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Introdução à Macroeconomia Lais Silva Santos Requena Introdução à Macroeconomia 2 Introdução A Macroeconomia trata o comportamento da economia como um todo, de períodos de prosperidade à recessão. Trata das variações dos preços e também dos níveis de emprego. Dessa forma, em Macroeconomia, negligenciamos os pormenores do comportamento de unidades econômicas individuais e tratamos do desempenho geral. Compreender Macroeconomia é muito importante, tendo em vista que a renda, o emprego, os juros e as variações de preços estão ligados de maneira direta a nossa vida, e o bom desempenho dessas variáveis pode tornar a nossa sociedade melhor e mais justa. Ao longo deste conteúdo, veremos alguns pensadores que tratam da Macroeconomia e de suas principais funções, abordaremos a política fiscal bem como os gastos e as receitas do governo. Além disso, iremos tratar da carga tributária do nosso país, do deficit público e do efeito da política fiscal sobre a economia. Objetivos da Aprendizagem Ao final do conteúdo, esperamos que você seja capaz de: • Conhecer os grandes agregados econômicos, como juros, inflação, desem- prego etc. • Identificar as políticas macroeconômicas e a real efetividade de cada uma delas para a economia do país. 3 Macroeconomia - seus Pensadores e Funções A palavra “economia” é muito antiga e significa basicamente “administração do lar”, ou seja, organização de recursos. Mas a economia somente passa a ser considerada uma ciência a partir de 1776, com o lançamento da obra de Adam Smith denominada “A riqueza das nações”. Sem dúvida, esta é até hoje uma das mais importantes obras na área econômica. Smith organizou os pensamentos econômicos que, até então, eram fragmentados, esparsos e, nesse livro, escreveu sobre as funções do Estado e como as empresas e os países deveriam fazer para ter sucesso econômico. De acordo com Smith, o Estado deveria apenas fazer valer o direito sobre a propriedade privada e garantir a segurança pública. Isto ficou denominado como “Estado Liberal”, isto é, aquele que não intervém em assuntos econômicos. Mas essa ideia durou apenas até a década de 1930, pois, com a grande depressão advinda da crise de 1929, o Estado passou a intervir de forma veemente na economia para garantir emprego e renda à população. Em 1936, John Maynard Keynes, um dos mais notáveis economistas da história, escreveu a obra “Teoria Geral dos Juros do Emprego e da Moeda”. Nessa obra, Keynes destacou a importância do governo em manter a Demanda Agregada da economia sempre em alta. Como? Através de investimentos públicos. Keynes acreditava que o Estado tinha mais funções do que simplesmente garantir a segurança e o direito à propriedade privada, o Estado deveria gerar emprego e renda. Ele pregava o poder multiplicador do investimento, isto é, por meio deste se gera emprego, que gera renda e enfim consumo. Com o aumento do consumo, seriam necessários mais investimentos, que geram mais emprego, renda e consumo novamente. Esse Estado de bem-estar Keynesiano durou até a década de 1970, pois, a partir dos anos 1980, os países estavam endividados e, portanto, entraram num processo de desestatização (privatizações), que foi agravado na década de 1990. O setor privado passou a ditar as regras do jogo novamente, e esse período é conhecido como Neoliberalismo, ou seja, o novo liberal. Atualmente, podemos dizer que o governo possui algumas funções econômicas, isto é, existem justificativas para a existência do governo, as quais são: A. Função alocativa, através da qual a ação do governo visa corrigir falhas da economia de mercado no uso dos recursos econômicos (fatores de produção), como é o caso 4 de algumas externalidades. Um bom exemplo de externalidade é a poluição, em que dificilmente as empresas desejarão incorporar os custos de não poluição, a não ser que haja imposição governamental. B. Função distributiva, que consiste em arrecadar impostos e contribuições dos mais ricos ou das regiões mais desenvolvidas, e transferi-los para os mais pobres e regiões mais carentes. C. Função estabilizadora, por meio da qual o governo procura atingir um de seus objetivos (veremos adiante que o governo possui outros objetivos, como crescimento econômico, distribuição de renda e diminuição do desemprego), que é a estabilização econômica, ou seja, a estabilidade dos preços, uma das condições necessárias para que os investimentos aumentem e, com eles, o crescimento econômico, o emprego e a renda nacional. Sem dúvida, o Plano Real é um bom exemplo dessa função exercida pelo governo brasileiro. Políticas macroeconômicas: As políticas macroeconômicas existem para que o governo cumpra suas funções econômicas. Reflita Análise do Produto Interno Bruto (PIB) Para analisarmos a economia como um todo, devemos abordar as principais variáveis que afetam a riqueza de um país, ou seja, as variáveis que afetam o PIB. Vejamos as principais variáveis: 5 Figura 1 – Variáveis da economia Fonte: Elaborado pelos autores. Tendo em vista que o principal objeto da Macroeconomia é a determinação do nível de atividade econômica no país, para que se possa estimar o produto interno bruto, a renda gerada por esse produto e também o emprego, é fundamental excluir dos gastos (ou dispêndios) globais o montante do valor gasto com as importações, pois estas não geram renda tampouco emprego aqui no Brasil. Em suma, serão enfocados os componentes da demanda agregada ou do dispêndio nacional, que é igual a C + G + I + (E - M), a fim de se destinar a renda nacional, o produto interno bruto e o nível de emprego no país. Agora que já sabemos que a demanda agregada determina o produto, isto é, a quantidade total de bens e serviços produzidos em um país num determinado ano, é fundamental analisar cada uma das variáveis ou fatores que influenciam a demanda agregada. Assim, vamos analisar os fatores determinantes do produto. Em particular, serão analisadas as relações entre os fatores que influenciam o consumo privado, tais como renda, taxa de juros, crédito, número de prestações, riqueza. É do consumo que se tira também a relação entre poupança, renda e taxa de juros: a) os gastos públicos (em consumo e em investimentos); b) o investimento privado com a taxa de juro e com o risco; c) as exportações. Este é o início para demonstrar como se determina o equilíbrio da atividade econômica e o pleno emprego dos recursos produtivos. 6 O Consumo Agregado Privado O consumo privado é o principal e o mais estável componente da demanda agregada, representando, em média, dois terços ou mais da Despesa Interna Bruta da economia brasileira, ou seja, do Produto Interno Bruto do país. Entre todos os fatores determinantes do nível de consumo, o nível de renda é, sem dúvida, o de maior importância. O consumo agregado (C) é uma função da renda disponível (Yd), chamada função-consumo, cuja notação geral é dada por: C = f (Yd). Isto significa dizer que: por renda disponível Yd, entende-se aquela renda (salários, juros, aluguéis, lucros) que está à disposição do consumidor, ou seja, é a renda bruta Y deduzida dos impostos (T). Portanto, Yd = Y - T. Assim, quanto maior o imposto, menor a renda disponível. O consumo das famílias depende da renda que elas têm. Essa relação é positiva, ou seja, à medida que a renda aumenta, o consumo também tende a elevar-se. Por outro lado, se a renda é reduzida, o nível do consumo fatalmente cairá. Em outras palavras, quanto maior for a renda, maior tende a ser o consumo. Admite-se que, para baixos níveis de renda, as despesas de consumo tendem a ser elevadas. Todavia, à medida que a renda se eleva, as despesas de consumo também se elevam em valor absoluto, embora passem a significar menor percentagem da renda. Em outras palavras, nas economias menos desenvolvidas, as famílias gastam proporcionalmente mais em consumo do que nas nações desenvolvidas. Como o consumo aumenta menos proporcionalmente que a renda, quanto mais aumentaa renda da sociedade, maior é a proporção dessa renda que é poupada. Em outras palavras, pode-se dizer que o consumo cresce a taxas decrescentes com a renda, enquanto a poupança cresce a taxas crescentes. Além da renda, o consumo também é influenciado ou afetado por outras variáveis, como a taxa de juros, o valor das prestações mensais, o número de prestações, do crédito e da riqueza. A taxa de juros é uma importante variável na decisão do consumo, em especial, para os bens e serviços de consumo duráveis (automóveis, eletrodomésticos de um modo geral), que normalmente têm um valor maior e, portanto, dependem de financiamento. Como bens financiáveis, os juros têm uma direta influência sobre o valor das prestações. Assim, quanto maior o juro, maior o valor das prestações, o que, em consequência, afeta negativamente a decisão do consumo. Ademais, a taxa de juros tem uma influência direta sobre a poupança, ou seja, as pessoas estarão tanto mais dispostas a aplicar recursos financeiros em poupança quanto maior for a taxa de juros (que é a remuneração da sua aplicação financeira). 7 Figura 2 – Taxa de juros Fonte: Plataforma Deduca (2022). Esta é a famosa Lei Psicológica Fundamental, conforme foi dita por Keynes, segundo a qual os indivíduos consomem mais conforme a renda aumenta, mas não na mesma proporção, uma vez que a poupança tende também a aumentar. Ora, poupar mais significa consumir menos, pois poupança é uma renúncia ao consumo hoje para consumir mais no futuro. Desse modo, quanto maior a taxa de juros, mais as pessoas desejarão poupar hoje, ou seja, o consumo presente diminui. Pode-se, assim, concluir o seguinte: quanto maior a renda e menor a taxa de juros, maior o consumo. A taxa de juros evidentemente tem muito a ver com a oferta monetária e, também, com a demanda por moeda. Um aumento da oferta monetária, isto é, da quantidade de moeda em circulação na economia, provoca uma queda nos juros e consequente aumento do consumo de bens duráveis, em especial. Além do seu efeito sobre o consumo, na verdade, a taxa de juros tem impactos diferenciados sobre os agentes econômicos, dependendo da situação desses agentes: se eles forem do setor privado (seja na situação de aplicadores ou de devedores) ou se esses agentes forem do setor público. Para os aplicadores privados, ou seja, aqueles que têm recursos financeiros aplicados em poupança, CDBs e fundos de investimentos (cujos rendimentos se baseiam nas taxas de juros), o aumento dos juros faz com que suas rendas aumentem (e, portanto, podem vir a consumir mais depois). Para os devedores (ou seja, pessoas que têm dívidas), o aumento dos juros faz com que suas rendas diminuam, pois elas terão que destinar mais gastos com juros. Consequentemente, terão menos recursos para gastar. 8 Para o setor público, que, de um modo geral, tem deficit público (ou seja, gasta mais do que arrecada) e, portanto, necessita financiar-se no mercado financeiro, é ruim. A escola monetária, na maioria das vezes associada à Universidade de Chicago, defende que o aumento de dinheiro em circulação provoca a elevação dos preços, ou seja, a expansão da moeda está atrelada à inflação. Na verdade, os monetaristas se preocupam muito com a expansão monetária para financiar os deficits públicos. O aumento de juros tende a aumentar ainda mais os gastos públicos e a própria dívida pública. Com relação às prestações, tanto o valor como o número delas têm uma influência sobre o consumo. Quanto maior o número de prestações (e, portanto, menor é o valor mensal delas), maiores as possibilidades de consumo de bens duráveis (que são financiáveis), pois os consumidores, em especial os de baixa/média renda, passam a ter condições financeiras de pagamento parcelado, apesar de as prestações se alongarem por dois ou mais anos. Essa variável (número de prestações) teve uma decisiva influência sobre o grande aumento de consumo de bens eletrodomésticos no Brasil no período 1996-1997. Nessa época, o importante para os consumidores era o fato de poder assumir as prestações, apesar de estarem pagando, ao final, duas ou mais vezes do que o valor à vista, dadas as elevadas taxas de juros. Em outras palavras, os juros altos "pesavam" menos do que a possibilidade de assumir o pagamento parcelado. O nível de riqueza das famílias influencia, também, as decisões de consumo. As pessoas que já têm ativos (como casa, automóvel, plano previdenciário e alguma poupança) estarão mais propensas a gastar maior parte de suas rendas atuais em consumo do que aquelas que ainda não tenham nenhum desses ativos, mesmo que o nível de renda de ambas seja igual. Em outras palavras, dado o nível de renda das pessoas, tende a consumir mais quem possui mais riquezas, pois elas têm menos preocupações com o futuro. Outro elemento determinante do consumo é a existência de crédito ao consumidor. Quanto mais desenvolvido um sistema financeiro que tenha crédito abundante, maior é o potencial de demanda por bens de consumo duráveis. Ao incluirmos a taxa de juros, a riqueza e o crédito como variáveis que influenciam o consumo, estamos nos referindo às aplicações financeiras, aos empréstimos e, portanto, ao sistema financeiro, ou seja, existindo um sistema financeiro desenvolvido, as regras deste podem estimular ou dificultar o consumo. O volume de crédito disponível em um país serve como um dos vários indicadores da capacidade de crescimento da economia. Quanto mais empréstimos as pessoas e empresas tomam, mais recursos podem ser direcionados para consumo ou para 9 investimentos, contribuindo para o aumento do nível de atividade. Sem dúvida, o pequeno volume de empréstimos é um obstáculo ao crescimento. Consumo do Setor Público O governo, assim entendidas as administrações públicas de um modo geral, incluindo as esferas federal, estaduais e municipais e respectivas empresas estatais, também tem influência sobre o consumo final de bens e serviços. É claro que as variáveis mencionadas (como renda, juros, prestações, riqueza e crédito) não são as que explicam o nível de consumo do setor público. Cabe ressaltar que esse tipo de consumo representa uma parcela muito significativa do Produto Interno Bruto brasileiro. Por exemplo, o consumo final das administrações públicas está ao redor de 20% do PIB do país, ao passo que, conforme já foi mencionado, o consumo agregado privado (das famílias) absorveu a parcela em torno de 60%. Em 1984, havia no Brasil 317 empresas estatais, sendo que 62% delas estavam ligadas ao setor produtivo e o restante era de administração descentralizada, com funções típicas de governo. Nessa época, nove enormes empresas controlavam mais de três quartos do orçamento das estatais. A partir do final da década de 1980, deu- se início a uma mudança bastante radical da presença do governo no setor produtivo, com a criação do Programa Nacional de Desestatização (leia-se: privatização). Com o processo de privatização, pretendeu-se reduzir e limitar o papel do governo como Estado-empresário. Investimento Agregado Privado Se a grande parte da produção de bens e serviços se destina ao consumo final (privado e governamental), outra parcela vai formar o que se chama de acumulação, ou seja, é composta por produtos ligados ao processo de formação de capital de um país. Na realidade, a acumulação diz respeito aos investimentos em bens de capital, os quais representam os acréscimos líquidos na capacidade nacional de produção. Os investimentos destinam-se à aquisição de bens de capital, que compreendem o conjunto das riquezas acumuladas pela sociedade, destinadas à geração de novas riquezas. Nesse conjunto de riqueza, incluem-se: máquinas, equipamentos, ferramentas de trabalho, construções, edificações, equipamentos de transporte e equipamentos de infraestrutura econômica e social. 10 A função de investimento, na versão de Keynes, é indubitavelmente um dos fundamentos da procura agregada. A tomada de decisão do empresário em investir,como será visto a seguir, é resultante da comparação entre a taxa de retorno do investimento e a taxa de juros de mercado. O investimento pode ser definido como o acréscimo ao capital real da sociedade. Assim como a poupança, ele resulta de uma abstenção do consumo imediato em relação à renda gerada no período, ou seja, estruturalmente o investimento (I) é igual à poupança (S), uma vez que eles são apenas aspectos diferentes de uma mesma realidade. Embora a poupança seja resultado do comportamento coletivo dos consumidores individuais e o investimento resulte do comportamento coletivo dos empresários e do governo, os dois se equivalem, porque qualquer um deles é igual ao excedente da renda sobre o consumo. As igualdades estruturais e as equações fundamentais do sistema keynesiano são: RENDA (Y) = VALOR DA PRODUÇÃO CORRENTE (VPC) VPC = BENS DE CONSUMO (C) + BENS DE INVESTIMENTO (I) INVESTIMENTO = PARCELA DA PRODUÇÃO DESTINADA À AMPLIAÇÃO DO ESTOQUE DE CAPITAL POUPANÇA (S) = EXCESSO DA RENDA EM RELAÇÃO AO CONSUMO Ou seja: Y = C + I S = Y – C Y = C + S I = S Fundamentalmente, o setor privado só realiza novas inversões (investimentos) se houver favoráveis expectativas de lucros. A taxa de retorno esperado do novo investimento (a qual Keynes deu a denominação de eficiência marginal do capital) é a base das decisões empresariais. Quando a eficiência marginal do capital for maior do que a taxa de juro, o novo investimento deve ser realizado. Caso contrário, o montante que seria aplicado na inversão prevista renderá muito mais se for aplicado à taxa de juros corrente. Portanto, o investimento privado (I) é uma função inversa (relação negativa) da taxa de juros (r), ou seja: I = f (r). Em outras palavras, uma queda da taxa de juros estimula os empresários a investirem mais, e vice-versa. Assim, quanto mais baixa a taxa de juros, maior o volume de recursos que o setor privado destinará para investimentos. A taxa de juros, na análise keynesiana, resulta do confronto da procura da moeda correspondente ao motivo de especulação e da oferta da moeda, isto é, ela é determinada no mercado monetário. Na realidade, o investimento depende também de outros fatores dinâmicos, como o nível de risco (leia-se expectativas sobre as condições futuras da economia), o avanço tecnológico, ou seja, o ritmo das inovações 11 tecnológicas, principalmente sobre os processos produtivos, o crescimento da demanda (via expansão populacional ou via aumento de renda), a política governamental, a evolução do comércio exterior, a descoberta de novos produtos e, até mesmo, a estabilidade política da nação. Entre esses fatores, cabe uma observação sobre o risco ou as expectativas sobre o futuro dessa igualdade, que só ocorre em situação de equilíbrio. Ressalta-se que os recursos para realizar o investimento provêm da poupança (do governo, das empresas, das famílias e do resto do mundo). Muitas vezes, a demanda para investimento (intenção de investir) está acima dos recursos disponíveis. Nesse caso, ocorre o desequilíbrio na economia do país. Quanto maior o otimismo com relação ao futuro (pensando-se em economia estável e regras de jogo definidas), mais estimulados estarão os empresários a investir, pois o investimento é um tipo de aplicação de longa duração, necessitando, portanto, de um horizonte temporal de longo prazo. Nesse caso, a redução de risco provoca um efeito positivo nos investimentos, deslocando a curva de investimento para a direita. Desse modo, dada a taxa de juros, quanto menor o risco, maior o investimento. Para o Brasil, é necessário e importante que os dois fatores atuem na mesma direção, ou seja, menor risco e juros mais baixos, pois assim o volume investido pelos empresários será maior. O investimento privado depende da taxa de juros e do risco. O investimento privado ou formação bruta de capital fixo das empresas e famílias está ao redor de 20% do Produto Interno Bruto brasileiro. Essa taxa de investimento (relação entre a formação bruta de capital fixo e o Produto Interno Bruto), no Brasil, já esteve bem acima desse patamar na década de 1970. Contudo, devido aos vários problemas da economia brasileira na década de 1980 (como dívida externa, inflação descontrolada, frequentes mudanças nas políticas monetária e cambial), surgiu um ambiente econômico de incertezas, de tal modo que os investimentos se retraíram. Vale ressaltar, contudo, que, para que a economia brasileira gere em torno de 1,7 milhão de novos empregos demandados anualmente, a taxa de crescimento do PIB deve se situar próximo a 7% ao ano, mas, para tanto, a taxa anual de investimento global (privado e público) deve se situar no patamar de 25% do PIB. É importante lembrar que o investimento afeta o nível de produto, porque ele é um elemento da demanda agregada. Quanto maior for o investimento ou o dispêndio em máquinas, equipamentos, edificações e construções, ou seja, em bens de capital, maior será o produto da economia (o PIB), além de gerar mais empregos e, portanto, maior renda para a coletividade. 12 Investimento Público Além do setor privado, o governo também faz investimentos. As obras públicas, como construções de rodovias, ferrovias, aeroportos, açudes, barragens, silos e armazéns, edificações (como escolas, hospitais) e também as aquisições de máquinas e equipamentos são bons exemplos de dispêndios do setor público na formação bruta de capital fixo do país. Na década de 1970, devido à maior presença do Estado na economia, o percentual do investimento público estava ao redor de 4% do PIB. Atualmente, esse percentual é inferior a 3% se forem considerados os investimentos das Estatais, mas se for levada em consideração apenas a Administração Federal direta não chega a 1%. As compras do governo, que constituem o terceiro componente da demanda agregada, têm um efeito de alto poder sobre o nível de renda. Os gastos do governo (G) são tratados como exógenos, isto é, como uma variável que pode afetar, mas não é afetada por outras variáveis no modelo. Exportações Um país exporta bens e serviços nacionais (E) e importa bens e serviços estrangeiros (M). Conforme foi citado, as exportações fazem parte do Produto Interno Bruto, gerando internamente renda e dispêndio, enquanto as importações transferem renda para o exterior e não fazem parte do PIB. A diferença entre as exportações e as importações representa a demanda externa líquida ou exportações líquidas. Desse modo, um aumento nas exportações líquidas X (em que X = E - M) aumenta a demanda de bens e serviços nacionais (demanda agregada), uma vez que, conforme já vimos: Da = C + G + I + X A expansão das exportações representa uma poderosa alavanca para o fortalecimento e expansão da demanda agregada (ou seja, da produção interna). Numa economia aberta (comércio com o exterior), as exportações fazem com que a demanda por produtos brasileiros se expanda, e, assim, a produção de bens e serviços produzidos no Brasil aumenta, gerando, em consequência, mais emprego e mais renda no território nacional. Por incrível que pareça, muitas pessoas não percebem esse efeito multiplicador das exportações sobre a economia brasileira, chegando, inclusive, a críticas do tipo: "É um absurdo que o Brasil exporte, quando há fome aqui dentro". É fundamental que se tenha em mente que, quando o Brasil exporta alguma mercadoria, o efeito é semelhante a vender aqui dentro, sob o ponto de vista de geração de renda e de emprego, sem 13 contar que, ao exportar, estamos trazendo divisas internacionais para o país, que delas necessita para pagar as importações e outros compromissos financeiros, em especial, para "bancar" o deficit na balança de serviços (isto é, pagar juros da dívida externa, remessa de lucros para o estrangeiro, pagamentos de fretes internacionais, entre outros). Políticas Econômicas Como vimos, o principal objeto da Macroeconomia é estudar os elementos que determinam o nível de produção de bens e serviços (PIB),da renda nacional, do emprego e dos preços de um país, e que essas variáveis, na visão keynesiana, dependem do nível e de variações na demanda agregada, que é a soma dos fluxos de dispêndios em bens e serviços de consumo (privado e público), em investimento (privado e público) e exportações (ou seja, o que os estrangeiros compram de produtos brasileiros). Quanto maior a demanda agregada por parte dos cerca de 200 milhões de brasileiros, das administrações públicas (governo), das empresas (que investem) e dos estrangeiros que compram produtos brasileiros, maior o nível de produção de bens e serviços no Brasil, maior o nível de emprego e maior o nível de renda nacional. Como para Keynes, a demanda agregada influencia a produção, o controle do nível da demanda agregada é exercido pelas autoridades governamentais, ou seja, pelo governo. Essa intervenção do governo na economia é denominada política econômica, que é um ramo da economia dita normativa e que faz parte da política pública. Objetivos das Políticas Econômicas Ao fazer as suas intervenções na economia, cujas consequências afetam a todos (consumidores, empresários, trabalhadores), o governo tem evidentemente algum objetivo. Basicamente podem-se citar quatro objetivos da intervenção governamental, ou seja, objetivos da política econômica: estabilidade dos preços, crescimento econômico (aumento de renda e de emprego), melhor distribuição da riqueza (renda) e equilíbrio nas contas externas. A prioridade do governo nesses objetivos se altera ao longo dos anos, de acordo com cada governo. Por exemplo, no início dos anos 1980, o ajuste externo era mais prioritário para o governo do que a estabilidade ou o crescimento. Desde 1986, com o Plano Cruzado e os demais planos econômicos (Bresser, Verão, Collor I e Collor II, até chegar ao Plano Real), a prioridade número 1 passou a ser a estabilização econômica. 14 Figura 3 – Moeda brasileira atual Fonte: Plataforma Deduca (2022). De um modo geral, as decisões no plano macroeconômico visam melhorar a qualidade de vida das pessoas. Entre alguns dos problemas macroeconômicos que um país pode enfrentar estão: inflação (ou seja, aumento generalizado dos preços de bens e serviços), recessão ou baixo crescimento da economia, desemprego elevado, distribuição desigual de renda, variação cambial (o real em relação ao dólar pode variar muito, num determinado período), problemas no balanço de pagamentos (que registra o resumo contábil das transações econômicas do Brasil, por exemplo, com o resto do mundo), em que o país tem dificuldades em pagar suas contas externas, taxas de juros elevados no mercado interno, entre outros. Com o objetivo de resolver ou, pelo menos, minimizar esses tipos de problemas econômicos, os governos fazem quase que diariamente intervenções na vida das pessoas e das empresas, via decisões políticas com interesse econômico. São basicamente quatro os objetivos de políticas econômicas: estabilidade dos preços (leia-se: inflação baixa); crescimento econômico, ou seja, crescimento da produção (de modo a garantir aumento de renda e de emprego); melhor repartição da riqueza (em particular da renda pessoal e regional); e equilíbrio nas contas externas (ou seja, que o país possa pagar seus compromissos financeiros com os demais países). Estabilidade Econômica Embora a estabilização econômica tenha um sentido mais abrangente, podemos entendê-la como sinônimo de estabilidade de preços, isto é, a busca por manter a 15 inflação em nível baixo (em geral, abaixo de 6% ao ano, para um país como o Brasil, já pode ser considerado um objetivo alcançado, enquanto para os EUA esse nível é em torno de 2,5% ao ano). Taxas elevadas de inflação trazem distorções para a sociedade: piora a distribuição de renda (porque os mais pobres não conseguem, com o mesmo sucesso dos mais ricos, fazer aplicações de seu dinheiro no mercado financeiro), as aplicações financeiras passam a ter prazos menores (desestimulando os investimentos das empresas e dificultando a aquisição de moradias, por exemplo), entre outros. Crescimento da Produção: Mais Renda e Emprego O crescimento econômico de um país (principalmente no caso do Brasil, que tem um elevado crescimento populacional) é, provavelmente, o mais importante objetivo de política econômica, uma vez que significa maior quantidade de bens e serviços disponíveis para a sociedade. Se a produção cresce a uma taxa superior à da população, diz-se que a produção por pessoa (a renda per capita) está aumentando. Aliás, este é talvez o único caminho para melhorar o nível de renda de um país. Como produção tem tudo a ver com emprego (inclui-se aqui não só a mão-de-obra, mas também outros fatores, como o emprego de recursos naturais e capital), a expansão da produção leva à geração de maior nível de emprego. Melhora da Distribuição de Renda Esse objetivo, apesar de sua importância, praticamente nunca foi o principal em nenhum dos governos brasileiros. A péssima distribuição de renda no Brasil está, assim, a merecer que, um dia, seja objeto de preocupação dos nossos governantes. O controle da inflação no país, nos últimos anos (leia-se Plano Real), até ajudou a melhorar esse problema (como já foi citado, em 1993, os 10% mais pobres, que detinham apenas 0,7% da renda agregada, viram sua participação aumentar para 1,1% em 2001), mas a solução para uma melhor distribuição de renda depende basicamente da melhoria na educação, especialmente nos níveis de ensino fundamental e médio. Para tanto, os ensinos fundamental e médio deveriam ser gratuitos, de qualidade e oferecer escolas com tempo integral, como ocorre em todos os países desenvolvidos. Equilíbrio nas Contas Externas No balanço de pagamentos, faz-se o registro contábil das transações comerciais e financeiras de um país com os demais países do mundo. Os três principais componentes 16 do balanço de pagamentos (BP) são: a balança comercial (que registra a diferença entre exportações e importações de mercadorias), a balança de serviços (que registra as transações de serviços e de renda, tais como pagamentos de juros, turismo, fretes, remessas de dividendos e de lucros, entre outros) e os movimentos de capital (investimentos estrangeiros e ingressos de capital financeiro), além das transferências unilaterais, que, na verdade, se constituem em um quarto componente do BP. O equilíbrio nas contas externas, em especial nas transações correntes (que é o balanço entre a conta comercial e a de serviços), para um país como o Brasil, é necessário principalmente por duas razões: primeiro, porque a moeda nacional (o real, no caso do Brasil) não é aceita mundialmente (portanto, não pode ser usada para pagamentos de compromissos com os demais países); segundo, porque o Brasil não pode imprimir dólares legalmente. Se um país tem deficit nas transações correntes, ele necessariamente dependerá do ingresso de dólares no país, seja via investimentos diretos de outro país no Brasil ou via capital especulativo. Caso contrário, essa necessidade de dólares para cobrir o deficit (o que significa que estão saindo mais dólares do que entrando) só seria possível se eles viessem das reservas em dólares que o país tem. Isso só é admissível em curto prazo, e não em longo prazo, pois o volume das reservas é limitado. Superavits permanentes podem também resultar em problemas para um país, porque o ingresso excessivo de dólares pode obrigar o Banco Central a ter que emitir moeda nacional (reais, no caso do Brasil) para fazer a conversão dos dólares por reais, uma vez que os dólares não têm livre circulação no país. Ocorre que, quanto maior o volume de dinheiro (em reais) em circulação na economia, maior é a possibilidade de inflação. Conflitos Existentes Cabe destacar a existência de conflitos entre esses quatro objetivos, ou seja, quando o governo intervém na economia para resolver um determinado problema, pode trazer consequências negativas sob o ponto de vista deoutro objetivo. Por exemplo, se o governo aumenta a taxa de juros para conter a inflação (isto é, atingir o objetivo de estabilidade dos preços), essa elevação dos juros pode desestimular o consumo e o investimento privado, retraindo a demanda agregada e, assim, pode provocar até recessão e desemprego. São objetivos da política econômica a estabilidade de preços, o crescimento, a melhor distribuição da riqueza e o equilíbrio nas contas externas. Sem nenhuma dúvida, a partir de 1986, quando foi lançado o primeiro plano de estabilização econômica (o Plano Cruzado em fevereiro de 1986), até o final do governo Fernando Henrique Cardoso, 17 em dezembro de 2002, a prioridade foi o combate à inflação, em que principalmente a política monetária foi utilizada como instrumento de estabilidade dos preços. Acreditava-se que, nos governos posteriores, o foco se alterasse um pouco, passando a ser: crescimento econômico (visando à geração de emprego) com estabilidade monetária e inclusão social (leia-se: preocupação com a repartição), mas infelizmente isso não ocorreu, pois a prioridade continuou sendo a estabilidade. Instrumentos de Política Macroeconômica A política macroeconômica envolve a atuação do governo sobre a capacidade produtiva (oferta agregada) e as despesas planejadas (demanda agregada), com o objetivo de permitir que a economia opere a pleno emprego, com baixas taxas de inflação e distribuição de renda justa, e que cresça de forma contínua e sustentável. Em nível macroeconômico, para atingir esses objetivos, o governo intervém na economia e, para tanto, dispõe de quatro instrumentos importantes: política fiscal (receita e gastos públicos), política monetária (juros e controle da oferta de moeda), política cambial (que afeta o setor externo: exportação, importação e transações financeiras, via câmbio, tarifas e outros controles) e política de rendas (que inclui o controle de preços e salários). A forma de atuação do governo tem consequências diretas sobre o sistema financeiro, em particular os bancos. Política Fiscal: Receita e Gastos Públicos Por política fiscal entende-se a atuação do governo no que diz respeito à arrecadação de impostos (as chamadas receitas públicas) e aos gastos públicos. De um lado, como sabemos, o governo constrói e mantém escolas, estradas e hospitais, paga funcionários e juros da dívida. De outro, atuando sobre o sistema tributário, pode aumentar ou diminuir a sua arrecadação, via impostos e outras taxas. O objetivo básico da política fiscal é conduzir, com eficiência, a área administrativa do governo, promovendo o bem-estar da população mediante a realização de obras de interesse da sociedade e a eficácia na arrecadação tributária para fazer frente às despesas orçamentárias. Essas políticas devem manter uma estreita ligação com os objetivos que os governos perseguem, embora muitos desses objetivos sejam conflitantes entre si. Entre esses objetivos estão: crescimento do PIB, pleno 18 emprego, distribuição da renda, taxa de inflação baixa e estável, taxas de juros baixas, investimentos em expansão e equilíbrio no balanço de pagamentos. Gastos do Governo Os gastos do governo compõem-se de despesas correntes e de investimento. Nas despesas correntes incluem-se quatro itens: o consumo do governo (pagamento dos funcionários e despesas como energia elétrica e materiais), transferências (despesas do setor público destinadas ao setor privado, sem contraprestação de serviços ou fornecimento de bens, como, por exemplo, é a Assistência e Previdência Social), juros (pagamento de juros tanto da dívida interna como externa) e subsídios (são gastos do governo objetivando que os consumidores adquiram alguns bens e serviços por preços menores do que se daria pelo mercado normal, ou que o produtor receba preços maiores, ou seja, o subsídio tanto pode ser para o consumidor quanto para o produtor). Quatro itens são importantes nas despesas do governo: Itens de despesas do governo 1. Despesas com pessoal e encargos sociais. 2. Gastos de custeio da máquina pública. 3. Déficit da previdência. Alíquota versus Arrecadação: a Curva de Lafer Os especialistas em ciências sociais e jurídicas têm procurado mostrar que há uma relação entre as alíquotas (taxas) de impostos e o volume total arrecadado pelos governos. Essa relação é conhecida como Curva de Lafer, em homenagem ao economista Arthur Lafer, que iniciou estudos nesta área. A figura a seguir mostra uma clássica relação entre as alíquotas dos impostos numa economia e a arrecadação tributária do governo. À taxa zero de alíquota, o governo não arrecada nada. À medida que a alíquota aumenta, a arrecadação também aumenta, mas há limites, ou seja, há uma determinada alíquota (tmax) que garante uma arrecadação máxima. Para alíquotas superiores a tmax, a arrecadação passa a decrescer. Por exemplo, para a alíquota t0, o volume de recursos arrecadados pelo governo seria menor (apenas A0). Acredita- se que a principal razão é o estímulo à sonegação/evasão fiscal e o desestímulo às atividades produtivas, quando as alíquotas são excessivamente elevadas. 19 Gráfico 1 – Curva de Laffer Fonte: Adaptado de Lordemann e Farell (2015, p. 5). Nos períodos de elevada inflação, há outro efeito sobre as receitas públicas, conhecido como Efeito Olivera-Tanzi, o qual ocorre como consequência do fato de que há uma defasagem entre o momento da geração do imposto e o do efetivo recolhimento. Como há um tempo (dias ou até meses), a inflação reduz o valor real (embora o valor nominal do imposto seja o mesmo) a ser arrecadado pelo governo. Isso prejudica as finanças públicas, provocando deficits, cujo conceito será abordado a seguir. A Carga Tributária no Brasil Talvez nenhuma variável econômica-fiscal no Brasil tenha aumentado tanto nos últimos anos como a da carga tributária: de um patamar de 21,2% do PIB no final dos anos 1980 para cerca de 40% atualmente. Quando se compara a situação tributária com a de outros países, chega-se a duas situações. A carga brasileira é baixa em comparação com países mais desenvolvidos, principalmente os do Norte da Europa (50% nos países nórdicos), mas é relativamente alta em relação aos demais países da América Latina, cuja maioria tem taxas ao redor (ou abaixo) de 20% do PIB. Conforme já mencionado, a carga tributária brasileira é concentrada em poucos tributos, sendo que seis deles contribuem com mais de 80% do valor total arrecadado. A incidência de tributos sobre bens e serviços é muito mais acentuada do que sobre a renda e o patrimônio, ao contrário dos países mais ricos. 20 A estrutura tributária é fortemente marcada pelos "impostos em cascata", cobrados diversas vezes ao longo da cadeia produtiva, provocando aumentos nos custos de produção e, assim, reduzindo a competitividade dos produtos brasileiros no exterior. Em parte, isso explica por que exportamos tão pouco, embora se tenha atingido recorde em 2011, chegando a mais de US$ 250 bilhões, e se tenha festejado o feito, a verdade é que ele ainda é baixo. Cargas Tributárias: O Brasil possui uma das mais elevadas cargas tributárias do mundo. Para saber mais, acesse o link. Saiba mais Deficit Público Normalmente, o conceito de deficit está associado à necessidade de financiamento do setor público, ou seja, quanto das despesas realizadas não foi financiado com recursos próprios. Diz-se que há deficit público (que é o que, via de regra, ocorre) quando os gastos do governo superam a sua arrecadação. Na situação de superavit das contas públicas, a arrecadação supera o total dos gastos. Há dois conceitos de deficit (ou superavit): Conceito Primário O conceito de deficit primário considera apenas o excesso de gastos não financeiros sobre as receitas não financeiras, ou seja, não se consideram nas despesas nem o pagamento de juros nem as correções monetárias e cambiais. A sua utilidade é que ele mede o que ocorreu no exercício, eliminando os efeitos das dívidas de exercíciosanteriores. Mede, assim, a capacidade de pagar os juros da dívida. No conceito primário, o Brasil tem apresentado deficit em torno de 159 milhões ao ano, ou seja, sem considerar o pagamento de juros, o governo brasileiro tem gastado mais do que arrecada. Em relação a esse deficit primário, é comum fazermos duas perguntas: Qual a finalidade de o governo possuir superavit primário? E como isso pode ser feito? A finalidade é a seguinte: como o governo precisa reduzir a proporção da dívida pública em relação 21 ao PIB (é bom lembrar que ela representa um pouco menos da metade do PIB), essa "economia" de receitas serve para pagar (parte) os juros da dívida pública, de modo a impedir seu maior crescimento. A maneira de o governo obter maior superavit primário ocorre basicamente de duas formas: com aumento da arrecadação de impostos e com maiores cortes nos gastos previstos no orçamento federal. Conceito Nominal O conceito de deficit nominal inclui o pagamento de juros e as variações com correção monetária e cambial das dívidas interna e externa. No Brasil, de cada R$ 100,00 gerados de PIB, cerca de R$ 5,00 foram destinados a pagar juros, razão pela qual os lucros dos bancos instalados no Brasil têm sido elevadíssimos nos últimos anos. Dessa forma os bancos brasileiros são os mais rentáveis do mundo. A rentabilidade (lucro líquido sobre o patrimônio) média dos bancos tem superado 20%, o que significa que para cada R$ 100 de patrimônio líquido, um banco brasileiro tem obtido mais de R$ 20 de lucro líquido, o que quer dizer que em cerca de seis anos é possível recuperar todo o patrimônio líquido. No conceito nominal, verifica-se qual o valor da dívida, em reais correntes, no início e no fim do período, geralmente de um ano. A variação da dívida é o deficit nominal. No conceito nominal, está englobada qualquer demanda de recursos pelo setor público (inclusive para fazer frente às despesas financeiras, como pagamento dos juros sobre a dívida pública). Esse conceito é utilizado em outros países, mas não o é no Brasil, por causa da inflação elevada que experimentou em anos recentes. Desse modo, o conceito nominal de deficit inclui tanto a correção monetária como as despesas financeiras. Concluindo, além dos altos deficits primários do setor brasileiro, este, levando em conta as três esferas, vem também experimentando deficits nominais, por causa dos super elevados gastos com os juros. Não é nenhum exagero afirmar que, nos últimos anos, o governo brasileiro "trabalha" (leia-se arrecada) para pagar juros. Financiamento do Deficit Vamos denominar de G os gastos públicos e de T (de tributos) a receita tributária. Se a despesa (G), distribuída entre o consumo governamental e o investimento público, superar a receita tributária (T), tem-se uma situação de deficit. Uma das medidas do governo é utilizar a política fiscal, via aumento de impostos ou corte de gastos. Mas se, mesmo assim, ainda continuar o deficit, o este deverá ser financiado fundamentalmente por duas vias de recursos extrafiscais, que são: 22 A. A emissão de moeda (M), em que o governo toma emprestado do Banco Central. B. O lançamento de títulos públicos (Títulos), em que o governo vende títulos da dívida pública ao setor privado (interno e externo). Cabe aqui uma observação: a venda de títulos provoca uma elevação da dívida pública. Nesse caso, diz-se que o setor privado financia (a gastança do) o setor público. Pode- se representar uma situação de deficit orçamentário do seguinte modo: G - T = M + TÍTULOS Essa "equação" mostra a ligação que existe entre a política fiscal (G >T) de deficit público com a política monetária, que trata da emissão de moeda e da venda de títulos públicos no open market (mercado aberto), como veremos no próximo conteúdo. O ponto importante da política fiscal é determinar o efeito dela sobre o resto da economia, em particular o efeito dos gastos do governo sobre a demanda agregada, e desta sobre a produção (oferta) e os preços. Para tanto, necessitamos, antes, voltar a analisar o modelo keynesiano de ver a economia como um todo. Efeitos da Política Fiscal sobre a Economia Como vimos, os impostos e gastos públicos afetam o nível de demanda da economia. A arrecadação incide sobre o nível de demanda ao influir na renda disponível que os indivíduos poderão destinar para consumo e poupança. Dado um nível de renda, quanto maiores forem os impostos, menor será a renda disponível e, portanto, o consumo. Os gastos públicos são diretamente um elemento da demanda agregada. Assim, quanto maior o gasto, maior será a demanda e maior será o produto. Desse modo, se a economia apresentar tendência para queda no nível de atividade, o governo pode estimulá-la, cortando impostos e/ou elevando gastos. Pode ocorrer o inverso, caso o objetivo seja diminuir o nível de atividade. A redução da carga tributária (T), à medida que aumenta a renda disponível (Yd) da população, pode também provocar a expansão do consumo pessoal (C) e, consequentemente, da demanda global (Da). Como o consumo depende da renda disponível (em que Yd = Y - T), um aumento nos impostos deve diminuir o nível de consumo. Portanto, de forma esquemática, a política fiscal atual sobre a oferta agregada (Sa) e o emprego (E) pode se dar por duas vias: A. Alterando o gasto do governo (G), que, por sua vez, afeta diretamente a demanda agregada (Da). 23 B. Alterando os impostos (T), os quais afetam a renda disponível (Yd), que, por sua vez, altera o consumo (C). Dessa forma, a política fiscal afeta o consumo, a produção, o emprego e a renda. Resultados fiscais da economia brasileira: Para saber mais sobre os resultados fiscais da economia brasileira, acesse o link. Saiba mais Caro(a) acadêmico(a), a política macroeconômica é muito importante para o país, pois é ela que leva o bem-estar à população. O governo deve utilizar corretamente as instituições que possui para aplicar corretamente as políticas fiscal e também monetária. Com a aplicação correta das políticas, a distribuição de renda melhora, os preços se estabilizam e, portanto, garantem o poder de compra da moeda brasileira, o que é muito importante principalmente para as famílias que não têm como se proteger da inflação, pois não têm acesso ao sistema financeiro, geralmente as de baixa renda. Para as empresas, é fundamental uma política consistente de juros, sendo que estes não penalizem o setor produtivo em favor do setor financeiro, pois, se os juros forem muito altos, automaticamente o setor produtivo será prejudicado, uma vez que pagará caro pelos empréstimos. Por outro lado, o setor financeiro será beneficiado, uma vez que, quanto maiores os juros, maior será o ganho deste setor. Também em relação à tributação e aos gastos, é necessário que haja um equilíbrio, em que os gastos públicos sejam feitos com eficiência e não gerem tributação desnecessária. 24 Conclusão Caro(a) acadêmico(a), ao longo deste conteúdo, vimos os conceitos trazidos por alguns pensadores que tratam da Macroeconomia bem como de suas principais funções. Abordamos também a política fiscal, assim como os gastos e as receitas do governo. Além disso, tratamos sobre carga tributária do nosso país, o deficit público e o efeito da política fiscal sobre a economia. Sendo assim, espero que você tenha compreendido os conceitos apresentados e que consiga relacioná-los com a prática no seu dia a dia. Referências KEYNES, J. M. Teoria geral dos juros, do emprego e da moeda. São Paulo: Abril Cultural, 1983. LORDEMANN, J. A.; FARELL, A. O. Análisis experimental de la Curva de Laffer y la evasión fiscal de Bolivia. Revista Latinoamericana de Desarrollo Economico, n. 24, p. 121-153, 2015. SMITH, A. A Riqueza das Nações. São Paulo: Nova Cultural, 1988.