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A neurociência e as altas habilidades/superdotação Apresentação Estudar o sistema nervoso, o seu funcionamento e a regulação dos seus órgãos – em especial o cérebro – é considerado um dos maiores desafios para a humanidade desde a Antiguidade. O ramo da ciência responsável por conduzir essas investigações e interessado nessa área é a neurociência. Apesar de o uso desse termo ser recente, os estudos do cérebro humano são muito antigos, e seus primeiros registros podem ser observados desde a Grécia Antiga. Os primeiros trabalhos foram conduzidos por filósofos da Grécia, que desenvolveram teorias sobre o cérebro por meio de observações simples. Posteriormente, os romanos iniciaram seus estudos dissecando animais. No século XVIII, por influência pelo Iluminismo, surgiram os estudos mais aprofundados do sistema nervoso. Diversos outros importantes estudiosos, como Charles Darwin, também contribuíram com seus conhecimentos para a neurociência, porém, foi com o advento do raio X e da tomografia computadorizada que as pesquisas do cérebro humano foram otimizadas. Isso propiciou, então, o surgimento formal da neurociência. As tecnologias atuais permitiram avanços consideráveis da neurociência, a qual pôde expandir seus campos de pesquisa para outras áreas. A educação, por exemplo, é uma das áreas de foco das investigações da neurociência. O conhecimento atual da neurociência é tão próspero que já é possível estabelecer onde e quando ocorrem no cérebro os processos cognitivos específicos, ou seja, aqueles relacionados à aprendizagem. Nesta Unidade de Aprendizagem, você estudará as principais funções e aplicações da neurociência no campo da educação de pessoas com altas habilidades/superdotação. Além disso, você aprenderá conceitos básicos da neurociência, que são de suma importância para entender o funcionamento do sistema nervoso e dos processos cognitivos de alunos com altas habilidades. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identificar a relação entre neurociência e altas habilidades/superdotação. • Reconhecer na neurociência as características das altas habilidades/superdotação. • Descrever a relação entre neurociência e educação e as propostas de ensino de alunos com altas habilidades/superdotação. • Infográfico Um dos mais importantes aspectos da neurociência do processo de ensino e aprendizagem é, sem dúvida alguma, a memória. A memória é, em seu significado mais completo, o resultado do conjunto de eventos que envolvem a aquisição, a formação, a conservação e a evocação de informações. Um aspecto importante e que deve ser ressaltado é que a memória pode diferir consideravelmente de acordo com a intensidade desses eventos. No Infográfico, veja as classificações neurocientíficas da memória. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://statics-marketplace.plataforma.grupoa.education/sagah/64be119d-4937-4407-befb-63c61dd130d9/320cc01a-9a28-49df-bec3-35fe8580d38a.png Conteúdo do Livro A aquisição de uma gama de informações e o acesso a elas constituem algo imprescindível no mundo globalizado no qual vivemos. Assim, estar conectado às pesquisas e às tendências atuais nas mais variadas áreas de trabalho em todo o mundo e que estão acontecendo a todo instante permite não só a manutenção do esforço produzido até então como também a adequação ao universo, que está em constante modificação. A tecnologia atual nos permite estudar diversas áreas que até então não eram palpáveis. O cérebro humano, apesar de ser objeto de discussão desde a época de Hipócrates (há 2.300 anos), agora pode ser estudado em mínimos detalhes, e isso é permitido pelas neurociências. No capítulo A neurociência e as altas habilidades/superdotação, da obra Ensino da pessoa com altas habilidades/superdotação, serão introduzidos os conceitos básicos sobre o funcionamento do cérebro de indivíduos com altas habilidades/superdotação, bem como as áreas de pesquisa da neurociência e suas aplicações no ensino de jovens com altas habilidades. Boa leitura. ENSINO DA PESSOA COM ALTAS HABILIDADES/ SUPERDOTAÇÃO Diego Anderson Dalmolin Neurociência e altas habilidades/superdotação Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identificar a relação entre neurociência e altas habilidades/superdotação. Reconhecer as características das altas habilidades/superdotação na neurociência. Descrever a relação entre neurociência e educação e as propostas de ensino para alunos com altas habilidades/superdotação. Introdução Os avanços no campo da biologia moderna permitiram que o homem alcançasse novos patamares em inúmeras áreas do conhecimento cien- tífico. Esses avanços oportunizaram grandes aprimoramentos em áreas científicas já dominadas pelo homem, como áreas da saúde, produção de alimentos e meio ambiente. Além disso, permitiram a criação de novas técnicas e o desenvolvimento de novos campos de conhecimento, como a neurociência. A neurociência é uma disciplina da área biomédica que estuda o sis- tema nervoso humano (BARTOSZECK, 2014; LENT, 2001). Os estudos que envolviam os processos neurais e o funcionamento do cérebro tiveram grande incentivo na chamada década do cérebro entre os anos de 1990 e 2000. Nesse período, muitas equipes multidisciplinares de diferentes países reuniram seus conhecimentos e criaram novas ciências, tais como a neu- roquímica, a neurofisiologia e a neurociência cognitiva (SIMONETTI, 2008). Neste capítulo, você vai estudar a relação entre neurociência e altas habilidades/superdotação (AH/SD). Para isso, vai conferir as características das AH/SD de acordo com a neurociência. Além disso, você vai ler sobre como neurociência e educação de relacionam, com destaque para as propostas de ensino para os alunos com AH/SD. 1 Neurociência e altas habilidades/ superdotação O sistema nervoso humano é constituído de diversos órgãos, tais como cére- bro, cerebelo, bulbo, medula espinhal e ponte neural. Todas essas estruturas realizam funções específi cas que, em conjunto, coordenam e regulam diversas atividades do corpo humano, como movimentos voluntários, sentimentos e ações comportamentais (PIOVESAN, 2017). Essas estruturas são formadas, principalmente, por um tipo especial de células: os neurônios. Neurônios são considerados unidades processadoras de informação. Essas células devem adquirir as informações (por meio de receptores sensoriais), transmiti-las para neurônios próximos e codificar nossas memórias, além de originar pensamentos e emoções (KOLB; WHISHAW, 2002). Diante da natureza multifacetada do sistema nervoso e das funções neurais, a neurociência está organizada em cinco principais disciplinas, conforme o Quadro 1. Fonte: Adaptado de Lent (2001). Neurociência celular Estuda as células que formam o sistema nervoso, sua estrutura e função. Neurociência cognitiva Investiga as capacidades mentais mais complexas do ser humano, como linguagem, memória e autoconsciência. Neurociência comportamental Estuda as estruturas neurais responsáveis pelos comportamentos e a produção de outros fenômenos psicobiológicos, tais como os comportamentos emocionais, sexuais, o sono, dentre outros. Neurociência molecular Investiga as moléculas responsáveis pelo funcionamento do sistema nervoso, bem como a interação entre os diversos tipos de moléculas. Neurociência sistêmica Aborda tanto o estudo da localização das células e estruturas nervosas quanto a sua morfologia (forma) e fisiologia (funcionalidade). Quadro 1. Cinco principais disciplinas da neurociência. Cada uma dessas disciplinas da neurociência promoveu um avanço consi- derável no estudo do comportamento e no desenvolvimento de pessoas com Neurociência e altas habilidades/superdotação2 AH/SD. Por exemplo, os estudos dos aspectos neurofisiológicos de pessoas consideradas talentosasou com inteligência acima da média investigaram a relação conjunta entre a estrutura cerebral e o processamento de informações neurais. Nesses estudos, foi possível observar que o alto grau de inteligência dos indivíduos com AH/SD é dado em função de processos integrados bastante avançados e velozes dentro de seus cérebros. Esses processos são, ao mesmo tempo, eficientes em relação ao gasto energético (ou seja, eles são econômicos em relação ao gasto de glicose) quando comparados aos cérebros de pessoas consideradas “normais” em relação às suas capacidades neurais (ANDERSON; DAVIS, 2001; HAIER, 2003). A quantificação da inteligência (QI) para a identificação de indivíduos com AH/SD também é utilizada no campo da neuropsicologia (neurociência cognitiva), visando a construção de estratégias educacionais que possam ter relevância para o processo de aprendizagem do aluno com AH/SD. O desen- volvimento de novas técnicas de imagem, em especial aplicadas à neurociência molecular/funcional, permitiu a observação in vivo de variações moleculares na atividade neural em diferentes áreas do cérebro. Essas técnicas permitiram detectar uma correlação positiva entre a inteli- gência fluida e o grau de ativação do circuito frontal-parietal em atividades que exigem raciocínio. Além disso, a neurociência molecular traz fortes indícios de que as diferenças de desempenho entre alunos estão fortemente associadas a diferenças funcionais, estruturais e anatômicas dos seus cérebros. Esses achados trazem à tona a necessidade de incluir esses tipos de avaliações no planejamento de atividades para alunos com necessidades especiais, especial- mente no seu desenvolvimento cognitivo. Apesar de abordarem diferentes aspectos do sistema nervoso ou de utiliza- rem metodologias distintas, essas disciplinas não são mutuamente exclusivas, e os conhecimentos produzidos em cada uma dessas áreas pode ser perfeitamente aplicado em outras áreas da neurociência. 2 Características de pessoas com altas habilidades/superdotação de acordo com a neurociência Os processos de aprendizagem e, consequentemente, de memorização têm funcionamentos específi cos em pessoas com AH/SD. De forma geral, o pro- cesso de memorização consiste em mecanismos complexos que transferem a informação recém obtida para os chamados bancos de memória de longa 3Neurociência e altas habilidades/superdotação duração. Nesses bancos, essas informações serão consolidadas e poderão ser utilizadas posteriormente (BARTOSZECK, 2014). Existem diversos centros de consolidação da memória distribuídos ao longo do cérebro, cada um especializado na memorização de determina- dos tipos de atividade. Atividades como andar, correr ou praticar qualquer outro tipo de atividade física ativam os centros de memorização motora. Já atividades que influenciam o sistema de memória emocional vão promover aprendizagens relacionadas à expressão (por exemplo, música). Os indivíduos com AH/SD apresentam precocemente realce nos padrões de sensibilidade de determinadas áreas de memorização, tanto de curta quanto de longa duração (BARTOSZECK, 2014). Os neurônios apresentam diferentes regiões celulares: dendritos, corpo celular, o axônio. Essas estruturas estão associadas, principalmente, aos processos de entrada, integração, condução e saída de informações. A atividade de um neurônio é influen- ciada por diferentes tipos de neurotransmissores (excitatórios ou inibitórios), que são liberados por outros neurônios adjacentes e que induzem correntes despolarizantes ou hiperpolarizantes nos dendritos. Se essas correntes que atingirem o corpo celular forem suficientemente fortes, um potencial de ação é iniciado e vai percorrer toda a extensão do axônio (de forma rápida graças à presença da bainha de mielina) até atingir os terminais sinápticos. Nesses locais, formam-se sinapses (áreas de conexão) com outros neurônios, reiniciando o ciclo de fluxo de informação nas células pós- -sinápticas (HAIER, 2003). Estudos neurocientíficos com indivíduos com AH/SD também detectaram características peculiares nos cérebros dos indivíduos analisados durante as pesquisas, sobretudo no que diz respeito a sua eficiência na codificação de informações de entrada. Em cérebros de pessoas ditas “normais”, a estrutura neural, o potencial sináptico e o sistema neural (circuitos neurais) são alterados a cada nova experiência vivenciada pelo indivíduo. Em termos biológicos, podemos dizer que a relação entre o estímulo promovido pelo ambiente e a resposta produzida pelo sistema nervoso do indivíduo acabam alterando as características e os processos neurológicos já existentes. Essas alterações podem ser traduzidas em aprendizagem. Porém, os especialistas observaram que o cérebro de indivíduos com AH/SD utiliza um número muito maior de Neurociência e altas habilidades/superdotação4 áreas cerebrais especializadas no processo de codificação da informação de entrada. Consequentemente, o desempenho do cérebro é traduzido em uma memória de trabalho mais eficiente, ou seja, a informação fica retida mais tempo na memória. Como resultado, esses indivíduos têm uma facilidade muito maior de reconhecer padrões, resolver problemas, fazer deduções, praticar e repetir atividades (BARTOSZECK, 2014; SILVA; ROLIM; MAZOLI, 2016). Pessoas com AH/SD também apresentam uma comunicação mais eficiente entre os hemisférios direito e esquerdo do cérebro. De acordo com Sousa e Alves (2017), essa característica lhes confere agilidade durante o processo de aprendizagem. Além disso, alguns indivíduos podem apresentar alta eficiência no processo de cognição cerebelar (VANDERVERT; SCHIMPF; LIU, 2007). Alguns estudiosos da neurociência das AH/SD defendem fortemente que o cerebelo tem papel fundamental na função cognitiva e tem uma relação íntima com o córtex cerebral (ambos estão ligados pela substância branca do cérebro (KOZIOL; BUDDING; CHIDEKEL, 2010). Como resultado, a interação entre a cognição cerebelar e a memória de trabalho acelera o alto controle da atenção desde o início da infância (VANDERVERT; SCHIMPF; LIU, 2007). Por fim, o cerebelo com AH/SD também pode apresentar um aumento considerável na densidade de matéria cinzenta, o que estaria rela- cionado, principalmente, à superioridade no desempenho de habilidades de cunho espacial e de processamento de informações. Existem fortes indícios de que as variações neurobiológicas da inteligência resultam de fatores hereditários. Elas são produzidas pelos genes oriundos dos pais e podem atravessar gerações (DAVIES et al., 2011). Contudo, as habilida- des cognitivas e o desenvolvimento da inteligência são altamente dinâmicas e apresentam plasticidade, ou seja, podem ser moldadas pelo ambiente (interação gene-ambiente). Assim, a escolaridade influenciaria o desenvolvimento intelectual-cognitivo dos alunos; a prática em uma determinada atividade escolar aprimoraria não só o desempenho nesta, mas também em outras tarefas não treinadas, desde que estas compartilhem os mesmos circuitos neurais de funcionamento (efeito de transferência) (DAVIES et al., 2011). As adversidades vivenciadas por indivíduos em desenvolvimento afetam diretamente o seu neurodesenvolvimento. Por exemplo, alunos com AH/SD que foram expostos a situações de vulnerabilidade psicossocial (estimulação insuficiente ou ausente) apresentaram comprometimento nas suas funções executivas. Esses achados demonstram a importância do contexto social e de um ambiente saudável para o desenvolvimento de crianças e adolescentes. Por fim, Geake e Cooper (2006) sintetizaram informações importantes a partir de suas pesquisas sobre neurociência cognitiva. Essas informações 5Neurociência e altas habilidades/superdotação auxiliaram a evidenciar algumas características comuns em pessoas com AH/ SD e podem auxiliar na sua diferenciação para indivíduos ditos “normais”. Observe no Quadro 2. Fonte: Adaptado de Bartoszeck (2014). Característica Indivíduo “normal”(prodígio) Indivíduo com AH/SD QI Normal Alterado Cognição de alto nível Compreensão e comunicação com uso de linguagem além de seus pares da mesma idade Raciocínio abstrato ausente ou mínimo Definição Competência de adulto em área específica antes dos 10–12 anos Talento excepcionalmente precoce em área específica Desenvolvimento Fala e leitura precoce Confiança em padrão concreto e literal de pensamento e ação Emoção Problemas com ajuste emocional Emoção modesta ou ausente Quadro 2. Caracterização neurocognitiva e comparação de indivíduos considerados “prodígio” e dos indivíduos com AH/SD 3 Propostas da neurociência para o currículo de alunos com altas habilidades/superdotação A neurociência é um campo de conhecimento interdisciplinar. Suas teorias e aplicações são construídas de maneira articulada com diversas áreas, tais como fi losofi a, linguística, medicina e educação. Um dos grandes objetivos da neurociência no campo da educação é elucidar os meios pelos quais o cérebro humano aprende, além de explicar como esse órgão se comporta no processo de aprendizagem. Para isso, a neurociência utiliza diversos métodos para identifi car quais estímulos geram respostas nas conexões neurais e de Neurociência e altas habilidades/superdotação6 que forma esses estímulos acabam por promover a aprendizagem do indivíduo (COSENZA; GUERRA, 2011). Os avanços teóricos trazidos pela neuropsicologia e pela neurociência enriqueceram o repertório de informações sobre o funcionamento das funções cognitivas e socioafetivas dos indivíduos com AH/SD (SILVA; ROLIM; MA- ZOLI, 2016). Esses indivíduos apresentam alta diversidade de características e variáveis de ordem cognitiva, social e emocional, que tornam o seu processo de aprendizagem único. Joseph Renzulli (1986), um dos estudiosos mais notórios das AH/SD, construiu a teoria dos três anéis, afirmando que os indivíduos com AH/SD têm compromisso com uma ou mais tarefas de sua preferência, apresentando habilidades acima da média e realização criativa. Formulada na década de 1970, apresenta uma conceituação centrada mais na atuação do que na potencialidade do indivíduo com AH/SD. A teoria dos anéis de Renzulli, como também é chamada, não se atém no Quociente Intelectual (QI), e sim na confluência de três principais fatores que determinarão os indivíduos com AH/SD, quais sejam: 1. habilidade/capacidade acima da média: permanece relativamente estável e não necessita ser excepcional; 2. comprometimento com a tarefa (motivação): persistência, dedicação, esforço e autoconfiança. 3. criatividade elevada: flexibilidade e originalidade do pensamento. As abordagens utilizadas para o ensino de alunos com AH/SD devem ser desenvolvidas de forma específica e direcionada para a sua área de domínio de tal forma a maximizar as suas aptidões (MATOS; MACIEL, 2016). Além disso, é de extrema importância o planejamento do currículo para esses indivíduos, uma vez que muitos deles acabam por apresentar baixo rendimento ou por abandonar a vida acadêmica (escolar) pelo simples fato de não considerar o currículo importante ou atraente (BECKER, 2014). O sucesso no processo de aprendizagem se dá integrando o assunto a ser aprendido com atividades que envolvam objetos que o aluno possa aprender e que ao mesmo tempo sejam cativantes. Para o aluno com AH/SD, esse tipo de experiência prática é extremamente importante. A aprendizagem promove alterações por meio do processo de neuroplasticidade, com mudanças neuro- anatômicas e neuroquímicas no cérebro. A reestruturação neural e o número de sinapses nervosas aumentam significativamente quando a aprendizagem é promovida com a experimentação (BARTOSZECK, 2014; KOLB; WHISHAW, 2002; OLIVEIRA, 2014). As atividades realizadas de forma diversa e progres- 7Neurociência e altas habilidades/superdotação sivamente mais complexas farão com que o cérebro desses alunos se adeque às suas necessidades intelectuais e comportamentais (ZAGO; RIBEIRO, 2017). A neurociência pode também ser considerada uma importante ferramenta que auxilia na renovação teórica dos docentes. O conhecimento do funcio- namento do cérebro e do processo cognitivo mediado por conexões neurais facilita a compreensão do desenvolvimento do aluno. Sobretudo, a neurociência mostra caminhos mais claros para que o educador compreenda a complexidade do processo de ensino e de aprendizagem e crie novas ferramentas para o desenvolvimento cognitivo saudável de seus educandos, especialmente os com AH/SD (SOUSA; ALVES, 2017). Bartoszeck (2014) propôs uma série de atividades que podem ser incluídas no currículo de alunos com AH/SD, por promoverem o aumento das conexões neurais/consolidação da memória: atividades de repetição; atividades de pensamento integrado, como as que integram tópicos de biologia, física e química; currículo do tipo espiral, abordando conceitos repetidamente, mas com alternância dos contextos (por exemplo, hora trabalhar com os conceitos de profundidade, hora de extensão); apresentação de conceitos com materiais diferentes, como livros didá- ticos e mídias digitais; atividades que envolvam a resolução de casos; ANDERSON, M.; DAVIS, H. Diferencias individuales y desarrollo: una dimensión o dos? In: ANDERSON, M. (ed.). Desarrollo de la inteligencia. Oxford: Oxford University, 2001. p.187-222. BARTOSZECK, A. B. Neurociências, altas habilidades e implicações no currículo. Rev. Educação Especial, v. 27, n. 50, p. 611-626, 2014. BECKER, M. A. É possível encontrar talentos nas ruas e em instituições prisionais? Rev. Educação Especial, v. 27, n. 50, p. 689-698, 2014. COSENZA, R. M.; GUERRA, L. B. Neurociência e educação: como o cérebro aprende. Porto Alegre: Artmed, 2011. Neurociência e altas habilidades/superdotação8 estudo da hierarquia da natureza (por exemplo, dos sais e íons que estão presentes nos neurônios até a forma como se dá o comportamento do indivíduo). DAVIES, G. et al. Genome-wide association studies establish that human intelligence is highly heritable and polygenic. Mol Psychiatry, v. 16, n. 10, p. 996-1005, 2011. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21826061. Acesso em: 12 fev. 2020. GEAKE, J.; COOPER, P. W. Cognitive neuroscience: implications for education? Westminster Studies in Education, v. 26, n. 1, p. 7-20, 2006. HAIER, R. J. Positron tomography studies of intelligence: from psychometrics to neu- robiology. In: NYBORG, H. 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Neurociência e altas habilidades/superdotação10 Dica do Professor As neurociências representam o esforço conjunto de diversas disciplinas em compreender os processos mentais, seus circuitos neurais subjacentes, seus substratos biomoleculares e genéticos e a interação destes com fatores ambientais e culturais. Assim, a neurociência vem sendo uma grande aliada da educação de alunos com altas habilidades/superdotação. Na Dica do Professor, saiba mais sobre os principais componentes do sistema nervoso e o funcionamento das suas mais diversas estruturas e, em especial, do cérebro. Conheça também um pouco mais os avanços científicos realizados no campo da neurociência das altas habilidades. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Audiodescrição da Dica do Professor: Clique aqui https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/cee29914fad5b594d8f5918df1e801fd/fb259fc63b08801dd4a894f7681987c9 https://publica.sagah.com.br/publicador/objects/attachment/2059056058/27894roteirodicadoprof.docx?v=2029444188 Exercícios 1) A neurociência contribuiu muito para a construção do conhecimento que hoje temos sobre o comportamento e o desenvolvimento dos indivíduos com altas habilidades/superdotação. Ela está organizada em cinco principais áreas de investigação: neurociência celular, neurociência cognitiva, neurociência comportamental, neurociência molecular e neurociência sistêmica. Em relação a essas áreas, são feitas as seguintes afirmações: I) A neurociência cognitiva investiga o desenvolvimento das estruturas relacionadas ao comportamento racional. II) As neurociências comportamental e sistêmica buscam encontrar a localização das estruturas relacionadas às psiques. III) A neurociência celular investiga o processo de formação e a morfologia das células do sistema nervoso. IV) A neurociência molecular estuda a formação das principais moléculas do sistema nervoso, ou seja, os neurônios. Assinale a alternativa que lista apenas afirmações corretas: A) A neurociência cognitiva investiga o desenvolvimento das estruturas relacionadas ao comportamento racional. B) As neurociências comportamental e sistêmica buscam encontrar a localização das estruturas relacionadas às psiques. C) A neurociência celular investiga o processo de formação e a morfologia das células do sistema nervoso. D) A neurociência molecular estuda a formação das principais moléculas do sistema nervoso, ou seja, os neurônios. E) Tanto a neurociência molecular quanto a celular estudam a formação das principais moléculas do sistema nervoso, ou seja, os axônios. Considera-se que o cérebro de indivíduos com altas habilidades/superdotação apresenta funcionamento muito eficiente, o que os coloca à frente de muitos dos indivíduos com quem 2) convivem. Essa eficiência ocorre devido a particularidades de algumas de suas áreas e/ou estruturas, tais como: A) as conexões nervosas do cérebro, as quais são extremamente velozes e gastam pouca energia nesse processo. B) o cérebro como um todo, que consegue recuperar-se rapidamente após traumas psicológicos. C) suas capacidades neurais que são transferidas rapidamente entre os hemisférios superior e inferior do cérebro. D) seus neurônios que se desgastam a uma velocidade baixíssima, precisando ser repostos apenas uma vez ao ano. E) seus neurônios não gastam energia, já que o número de células nervosas é imensamente maior do que o número presente no cérebro de pessoas ditas "normais", o que faz com que tenham que processar menos informação. 3) O funcionamento do cérebro humano é como uma grande orquestra que está continuamente a tocar uma grande sinfonia. Não podemos apontar para nenhuma parte isolada, ou mesmo para uma combinação de partes e dizer que constitui a orquestra ou a sinfonia. O miraculoso processo de atividade mental ocorre regularmente, em todos nós, a toda hora, quer sejamos talentosos, quer sejamos pessoas normais. As informações contidas nesse texto são: A) totalmente falsas, pois cada uma das funções realizadas pelo cérebro, incluindo as mais basais (falar, pensar), só depende de uma parte específica do cérebro, a qual trabalha de forma isolada e autossuficiente. B) falsas, em partes, pois somente o cérebro de pessoa com altas habilidades/superdotação consegue combinar múltiplas regiões cerebrais na realização das funções. C) totalmente verdadeiras, pois o conhecimento atual da neurociência do cérebro nos permite caracterizá-lo como um órgão complexo e integrado, e diversas regiões são utilizadas na realização de funções e atividades. D) verdadeiras, mas essa conexão está mais concentrada no hemisfério esquerdo do cérebro. E) verdadeiras, em partes, pois, apesar de o funcionamento do cérebro ser bem conhecido, essas informações não podem ser estendidas a pessoas com altas habilidades, porque seu funcionamento ainda é muito pouco conhecido. 4) A neurociência demonstrou, por meio de suas pesquisas, que a experimentação é a melhor forma de promover o aprendizado em jovens com altas habilidades. Durante esse tipo de atividade, diversas áreas do cérebro são utilizadas, já que as atividades de experimentação: A) promovem a reestruturação neural, desde que as atividades sejam repetitivas. B) promovem a reestruturação neural, desde que o repertório de atividades seja diverso. C) aumentam o número de sinapses nervosas, desde que o repertório de atividades não seja muito diverso. D) diminuem a neuroplasticidade neural, que é a principal responsável pelas dificuldades de retenção da memória. E) aumentam a neuroplasticidade neural, desde que essas atividades de experimentação não sejam complexas. 5) Os principais defensores da abordagem neurocientífica para complementar o planejamento no ensino de alunos com altas habilidades/superdotação defendem a utilização de uma série de atividades no currículo desses alunos, entre as quais: A) atividades que envolvam pensamento de forma integrada. B) atividades não repetitivas C) atividades de fácil resolução. D) utilização do mesmo tipo de material para abordar diferentes conceitos. E) currículo do tipo divergente, no qual os conteúdos sejam o mais diferentes possível a fim de evitar o sentimento de tédio nesses alunos. Na prática As neurociências, ou “simplesmente” as ciências do cérebro, que avançam vertiginosamente, podem contribuir muito para a renovação teórica na formação docente, adicionando informações científicas essenciais para a melhor compreensão da aprendizagem como fenômeno complexo. A neurociência apresenta uma perspectiva que reflete uma visão contemporânea, que pode, inclusive, ser consideradaum foco atual de atenção da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). As informações obtidas pelos estudos da neurociência permitem nos apropriarmos do aprendizado acerca do cérebro e do seu funcionamento. Suas informações podem, então, maximizar as potencialidades de nossos alunos e promover o seu pleno envolvimento com a escola. Neste Na Prática, conheça um estudo de caso de um professor que buscou na neurociência o auxílio de que necessitava para o atendimento especializado de seu aluno com altas habilidades/superdotação. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://statics-marketplace.plataforma.grupoa.education/sagah/6d192657-6e01-481c-b683-27fe6ea69021/c80b2f5b-a9fd-4a3b-ab56-ae37d3436726.png Saiba mais Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: Convergência entre as altas habilidades e a neurociência cognitiva Neste artigo, você encontrará, entre muitas discussões, uma lista com uma série de estudos realizados na neurociência cognitiva ao longo dos anos. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Alunos dotados e talentosos: atividade neural e o papel do professor Neste manuscrito, você poderá entender um pouco mais sobre a importância da estimulação ambiental e do professor no processo de desenvolvimento cognitivo de alunos com altas habilidades. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Neurociências e aprendizagem: como o cérebro aprende Neste vídeo, você poderá assistir a uma discussão estendida do processo neurológico de aprendizagem. http://publica.sagah.com.br/publicador/objects/attachment/167357083/PaulinoCONVERGNCIASENTREASALTASHABILIDADESEANEUROCINCIA.pdf?v=561028594 http://publica.sagah.com.br/publicador/objects/attachment/852265471/Simonetti2011.pdf?v=1839557798 Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://www.youtube.com/embed/23I4yU-jCGM