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O professor de língua portuguesa

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Dados Internacionais de Catalogacdo na Fublicagdo (CIp)(Cirnara Brasileira do Livro, Si Brasilj
Lfngua portugnesa em debate : conhecimento e ensino / Jos6 carlos de Azeredo (otganizador).
- 
Petr6polis, RJ : Vozes,2000.
Vdrios autores.
ISBN 85.326.2411_l
l Portugu€s 2. Portugu6s 
- 
Estudo e ensino I. Azeredo, Jos6 Carros de,
inclices para catdlogo sistemdtico:
l. Portugu€s : Estudo e ensino 469.07
00-37 t7
cDD-469.07
O PROFESSOR DE LfNGUA PORTUGUESA:
MODOS DE E,NSINAR E Dts, APRE(E)NDER.
Maria Teresct GortEah,es Pereira ( UERJ )
O tema 6 paradoxalmente 6rido e f6rtil: a sua aridez decorre do desgaste que a
sociedade inflige ao professor com a superexposiEio, geralmente negativa, em todos
os setores; a fertilidade vem da perseveranEa que os mestres realmente apaixonados
pelo que fazem, conferem d sua atividade, nlo se desmotivando nunca, abertos d
renovag6o, sempre prontos a considerar possibilidades que facilitem e/ou aperfeigoem
seu oficio. Dedicamos este artigo a Olmar Guterres da Silveira, grande professor, que
faleceu recentemente. Tivemos o raro privil6gio de ser sua aluna durante quatro anos.
Fica, pois, registrada, nossa sincera homenagem ao querido mestre que tantas liq6es
de vida nos proporcionou.
Nlo abordaremos aqui contefidos, porque jii sao exaustivamente contemplados,
mas a postura, segundo nossa concepEdo, do professor de Lingua Porluguesa. De como
o percebemos. Da sua represer.rtaElo.
Nlo h6 uln"no. drivida de que o ensino e a aprendizagem da Lingua Portuguesa
s6o considerados dificeis e enfadonhos. Ndo se trata de dourar a p(lula, dizer que
h6 f6rmulas infaliveis de se chegar ao aluno, com aprovaE6o e receptivid4dq 1ais,
que nos esperarlo nas salas, ansiosos, motivados e prontos para aulas magnificas
e inesqueciveis.
Por uma s6rie de circunstAncias, ndo existe esse contexto, pelo menos em termos
tlo otimistas, infelizmente, para todos n6s, professores de Lingua Portuguesa.
Quando falamos a respeito de ensino, nlo o fazemos com distanciamento. Somos(sempre seremos), por efetiva prdtica, professora de Educagdo Infantil (antigo
Primdrio), Fundamental e M6dio, durante anos (aposentando-nos no Municipio com
tempo integral, dando aulas), estando atualmente no Ensino Superior com docOncia e
pesquisa.
Ent6o, antes de qualquer outra titulaE1o, somos professora com muito orgulho,
sem ficarmos pedindo desculpas pela desvalorizagdo porque nosvalorizamos,valori-
zamos nosso trabalho, ndo somos envergonhada.
Voltando d questdo central, qual deve ser realmente o perfil do professor de Lfngua
Portuguesa?
Primeiramente conscientizar-se de que professor de Lingua Portuguesa nd.o 6 s6
ser professor de Gram6tica. E s"r polivalente. Por tal, entenda-se, relacionar-se bem
com Leitura, Literatura, Filologia, Filosofia, Antropologia, Sociologia, Hist6ria,
O professor de lingua llortuguesa...
Geografia porque efetivamente uma lingua viva se funda em tudo isso,6 tlertontinador
conuoit,6fator cle uniclatle, polariza, congrega, irtstign, enfirn, 6 agerzte cle culfitra.
O professor de Lirrgua Portuguesa deve estar infolmado das exposig6es, filrnes,
peqas teatrais, "shows" de sua cidade, ler jornal e revista, ver televis6.o, estar "por
dentro" do que acontece pelas diferentes formas em que se apresenta a tal Lingr-ra
Fortuguesa de que ele 6 o mais qualificado relaE6es piiblicas. Diriamos at6 que precisa
ser multimidia, guardando as devidas proporE6es, se nio ttos atemorizf.ssemos tanto
com o sentido estratosf6rico e folcl6rico desse termo.
Quaptos de n6s jd nlo passararn pela experiOncia, principalmente no ensino
fundamental, do colega de outra disciplina, quando indagado de algo pelo aluno,
encaminhd,lo ao professor de Portuguas, como Se este soubesse de tudo.
Ali6s, acr-editamos que a explicaEdo melhor pafa tal atitude 6 a de que ningu6m
rcaliza com mais propriedade a shiese do que o professor de Lingua Poftugttesa,
tamb\mprofessor de tuna disciplitxa estltante devida,forga, detentor do c6digo capaZ
de decifrar enigmas, desvel.ando segredos, trazendo o novo, ao nlesnlo lentpo que
resgato o passado, administrando semelhangas e diferenEas-
O leitor certamente deve pensar como encontrard tempo para isso tudo, al6m de
ser formado em Letras, Jomalismo, Filosofia etc. Ndo 6 "bem assim". Costumamos
ter entusiasnto, ndo delirio. Basta que o professol- de Lir-rgua Porluguesa esteja
medianamente informado, atento ao que sucede ao Seu redor, na sua cidade, no Seu
pais, no mundo. Habituar-se a fazer leituras sinceras e constantes dele mesmo e da
vida, inserir-se no contexto. Enfim, nlo se alienar.
Ndo pode ser bitolado por regras e exceEdes, protegido pela redoma da Grarndtica
(e a Gram6tica 6 uma conveniente redoma) porque, convenhamos, 6 extremamente
c6moclo "ficar ilhado". Resolve mil problemas, ou melhor, n5.o cria problemas. Seu
aluno deve encontrar nele um apoio, um motivador, um reverberador, um impul-
sionaclor. A Lingua Portuguesa estd presente em tudo: dentro e fora da instituigao
escolar. Ela 6 o c6digo maior de comunicaqdo, o mais fdcil, o mais d m6o. H6 de ser
enriquecida diuturnamente.
Voltando para a Gram 6tica, para n6o dizer que nlo falei de flores (gramaticais ou
verbais), torna-se claro que o professor de Lingua Portuguesa precisa ensinar
gramdtica. Ent6o, acaba o encanto da globalizaE6o lingiiistica? Respondemos que nao,
porque o professor nao se limitard a reproduzir "gramatiquices", regras e exceE6es,
loni"itos pussados como verdades absolutas, nomenclaturas isentas de criticas, s6ries
de exercicios mon6tonos e repetitivos.
A gram6tica 
- 
com todo o seu fundamento 
- 
faz-se necessdria porque reflete a
estrutuia do sistema lingi-iistico, revelando a tradigio da lingua no que ela tem de
verdadeiro, universal e eterno.
A figura do professor que, entao, transrnitir6 a tal gramdtica 6 essencial, nio
acess6rii, as luzei concentrando-se nele, brilhando sempre intensamente, lembrando
um farol no meio da escuriddo.
244 245
A4aria Teresa C. Pereira
Antes de mais nada, nao seri um acomodado, abrindo a Grarndtica e ler.rdo
conceitos ou Lrsando o livro diddtico como muleta e n5o complemento. Nao poderd
clregar e dizer: "Hoje vamos aprender Sujeito e Predicado. Sujeito 6... Predicado 6..."
Nao poderd fazer semindr-ios infinddveis sobre assulrtos te6ricos, dividindo-os para o
aluno apresentar (decorar) e "despejar" para a turma que coutinuard sem nada
entender. Ndo poderd esconder-se atrfs (dentro) da Glamdtica, repetindo ad infinitr.un
o qlle ali estd escrito e tdo-somente aquilo, nlo deixando espaEo para que o aluno
lespire, reflita e exponha suas contradiE6es e dfrvidas, impedindo-o de manifestar-se.
Deve dialogar coln ele ila lingua e sobre a lingua, interagindo lingiiisticamente-
Deve ser critico e fazer com que seus alunos (corn as adequaEoes cornpativeis ao
r.rivel) exergam o sentido da critica, conhecendo teorias diversas, sem medo de ser
avanEado (ousado) demais ou tradicional (antigo, ultrapassado), lernbrando-se de qr-re
como usudrio da lingua (pala comunicar-se simplesrnente ot f azer uso de sua funE6o
expressiva, est6tica), ele tem direitos e deveres, nlo sendo indiferente, alheio, neutro.
Muito menos temer alguma pel'gunta embaraEosa que nlo possa fesponder correta e
imed iatamente.
Precisa comprometer-se com a causa e nlo eximir-se da responsabilidade com
frases tio conhecidas como: "Eu sozinho n6o posso fazer nada", "6 o sistema o
culpado". Entlo, lembramo-nos pela primeira vez de JoSo Cabral de Melo Neto em
Tecendo a Manhd quando os galos se unem.
N6o vamos aqui, pelo pouco espaEo disponivel, falar de texto, interpretaEdo e
produE6o, livro diddtico e paradidiitico, lfngua coloquial x lingua culta, cultura popular
- 
assuntos que fazem parle da Lingua Portuguesa. Pensamos que, sem dfvida, a
Gramiitica 6 uma preocupaEdo maior quando se fala em ensino; por isso optamos por
destacf-la.
Dd muito trabalho ser bom e eficiente professor de Lingua Portuguesa. Tftulos,
cursos, leituras, eventos, ajudam 
- 
e muito. Entretanto, o mais importante 6 o
entusiasmo,a paixdo (gostamos dessa palavra) por aquilo que se faz, acreditar que_rsg
6 capaz. pelo menos, de mudar aquela turma.-as pessoas que estdo ali, naquele
momento, em algumas horas, em um semestre, em um ano, porque naquele breve
tempo poderd, al6m de ensinar. "despeftar" o desejo por mais, "instigar" a procura do
conhecimento, ser responsdvel pelo aparecimento de pessoas especiais.
Sempre dizemos que professor ndo 6 profissio que se tema tanto perder. Se for
um fardo grande, h6 um concurso do Banco do Brasil, uma ocupaqdo no com6rcio que
rende mais, financeiramente falando. Para ficar e ser bem-sucedido, gratificado e
vencedor 
- 
sem se afogar num mar de queixumes pela vida, acumulando fracassos e
insatisfag6es 
- 
ndo 6 dificil nem impossivel, mas h6 de se levar em conta determinadas
condiE6es porque o assunto 6 extremamente s6rio. Tratamos do sentimento de nacio-
nalidade, realizagIo pessoal e profissional, temas relativos ao estar no mundo, ao que
fazer e para que fazer, que nos par-ecem fundamentais, de nenhuma forrna sup6r{1uos
ou postergdveis.
Ser professor de lfngua 6 um privil6gio pelo poder de abarcar o mundo, nlo s6
usando as v6rias linguagens, mas escolhendo-as, dominando-as e deixando-se en-
24(:
O professor de lingua llortuguesa...
volver por elas po[que visceralmente as conhece. Somos verdadeiraurente amantes
apenas quando podemos dizer que o objeto amado 6 por n6s conhecido na intimidade,
nao s6 fisicamente, mas rla mente e tto coraEao.
Gostariamos de deixar claro que nossas palavras 
- 
reproduqlo exata daquilo ern
que acreditamos e procuramos vivenciar no dia-a-dia 
- 
dirigem-se a qualquer profes-
sor de Lingua Portuguesa, da Educaqao Infantil ao Curso Superior. Considerando as
diferengas de n(vel, as quest6es de fundo, essenciais, slo as mesmas.
Nlo se trata de utopia. Pode e deve ser realidade. Assitn como qualquer verdadeir-o
amor, este tambdm carece de cuidados constantes. Caetano Veloso na mfsica Sozinho
jd diz "quando a gente gosta, a gente cuida, nio 6 s6 da boca para fora". Assim, ser
v6rios em um, revitalizando postutas e situaq6es. E nlo (des)cuidar-se.
Para n6s, assim deve ser o professor de Lingua Portuguesa: nio limitado ou
escravo de livros ou teorias, mas antenado ) vida, comprometido tanto com a ttadiElo
quanto com a modernidade, evoluindo sem temer o novo, fiel ) sua con scilncia sempre
e preocupado em dar efazer o melhor.
Acreditamos que uma atitude coerente e s6bia do professor 6 manter seus canais
aberlos, consciente de que tamb6m aprende com o aluno porque se h6 troca, hd
aprendizado de ambas as paltes. N6o conhecemos nada tlo politicamente incorreto e
antigo quanto a id6ia do conhecido ntagister dixit, detentor da verdade absoluta.
Hd necessidade de atitudes responsdveis por pafte do professor de Lfngua Por-
tuguesa. Mais do que a pedagogia correta, a did6tica eficaz,estratlgias e metodologias
adequadas, conhecimento dos conteridos a serem ministrados 
- 
sendo tudo isso,
evidentemente, de extrema impoftAnci a 
- 
6 a 6tica que nos deve nortear em qualquer
situaEdo, mantendo-nos dignos e altivos em nosso oficio de ensinar a lingua materna-
Concordamos com Fernando Pessoa quando escreve:
"A cultura 6 um fen6meno pelo qual estamos ligados ao passado pela
intelig€ncia; 6, em outras palavras, a tradiqio intelectual. Na palavra falada
temos que ser, em absoluto, do nosso tempo e lugar; nao podemos falar como
Vieira, pois nos arriscamos ou ao ridiculo ou d incompreensio. Ndo podemos
pensar como Descartes, pois nos arriscamos ao t6dio alheio. A palavra
escrita, ao contrdrio, nlo 6 para quem a ouve, busca quem a ouEa; escolhe
quem a entenda, e ndo se subordina a quem a escolhe".
Parafinalizar, terminamos com a palavra da poesih e a palavra da mf sica, ambas
tdo significativas e expressivas. 56 desejamos que atinjam diretamente o alvo.
Lembramos, pela segunda vez, de Joio Cabral de Melo Neto, tamb6m recente-
mente falecido, mas tao vivo atrav6s de sua obra. Atentem para a vida fazendo-se na
nlo-vida.
247
Maria Teresa C. Pcleira O professor de lingua portuguesa..
Vou ficar
Ficar com certezt maluco beleza
Eu vou ficar
E esse espago caminho que eu mesmo escolhi
E tao fdcil seguir'
Por ndo ter oncle ir
Contlolando a minha maluquez
Mistulada com a minha lucidez
Vou ficar
Ficar com certeza maluco beleza
Eu vou ficar
Em Mahtco belez.a, Raul Seixas coloca a"ltcidez" e a "maluquez" lado a lado.
Gostariamos de dizer que na vida pessoal e profissional parece-nos extremamente
sauddvel que assim seja. Lucidez 6 o racioltal, maluquez 6 a ousadia. As duas sao
indispens6veis e nlo excludentes.
E, que professor de Lingua Porluguesa seja o que efetivamente todos escolheram
seguir, e nao porque nlo tivessem onde ir, parafraseando, air.rda, um de nossos grandes
porlugueses, Jos6 R6gio, em CArttico Negro.
Bibliografila
MELLO NETO, Jolo Cabral . Poesias contpletas. Rio de Janeiro: Livraria Jos6
Olympio Editora, 3" ed", L9'19.
PESSOA, Fernando. A lingua portLtguesa. Sdo Paulo: Cia. das Letras, 1999.
REGIO, Ios6. Poemas de Deus e do Diabo. Lisboa: Portug6lia, 1969.
O Poentct
Atintaealipis
escrevem-se todos
os vetsos do mundo.
Que monstlos existem
nadando no poEo
negro e fecundo?
Que outros deslizam
largando o carvio
de seus ossos'?
Como o ser vivo
que 6 um verso,
um organismo
com sangue e sopro,
pode brotar
de germes mortos?
O papel nem sempre
6 branco como
a primeira manhd.
E muitas vezes
o triste e pobre
papel de embrulho;
6 de outras vezes
de carta a6rea,
leve de nuvem.
Mas 6 no papel,
no branco assdptico,
que o verso rebenta.
Como um ser vivo
pode brotar
de um chio mineral'/
A poesia neo se explica, sente-se. Jodo Cabral dizia que ndo tinha que ser emotiva,
mas provocar emoElo em quem a lesse.
Maluco beleza
Enquanto vocd se esforEa para ser um sujeito normal
E fazer tudo igual
Eu do meu lado aprendendo a ser louco
IJm maluco total
Na loucura real
Controlando a minha maluquez
Misturada com a minha lucidez
248 249

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