Logo Passei Direto
Buscar
Material
páginas com resultados encontrados.
páginas com resultados encontrados.

Prévia do material em texto

Processo penal 
e direitos fundamentais 
,, 
Tenho a impressão de que as ga-
rantias clássicas do processo pe-
nal e da Constituição são atual-
mente ameaçadas de modo massivo. 
São ameaçadas por uma evolução que 
atinge os países ocidentais e talvez 
todo o mundo. As palavras-chave são 
modernização e globalização. Penso 
que estas evoluções intluenciam ne-
gativamente o Direito Penal desde há 
algum tempo sem que a ciência o tenha 
registrado de forma muito precisa. 
A Europa evolui lentamente no 
sentido de ameaça às garantias do 
processo penal. Observo que existem 
tendências para a centralização, para 
a minimização de garantias, para im-
por interesses europeus, interesses de 
Bruxelas, em prejuízo das tradições 
nacionais. Alguns penalistas europeus 
criticam isso há anos. Refiro-me so-
bretudo aos gregos. 
Em recente congresso em Dresden, 
Alemanha, discutimos as evoluções 
européias. Os temas foram especial-
mente o corpus júris para a proteção 
de interesses económicos da união Eu-
ropéia, um projeto legislativo ampla, 
mente restritivo, e o chamado man• 
dato de detenção europeu. Eu vejo 
nessas evoluções um alerta para a so-
brevivência das garantias do processo 
penal em toda a Europa. 
Já não tem sentido querer alterar 
ou travar a Constituição européia. Esse 
trem está em marcha, e os penalistas não 
podem modificar isso. O que eles podem 
fazer é, entabular wna comunicação ao 
nível europeu, wna comunicação de ci-
ência jurídico-penal coqi intuito políti-
co-criminal. Esse movimento já come-
çou, embora talvez não seja ainda muito 
visível em Portugal. Ele tev~ inicio em 
muitos países da Europa continental. 
Com base nessas observações, de-
senvolverei o tema "processo penal e 
direitos fundamentais" em três fases. 
Na primeira, tentarei expor~ tradição 
dos direitos fundamentais no processo 
penal. Buscarei essa fonte no iluminis-
mo europeu e falarei, de forma muito 
breve e muito simples, sobre o papel 
da liberdade, da segurança, dos direi-
tos humanos e do Estado. Darei um 
panorama da realidade jurídica alemã 
no Direito Penal material e no proces-
so penal. Na segunda, defenderei a tese 
de que essa evolução tem uma tendên-
cia clara que consiste na mi11imização 
de garantias. Indicarei quatro exem-
plos disso e tentarei também explicar 
o que está por detrás dessa evolução. 
Numa terceira fase, questionarei o que 
podem hoje fazer ossimpáticos e 
positivos, mas a verdade é que ela alcan-
ça esses fins positivos por meio da aflição 
intencional de um mal: a pena. Mesmo 
que as idéias filantrópicas se tomassem 
r~alidade e se dissesse _ muitas pessoas 
dizem-no - que não são precisas mais 
penas, que basta comprovar a culpa para 
se tomar claro que a norma foi infrin-
gida, isso bastaria para constituir uma 
agressão à honra do visado. 
A Constituição alemã reage a esse 
papel do Estado e a esse papel do Di-
reito Penal, na medida em que acen-
tua e assegura especialmente aqueles 
direitos fundamentais relacionando 
com o Direito Penal. Vemos suceder 
isso com a regra nula poena sine lege, 
que está concentrada no Direito Penal, 
com as garantias no caso de privação da 
liberdade e com a proibição da pena de 
morte. A lei fundamental corresponde 
assim a este diagnóstico, a esta situação, 
pois ela toma especialmente a sério os 
problemas do Direito Penal. 
A evolução do Direito Panal a do 
processo panal na Alemanha 
Essa evolução caracteriza-se por 
uma diminuição das garantias, por 
uma ampliação do Direito Penal e por 
um aumento do poder do Estado. Na 
Alemanha, nós discutimos duas ex-
pressões emblemáticas para explicar 
as razões dessa evolução. A primeira é 
a erosão normativa, ou seja, erosão de 
normas sociais; a segunda é a socieda-
de do risco. Sobre ambas as expressões, 
t na J\]emanha um número inter-
rninável de pesquisas, tanto no domí-
iio do Direito Penal como no da So-
:iologia do Direito. No que diz respeito 
1 erosão de normas, a tese é a seguinte: 
IS normas sociais, as normas da vida 
ie todos os dias, que são normas não 
~scritas, estão expostas à erosão, isto é, 
:lesaparecem, perdem eficácia. O que 
é evidente, o 51ue não tem de se funda-
mentar, o que vale por si mesmo, o que 
é tradição, o que é informal, tudo isso é 
perecível. Esse fenômeno tem a ver tal -
vez com evoluções sociais a longo pra-
zo, contribuindo grandemente para ele 
na Alemanha o narcisismo - desapare-
cimento do social; redução do homem 
à sua individualidade - e as migrações. 
Significa que as normas sociais tradi-
cionais da Alemanha são contraria-
das ou substituídas por outras normas 
sociais, o que quer dizer que elas não 
cooperam. mas neutralizam-se mutu-
amente. O que vos apresento são teo-
rias que não pretendo discutir aqui. A 
erosão de normas tem como efeito um 
enfraquecimento da orientação nor-
mativa. As normas sociais orientam. 
são úteis, dito de forma metafórica, es-
tabelecem aquilo em que se pode con-
fiar, que se pode reclamar e por isso a 
sua erosão causa desorientação, perda 
de segurança normativa. 
A segunda expressão é a socieda-
de do risco. Ela foi introduzida na 
discussão alemã especialmente pelo 
sociólogo Ulrich Beck. Penso que ela 
é adequada para fornecer uma expli-
cação para a desorientação normati-
va. A tese é a seguinte: a população 
das sociedades ocidentais encontra-
se perante grande riscos, como sejam, 
graves abusos, destruição do ambiente 
ao nível internacional, riscos monetá-
rios, colapso económico, criminalida-
de organizada, corrupção, terrorismo. 
Os grandes riscos caracterizam-se por 
não serem domináveis, por serem de-
vastadores quando se realizam, por 
serem vagos, opacos, enfim, por não 
serem tangíveis, pois são mais uma 
sombra que um objeto. Considera a 
teoria que nesta situação aumentam o 
medo do risco da população e as suas 
necessidades de controle. Perante a 
ameaça do risco, a população carece de 
orientação, de tranqüilidade normati-
va, por isso reage em pânico, sente-se 
encostada à parede e, em conseqüên-
cia, aumentam as suas necessidades 
de controle e os seus instrumentos de 
repressão. Segundo essa definição, as 
sociedades do risco tendem para uma 
agravação dos meios repressivos e para 
uma antecipação do controle. 
As normas sociais, 
as normas da vida de 
todos os dias, que são 
as normas niio escritas, 
estão expostas à erosão, 
isto é, desaparecem, 
perdem eficácia 
São duas propostas de explicação 
profunda que apresentei por meio de 
fatos. Fatos que consistem em agra-
vações no Direito Penal material, .em 
agravações no Direito Processual Pe-
nal e em alterações no papel do Esta-
do. As reformas do Direito Penal mate-
rial têm-se concentrado sobretudo em 
agravações. São criados novos tipos pe-
nais nos âmbitos do Direito económi-
co, do Direito patrimonial, do Direito 
da droga, do terrorismo, que tem a par-
ticularidade de restringir amplamente 
o espaço de ação do cidadão. Proce-
de-se à criminalização antecipada, à 
criminalização na fase prévia à lesão 
de um bem jurídico, por exemplo, no 
branqueamento de capitais. Verificam-
se o aumento e a agravação de antigas 
molduras penais, sobretudo no campo 
da criminalidade da droga. Os crimes 
de perigo abstrato são a forma normal 
do Direito Penal moderno, em que pre-
cisamente não existe uma lesão do bem 
jurídico, nem este tem de ser concreta-
mente posto em perigo, mas basta que 
se verifique uma ação abstratamente 
perigosa. A burla, por exemplo, que é 
um crime clássico de resultado, exige a 
realização de um engano, de um erro, 
de wna disposição patrimonial e de wn 
prejuízo patrimonial. A burla para a 
obtenção de subvenções, que constitui 
uma forma moderna da burla, requer 
apenas uma ação de enganar, tratan-
do-se por isso de um crime de perigo 
abstrato. Há vantagens para a persegui-
ção penal, pois não há muito a provar. 
Não tem de se provar a existência de 
erro, de disposição patrimonial ou de 
prejuízo patrimonial, bastando a prova 
da ação de enganar. 
No entanto, as possibilidades de de-
fesa são minimizadas nesta espécie de 
crimes. 1:. lógico que assim seja, pois o 
argüido só se pode defender contra a 
censura de uma ação perigosa. TQdo o 
mais não é pressuposto da punição. Por 
fim, existem bens jurídicos ao mesmo 
tempo abstratos e universais, como a 
capacidade funcional no instituto das 
subvenções, a saúde pública no Direito 
Penal da droga, nos quais o Estado não 
pode ser controlado pelo bem jurídico. A 
saúde pública é de todos e de cada um, a 
ameaça ao instituto das subvenções pode 
ser de todos e de cada um. 
No que diz respeito ao Direito 
Processual Penal, a tendência é seme-
lhante. As reformas do processo pe-
nal concentram-se nas últimas déca-
das somente na fase de investigação, 
isto é, naquela parte do processo em 
que se trata de instrumentos de con-
trole. Refiro-me por exemplo à ob-
servação policial, à busca por meio 
Dei Aey Jurídica 73 
de cruzamento de dados pessoais, às 
' escutas telefónicas, às escutas secretas 
em habitações, às informações de ser-
viços secretos para a polícia, aos agen-
tes infiltrados, que são os modernos 
instrumentos de investigação do pro-
cesso penal alemão nos últimos anos. 
Surgem aqui dois problemas. Primei-
ro, esses instrumentos de averiguação 
têm de ser secretos, pois, se o visado 
-nota que está sendo investigado, não 
funcionam. São diferentes dos instru-
mentos processuais penais clássicos 
das buscas, do confisco, do exame em 
hospital psiquiátrico, da prisão pre-
ventiva. Isso significa que temos um 
novo elemento, o elemento latência. E, 
segundo a tradição do processo penal, 
isso conduz a um novo problema. De-
signamos classicamente este problema 
como nem~ tenetur se ipsum acusare, o 
que quer dizer qu~1o visado atua dian-
Ie do controle: ele pode comportar-se 
perante o controle de forma estratégi-
ca, pessoal. Todavia, se os instrumen-
tos são secretos. não pode, porque ele 
não sab~ que está sob observação. Eu 
não quero criticar esta solução, mas 
apenas precisar que se trata de algo 
que modifica intensamente a tradição 
clássica do processo penal. 
Em segundo lugar, esses instru-
mentos atingem necessariamente 
terceiras pessoas. Agentes infiltra-
dos, escutas telefónicas, cruzamento 
de dados, observação policial afetam 
não só os suspeitos, mas também o 
seu círculo de relações. O legislador 
alemão ampliou isso ainda mais na 
medida em que incluiu os chamados 
acompanhantes.Também não quero 
criticar isso, mas tão-somente mostrar 
que existe um problema com o proces-
so penal clássico. Nos ordenamentos 
jurídicos europeus, o visado presume-
se inocente na fase de investigação. No 
entanto, ele tem de tolerar os encargos 
próprios desta fase, como a prisão pre-
ventiva ou a observação policial, com 
74 Dei Aey Jurídica 
base num fundamento jurídico: a sus-
peita. Esta funciona como equivalente 
funcional da culpa antes da condena-
ção do argüido, o que a torna conceito 
muito importante. Ora, e é isto que eu 
quero dizer:· esses instrumentos mo-
dernos de investigação atingem igual-
mente pessoas que não são suspeitas. 
A doutrina processual-penal não pode 
deixar de analisar esse aspecto. 
Faço uma terceira observação para 
dizer que o papel do Estado e o papel 
dos direitos fundamentais sofreram 
uma alteração. O Estado já não é o Le-
viatã. Esta política jurídica não foi feita 
contra a população, mas antes com um 
grande consenso da população. O Esta -
do deixa de ser o Leviatã para se tornar 
um parceiro no combate geral contra 
riscos e contra a criminalidade. Os di-
reitos fundamentais, por sua vez, já não 
são direitos de defesa contra o Estado. 
De um certo modo, eles deixaram de 
cumprir esta função. Os direitos funda-
mentais tendem a constituir um obstá-
culo numa luta eficaz do Estado contra 
a criminalidade, 'e um aspecto impor-
tante na dogmática jurídico-constitu-
cional alemã é a invenção de um direito 
fundamental à segurança. Insensee de 
Bona escreveu sobre o tema em 1983, 
e eu espero que possam ver que um di-
reito fundamental à segurança é algo 
semelhante a uma bomba. 
Se se concorda que a segurança é 
produzida tipicamente por meio da 
limitação de direitos•fundamentais, 
como a liberdade, o património ou a 
honra, então a produção de segurança 
representa normalmente restrição de 
direitos fundamentais. Resulta daqui 
que um direito fundamental à seguran -
ça se enquadra dogmaticamente muito 
bem nessa evolução, mas não é menos 
certo que ele contraria sobretudo a tra-
dição do Direito Constitucional. 
Nesse contexto, o Direito Penal não 
é uma ameaça, mas um módulo auxi-
liar. Não é ultima ratio ou mesmo sola 
ratio. Existe uma crença difundida de 
que o Direito Penal é um instrumento 
idóneo para o domínio de grandes ris-
cos, embora pertença à tradição deste 
ramo do Direito duvidar sempre dessa 
idoneidade. E verifica-se a supremacia 
de um novo paradigma: o paradigma 
da prevenção. Tudo é prevenção. Pen-
so também que a Europa agravará esse 
problema, não a ciência jurídico-penal 
européia, entenda-se, mas Bruxelas, a 
União Européia. Tenho a impressão de 
que a União Européia não tem nenhu-
ma sensibilidade formada acerca dos 
riscos do Direito Penal. 
Questionarei, a concluir, se existem 
limites à restrição de direitos funda-
mentais. Penso que sim, que existem, 
mas são extremamente problemáticos. 
Em primeiro lugar, quando falo de limi-
tes, não estou a pensar em limites que 
se podem traçar como um engenheiro 
traça uma linha. No âmbito jurídico, os 
limites nunca são linhas, mas antes re-
forço de argumentos. Não se pode dizer 
em nenhum ramo do Direito, mesmo 
no caso da proibição da analogia ou no 
caso do principio da culpa, que se trata 
de limites, mas somente que eu dispo-
nho de argumentos para tentar limitar 
determinadas evoluções. Assim, quando 
falo de limites, falo de argumentos ou, 
dito com mais rigor, falo de argumen-
tos que apóiam determinadas evoluções 
e criticam outras. Tenho neste ponto 
uma mensagem a que dou especial va-
lor, que é a de que esses limites do Di-
reito Penal, esses limites à restrição de 
direitos fundamentais, podem emanar 
de duas fontes nas culturas ocidentais. 
Essas fontes ainda não estão reunidas 
na Alemanha, mas isso é uma tarefa 
cientifica. Uma delas é a tradição jurí-
dico-penal, sobretudo dos séculos XVIII 
e XIX e da primeira metade do século 
XX, a qual consistiu sempre numa limi-
tação das intervenções do Estado por 
intermédio do Direito Penal. Ne bis in 
idem, proibição da analogia, prindpio 
r 
da legalidade do Direito Penal, são to-
dos pr~s~upostºs para o fortalecimento 
da pos1çao do cidad· E é di ã . A ao. ssa a tra ç o 
antiga. par dela, existe ente nós uma 
nova tradi - , çao que e a Constituição. A 
parte dos di • . reitos fundamentais não é 
::s que uma restrição das possibili-
. es de intervenção nas liberdades do 
cidadã T d . o. o aV1a, na Alemanha, ambas 
correm em separado. Os penalistas não 
têm ª menor idéia da Constituição, e os 
constitucionalistas têm uma atitude de 
total indiferença perante o Direito Pe-
nal, com algumas exceções. 
Afirmei que as duas tradições ainda 
não estão reunidas. Explicarei em bre-
ves palavras o que quero dizer. A tradi-
ção da filosofia do Direito e do Direito 
Penal traça um limite que nós desig-
namos da tortura e da punição de um 
inocente, por exemplo, e pertence a este 
domínio da posição jurídica indisponí-
vel. Indisponível significa que mesmo 
em momentos de necessidade não pode 
haver aqui intervenção. Por exemplo, 
não é permitido torturar. Temos trava-
do essa discussão na Alemanha desde 
que há meio ano um jovem matou uma 
criança. A polícia pensou que a criança 
ainda estava viva, deteve o jovem e disse 
que lhe faria mal se não indicasse onde 
estava a criança. O detido relatou que o 
tinham ameaçado de que o violariam e 
começou uma discussão entre nós em 
torno da questão de saber por que ra-
zão não se pode fazer mal a esse sujeito 
para salvar a vida de uma criança. Há 
décadas que eu previa que esta discus-
são havia de acontecer. Havia de ocor-
rer um caso em que se dissesse que é 
absurdo não torturar alguém quando 
se tem de ajudar a vítima. 
A discussão não chegou ao fim, mas 
decorreu de forma relativamente sim-
plificada até agora. Continua a haver 
uma maioria que diz não, que mesmo 
que exista realmente uma situação de 
necessidade não devemos torturar e, 
em caso de punição do inocente, deve-
mos recordar o argumento de Caifás da 
história bíblica do sofrimento de Cris-
to: é preferível condenar um inocente 
do que levar todo um povo à rebelião. 
Também isso, penso eu, é indisponível. 
No âmbito do Direito Constitucional, 
a questão é vista de modo diverso, mas 
trata-se no fundo da mesma coisa. Na 
lei fundamental alemã temos duas si-
tuações de indisponibilidade, uma das 
quais é que nada deve ferir o conteúdo 
essencial de um direito fundamental. 
Pode-se restringir direitos fundamen-
tais, mas nunca se pode atingir o seu 
núcleo essencial. A segunda situação 
consiste em que nós temos uma ga-
Havia de ocorrer 11111 caso 
cm ,,ue se dissesse ,,ue 
é absurdo não torturar 
alguém ,111mulo se tem de 
ajudar a vítima. 
rantia de perpetuidade (art. 79, n. 3). 
Uma Constituição que atente contra a . 
dignidade da pessoa humana não deve 
existir, independentemente de qual seja 
a maioria e de qual seja a situação. 
Como podem ver, são limites va-
gos, de conceitos vagos e imprecisos, 
dos quais nada se pode deduzir. Creio, 
no entanto, que se pode argumentar 
vigorosamente com eles. Por último, 
e,tiste ainda uma outra via pela qual os 
pe'nalistas minimizam talvez a pressão 
sobre o Direito Penal e a pressão sobre 
os direitos fundamentais. Na Alemanha, 
a história da critica a um Direito Penal 
demasiado forte foi sempre a mesma: 
a história de queixa, de lamentação, de 
que isso atentava contra os direitos fun-
damentais, contra a Constituição, mas 
apesar de tudo passava. Penso que esta 
fase tem de chegar ao fim, que tem de se 
continuar a reclamar, e os tribunais têm 
de continuar a trabalhar na proteção dos 
direitos fundamentais, mas talvez exis-
tam outras possibilidades, mesmo ou-
tras tarefas dos penalistas, isto é, talvez 
haja equivalentes funcionais ao Direito 
Penal. Os penalistas ainda não os encon-
traram porque não os procuraram, não 
tiveram suficiente fantasia, mas com um 
pouco de imaginação vão encontrá-los. 
Por exemplo, nós tínhamos grandes 
problemas com o furtode automóveis 
BMW, de Mercedes, que eram depois 
exportados para a Jordânia, a Albânia, 
e havia Máfias que os introduziam na 
Polónia. Podiam ser feitas duas coisas: 
uma era a realização de escutas, inves-
tigação dissimulada, portanto, e a outra 
era a utilização de um dispositivo de blo-
queio de automóveis. 
Há seis ou sete anos a questão foi 
tecnicamente resolvida e os veícu-
los passaram a ter um tal dispositi-
vo. Não foi preciso recorrer a meios 
de investigação dissimulada, e existe 
hoje nenhuma - ou quase nenhuma 
- criminalidade de automóveis, H.í 
também a discussão sobre assaltos a 
bancos: passou-se a utilizar vidro de 
segurança e desde então os assaltos a 
bancos diminuíram. Ou ainda a pro-
dução de produtos perigosos, como o 
sangue contaminado com o vírus da 
Aids na França, o óleo colza na Es-
panha, ou o produto de proteção de 
madeira na Alemanha. Pode-se pen-
sar num sistema de penas completa-
mente louco, podem-se aumentar os 
seus limites, mas pode-se também fa-
zer as coisas de outra maneira. 
Dei Rey Jurldica 75 
.' I 
~~,~;r!fi~~r~~~~~tili1;;:3~:~~7z~-~::-:~~I~ 
·..- .. \ •.: ~- -· ~-.. : __ ... i ·~ ·:"'·•: - ·-~ . :_ __ :_· -.. r...;.. . . . :t"~ 
~---=- -~ 
{"type":"Document","isBackSide":false,"languages":["pt-br"],"usedOnDeviceOCR":true}
{"type":"Document","isBackSide":false,"languages":["pt-br"],"usedOnDeviceOCR":true}
{"type":"Document","isBackSide":false,"languages":["pt-br"],"usedOnDeviceOCR":true}
{"type":"Document","isBackSide":false,"languages":["pt-br"],"usedOnDeviceOCR":true}
{"type":"Document","isBackSide":false,"languages":["pt-br"],"usedOnDeviceOCR":true}

Mais conteúdos dessa disciplina