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TEMA 2 - LIBRAS 
 ESTUDO DA LÍNGUA DE SINAIS: LINGUÍSTICA 
 Sócio-interacionismo: uma ferramenta de análise para compreender o processo de 
 comunicação na surdez 
 A surdez é o objeto de estudo de muitos pesquisadores. As dificuldades oriundas 
 dessa limitação têm despertado o interesse de várias linhas de pesquisa. 
 Para a grande maioria dos pesquisadores dessa área, o problema mais significativo, 
 para a pessoa surda, está na aquisição da linguagem. Pelo fato de, em geral, ela se 
 dar de forma tardia, acarreta problemas psicológicos, sociais e cognitivos: o que 
 significa dizer que a linguagem, então, possui uma função muito mais abrangente do 
 que simplesmente a de comunicar. 
 Vygotsky e Bakhtin fazem um estudo da linguagem a partir da ótica social e sobre a 
 influência do meio social no desenvolvimento cognitivo do indivíduo, que é a 
 chamada psicologia sociointeracionista. 
 Consciência e ideologia: uma questão de linguagem? 
 Contrariando o subjetivismo idealista, que parte do ato da fala como criação 
 individual, e o objetivismo-abstrato, que parte das regras gramaticais determinadas 
 pela sociedade e não pelo indivíduo, portanto ele não pode modificá-la, apenas 
 utilizá-la, Bakhtin objeta seus estudos sobre aquisição da linguagem nas relações 
 interpessoais e no meio social no qual a pessoa participa. 
 “A consciência humana não só nada pode explicar, mas, ao contrário, deve ela 
 própria ser explicada a partir do meio ideológico e social”. 
 (BAKHTIN apud GOLDFELD,1990 p. 46) 
 Para Bakhtin, há uma relação inseparável entre o psiquismo (individual) e ideologia 
 (social). A ideologia é responsável pela construção da consciência individual. O 
 indivíduo, ao atuar na sociedade, o faz com suas marcas individuais que, por sua 
 vez, se originaram no meio social. Essas relações sociais constituem o indivíduo 
 que se utiliza da linguagem e dos signos para comunicar-se tanto no diálogo exterior 
 quanto no interior (pensamento). Nesse sentido, o meio social passa a existir a partir 
 da consciência individual que, por sua vez, existe a partir do social. 
 Sendo assim, a língua não só é determinada pelo meio social e pelo momento 
 histórico, como reflete as características sócio-históricas da comunidade que a 
 utiliza. Ou seja, a maneira de falar, o valor atribuído às palavras e toda a 
 subjetividade são determinados pelo momento sócio-histórico em que o indivíduo se 
 desenvolve. 
 Os signos são os mediadores da internalização da relação ideológica-psíquica, uma 
 vez que o homem internaliza o símbolo, o semiótico, a linguagem. 
 “Os signos só emergem decididamente, do processo de interação entre uma 
 consciência individual e outra. E a própria consciência individual está repleta de 
 signos. A consciência só se torna consciência quando se impregna de conteúdo 
 ideológico (semiótico) e, consequentemente, somente no processo de interação 
 verbal.” 
 (BAKHTIN apud GOLDFELD, 1990, p.49) 
 Então, como ocorre o desenvolvimento da consciência nos surdos que não 
 têm acesso à língua de sua comunidade? Para Bakhtin, os signos não se 
 restringem única e exclusivamente à fala oral. Todo e qualquer meio pode servir 
 como meio de utilização dos signos. O problema, então, não está no indivíduo que 
 não ouve ou em seus ouvidos que não captam o som. O problema está no meio 
 social em que o indivíduo está inserido. 
 Num passado não muito distante, o surdo foi proibido de utilizar sua língua natural e, 
 consequentemente, de viver sua própria cultura. Hoje, os surdos não são proibidos 
 legalmente de se comunicar através de sinais, mas muitos surdos não têm acesso a 
 um grupo social que utilize essa língua, permanecendo à margem da sociedade. 
 O processo de aquisição da língua portuguesa, para um surdo, é muito lento e não 
 se dá de forma natural, enquanto a Libras é adquirida de forma natural e 
 espontânea e com ela todas as características culturais de sua comunidade. 
 Pensamento e linguagem: bases para a comunicação 
 Vygotsky desenvolveu suas pesquisas entre os anos de 1926 a 1936. Os estudos 
 sobre a relação entre pensamento e linguagem existentes em sua época 
 consideravam pensamento e linguagem uma mesma função, ou o seu extremo, 
 totalmente independentes. 
 Ele propôs que o estudo da relação entre essas funções seja feito a partir de sua 
 unidade comum, pois assim há a conservação de todas as propriedades do todo, 
 não havendo o risco de dividir sua estrutura a ponto de perder a noção do seu real 
 funcionamento, evitando que se tenha uma visão reducionista dessas funções e 
 suas relações. 
 A unidade pertencente ao pensamento e a linguagem, segundo Vygotsky, está no 
 significado da palavra. É nele que o pensamento e a linguagem se unem dando 
 origem ao pensamento linguístico. Nesse sentido, a linguagem não tem apenas a 
 função de comunicar, mas também de constituir o pensamento. Com isso, pode-se 
 concluir que o processo de aquisição da linguagem para Vygotsky é o mesmo de 
 Bakhtin, do meio social para o indivíduo. 
 Segundo Vygotsky, “[...] o pensamento não é simplesmente expresso em palavras, é 
 por meio delas que ele passa a existir.” (VYGOTSKY apud GOLDFELD, 1990, p. 
 53). Isso significa dizer que o meio social em que o indivíduo está inserido 
 desempenha um papel importante e é nesse meio que se deve focar nossa análise 
 nos casos em que há atrasos de linguagem. 
 A criança surda que apresenta problemas de comunicação e cognição deve ser 
 analisada pelo meio social que está inserida, pois é ele que não está lhe oferecendo 
 condições de adquirir uma língua natural. 
 “A natureza do próprio desenvolvimento se transforma do biológico para o 
 sócio-histórico. O pensamento verbal não é uma forma de comportamento natural e 
 inato e tem propriedades e leis específicas.” 
 (VYGOTSKY apud GOLDFELD, 1990, p. 54) 
 Para Vygotsky, existem duas linhas de constituição do pensamento, a primeira 
 é natural, biológica; e a segunda é sócio-histórica , mas é a segunda, a 
 sócio-histórica, que exerce maior influência no desenvolvimento do pensamento. Em 
 outras palavras, a linguagem utilizada no meio social modela a maior parte do 
 pensamento, o que explica por que os surdos que não tiveram acesso a uma língua 
 natural desenvolvem um tipo de pensamento mais concreto e possuem dificuldade 
 em internalizar conceitos mais abstratos: um quadro difícil de ser revertido quando 
 já se está na adolescência ou na fase adulta. Daí a necessidade de introduzir, o 
 mais cedo possível, um ambiente que se utilize LIBRAS, assim, o surdo não estará 
 apenas aprendendo a nomear objetos, mas estará fazendo o mais importante, 
 constituindo seu pensamento ideológico, compreendendo desde os conceitos 
 concretos, como mesa, casa, livro até conceitos puramente abstratos, como: eu, 
 ética, metafísica. 
 Aquisição da linguagem e desenvolvimento cognitivo 
 O pensamento e a linguagem, no início da vida de um bebê, segundo Vygotsky, 
 estão dissociados, por isso classifica essas funções como linguagem não intelectual 
 e pensamento não verbal. 
 O recém-nascido, inicialmente, possui apenas reações instintivas (choro, 
 balbucio...),que vão adquirindo significado à medida em que a mãe interage com 
 ele. Ao amamentar o bebê após o choro, por exemplo, a mãe está fazendo com que 
 ele adquira o significado de fome, assim, toda vez que sentir necessidade fisiológica 
 de alimento, o bebê se utilizará do choro para dizer à mãe que está com fome, 
 atribuindo ao choro uma função comunicativa com a mãe. O mesmo acontece com 
 as tentativas de apanhar objetos distantes que, por não estarem ao seu alcance, a 
 criança os aponta, comunicando ao adulto que os quer. Ações um tanto quanto 
 simples, mas fundamentais, pois são o início de um processo mais complexo que 
 apenas o ser humano domina e que lhe possibilita formas de raciocínio 
 extremamente desenvolvidas: o da linguagem. 
 A criança desenvolve sua fala a partir da fala da comunidade a qual pertence. Os 
 adultos não só estimulam a comunicação da criança, mas também o seu 
 desenvolvimento intelectual, ao ajudar na realização de tarefas que elas ainda não 
 fazem sozinhas. A relação entre o psiquismo do adulto e o da criança dá origem ao 
 desenvolvimento cognitivo que para Vygotsky é inter-psíquico. 
 Em torno dos dois anos de idade, a criança passa a utilizar a fala social com a 
 função de comunicação, que se desenvolve em dois sentidos: o primeiro se refere 
 ao aumento da complexidade das estruturas linguísticas utilizadas na comunicação, 
 e o segundo se refere à internalização, que é a substituição da fala do adulto pela 
 sua própria fala na realização de tarefas. 
 Dos dois aos seis anos de idade é comum as crianças falarem sozinhas enquanto 
 brincam. Esse ato, denominado por Vygotsky como fala egocêntrica, marca o início 
 da função cognitiva da linguagem de forma intrapsíquica, e pensamento e 
 linguagem passam a ser interdependentes. A linguagem passa a organizar e 
 orientar o pensamento da criança. 
 A estrutura da fala egocêntrica, no início, é muito semelhante à da fala social, mas à 
 medida que a criança se desenvolve essa semelhança vai diminuindo, pois a 
 estrutura gramatical aos poucos vai sendo abreviada, e a criança se dá conta que o 
 interlocutor da fala é ela mesma, por isso a fala egocêntrica é predicativa já que a 
 criança sabe de quem ou a que está se referindo, e não há necessidade de 
 mencionar o sujeito. 
 Inicialmente, a fala egocêntrica é utilizada no fim da atividade, e isso ocorre em 
 torno dos três anos de idade. A fala aqui se refere ao que já foi feito. Com o passar 
 do tempo e o desenvolvimento da criança, sua fala passa a ser utilizada durante a 
 atividade até que finalmente chega a antecedê-la, ou seja, nesse estágio a criança 
 já é capaz de planejar, de maneira consciente, através de sua fala, suas ações 
 futuras. 
 Com o desenvolvimento da criança, sua fala egocêntrica vai sendo interiorizada, 
 passando assim a utilizar a fala interior. Nesse estágio, a verbalização não se faz 
 necessária, e a criança já consegue organizar suas atividades, fazendo uso apenas 
 do pensamento verbal. 
 A fala interior difere da fala social uma vez que é composta por significados e 
 generalizações, não se concentrando na expressão fonética. 
 Como já mencionado anteriormente, a aquisição de linguagem é um processo que 
 acontece do exterior para o interior. Tem seu princípio na fala social, passa para a 
 fala egocêntrica até chegar à fala interior, que é a principal forma de pensar, 
 também conhecida como pensamento linguístico. 
 Ao afirmar que a linguagem além da função comunicativa também tem a função de 
 organizadora e planejadora, está se afirmando também que as crianças surdas que 
 sofrem atraso de linguagem estão em desvantagem em relação às crianças que 
 adquirem linguagem de forma natural. A aquisição de linguagem é a principal 
 responsável pelo desenvolvimento cognitivo da criança e toda a cognição é 
 determinada pela linguagem que, por sua vez, é influenciada e determinada por 
 questões culturais e socioeconômicas. 
 De fato, a necessidade de comunicação do ser humano é tamanha que, ainda que 
 uma criança surda desconheça a língua de sinais e a língua oral, seu convívio social 
 permite que ela simbolize e conceitue, e de alguma forma, se comunique. Mas sua 
 comunicação será muito limitada, pois não possui acesso a todas as informações e 
 assuntos que os ouvintes têm. Sua compreensão se restringirá ao presente, 
 sendo-lhe quase que impossível compreender o passado, o futuro e os assuntos 
 abstratos. Ao permanecer vinculada ao concreto, suas funções organizadora e 
 planejadora da linguagem não se desenvolvem de forma plena e satisfatória. 
 Formação de conceitos 
 O conceito está ligado à capacidade de generalização, de categorização das 
 palavras. O significado é mutável e se modifica à medida que o indivíduo se 
 desenvolve, mas não significa dizer que a generalização e a abstração se 
 modificam. 
 A palavra pode nomear diversos objetos para uma criança e por isso se utiliza, 
 normalmente, do auxílio de gestos para que o interlocutor a compreenda. Ao falar 
 água, por exemplo, a criança pode estar se referindo à água que está vendo em um 
 aquário ou piscina, ou ainda pode estar afirmando que está com sede. Para que o 
 adulto a compreenda, ela certamente apontará para um copo e falará água, o que 
 significa estar com sede. 
 Pode-se concluir que o pensamento conceitual não é algo inato, pelo contrário, para 
 chegar até ele a criança precisa passar por um processo que dependerá muito da 
 participação do adulto, uma vez que a criança sozinha não é capaz de inventar 
 conceitos: o que significa dizer que suas relações sociais serão muito importantes 
 nesse processo, pois é através dos conceitos de sua família e de sua comunidade 
 que a criança passa a formar a sua maneira de pensar. 
 O início do processo de categorização é marcado pela percepção das semelhanças, 
 algo não tão simples, pois envolve um certo grau de abstração em que a criança 
 precisa separar as características dos objetos, compará-las e ser capaz de 
 reconhecer as semelhanças. 
 Ao longo do seu desenvolvimento, a criança categoriza os objetos de diversas 
 formas. Vygotsky salienta três etapas desse processo: 
 Na primeira, a criança não procura semelhanças, mas simplesmente agrupa objetos 
 de forma aleatória. 
 Na segunda etapa, a criança já utiliza alguns critérios para o agrupamento, porém 
 esses critérios ainda não são subjetivos ou lógicos, mas apenas concretos e fatuais. 
 Vygotsky denomina essa fase como pensamentos complexos, em que as palavras 
 possuem um significado muito amplo, como no exemplo da água, citado 
 anteriormente. 
 No final do estágio de pensamento por complexos, a criança já possui fala 
 semelhante a do adulto, porém os significados das palavras ainda diferem bastante, 
 pois ela ainda não é capaz de perceber as relações lógicas entre os conceitos. 
 Nessa etapa, a criança inicia seu processo de abstração quando consegue agrupar 
 objetos com maior semelhança. Esse estágio precede os conceitosverdadeiros, 
 onde a criança só chega após ser capaz de abstrair, de se desvincular do concreto, 
 de sintetizar e de analisar. 
 “Um conceito só aparece quando os traços abstraídos são sintetizados novamente, 
 e a síntese abstrata daí resultante torna-se o principal instrumento do pensamento.” 
 (VYGOTSKY apud GOLDFELD, 1997 p. 66) 
 Cada conceito é uma generalização que, relacionados entre si, formam uma relação 
 de generalizações, que por sua vez, não são percebidas pela criança na fase dos 
 complexos, pois ainda não são capazes de perceber a hierarquia existente entre os 
 conceitos de flor e rosa. 
 O sistema conceitual do indivíduo é formado quando ele é capaz de perceber as 
 relações de generalidade entre os conceitos, sendo capaz de elaborar novos 
 conceitos sem necessariamente estar ligado a uma situação concreta. Seus 
 conceitos surgem de outros já conhecidos. 
 Conceitos generalizados como roupa, moradia, mobília, marcam um avanço muito 
 grande no desenvolvimento da criança e demonstram que ela já está estabelecendo 
 relação entre eles. Mais do isso, já está sendo capaz de libertar-se do concreto, 
 podendo falar de tempo e espaço não alcançados por ela. 
 Daí a dificuldade em conversar com crianças surdas, em português, sobre assuntos 
 que não estejam relacionados ao ambiente em que ela e o interlocutor estejam. Em 
 geral, o adulto, diante dessa dificuldade, evita falar sobre assuntos abstratos com a 
 criança surda, impossibilitando que ela venha a desenvolver o domínio desses 
 conceitos. Por isso, a criança surda, muitas vezes, fica restrita a níveis de 
 generalizações concretas, apresentando grande dificuldade em perceber a relação 
 existente entre palavras hierarquicamente relacionadas como: ser vivo – vegetal – 
 flor – margarida. Muitas vezes, considera-os como equivalentes, não sendo capaz 
 de utilizar generalizações do tipo seres vivos e vegetais. 
 Para Vygotsky, adquire-se os conceitos de duas formas: do dia a dia, da experiência 
 concreta, que são os conceitos espontâneos, e não na escola, que é responsável 
 por boa parte dos conceitos aprendidos de maneira formal. Esses são chamados de 
 conceitos científicos, e são aprendidos através da explicação e de outros conceitos 
 que a criança já domina. Os dois tipos de conceitos fazem parte de um sistema 
 onde um impulsiona o desenvolvimento do outro. 
 Libras: o estudo da sua estrutura linguística 
 Para entender o status linguístico da Libras, precisamos refletir primeiramente sobre 
 o que significa estudar uma língua. Podemos estudar uma língua por meio do 
 conhecimento de sua estrutura. Dessa maneira, busca-se encontrar padrões de 
 organização dentro da língua, bem como similaridades entre os padrões 
 encontrados dentro de uma língua com outras línguas. As línguas de sinais nos 
 oferecem, nesse sentido, uma particularidade interessante. Diferentemente das 
 línguas orais, ela se faz presente na modalidade visoespacial. Isso significa que sua 
 articulação acontece de forma visual e que os interlocutores usam o espaço ao seu 
 redor como processo natural de comunicação. O estudo linguístico, quando pelo 
 viés da forma, ocupa-se normalmente das seguintes categorias: fonologia, 
 morfologia, semântica e pragmática. As línguas de sinais, incluindo a Libras, são 
 analisadas de acordo com essas categorias de análise. A seguir, serão descritos 
 alguns dos resultados principais desses estudos, juntamente com algumas reflexões 
 sobre como esse conhecimento pode ajudar no que diz respeito ao aprendizado da 
 Libras. 
 Fonologia 
 Embora possa parecer estranho encontrar a fonologia dentro dos estudos de uma 
 língua sinalizada, as pesquisas encontraram paralelos interessantes que nos 
 mostram como línguas como a Libras possuem uma arquitetura e organização 
 semelhante, mesmo no nível fonológico. 
 A fonologia é originalmente considerada como o estudo da relação entre os sons de 
 uma língua com a distinção de sentido. Esse conceito foi estendido também para as 
 línguas de sinais. Mais especificamente, o aspecto que permite pensarmos em uma 
 fonologia da Libras, por exemplo, diz respeito ao estudo dos pares mínimos de uma 
 língua. Esses são os fonemas ou sons que individualmente não provocam diferença 
 de sentidos, mas que, quando comparados com os de outras palavras, ocasionam a 
 mudança de sentidos entre elas. Podemos tomar como exemplo os fonemas das 
 palavras pala e mala. A diferença está no primeiro fonema, portanto, ele é 
 contrastivo. 
 A Libras também produz sinais a partir do mesmo princípio fonológico. Para 
 entender como isso se dá, precisamos primeiramente entender como se dá a 
 construção de um sinal. O princípio básico está no seguinte padrão de organização: 
 Ainda existem alguns aspectos importantes na formação do sinal chamados de 
 expressões não manuais, que podem incluir a expressão facial, a direção do olhar, 
 entre outros. É importante que se lembre desses parâmetros básicos para a 
 formação do sinal, visto ser comum os estudantes de Libras cometerem erros na 
 sua articulação por falta de consciência de sua organização. 
 Portanto, os três primeiros parâmetros mencionados, configuração de mão, locação 
 e movimento são responsáveis pela articulação do sinal. Assim como em línguas 
 orais como o Português, a troca de um parâmetro da articulação acarreta na 
 mudança do seu sentido. Isso é observado em pares de sinais realizados de forma 
 quase idêntica, a não ser por um parâmetro. Por exemplo, podemos notar a 
 diferença entre os sinais DESCULPA e VERDE. Os dois sinais podem ser 
 realizados no mesmo local e com o mesmo movimento, porém com a configuração 
 de mão diferente. 
 A partir dos estudos com línguas de sinais, o conceito de fonologia então passa a 
 ser compreendido como o estudo das unidades mínimas sem sentido em uma 
 língua e como a sua mudança pode causar a mudança de sentido de uma palavra. 
 Na prática, esse conhecimento é importante para que se aprenda a diferenciar os 
 sinais tanto no momento em que se percebe a sua formação como no momento em 
 que se precisa produzi-lo. A mudança de um dos seus parâmetros pode mudar o 
 sentido ou fazer com que o sinal fique completamente incompreensível. O sinal em 
 Libras também pode ser compreendido pela sua morfologia. A seguir, serão dados 
 alguns exemplos de organização morfológica da Libras. 
 Morfologia 
 A Libras também se organiza de acordo com padrões estudados da morfologia. Esta 
 área do estudo linguístico se ocupa das unidades mínimas responsáveis por 
 sentidos específicos, e são assim importantes para a produção do léxico, ou seja, o 
 seu conjunto de sinais. Por meio dos estudos morfológicos, podemos entender 
 quando uma palavra designa o feminino, como em menina; o masculino, como em 
 menino; o singular ou o plural, pela presença ou ausência de s. Além desses casos, 
 também há estudos sobre quando esse mesmo padrão não é obtido dentro do 
 léxico de uma língua. A seguir, você poderá compreender como alguns desses 
 aspectos são marcados em Libras. 
 Gênero emLibras 
 A Libras também tem uma forma para marcar o gênero masculino e feminino 
 quando necessário. O sinal MULHER e HOMEM normalmente é utilizado para os 
 casos onde o sinal anterior não marcar gênero. Um bom exemplo é o sinal PRO- 
 FESSOR, que em si não marca gênero, e isso pode ser sucedido pelo sinal 
 HOMEM ou MULHER. 
 Número em Libras 
 A organização das informações por número indica se o referente de um enunciado é 
 singular ou plural. A Libras possui alguns mecanismos para a disposição de 
 informações nesse sentido. A repetição do sinal no espaço em frente ao sinalizador 
 é um exemplo desse mecanismo. Quando se busca o que em Português seria o 
 plural da palavra casa, um sinalizador faria a repetição desse sinal no espaço. 
 A sintaxe da Libras 
 A sintaxe é a área de estudos linguísticos que analisa como as frases são 
 organizadas. A diferença mais significativa na forma como a Libras organiza as suas 
 frases está no uso da modalidade visoespacial. Enquanto as línguas orais auditivas 
 usam o aparelho fonador como articulador principal, as mãos são o principal meio 
 de línguas como a Libras. Assim, elas podem articular o seu discurso no espaço a 
 sua frente, fazendo relação aos referentes. A isso se chama campo anafórico. 
 A consciência da forma como a Libras organiza a suas frases é importante para 
 quem vai começar a aprender a se comunicar com surdos. É comum esperar que 
 eles façam as suas frases na mesma estrutura do Português, mas isso não 
 corresponde à realidade das línguas, visto haver diferentes formas de organização 
 sintática. O aprendiz deve conhecer mais sobre como as frases são feitas para 
 poder melhorar a sua comunicação. Uma dica interessante é prestar atenção no tipo 
 de verbo utilizado, e um exemplo são os verbos direcionais. Esse tipo de verbo 
 utiliza o espaço à frente do sinalizador e faz com que a configuração de mão 
 percorra uma trajetória. Assim para dizer “Eu avisei a você”, é necessário usar o 
 sinal AVISAR e direcioná-lo ao interlocutor à frente e, para dizer o contrário, “Você 
 me avisou”, você deverá fazer o caminho inverso, trocando não somente a direção 
 do sinal, mas a orientação da mão, invertendo-a. 
 Semântica e pragmática 
 Assim como nas línguas orais, as línguas de sinais também possuem padrões de 
 organização semântica e pragmática. Quando se estuda a semântica de um sinal ou 
 de uma palavra, o objetivo maior é compreender que sentidos podem haver dentro 
 de uma frase. Por outro lado, quando associamos a nossa busca ao contexto onde 
 ela é dita, estamos colocando a pragmática. Um exemplo clássico acontece quando 
 alguém, em uma sala, pede para outra pessoa fechar a janela devido ao frio. Isso 
 pode ser dito diretamente como em: “por favor, fecha a janela”. Ou então pode ser 
 dito por meio do contexto pragmático, olhando para a janela e dizendo: “Está frio 
 hoje, não”. A outra pessoa pode entender que deve fechar a janela, mesmo que 
 dentro do enunciado não haja a palavra frio ou fechar. Esse sistema de organização 
 também é visto em línguas sinalizadas como a Libras, o que implica na necessidade 
 de buscar o sentido dentro do contexto e não apenas por meio da localização e uso 
 de sinais individualmente. 
 Outra questão semântico-pragmática que é importante lembrar ao se conhecer a 
 Libras diz respeito à existência de sinais idênticos para sentidos diferentes. Esse é 
 normalmente o caso do sinal LARANJA e SÁBADO. Os dois sinais são feitos com a 
 mesma configuração de mão, locação e movimento. O sentido pode normalmente 
 ser visto no contexto da interlocução. Isso nos remete para importantes questões 
 frequentemente levantadas por alunos que estão começando a aprender a língua de 
 sinais. Muitos argumentam que o sentido poderia ser único para evitar confusões e 
 ser mais fácil o aprendizado. No entanto, é importante lembrar que a Libras se trata 
 de uma língua natural e que, assim, ela passa por fenômenos semelhantes a elas, 
 sejam da modalidade oral como o Português ou outra língua na modalidade 
 sinalizada. 
 O léxico da Libras 
 Quando falamos do léxico da Libras neste capítulo, estamos tratando do conjunto do 
 vocabulário que essa língua usa para propiciar a comunicação. Esse pode ser 
 composto por sinais já estáveis na língua, isto é, sinais já presentes e conhecidos 
 entre os seus usuários. Por outro lado, também há a possibilidade de produção de 
 novo vocábulo, como já mencionado. É comum alunos questionarem se esse 
 processo deveria ser acelerado ou, então, controlado para fins de universalização. É 
 importante lembrar novamente que isso não pode e não deve ser contido, visto a 
 Libras não ser uma língua artificial. Por outro lado, a criação de novos sinais 
 depende do conhecimento que os indivíduos possuem das regras de formação de 
 sinais, bem como da sua experiência linguística, educacional e de trabalho, entre 
 outras. 
 O léxico da Libras também pode fazer uso de elementos do Português, como o 
 alfabeto manual. A isso chamamos empréstimo linguístico. O alfabeto manual, 
 também chamado de datilológico, corresponde às letras do alfabeto. É comum 
 pensar que esse alfabeto corresponde a todos os sinais utilizados pelos surdos, ou 
 que para se comunicar com os surdos basta simplesmente usá-lo soletrando cada 
 letra do alfabeto manual. Isso pode ser complicado para a sua comunicação. Os 
 surdos que usam a Libras possuem um vocabulário próprio dentro da sua língua de 
 sinais. As palavras do Português correspondem ao vocabulário de outra língua, e os 
 surdos podem não ter tido acesso a esse vocabulário. O fato de os surdos 
 compartilharem a identidade de brasileiros e conviverem entre textos escritos em 
 Português não significa automaticamente que eles tenham conhecimento pleno do 
 vocabulário dessa língua. Para que a comunicação aconteça com qualidade, é 
 importante respeitar o vocabulário do léxico da Libras, aprendendo os seus sinais e 
 utilizar o alfabeto manual para momentos onde não houver um sinal comum, 
 respeitando o fato de a palavra não ser do léxico da língua de sinais. 
 Variação linguística da Libras 
 A variação linguística é o processo pelo qual as línguas mudam ao longo do tempo 
 ou de uma determinada região em comparação com outra região. Na Libras, 
 também é possível encontrar o fenômeno da variação linguística. Por exemplo, o 
 sinal PESSOA utilizado no estado do Rio Grande do Sul não é o mesmo encontrado 
 em outras regiões do Brasil. Enquanto no Rio Grande do Sul esse sinal é articulado 
 no tórax do sinalizador, em outras partes do Brasil esse conceito é sinalizado na 
 região superior da cabeça. 
 Para que se conheça a língua, é importante aprender a respeitar a sua variação 
 sociolinguística. Isso não significa que se deva aprender todas as formas de um 
 sinal já de início. Um lugar interessante para se conhecer a variação linguística da 
 Libras é a internet. O site Youtube contém vídeos de diversaspartes do Brasil. Em 
 se tratando de línguas de sinais de outros lugares do mundo, o site também é um 
 ótimo lugar para a busca. No entanto, é importante usar de critérios para a busca e 
 o conhecimento de línguas de sinais na internet, visto que o aluno pode estar 
 aprendendo uma variação que não pertence a sua região. A orientação de um 
 profissional do ensino da Libras é importante para que se possa aproveitar da 
 melhor maneira o conhecimento disponibilizado em vídeos na internet.

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