessível ou pouco acessível a ela. Ao mesmo tempo, essa aprendizagem poderá trazer vantagens para o indi víduo, conforme será discutido no tópico sobre autocon trole mais à frente. Como um tipo de tato, o autotato também pode sofrer “distorções”. H á experimentos a respeito da correspon dência entre comportamento verbal descritivo e compor tamento não verbal que é descrito. Esses estudos buscam analisar as circunstâncias nas quais o indivíduo relata o comportamento sob controle do próprio comportamento. Esses experimentos esclarecem que a correspondência é estabelecida por meio das contingências de reforçamento. Ribeiro (1989) descreve um procedimento em que crianças pré-escolares brincavam com alguns brinquedos e poste riormente relatavam se haviam brincado ou não com os brinquedos cujas fotos lhes eram apresentadas. Na linha de base, houve correspondência precisa entre o compor tamento verbal e não verbal das crianças, ou seja, entre ter brincado ou não ter brincado com aquele brinquedo e relatar que brincou ou nao com aquele brinquedo. Todas as crianças inicialmente descreviam bem o próprio compor tam ento, falavam a verdade. Posteriormente, o experi m entador passou a reforçar as respostas afirmativas das crianças, independente da correspondência. Como resul tado, a frequência dos relatos afirmativos aumentou e a correspondência verbal-não verbal diminuiu. Esse experi mento demonstrou claramente como respostas que antes da intervenção podiam ser classificadas como autotato passaram a ter função de mando. As contingências verbais estabelecidas pelos outros levam o indivíduo a se auto-observar e a descrever o que observa, mesmo quando o observado é inacessível aos outros. Segundo Skinner (1969), podemos aprender a relatar eventos que ocorrem sob a pele do falante. Imagi nemos perguntas feitas a uma criança de dois anos que começou a chorar: “O que você está sentindo?”, “Está doendo em algum lugar?”, “O que aconteceu?”, “Você se machucou?”, “É aqui na barriguinha?”, “Q uer ir ao banheiro?”, e assim por diante. A criança responde de alguma maneira, por exemplo, sinalizando afirmativa mente com a cabeça a algumas dessas questões e, a partir disso, o adulto toma alguma providência que tem como consequência, para a criança, a fuga dessa estimulação aversiva que é acessível apenas à própria criança. Esse é um exemplo simples de como a comunidade verbal estabelece contingências que constroem repertório de auto-obser- vação e modelam a descrição. Segundo Skinner (1978), o 200 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento autoconhecimento apareceu muito tarde na evolução da espécie, pois apenas quando o indivíduo começou a ser questionado sobre seu comportamento e sobre as causas de seu comportamento é que ele começou a se tornar cons ciente de si nesse sentido. A U T O C O N H E C IM E N T O O autoconhecimento é a consciência a respeito de si mesmo. Dizemos que um indivíduo tem autoconheci mento quando é capaz de discriminar e descrever eventos que ocorrem no próprio organismo ou relações estabe lecidas entre esse organismo e o mundo. O autoconhe cimento não é especial em relação ao método. Ele difere apenas em relação ao seu objeto, conforme explicita Sério (2000, p. 170): “O autoconhecimento é apenas o conhecimen to no qual o sujeito que produz conhecimento é também o objeto conhecido. A especificação auto’ refere-se ao objeto do conhecimento e não à for ma ou maneira que o conhecimento é produzido. Para o Behaviorismo Radical, o autoconhecimento nao é imediato; ao contrário, ele é sempre media do por outros.” Esses “outros” são a comunidade verbal. A comunidade produz comportamentos autodescritivos ao perguntar: “O que você está fazendo?” ou “Por que você está fazendo isso?” e reforçar apropriadamente as respostas. De início, as respostas que damos às perguntas não devem ser muito acuradas, mas elas vão sendo modeladas conforme a comu nidade consiga usar correlatos de eventos privados para reforçar os relatos de maneira contingente. De acordo com Skinner (1969), o comportam ento com o qual respon demos a essas questões não pode ser confundido com aquele produzido pelas contingências originais. O compor tamento com o qual respondemos tem origem verbal, isto é, não haveria razão para emiti-lo se não fossem as contin gências arranjadas pela comunidade verbal. O repertório de autoconhecimento estabelecido com perguntas como as citadas no parágrafo anterior inclui respostas de auto-observação e respostas autodescritivas (autotatos). A auto-observaçãoinclui observar: as condi ções em que o comportamento surge, o próprio compor tam ento e as suas consequências. O autotato é o relato sob controle daquilo que é auto-observado. Enunciando tecnicamente, a auto-observação é uma resposta encoberta que ocorre no mesmo instante em que o comportamento está sendo observado (este comportamento pode ser público ou não). A consequência da auto-observação é a expo sição do indivíduo aos estímulos produzidos autom ati camente por seu próprio comportamento, como exposto anteriormente. Esses estímulos são os Sd para determinadas respostas, inclusive os autotatos, no caso dos humanos. Finalmente, os autotatos são reforçados pela comunidade. Quando a comunidade faz isso, ou seja, quando a comu nidade reforça o relato a respeito do próprio comporta m ento, de suas condições e consequências, ela mantém e fortalece respostas de auto-observação, tendo em vista, em outros termos, que a auto-observação é, ao menos em parte, precorrente para o autotato (de Rose, 2001). O seguinte esquema talvez esclareça um pouco mais: Perguntas da comunidade são Sd para —> resposta de auto-observação que produz -> S do próprio comporta mento (e de suas condições e consequências) que são Sdpara —> resposta de autotato que produz —> S reforçador social. No caso dos humanos, muitas vezes, os Sd automatica mente produzidos pelo próprio comportamento na resposta de auto-observação servem de Sd para respostas de autotato. As questões feitas pela comunidade são a ocasião na qual o sujeito emite respostas de auto-observação de modo a responder adequadamente às questões, isto é, as questões tornam a autoestimulação discriminativa porque ela passa a ser a ocasião em que o reforço ocorre (i. e., estabelece esse controle de estímulos). Tal discriminação não precisa ser imediatamente acurada, mas vai se refinando na medida em que o controle de estímulos se estabelece, essencial mente da mesma maneira como acontece uma discrimi nação sobre estímulos públicos. A única questão é que, por serem privadas, essas discriminações talvez não possam ser estabelecidas tão acuradamente, como comentamos. Quando o Sd, que é consequência da auto-observação, tem correlato público, a descrição pode ser modelada de modo mais preciso. A sudorese e o rubor facial são observáveis tanto para o falante como para o ouvinte. Por outro lado, o “frio na barriga” não o é. Então, temos um problema (Skinner, 1978, p. 72): “A comunidade verbal que nos ensina a fazer distinções entre as coisas do mundo ao nosso redor não possui as informações que ela precisa para nos ensinar a distinguir entre eventos do nosso mundo privado”. Skinner (1971) observa que conhecer os eventos privados é mais do que responder a eles; é descrevê-los. Como a comunidade pode, então, construir um repertório de descrição de eventos privados se ela não tem acesso a esses eventos? Segundo Skinner (1957; 1959/1972), há, pelo menos, quatro maneiras de a comunidade, que não Consciência e Autoconhecimento 201 tem acesso à estimulação privada do indivíduo, ensiná-lo a responder verbalmente a essa estimulação, e que vamos descrever brevemente. A primeira delas é o reforçamento contingente a respostas verbais que acompanham eventos públicos vinculados a eventos privados. Exemplificando, quando uma criança se fere no joelho, tem o evento privado da dor e a resposta verbal pública: “Isso dói!” Logo, a comunidade não tem acesso aos eventos privados, mas pode ter acesso a seus correlatos públicos e, a partir deles, modelar o relato do indivíduo. Malerbi e Matos (1982) citam várias pesquisas arranjadas de modo que o relato verbal dos sujeitos a respeito de determinado evento privado fosse modelado pelo experimentador a partir de eventos públicos corre latos acessíveis inicialmente apenas ao experimentador. As autoras citam estudos a respeito do nível de álcool no sangue, da pressão arterial, da frequência cardíaca, entre outros. Em um a dessas pesquisas, pedia-se aos sujeitos que relatassem as alterações em seus batimentos cardíacos e a coincidência entre tais alterações e alguns estímulos apresentados na situação experimental. As experimenta doras registravam as alterações da frequência cardíaca em um eletrocardiograma. Com o resultado, obteve-se que, inicialmente, não havia correspondência entre as alterações medidas pelo eletrocardiograma e os relatos dos sujeitos. Posteriormente, o experimentador indicava aos sujeitos a correspondência entre os seus relatos sobre a frequência cardíaca e a própria frequência cardíaca. Esse procedimento pode ser entendido como um treino discriminativo. Esse treino levou os sujeitos a aumentarem a precisão do relato a respeito da sua frequência cardíaca. Podemos tomar esse experimento como exemplo de como a comunidade verbal, ao modelar o auto tato do sujeito a partir de correlatos públicos dos eventos privados, modela também as respostas de auto-observação que têm como consequência os estí mulos que são “tateados”, descritos, relatados. Em um a segunda maneira descrita por Skinner, de acordo com a qual a comunidade ensina o indivíduo a falar sobre eventos privados, “a comunidade infere o estímulo privado, não a partir de estímulos públicos que o acom panham, mas de respostas colaterais, geralmente incon- dicionadas e, no mínimo, não verbais (mão no maxilar, expressões faciais, gemidos etc.)” (Skinner, 1959/1972, p. 375). O sujeito que permanece com a mão no maxilar pode ser questionado: “Você está com dor de dente?”, e sua resposta, por exemplo, “é o dente do ciso que está nascendo”, será reforçada. Em uma terceira estratégia, a comunidade modela o indi víduo a falar sobre seus comportamentos públicos, abertos, observáveis. Desse modo, o indivíduo pode descrever os mesmos comportamentos quando eles ocorrerem no nível privado, por exemplo, em um sonho. Somos ensinados a retroceder muitos de nossos comportamentos ao nível privado, ao fazermos contas de cabeça ou deixarmos de 1er em voz alta, por exemplo. A última maneira seria aquela em que, por indução, uma resposta adquirida e mantida em conexão com estí mulos públicos pode ser emitida em resposta a eventos privados. Neste caso, os estímulos públicos e os privados têm propriedades em comum. Então, os eventos privados são descritos por meio de metáforas. A pessoa pode relatar eventos internos usando expressões como tristeza aguda, estômago embrulhado ou peso na consciência, por exemplo. Nesses casos, a comunidade reforça respostas a eventos privados que guardem alguma relação com os eventos públicos. Como todas essas 4 estratégias não esta belecem um grau acurado de precisão, Skinner afirma que o sujeito não consegue conhecer claramente a si mesmo (Skinner, 1959/1972). Podemos afirmar, então, que o autoconhecim ento é constituído socialmente, pois o produto da auto-obser- vação torna-se, por meio de contingências estabelecidas pela comunidade, Sd para o relato. De acordo com Abib (2007, p. 64): “com o comportamento verbal, descreve- se um m undo e um sujeito constituído pela linguagem de uma cultura. Uma descrição dessa natureza não signi fica representação, significa constituição”. Portanto, sob a ótica da análise do comportamento, “embora estranho, é a comunidade que ensina o indivíduo a ‘conhecer a si mesmo’” (Skinner, 1957, p. 134), e podemos concluir que “a consciência é um produto social” (Skinner, 1971, p. 192), conforme analisado. A U TO CO N TRO LE Skinner (1969, p. 244) afirma que estamos conscientes do que estamos fazendo quando descrevemos a topografia de nosso comportamento. Mas só estamos conscientes das razões de nosso comportamento quando descrevemos as variáveis relevantes e os aspectos importantes da ocasião ou do reforçamento, isto é, sabemos por que agimos deste ou daquele modo quando conseguimos descrever funcio nalmente as relações que existem entre o comportamento em questão e o ambiente. Ao descrevermos