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CEDERJ - CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR A DISTÂNCIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO MATERIAL DIDÁTICO IMPRESSO CURSO: Administração DISCIPLINA: Gestão Financeira CONTEUDISTAS: Fabrícia de Farias da Silva e Kátia de Almeida AULA 02 O Modelo Dinâmico (Parte 2) METAS DA AULA: Apresentar as variáveis do modelo dinâmico de gestão financeira de empresas; Mostrar como as variáveis do modelo podem ser interpretadas; Apresentar a análise de tendência do modelo; Apresentar o indicador de liquidez do modelo dinâmico. OBJETIVOS: Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de: Descrever as variáveis do modelo dinâmico; Interpretar o resultado de cada variável; Interpretar o indicador de liquidez do modelo. INTRODUÇÃO Na última aula, aprendemos que A partir da experiência francesa em gestão financeira de empresas, Michael Fleuriet, juntamente com Ricardo Kehdy e Georges Blanc, desenvolveu e adaptou, à realidade brasileira, o Modelo Dinâmico de Gestão Financeira de Empresas, também conhecido como Modelo Fleuriet, de cujo trabalho resultou a obra A Dinâmica Financeira das Empresas Brasileiras- um novo método de análise, orçamento e planejamento financeiro, publicada em 1978. Vimos, também, que para uma melhor compreensão do novo modelo de análise financeira, as contas do ativo e passivo devem ser consideradas em relação à realidade dinâmica das empresas, onde as contas relacionam-se ao tempo, que lhes confere estado de permanente movimentação. Isso quer dizer que é preciso reclassificar as demonstrações financeiras para um modelo funcional, cuja preocupação básica consiste em relacionar as diversas contas não somente pela dimensão temporal, como também pelo relacionamento dessas com a atividade operacional. Desse modo, FLEURIET, KEHDY e BLANC (2003) classificam como contas cíclicas aquelas que mantêm relação direta com o exercício da atividade operacional da empresa, na medida em que se renovam periodicamente, de acordo com o ritmo dos negócios. Como contas permanentes ou não-cíclicas, aquelas que não variam em função do ritmo dos negócios da empresa, sendo o longo prazo o denominador comum de todas essas contas, ou seja, são as contas de natureza estratégica. Já as contas erráticas são aquelas de curto e curtíssimo prazo, que não guardam relação direta com o processo produtivo, mas sim com decisões tipicamente financeiras (tesouraria). Diante desta reclassificação é possível mensurar as principais variáveis do modelo dinâmico do balanço patrimonial, que são: a necessidade de capital de giro (NCG), o capital de giro (CDG) e o saldo de tesouraria (T), as quais se constituem nas variáveis-chave para a gestão financeira das empresas, e que vamos estudar na presente aula. O quadro 1, mostra como podem ser encontradas cada uma das variáveis mencionadas. QUADRO 1 – Variáveis do Modelo Dinâmico Fonte: Adaptado a partir de Amaral, 2006 AS VARIÁVEIS DO MODELO DINÂMICO Necessidade de Capital de Giro (NCG) Como vimos no quadro 1, a Necessidade de Capital de Giro se define pela expressão: NCG = ativo cíclico - passivo cíclico Em que o ativo cíclico é a soma das contas cíclicas do ativo e o passivo cíclico a soma das contas cíclicas do passivo. Vamos entender melhor. Quando, no ciclo financeiro, as saídas de caixa ocorrem antes das entradas de caixa, a operação da empresa cria uma necessidade de aplicação permanente de fundos (para manter a atividade operacional), isso se evidencia no balanço pela diferença positiva entre o valor das contas cíclicas do ativo e das contas cíclicas do passivo. Pode-se dizer que o conceito de NCG é considerado pelos autores em finanças como a chave para a análise da situação e gestão financeira das empresas, uma vez que envolve, praticamente, toda a estrutura operacional da empresa. Os autores Fleuriet, Kehdy e Blanc, destacam as seguintes observações para melhor entendimento do conceito da referida variável: 1. A NCG é diferente do Capital Circulante Líquido (CCL). Como você deve lembrar o CCL = ativo circulante - passivo circulante. Percebe-se, então que a diferença está no fato de que o ativo e passivo cíclicos constituem apenas uma parte do ativo e passivo circulantes. 2. É um conceito de ordem econômico-financeira e não uma definição legal. Refere-se ao saldo de contas cíclicas ligadas às operações da empresa. 3. É uma variável sensível às modificações que ocorrem no ambiente econômico em que a empresa atua, dependendo da natureza e do nível de atividades empreendido. A natureza dos negócios da empresa determina seu ciclo financeiro, enquanto o nível de atividade é função das vendas. Dessa forma, pode-se dizer que a NCG é uma variável que guarda proporcionalidade ao ciclo financeiro e ao volume de vendas praticado. 4. As contas cíclicas do ativo e passivo que constituem a NCG são contas ligadas ao às operações da empresa. 5. A variável pode ser negativa. Neste caso, no ciclo financeiro, as saídas de caixa ocorrem depois das entradas de caixa. É o caso do ciclo financeiro negativo. 6. No caso de interrupção das operações, a NCG, que representava uma aplicação de fundos, passará a constituir uma fonte de fundos que poderá, por exemplo, ser utilizada pela empresa para pagamento a credores e acionistas. Vimos, então que a variável pode assumir valores positivos e negativos, além disso, pode, ainda ter valor igual a zero. Sendo assim, as situações básicas que ocorrem numa empresa, com relação à NCG podem ser assim explicadas: a) NCG positiva: ocorre quando o ativo cíclico (ou aplicações de capital de giro) é maior do que o passivo cíclico (ou fontes de capital de giro). Neste caso, a empresa apresenta uma demanda de recursos para o giro dos negócios, o que poderá ser financiado com recursos próprios e/ou recursos de terceiros de curto e de longo prazos. b) NCG negativa: ocorre quando o ativo cíclico é menor do que o passivo cíclico. Neste caso a empresa não apresenta demanda de recursos para o giro dos negócios mas, pelo contrário, dispõe de fontes para financiar outras aplicações, em conformidade às políticas de sua Administração. c) NCG nula: ocorre quando o ativo cíclico é igual ao passivo cíclico. Neste caso a empresa não tem necessidade de financiamento para o giro dos negócios, financiando-o apenas com contas cíclicas. A Necessidade de Capital de Giro, quando positiva, reflete uma aplicação permanente de fundos, que, normalmente deve ser financiada com os fundos permanentes utilizados pela empresa, esses fundos permanentes correspondem às contas não cíclicas do passivo, e serão vistas com mais detalhe no próximo tópico. Capital de Giro (CDG) Podemos definir Capital de Giro (CDG) a diferença entre as contas não cíclicas do passivo e as contas não cíclicas do ativo: CDG = passivo permanente - ativo permanente A maior parte dos fundos permanentes destinam-se ao financiamento das aplicações permanentes enquanto apenas uma parte é utilizada para o financiamento da necessidade de capital de giro, isso para manter o equilíbrio financeiro. Os autores Fleuriet, Kehdy e Blanc (2003) evidenciam que algumas informações adicionais são importantes para esclarecer melhor o conceito de capital de giro: 1. O capital de giro possui o mesmo valor que o capital circulante líquido (CCL), sendo apenas o cálculo realizado de maneira diferente. Isso porque, na definição clássica, o capital circulante líquido representa uma aplicação de fundos, enquanto que, na definição apresentada, o capital de giro representa uma fonte de fundos. 2. Da mesma forma que a variável anterior, o CDG é um conceito econômico-financeiro e não uma definição legal, representando uma fonte de fundos permanente utilizada para financiar a necessidade de capital de giro da empresa. 3. O capital degiro apresenta-se razoavelmente estável ao longo do tempo. Diminui quando da realização de novos investimentos em bens do ativo permanente (aumento do ativo permanente) e aumenta por autofinanciamento, empréstimos a longo prazo e aumentos de capital em dinheiro (aumento do passivo permanente). 4. O capital de giro pode ser negativo. Neste caso o ativo permanente é maior que o passivo permanente, significando que a empresa financia parte de seu ativo permanente com fundos de curto prazo. Embora esta condição aumente o risco de insolvência, a empresa poderá se desenvolver, desde que sua necessidade de capital de giro seja, também, negativa. Importante Empresas que conseguem prever com maior grau de certeza as suas entradas de caixa podem trabalhar com baixa liquidez ou até mesmo com liquidez negativa. Um exemplo dessa situação é o setor de energia elétrica, em que os clientes precisam pagar a conta no prazo estipulado para que o fornecimento de energia não seja cortado por falta de pagamento. Isso faz com que as entradas de caixa sejam altamente previsíveis, o que gera um fluxo de caixa adequado, mesmo com liquidez negativa. Com relação ao seu valor, podemos destacar que as situações básicas que ocorrem numa empresa, com relação ao CDG podem ser: a) CDG positivo: neste caso as fontes permanentes superam as aplicações permanentes, indicando a utilização de recursos estáveis (de longo prazo) no financiamento da NCG, ou seja, o CDG representa uma fonte de fundos permanentes para financiar as operações da empresa. b) CDG negativo: ocorre quando as aplicações permanentes superam as fontes permanentes, evidenciando, assim, a utilização de recursos de curto prazo no financiamento de ativos de pouca liquidez (de longo prazo). Neste caso o CDG se transforma em aplicação de fundos, ou seja, ativos permanentes estão sendo financiados por recursos de curto prazo, o que pode acarretar problemas de insolvência. c) CDG nulo: ocorre quando as aplicações permanentes se igualam às fontes permanentes, indicando que os recursos de curto prazo estão financiando as flutuações da NCG. Percebemos, então, a relação entre as variáveis CDG e NCG, o que também ocorre com a variável Saldo de Tesouraria, como você verá a seguir. Saldo de Tesouraria (T) O saldo de tesouraria resulta da diferença entre as tesourarias ativa (ativo errático) e passiva (passivo errático), identificadas no balanço funcional. Lembrando que as contas erráticas são as contas circulantes que não estão diretamente ligadas à operação da empresa e que os valores se alteram de forma aleatória, ou seja, trata-se de uma variável decorrente de decisões financeiras. T = ativo errático - passivo errático Podemos dizer ainda, que o Saldo de Tesouraria representa um valor residual correspondente à diferença entre o Capital de Giro e a Necessidade de Capital de Giro: T = CDG - NCG Representa, então, a diferença, num dado momento, entre os recursos empregados para financiar a atividade da empresa e as necessidades geradas por esta atividade. Com relação a esta variável, as seguintes situações podem ser encontradas: a) Saldo de Tesouraria positivo: ocorre quando o ativo errático é superior ao passivo errático. Neste caso a empresa dispõe de fundos de curto prazo, que poderão, por exemplo, ser aplicados em títulos de liquidez imediata. Indica que recursos de longo prazo (próprios ou de terceiros) dão cobertura às necessidades de recursos para o giro dos negócios e ainda permitem aplicações no mercado financeiro ou simplesmente a sua manutenção em caixa. Pode evidenciar ainda uma situação financeira folgada, em função das aplicações em ativos financeiros. Cabe ressaltar, entretanto, que a existência de um saldo de tesouraria positivo e elevado nem sempre é bom para a empresa, pois pode significar também o fato da empresa não estar aproveitando adequadamente as oportunidades de investimento proporcionadas por sua estrutura financeira. Neste caso o saldo de tesouraria “engorda” por falta de uma estratégia dinâmica de investimentos. b) Saldo de Tesouraria negativo: ocorre quando o ativo errático é menor do que o passivo errático. Neste caso a empresa tem fontes de recursos de curto prazo financiando suas atividades, o que revela a insuficiência de recursos de longo prazo (próprios ou de terceiros) e a tomada de empréstimos de curto prazo para cobrir a NCG, evidenciando uma situação de risco de insolvência mais elevado. Dentro desta perspectiva, é importante que a gestão financeira da empresa acompanhe a evolução do saldo de tesouraria, a fim de evitar que permaneça constantemente negativo e crescente. Quando a necessidade de capital de giro cresce mais que proporcionalmente às fontes de capital de giro, tem-se a ocorrência do chamado efeito tesoura (desequilíbrio financeiro), que veremos ainda nesta aula. TIPOS DE ESTRUTURA DO BALANÇO Tendo em vista as três variáveis apresentadas, podemos perceber que as aplicações operacionais são financiadas, a cada momento, por uma composição de fontes de longo prazo do capital de giro e de fontes de curto prazo do saldo de tesouraria , dependendo da situação financeira da empresa. O ciclo econômico e a rentabilidade das empresas conferem a seus balanços um aspecto particular que permite enquadrá-los em uma das seguintes estruturas, conforme Fleuriet, Kehdy e Blanc (2003): a) CDG positivo, NCG positiva e T negativo. Neste caso a empresa apresenta insuficiência de fundos de longo prazo para o financiamento de suas necessidades de capital de giro, utilizando-se, assim, de créditos de curto prazo (Tde Tesouraria que uma importante função da gestão financeira de uma empresa é acompanhar a evolução da variável para evitar que permaneça constantemente negativo e crescente. Isso porque a maioria das empresas que operam com Saldo de Tesouraria crescente negativo apresenta estrutura financeira inadequada e com dependência excessiva de empréstimos a curto prazo, que poderá levá-las à insolvência. Por meio da verificação da evolução do saldo de tesouraria (T) em relação à necessidade de capital de giro (NCG) e do cálculo do indicador ao longo do tempo, podemos realizar uma análise de tendência. Quando ocorre uma piora significativa e persistente da NCG, em decorrência do crescimento relativo do saldo de tesouraria (T) como uma fonte de recursos (Tassim, de créditos de curto prazo, o que se evidência pela relação T/NCG (termômetro de liquidez). Tal estrutura revela que a empresa encontrava-se em desequilíbrio financeiro, apesar de possuir capital de giro (CDG) positivo. Já no ano de 2003, a empresa consegue resultados positivos, passando para um perfil satisfatório de sua situação financeira. Este tipo de estrutura revela uma posição financeira sólida, uma vez que a empresa dispõe de um saldo de tesouraria positivo que lhe permite enfrentar aumentos temporários da necessidade de capital de giro, ou seja, o capital de giro é suficiente para bancar as necessidades de capital de giro e ainda proporcionar aplicações em ativos financeiros, proporcionando, assim, relativa liquidez à empresa. RESUMO A análise financeira dinâmica considera o equilíbrio financeiro baseado nos ciclos financeiros e nas necessidades de recursos e aplicações nesses ciclos de decisão. Recorre, para isso, às variáveis características do modelo dinâmico de gestão financeira de empresas, ou Modelo Fleuriet, que são: necessidade de capital de giro (NCG), capital de giro (CDG) e saldo de tesouraria (T). Por meio desta aula pudemos perceber como é aplicado o modelo dinâmico, suas variáveis (NCG, CDG e T), as análises que podem ser feitas por meio delas. O comportamento das variáveis pode enquadrar as empresas em determinado perfil de estrutura, podendo indicar tendências da situação financeira da empresa. Cabe ao administrador financeiro analisar essas tendências e não deixar que os distúrbios aconteçam. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA: AMARAL, Hudson Fernandes. Notas de aula. Belo Horizonte, 2006. ASSAF NETO, Alexandre; SILVA, César Augusto Tibúrcio. Administração do Capital de Giro. 3ª Edição. São Paulo: Atlas, 2010. FLEURIET, Michel; KEHDY, Ricardo; BLANC, Georges. O Modelo Fleuriet: a dinâmica financeira das empresas brasileiras. 7ª Edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003.