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Prévia do material em texto

Caminhos bifurCantes na eduCação inClusiva: 
inclusões e rebeldias silenciosas na educação Pública 
Ana Lucia C. HeckertH
Ricardo Bodart de AndradeH H
resumo
Este artigo apresenta parte das reflexões efetuadas na pesquisa de mestrado 
“Políticas inclusivas no chão da escola: usinagens e rebeldias no front-da-
batalha” realizada em duas escolas de um município situado na região norte do 
estado do Espírito Santo. Por meio de conversações buscou-se cartografar os 
processos de inclusão gestados nas práticas educacionais. Nosso temário geral 
foi a Educação Inclusiva, campo de intervenção usualmente associado à idéia de 
inclusão de pessoas com Necessidades Educacionais Especiais (NEE) no ensino 
regular. Abordamos o tema utilizando especialmente os instrumentos analíticos 
oferecidos por Michael Hardt e Toni Negri, e Michel Foucault acerca das práticas 
sociais, dos processos de inclusão e do biopoder. A pesquisa realizada apontou 
que os modos instituídos que tecem a Educação produzem o chamado fracasso 
escolar, invisibilizando recusas e inventividades. Apontou ainda, que modos de 
educar podem revolucionar processos de inclusão diferencial compondo alianças 
que fortaleçam essas vidas “marginais”. 
Palavras-chave: educação pública; inclusão diferencial; práticas sociais.
rupturing paths in inClusive eduCation: inclusions 
and silent rebellions in the Public education
abstraCt:
This article presents some reflections made on the masters degree research 
known as “Políticas inclusivas no chão da escola: usinagens e rebeldias no 
front-da-batalha” (Inclusive policy on the school floor: machining and rebellion 
at the battlefront). This research took place in two schools from a city at the 
north region of the state of “Espírito Santo” in Brazil. The inclusion processes 
H Professora do departamento de psicologia da UFES e do Programa de Pós-Graduação em 
Psicologia Institucional/UFES. Endereço: Universidade Federal do Espírito Santo, Departamento 
de Psicologia. Avenida Fernando Ferrari, 514. Goiabeiras, Vitoria, ES – Brasil. CEP: 29060-900.
E-mail: anaheckert@uol.com.br 
H H Possui graduação em Psicologia pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) (2000), 
Especialização em Intervenção Sistêmica com Famílias pelo Instituto Crescent/FDV (2005) 
e Mestrado em Psicologia Institucional pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia 
Institucional (PPGPSI) - UFES (2009).
E-mail: rba.psicologia@gmail.com
Sérgio_hp
Typewritten Text
Ana Lucia C. Heckert; Ricardo Bodart de Andrade
498 Fractal: Revista de Psicologia, v. 22 – n. 3, p. 497-512, Set./Dez. 2010
managed by the educational system were mapped through reasoning. The main 
theme considered in the research was the Inclusive Education. This intervention 
field is usually associated to people with special educational needs who study 
at regular schools. The themes were approached following Michael Hardt, Toni 
Negri and Michel Foucault ideas regarding social practices, inclusion processes 
and biopower. The research showed that the school failure is produced by the 
established Educational ways. It also showed that the way people educate 
can revolutionize the differential inclusion processes, making alliances which 
strengthen these marginal lives.
Keywords: public education; differential inclusion; social practices.
eduCação e inClusão esColar Como proCessos de inClusão 
diferenCial
O presente trabalho vem apresentar parte das reflexões de uma pesquisa de 
mestrado “Políticas inclusivas no chão da escola: usinagens e rebeldias no front-
da-batalha” (ANDRADE, 2009) realizada em 02 escolas de um município situa-
do na região norte do estado do Espírito Santo. Por meio de conversações com os 
sujeitos do cotidiano destes estabelecimentos buscou-se cartografar os processos 
de inclusão gestados nas práticas educacionais. 
Nosso temário geral foi a Educação Inclusiva, campo de intervenção usu-
almente associado à idéia de inclusão de pessoas com Necessidades Educacionais 
Especiais (NEE) no ensino regular. Procuramos abordar o tema utilizando especial-
mente os instrumentos analíticos oferecidos por Hardt e Negri (2005) e Foucault 
(2005, 2006a, 2006b, 2006c) acerca das práticas e dos processos de inclusão.
Foucault afirma que não há prática sem teoria, nem teoria sem prática, de 
forma que cada uma compreende aspectos da outra e ambas configuram um po-
sicionamento num jogo de forças. Nesse sentido, tomamos o próprio ato de pes-
quisar como uma intervenção, uma ação no mundo. Concordamos com Foucault 
(2006a, p. 71) na afirmação de que “[...] uma ‘teoria’ é o sistema regional de lutas 
[...]”, isto é, um conjunto de ações que delimitam certos territórios de embate e 
dispara certos efeitos na Vida,1 produzindo-a, reinventando-a. 
Na esteira desse sentido foucaultiano de produção da Vida, Hardt e Ne-
gri (2005) distinguem a peculiaridade dos processos inclusivos contemporâneos 
apontando seus modos de expressão. De acordo com esses autores, o Império 
como condição planetária atual do Capital se mantém por meio de processos di-
fusos de “inclusões diferenciais”, produção pela qual tudo e qualquer um é inclu-
ído, diferencialmente encaminhado e gerenciado num grande sistema de controle 
e poder (HARDT; NEGRI, 2005, p. 218).
Incluindo as diferenças numa “noção universal de direito” o Império dis-
tingue tais diferenças amenizando-as numa perspectiva cultural, gerenciando-as 
e hierarquizando-as numa racionalidade econômica generalizada e de controle. A 
Caminhos bifurcantes na educação inclusiva: inclusões e rebeldias silenciosas na educação pública
Fractal: Revista de Psicologia, v. 22 – n. 3, p. 497-512, Set./Dez. 2010 499
rede imperial atua por modulações, com autodeformações dinâmicas, com solu-
ções incompletas e efetivas porque mutantes de um ponto a outro da trama, numa 
multiplicidade complexa de variáveis. Como uma grande corporação transna-
cional que empreende diferentes métodos e graus de exploração/repressão dos 
diversos grupos étnicos que trabalham para ela, o Império “[...] reconhece as 
diferenças existentes ou potenciais, festeja-as e administra-as em uma economia 
geral de comando. O triplo imperativo do Império é incorporar, diferenciar e 
administrar” (HARDT; NEGRI, 2005, p. 220, grifo nosso).
É nessa perspectiva de um processo de inclusão sempre em curso – efetiva-
do numa contínua produção da Vida por meio de ações teóricas e práticas – que 
tecemos nossas provocações no campo da Educação e da inclusão escolar, com-
preendendo “exclusão”, “inclusão” e “Educação” como processos dinâmicos, 
conflituosos e em rede, formas e fluxos de uma inclusiva social inevitável.
Ressaltamos que a perspectiva de inclusão da qual partimos pauta-se nas 
reflexões de Hardt e Negri (2005) e entende-se por inclusão as diferentes formas 
sociais de geração, composição e gerenciamento da vida, tanto por meios disci-
plinares do corpo, como por regulações da população. Nesse sentido, inclusão é 
também produção de vida, de modos de sentir e viver.
Para trabalhar a inclusiva social em sua dimensão de inclusão escolar re-
corremos a três eixos conceituais, três patamares de pensamento crítico que nos 
permitiu pensar os processos escolares nessa rede e vislumbrar o caráter produti-
vo do social e do desejo no social, sempre inclusivo, diferencialmente inclusivo a 
depender de quem, como e quando. 
Nossa pesquisa-intervenção em Aracruz levou na sacola uma noção de pro-
dução social da subjetividade, tendo como “presenças” conceituais constantes: (1) 
a assunção de que há políticas e práticas em curso voltadas para o controle da popu-
lação por meio da produção da vida (FOUCAULT, 2005; HARDT; NEGRI, 2005; 
PELBART, 2003); (2) que ela se processa nas filigranas da constituição própria 
de nosso corpo individual e de nossas maneiras de pensar, sentir e viver (GUAT-TARI, F.; ROLNIK, S., 2005), as quais continuamente tensionam estratégias de 
resistência e invenção constante (HARDT; NEGRI, 2005; PELBART, 2003); e (3) 
que esse processo produtivo do viver perfaz sempre processos de inclusão social. 
Neste, a Educação Escolar é um dos dispositivos, sendo que, para nós, não há ex-
clusão absoluta e que, por isso, toda Educação, a rigor, é Inclusiva: toda exclusão 
aparente se dá em algum tipo de inclusão (HARDT; NEGRI, 2005).
No final do século XVIII, na ampliação da sociedade disciplinar, surge 
um novo tipo de poder; o biopoder. Essa nova tecnologia vai progressivamente 
imprimindo, dentre outras, três mudanças importantes: (1) criará um novo corpo, 
corpo-população, sobre o qual vai agir; (2) passará a atentar para fenômenos de 
outra natureza, não mais individuais, mas pertinentes apenas ao nível da massa, 
considerando a população em sua duração; e (3), finalmente, agirá com mecanis-
mos com funções diferentes daquelas dos dispositivos disciplinares – individuais 
– se tratando, sobretudo, de prever alterações e intervir com regulações globais, 
com vistas a um equilíbrio (FOUCAULT, 2005, p. 292-294).
Ana Lucia C. Heckert; Ricardo Bodart de Andrade
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Articulam-se então dois poderes: o disciplinar, que atua no corpo por meios 
disciplinares, e o biopoder, que atua na população por meios regulamentadores. 
Duas tecnologias de poder que são geradas em tempos cronológicos diferentes e 
se sobrepõem, agindo complexamente sobre o corpo-individual, disciplinando-o, 
e sobre a vida, regulando-a (FOUCAULT, 2005, p. 297).
Biopoder como um regime geral de dominação da vida, 
biopolítica como uma forma de dominação da vida que pode 
também significar, no seu avesso, uma resistência ativa, e 
biopotência como a potência de vida da multidão, para além 
das figuras históricas que até há pouco tentaram representá-
la (PELBART, 2003, p. 86).
O humano é constituído nesse social dinâmico e entrecruzado de forças de 
naturezas diversas, uma rede inacabada cuja configuração visível momentânea 
permitiu a diferenciação de uma forma-subjetividade, que usualmente chamamos 
“indivíduo”, “pessoa”, “criatura”. Ou seja, somos constituídos por jeitos de lidar 
com o corpo, com a Lei, com a imagem, com abordagens policialescas de vigi-
lância e punição, com os modos de habitar e as alternativas de convívio e desloca-
mento no terreno, jeitos e intensidades que nos atravessam desde o nascimento. 
A matéria-prima do Capital está exatamente nas usinagens de formas de pensar/
sentir/estar na Vida, de formas de afetar e ser afetado. No sopro da economia 
subjetiva, “[...] na microtessitura da vida subjetiva, nas diferentes maneiras que 
entendemos nossas existências” (GUATTARI; ROLNIK, 2005, p. 53).
Nessa maquinação de produção, toda e qualquer condição é produzida e 
composta dinamicamente, nada está fora do lugar, nada está excluído, pois produ-
zido que é nessa megalógica de poder do Império, mas diferencialmente forjado: 
não há exclusão, mas inclusão diferencial (HARDT; NEGRI, 2005). O artista 
carismático e famoso da mídia, bem pago e esteticamente alinhado está tão inclu-
so socialmente quanto o menino mirrado, subnutrido, miserável e “incógnito”; 
estão, no entanto, diferencialmente inclusos. É nesse sentido que não há exclusão, 
não há falta, mas sim inclusões diferenciais e produção: de homens, mulheres, 
escolas, sucessos, fracassos...
Foi nessa perspectiva de produção social biopolítica por meio de uma mi-
cropolítica humana, histórica e sempre inacabada, que procuramos compor alian-
ças com os movimentos de estudantes, educadores e familiares.
entrevistas, entremeios, entre euCaliptos em araCruz (es)
Buscamos compreender e problematizar em nossa pesquisa os efeitos 
das “inclusões” efetuadas pelas práticas escolares na vida de estudantes e 
educadores de escolas municipais em Aracruz/ES. O termo escolar é pertinen-
te, pois queríamos compreender os processos inclusivos que se dão na escola, 
com ela, por e/ou em torno dela.
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Concentramos as entrevistas para os educadores em 4 perguntas básicas: 
(1) O que é essa escola na vida dessas crianças?; (2) O que é essa escola na sua 
vida?; (3) Você conhece a vida dessas crianças?; e (4) O que é educação inclusiva 
para você? As conversas transitavam por essas perguntas, ao mesmo tempo em 
que estávamos atentos aos movimentos que permeavam o cotidiano das escolas, 
que se atualizavam em gestos, fatos, expressões do corpo, ou seja, aos diversos 
modos de dizer que não se restringem às falas propriamente ditas. 
Nesse sentido, procuramos perceber como os educadores pensavam os sen-
tidos da escola para os estudantes e para eles mesmos. Queríamos compreender o 
que eles conhecem da vida quotidiana desses jovens e como a noção de Educação 
Inclusiva surgia nesse contexto, evidenciando contrastes entre os diversos modos 
de pensar/fazer Educação. Trazer essas impressões para composições com as dos 
jovens, nos possibilitou análises de como a escolarização encaminha essas vidas. 
Permitiu também perceber consonâncias e dissidências entre as noções de Edu-
cação Inclusiva dos profissionais, as dos conhecidos discursos neste campo e as 
inclusões diferenciais quotidianas, “concretas”. 
Esse modo de pesquisar compõe o que podemos chamar de um exercício 
e aprendizado cartográficos. A produção de diferença e a busca de discursos mi-
noritários, confabulados com os intercessores,2 são importantes princípios para o 
nosso exercício cartográfico. O princípio primeiro, por assim dizer, foi o de con-
ceber que a ética, enquanto exercício, “[...] implica, sobretudo, não falar e decidir 
pelo outro” (HECKERT, 2008, p. 213).
A aposta e o movimento cartográfico se referem às estratégias de formação 
do desejo no campo social. O desejo produz o campo social, fabrica encontros. Car-
tografar é um transitar entre direções, direcionamentos expostos aos agenciamentos 
da trajetória, e não entre objetos e objetivos preestabelecidos. Procurando dar voz 
e corpo aos afetos que pedem passagem, assume-se parte da investigação com um 
tipo de sensibilidade possível de prevalecer em seu trabalho (ROLNIK, 1989 apud 
BOCCO, 2006, p. 52). Se, por um lado, não há um objeto-objetivo a priori, a carto-
grafia comporta uma direção. Implica em fazer escolhas a cada momento de acordo 
com os agenciamentos que se operam. Essas escolhas fazem diferença.
A noção de cartografia (KASTRUP, 2007) implica em construção e, para 
nós, ela é tecida na relação, na trama. O exercício para nós foi captar os movi-
mentos que se insinuavam no cotidiano da escola e da vida dos moradores, bus-
cando perceber suas nuances, suas ondulações e inserir-se em algumas delas. O 
aprendizado cartográfico pede que o pesquisador se deixe tocar, que permita sus-
tentar a vontade de ir em outra direção da prevista no itinerário, exige continuar 
sem certezas por muitos momentos, ouvir estranhezas. Nesse sentido, foi impres-
cindível ouvir as crianças, já que perceber o que se passava com elas, a partir de 
suas falas e expressividades, era romper com uma tendência de se falar por elas e 
sobre elas, afirmando e desafirmando o que elas pensam, precisam e querem.
Ana Lucia C. Heckert; Ricardo Bodart de Andrade
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O desafio foi estabelecer uma escuta do que se passava, conversando com 
esse movimento. A composição geral que se pretendeu com as entrevistas foi en-
trelaçar produções dos educadores e estudantes, compreendendo encaminhamentos 
de vidas pela escolarização, percebendo os movimentos de inclusões diferenciaisconstruídas nos encontros e desencontros da escolarização nesse contemporâneo.
O intuito era o de compor um entrelaçamento entre os apontamentos feitos 
pelos educadores e as considerações de crianças e jovens. Transitamos pelas sig-
nificações que a escola e a Educação tomam para esses atores em seus territórios 
existenciais e suas construções de passado, presente, futuro. Como os educadores 
pensavam os sentidos da escola para os estudantes e para eles mesmos? O que 
eles conhecem da vida quotidiana desses jovens? Como a noção de Educação 
Inclusiva surgia nesse contexto? Queríamos evidenciar os contrastes entre os di-
versos modos de pensar/fazer Educação. Trazer essas impressões nos possibilitou 
análises de como a escolarização encaminha essas vidas. 
Aracruz é um município ao norte do Espírito Santo, cuja sede central fica a 
83 Km da Capital Vitória. O município é conhecido internacionalmente em virtude 
da Aracruz Celulose S/A, empresa que é referência mundial em produção de pasta 
branqueada de celulose de eucalipto. “A” história aracruzense nasce numa região 
hoje chamada de “Santa Cruz” ou “Vila de Santa Cruz”, conhecido balneário ao 
Norte do Espírito Santo com antiga tradição gastronômica. Próxima de território 
que é foco de nossa pesquisa, essas paragens eram habitadas por índios guaranis e 
tupiniquins, tendo sido “agraciadas”, em 1556, com um núcleo de catequese. Em 
16 de dezembro de 1837, são batizadas como Distrito de Santa Cruz, tornado-se 
município em 3 de abril de 1848 e sendo instalado em 16 de janeiro de 1849. A Vila 
de Santa Cruz então se torna oficialmente a sede do município Santa Cruz.
Dados de 2007 (PREFEITURA MUNICIPAL DE ARACRUZ, 2008) 
apontam que o município de Aracruz conta com pouco mais de 3% do território 
capixaba e 73.358 residentes. Em 2008 se cogitava em torno de setenta e cinco 
mil. Apesar do PIB de mais de 32 mil reais por pessoa, seu Índice de Desenvol-
vimento Humano total e desagregado (IDH) sempre esteve pareado com o índice 
Nacional. De 1991 a 2000 o IDH aracruzence esteve um pouco acima do índice 
nacional apenas na Educação, 5º lugar entre os municípios capixabas (PREFEI-
TURA MUNICIPAL DE ARACRUZ, 2008). Em 2007, Aracruz contava com 54 
escolas no município, entre unidades de ensino infantil, fundamental, médio e 
unidades mistas, algumas com Ensino de Jovens e Adultos (EJA). Atendia a cerca 
de 14.000 estudantes, entre crianças, jovens e adultos (PREFEITURA MUNICI-
PAL DE ARACRUZ, 2007).
Relatos informais e entrevistas permitiram perceber as singularidades do 
município de Aracruz. Os entremeios de uma história que conta o “sobrepeso” 
de grandes empresas, tomadas de terras indígenas e quilombolas, dependência 
econômica da prefeitura para com os repasses da Aracruz Celulose S/A (AR-
CEL). Podemos dizer que a história recente do Município se confunde com a 
história da Empresa. Segundo Gurgel e Borgneth (2007, p. 77), as atividades da 
Aracruz Florestal S/A, que plantou as primeiras mudas, se iniciam no municí-
Caminhos bifurcantes na educação inclusiva: inclusões e rebeldias silenciosas na educação pública
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pio em 1967. Foi recebida como a “salvadora da pátria”, chegando ao municí-
pio em tempos difíceis, quando 54% dos cafezais tinham sido erradicados. Era 
o período da industrialização, do “milagre brasileiro” e dos incentivos do Plano 
Nacional de Desenvolvimento (PND). 
O Município de Aracruz tem hoje sua cobertura original de Floresta Atlântica 
de planície e encosta (Hiléia Baiana) quase totalmente substituída por pastagens 
e especialmente pelas culturas e reflorestamentos homogêneos com eucalipto. 
A ARCEL S/A, volta e meia anunciando recordes de produtividade e lucro, 
chega a registrar em 2005 uma base florestal com 245 mil hectares em 4 estados 
brasileiros, com 132 mil hectares anunciadas como reservas de matas nativas. Seu 
território próprio alcançava na época em torno de 405 mil hectares (FUNDAÇÃO 
GETÚLIO VARGAS, 2007). Em 2007, seu site oficial, hoje (2010) ‘fora do ar’, 
referia 280 mil hectares de base florestal em cinco estados brasileiros e cerca de 
157 mil hectares de áreas de preservação. Podíamos contar nesse ano, somando 
um mais um, 437 mil hectares sobre a “jurisdição” da megamáquina de papel 
(ARACRUZ CELULOSE, 2007)3. 
Essa presença da ARCEL dificultava o aparecimento de contrastes e 
discursos colonizadores “pipocam” por todo município. Como falar em “auto-
nomia” nesse panorama? Estamos diante de um Golias? Onde/como estão os 
“Davis”? Depoimentos afirmam que a economia do município depende sim do 
pólo industrial, e depende muito.
A problemática da terra gerada pela ARCEL / FIBRIA vai de encontro 
aos interesses de índios, quilombolas e ambientalistas desta e de outras regiões. 
Relatos informais contam histórias conflituosas e até sangrentas4, comumente 
veiculadas na mídia sob a perspectiva do “homem branco”, marcando o caráter 
exploratório e truculento do Capital para com os recursos e comunidades locais. 
Outrossim, as cercanias do seu sistema portuário (Portocel) contam com condi-
ções degradantes de vida, com prostituição, abuso infantil, fome e outras violên-
cias. Ao pesquisador interessado, basta caminhar e conversar pelos recantos do 
município e ouvir, especialmente os de mais idade. A produção midiática desta 
empresa sobre sua monocultura, seu uso das águas e outros “detalhes” obviamen-
te contrasta com tais relatos.
Capilarmente instalada no município a “fabriqueta” de papel goza de cre-
dibilidade local, estadual, nacional e internacional. A Aracruz Celulose é conheci-
da como uma empresa que respeita o meio-ambiente e se preocupa com a questão 
social, sendo valorizada por fomentar diversos projetos empresariais, sociais e 
ambientais e abençoada aparentemente por tudo e todos (GURGEL; BORG-
NETH, 2007). A caracterização do peso da “megamáquina de papel branco” na 
economia de Aracruz (em Aracruz, em sua macropolítica, na flora e na fauna, 
na biopolítica das relações sociais, na micropolítica da subjetividade), pretende 
compor um panorama do município sem a ingenuidade do frontispício de boa 
empresa. Evidencia também sua capilaridade nos modos de pensar a vida (a Es-
cola, o público, as relações). 
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504 Fractal: Revista de Psicologia, v. 22 – n. 3, p. 497-512, Set./Dez. 2010
No que tange à constituição de políticas públicas, relatos apontam que a 
gestão municipal de 2004 configurou um rompimento de uma alternância bipolar. 
Depoimentos pelas ruas afirmam ser esta administração uma nova perspectiva 
em termos de políticas públicas. O termo “público”, de uma política pública, em 
termos de um conjunto de esforços em torno do que é bem comum e uso coletivo 
(unidades de saúde, escola pública, conselhos comunitários, etc) parece ser uma 
noção recente neste município. 
Entre eucaliptos, lutas, apaziguamentos e redes imperiais são constituídas as 
políticas de inclusão. Na pesquisa realizada ressaltou-se, para nós, a produção do fra-
casso escolar como expressão das inclusões diferenciais operadas na atualidade. 
a produção do fraCasso esColar e as reCusas
Elegemos a produção do fracasso escolar e os diferentes processos de recusa 
para assentar nossa afirmativa de que há apenas inclusões “diferencialmente” en-
gendradas aqui e ali na rede social. Tal afirmativa “localiza” também, e esse é um 
dos “pulos do gato”, o que entendemos e propomos de combate em favor da vida.
O modo como compreendemos a fabricação dos processos educacionais 
nos distancia das noções individualizadas de “problemas de aprendizagem”, “de-
ficiências” e “soluções pedagógicas” para “o” problema da “exclusão escolar”. 
Percebemos tais questões como produção histórica e social, não passíveis de re-
solução apenas por mudanças técnicasde conteúdo ou de atitudes em sala de aula. 
Esta compreensão forçou-nos a confabular com os usuários das escolas perceben-
do os contrastes entre conteúdos escolares e comunidade local, ideais inclusivos 
e condições de trabalho do educador. Bem como nos fez lembrar que a vida pulsa 
em meio às produções da escola e da escolarização na sociedade contemporânea, 
produções essas em que a perspectiva inclusiva toma espaço.
Uma das linhas que tecem o chamado fracasso escolar, e que para nós se 
constitui num fator importante de análise, é a vinculação temporária de trabalho 
de muitos profissionais da educação (ou professores). A precarização dos contra-
tos de trabalho gera descontinuidades que incidem na saúde do trabalhador e nas 
vinculações possíveis que se criam (e não se criam) com os alunos e as questões 
da região. Heckert (2000) nos lembra dos múltiplos entrelaçamentos que con-
figuram os processos educacionais, atentando para a “diluição” da escola nos 
processos de regulação do mercado. Dentre tais processos de regulação, a pre-
carização do trabalho do educador emerge como analisador5 do lugar da escola 
nessa produção social biopolítica.
Como criar vínculos mudando de escola várias vezes? E as possibilidades 
de um trabalho que construa alguma permanência e promova intervenções não-
individualizantes que facultem transformações sociais na região? Consideramos 
que essas transformações demandam tempo, continuidade, debate, errância. Com 
essas vinculações temporárias no conjunto da educação institucionalizada o dis-
curso da carência (dos alunos, de suas famílias, do bairro...) se perpetua.
Caminhos bifurcantes na educação inclusiva: inclusões e rebeldias silenciosas na educação pública
Fractal: Revista de Psicologia, v. 22 – n. 3, p. 497-512, Set./Dez. 2010 505
Outrossim, a produção do fracasso escolar, sentido como tal numa estrutura 
oficial de Escolarização, nos lembra das tramas capital-escola. Longe de ser uma 
conceituação distante as forças de Capital estão nas tramas de currículos, nas peda-
gogias e psicologias idealizadas e se misturam no quotidiano do educado. Expec-
tativas messiânicas depositadas na escola e valores afins ao capital são reativados 
em conteúdos distantes das experiências de escassez e modos de vida de crianças 
pobres, produzindo uma docência da insistência, uma docência do resgate: 
[...] porque a gente acha assim... que, dá pra fazer, mas não 
tem condições de fazer [...] estou numa fase assim meio, 
decepcionada [...] Tem caso de alunos aqui que já está com 
50 faltas, que a gente não consegue resgatar, não consegue 
trazer para a escola (Profissional entrevistado).
Não se trata de haver uma teoria da pedagogia lá (na academia) que ao 
ser aplicada aqui (na comunidade tal) dê errado. Há produções teóricas que 
fazem parecer que os confrontos que se dão no chão-de-escola se devem a uma 
questão de teoria mal aplicada, talvez uma pedagogia insuficiente, que fracassa 
em não-resgatar. Entendemos que há a produção de um sentimento de incom-
petência e incapacidade dentro da escola. Uma tendência de constatar que a 
escola não “salva” essas crianças, mas deveria fazê-lo e que os professores são 
os “culpados” por esse não fazer.
Nessa idealização da Escola a educação é a medida da doutrinação. Algu-
mas vezes os alunos “apenas” afirmam outras coisas, elaboradamente e educada-
mente. Geralmente, entretanto, “deseducadamente” debocham, rejeitam, atacam, 
vão embora. A escuta cuidadosa é fundamental tanto numa situação como noutra. 
Muitos alunos vão à escola, gostam de lá, mas não gostam de estudar; utilizam 
aquele espaço, público, como lhes agrada. É sutil perceber nisso tudo uma batalha 
continuada, perceber uma produção de modos de viver, de resistir e não falta de 
educação, de interesse. Perceber aí embates entre movimentos de cooptação e 
de recusa, ambos misturados nas relações escolares. São sutis as fronteiras entre 
uma educação-respeito e uma educação-doutrinação.
Nossa pesquisa-cartografia evidenciou casos de alunos que simplesmente 
foram embora e abriram mão da merenda, da amizade, do convívio, abriram mão 
da escola que gostam, pois não gostam de toda a escola, de tudo que ela ofere-
ce. Eles não foram expulsos (diretamente), mas ficou desconfortável ficar. Nesse 
processo, a escola torna-se também saudade, desejo de retorno para um espaço-
tempo-convívio (possível apenas para o próximo ano, caso consigam retornar 
à escola). Ficaram na lembrança dos alunos tanto as dores como as pessoas em 
quem encontraram acolhida. 
As situações de sala de aula não se resumem nem àquele espaço-tempo, 
nem a alguma teima específica. Suas produções e efeitos se estendem! Ressoam 
na matéria e densidade corporais, na intensidade do pensamento, na ida pra casa, 
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na família. Transitam no tempo, no estar do presente, um presente que se mistura 
com o desejo de futuro, com os sonhos que se tem, aproximando-os, distancian-
do-os, potencializando e despotencializando a força do vivo.
Nas conversas com as crianças perspectivas de futuro e sonhos chamaram 
nossa atenção, pois apontavam as dimensões de possibilidades e impossibilidades 
sentidas por esses jovens, dimensões compostas também nos encontros de seus 
pulsos de vida com a escolarização. Os estudantes têm coisas a dizer, sentem es-
ses processos, mesmo que não sejam explícitos quanto a isso, pois são afetações 
muitas vezes silenciadas. Um silêncio “excluído” da escola, incluso diferencial-
mente para as raias da família, dos amigos mais íntimos.
É incluso diferencialmente também em discursos habituais que desqua-
lificam o aluno ou sua família. Vem-nos à memória a situação de uma mãe que 
não sabia ao certo porque um aluno não voltara para a escola, um quebra-cabeça 
que foi se montando aos poucos. O aluno A, depois de uma fala mais ríspida de 
um Educador, ficou “sem jeito” de voltar para a escola, não partilhou com a mãe 
o que houve e simplesmente não voltou mais! Essa autonomia (de não voltar e 
não dizer) construída com essa mãe que o acolheu acaba também por alimentar 
o discurso habitual voltado para essa população: aluno desinteressado, que não 
dá para o estudo, com família desestruturada... Um discurso costumeiro de uma 
estatística costumeira de um modo costumeiro de avaliar a escola: evasão escolar; 
diz-se o aluno evadiu, como se essa trama não fosse coletiva.
Em nossas análises sobre o desempenho escolar nas escolas públicas ten-
demos a excluir as condições político/sociais que produzem as condições de re-
petência, baixo rendimento e evasão escolar. Não no sentido de dizer que elas 
explicariam os rendimentos escolares ruins dos pobres, como se, se eles morassem 
melhor, tivessem uma família “estruturada”, comessem bem e tivessem mais estí-
mulos – como as ditas tecnologias modernas –, poderiam render mais. A ressalva 
é mais grave! É preciso mudar a pergunta: “[...] não mais quem repete [abandona] 
ou porque repete [desiste], mas “o que se repete” [ou o que é abandonado e o que é 
produzido]” (BENEVIDES, 1997 apud HECKERT, 2004, p. 152)?
É claro que morar com conforto, comer o suficiente e ter acesso a ferramen-
tas tecnológicas, pode ser bom para uma comunidade, inclusive para o desempenho 
escolar. Mas a falta disso não é o problema, ou melhor, essa correlação é um ‘falso 
problema’ (DELEUZE, 1999). Pode ser bom, pois a depender do engendramento 
que leva “casa, comida e tecnologia lavada”6 a comunidades de baixa renda, pode-
mos estar nas raias da caridade apaziguadora e compensatória, muitas vezes ofe-
recidas por grandes empresas em troca de afrouxamentos no cumprimento de leis 
ambientais e de obrigações tributárias e sociais, as quais, se honradas, dispensariam 
tais atos de “bondade” empresarial, aparentementebem intencionados.
A casa ruim, a alimentação de poucas vitaminas e calorias, o convívio fa-
miliar dos alunos (pobre de estímulos) e até mesmo fatores biológicos ou intra-
escolares (como o pouco acesso à tecnologia) não causam o baixo desempenho 
escolar, mas a complexidade das práticas que constituem essas condições (HE-
Caminhos bifurcantes na educação inclusiva: inclusões e rebeldias silenciosas na educação pública
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CKERT, 2004: p. 150). Nessa complexidade, vislumbramos a proposição e efe-
tivação forçadas de uma Educação que não atende, ou atende muito pouco, a 
essa população. O problema para nós é o seguinte: o próprio formato (conteúdo, 
tempo, ênfases) da escola oferecida à população de baixa renda não teria se cons-
truído assim, do jeito que se apresenta, para repetir, nos encontros com “Joãos”, 
“Marias”, “Ticos” e “Pixotes”, uma mesma maquinação de inclusão diferencial 
precária dessas vidas, ano após ano, década após década, geração após geração? 
Isso ninguém contou à Mãe do menino que não voltou mais à escola...
O que se repete não é a exclusão, mas sim uma inclusiva funcional do 
sistema capitalista, inerente também à Escola, que mantém a precarização das 
condições de vida de uma população e os privilégios de poucos. A maquinaria 
da escolarização parece ficar mais visível se contrastada com essa lógica “econô-
mica” das inclusões diferenciais: acesso universal com a égide da “Escola para 
Todos” (momento inclusivo); perspectiva inclusiva flexível de acolhimento da 
diversidade do alunado (momento diferencial) e garantia de aproveitamento de 
acordo com as aptidões e habilidades (ou limitações e deficiências) individuais 
(momento gerencial). Esse é um dos efeitos da Educação ou um dos usos possí-
veis para os tempos, espaços e recursos das escolas.
A sutileza da inclusão escolar diferencial pode ser compreendida, inicial-
mente, se vislumbramos processos muito comuns na escolarização pública: os 
moldes educacionais tendem a combinar com valores instituídos de família, de 
trabalho e ascensão social, os quais não condizem com o quotidiano da maioria 
da população pobre desse país. 
Pensando na Escola como possibilidade de contrapoder na rede do Império, 
propomos pensar cada educador como um interventor no domínio biopolítico, em 
que os desejos e movimentos de invenção da comunidade local fossem fomenta-
dos por sua prática, em especial em sala de aula. Nessa dimensão – da biopolítica 
– evidenciamos como importante o trabalho de configurar diferentes maneiras de 
entender os quotidianos individuais e coletivos, fazer da prática educativa uma 
reafirmação de modos de viver singulares, mesmo que incomuns, patologizados 
pelas ciências e fora de forma, de moda, de sucesso. Esses processos inovadores 
já se dão nas ações quotidianas. Lembramos da intervenção de um dos educado-
res que relacionava sua temática com as situações de precariedades sociais locais 
e das formas possíveis de mobilização coletiva. Outro educador questionava o 
pequeno tempo de recreio, defendendo que ele deveria ser aumentado, já que os 
alunos não tinham muito tempo para conversar, pois vinham de lugares diferentes 
da região e não se viam fora da escola.
Essa perspectiva enviesada que procuramos produzir na cartografia com 
processos inclusivos escolares em Aracruz enxerga o trabalho dessa grande 
maquinação social de que todos fazemos parte. Enxerga, por isso também, 
essa vitalidade humana, de inventividade a toda hora, agora, agora, agora! 
Nesta também tomamos parte!
Ana Lucia C. Heckert; Ricardo Bodart de Andrade
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inConClusões: inClusiva esColar e Combate
A vitalidade da Escola, assim como as controversas forças de mudanças 
na Saúde – conquistas do SUS, travessias da luta antimanicomial, reforma psi-
quiátrica, atenção psicossocial, desinstituicionalização – precisa de profissionais 
“implicantes” (RODRIGUES, 2009). Profissionais que exijam de si e dos de-
mais, “[...] a cada ensinamento ou recomendação, a análise da participação de tal 
ensinamento ou recomendação na produção daquilo que aparentemente apenas 
se constata como ‘problema da vida’ ” (RODRIGUES, 2009: p. 206). Ousamos 
dizer que a Educação precisa também ser desinstitucionalizada! Primeiramente, 
no sentido de compreender que o cotidiano educa mais do que os conteúdos, su-
plantados inclusive pelo próprio modo de fazer escola, que gera a pertinência de 
se ensinar uns conteúdos e não outros. Em segundo lugar, desinstitucionalizada 
na possibilidade de negar boa parte daquilo que habitualmente entendemos por 
educar, uma recusa talvez inevitável para que revoluções em favor do povo de 
fato se dêem. Revoluções para as quais as formações institucionalizadas (de pe-
dagogos, psicólogos, assistentes sociais...) jamais serão um alimento.
Os modos instituídos na escola – regime de verdade para Foucault (2006a) 
– são similares aos das academias, das ciências positivistas, dos ideais midiáticos 
e de consumo e das exigências industriais de exploração do trabalhador. Essa si-
milaridade ajuda a explicar porque os índices de rendimento de estudantes mora-
dores de bairros com rendas médias, média-alta e alta tendem a ser considerados 
melhores que os rendimentos de estudantes de baixa renda. É que os valores e 
racionalidades das famílias mais abastadas são similares às tramas que geram os 
currículos, as avaliações e metas escolares, sendo similares, ao mesmo tempo, 
aos modos preconizados pelo mundo do trabalho capitalizado. 
Martins (2008) propõe um método que tome como referência na análise 
dos processos sociais aquilo que é limiar, marginal e anômalo. Para nós esse 
método pode estar presente também na maneira de pesquisar, esta uma forma de 
intervenção na vida. A lembrança de uma mistura fluida constante de uma biopo-
lítica aracruzence (santacruzence, capixaba, brasileira...) e de uma micropolítica 
cotidiana (local), esteve conosco nos encontros por essas terras. 
Escolhemos para a elaboração deste trabalho algumas das tecelagens que 
inventamos junto com educadores, estudantes, familiares e moradores, acredi-
tando que “produzir com” é fortalecer essas vi(d)as (pensamentos, sentimentos, 
práticas...) que tendem para a invisibilidade frente aos modos hegemônicos de 
viver. Afirmamos essas modulações de alianças marginais como combates estra-
tégicos na rede de inclusão diferencial do Capital, ações indispensáveis por serem 
intervenções que compõem com os modos de viver dos atores locais.
Caminhos bifurcantes na educação inclusiva: inclusões e rebeldias silenciosas na educação pública
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notas
1 Vida aqui é entendida para aquém e além de seu aspecto biológico, considerando sua amplitude 
social, de pensamentos, de afetações, de vínculos, de inventividade e construção de soluções 
e problemas quotidianos. Vida “[...] inclui a sinergia coletiva, a cooperação social e subjetiva 
no contexto de produção material e imaterial contemporânea, o intelecto geral. Vida significa 
inteligência, afeto, cooperação, desejo [...]” (PELBART, 2003, p. 83).
2 A noção de intercessores que utilizamos aqui vem de Deleuze (2000). Intercessor são pessoas, 
conceitos, coisas, como as quais construímos um falseamento para exprimir o que precisamos 
dizer. A idéia de falseamento se coloca por não haver a intenção de representar o que o outro diz, 
de re-apresentar sua verdade, mas, sim, de sermos tocados pelo outro, que nos compromete numa 
relação inventada. No desenvolvimento de um pensamento, de um trabalho, criamos intercessores, 
construídos no entre, no encontro.
3 A ARCEL, hoje (2010) FIBRIA, refere em site oficial (www.fibria.com.br) uma base de áreaflorestal superior a 1 milhão de hectares. Destes, 393 mil seriam dedicados ao que eles chamam 
de ‘conservação de ecossistemas nativos’. A empresa refere ainda que sua área florestal está 
presente em 6 estados: Espírito Santo, Bahia, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, São Paulo e Mato 
Grosso do Sul (FIBRIA, 2010). O surgimento da FIBRIA aparece no site da ARCEL, como uma 
união entre esta empresa e a Votorantim Celulose e Papel (VCP), referidas como duas empresas 
brasileiras com forte presença no mercado global de produtos florestais (ARCEL, 2010). Já no 
domínio virtual da FIBRIA, a mesma é anunciada como uma “líder em celulose de mercado” que 
nasce da incorporação da antiga ARCEL - ali nomeada de ‘Aracruz’ - pela VCP, anunciando seus 
15 mil empregados e sua capacidade de produção em torno de 5,4 milhões de toneladas de celulose 
e 300 mil toneladas de papel por ano (FIBRIA, 2010). A distinção entre ‘união’ e ‘incorporação’ 
nesse caso – somada à estranha escrita que anuncia a incorporação pela VCP da ‘Aracruz’ e não da 
‘ARCEL’ ou ‘Aracruz Celulose’ – seria mero eufemismo para a violação ambiental oficializada? 
4 Informações atuais sobre conflitos com a ARCEL podem ser acessados nas páginas do “Brigada 
Indígena”, grupo de apoio às comunidades Tupiniquim e Guarani nos municípios de Aracruz 
(http://www.autistici.org/brigada/) e da FASE (www.fase.org.br).
5 Os analisadores são acontecimentos, que põem em evidência, em movimento e em análise, 
determinadas relações de força, determinadas situações, enfim, um conjunto de relações, que até 
esse momento não estavam em visibilidade, não estavam em questão ou não eram discutidas da 
maneira que, a partir de então, passa a se colocar (LOURAU, 2004, p. 131-132).
6 Menção à conhecida proposta popular, e comumente jocosa, que oferece “casa, comida e roupa 
lavada” a um (a) possível pretendente, com óbvios interesses de convívio continuado sob 
determinadas condições de compromisso, casamento ou algo do gênero. Uma proposta nesses 
termos pode ser boa, mas não será necessariamente assim para todas as partes envolvidas.
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	Ana Lucia C. Heckert

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