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Notas de Aula 02

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Os Nu´meros Reais - parte II
NA 2
Notas de Aula 2 – Os Nu´meros Reais - parte II
Introduc¸a˜o
Esta aula comec¸a com o estudo de “valor absoluto“ ou “mo´dulo“ em
R, a partir do qual se define “distaˆncia entre dois nu´meros reais”, a qual e´ de
suma importaˆncia para estabelecer de modo rigoroso noc¸o˜es que dependem da
ideia de aproximac¸a˜o, tais como as de “limite”, “continuidade” e “derivada”
de uma func¸a˜o. Os outros conceitos importantes introduzidos nesta aula
sa˜o os de “supremo” e “´ınfimo” de um subconjunto de R. A partir deles,
introduz-se o Axioma do Supremo. Este u´ltimo axioma e´ exatamente aquele
que permite suprir certas deficieˆncias dos nu´meros racionais e estabelecer
a principal diferenc¸a entre Q e R: por exemplo, e´ a partir do Axioma do
Supremo que se pode provar que a equac¸a˜o x2 = 2 admite soluc¸a˜o em R, fato
que na˜o e´ verdadeiro em Q como ja´ visto. O Axioma do Supremo e´ tambe´m
a principal ferramenta para provar, por exemplo, a validade do Teorema do
Valor Intermedia´rio, que voceˆ ja´ conhece do Ca´lculo.
Valor Absoluto em R
A ordem e a propriedade de tricotomia em R permitem estabelecer o
conceito de mo´dulo ou valor absoluto em R. A saber,
Definic¸a˜o 2.1 Seja ∈ R. O valor absoluto ou mo´dulo de a e´ o nu´mero real
denotado |a| tal que
|a| :=
{
a se a ≥ 0,
−a se a < 0.
Por exemplo, |2| = 2 e | − 2| = 2.
Observac¸a˜o 2.1 Decorre diretamente da Definic¸a˜o 2.1 que |a| ≥ 0 para todo a ∈
R . Note que a Definic¸a˜o 2.1 afirma que |a| = a nos casos a > 0 e a = 0.
♦ Prelu´dio 2.1 Se P(x) e Q(x) sa˜o afirmac¸o˜es sobre um objeto x, o enunciado
p se Q(x) enta˜o P(x)q
e´ chamado rec´ıproca do enunciado
p se Q(x) enta˜o P(x)q.
1
CEDERJ
Elementos
de
Ana´lise
Real
Os Nu´meros Reais - parte II
Uma implicac¸a˜o pode ser verdadeira sem que sua rec´ıproca o seja. Agora,
enunciados da forma
P(x) se e somente se Q(x) (em s´ımbolos: P(x) ⇔ Q(x)) (∗)
sa˜o chamados biimplicac¸o˜es ou equivaleˆncias. Enunciados como em (∗) quando
sa˜o verdadeiros, indicam que sa˜o verdadeiras as duas seguintes implicac¸o˜es:
se P(x) enta˜o Q(x) e se Q(x) enta˜o P(x).
ou seja, a implicac¸a˜o e sua rec´ıproca.
As propriedades de mo´dulo que se seguem sa˜o muito importantes. Es-
tude com muita atenc¸a˜o as suas demonstrac¸o˜es, para aprender como se tra-
balha com este conceito.
Proposic¸a˜o 2.1 (a) Para todo a ∈ R, |a| = 0 se e somente se a = 0;
(b) Para todo a ∈ R, | − a| = |a|;
(c) Para todos a, b ∈ R, |ab| = |a||b|;
(d) Se a, c ∈ e c ≥ 0 enta˜o |a| ≤ c se, e somente se, −c ≤ a ≤ c;
(e) Se a ∈ R enta˜o −|a| ≤ a ≤ |a|.
Prova: (a) (⇒) Por hipo´tese, |a| = 0. Suponha, por contradic¸a˜o, que a 6= 0.
Pela tricotomia, a > 0 ou a < 0. Ora, no primeiro caso, tem-se pela Definic¸a˜o
2.1 que |a| = a > 0, contrariando a hipo´tese. No segundo caso, |a| = −a > 0,
pois a < 0. Mas aqui tambe´m contraria-se a hipo´tese inicial. Logo na˜o e´
poss´ıvel que seja a 6= 0. Conclui-se que a = 0.
(⇐) Por hipo´tese, a = 0. Da´ı e da Definic¸a˜o 2.1 tem-se que |a| = 0. �
(b) Seja a ∈ R. Enta˜o a ≥ 0 ou < 0, pela tricotomia. Suponha a ≥ 0. Enta˜o
−a ≤ 0. Da´ı e da Definic¸a˜o 2.1, |a| = a e | − a| = −(−a) = a. Portanto,
|a| = | − a| neste caso. Suponha agora a < 0. Enta˜o |a| = −a. Mas como
agora −a > 0, tem-se | − a| = −a, e portanto, |a| = | − a| tambe´m neste
caso. Conclui-se que vale o resultado em qualquer caso. �
(c) Exerc´ıcio. Considerando a Definic¸a˜o 2.1, demonstre a conclusa˜o para
cada um dos quatro casos poss´ıveis para o par de nu´meros a e b.
(d) Por hipo´tese (geral) a, c ∈ R com c ≥ 0.
(⇒) Por hipo´tese, |a| ≤ c. Aqui e´ preciso mostrar que −c ≤ a e que a ≤ c.
Mas como aparece |a| na hipo´tese, para poder escrever a e´ preciso considerar
os dois casos, a ≥ 0 e a < 0, e mostrar a conclusa˜o em cada caso.
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Os Nu´meros Reais - parte II
NA 2
Suponha primeiramente a ≥ 0. Enta˜o a = |a| ≤ c. Ale´m disso, −c ≤ 0 ≤ a.
Portanto, vale a conclusa˜o −c ≤ a ≤ c no caso a ≥ 0. No caso em que
a < 0, por Definic¸a˜o e da hipo´tese vem que −a = |a| ≤ c. Logo, −c ≤ a.
Ale´m disso, a < 0 ≤ c. Portanto, vale a conclusa˜o −c ≤ a ≤ c tambe´m no
caso a < 0. Logo, vale a conclusa˜o em qualquer dos dois casos poss´ıveis. A
implicac¸a˜o (⇒) esta´ provada.
(⇐) Por hipo´tese, −c ≤ a ≤ c, ou seja, a ≤ c e −c ≤ a. Como e´ preciso
concluir algo sobre |a|, consideram-se os dois casos poss´ıveis e mostra-se a
conclusa˜o em cada um. Ora, supondo que a ≥ 0, tem-se |a| = a ≤ c e
supondo-se a < 0 enta˜o |a| = −a ≤ c. Portanto, em qualquer caso, |a| ≤ c.�
(e) Exerc´ıcio.
Uma das mais importantes propriedades da noc¸a˜o de valor absoluto de
um nu´mero real, muito usada nas aplicac¸o˜es e´ a:
Proposic¸a˜o 2.2 (Desigualdade triangular) Se a, b sa˜o elementos de R
enta˜o
|a+ b| ≤ |a|+ |b|. (∗)
Prova: Da Proposic¸a˜o 2.1 (e) tem-se −|a| ≤ a ≤ |a| e −|b| ≤ b ≤ |b|.
Adicionando estas duas desigualdades termo a termo e usando a Proposic¸a˜o
1.9 (b) resulta
−(|a|+ |b|) ≤ a+ b ≤ |a|+ |b|.
Da´ı e da Proposic¸a˜o 2.1 (d) tem-se (∗).
Decorre do resultado acima que (1)
Corola´rio 2.1 Para todos a, b ∈ R tem-se ||a| − |b|| ≤ |a− b|.
Prova: Aplicando a Desigualdade Triangular em a = (a − b) + b tem-se
|a| = |(a− b) + b| ≤ |a− b|+ |b|. Adicionando −|b| resulta
|a| − |b| ≤ |a− b|. (⋆)
Analogamente, usando a Desigualdade Triangular para b = (b− a) + a tem-
se |b| = |(b − a) + a| ≤ |b − a| + |a|. Ou seja, −(|a| − |b|) ≤ |b − a|. Da´ı e
1“Teoremas”, “‘proposic¸o˜es”, “lemas” e “corola´rios” sa˜o afirmac¸o˜es verdadeiras que
precisam ser demonstradas na construc¸a˜o de uma teoria. Chamamos “teorema” a`s
afirmac¸o˜es mais importantes e a`s outras, chamamos “proposic¸o˜es”. “Lema” e´ uma
afirmac¸a˜o que auxiliara´ na demonstrac¸a˜o de um outro resultado. Um “corola´rio” e´ um
resultado que e´ consequeˆncia de outra afirmac¸a˜o.
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Elementos
de
Ana´lise
Real
Os Nu´meros Reais - parte II
Proposic¸a˜o 2.1 (b) resulta −(|a| − |b|) ≤ |b− a| = | − (a− b)| = |a− b|. Isto
equivale a
|a| − |b| ≥ −|a− b|. (⋆⋆)
De (⋆), (⋆⋆) e Proposic¸a˜o 2.1 (d) obte´m-se o resultado desejado.
♦ Prelu´dio 2.2 Como mencionado nas NA 01, uma implicac¸a˜o da forma
p se P(x) enta˜o Q(x)q ou da forma p∀ x, se P(x) enta˜o Q(x)q (*)
e´ falsa se e somente se, a hipo´tese P(x) e´ verdadeira e a conclusa˜o Q(x) e´ falsa.
Portanto, para mostrar que uma implicac¸a˜o e´ falsa, deve-se exibir um objeto x
do contexto em que se esta´ trabalhando, que satisfac¸a a hipo´tese P(x) e na˜o
satisfac¸a a conclusa˜o Q(x). Ou seja,
p se P(x) enta˜o Q(x)q e´ uma afirmac¸a˜o falsa
se e somente se p existe x tal que P(x) e´ verdadeira e Q(x) e´ falsaq. O mesmo
vale para:
p∀ x, se P(x) enta˜o Q(x)q e´ afirmac¸a˜o falsa
se e somente se (ou seja, equivale a, e´ o mesmo que)
p ∃ x tal que P(x) e´ verdadeira e Q(x) e´ falsa q.
A este exemplar de objeto x do universo de trabalho que satisfaz P(x) e
na˜o satisfaz Q(x) chama-se um contra-exemplo para a implicac¸a˜o (*).
Exemplo 2.1 A afirmac¸a˜o ppara todo x, sex ≥ 3 enta˜o x > 3q e´ falsa, pois
existe x = 3 tal que 3 ≥ 3 mas na˜o e´ verdade que 3 > 3.
A reta real
E´ comum representar-se geometricamente o conjunto dos nu´meros reais
por uma reta no qual se marcam a origem 0 e o 1 (mais adiante, veremos
uma justificativa para esta atitude). A partir da´ı se podem marcar na reta
os demais inteiros, usando-se o segmento de extremos 0 e 1 como medida
e tambe´m os nu´meros racionais, como subdiviso˜es deste segmento. Nesta
interpretac¸a˜o, o mo´dulo de x ∈ R, |x|, fornece a distaˆncia de x a` origem
da reta. Em termos precisos, a distaˆncia entre dois nu´meros reais x e y
quaisquer e´ definida como |x− y|.
A relac¸a˜o de ordem em R determina importantes subconjuntos cha-
mados intervalos. Um intervalo e´ um conjunto I de nu´merosreais com a
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Os Nu´meros Reais - parte II
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propriedade de que, para todos x, y ∈ I, se z ∈ R e´ tal que x < z < y enta˜o
z ∈ I (note que esta definic¸a˜o tem a forma de uma implicac¸a˜o).
Os intervalos mais comuns sa˜o:
(a, b) := {x ∈ R : a < x < b}, [a, b] := {x ∈ R : a ≤ x ≤ b},
(a, b] := {x ∈ R : a < x ≤ b}, [a, b) := {x ∈ R : a ≤ x < b},
(−∞, b) := {x ∈ R : x < b}, (−∞, b] := {x ∈ R : x ≤ b},
(a,+∞) := {x ∈ R : x > a}, [a,+∞) := {x ∈ R : x ≥ a}.
Os intervalos dos tipos (a, b), [a, b], (a, b] e [a, b) sa˜o chamados intervalos
limitados com extremos a e b e podem ser vistos geometricamente como
segmentos da reta real: o primeiro e´ dito um intervalo aberto, o segundo e´
um intervalo fechado. Os intervalos dos tipos (a,+∞), (−∞, b), [a,+∞) e
(−∞, b] sa˜o ditos ilimitados e podem ser identificados geometricamente com
semirretas. E´ tambe´m comum escrever R = (−∞,+∞). Chama-se atenc¸a˜o
para o fato de que −∞ e +∞ sa˜o apenas s´ımbolos convenientes, que se
leˆem menos infinito e mais infinito, respectivamente; na˜o representam, em
hipo´tese alguma, nu´meros reais.
Os conjuntos {1, 2, 100}, N, Z, Q, X1 = {x ∈ R|x < 2 ou x ≥ 7, 1},
X2 = {2n|n ∈ N} e X3 = { 12n |n ∈ N} sa˜o subconjuntos de R que na˜o sa˜o
intervalos, pois na˜o satisfazem a` condic¸a˜o enunciada acima: por exemplo,
como existem x = 1/23 e y = 1/22 pertencentes a X3 e z = 3/16 ∈ R tais
que 1/8 < 3/16 < 1/4 e 3/16 /∈ X3 enta˜o X3 na˜o e´ um intervalo de R (estude
o Prelu´dio 2.2, entenda este caso e fac¸a os outros!)
A pro´xima Definic¸a˜o sera´ de extrema importaˆncia para o trabalho com
a ideia de “aproximac¸a˜o”, que por sua vez, sera´ fundamental para se estabe-
lecer, por exemplo, o conceito de limite de uma func¸a˜o num ponto:
Definic¸a˜o 2.2 Sejam a, ǫ elementos de R com ǫ > 0. A vizinhanc¸a de a
de raio ǫ e´ o conjunto
Vǫ(a) := {x ∈ R : |x− a| < ǫ}
de todos os reais x cuja dista˜ncia a a e´ menor do que ǫ .
Note que afirmar que x pertence a Vǫ(a), significa pela Proposic¸a˜o 2.1 (d) que
−ǫ < x− a < ǫ , o que equivale a a− ǫ < x < a+ ǫ. (2.1)
Em s´ımbolos, escreve-se:
x ∈ Vǫ(a)⇔ −ǫ < x− a < ǫ ⇔ a− ǫ < x < a+ ǫ. (∗∗)
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Real
Os Nu´meros Reais - parte II
Usando a definic¸a˜o de intervalo, veˆ-se das equivaleˆncias (∗∗) que a vizi-
nhanc¸a Vǫ(a) e´ um intervalo aberto, ou seja
Vǫ(a) = (a− ǫ, a + ǫ).
Proposic¸a˜o 2.3 Sejam a, x ∈ R. Se x ∈ Vǫ(a) para qualquer ǫ > 0 enta˜o
x = a.
Prova: Por hipo´tese a, x ∈ R sa˜o tais que |x − a| < ǫ para todo ǫ > 0.
Pode-se enta˜o concluir que |x − a| = 0, pelo Exemplo 1.3 das NA 01.Da´ı
x− a = 0 pela Proposic¸a˜o 2.1 (a). Logo, x = a.
R como corpo ordenado completo
Estuda-se em A´lgebra que o conjunto Q satisfaz todas as propriedades
alge´bricas e de ordem ja´ estudadas em R, ou seja, que Q e´ tambe´m um corpo
ordenado. No entanto, nas Notas de Aula 01 mostrou-se que a equac¸a˜o
x2 = 2 na˜o tem soluc¸a˜o em Q. Este fato mostra que o conjunto dos nu´meros
racionais tem “lacunas” ou “deficieˆncias”. Os irracionais sa˜o os nu´meros
reais que preenchem estas “lacunas” e permitem a representac¸a˜o geome´trica
de R como uma reta. O fato de que em R na˜o ha´ tais “lacunas” e´ que o
faz ser “completo” no sentido que sera´ tornado preciso adiante. Esta e´ a
propriedade de R que e´ fundamental para o estabelecimento das noc¸o˜es de
limite, continuidade e derivada, que sa˜o ba´sicas para o estudo de Ana´lise,
iniciado pelas disciplinas de Ca´lculo Diferencial e Integral.
Uma outra “deficieˆncia“ em Q pode ser vista no seguinte exemplo:
Exemplo 2.2 Seja A o conjunto de todos os racionais positivos r tais que
r2 ≤ 2. Enta˜o A na˜o possui um “elemento ma´ximo”, ou seja, na˜o existe em
A um elemento que seja maior do que todos os outros elementos de A.
Prova: Deve-se mostrar que, para todo r ∈ A existe um s ∈ A tal que s > r.
De fato, para cada racional r > 0 considera-se o racional
s = r − r
2 − 2
r + 2
=
2r + 2
r + 2
. (i)
Enta˜o
s2 − 2 = 2(r
2 − 2)
(r + 2)2
. (ii)
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Sendo r ∈ A enta˜o r2 − 2 < 0 e da´ı −(r2 − 2)/(r + 2) > 0. Usando esta
u´ltima desigualdade e o item (i) tem-se
s = r − r
2 − 2
r + 2
> r.
E ainda: de (ii) tem-se que s2 < 2, pois s2 − 2 < 0. Portanto, s2 ≤ 2, o
garantindo que s ∈ A. Assim, existe s ∈ A tal que s > r, e fica provado que
A na˜o possui um maior elemento. �
Essas deficieˆncias de Q na˜o ocorrem em R porque aqui vale o Axioma
do Supremo, o qual e´ fundamental na caracterizac¸a˜o dos elementos de R.
“Supremo” e “´ınfimo” sa˜o conceitos associados a “limitac¸a˜o superior” e
“limitac¸a˜o inferior” de conjuntos de nu´meros reais, noc¸o˜es que se va˜o tornar
precisas a seguir. Neste ponto seria de muita importaˆncia que voceˆ recordasse
o Princ´ıpio da Boa Ordenac¸a˜o, uma propriedade do conjunto Z estudada em
A´lgebra. Sera´ necessa´rio tambe´m estudar com muita atenc¸a˜o o pro´ximo
Prelu´dio.
Definic¸a˜o 2.3 Seja A um subconjunto de R.
(i) Um nu´mero real s e´ uma cota superior de A quando s ≤ s para todo
s ∈ A;
(ii) Um nu´mero real i e´ uma cota inferior de A quando i ≤ s para todo
s ∈ A.
(iii) A e´ chamado conjunto limitado superiormente quando existe alguma
cota superior para A (diz-se, neste caso, que o conjunto A possui uma
cota superior). Analogamente, A e´ chamado conjunto limitado infe-
riormente quando existe alguma cota inferior para A (tambe´m diz-se
neste caso, que o conjunto A possui uma cota inferior). Diz-se que
A e´ conjunto limitado quando A e´ limitado superiormente e limitado
inferiormente.
Exemplo 2.3 (1) Os subconjuntos de R da forma (a, b), [a, b], (a, b], [a, b)
sa˜o ditos intervalos limitados, pois sa˜o todos conjuntos limitados supe-
riormente e inferiormente. Em todos eles, o nu´mero real b e´ uma cota
superior, assim como todo nu´mero real ≥ b . Analogamente, o nu´mero
real a e´ uma cota inferior para todos estes intervalos, assim como todo
nu´mero real ≤ a . E´ muito importante notar que uma cota pode per-
tencer ou na˜o ao conjunto. Quando se diz “o conjunto S possui cota
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Elementos
de
Ana´lise
Real
Os Nu´meros Reais - parte II
superior (respectivamente, cota inferior)“, isto significa que existe tal
cota, mas na˜o necessariamente que a cota pertence ao conjunto. Por
exemplo, 2 e qualquer nu´mero real maior do que 2 sa˜o cotas superiores
do intervalo (0, 2), mas nenhuma destas cotas pertence ao conjunto.
(2) Os subconjuntos de R da forma (−∞, b), (−∞, b], (a,+∞), [a,+∞),
(−∞,+∞) sa˜o chamados intervalos ilimitados, pois na˜o sa˜o limitados
inferiormente ou inferiormente ou ambos: de fato, o primeiro e o se-
gundo sa˜o conjuntos limitados superiormente mas na˜o sa˜o limitados
inferiormente, o terceiro e o quarto sa˜o conjuntos na˜o limitados su-
periormente e o u´ltimo intervalo e´ um conjunto que na˜o e´ limitado
inferiormente e nem superiormente. Os s´ımbolos −∞ e +∞, que na˜o
sa˜o nu´meros reais, indicam exatamente esta ideia de inexisteˆncia de
cota inferior e superior, respectivamente, para estes conjuntos.
(3) O conjunto
{1
2
,−1
4
,
1
5
,−5
2
,
√
3,−
√
2}
e´ limitado (−5
2
e
√
3 sa˜o cotas, verifique!). Na verdade, todo con-
junto finito e´ limitado. Note que a rec´ıproca desta afirmac¸a˜o na˜o e´
verdadeira, ou seja: nem todo conjunto limitado e´ finito: os intervalos
limitados do item (1) servem de contra-exemplo. (2)
Observac¸a˜o 2.2 As afirmac¸o˜es abaixo decorrem imediatamente da Definic¸a˜o
2.3:
(1) Se um subconjunto A de R e´ limitado superiormente enta˜o A possui in-
finitas cotas superiores. Analogamente, os subconjuntos de R limitados
inferiomente teˆm infinitas cotas inferiores. Por exemplo, 2 e todo real
maior do que 2 e´ cota superior dos conjuntos(0, 2), {0,−3,−27, 2} e
de (−∞, 2]. Assim tambe´m, 3 e qualquer real < 3 e´ uma cota inferior
para os conjuntos {5, 4, 3, 7/2, 3√2}, [4, 6] e (3,+∞) .
(2) α ∈ R na˜o e´ uma cota superior do conjunto A se, e somente se, existe
algum nu´mero real s ∈ A tal que α < s. Por exemplo, 2 na˜o e´ uma
cota superior de A = {x ∈ R | x < 2, 5} pois existe x = 2, 1 ∈ A tal
que 2 < 2, 1.
2As noc¸o˜es de conjunto finito e conjunto infinito sera˜o estudadas de forma precisa mais
adiante. No momento, basta uma noc¸a˜o ba´sica destes termos, que ja´ devem ser conhecidos.
Se precisar, na˜o hesite em consultar um livro de Ensino Me´dio.
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(3) β ∈ R na˜o e´ uma cota inferior de A se, e somente se, existe algum
elemento s ∈ A tal que s < β. Justifique precisamente o fato de -5/2
na˜o ser uma cota inferior do conjunto {2,−2, 1/2,−1/2, 3,−3, 4,−4} .
(4) Pela Definic¸a˜o 2.3, todo nu´mero real α e´ uma cota superior do conjunto
vazio ∅. De fato, em caso contra´rio, pelo item (2) existiria s ∈ ∅ tal
que α < s. Mas, na˜o ha´ elemento em ∅. Logo, todo nu´mero real e´ uma
cota superior de ∅. De modo similar, mostra-se que todo nu´mero real e´
uma cota inferior de ∅.
Definic¸a˜o 2.4 Seja A um subconjunto na˜o vazio de R.
(i) Considere A um conjunto limitado superiormente. Um nu´mero real s
e´ chamado supremo de A quando s e´ a menor das cotas superiores de
A.
Notac¸a˜o: s = supA.
Em termos precisos, escreve-se:
Se s ∈ R, tem-se que s = supA quando s satisfaz as duas seguintes
condic¸o˜es:
(S1) s ≤ s, para todo s ∈ A;
(S2) se c ∈ R e c < s enta˜o existe s ∈ A tal que c < s.
(ii) Seja A um conjunto limitado inferiormente. Um nu´mero real i e´ cha-
mado ı´nfimo de A quando i e´ a maior das cotas inferiores de A.
Notac¸a˜o: i = inf A.
Em termos precisos, escreve-se:
Se i ∈ R, tem-se que i = inf A quando i satisfaz as duas seguintes condic¸o˜es:
(I1) i ≤ s, para todo s ∈ A;
(I2) se d ∈ R e i < d enta˜o existe s ∈ A tal que s < d.
Observac¸a˜o 2.3 (1) A condic¸a˜o (S1) diz que s e´ uma cota superior do
conjunto A e (S2) afirma que um nu´mero menor do que s na˜o e´ uma
cota superior de A. E´ atrave´s destas duas condic¸o˜es que se descreve
precisamente a ideia de que o supremo de A e´ a menor das cotas supe-
riores de A.
Ale´m disso: desta ideia segue que, se existe supA, enta˜o um nu´mero
real s0 e´ uma cota superior de A se e somente se, supA ≤ s0. Ou seja,
s ≤ s0 para todo s ∈ A se, e somente se, supA ≤ s0.
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Elementos
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Ana´lise
Real
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(2) De forma ana´loga: a condic¸a˜o (I1) diz que i e´ uma cota inferior do
conjunto A e (I2) afirma que um nu´mero maior do que i na˜o e´ uma cota
inferior de A. E´ exatamente assim, por meio destas duas condic¸o˜es,
que se traduz a ideia de que o ı´nfimo de A e´ a maior das cotas inferiores
de A. Da´ı segue que, se existe inf A, enta˜o um nu´mero real i0 e´ uma
cota inferior de A, ou seja, i0 ≤ s para todo s ∈ A, se e somente se,
inf A ≥ i0.
(3) O supremo de um conjunto na˜o vazio A , quando existe, e´ u´nico. De
fato: suponhamos que s1 e s2 sejam ambos supremos de A. Enta˜o, por
Definic¸a˜o, ambos sa˜o cotas superiores de A e da´ı, aplicando a segunda
parte do item (1) acima para s1 e s2, tem-se que s1 ≤ s2 e s2 ≤ s1.
Segue que s1 = s2 e a afirmac¸a˜o esta´ provada. Um racioc´ınio ana´logo
mostra que o ı´nfimo de um conjunto na˜o vazio, quando existe, e´ u´nico.
Fac¸a como exerc´ıcio.
(4) Se s0 e´ uma cota superior de um conjunto A e s0 ∈ A enta˜o s0 = supA.
De fato, a condic¸a˜o (S1) da Definic¸a˜o 2.4 e´ satisfeita por hipo´tese. E,
se c < s0 enta˜o e´ claro que c na˜o e´ cota superior de A pois, por hipo´tese,
s0 ∈ A. Assim, a condic¸a˜o (S2) da Definic¸a˜o 2.4 tambe´m e´ satisfeita,
e portanto, s0 = supA. De forma ana´loga, prova-se que: se i0 e´ uma
cota inferior de A e i0 ∈ A enta˜o i0 = inf A. Fac¸a como exerc´ıcio.
Exemplo 2.4 Considere atentamente os exemplos a seguir:
(1) Como −1 e´ uma cota inferior de A1 = {x ∈ R : −1 ≤ x ≤ 1} e
−1 ∈ A1 enta˜o do item (4) da Observac¸a˜o 2.3 tem-se que −1 = inf A1.
Por racioc´ınio ana´logo, mostra-se que 1 = supA1.
(2) O conjunto A2 = {x ∈ R : x < 1} tem, tambe´m, 1 como cota superior
pois x ≤ 1, para todo x ∈ A2. Portanto, 1 satisfaz a condic¸a˜o (S1).
Aqui 1 /∈ A2, logo na˜o se pode usar o item (4) da Observac¸a˜o 2.3.
Deve-se mostrar diretamente que a condic¸a˜o (S2) da Definic¸a˜o 2.4 e´
satisfeita: de fato, se c ∈ R e c < 1 enta˜o existe (c + 1)/2 ∈ A2 sendo
que c < (c + 1)/2 < 1. Portanto, existe s := (c + 1)/2 ∈ A2 tal que
c < s. Assim, nenhum nu´mero real c < 1 e´ uma cota superior de A2,
ou seja, provou-se que vale a condic¸a˜o (S2) para o nu´mero 1. Fica
enta˜o garantido que 1 = supA2. Por outro lado, A2 na˜o e´ limitado
inferiormente e portanto na˜o existe ı´nfimo de A2.
CEDERJ 10
Os Nu´meros Reais - parte II
NA 2
Definic¸a˜o 2.5 Seja A um subconjunto de R. Se A e´ um conjunto limitado
superiormente, diz-se que s0 ∈ R e´ o elemento ma´ximo de A quando s0 ∈ A
e s ≤ s0 para todo s ∈ A.
Notac¸a˜o: s0 = maxA.
Analogamente, se A e´ um conjunto limitado inferiormente, diz-se que i0 ∈ R
e´ o elemento mı´nimo de A quando i0 ∈ A e i0 ≤ s para todo s ∈ A.
Notac¸a˜o: i0 = minA.
Observac¸a˜o 2.4 (1) O elemento ma´ximo e o elemento mı´nimo de um con-
junto, quando existem, sa˜o u´nicos. Justifique esta afirmac¸a˜o usando a
Definic¸a˜o acima.
(2) A Definic¸a˜o 2.5 diz exatamente que o elemento ma´ximo de um conjunto
e´ uma cota superior que pertence ao conjunto. Formulac¸a˜o ana´loga vale
para o elemento mı´nimo de um conjunto. Por exemplo, sejam A1 e A2
os conjuntos do Exemplo 2.4. Tem-se que maxA1 = 1 = supA1 e
minA1 = −1 = inf A1. O conjunto A2 na˜o possui elemento ma´ximo,
apesar de valer supA2 = 1. Isto ocorre porque 1 /∈ A2.
Assim, se s e´ o elemento ma´ximo de um conjunto enta˜o s e´ o supremo
do conjunto. Por outro lado, o supremo de um conjunto e´ seu elemento
ma´ximo se o supremo pertence ao conjunto. Um conjunto pode possuir
supremo e na˜o possuir elemento ma´ximo; mas se existe o elemento
ma´ximo do conjunto, este e´ o supremo do conjunto.
(3) Todo conjunto finito de nu´meros reais possui elemento ma´ximo e ele-
mento mı´nimo, portanto possui supremo e ı´nfimo. Em particular,
max{α, β} = β se, e somente se, β ≥ α.
(4) Segue direto da Definic¸a˜o 2.1 que, para todo a ∈ R, |a| = max{a,−a}.
O Axioma do Supremo e suas consequeˆncias
Com base nos axiomas alge´bricos e de ordem estabelecidos, que fazem
de R um corpo ordenado, na˜o e´ poss´ıvel mostrar uma das mais importantes
propriedades de R, a chamada Propriedade do Supremo, tambe´m cha-
mada Propriedade da Completeza (note que se isto fosse poss´ıvel, ela
tambe´m valeria no corpo ordenado Q). Em cursos de po´s-graduac¸a˜o, quando
se estuda uma das formas de construir o conjunto R a partir do conjunto Q,
esta propriedade aparece como teorema a ser demonstrado. Nestas Notas,
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CEDERJ
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de
Ana´lise
Real
Os Nu´meros Reais - parte II
a propriedade do supremo e´ estabelecida como axioma, sem necessidade de
demonstrac¸a˜o.
Axioma do Supremo
Todo subconjunto de R na˜o vazio e limitado superiomente admite um su-
premo em R.
Munido do Axioma do Supremo, o corpo ordenado R e´ dito um corpo
ordenado completo. Pode-se mostrar que, a menos de isomorfismos, R e´ o
u´nico corpo ordenado completo.
A propriedade ana´loga para o ı´nfimo na˜o precisa ser estabelecida como
axioma, pois pode ser mostrada a partir do Axioma do Supremo.
Proposic¸a˜o 2.4 (A propriedade do I´nfimo) Todo subconjunto A de R
na˜o vazio e limitado inferiomente possui um ı´nfimo em R.
Prova: Seja A um subconjunto de R, na˜o vazio e limitado inferiormente.
Considere o conjunto A1 = {−s ∈ R;s ∈ A}. Note que −s ∈ A1 se e
somente se s ∈ A. A1 e´ na˜o vazio e limitado superiormente (verifique!), e
pelo Axioma acima, existe s = supA1. Da´ı mostra-se que −s e´ o ı´nfimo de
A. De fato, como s e´ uma cota superior de A1 enta˜o −s ≤ s, para todo s ∈ A
e a condic¸a˜o (I1) da Definic¸a˜o 2.4 e´ satisfeita. Para provar a condic¸a˜o (I2),
seja d ∈ R tal que d > −s. Enta˜o −d < s = supA1, ou seja, −d na˜o e´ uma
cota superior de A1. Logo, existe −s ∈ A1 tal que −d < −s, donde d > s.
Ou seja, existe s ∈ A (pois −s ∈ A1) tal que s < d. Portanto, nenhum real
d > −s e´ cota inferior para A. A condic¸a˜o (I2) da Definic¸a˜o 2.4 e´ tambe´m
satisfeita, e portanto −s = inf A.
Uma importante consequeˆncia do Axioma do Supremo e´ que o conjunto
dos nu´meros naturais N na˜o e´ limitado superiormente em R. Ou seja, nenhum
x ∈ R e´ uma cota superior para N. Este fato na˜o pode ser demonstrado
apenas por meio dos axiomas alge´bricos e de ordem estabelecidos nas Notas
de Aula 01.
Proposic¸a˜o 2.5 (Propriedade Arquimediana) Se x ∈ R enta˜o existe
n0 ∈ N (n0 dependente de x) tal que n0 > x.
Prova: Seja x ∈ R. Suponha por contradic¸a˜o, que para todo n ∈ N se
tenha que n ≤ x. Esta condic¸a˜o diz que x e´ uma cota superior de N. Enta˜o,
pelo Axioma do Supremo, o conjunto dos naturais N tem supremo. Seja
s = supN. Como s − 1 < s enta˜o s − 1 na˜o e´ cota superior para N. Logo,
existe m ∈ N tal que s − 1 < m. Mas da´ı se obte´m s < m + 1 sendo que
CEDERJ 12
Os Nu´meros Reais - parte II
NA 2
m+1 ∈ N. Isto contradiz o fato de que s e´ o supremo de N. Esta contradic¸a˜o
veio da suposic¸a˜o de que x e´ uma cota superior para N. Portanto o que vale
e´ o contra´rio e assim pode-se afirmar que existe n0 ∈ N tal que n0 > x.
Os enunciados abaixo sera˜o deduzidos como corola´rios do anterior. Eles
sa˜o tambe´m a`s vezes nomeados como “Propriedade Arquimediana”, pois sa˜o
diferentes maneiras de expressa´-la.
Corola´rio 2.2 Sejam y e z nu´meros reais positivos. Enta˜o:
(a) Se y e z nu´meros reais positivos enta˜o existe n ∈ N tal que z < ny;
(b) Para cada nu´mero real y > 0 existe n ∈ N tal que 0 < 1/n < y;
(c) Existe n ∈ N tal que n− 1 ≤ z < n.
Prova: (a) Se y e z sa˜o nu´meros reais positivos enta˜o z/y e´ um real positivo.
Pela Proposic¸a˜o 2.5 existe n ∈ N tal que n > z/y, ou seja, que z < ny. �
(b) Dado y > 0 em R, tomando, em particular, z = 1 > 0 no item (a) tem-se
1 < ny, e consequentemente 1/n < y. Como 1/n > 0 conclui-se o resultado.
�
(c) Como z ∈ R, a Proposic¸a˜o 2.5 garante que A = {m ∈ N : z < m} e´
na˜o vazio. Ale´m disso, ele e´ limitado inferiormente por z. Como A ⊂ N,
o Princ´ıpio da Boa Ordenac¸a˜o estudado em A´lgebra garante que existe o
elemento mı´nimo de A (note que aqui na˜o adianta usar a propriedade do
ı´nfimo, pois este na˜o sera´ necessariamente um nu´mero inteiro). Seja n este
menor elemento de A. Enta˜o n− 1 /∈ A e n < z. Portanto, n− 1 ≤ z < n.
Exemplo 2.5 Considere C =
{ 3
2n− 1 ; n ∈ N
}
. Mostre que:
(a) inf C = 0, (b) supC = 3.
Prova: (a) Para mostrar que inf C = 0, e´ necessa´rio mostrar que as
condic¸o˜es (I1) e (I2) da Definic¸a˜o 2.4 sa˜o satisfeitas pelo 0.
(I1) Seja n ∈ N. Enta˜o 2n − 1 > 0 pois n > 1. Logo 1
2n−1
> 0 e da´ı,
3
2n−1
> 0. Assim, 3
2n−1
> 0 para todo n ∈ N, o que significa que 0 e´ uma
cota inferior para C (entenda que na˜o basta enumerar alguns elementos do
conjunto C para garantir que zero e´ uma cota inferior de C).
(I2) Para mostrar que 0 e´ a maior das cotas inferiores de C, sera´ fundamental
usar a Propriedade Arquimediana na forma
“para todo nu´mero real x existe n ∈ N tal que n > x.”
13
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Ana´lise
Real
Os Nu´meros Reais - parte II
Supo˜e-se enta˜o que β e´ um nu´mero real e que vale β > 0. Deve-se mostrar
que β na˜o e´ uma cota inferior para C. Ou seja, deve-se mostrar que existe
3
2n0−1
∈ C tal que 3
2n0−1
< β. Para encontrar este elemento de C, faz-se um
rascunho como abaixo, que na˜o aparecera´ na demonstrac¸a˜o.
Rascunho: Procura-se n0 ∈ N tal que 32n0−1 < β sabendo-se que β > 0.
Faz-se aqui no rascunho, uma conta de “tra´s para a frente” como a seguir:
β >
3
2n0 − 1 ⇔ 2n0β − β > 3⇔ 2n0β > 3 + β ⇔︸︷︷︸
3β>0
n0 >
3 + β
2β
.
Conclui-se enta˜o que n0 >
3+β
2β
serve para o problema. A propriedade Arqui-
mediana garante que este n0 existe (deve-se notar que na u´ltima passagem,
o fato de ser β > 0 e´ fundamental e isto devera´ ser ressaltado na demons-
trac¸a˜o). Fim do rascunho.
Atenc¸a˜o: De modo geral, a necessidade de fazer o que aqui e´ chamado “ras-
cunho” aparece quando precisa-se encontrar um objeto satisfazendo certa
propriedade e relacionado com os demais objetos do problema (outras si-
tuac¸o˜es em que rascunhos sa˜o necessa´rios aparecera˜o no decorrer do curso).
Na˜o ha´ sentido em que o rascunho tal como e´ feito aqui aparec¸a na demons-
trac¸a˜o. Mas alguns dos ca´lculos que aparecem nele, sim. Estude com muito
cuidado o exemplo acima, ate´ compreender completamente o racioc´ınio rea-
lizado e conseguir explica´-lo para outro colega que tambe´m tenha entendido.
Demonstrac¸a˜o do item (I2): Seja β ∈ R tal que β > 0. Enta˜o 3+β
2β
e´ um
nu´mero real. Pela Propriedade Arquimediana, existe n0 ∈ N tal que
n0 >
3 + β
2β
.
Da´ı, usando as propriedades alge´bricas de R, chega-se a ( 3 )
∴ 2βn0 > 3 + β, pois 2β > 0.
∴ 2n0β − β > 3 ∴ β(2n0 − 1) > 3.
(∗)
Como 2n0 − 1 > 0, pois n0 ≥ 1, pode-se escrever
β >
3
2n0 − 1 . (∗∗)
(4)Assim, existe pelo menos um elemento 3
2n0−1
∈ C tal que 3
2n0−1
< β. Logo
β na˜o e´ cota inferior para C. Fica provado enta˜o que para todo nu´mero
3O s´ımbolo p∴q significa “enta˜o” ou “logo”. E´ diferente de ⇒ que se leˆ “se . . . enta˜o
. . .” e na˜o se aplica em situac¸o˜es como esta.
4Deve-se notar que somente as passagens assinaladas com (∗) e (∗∗) foram justificadas.
De modo geral, as passagens onde se aplicam os itens (c), (d), (e) e (f) da Proposic¸a˜o 1.10
e similares devem ser justificadas como feito na demonstrac¸a˜o acima.
CEDERJ 14
Os Nu´meros Reais - parte II
NA 2
real β > 0, β na˜o e´ uma cota inferior para C. Logo, foram provadas que as
condic¸o˜es (I1) e (I2) da Definic¸a˜o 2.4 conclui-se que 0 = inf C �
(b) Pela Definic¸a˜o 2.4, para mostrar que supC = 3 e´ necessa´rio mostrar
que valem as condic¸o˜es (S1) e (S2).
(S1) Seja n ∈ N. Enta˜o 2n − 1 > 1 e assim 1
2n−1
< 1. Da´ı 3
2n−1
< 3.
Portanto, vale 3
2n−1
< 3 para todo n ∈ N, o que significa que 3 e´ uma cota
superior para C. A condic¸a˜o (S1) e´ satisfeita.
(S2) Aqui e´ preciso notar que 3 = 3
2.1−1
∈ C. Ou seja, 3 e´ uma cota superior
de C que pertence a C. Ja´ se comentou que nesta situac¸a˜o tem-se que
3 = supC, como se queria (reveja a Observac¸a˜o 2.3(4)).
Exemplo 2.6 Considere o conjunto C =
{ 2n
3n+ 2
; n ∈ N
}
. Mostre que:
(a) inf C = 2/5, (b) supC = 2/3.
Prova:
(a) (i) Seja n ∈ N. Enta˜o vale claramente que 4 ≤ 4n , pois 1 ≤ n . Da´ı
tem-se 6n+ 4 ≤ 6n + 4n = 10n, de onde resulta 2(3n+ 2) ≤ 5 · 2n.
Portanto, como 3n + 2 > 0 e 5 > 0 tem-se que
2
5
≤ 2n
3n+ 2
. Como o
natural n inicial e´ arbitra´rio, pode-se afirmar que, para todo n ∈ N tem-se
que
2
5
≤ 2n
3n+ 2
. Esta´ provado que 2/5 e´ uma cota inferior para C.
Como saber que se deve partir da afirmac¸a˜o p4 ≤ 4nq? Simples, fazendo
uma conta “de tra´s para frente”: as afirmac¸o˜es acima sa˜o todas equivalentes:
no rascunho (e so´ no rascunho), parte-se da u´ltima e chega-se a` primeira; na
demonstrac¸a˜o mesmo, elas aparecem em ordem inversa.
(ii) No caso do conjunto C acima, 2/5 e´ uma cota inferior de C e 2/5 ∈ C.
Logo, de (i), (ii) e pela Observac¸a˜o 2.1 (4) tem-se que 2/5 = inf C. �
(b) (i) Seja n ∈ N. Enta˜o a afirmac¸a˜o 6n ≤ 6n+2 e´ claramente verdadeira.
Assim,3 · 2n ≤ 2 · (3n+ 2); da´ı resulta 2n/(3n+ 2) ≤ 2/3, pois 3n+ 2 > 0.
Como n ∈ N inicial e´ arbitra´rio, pode-se afirmar que para todo n ∈ N, vale
2n/(3n+2) ≤ 2/3. Portanto, por definic¸a˜o, 2/3 e´ uma cota superior para C.
(ii) Seja c ∈ R tal que c < 2/3. Deve-se encontrar x ∈ C tal que c < x.
Pela Propriedade Arquimediana, existe n0 ∈ N tal que n0 > c
2− 3c . Note
que 2− 3c > 0 porque c < 2/3 (verifique!)
Sendo 2−3c > 0 e n0 > c
2− 3c tem-se que n0(2−3c) > c. Da´ı, 2n0−3n0c >
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2c. Assim, 3n0c + 2c = (3n0 + 2)c < 2n0. Portanto, c <
2n0
3n0 + 2
, sendo que
2n0
3n0 + 2
∈ C. Assim, existe x = 2n0
3n0 + 2
∈ C tal que c < x.
Pelas etapas (i) e (ii) acima e pela Definic¸a˜o 2.4 (2), fica garantido que
2/3 = supC.
Da mesma forma que no item (i) e no Exemplo 2.5, a desigualdade inicial
em p6n ≤ 6n + 2q e o desenvolvimento acima sa˜o obtidos fazendo-se uma
conta “de tra´s para frente”, procurando n0 que satisfaz c <
2n0
3n0 + 2
.
♦ Prelu´dio 2.3 Seja A ⊂ R um conjunto limitado e na˜o vazio. Como R
possui a propriedade do supremo enta˜o os nu´meros reais supA e inf A existem.
Por definic¸a˜o, supA e´ a menor das cotas superiores de A. Enta˜o dado
um nu´mero real α,
supA ≤ α se, e somente se, α e´ uma cota superior de A
(isto e´, x ≤ α para todo x ∈ A.)
Voceˆ devera´ sempre lembrar disto quando precisar mostrar que o supremo
de um certo conjunto e´ menor ou igual a um certo nu´mero.
Por definic¸a˜o, inf A e´ a maior das cotas inferiores de A. Enta˜o dado um
nu´mero real β,
β ≤ inf A se, e somente se, β e´ uma cota inferior de A
(isto e´, β ≤ y para todo y ∈ A).
Este fato e´ o que voceˆ precisara´ ter em mente quando precisar mostrar que
o ı´nfimo de um determinado conjunto e´ maior ou igual a um certo nu´mero.
Estude o pro´ximo Exemplo.
Exemplo 2.7 Sejam A,B ⊂ R conjuntos limitados e na˜o vazios tais que
A ⊂ B. Mostre que
inf B ≤ inf A e supA ≤ supB.
Conclua que inf B ≤ inf A ≤ supA ≤ supB.
Prova: Por hipo´tese, A e B sa˜o subconjuntos limitados e na˜o vazios de R
e A ⊂ B. Pelo Prelu´dio 2.3 os nu´meros reais inf B, supB, inf A e supA
existem.
CEDERJ 16
Os Nu´meros Reais - parte II
NA 2
Primeiramente, por definic¸a˜o de ı´nfimo sabe-se que inf B ≤ y para todo
y ∈ B. Como A ⊂ B (hipo´tese), enta˜o inf B ≤ x para todo x ∈ A. Ou seja,
inf B e´ uma cota inferior para A. Da´ı, pela definic¸a˜o de ı´nfimo (releia o
prelu´dio se precisar), tem-se que
inf B ≤ inf A. (⋆)
Do mesmo modo: por definic¸a˜o de supremo sabe-se que y ≤ supB para todo
y ∈ B. Como A ⊂ B (hipo´tese), enta˜o x ≤ supB para todo x ∈ A. Ou seja,
supB e´ uma cota superior para A. Da´ı, pela definic¸a˜o de ı´nfimo (releia o
prelu´dio se precisar), tem-se que
supA ≤ supB. (⋆⋆)
Finalmente, e´ claro que inf A ≤ supA (por queˆ?). Da´ı e de (⋆) e (⋆⋆), segue
a conclusa˜o final.
♦ Prelu´dio 2.4 Em Matema´tica, o enunciado “existe x tal que P (x)” signi-
fica “existe pelo menos um objeto x que tem a propriedade P (x)”. Portanto,
“existem treˆs x tal que P (x)”, significa “existem pelo menos treˆs x tal que
P (x)”.
Na maioria das vezes, mas na˜o em todas as vezes, para garantir que a
afirmac¸a˜o “existe x que satisfaz a propriedade P (x)” e´ verdadeira, deve-se
exibir um objeto x e mostrar que ele realmente tem a propriedade P (x). Note
que esta te´cnica na˜o poˆde ser utilizada, por exemplo, na prova da Proposic¸a˜o
2.5. Tambe´m na˜o sera´ a te´cnica utilizada em alguns dos resultados estudados a
seguir.
Exemplo 2.8 (a) O enunciado “existe um nu´mero real x tal que x2 < x”
e´ verdadeiro, pois, por exemplo, para x = 1/2 ∈ R vale x2 = (1/2)2 =
1/4 < 1/2 = x .
(b) No Exemplo 2.5, para garantir a existeˆncia de (pelo menos) um n0 ∈ N
satisfazendo n0 >
3+β
2β
foi preciso utilizar a Propriedade Arquimediana.
Note que tal n0 na˜o e´ u´nico, pois todo n > n0 tambe´m serve. E´ claro
que os enunciados “existe n0 ∈ N tal que n0 > 3+β2β ” e “existe n ∈ N
tal que n > 3+β
2β
” teˆm o mesmo sentido.
17
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Ana´lise
Real
Os Nu´meros Reais - parte II
(c) A afirmac¸a˜o “existe um nu´mero racional que pertence ao intervalo
(0, 1) = {x ∈ R : 0 < x < 1}” e´ verdadeira, pois, por exem-
plo, 4/5 e´ um nu´mero racional que pertence ao intervalo (0, 1), ja´ que
0 < 4/5 = 0, 8 < 1 .
Uma outra importante aplicac¸a˜o do Axioma do Supremo e´ garantir a
existeˆncia de nu´meros reais satisfazendo certas hipo´teses ou como soluc¸a˜o de
equac¸o˜es. Para ilustrar este fato, mostra-se a seguir que a equac¸a˜o x2 = 2
tem uma soluc¸a˜o positiva em R. Ja´ foi mostrado nas Notas de Aula 01 que
este fato na˜o e´ verdadeiro em Q.
Proposic¸a˜o 2.6 Existe um nu´mero real positivo c tal que c2 = 2.
Prova: Seja A := {y ∈ [0,+∞) : y2 < 2}. Como 1 ∈ A enta˜o A e´ na˜o vazio.
Ale´m disso, A e´ limitado superiormente por 2, pois se z > 2 enta˜o z2 > 4,
de modo que z /∈ A. Logo, se z ∈ A enta˜o z ≤ 2. O Axioma do Supremo
garante enta˜o que A possui supremo em R. Seja c := supA. Observe que
c > 0 (por que?). Mostra-se que c2 = 2, mostrando-se que sa˜o falsas as duas
outras possibilidades: c2 < 2 e c2 > 2.
Supo˜e-se primeiramente, por absurdo, que c2 < 2 e´ verdadeira. Mostra-
se que esta suposic¸a˜o implica a existeˆncia de um elemento de A que e´ maior
do que c ( sera´ um elemento da forma c + 1
n
, com n ∈ N). Isto leva a uma
contradic¸a˜o, pois sendo o supremo de A, c e´ uma cota superior de A. Para
encontrar tal n fez-se um rascunho que na˜o e´ mostrado aqui.
Tem-se neste caso, que 2− c2 > 0, e tambe´m e´ claro que 2c+ 1 > 0. Da´ı,
2− c2
2c+ 1
> 0.
A Propriedade Arquimediana garante que existe n ∈ N tal que
1
n
<
2− c2
2c+ 1
.
Portanto,
1
n
(2c+ 1) < 2− c2 . (1)
Da´ı (
c+
1
n
)2
= c2 +
2c
n
+
1
n2
< c2 +
2c
n
+
1
n
= c2 +
1
n
(2c+ 1)
(1)
< c2 + 2− c2 = 2.
CEDERJ 18
Os Nu´meros Reais - parte II
NA 2
Com isto, tem-se que o nu´mero real c + 1/n e´ um elemento do conjunto A,
o que e´ absurdo, pois c = supA. Assim, na˜o e´ poss´ıvel que seja c2 < 2.
Supo˜e-se agora, por absurdo, que c2 > 2. Mostra-se que esta suposic¸a˜o
implica na existeˆncia de uma cota superior de A menor do que c, o que e´
absurdo.
Como c2 − 2 > 0 e 2c > 0 enta˜o
c2 − 2
2c
> 0.
Logo, pela Propriedade Arquimediana, existe m ∈ N tal que
1
m
<
c2 − 2
2c
.
Da´ı e de novo de 2c > 0 tem-se 2c
m
< c2 − 2 , o que leva a
−2c
m
> 2− c2 . (2)
Enta˜o (
c− 1
m
)2
= c2 +
(−2c)
m
+
1
m2
> c2 − 2c
m
(2)
> c2 + (2− c2) = 2 .
Portanto (
c− 1
m
)2
> 2 ≥ y2 > 0,
para todo y ∈ A. Pelo Exerc´ıcio 2.1 item 4,(
c− 1
m
)
> y ,
para todo y ∈ A. Ou seja, (c− 1
m
)
e´ uma cota superior para A, o que e´
absurdo, pois c− 1
m
< c = supA. Portanto, na˜o se pode ter c2 > 2.
Pelos dois casos e pela tricotomia, conclui-se que c2 = 2. Portanto,
existe c ∈ R, c > 0, tal que c2 = 2.
Definic¸a˜o 2.6 O nu´mero real positivo que e´ soluc¸a˜o da equac¸a˜o x2 = 2 e´
chamado raiz quadrada (positiva) de 2 e denotado
√
2.
Apesar das “lacunas” ou “deficieˆncias” existentes no conjunto dos nu´meros
racionais ele apresenta uma propriedade nota´vel, que e´ o fato de que entre
dois racionais existir sempre um outro racional. Isto e´ verdade, pois se r < s
sa˜o dois racionais enta˜o r < (r+s)/2 < s, onde r+s/2 ∈ Q (veja o Exerc´ıcio
2.1 item 9). Note que este fato na˜o vale em Z.
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Elementos
de
Ana´lise
Real
Os Nu´meros Reais - parte II
Uma consequeˆncia imediata do pro´xima resultado e´ que ha´ uma infini-
dade de nu´meros racionais entre dois nu´meros reais quaisquer distintos. Por
isto diz-se que o conjunto Q e´ denso em R.
Teorema 2.1(Teorema da Densidade) Se x e y sa˜o dois nu´meros reais
com x < y enta˜o existe um nu´mero racional r tal que x < r < y.
Prova: Suponha que 0 < x < y (o caso x < y < 0 e´ ana´logo) Enta˜o
1/(y − x) ∈ R. Da´ı e da Proposic¸a˜o 2.5 existe n ∈ N tal que 1/(y − x) < n.
Esta desigualdade leva a
1 + nx < ny. (i)
Como xn > 0 enta˜o do Corola´rio 2.2 (c) existem ∈ N tal quem−1 ≤ xn < m.
Da´ı, tem-se m = 1 + (m − 1) ≤ 1 + xn <︸︷︷︸
(i)
ny. Portanto, xn < m < yn.
Toma-se enta˜o o racional r := m/n, o qual satistaz x < r < y.
Corola´rio 2.3 Se x e y sa˜o dois nu´meros reais com x < y enta˜o existe
(pelo menos) um nu´mero irracional z tal que x < z < y.
Prova: Como
√
2 > 0 e x < y enta˜o x/
√
2 < y/
√
2. Da´ı e do Teorema 2.1
existe r ∈ Q tal que
x√
2
< r <
y√
2
ou seja, tal que x < r
√
2 < y.
Logo, z := r
√
2 e´ um irracional tal que x < z < y.
Dados c, s ∈ R, tem-se que c < s se, e somente se, c = s−ǫ, para algum
ǫ > 0. Da mesma forma, i < d se, e somente se, d = i+ǫ, para algum nu´mero
real ǫ > 0. Estas ideias podem ser aplicadas para expressar as condic¸o˜es (I2)
e (S2) da Definic¸a˜o 2.4 de uma forma que e´ bastante utilizada nos livros de
Ana´lise Real e esta´ no Lema a seguir:
Lema 2.1 Seja A um subconjunto na˜o vazio de R e sejam s, i ∈ R.
(1) s = supA quando s satisfaz as duas seguintes condic¸o˜es:
(S1) s ≤ s, para todo s ∈ A;
(S2′) para cada ǫ > 0, existe s = sǫ ∈ A (sǫ significa que s pode
depender de ǫ) tal que s− ǫ < sǫ.
(2) i = inf A quando i satisfaz as duas seguintes condic¸o˜es:
(I1) i ≤ s, para todo s ∈ A;
(I2′) para cada ǫ > 0, existe s = sǫ ∈ A tal que s < i + ǫ.
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Os Nu´meros Reais - parte II
NA 2
Prova: Segue direto da Definic¸a˜o 2.4.
Exerc´ıcios 2.1 1. Sejam a, b elementos de R. Mostre que |ab| = |a||b|.
2. Mostre que, para todo a ∈ R, √a2 = |a|.
3. Se a, b ∈ R, mostre que |a− b| ≤ |a|+ |b|.
4. Sejam a1, a2, . . . , an ∈ R. Mostre, por meio do princ´ıpio de induc¸a˜o
matema´tica que, para todo n ∈ N vale |a1+ · · ·+ an| ≤ |a1|+ · · ·+ |an|.
5. Moatre que, para todos a, b ∈ R,
max{a, b} = a+ b+ |a− b|
2
e min{a, b} = a+ b− |a− b|
2
.
Sugesta˜o: Utilize as definic¸o˜es para os dois casos poss´ıveis, a ≤ b e
a ≥ b, em cada afirmac¸a˜o.
6. Mostre que, se a, b sa˜o nu´meros reais positivos e a2 < b2 enta˜o a < b.
Sugesta˜o: Use a2 − b2 = (a− b)(a + b).
7. Se x, y, ǫ ∈ R, ǫ > 0, |x − a| < ǫ e |x − b| < ǫ, mostre (usando a
Desigualdade Triangular) que x+ y ∈ V2ǫ(a+ b).
8. Deˆ exemplo de um subconjunto de R que:
(i) na˜o tem cota superior;
(ii) na˜o tem cota inferior;
(iii) na˜o tem cota superior e nem cota inferior.
9. Use a propriedade Arquimediana para mostrar que
inf{1/n : n ∈ N} = 0;
10. Mostre que as seguintes afirmac¸o˜es sa˜o equivalentes:
(a) N e´ um conjunto na˜o limitado superiormente;
(b) inf{1/n : n ∈ N} = 0;
(c) Se x ≥ 0, y > 0 sa˜o nu´meros reais enta˜o existe n ∈ N tal que
ny > x.
Sugesta˜o: Mostre que (a)⇒ (b)⇒ (c)⇒ (a). Entenda que isto permite
obter todas as implicac¸o˜es, pela transitividade de ⇒.
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Ana´lise
Real
Os Nu´meros Reais - parte II
11. Seja S um subconjunto na˜o-vazio e limitado de R.
(a) Sejam a > 0 e aS = {as : s ∈ S}. Mostre que
inf(aS) = a inf S e sup(aS) = a supS;
(b) Sejam b < 0 e bS = {bs : s ∈ S}. Mostre que
inf(bS) = b supS e sup(bS) = b inf S.
12. Mostre que, se r, s ∈ Q e r < s enta˜o r < (r + s)/2 < r.
Sug.: A` hipo´tese r < s adicione s, depois adicione r e compare as
expresso˜es encontradas.
13. Dado x ∈ R mostre que existe um u´nico n ∈ Z tal que n− 1 ≤ x < n.
14. Seja x e´ um real positivo. Mostre que existe n ∈ N tal que 1/2n < x.
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