Buscar

Notas de Aula 01-2014

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 17 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 17 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 17 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

Os Nu´meros Reais I
NA 1
Notas de Aula 1 – Os Nu´meros Reais I
Introduc¸a˜o
Nesta aula, as propriedades fundamentais associadas a`s operac¸o˜es de
adic¸a˜o e multiplicac¸a˜o dos nu´meros reais sa˜o apresentadas por meio de axi-
omas (1). Assume-se que o aluno tenha experieˆncia com o conjunto N dos
nu´meros naturais, o conjunto Z dos nu´meros inteiros e o conjunto Q dos
nu´meros racionais, que sa˜o todos subconjuntos de R. Em s´ımbolos:
N := {1, 2, 3, . . .},
Z := {0, 1,−1, 2,−2, 3,−3, . . .},
Q :=
{
r : r =
p
q
, p, q ∈ Z, q 6= 0
}
.
A notac¸a˜o p:=q e´ lida ”igual a” ou ”por definic¸a˜o”. Como se sabe
N ⊂ Z ⊂ Q ⊂ R.
Denota-se por ∅ o conjunto vazio, isto e´, o conjunto que na˜o possui nenhum
elemento. Para todo conjunto A, vale que ∅ ⊂ A.
Propriedades alge´bricas de R
Uma operac¸a˜o bina´ria em R e´ uma func¸a˜o que associa a cada par (a, b)
de elementos de R um elemento de R. No conjunto R dos nu´meros reais esta˜o
definidas duas operac¸o˜es bina´rias: a adic¸a˜o e´ uma operac¸a˜o que associa a
cada par (a, b) o nu´mero real a + b, chamado soma de a e b; por sua vez,
a operac¸a˜o de multiplicac¸a˜o associa a cada par (a, b) o produto a · b. Em
s´ımbolos matema´ticos, escreve-se:
Operac¸a˜o de adic¸a˜o: + : R× R→ R tal que (a, b) 7→ a+ b;
Operac¸a˜o de multiplicac¸a˜o: · : R×R :→ R tal que (a, b) 7→ a · b.
Estas operac¸o˜es satisfazem as seguintes propriedades, que sa˜o aqui estabele-
cidas como axiomas:
(A) Axiomas da Adic¸a˜o
1Axiomas sa˜o afirmac¸o˜es aceitas como verdadeiras, sem necessidade de demonstrac¸a˜o.
1 CEDERJ
Elementos
de
Ana´lise
Real
Os Nu´meros Reais I
(A1) Comutatividade: Para todos a, b ∈ R, a+ b = b+ a;
(A2) Associatividade: Para todos a, b, c ∈ R, (a+ b) + c = a+ (b+ c);
(A3) Existeˆncia do elemento neutro: Existe um elemento em R, deno-
tado 0, tal que 0 + a = a para todo a ∈ R;
(A4) Existeˆncia do elemento sime´trico: Para cada a ∈ R, existe um
elemento em R, denotado −a, tal que a+ (−a) = 0.
(M) Axiomas da Multiplicac¸a˜o
(M1) Comutatividade: Para todos a, b ∈ R, a · b = b · a;
(M2) Associatividade: Para todos a, b, c ∈ R, (a · b) · c = a · (b · c);
(M3) Existeˆncia do elemento neutro: Existe um elemento em R, deno-
tado por 1, tal que 1 6= 0 e para todo a ∈ R vale 1 · a = a;
(M4) Existeˆncia do elemento inverso: Para todo a ∈ R, a 6= 0, existe um
elemento em R, denotado por 1/a (ou a−1) tal que a · (1/a) = 1.
(D) Axioma da distributividade da multiplicac¸a˜o em relac¸a˜o a`
adic¸a˜o Para todos a, b, c ∈ R a · (b+ c) = a · b+ a · c .
Um conjunto X dotado de operac¸o˜es + e · satisfazendo (A), (M) e
(D) constitui uma estrutura alge´brica chamada corpo. Em particular, R e´
um corpo.
♦ Prelu´dio 1.1 Enunciados (ou seja, afirmac¸o˜es) da forma
p se P(x) enta˜o Q(x) q (em s´ımbolos: p P(x) ⇒ Q(x)q e da forma
p para todo x, se P(x) enta˜o Q(x) q (em s´ımbolos: p ∀x, P(x)⇒ Q(x)q),
(1.1)
onde P (x) e Q(x) sa˜o enunciados referentes a x, sa˜o chamados enunciados
condicionais ou implicac¸o˜es.
A maioria das afirmac¸o˜es em Matema´tica tem a forma de uma implicac¸a˜o.
As afirmac¸o˜es verdadeiras sa˜o chamadas Proposic¸o˜es, Teoremas, Lemas ou Co-
rola´rios, dependendo da situac¸a˜o em que surgem ou da sua utilizac¸a˜o. Isto sera´
explicado no decorrer do texto.
Em implicac¸o˜es como as de (1.1), o enunciado P (x) e´ chamado hipo´tese
e Q(x) e´ chamado tese ou conclusa˜o.
Por exemplo: os enunciados p se x ∈ R e x + x = x enta˜o x = 0 q e
p para todo x ∈ R, se x + x = x enta˜o x = 0 q sa˜o duas implicac¸o˜es que teˆm
CEDERJ 2
Os Nu´meros Reais I
NA 1
o mesmo sentido: em ambos, a hipo´tese e´ px ∈ R e x + x = xq e a tese e´
px = 0q.
Exemplo 1.1 Exemplos de enunciados condicionais:
1. Se x ∈ R e x+ x = x enta˜o x = 0.
2. Se x ∈ N e x > 100 enta˜o x > 1000.
3. Para todos x, y, z ∈ R, se x · y = z enta˜o x = z · (1/y).
No enunciado 1 do Exemplo 1.1, a hipo´tese e´ px ∈ R e x + x = xq e a
tese e´ px = 0q.
No enunciado 2, a hipo´tese e´ px ∈ N e x > 100q e a tese e´ px > 1000q.
No enunciado 3, a hipo´tese e´ px, y, z ∈ R e x · y = zq e a tese e´ px =
z · (1/y)q.
O primeiro enunciado e´ verdadeiro e o segundo e o terceiro sa˜o falsos.
Atenc¸a˜o: Uma implicac¸a˜o e´ um enunciado falso exatamente quando a hi-
po´tese e´ verdadeira e a conclusa˜o e´ falsa.
Por outro lado, afirmar que uma implicac¸a˜o como as de (1.1) e´ verda-
deira, na˜o significa simplesmente afirmar que a hipo´tese, P (x), e´ verdadeira
isoladamente, e nem que a conclusa˜o Q(x) e´, somente ela, verdadeira. O que
se garante e´ que Q(x) e´ verdadeira sob a condic¸a˜o de P (x) ser verdadeira
(por isso ”enunciado condicional”).
Mais adiante voceˆ vai aprender a justificar a verdade e a falsidade de
enunciados condicionais. (2)
Todas as propriedades dos nu´meros reais envolvendo a adic¸a˜o e a multi-
plicac¸a˜o podem ser deduzidas por meio de racioc´ınios lo´gicos a partir dos axi-
omas (A), (M) e (D). No que se segue, afirmac¸o˜es verdadeiras (proposic¸o˜es)
sa˜o enunciadas e as te´cnicas para realizar os racioc´ınios para prova´-las sa˜o
apresentadas.
A primeira te´cnica mostra como se raciocina para provar que uma pro-
posic¸a˜o na forma condicional e´ verdadeira. Antes de mais nada, certifique-se
de entender o significado das afirmac¸o˜es abaixo, pois elas devem ser conhe-
cidas de outras disciplinas.
2Da mesma forma, quando se diz “se eu tiver dinheiro enta˜o eu lhe empresto”, na˜o se
esta´ afirmando que se tem dinheiro e nem que se emprestara´ dinheiro. A afirmac¸a˜o so´ sera´
falsa se a pessoa que a diz tiver dinheiro e na˜o empresta´-lo ao interlocutor.
3 CEDERJ
Elementos
de
Ana´lise
Real
Os Nu´meros Reais I
Lembre que uma proposic¸a˜o e´ uma afirmac¸a˜o verdadeira. A ideia principal
para provar que um enunciado na forma condicional e´ verdadeira e´: usam-se a
hipo´tese e axiomas e/ou resultados anteriores (caso existam) para se obter a
conclusa˜o. Jamais se pode usar a conclusa˜o.
Proposic¸a˜o 1.1 (a) (Cancelamento da adic¸a˜o) Para todos a, b, c ∈ R, se
a+ c = b+ c enta˜o a = b;
(b) Para todo a ∈ R, se a+ a = a enta˜o a = 0.
(c) Para todo a ∈ R, a · 0 = 0.
Prova: (a) Por hipo´tese: a+ c = b+ c, onde a, b, c ∈ R.
Por (A4), existe o nu´mero real −c. Adicionar −c a ambos os lados da igual-
dade a+ c = b+ c na˜o a altera e obte´m-se:
(a+ c) + (−c) = (b+ c) + (−c).
Por (A2) enta˜o
a+ (c+ (−c)) = b+ (c+ (−c)).
Por (A4),
a+ 0 = b+ 0.
Finalmente, por (A3), tem-se a tese a = b. �
(b) Por hipo´tese, a+ a = a. Pode-se proceder exatamente como na prova de
(a) acima ate´ obter-se a tese a = 0. Fac¸a isto como exerc´ıcio!
Uma outra maneira de provar a afirmac¸a˜o acima, que deve ser com-
preendida e aprendida, consiste em aplicar o resultado anterior: para isto,
e´ preciso que se tenha as condic¸o˜es da hipo´tese do item (a). Para tal fim,
reescreve-se a hipo´tese a + a = a de forma a se ter um nu´mero para cance-
lar, como na hipo´tese de (a). De fato, pode-se reescrever a + a = a como
a+ a = 0+ a (note que nada foi alterado). Da´ı e da lei de cancelamento (a),
pode-se afirmar enta˜o que a = 0. �
(c) Por hipo´tese, a ∈ R. Pelo item (b) acima, para concluir que a · 0 = 0
basta mostrar que a · 0 + a · 0 = a · 0. Para mostrar que uma igualdade
e´ verdadeira, basta desenvolver um dos seus membros ate´ obter-se o outro
(jamais se desenvolvem os dois lados ao mesmo tempo!). Assim,
a · 0 + a · 0 D= a · (0 + 0) (A3)= a · 0 .
CEDERJ 4
Os Nu´meros Reais I
NA 1
Obteve-se um enunciado que tem a forma da hipo´tese do item (b) para o
nu´mero real a · 0. Como (b) ja´ foi provado ser verdadeiro, fica garantido
enta˜o que vale a · 0 = 0.
A prova da pro´xima Proposic¸a˜o e´ deixada como exerc´ıcio. Fac¸a-a depois
de ter entendido e refeito por si mesmo as provasacima.
Proposic¸a˜o 1.2 (Cancelamento da multiplicac¸a˜o) Para todos a, b, c ∈ R, se
ac = bc e c 6= 0 enta˜o a = b.
Prova: Exerc´ıcio (atente para a utilizac¸a˜o correta do Axioma (M4)).
Recorde que o Axioma (A3) garante a existeˆncia do nu´mero real 0, que
tem a propriedade de que
a+ 0 = a , para todo a ∈ R . (1.2)
Na pro´xima Proposic¸a˜o, prova-se que 0 e´ o u´nico nu´mero real com esta pro-
priedade.
Para provar a unicidade de um objeto matema´tico (termo), supo˜e-se que
existe um outro objeto com a mesma propriedade e raciocina-se para concluir
que os objetos sa˜o iguais.
Proposic¸a˜o 1.3 O elemento neutro da adic¸a˜o em R e´ u´nico.
Prova: Suponha que existe θ ∈ R tal que
a+ θ = a , para todo a ∈ R . (1.3)
Como 0 e´ um nu´mero real enta˜o (1.3) vale em particular para a = 0, ou seja,
tem-se que
0 + θ = 0 . (1.4)
Da mesma forma, como θ ∈ R enta˜o (1.2) vale em particular para a = θ,
fornecendo
θ + 0 = θ . (1.5)
Como por (A1), 0 + θ = θ + 0, enta˜o por (1.4) e (1.5), 0 = θ. A unicidade
do elemento neutro da adic¸a˜o esta´ provada.
Dado a ∈ R, o Axioma (A4) garante a existeˆncia de −a, o elemento
sime´trico de a . A pro´xima Proposic¸a˜o estabelece que cada nu´mero real possui
um u´nico elemento sime´trico.
Proposic¸a˜o 1.4 Se a ∈ R enta˜o o elemento sime´trico de a e´ u´nico.
5 CEDERJ
Elementos
de
Ana´lise
Real
Os Nu´meros Reais I
Prova: Por hipo´tese, a ∈ R. Por (A4), existe −a ∈ R tal que a+ (−a) = 0.
Suponha que exista a′ ∈ R com a mesma propriedade de −a, isto e´, tal que
a+a′ = 0 . Logo a+(−a) = a+a′ . Pela Proposic¸a˜o 1.1(a), pode-se cancelar
a, logo segue que −a = a′ . Portanto, o elemento sime´trico de a e´ u´nico.
A Proposic¸a˜o 1.4 estabelece que se c ∈ R e a + c = 0 enta˜o c = −a;
ou seja, para garantir que c ∈ R e´ o sime´trico de a ∈ R basta, ou seja,
e´ suficiente, mostrar que a+ c = 0. Esta ideia e´ usada no pro´ximo Exemplo,
que deve ser estudado cuidadosamente.
Exemplo 1.2 Demonstrar a afirmac¸a˜o: se a, b ∈ R enta˜o (−a) · b = −(a · b),
ou seja, (−a) · b e´ o sime´trico de a · b.
Prova: A hipo´tese e´ a, b ∈ R. Pela Proposic¸a˜o 1.4 basta provar que a ·
b + (−a) · b = 0. Como ja´ foi comentado, para provar que uma igualdade e´
verdadeira, deve-se desenvolver um dos seus membros ate´ obter-se o outro.
Assim,
a · b+ (−a) · b = (a+ (−a)) · b = 0 · b = 0 .
Nesta sequeˆncia, foram utilizadas (D), (A4) e a Proposic¸a˜o 1.1 (c), nesta
ordem. Pela Proposic¸a˜o 1.4, conclui-se que (−a) · b = −(a · b).
Note que na prova de uma implicac¸a˜o, a tese e´ a conclusa˜o, a qual se deseja
estabelecer a partir das hipo´teses e/ou de resultados ja´ provados anteriormente.
Ao contra´rio das hipo´teses, a conclusa˜o na˜o pode ser usada no racioc´ınio e na˜o
pode ser considerada como fato verdadeiro a priori. Portanto, na˜o faz sentido
afirmar numa demonstrac¸a˜o que a conclusa˜o e´, de antema˜o, verdadeira.
A mesma ideia do Exemplo anterior e´ usada na demonstrac¸a˜o da Pro-
posic¸a˜o a seguir:
Proposic¸a˜o 1.5 (a) Para todos a, b ∈ R, a · (−b) = −(ab) ;
(b) Para todo a ∈ R, a = −(−a) ;
(c) Para todos a, b ∈ R, (−a)(−b) = ab;
(d) (−1) · (−1) = 1 .
Prova: (a) Este item fica como exerc´ıcio. �
(b) Por hipo´tese, a ∈ R. Como a + (−a) = 0 e´ verdade por (A4), enta˜o
a = −(−a) , pela Proposic¸a˜o 1.4. �
(c) Pode-se raciocinar como no Exemplo 1.2. Ou enta˜o usar os itens anteri-
ores: (−a)(−b) (a)= −(a · (−b)) (b)= −(−(a · b)) . �
CEDERJ 6
Os Nu´meros Reais I
NA 1
(d) E´ um caso particular de (c) para a = b = 1.
Apo´s ter estudado cuidadosamente as provas das Proposic¸o˜es anterio-
res, use racioc´ınios ana´logos para provar que:
Proposic¸a˜o 1.6 (a) O elemento neutro da multiplicac¸a˜o e´ u´nico, isto e´, 1 e´
o u´nico nu´mero real com a propriedade
1 · a = a, para todo a ∈ R .
(b) Se a ∈ R e a 6= 0 enta˜o o inverso multiplicativo de a e´ u´nico.
Prova: Exerc´ıcio. Para (a), lembre que 1 6= 0 por (A3). Em (a) e (b), voceˆ
devera´ usar a Proposic¸a˜o 1.2.
Pela Proposic¸a˜o 1.6 (b), para garantir que um nu´mero real b e´ o inverso
multiplicativo de um nu´mero real a 6= 0, ou seja, que b = 1/a, e´ suficiente
mostrar que a · b = 1. Esta e´ a ideia da prova do item (a) da pro´xima
Proposic¸a˜o.
Proposic¸a˜o 1.7 Sejam a, b, c elementos de R.
(a) Se a 6= 0 enta˜o 1/a 6= 0 e a = 1/(1/a);
(b) Se a · b = 0 e a 6= 0 enta˜o b = 0.
(c) Se a · b = 0 enta˜o a = 0 ou b = 0.
Prova: (a) Por hipo´tese, a 6= 0. Logo, por (M4), existe o nu´mero real 1/a.
Na˜o pode acontecer 1/a = 0, pois caso isto ocorra enta˜o 1 = a · (1/a) =
a · 0 = 0 e isto contradiz (M3).
Assim sendo, 1/a 6= 0 e, como (1/a)·a = 1 enta˜o, pelo item (b) da Proposic¸a˜o
1.6, resulta que 1/(1/a) = a . �
(b) Por hipo´tese a · b = 0 e a 6= 0. Logo existe o nu´mero real 1/a, que pode
multiplicar ambos os lados da primeira igualdade para fornecer (1/a)(a · b) =
(1/a) ·0. Da´ı por (M1) segue que ((1/a) ·a) ·b = 0 . Enta˜o, por (M4), 1 ·b = 0,
e da´ı por (M3), b = 0. �
(c) Por hipo´tese a · b = 0. Tem-se que a = 0 ou a 6= 0. Se a = 0, nada ha´ a
provar. Se a 6= 0 enta˜o pelo item (b) acima tem-se b = 0. Conclui-se enta˜o
que, se vale a · b = 0 enta˜o necessariamente a = 0 ou b = 0.
A subtrac¸a˜o e´ a operac¸a˜o que associa a cada par (a, b) de nu´meros reais
a diferenc¸a a−b. A divisa˜o entre dois nu´meros reais e´ a operac¸a˜o que associa
7 CEDERJ
Elementos
de
Ana´lise
Real
Os Nu´meros Reais I
a cada par (a, b) de nu´meros reais no qual b 6= 0, o nu´mero real a/b = a·(1/b),
que e´ chamado quociente de a por b .
De agora em diante tambe´m sera´ usada a notac¸a˜o ab para o produto
a · b. A operac¸a˜o de potenciac¸a˜o de nu´meros reais e´ definida da forma usual,
a saber:
a0 := 1; a1 := a; ; e an+1 := ana para todo n ∈ N.
Os nu´meros irracionais: Os elementos de R que na˜o podem ser escritos
na forma a/b com a, b ∈ Z e b 6= 0 sa˜o chamados de nu´meros irracionais.
Estes nu´meros reais surgem em diversas situac¸o˜es na Matema´tica, sendo
soluc¸o˜es para equac¸o˜es que na˜o teˆm resposta em Q. Por exemplo, pode-se
mostrar que a equac¸a˜o (3)
x2 = 2. (∗)
na˜o tem soluc¸a˜o em Q, isto e´, na˜o existe um nu´mero racional x que seja
soluc¸a˜o de (∗).
De fato, admitir que existe tal x em Q e´ admitir como verdadeiro que
existem p, q ∈ Z tais que q 6= 0, com p e q sem divisores comuns (se na˜o,
bastaria reduzir a frac¸a˜o) e x = p/q. Mas como x2 = 2 enta˜o tem-se p2 =
2q2. Assim, p2 e´ necessariamente par, e portanto p e´ par, digamos p =
2m, m ∈ Z. Consequentemente,
4m2 = 2q2, ou seja q2 = 2m2,
de onde segue que q2 e´ par, e da´ı que q e´ par. Portanto, p e q sa˜o pares o que
e´ uma contradic¸a˜o pois, por escolha, eles sa˜o primos entre si (na˜o possuem
divisores comuns). Conclui-se que a equac¸a˜o (∗) na˜o possui soluc¸a˜o no corpo
Q dos racionais.
Nas Notas de Aula 02 sera´ provado que o nu´mero real positivo x que
satisfaz (∗) existe. Ele sera´ denotado √2 e chamado raiz quadrada (positiva)
de 2. Provou-se que
√
2 na˜o pertence ao conjunto dos nu´meros racionais. A
demonstrac¸a˜o de que a equac¸a˜o (∗) tem soluc¸a˜o em R depende do Axioma
do Supremo, propriedade do conjunto dos nu´meros reais que sera´ introduzida
3Uma equac¸a˜o e´ uma igualdade contendo uma ou mais inco´gnitas (ou varia´veis)´. E´
claro que equac¸o˜es na˜o sa˜o falsas e nem verdadeiras, pois, tendo inco´gnitas, seu valor lo´gico
na˜o pode ser estabelecido. Se as inco´gnitas sa˜o substitu´ıdas por valores do contexto, enta˜o
se tera´ igualdades verdadeiras ou falsas, dependendo de as inco´gnitas satisfazerem ou na˜o
as equac¸o˜es.
CEDERJ 8
Os Nu´meros Reais I
NA 1
nas Notas de Aula 02. Pelo que foi visto acima, ter-se-a´ necessariamente que√
2 e´ um nu´mero irracional.
♦ Prelu´dio 1.2 Um tipo de racioc´ınio dedutivo que e´ a`s vezes utilizado para
seprovar que uma implicac¸a˜o
se P(x) enta˜o Q(x)
e´ verdadeira e´ o chamado racioc´ınio indireto ou racioc´ınio por absurdo. Procede-
se da seguinte forma:
admite-se, como sempre, que a hipo´tese P(x) e´ verdadeira e
supo˜e-se (por absurdo), que a conclusa˜o Q(x) e´ falsa.
Da´ı, busca-se chegar a uma afirmac¸a˜o que contrarie a hipo´tese, P(x), ou contrarie
algum fato ja´ provado. Como a contradic¸a˜o (ou absurdo) decorreu da suposic¸a˜o
de que a tese, Q(x), era falsa, conclui-se que Q(x) e´ verdadeira. Assim, o
que se desejava provar e´ fato. Este tipo de racioc´ınio e´ muito adequado para a
demonstrac¸a˜o de certos tipos de enunciados, na˜o devendo ser por isto, a primeira
te´cnica a ser empregada.
A demonstrac¸a˜o acima, de que na˜o existe um nu´mero racional x satisfa-
zendo (∗), e´ um exemplo de enunciado adequado para se utilizar o racioc´ınio
indireto, como foi feito: para prova´-la, supoˆs-se, por absurdo, que existisse um
racional x satisfazendo (∗) e chegou-se a uma contradic¸a˜o com relac¸a˜o aos intei-
ros p e q escolhidos. Poˆde-se concluir enta˜o que na˜o existe tal nu´mero racional.
Observe que o racioc´ınio por absurdo tambe´m foi utilizado no in´ıcio da
prova da Proposic¸a˜o 1.9 (a). Reveja-a e identifique o racioc´ınio indireto utilizado.
♦ Prelu´dio 1.3 O Axioma (A4) permite afirmar que, se um nu´mero real c e´
igual ao elemento sime´trico de a ∈ R, isto e´, se c = −a, enta˜o a + c = 0. Por
outro lado, a prova da Proposic¸a˜o 1.4 estabelece que se c ∈ R e a + c = 0
enta˜o c = −a. Ou sejam, valem as duas implicac¸o˜es abaixo, onde a hipo´tese da
primeira e´ a conclusa˜o da segunda e vice-versa:
se c = −a enta˜o a+ c = 0
e se a+ c = 0 enta˜o c = −a .
Em Matema´tica, o fato de valerem estas duas implicac¸o˜es e´ expresso de modo
resumido escrevendo-se
c = −a ⇔ a+ c = 0 . (1.6)
9 CEDERJ
Elementos
de
Ana´lise
Real
Os Nu´meros Reais I
(leˆ-se: “c e´ o sime´trico de a se e somente se a+ c = 0).
De modo geral, se P[x] e Q[x] sa˜o dois enunciados, o enunciado pP [x]⇔
Q[x]q (leˆ-se P[x] se e somente se Q[x]))indica que os dois enunciado possuem o
mesmo valor lo´gico, ou seja, um e´ verdadeiro se e somente se o outro tambe´m e´ e
um deles e´ falso exatamente quando o outro e´. Diz-se tambe´m que os enunciados
sa˜o ”equivalentes”. Para provar uma biimplicac¸a˜o e´ necessa´rio provar as duas
implicac¸o˜es envolvidas.
A ordem em R
As propriedades da relac¸a˜o da relac¸a˜o de ordem < em R permitem
estabelecer a noc¸a˜o de desigualdade entre nu´meros reais e fazem de R um
corpo ordenado, no sentido que se vai explicar. Assim como no caso da
estrutura alge´brica dos nu´meros reais, sera˜o introduzidas certas propriedades
ba´sicas de < como axiomas (os Axiomas de Ordem), a partir das quais todas
as outras podera˜o deduzidas.
Com este fim, assume-se a existeˆncia de um subconjunto R+ de R,
cujos elementos sa˜o chamados nu´meros positivos e satisfazem as seguintes
propriedades:
(O) Axiomas de Ordem
(O1) Se a, b pertencem a R+ enta˜o a+ b pertence a R+;
(O2) Se a, b ∈ R+ enta˜o ab ∈ R+;
(O3) Se a ∈ R enta˜o uma e somente uma das afirmac¸o˜es e´ verdadeira:
a ∈ R+ ou a = 0 ou − a ∈ R+ .
A propriedade (O3) e´ chamada tricotomia, pois reparte R em treˆs sub-
conjuntos dois a dois disjuntos, ou seja, com a intersec¸a˜o igual a φ: o sub-
conjunto R+ dos nu´meros positivos, o subconjunto {0} e o subconjunto dos
nu´meros −a tais que a ∈ R+, que sera´ denotado R− e chamado conjunto
dos nu´meros reais negativos. Ale´m disso, (O3) estabelece que R e´ a unia˜o
destes treˆs subconjuntos: em s´ımbolos, R = R+ ∪ {0} ∪ R−.
A pro´xima Definic¸a˜o introduz notac¸o˜es que permitira˜o que os Axiomas
de Ordem sejam reescritos sob uma forma mais simples.
CEDERJ 10
Os Nu´meros Reais I
NA 1
Definic¸a˜o 1.1 Se a ∈ R+ diz-se que a e´ um nu´mero real positivo (ou estri-
tamente positivo) e escreve-se a > 0;
Se a ∈ R+ ou a = 0, diz-se que a e´ um nu´mero real n a˜o negativo e escreve-se
a ≥ 0;
Se −a ∈ R+ diz-se que a e´ um nu´mero real negativo (ou estritamente nega-
tivo) e escreve-se a < 0;
Se −a ∈ R+ ou a = 0, diz-se que a e´ um nu´mero real n a˜o positivo e escreve-se
a ≤ 0.
Pela Definic¸a˜o acima, 0 (e somente ele) e´ ao mesmo tempo um nu´mero
real na˜o positivo e na˜o negativo.
(O) Axiomas de Ordem (reescritos)
(O1) Para todos a, b ∈ R, se a > 0 e b > 0 enta˜o a+ b > 0;
(O2) Para todos a, b ∈ R, se a > 0 e b > 0 enta˜o ab > 0 ;
(O3) Tricotomia: Se a ∈ R enta˜o uma e somente uma das afirmac¸o˜es e´
verdadeira:
a > 0 ou a = 0 ou − a > 0 .
A noc¸a˜o de desigualdade entre dois elementos de R e´ definida por meio da
positividade do seguinte modo:
Definic¸a˜o 1.2 Sejam a, b ∈ R.
(a) pa > bq (ou pb < aq) significa pa− b > 0q;
(b) pa ≥ bq (ou pb ≤ aq) significa pa− b ≥ 0q.
A partir da Definic¸a˜o 1.2, convenciona-se que pa < b < cq abrevia pa <
b e b < cq. De modo similar, pa ≤ b ≤ cq significa pa ≤ b e b ≤ cq ,
pa ≤ b < cq abrevia pa ≤ b e b < cq, e assim por diante.
Um corpo F dotado da relac¸a˜o de ordem (parcial) < com as proprieda-
des acima e´ chamado de corpo ordenado. Portanto, R e´ um corpo ordenado.
Algumas propriedades da ordem em R
Proposic¸a˜o 1.8 (a) Se a, b ∈ R, a > b e b > c enta˜o a > c;
(b) Se a, b ∈ R enta˜o uma e somente uma das relac¸o˜es a > b, a = b ou
a < b ocorre;
(c) Se a, b ∈ R, a ≥ b e b ≥ a enta˜o a = b .
11 CEDERJ
Elementos
de
Ana´lise
Real
Os Nu´meros Reais I
Prova: (a) Por hipo´tese a > b e b > c. Pela Definic¸a˜o 1.2 tem-se que
a− b > 0 e b− c > 0. Da´ı e por (O1) tem-se (a− b)+(b− c) > 0. Mas usando
(A1),(A2), (A3) e (A4) tem-se que (a− b) + (b− c) = a− c. Logo, de novo
pela Definic¸a˜o 1.2, tem-se que a > c. �
(b) Por hipo´tese, a, b ∈ R. Logo, a− b ∈ R e pela Propriedade de Tricotomia
(O3), exatamente uma das seguintes relac¸o˜es ocorre:
a− b > 0 ou a− b = 0 ou − (a− b) = b− a > 0.
Da´ı e pelo item (a) da Definic¸a˜o 1.2 tem-se que uma e somente uma das
relac¸o˜es a > b ou a = b ou a < b e´ verdadeira.
(c) Por hipo´tese, a ≥ b e b ≥ a. Suponhamos, por absurdo, que a 6= b (veja o
Prelu´dio 2). Enta˜o a−b 6= 0 (por que?), e portanto, pelo item (b) precedente,
a− b > 0 ou a− b < 0. Como, por hipo´tese, a ≥ b, o que significa que a > b
ou a = b, enta˜o na˜o se pode ter a < b. Como, tambe´m por hipo´tese, b ≥ a,
o que significa b > a ou b = a, enta˜o na˜o se pode ter b < a, ou seja, na˜o se
pode ter a > b. Assim, na˜o se pode ter a < b e nem a > b. Pela Tricotomia
enta˜o, so´ pode valer a = b.
Proposic¸a˜o 1.9 (a) Se a e´ um elemento de R e a 6= 0 enta˜o a2 > 0;
(b) 1 > 0.
Prova: (a) Sendo por hipo´tese a 6= 0 enta˜o, pela Tricotomia, a > 0 ou
−a > 0. Sera´ enta˜o necessa´rio obter a conclusa˜o desejada em cada um dos
dois casos. Ora, se a > 0 enta˜o por (O2) tem-se a2 = aa > 0. E tambe´m, se
−a > 0 enta˜o por (O2) tem-se (−a)(−a) > 0. Mas pela Proposic¸a˜o 1.6(c)
tem-se
(−a)(−a) = aa = a2.
Portanto, a2 > 0 tambe´m neste caso. Logo vale a conclusa˜o em qualquer dos
casos poss´ıveis. Esta´ enta˜o demonstrado que se a 6= 0 conclui-se que a2 > 0.
�
(b) Como 1 = 12 e´ verdade por (M3) enta˜o do item (a) precedente resulta
que 1 > 0.
Proposic¸a˜o 1.10 (a) Se a, b, c ∈ R e a > b enta˜o a+ c > b+ c;
(b) Se a, b, c, d ∈ R, a > b e c > d enta˜o a+ c > b+ d;
(c) Se a, b, c sa˜o nu´meros reais, a > b e c > 0 enta˜o ac > bc;
(d) Se a, b, c ∈ R, a > b e c < 0 enta˜o ac < bc;
CEDERJ 12
Os Nu´meros Reais I
NA 1
(e) Se a ∈ R e a > 0 enta˜o 1/a > 0;
(f) Se a ∈ R e a < 0 enta˜o 1/a < 0;
Prova: (a) Por hipo´tese a > b, ou seja, a− b > 0. Logo (a + c)− (b + c) =
a− b > 0. Portanto, a+ c > b+ c. �
(b) Por hipo´tese a > b e c > d. Logo
a− b > 0 e c− d > 0 . (∗)
Como (a+ c)− (b+d) = (a− b)+(c−d) enta˜o, por (O1) e por (∗) conclui-se
que (a+ c)− (b+ d) > 0. Logo, pela Definic¸a˜o1.2, a+ c > b+ d. �
(c) Por hipo´tese a > b e c > 0. Enta˜o a− b > 0. Da´ı, de c > 0 e por (O2)
tem-se ac− bc = (a− b)c > 0. Assim, ac > bc, pela Definic¸a˜o 1.2. �
(d) Exerc´ıcio.
(e) Por hipo´tese a > 0. Pela Tricotomia, a 6= 0, de onde segue pela Proposic¸a˜o
1.7(a), que 1/a 6= 0. Suponha, por absurdo, que 1/a < 0 (veja o Prelu´dio
2). Enta˜o a > 0 e c = 1/a < 0. Usando o item (d) acima tem-se que
a · (1/a) < a · 0, ou seja 1 < 0. Isto contradiz o item (b) da Proposic¸a˜o 1.9.
Portanto, tem-se que 1/a > 0 �
(f) Exerc´ıcio.
A afirmac¸a˜o demonstrada no pro´ximo Exemplo sera´ muito u´til no de-
correr do estudo de EAR.
Exemplo 1.3 Se a ∈ R e para todo nu´mero real � > 0 vale 0 ≤ a < �, enta˜o
a = 0.
Prova: A hipo´tese e´ (atenc¸a˜o!!!): a ∈ R e vale 0 ≤ a < � para todo nu´mero
real � > 0 . Suponha, por absurdo, que a 6= 0. Da´ı, a < 0 ou a > 0 (pela
tricotomia, so´ vale uma das situac¸o˜es). Como por hipo´tese a ≥ 0, na˜o pode
ocorrer a < 0. Portanto, a > 0. Sendo a > 0 pode-se fazer � = a na hipo´tese
( isto e´ poss´ıvel, pois a hipo´tese e´ verdadeira para todo � > 0 real, logo em
particular para � = a). Da´ı obte´m-se a < a. Mas isto e´ um absurdo pela
tricotomia! Logo, a = 0.
♦ Prelu´dio 1.4 Um estudo sistema´tico do conjunto Z dos nu´meros intei-
ros ja´ foi realizado em disciplinas anteriores. La´ voceˆ aprendeu sobre os
Princ´ıpios da Boa Ordenac¸a˜o e da Induc¸a˜o Matema´tica, sendo que um deles
13 CEDERJ
Elementos
de
Ana´lise
Real
Os Nu´meros Reais I
foi introduzido como Axioma e o outro deduzido dele. Aqui sera´ feita apenas
uma recordac¸a˜o deste u´ltimo, apresentado como um Teorema.
O Princ´ıpio da Induc¸a˜o Matema´tica - PIM - e´ talvez a mais importante
propriedade dos nu´meros inteiros (logo, dos nu´meros naturais). Na sua versa˜o
mais simples, o PIM fornece uma maneira de provar que uma afirmac¸a˜o do
tipo
Para todo nu´mero inteiro n ≥ a, vale P[n] (?)
e´ verdadeira. Na afirmac¸a˜o (?), P[n] indica uma propriedade que se refere
ao nu´mero inteiro n e a e´ um nu´mero inteiro conhecido. Portanto, o PIM
fornece um me´todo de prova.
Exemplo 1.4 • Para todo n ∈ N, n > 0.
Aqui, a = 1 e P[n] e´ a propriedade pn > 0q.
• Para todo natural n ≥ 4, 2n < n!.
Aqui, a = 4 e P[n] e´ a propriedade p2n < n!q.
Note a estrutura de enunciado condicional na formulac¸a˜o precisa do
Teorema que sera´ chamado PIM em EAR.
Teorema 1.1 (Princ´ıpio da Induc¸a˜o Matema´tica - PIM) Seja P[n] uma
propriedade referente ao nu´mero inteiro n e seja a ∈ Z dado. Se P[n] satisfaz
1. P[a] e´ enunciado verdadeiro e
2. para todo k ∈ Z, k ≥ a, se P[k] e´ verdadeira enta˜o P[k+1] e´ verdadeira
enta˜o P[n] e´ verdadeira para todos os nu´meros naturais n ≥ a.
Entenda que para usar o PIM na demonstrac¸a˜o de que uma propriedade
P[n] e´ verdadeira para todos os inteiros n ≥ a, onde a e´ um inteiro dado,
e´ necessa´rio provar que P[n] satisfaz os itens (1) e (2) acima, ou seja, que
P[n] esta´ nas condic¸o˜es das hipo´teses do PIM. E mais: como o item (2) exige
que ”se P[n] e´ verdadeira para o inteiro k ≥ a enta˜o P[n] e´ verdadeira para
n = k + 1”, prova´-lo significa provar uma implicac¸a˜o!
A seguir voceˆ encontra um passo-a-passo para usar o PIM na demons-
trac¸a˜o de que uma afirmac¸a˜o do tipo ”para todo nu´mero inteiro n ≥ a, vale
P[n] ”e´ verdadeira.
[10] Identificar a propriedade P[n] e o nu´mero inteiro (ou natural) a;
CEDERJ 14
Os Nu´meros Reais I
NA 1
[20] Mostrar que vale P[n] para n = a, isto e´, que P[a] e´ uma afirmac¸a˜o
verdadeira;
[30] Escrever a Hipo´tese de Induc¸a˜o - HI - corretamente: ”seja k ∈ Z, k ≥ a
e suponha-se que vale P[k]”;
[40] Usando HI provar que P[k+1] e´ verdadeira.
Atenc¸a˜o: Em HI supo˜e-se que P[k] e´ verdadeira para um determinado inteiro
k ≥ a e na˜o para todo k. Na verdade, que ”vale P[n] para todo n ≥ a ” e´ a
conclusa˜o final, a tese. Portanto, esta na˜o pode ser a HI!!
Exemplo 1.5 Provar que a soma dos n primeiros nu´meros naturais e´ igual
a
1
2
n(n+ 1), ou brevemente, que para todo n ∈ N vale
1 + 2 + · · ·+ n = 1
2
n(n+ 1). (?)
Prova: Aqui P [n] e´ a igualdade (?) e a = 1 .
P [1] diz que 1 = 1
2
· 1 · 2, , o que e´ verdade.
HI: Suponha que k ∈ N e que valha P [k], ou seja, que 1 + 2 + · · · + k =
1
2
k(k + 1).
Deseja-se provar que P [k + 1] e´ verdadeira. Ou seja, que vale 1 + 2 +
· · ·+ k+ (k+ 1) = 1
2
(k+ 1)(k+ 2). Para mostrar esta igualdade, procede-se
como a seguir:
1+2+ · · ·+ k+(k+1) = (1+2+ · · ·+ k)+ (k+1) HI= 1
2
k(k+1)+ (k+1) =
=
k(k + 1) + 2(k + 1)
2
=
1
2
(k + 1)(k + 2). Assim vale que
1 + 2 + · · ·+ k + (k + 1) = 1
2
(k + 1)(k + 2), ou seja, P[k+1] e´ verdadeira.
Como as duas condic¸o˜es da hipo´tese do PIM foram provadas, o Teorema
conclui-se que P [n] e´ verdadeira para todo n ∈ N
Observac¸a˜o 1.1 O resultado acima possui uma prova alternativa diferente
da apresentada, que costuma ser apresentada aos estudantes de Ensino Me´dio
(pesquise!). Este fato na˜o e´ comum para a maior parte dos enunciados
pass´ıveis de serem provados por induc¸a˜o.
Exemplo 1.6 Mostrar que: se n ∈ N e n ≥ 4 enta˜o 2n < n!.
15 CEDERJ
Elementos
de
Ana´lise
Real
Os Nu´meros Reais I
Prova: Note que aqui a = 4 e P[n] e´ p2n < n!q.
Para n = 4, P[4] diz que 24 < 4!, ou seja, que 16 < 24. E isto e´ verdade.
A HI e´: suponha que P[n] vale para um determinado natural n ∈ N com
n ≥ 4. Ou seja, suponha que 2n < n! vale. Multiplicar ambos os membros
da desigualdade de HI por 2 na˜o a altera (veja a Proposic¸a˜o 1.10(c) ) e
fornece 2n+1 = 2n · 2 < n! · 2 . Como 2 < n + 1, pois 4 ≤ n (verifique!) e
n! > 0, resulta n! · 2 < n!(n + 1) = (n + 1)! . Usando as duas desigualdades
e transitividade, vem que 2n+1 < (n+ 1)!.
Como as duas condic¸o˜es do Teorema 1.1 foram provadas, conclui-se
pelo PIM que 2n < n! e´ verdade para todo natural n ≥ 4.
Proposic¸a˜o 1.11 Para todo n ∈ N, n > 0.
Prova: Aqui P[n] e´ a propriedade pn > 0q e a = 1.
1) P[1] vale, pois 1 > 0 pela Proposic¸a˜o 1.9(b);
2) A HI e´: seja k ∈ N (logo k ≥ 1) e suponha que P[k] e´ verdadeira para este
k, isto e´, que k > 0. Como 1 > 0 e pela HI, k > 0, enta˜o k+1 > 0 por (O1).
Assim, as duas condic¸o˜es da hipo´tese do PIM sa˜o satisfeitas. Resulta
dele enta˜o que n > 0 para todo n ∈ N .
Proposic¸a˜o 1.12 Se a e b sa˜o elementos de R tais que a < b enta˜o a <
1
2
(a + b) < b. Em particular, se a = 0 tem-se que 0 < 1
2
b < b para qualquer
b ∈ R.
Prova: Sendo por hipo´tese a < b enta˜o, do item (a) da Proposic¸a˜o 1.10 tem-
se que 2a = a+a < a+ b e que a+ b < b+ b = 2b. Da´ı, 2a < a+ b < 2b. Pela
Proposic¸a˜o 1.11, 2 > 0, e, da´ı, pela Proposic¸a˜o 1.10 (e) tem-se que 1/2 > 0.
Aplicando a Proposic¸a˜o 1.10 (c) em 2a < a+ b < 2b com c = 1/2 resulta que
a =
1
2
(2a) <
1
2
(a+ b) <
1
2
(2b) = b.
Proposic¸a˜o 1.13 Se a e´ elemento de R tal que 0 ≤ a < � para qualquer �
positivo, enta˜o a = 0.
Prova: Por hipo´tese, a ∈ R e 0 ≤ a < �, para todo nu´mero real positivo
�. Logo a ≥ 0. Raciocina-se por reduc¸a˜o ao absurdo. Suponha, enta˜o, que
a > 0. Da´ı, pela Proposic¸a˜o 1.12, 0 < a/2 < a. Por outro lado, como 2 > 0,
CEDERJ 16
Os Nu´meros Reais I
NA 1
pela Proposic¸a˜o 1.10 (e) tem-se que 1/2 > 0. A hipo´tese vale em particular
para � := a/2, pois ela vale para todo nu´mero real > 0, e portanto, tem-se
que 0 < a < a/2. Mas pela Tricotomia, e´ um absurdo valer a < a/2 e
a/2 < a ao mesmo tempo, levando a uma contradic¸a˜o. Logo, na˜o se pode ter
a > 0 no caso acima, e necessariamente tem-se que a = 0.
Exerc´ıcios 1.1 1. Mostre que, se z, a ∈ R com a 6= 0 e z · a = a enta˜o
z = 1.
2. Se a, b ∈ R e a+ b = 0 enta˜o b = −a. Mostre.
3. Mostre que (−1) · (−1) = 1.
4. Mostre que: se a, b, c ∈ R, a ≥ b e b ≥ c enta˜o a ≥ c.
5. Sejam a, b, c elementos de R.Mostre que:
(a) Se a > b e c < 0 enta˜o ac < bc;
(b) Se a < 0 enta˜o 1/a < 0.
6. Sejam a, b ∈ R e suponha que a − � < b para qualquer � > 0. Mostre
que a ≤ b.
7. Sejam a, b ∈ R tais que ab > 0. Mostre que ambos sa˜o positivos ou
ambos sa˜o negativos.
8. Sejam a, b nu´meros reais. Se a > 0 e b > 0, mostre que a me´dia
aritme´tica, (a+ b)/2, e a me´dia geome´trica,
√
ab, satisfazem
√
ab ≤ 1
2
(a+b), e que a igualdade entre elas ocorre se e somente se a = b.
9. (Desigualdade de Bernoulli) Se x e´ um nu´mero real tal que x ≤ −1,
mostre, usando induc¸a˜o matema´tica, que (1 + x)n ≥ 1 + nx para todo
n ∈ N.
10. (Desigualdade de Cauchy) Mostre que: para todo n ∈ N, se a1, . . . , an
e b1, . . . , bn sa˜o nu´meros reais enta˜o
(a1b1 + · · ·+ anbn)2 ≤
(
a21 + · · ·+ a2n
) (
b21 + · · ·+ b2n
)
.
17 CEDERJ

Continue navegando