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CRIMINOLOGIA 3. TEORIAS MACROSSOCIOLÓGICAS DA CRIMINALIDADE 3.3 Teoria da Anomia É considerada uma teoria do consenso. Anomia é uma palavra que tem origem etimológica no grego (a – ausência; nomos – lei) e que significa sem lei, conotando também a ideia de iniquidade, injustiça e desordem. A motivação para a delinquência decorreria da impossibilidade de o indivíduo atingir metas desejadas por ele. EX: Haiti e o controle da ordem pública pela ONU. Pensamento de Durkheim Dentro das teorias mais sociológicas, o princípio do bem e do mal foi posto em dúvida pela teoria estrutural-funcionalista da anomia e da criminalidade. Seu precursor foi Émile Durkheim. Segundo o pensamento de Émile Durkheim é a anomia a ausência ou desintegração das normas sociais. Diante disso, tem-se 3 ideias sobre o assunto: a) a existência da transgressão da norma por quem pratica crimes; b) a existência de um conflito claro de normas, que torna difícil a adequação do indivíduo aos padrões sociais; c) a existência de contestação sobre a não existência de normas que vinculem pessoas ao um contexto social. Há a crise de valores, acarretando a ausência de normas sociais de referência que acarreta uma ruptura dos padrões sociais de conduta, produzindo uma situação de pouca coesão social (SHECAIRA, 2012, p. 189). Continuando no pensamento de Durkheim, o conceito de anomia requer o entendimento da ideia do coletivo ou do comum. “Nas sociedades arcaicas, em que há maior solidariedade, denominada por Durkheim de ‘solidariedade mecânica’, a consciência coletiva abrange a maior parte das consciências individuais” (SHECAIRA, 2012, p. 190). Pode-se dizer que nessa sociedade, não havia a ideia de indivíduo, porque a coletividade pensava e agia de forma coletiva, para o coletivo. Na visão de Durkheim, existia a “solidariedade orgânica”, que era oriunda de uma sociedade individualista, até por conta das diferentes profissões e posições sociais exercidas pelas pessoas. Alessandro Baratta, citado por Sérgio Salomão Shecaira, determina a síntese do pensamento de Durkheim, afirmando que: “Solidariedade orgânica ligada a sociedade mais diferenciadas e solidariedade mecânica relacionada às sociedades primitivas, tem-se que haverá anomia, compreendida como ausência ou desintegração das normas sociais, sempre que os mecanismos institucionais reguladores do bom gerenciamento da sociedade não estiverem cumprindo seu papel funcional. Vale dizer, as crises decorrem, muitas vezes, do fenômeno da anomia. O crime, por sua vez, é um fenômeno normal de toda estrutura social. Só deixa de sê-lo, tornando-se preocupante, quando são ultrapassados determinados limites, quando o fenômeno do desvio passa a ser negativo para a existência e o desenvolvimento da estrutura social, seguindo-se um estado de desorganização, no qual todo o sistema de regras de conduta perde valor, enquanto um novo sistema ainda não se firmou (esta é a definição de anomia). Ao contrário dos pensadores com perfil biologicista do crime, dentro de seus limites funcionais, o comportamento desviantes é um fator necessário e útil para o equilíbrio e o desenvolvimento sociocultural” (BARATTA, 1999, p. 59- 60) Assim, quando se criam na sociedade espaços anômicos, ou seja, quando um indivíduo ou um grupo perde as referências normativas que orientavam a sua vida, então enfraquece a solidariedade social, destruindo-se o equilíbrio entre as necessidades e os meios para sua satisfação. O indivíduo sente-se livre de vínculos sociais, tendo um comportamento antissocial ou inclusive autodestrutivo (SABADELL, 2005, p. 82). Pensamento de Robert Merton Robert King Merton quem melhor desenvolveu a ideia de anomia. Este afirmava que todo contexto sociocultural desenvolvem-se metas culturais. Estas expressam os valores que orientam a vida dos indivíduos em sociedade. Com isso, pergunta-se: Como atingir tais metas? Segundo Merton, cada sociedade estabelece recursos para que tais metas sejam atingidas. Alguns recursos são institucionalizados, ou seja, são meios considerados corretos de obtenção de tais metas e outros são, aos olhos daquela sociedade, incorretos (ilegítimos). A utilização dos recursos ilegítimos é que violam as regras sociais e que é base do presente estudo. Assim, no conceito de anomia de Merton, tem-se um conflito de dois pontos: metas culturais (ex: riqueza, sucesso, status profissional, american dream) contra meios institucionalizados. Merton criou um esquema onde explica os meios de adaptação dos indivíduos, que chamou de modos de adaptação individual, e que são cinco: a) conformidade; b) ritualismo; c) retraimento; d) inovação e e) rebelião. Conformidade: é chamado de comportamento modal. O indivíduo aceita os meios sociais institucionais para alcançar as metas culturais. Ele adere totalmente ao comportamento aceito e esperado pela sociedade e não apresenta comportamento desviante. Os demais comportamentos são não modais ou desviantes e sinalizam a ocorrência de anomia. Este comportamento é o mais comum e que garante a estabilidade da própria sociedade. Ritualista: aqui o indivíduo vê com descaso o atendimento das metas socialmente dominantes. Por um motivo ou outro, a pessoa acredita que nunca atingirá as metas culturais, e mesmo assim continua respeitando as regras sociais, mas agindo como uma espécie de ritual. Ex: tímido funcionário público (barnabé). Retraimento (evasão): ao contrário do ritualista que renuncia aos objetivos sociais, mas adere às normas, no retraimento a pessoa renuncia a ambos. Nesse contexto, encontram-se os párias, proscritos, errantes, mendigos, bêbados crônicos e os viciados em drogas. É um comportamento anômico. Inovação: Aqui, o agente aceita as metas culturais, mas não os meios institucionalizados. Quando o indivíduo verifica que não estão acessíveis a ele todos os meios institucionais, ele rompe com o sistema e passa ao desvio para atingir as metas culturais. O criminoso corta caminho para conseguir a ascensão social. É a delinqüência dita. Rebelião: consiste na rejeição das metas e dos meios dominantes. Tal conduta é marcada pelo inconformismo e pela revolta. Há proposições de novas metas e a institucionalização de outros meios para atingi-las. Portanto, segundo Merton, toda vez que a sociedade acentuar a importância de determinadas metas, sem oferecer à maioria das pessoas a possibilidade de atingi-las, por meios legítimos, estar-se-á diante de uma situação de anomia. (SHECAIRA, 2012, p. 199). Assim, os autores funcionalistas já tratados vêem o delito como um fenômeno normal da sociedade e não necessariamente ruim. É normal porque se encontra em todo o agrupamento humano até a formação da sociedade. Não necessariamente ruim, porque através de um crime, poder-se-ia ajudar a sociedade a consagrar sua identidade, revoltando-se com os fatos delituosos ou até tomando medidas diversas. EX: plano cruzado. Para Schecaira (2012, p. 200): “Assim, o criminoso pode desenvolver um útil papel para a sociedade, seja quando contribui para o progresso social, criando impulsos para a mudança das regras sociais, seja quando os seus atos oferecem a ocasião de afirmar a validade destas regras, mobilizando a sociedade em torno dos valores coletivos. Por outro lado, a teoria da anomia também tem o mérito de desmistificar a conduta delituosa como uma anormalidade. As figuras de criminosos com características fisionômicas distintas, com comportamentos estranhos etc., são superadas pela constatação de que os criminosos são iguais a nós mesmo, apenas querendo inovar nos caminhos para atingirem sucesso pessoal”. O sistema se torna funcional uma vez que a criminalidade faz surgir um comércio em diferentes áreas. Essa teoria é aplicávelao Brasil. Quando se fala em falta de oportunidades, principalmente os de cunho social têm-se o aumento da mendicância (retraimento), como também o aumento de crimes de tráfico de entorpecentes (inovação). Ainda, encontram-se outras atividades revolucionárias, como os punks, anarquistas. 3.4 Teoria da Subcultura Delinquente Essa teoria foi fundada nas ideias de Albert Cohen (sociólogo norte-americano), através de sua obra “Delinquent Boys” (1955). O conceito sobre a subcultura delinquente não é exclusivo da área criminal, mas também da antropologia e sociologia. Assim, segundo Lola Aniyar de Castro cultura é “um conjunto de símbolos, de significados, de crenças, de atitudes e de valores, que têm como característica o fato de serem compartilhados, de serem transmissíveis e de serem apreendidos. Quando esta cultura penetra na personalidade, o faz através de um processo que se denomina processo de socialização”. Então, poder-se-ia afirma que subcultura é uma cultura dentro de outra cultura mais abrangente. Mas também se tem a contracultura. Há diferenças entre elas? As duas expressões surgiram do processo de atos conflitantes dos jovens desvirtuados em relação à sociedade tradicional adulta. As subculturas aceitam, em parte, os valores da sociedade tradicional, mas expressam as suas opiniões, sentimentos exclusivos de tais grupos. As contraculturas são totalmente adversas aos conceitos e valores da sociedade tradicional. “Um meio de distinguir entre as duas formas de cultura da juventude é notar que os grupos subculturais se retiram da sociedade convencional, enquanto os grupos contraculturais são contestadores e confrontadores. Entre os exemplos de grupos subculturais incluem-se alguns delinquentes juvenis, as gangues de periferia, grupos anarcopunks, skinheads, os chamados hooligans etc. Outro grupo subcultural que merece destaque são os metaleiros, também conhecidos como headbangers ou metalheads, no entanto esses termos são considerados pejorativos para os integrantes desse grupo cujo principal gênero apreciado é o heavy metal” (SHECAIRA, 2012, p. 214). Um exemplo de contracultura são os hippies e os beatniks. Conforme já analisado anteriormente, há um conflito considerável entre as metas que a sociedade estabelece aos seus integrantes e os meios institucionalizados de obtê-los. Por tal razão, dá para considerar que as subculturas criminais também nasceram desse conflito, como uma forma de protesto das classes minoritárias fortemente desprovidas de recursos institucionalizados em atingirem tais metas. Segundo Sérgio Salomão Shecaira: “A subcultura delinquente, por sua vez, pode ser resumida como um comportamento de transgressão que é determinado por um subsistema de conhecimento, crenças e atitudes que possibilitam, permitem ou determinam formas particulares de comportamento transgressor em situações específicas” (2012, p. 219). Quando se falava em gangues, o conceito estava intimamente ligado à delinqüência juvenil. A revolta de determinados grupos contra os padrões institucionalizados pela sociedade tradicional trazia, em grande parte, atos de vandalismo. Os jovens só seriam levados à sério pelos adultos quando montassem grupos para fazer atos inapropriados socialmente, ou seja, atos de vandalismo, crimes e outras ações desvirtuosas. O exemplo mais claro disso é o bullying. “O bullying entre crianças e adolescentes engloba uma ampla variedade de comportamentos, todos eles negativos, que se reiteram no tempo, como consequência de um real e identificado desequilíbrio de poder, em que as crianças mais fortes do grupo se valem dessa diferença etária para dominar os mais fracos. Alguns atos são conhecidos: colocar apelidos, fazer brincadeiras violentas, esperar as crianças menores na saída da escola para intimidação etc” (SHECAIRA, 2012, p. 220). Todas essas atitudes podem gerar vários danos, como abrir as portas para a criminalidade (vítimas). A perda de autoestima, a humilhação e o temor de continuar a ser aterrorizado faz com que esses adolescentes se associem a grupos de proteção, que compensarão com atos violentos, vindo até a se formar em grupos de repressão (gangues). Se o adolescente não se sentir acolhido dentro da sociedade tradicional, tentará “chamar a atenção” e muitas vezes a escolha será ficar a margem da sociedade, contra esta, através de atos violentos ou desviantes. Para Cohen, a subcultura delinquente se caracteriza por 3 fatores: não utilitarismo da ação, malícia da conduta e seu negativismo. Em relação ao não utilitarismo da ação, é de conhecimento notório que a pessoa que pratica um determinado crime, pratica por alguma razão justificável. Pode ser que tal justificativa não se amolde nos casos de exclusão da ilicitude ou da culpabilidade, mas ninguém pratica crime sem uma razão lógica. No caso dos crimes praticados por gangues juvenis, muito deles são praticados sem razão fundada, ou seja, só para contrariar o sistema tradicional. Há quem diga que tais grupos furtam ou roubam por prazer; prazer de serem perseguidos pelo sistema e não se amoldar a ele. Veja que tal conduta é uma forma de se afirmar no grupo. Os atos mais difíceis, ou os crimes mais complexos, uma vez praticados, faz com que nasça a admiração dos demais e aumenta o poder daquele “benfeitor”, ou seja, dá status. Os atos são meramente reprodução do pouco caso que fazem para as normas vigentes. Já no caso da malícia, esta é inerente as condutas perniciosas praticadas pelo delinquente juvenil. É o prazer de causar desconforto alheio. Para completar, as atitudes desse grupo estão cobertas de negatividade. Segundo Shecaira: “Muitos adolescentes transgridem as normas não para burlar a lei, não na esperança de escapar das conseqüências de seus atos, mas, ao contrário, para excitá-la para que a repressão corra atrás deles e assim os reconheça como pares dos adultos, ou melhor, como as partes escuras e esquecidas dos adultos” (2012, p. 223). Na visão de Cohen, o delito não está relacionado com o conceito de desorganização social da Escola de Chicago. Aliás, segundo seus estudos, a delinqüência estava marcada em bairros onde havia uma inversão dos valores sociais da época, mas de forma organizada. “Assim, o delito deixa de ser uma conseqüência do ‘contágio social’ proveniente de uma ‘desorganização social’ em face das chamadas perdas de raízes decorrentes da imigração ou migração (como sustentavam as teorias ecológicas). É para estes pensadores, expressão de um sistema normativo próprio, característico da subcultura, cujos valores diferem dos majoritários em forma deliberadamente contraposta” (SHECAIRA, 2012, p. 224). Ainda, para Cohen, a sanção a estas ações não deveriam ser criminais, e sim sociais. O combate a essa criminalidade não pode ser através dos mecanismos normais de repressão ao crime. Primeiro porque a ideia principal dessa prática delituosa é o desprezo ou descontentamento com a ordem social e se for reprimir, só piorará a situação. A saída é fazer com que essas pessoas sejam envolvidas no mercado de trabalho e com acesso à sociedade produtiva. E em outra ponta, o Poder Público deverá, através de delegacias especializadas, desenvolver medidas contentoras das ações mais graves. No Brasil, a maioria desses atos de protestos está relacionada a vandalismo em propriedade pública e privada. As pichações tomam conta das grandes cidades e em momentos diferentes, possuem sanções diferentes também. Pichação do Cristo Redentor por 2 adolescentes de São Paulo, em 17/01/1991. Manifestações punks, que se iniciaram no fim da década de 1970, nos EUA. Só que o punk deve ser considerado também como um movimento cultural, sendo a sua principal filosofia a seguinte ideia: “se você não está contente com o sistema, faça-você-mesmo!”.Nas periferias de grandes cidades, onde as pessoas possuem nível econômico baixo, é fácil encontrar grupos com aversão a sociedade capitalista, como por exemplo, os Carecas do ABC, skinheads, punks, neonazistas, anarquistas, metaleiros. Esse grupo é organizado na questão de seus costumes e roupas, por exemplo, mas não tão organizado em relação a expressão de suas ideias. Agora, não é somente em nível social baixo que se encontra esse tipo de grupo. Na classe média, média-alta também poderá ser observado esse tipo de grupo. Três casos notórios no Brasil: a) Trotes universitários; b) Brigas de gangues de jiu-jítsu e; c) O caso do índio Galdino, como também os ataques as empregas domésticas em ponto de ônibus, por achar que eram prostitutas, ou até contras essas mesmas, só pelo fato de serem prostitutas. Há a subcultura carcerária, uma vez que a pessoa que ali se encontra recolhida, não possui outra opção a não ser entender o sistema interno e se adaptar a ele, com suas gírias, normas e costumes.
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