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1 O AMBIENTE MARINHO – AS COMUNIDADES DO MAR ABERTO A primeira apostila apresentada sobre o ambiente marinho, teve por objetivo fornecer informações básicas a respeito dos aspectos oceanográficos, físicos e químicos dos oceanos. Passaremos agora para os aspectos ecológicos deste ambiente, dando ênfase à estrutura e à dinâmica das comunidades. Estrutura: O mar aberto não possui comunidades distintas como acontece com os os ambientes terrestres. Isto se deve, principalmente, a dois fatores: a ausência de uma vida vegetal de grande porte e o livre movimento do plâncton e do nécton que, em geral seguem as correntes dos mares e oceanos. Plâncton (Gr. planktos = errante): Organismos vivos, de natureza vegetal (fitoplâncton) ou animal (zooplâncton), que não se encontram fixos a nenhum tipo de substrato, e que passam toda a vida, ou parte dela, na coluna d’água, onde flutuam de uma forma mais ou menos passiva. Fitoplâncton (Gr. phyton = vegetal + planktos = errante): Forma dominante de produtores primários no oceano. Acham-se amplamente dispersos nas águas, basicamente ria zona fótica, uma vez que a luz atua como fator limitante para a atividade fotossintética. A composição do fitoplâncton varia sazonal e geograficamente, em função da intensidade luminosa, da temperatura, quantidade de nutrientes e efeito da predação. As águas neríticas e as zonas de ressurgência são mais ricas em fitoplâncton. As diatomáceas são particularmente importantes nos mares temperados e frios, enquanto que os dinoflagelados dominam os habitats tropicais. Estes podem, por vezes, atingir concentrações tais na massa d’água de originar o fenômeno da maré vermelha, freqüentemente tóxica para os demais organismos. Os cocolitoforídeos constituem um tipo especial entre os organismos do fitoplâncton, pois possuem a capacidade de nadar, estando universalmente distribuídos por todos os mares, com exceção das águas árticas. Zooplâncton (Gr. zoion = animal + planctos = errante): Os organismos do zooplâncton estão divididos em duas categorias: Holoplâncton (Gr. holos = inteiro): organismos que completam seu ciclo de vida no plâncton. Exemplos: ctenóforos, sifonóforos, pterópodos, copépodos, eufausiáceos (krill), salpas e quetognatos. Meroplâncton (Gr. meras = parte): organismos que passam parte da sua vida no plâncton, e parte no nécton ou no bentos. Exemplos: larvas de poliquetos, de moluscos, de crustáceos, de peixes, e de equinodermos e fase medusóide de celenterados. O zooplâncton é constituído por consumidores primários como ostrácodos, eufausiáceos, larvas de gastrópodes e bivalves. Os consumidores secundários estão representados, entre outros, pelos ctenóforos e quetognatos. Existem também organismos de hábito onívoro, tais como os copépodos, os mais numerosos componentes do zooplâncton. A composição do zooplâncton varia em função dos mesmos fatores que influenciam o fitoplâncton. As formas maiores ocorrem nas águas costeiras, de baixa profundidade; e as menores nas águas profundas do mar aberto. Na plataforma continental, aparece uma grande quantidade de larvas de peixes (alevinos) e de organismos bentônicos. 2 A diversidade de espécies que ocorre em uma determinada área reflete as condições químicas e físicas do ambiente. O mar aberto apresenta uma menor diversidade pela sua homogeneidade e baixa concentração de nutrientes. A abundância varia também segundo os mesmos parâmetros, sendo que as águas temperadas sofrem o efeito das mudanças sazonais na temperatura de uma forma mais drástica do que as águas tropicais. Nécton (Gr. nektos = natante): Organismos de natureza animal que passam toda vida, ou parte dela, na coluna d’água, sendo capazes de nadar ativamente, vencendo as correntes. Alimentam-se do plâncton e transferem energia para níveis tróficos mais elevados nas cadeias alimentares oceânicas. Os consumidores primários estão representados por uns poucos peixes herbívoros, como a anchoveta (Engraulius ringens) das correntes de ressurgência do Peru. Os consumidores secundários incluem a grande maioria dos organismos nectônicos que utilizam tanto a filtração como a predação nas suas estratégias alimentares. Exemplos: baleias filtradoras (Mysticeti), formas jovens de peixes (alevinos), e teleósteos cm geral. Os consumidores terciários e os predadores de topo estão representados pelos salmões, lulas, golfinhos, tubarões e baleias (Odontoceti). Alguns destes organismos estão restritos a zona fótica, outros se localizam nas camadas mais profundas do meso e do batipelágico. Os habitantes destas águas estão representados por pequenos peixes (15 cm ou menos), e por algumas formas maiores, como a lula gigante (Architeuthis). No batipelágico, a bioluminescência atinge o seu maior desenvolvimento, sendo que dois terços das espécies produzem luz (alguns peixes e lulas). As regiões não iluminadas do meso e batipe1ágico dependem da chamada “chuva de detritos”, provenientes das camadas superiores para a obtenção de nutrientes. A taxa de decantação destes detritos é tão lenta que a maior parte é consumida, decomposta ou dissolvida antes de chegar ao fundo, limitando drasticamente a ocorrência de vida nestas regiões. Outras fontes alimentares partem até estas zonas na forma de plâncton saprofítico, matéria orgânica particulada, importe de material das zonas costeiras que descem pela plataforma continental, lixo de navios e corpos de animais de grande porte. Bentos (Gr. benthos = o fundo do mar): Organismos, animais e vegetais, que vivem associados ao fundo de diversas formas, durante toda a sua vida ou parte dela. Os organismos do bentos são influenciados pela natureza do substrato. Este pode variar de um substrato duro, rochoso, onde predomina a epifauna (organismos que vivem sobre o substrato) até um substrato não consolidado, onde predomina a infauna (organismos que vivem enterrados). O tipo de substrato varia com a profundidade, e está relacionado com a natureza dos continentes mais próximos, e das plataformas continentais. Os sedimentos marinhos mais profundos são caracterizados por partículas menores, e pela matéria orgânica decantada. Esta, porém, possui pouco carbono para decomposição e reciclagem e é constituída, principalmente, por fragmentos dos esqueletos de organismos planctônicos, formando as chamadas “vasas de foraminíferos e radiolários”. Os sedimentos marinhos possuem uma camada superficial, relativamente oxigenada, que abriga a maioria dos organismos bentônicos. Nas regiões mais profundas, encontramos copépodos (Marpacticcida), crinóides, holotúrias, anfioxos, esponjas, anêmonas e algumas estrelas-do- mar, além de uma grande quantidade de bactérias aeróbicas. Abaixo desta camada encontra-se uma faixa anóxica, habitada quase que exclusivamente por bactérias anaeróbicas. As bactérias constituem um importante elo da cadeia alimentar dos fundos oceânicos, podendo chegar a dezenas de gramas por metro quadrado 3 nas camadas superficiais. Elas sintetizam compostos protéicos a partir dos nutrientes dissolvidos, e tornam-se fonte de proteínas, óleos e gorduras para os organismos do fundo que apresentam, na sua maioria, um hábito alimentar detritívoro. Dinâmica: Apesar de os oceanos ocuparem 70% da superfície da terra, e de possuírem uma profundidade média de 4.000 m, a produtividade primária, neste ambiente, é consideravelmente menor do que a do ambiente terrestre. Isto se deve aos limites impostos à vida vegetal pela zona fótica, que atinge no máximo 100 m de profundidade, e pelo fato de as águas oceânicas abertas serem pobres em nutrientes, determinando uma distribuição agregada (em manchas) do fitoplâncton. Verifica-se uma constante perda dos nutrientes por decantação, a partir da zona fótica. Este fato favorece a biotadas águas mais profundas, ocasionando, porém, uma rarefação do material necessário para a existência de uma maior abundância de organismos nas camadas superiores. Esta perda é mais drástica nas águas tropicais, onde uma estratificação térmica mais marcada impede a circulação das águas e, portanto a reciclagem dos nutrientes perdidos para o fundo. Dessa forma, apesar das altas intensidades luminosas, e altas temperaturas, os mares tropicais apresentam uma baixa produção, por volta de 3,79 x lO9 tonC/ano (toneladas de carbono por ano). Os oceanos temperados são mais produtivos, pois nestes não se forma uma estratificação térmica (termoclina) permanente. Durante a primavera e o outono, estas águas sofrem uma circulação, devido às mudanças marcantes na temperatura, permitindo uma melhor reciclagem dos nutrientes. Nesta fase, ocorre um grande desenvolvimento do fitoplâncton e, conseqüentemente, dos demais organismos em outros níveis tróficos. No fim da primavera e começo do verão, as águas se tornam novamente estratificadas, devido à estabilização da temperatura. O fitoplâncton começa a esgotar os recursos disponíveis, e a sua densidade diminui, até que uma nova circulação ocorra no início do outono, quando as camadas superiores da água se resfriam e descem, dando lugar às águas mais quentes e profundas, ricas em nutrientes. Mesmo no inverno, as águas temperadas apresentam valores de produção ligeiramente superiores às das águas tropicais, ou seja, 4,22 x lO9 tonC/ano. As áreas mais produtivas dos oceanos estão nas zonas de ressurgência e zonas costeiras, com valores que chegam a 6,90 x lO9 tonC/ano. A contribuição das regiões bentônicas para o cálculo da produção total do ambiente marinho é levada em consideração, apenas no que toca as águas mais rasas da zona costeira. No mar aberto, esta é desprezada, pois devido às grandes profundidades a matéria orgânica produzida está praticamente inacessível às camadas de água superiores. A transferência do material produzido pelo fitoplâncton para tecido animal é realizada pelo zooplâncton herbívoro, principalmente copépodos. Nas águas antárticas, os herbívoros dominantes são os eufausiáceos, que servem de alimento para as baleias filtradoras, entre elas, a baleia azul. As zonas costeiras e de ressurgência apresentam geralmente menos níveis tróficos do que as comunidades pelágicas oligotróficas (Gr. Oligos = pouco + trophos = comer) do oceano aberto. A biomassa de peixes é menor nestas últimas comunidades, devido as perdas substanciais de energia ao longo dos níveis tróficos, que são mais numerosos. A anchoveta, da corrente de ressurgência do Peru, pode eliminar o elo da cadeia alimentar constituída pelo zooplâncton, alimentando-se diretamente do fitoplâncton, diminuindo, desta forma, a perda de energia do sistema. Esta espécie se reproduz ao longo do ano, mesmo que sua atividade reprodutiva esteja concentrada nos meses de abril e maio, no hemisfério sul, 4 e, em setembro, no hemisfério norte. Os ovos possuem pouco vitelo, e os alevinos dependem da presença de alimento em abundância ao seu redor. A mortalidade é alta, pois as larvas e os ovos pelágicos são predados em grande parte pelos organismos que se alimentam do plâncton, incluindo as anchovetas adultas. Estas são predadas por lulas, por peixes como o bonito (Sarda chilensis), e por aves como cormorões, gaivotas e pelicanos. Estas últimas possuem bolsas na garganta, adaptadas para carregar as grandes quantidades de peixe. 95% da dieta dos cormorões e 80% da dos pelicanos consiste de anchoveta. A densidade da população de aves desta região está, portanto, diretamente ligada à densidade da anchoveta. Recentemente (década de 70), as populações de aves têm caído, devido em parte à competição humana. As aves consomem cerca de quatro milhões de toneladas métricas de anchoveta por ano, enquanto que a indústria pesqueira peruana consome 10,4 milhões de toneladas métricas. A atividade pesqueira no Peru tem sofrido um colapso, devido a sobrepesca e aos desvios da corrente fria de Humboldt e substituição pelas águas quentes e pobres em nutrientes da corrente equatorial (El Niño). Migrações: I. Migração vertical: Um dos mais intrigantes fenômenos do mar e a migração vertical de um grande número de organismos do zooplâncton, que consiste na descida destes para o fundo durante o dia, e na subida para a superfície, durante a noite. As causas desta movimentação diária do zooplâncton ainda não estão totalmente esclarecidas, mas sabe-se que a intensidade luminosa atua como estímulo principal. Várias hipóteses, no entanto, foram sugeridas por diversos autores para explicar este fenômeno. A migração seria uma forma de evitar a ação de predadores diurnos, que utilizam a visão como método de captura (peixes e cefalópodos). Esta hipótese tem sido, em parte, refutada, devido aos seguintes fatos: a) A profundidade atingida por algumas das espécies encontra-se ainda nos limites da zona fótica, não impedindo, desta forma, a predação. b) Algumas espécies atingem profundidades superiores às necessárias para a fuga da predação por mecanismos visuais, o que implica em um gasto desnecessário de energia. c) Muitas das espécies migradoras são bioluminescentes. d) Muitos dos predadores em potencial também migram. II. Migração anádroma (Gr. ana = para cima + dromos = correr): tipos de migração na qual os peixes voltam para a água doce na época da reprodução. O sa1mão, por exemplo, volta ao ponto exato do riacho onde nasceu para o acasalamento e a desova. O salmão do Pacífico (Oncorhynchus sp) migra uma única vez na vida, morrendo após a desova. O salmão do Atlântico (Salmo salar) migra e acasala várias vezes durante seu ciclo de vida. III. Migração catádroma (Gr. kata = para baixo + dromos = correr): tipos de migração na qual os peixes retornam ao mar na época da reprodução. A enguia (Anguilla sp) sai dos rios da Europa ocidental e da costa oriental da América do Norte em direção a um ponto comum, no meio do At1ântico, no mar dos Sargaços. Os adultos nadam a profundidades de mais ou menos 300 m por um período de 01 a 02 meses, para morrer logo após a desova. As larvas migram para as regiões de origem, utilizando as camadas de água 5 superficial, em uma viagem que pode durar de 2 a 3 anos. Durante esta fase, atingem o estágio jovem, sendo que os machos permanecem nas águas costeiras salobras, da desembocadura dos rios e as fêmeas sobem as correntes de água doce. Após um período de 8 a 15 anos, elas retornam para realizar a viagem migratória, juntamente com os machos, terminando o ciclo de vida após a desova. Outros grupos de animais realizam migrações periódicas ao longo dos oceanos, em geral com o objetivo de encontrar condições favoráveis para a procriação. Baleias e focas migram para os pólos durante o verão para se alimentar dos ricos estoques de p1âncton das águas árticas, e voltam para as águas quentes durante o inverno para o nascimento dos filhotes. Desta forma, protegem as crias contra o frio das águas polares, nos primeiros meses de vida. As tartarugas marinhas da América do Sul (Chelonia mydas), migram até a ilha de Ascenção para a desova. Esta pequena ilha está situada no meio do Atlântico à cerca de 2.600 km da costa. Cardumes de atuns migram da costa da Califórnia para as ilhas do arquipélago do Japão, provavelmente para não exaurir os estoques de nutrientes dos habitats onde vivem, explorando assim, outros sítios e outros recursos. As aves marinhas realizam migrações a longas distâncias, exercendo suas pressões predatórias em diferentes locais do globo, conforme a estação do ano. ADAPTAÇÕES Flutuação: Um dos problemas básicos, tanto do plâncton como do nécton, consiste na manutenção dos organismos em determinadosníveis da coluna d’água, uma vez que a densidade dos tecidos vivos tende a ser maior do que a da água do mar. Desta forma, o fitoplâncton afundaria para regiões abaixo da zona fótica, e o zooplâncton seria incapaz de atingir os agregados de fitoplâncton. O mesmo se dá com os organismos do nécton. O plâncton apresenta algumas adaptações para manter uma certa flutuabilidade positiva, tais como: espinhos, cerdas e corpo achatado para aumentar a superfície (dinoflagelados, larvas de crustáceos, quetognatos, etc); vesículas de gás (radiolários) ou óleo (radiolários e larvas de poliquetos) para diminuir a densidade. Os organismos do nécton utilizam, para o mesmo fim, estruturas tais como a bexiga natatória da maioria dos peixes teleósteos que constitui cerca de 5 a 10% do volume do corpo. Aqueles que não possuem bexiga natatória depositam grandes quantidades de gordura no fígado (tubarão e bacalhau). A forma das nadadeiras e da cauda auxilia também nos mecanismos de flutuabilidade, aumentando as propriedades hidrodinâmicas do corpo, facilitando desta forma a natação e, como conseqüência, a manutenção do corpo do animal na coluna d’água. Mamíferos marinhos utilizam as camadas de gordura subcutânea e de órgãos específicos em adição ao ar acumulado nos pulmões e entre os pêlos que revestem o corpo, para auxiliar na flutuação. As formas mais evoluídas apresentam métodos passivos para manter a flutuabilidade, e que requerem um menor gasto de energia. Por outro lado, formas mais primitivas adotaram estratégias ativas com um maior gasto de energia, envolvendo, na maioria das vezes, a natação. Temperatura: A temperatura é um fator de grande importância na regulação dos processos vitais e na distribuição dos organismos. Assim, nas águas polares, o zooplâncton entra em dormência no inverno, retomando a atividade no verão, durante o “bloom” de diatomáceas. Nesta fase, a temperatura torna-se adequada para que se iniciem os processos reprodutivos, aumentando consideravelmente os estoques do plâncton 6 nestas águas. Em contraposição, nas águas tropicais, onde a temperatura é praticamente constante, a reprodução ocorre o ano todo. A maioria dos mamíferos marinhos, como as focas, as baleias, as morsas, golfinhos, etc., possue uma grossa camada de gordura sob a pele que isola estes animais das baixas temperaturas da água que os circunda, impedindo uma perda drástica de calor. Pressão: De todos os fatores abióticos estudados, a pressão é o que apresenta as maiores amplitudes no ambiente marinho. Ela pode variar, no mar profundo, de 200 a 600 atm, chegando a 1.000 atm nas fossas do hadal. Este fato acarreta limitações drásticas na diversidade e densidade da biota nas grandes profundidades. As bactérias do abissal, por exemplo, param de crescer e de se reproduzir, quando sujeitas a pressões menores do que aquelas encontradas no ambiente de origem. Quanto aos metazoários, são poucos os dados disponíveis, pois estes, quando capturados e levados para a superfície, chegam já bastante danificados ou mortos devido à brutal mudança da pressão. Sabe-se, no entanto, que o complexo enzimático destes organismos funciona de modo diferente, evidenciando uma adaptação particular aos ambientes das águas profundas. A fim de evitar problemas fisiológicos, durante os mergulhos profundos, baleias e focas utilizam as seguintes estratégias: mergulham com os pulmões vazios; o fluxo sanguíneo diminui para evitar as trocas gasosas que poderiam originar bolhas de nitrogênio no sangue (embolia); o pouco ar remanescente ficaria retido nas vias respiratórias superiores onde não ocorre absorção de gases; os músculos possuem uma grande quantidade de mioglobina que se satura de oxigênio antes do mergulho. Este conjunto de fatores permite ainda mergulhos de longa duração, sem que seja necessária uma subida à superfície para a tornada de ar. Captura de alimento e fuga dos predadores: A ausência de refúgio e a baixa densidade de nutrientes nas águas do mar aberto, exigiram o desenvolvimento de adaptações especiais dos organismos, tanto para a captura de alimento, como para a fuga da ação predatória dos carnívoros marinhos. No caso do plâncton herbívoro, a eficiência da filtração foi otimizada pela aquisição de estruturas como cerdas (copépodos), redes de muco (tunicados como Oikopleura) e cílios (larvas de moluscos), entre outros. Estas estruturas, localizadas ao 1ongo do corpo, nas antenas, apêndices 1ocomotores, etc, auxiliam na captação de algas, pequenos organismos e demais partículas alimentares, com um menor gasto de energia. A camuflagem constitui uma estratégia útil, tanto na fuga de predadores, como na captura de presas. Alguns organismos apresentam cores crípticas (Gr. kryptein = oculto) que assemelham o animal ao ambiente circundante (diversos teleósteos). Outros possuem corpos total ou parcialmente, transparentes, tornando-os quase invisíveis na coluna d’água (ctenóforos). Raias e orcas apresentam a parte ventral do corpo clara (para confundir com a luz vinda da superfície) e a dorsal escura (para confundir com o fundo). Dependendo do posicionamento do observador, estes animais se tornam difíceis de visualizar. Um tipo de golfinho apresenta a parte ventral branca com manchas escuras e a parte dorsal cinza com manchas claras. Estes animais são freqüentemente encontrados no meio de cardumes de atuns, tornando-se também bastante difíceis de localizar. O posicionamento da presa pode ser levado a efeito por outros métodos que não os envolvidos com o sentido da visão. Golfinhos e cachalotes utilizam a ecolocação à semelhança dos morcegos. É interessante notar que os atuais não possuem bexiga natatória e dificilmente são predados pelos golfinhos. Este órgão seria o responsável pela formação do eco denunciador da presença de uma presa em potencial. O olfato é utilizado principalmente pelos tubarões. Estes dispensam, 7 de modo geral, qualquer estratégia de camuflagem, por constituírem os predadores de topo do ambiente onde vivem. A forma do corpo pode auxiliar também para tornar o animal menos visível. A forma abaulada do ventre dos peixes faz com que se projetem sombras para as camadas mais profundas. Já a forma em ponta ou quilha, possibilita à luz incidente uma maior reflexão e dispersão nas laterais do corpo, diminuindo o “efeito sombra”. As medusas adotaram métodos de ataque e defesa um pouco mais agressivos, com as células urticantes de seus tentáculos. Uma estratégia mais ativa consiste no desenvolvimento máximo das habilidades natatórias. Quanto mais veloz e ágil o animal, maior a chance de conseguir alimento e de evitar, ao mesmo tempo, que ele se transforme na presa do outro predador. As lulas e polvos desenvolveram ainda, em adição à velocidade, as nuvens de tinta que servem para confundir o perseguidor durante a fuga. O peixe voador, por outro lado, desenvolveu a habilidade de planar sobre a superfície da água, virtualmente desaparecendo das vistas do inimigo por vários segundos. Estratégias reprodutivas Dependendo do tipo de habitat e das pressões sofridas pelos organismos do reino pelágico, dois tipos de estratégias podem ser encontrados: do tipo r onde uma grande quantidade de ovos é produzida, sendo quase nulo o cuidado com a prole, e a do tipo k, com poucos ovos, havendo, em geral, um certo cuidado com os jovens. Peixes nectônicos como o atum, produzem uma grande quantidade de ovos (2,0 a 2,5 milhões/fêmea), sujeitos a pesadas perdas por predação por parte dos organismos planctófagos (Gr. planktos = errante + phagein = comer). O crescimento e o ciclo de vida são rápidos, levando de 5 a 10 anos. A grande maioria dos teleósteos apresenta esta estratégia. Tubarões, por outro lado, produzem poucos ovos, sendo que a fêmea retém os embriõesaté a eclosão com um tamanho suficientemente grande para que seja possível ao jovem evitar a predação nos primeiros estádios de vida. Os mamíferos marinhos possuem uma estratégia reprodutiva do tipo K, atingindo a maturidade sexual em idade mais avançada e apresentando um longo ciclo de vida. As baleias têm seus filhotes nas águas quentes dos mares tropicais, sendo que estes nascem debaixo d’água, ligados ao cordão umbilical até a primeira vez que respiram o ar na superfície, ajudados pela fêmea. O cuidado é intensivo e o filhote não se afasta muito da mãe. Devido à grande quantidade de energia utilizada na produção do leite, extremamente rico em gorduras, as baleias podem gerar apenas um filhote de cada vez (a ocorrência de gêmeos é extremamente rara). Os Pinnipedia (focas, morsas, leões-marinhos, etc), têm seus filhotes, em geral a cada ciclo, em terra firme, abandonando-os por longos períodos de tempo, enquanto a fêmea se afasta em busca de alimento. Quando sozinhos, os filhotes são ameaçados por aves predadoras, correndo inclusive o risco de esmagamento por outros membros do grupo, uma vez que estes animais são extremamente gregários na época da reprodução. O macho forma um harém e defende seu território e suas fêmeas, contra os demais machos do bando. Tanto baleias como focas selecionam áreas particulares para a procriação, formando grandes grupos nestes períodos. Caso alguma alteração aconteça, seja devida a caça indiscriminada, destruição do habitat ou poluição das águas, o equilíbrio natural é quebrado levando estas populações a um sério risco de extinção. 8 AMBIENTES ESPECIAIS As zonas profundas: Estas zonas serão consideradas, resumidamente, em separado, por apresentarem características diferentes das regiões mais superficiais. Devido à ausência total de luz, e conseqüentemente, ausência de fitoplâncton, as comunidades dos mares profundos são, na sua totalidade, de caráter heterotrófico. A fonte de energia é proveniente da chuva de detritos que cai por sedimentação, a partir das camadas superiores. A quantidade deste material chega a cerca de 0,5 g/m2/ano. Eventuais cadáveres de grandes animais, como focas e baleias, podem adicionar mais 3,0 a 4,0 g/m2/ano. Parte deste material, em decantação, chega ao fundo dos oceanos onde sedimentam. O restante fica retido em diversas profundidades, onde é capturado por organismos adaptados a viver sob pressões determinadas. Observa-se neste caso o fenômeno da “Migração em Escada”. Esta consiste na movimentação dos organismos entre os limites das camadas às quais estão adaptados, podendo exercer uma ação predatória, ou mesmo serem predados, ficando assim assegurada a manutenção de diversos elos de ciclagem de nutrientes, garantindo o fluxo de energia nestas cadeias alimentares especiais. Nesta região encontra-se o plâncton, que se alimenta de matéria orgânica em decomposição, proveniente da chuva de detritos. Os peixes que habitam estas águas estão adaptados a aproveitar toda e qualquer presa que esteja disponível, mesmo que estas apresentem grandes dimensões. Para tanto, possuem abdomens extensíveis, mandíbulas grandes e elásticas, dentes longos e pontiagudos, ausência de bexiga natatória para economizar espaço no abdômen, e órgãos bioluminescentes para atrair as presas (e, também, para o reconhecimento de organismos da mesma espécie). Outros organismos que apresentam bioluminescência são as lulas e eufausiáceos encontrados em grandes quantidades nestas águas. Uma vez que este ambiente apresenta condições praticamente constantes no que toca à temperatura, salinidade, oxigênio e pH, a reprodução das espécies de águas profundas é contínua. Chuvas de nutrientes mais densas podem incrementar a atividade reprodutiva em determinadas ocasiões. A maioria das espécies produz ovos grandes e em pequeno numero, predominando a viviparidade. São raros os que possuem estágios larvais, evidenciando uma clara tendência para uma estratégia reprodutiva do tipo k, que é típica de ambientes estressados. BIBLIOGRAFIA LEVINTON, J. S. 1982. Marine Ecology. Prentice-Hall inc., Englewood Cliffs, NJ, 526 p. NYBAKKEN, J. W. 1982. Marine Biology. An Ecological Approach. Harper f. Row, New York, 446p. ODUM, E. P. 1972. Ecologia. 39 ed. Interamericana, México, 639 p. SMITH, R. L. 1980. Ecology and Field Biology. 39 ed. Harper & ROW, New York, 835 p. ZOTTOLI, R. 1978. Introduction to Marine Environments. 29 ed. The C. V. Kosby Company, Saint Louis, 252 p.
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