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1 Uma investigação que pesquise dados qualitativos pode então ser posta em marcha para refinar o conhecimento que temos sobre o que se passa em tais comunidades. Nesse caso, poderemos seguir alguns caminhos, mas teremos sempre que decidir o que será interpretado. Poderá ser o que dizem determinadas pessoas por sua importância para a comunidade (presidentes de associações de moradores, por exemplo), ou pessoas da própria comunidade escolhidas randomicamente. Note que é um erro supor que pessoas que ocupam funções importantes são as que sabem mais e podem dar as informações mais importantes. Esse tipo de erro foi exaustivamente apontado pelas instituições psiquiátricas chamadas “comunidades terapêuticas” e nas quais o assistente social desempenhava papel da maior importância. Essas comunidades surgiram no contexto das primeiras tentativas de reforma da psiquiatria clássica e questionavam o modelo fortemente hierarquizado que vigorava nos hospitais psiquiátricos tradicionais. Neste modelo, o médico ficava no topo da pirâmide, detentor dos segredos da saúde e da doença, enquanto os pacientes ficavam na base, tidos como alienados, objetos do saber e prática médica que deveriam trazê-los de volta à razão / saúde. Entre esses dois extremos, psicólogos, enfermeiros, assistentes sociais, funcionários da instituição. O princípio norteador das práticas das comunidades terapêuticas era que essa hierarquia era produtora de doença. Criaram-se espaços nos quais os pacientes pudessem dizer o que pensavam sobre o que lhes acontecia e sobre o que acontecia na clínica. Deveriam poder opinar em condições de igualdade nos grupos operativos, de tal maneira que passassem a ser agentes de seu próprio tratamento e do ambiente da clínica. Não apenas pacientes, mas também funcionários e outros técnicos deviam escutar e aprender com os médicos, mas estes também deveriam escutar e aprender com os primeiros. Todos aqueles que antes não encontravam espaço para participar das decisões concernentes ao tratamento, por não representarem o saber oficialmente aceito como científico, passam a ter voz ativa, o que foi de extrema riqueza para o desenvolvimento da psiquiatria como um todo. Assim fará parte importantíssima de sua pesquisa a decisão sobre quem ouvir e para quê. Cumpre ainda mais uma vez notar que outros signos que não os enunciados de pessoas podem ser colhidos como dados qualitativos, como, por exemplo, uma manifestação coletiva de protesto, ou o surgimento de uma manifestação artística ou cultural coletiva ou individual. Estaremos sempre observando ações humanas, muitas vezes levando em conta o significado / sentido do que as pessoas dizem enquanto agem, mas também sempre atentos aos aspectos não verbais que fazem parte de todo ato de fala. Se o significado das palavras muda em uma frase dependendo de um ponto, ou de uma vírgula, que dizer do quanto poderá mudar dependendo do lugar e do momento em que um sujeito fala em meio a sua ação social. Aliás, conforme disse em nossa última aula, essa flutuação do significado das palavras utilizadas no aqui agora da vida real é o que nos faz recorrer ao termo “sentido”. O sentido carece sempre de interpretação; fala-se 2 em “sentido” quando não se tem apenas uma maneira de entender o que está sendo dito, ou escrito. Para fazer seu trabalho de campo em uma abordagem quantitativa, qualitativa ou mista, você poderá contar com alguns instrumentos, sobre os quais tecerei comentários a partir de agora.
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